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JOAO ALVES DIAS (Univers. Nova de Lisbos) Itinerario de D. Afonso IL (1211-1223) PORTO 1986 Itinerario de D. Afonso II (1211-1223) * Por JOAO ALVES DIAS (Gaiven, Nove de Lisbon) Antes de enalisarmos o itinerério de Afonso I, lembremos as razées. que motivavam as andancas dos monarcas da Idade Média, Como dissemos no Itinerdrio de D. Afonso HI «o rei era o mais alto senhor de um tervitério, ao qual estavam sujeitos, por nabureza, todos quamtos a esse ‘territdrio se encontravam vineulados, quer fosse por residéncia, quer por propriedade, quer por seahorio; isto é, todas as Pessoas de um reino The deviam fidelidade, obediéncia e auxilio. Das obrigacdes do Rei podemos salientar duas que nos interessam ‘especialmente: , —Tealizagao de justica; — desenvolvimento e integridade, territorial. A realizacao da justiga era uma okrigacdo fundamental da realeza, de tal modo que o rei que a no cumprisse era cdnsiderado indigno da fungao: rex eris si recte faceris...; rei que néo faz justiga nao deve reinar..., sdo sentencas correntes, a primeira vinda do Primus Titulus do Cédigo Visigdtico e a segunda do romanceiro peninsular (). O rei era pois, o supremo juiz. * ComunicacSo apresentada As Jornadas sobre Portugal Medieval, realiza- das em Leiria de 20 a 22 de Outubro de 1983. () Marcello Caetano, Lipdes de Historia do Direito Portugués, Coimbra, Coimbra Editora, 1962, p. 74. a Assim, e dada a dificuldade das comunioagées, para o rei cumprir os seus deveres para com os povos tinha de deslocar-se constantemente de terra em terra acompanhado de sua familia e dos seus dulicos; & a corte itinerante [...]. A passagem do rei pelas vdrias localidades per- mitia tornar presente a sua autoridade e conhecer as necessidades dos poves, para cuja satisfacdo passava cartas que eram veneradas como representando a continuacéo da presenca régia e a perpetuidade da palavra do monarca(). Defendia assim a segunda das duas obrigagées que salientémos, Todas estas deslocagdes exigiam bastantes despesas, nko ao rei na sua totalidade, pois ele tinha o direito de aposentadoria ou de pousar com a sua comitiva nas casas particulares e mosteiros, que Thes Ceviam fomecer hospedagem completa. Nos outros pontos, onde se fixava por Tongo tempo, recorria 20 consumo dos géneros arrecadados nos seus celeiros e nas suas tuthas nos varios lugares do reino (). Por isso tem tanta importancia na Idade Média conhecer os itine- rérios dos reis, pois raramente paravam muito tempo no mesmo sitio (). Nao podemos, contudo, esquecer que se o rei ia acompanhado por toda a sua corte no seguia com certeza em grarides cavalgadas, e a cortasmato, mas sim por estradas ou caminhos previamente determina- dos, que passavam, com toda a certeza, pelos principais centros urba- nos. Realizando, assim, cronologicamente a ligacdo das diversas locali- dades, onde 0 rei parava para dar as cartas (entre outros documentos) atrés apontados, vernos aparecer as possiveis rotas terrestres. E, se em vez de analisarmos o itinerério de um timico rei, virmos os peroursos Ue todo um oonjunto de monarcas, para uma mesma regiéo, durante a Idade Média, poderemos tragat, com quase toda a certeza, as estradas medievais (*) c * Como fonte do presente trabalho, utilizémos toda a massa tocumen- tal que © acaso e a busca constante, nos diversos arquivos do Pafs, nos @) Ibidem, p. 7. ©) Ibidem, p. 71. © Ibidem, p. 71. (©) Sugestio apresentada pelo Prof. Doutor A. H. de Oliveira Marques. fizeram chegar as mios (*). Haverd, porventura, mais documentos espa- thados em diversos micleos documentais, quer particulares, quer ptibli- cos. Mas, infelizmente, ainda ndo temos um corpos com toda a docu: mentagio medieval, j4 ndo digo publicada, mas pelo menos bem inven- tariada ("). Nem nos proprios arquivos e bibliotecas existem ficheiros capazes de responder &s buscas de um investigador ('), Por isso, existi- ro, sem diividas, falhas no presente trabalho» ("). * ‘Uma cradiografias do itinerdrio. Julgamos que seré de maior utilidade, e que nos abre mais pers- pectivas da conjuntura administrativa, eoonémica ¢ politica do reinado de Afonso II, apresentar uma sintese global das viagens realizadas por esse monarca, do que analisermos, ano a ano, esses mesmos peroursos. Dos 4301 dias de vida reinante We Afonso Ii —de 29 de Margo de 1211 a 25 de Margo de 1223 (*°)—os documentos apenas nos elucidam concretamente sobre 126, ou seja cerca de 3%, E, embora frequente- mente, possamos inferir locais ou regices onde tenha passado em datas omissas, numerosos so os hiatos de tempo impossivel de preencher sem entrar no campo da pura especulacio. Se tivermos em conta as datas © os locais passiveis de dedugio pelos dados do itinerario, é evi- dente que o mimero de dias em que se comhece o parudeiro do rei aumenta. Assim, por exemplo, estando o monarca em Guimaraes a 4 de Julho de 1218 e, novamente, em 10 de Julho, parece Kégioo que em Gui- maraes se encontrasse nos dias intenmédios, nio referidos nos diplo- mas. Mas se a Idgica, em casos como este, resulta simples e correcta, j4 ‘dividas se levantam sobre a legitimidade da sua aplicagao a outros casos. Assim, sabendo que esta a 6 da Abril de 1211 em Coimbra, ¢ que ©) As fontes, ¢ para evitar uma repeticio, encontramse no fim do presente trabalho, especificadas por arquivos. (©) ‘Vejase, todavia, um precioso auxiliar o Guia do Estudante de Histéria Medieval Portuguesa, 2+'ed., Lisboa, Ed. Estampa, 1979. ()_ © Arquivo Nacional da Torre do Tombo possui «indices» aceitéveis, em ‘comparacio com o que passa em outros arquivos do Pais. 0) Todo José Alves Dias, Itinerdrio de D. Afonso III, Separata de Arquivos do Centro Cultural Portugués, XV, Paris, F.C. G., 1980, (*) Segundo 0 Liber Anniversariorum Eeclesiae Cathedralis Colimbriensis (Livro das Kalendas), Vol. 1, Coimbra, F. Letras, 1947, Sancho I morreu a 29 de Margo de 1211 (p. 173) © Afonso II a 25 de Margo de 1223 (p. 163). 31 ai penmaneve no dia 30 de Junho do mesmo ano, sera Mcito dizer que o rei continuou 1 durante os meses de Abril, Maio ¢ Junho? Se se conjecturar esta permanéncia fisica do rei na mesma locali- dade, dentro de parametros aceitéveis, 0 nosso conhecimento sobre os “locais onde 0 monarea se deteve, 20 longo do seu reinado, aumentariam de 3 para 34%, ou seja para 1460 dias, com a distribuigio seguinte: Ano Penfodo Localidade N° de dias 1211 Abril, 6 — Julho (*) Coimbra 87 121142 Dezembro, 5—Janeiro, 27 Coimbra 4 121314 Dezembro, 8— Janeiro, 31 Coimbra 55 1217 Abril, 17— Maio, 7 Lisboa 2 1217 Junho (**) — Julho (*) Coimbra 2 1217 Agosto, 11 — Setembro, 6 Guimaraes 27 1217 Outubro (**)—Dezembro, 1 Onimmbra 32 121748 Dezembro, 18 — Abril, 13 Santarém u7 1218 Maio (**) — Junho, 5 Lisboa 6 1218 —Sulho, 4—Iulho, 10 Guimaraes 7 1218 Julho, 31 — Agosto, 15 Coimbra 16 1219 Fevereiro, 9— Junho, 7 Guimaraes 119 1219 Julho, 4— Julho, 7 Guimarses 4 1219 Agosto, 30—Setembro, 30 Guimaraes 31 121920 Dezembro, 22—Janeiro, 10 Coimbra 20 1220 Margo (**) — Abril (*) Santarém 2 1220 Maio (**) — Dezembro Coimbra 40 1221 Jeneiro(**) — Dezembro "Santarém 335 1222 Janeiro — Dezembro Santarém 365 1223 Janeiro — Mango, 25 © -Santarém % “Total 1424 Localidades documentadas s6 com um dia. all Total Enoontram-se, também, embora em escasso mimero, casos de incom- patibilidades de datas © estadins, em grande parte devidos, provavel- ( Nestes casos em que se nfo conhece 0 dia em que foi dado o diploma, consideramos 0 primeiro dia do més para data limite sem objecsSo. (**) Nestes casos em que nao se conhece o dia em que foi dado o diploma, concideramot 0 iltimo dia do més como data limite sem objecsSes. 32 inente, a ertos das fontes (que so, em sua maioria, cépias e, portato, faceis portadoras de erros). Por exemplo, um documento que foa0 Pedro Ribeiro cita como sendo feito em «Colimbrie pridie Kal. Mail era 1255», cartas, hoje conhecidas, a 1, 6 ¢ 7 de Maio. Portanto, era impossivel loca, dizar-se na cidatle de Coimbra a 30 de Abril. Julgamos que o erro esteja na Jeitura, acaso por confusio entre «Mai» e «Marci». A estar certo o ano, a data correcta seria, portanto, 28 de Fevereiro de 1217. Outro erro. ‘possi- Yel € o que se encontra na confirmacio do foral de S. Joio da Pesqueira, firmado, segundo a cépia existente, transcrita nos Portugaliae Mone, menta Historica, Leges (p. 348), em Guimaraes, quatro dias de Junho de 1218, mas que o deve ter sido a 4 de Julho, pois o rei, no dia 5 de Junho, ainda se achava em Lisboa, e 0 dia 9 em Torres Vedras, coatinnande depois a marcha para Guimaraes. ‘J& Jodo Pedro Ribeiro assinalara que a maioria dos documentos era firmada sem se declarar o dia do més, «apparecendo bem poucos até ao principio do Reinado do Senhor D. Dis ‘que especifiquem mais que a era, €.0 mez»("). Assim, novo problema se nos levanta, quario dispomos de uma série de cartas firmadas no mesmo més e ano mesmo local: foram dadas em dias diferentes? foram dadas no mesmo dia? Ambas as hipéte- Ses so acertadas. Por isso optémos por um s6 documento assinalando ® presena régia na referida localidade. Quando nos surgiram documen. tos firmados com o dia e 0 més, ao lado de outros indicando <6 este ‘ltimo, numa mesma localidade, mencionémos apenas os que tinham a data compteta visto que os documentos sem dia podiam ter side lavradoe no mesmo dia dos outros. * Seguindo estes critésivs, elabordmos trés quadros e um mapa que nos vio ajudar a explicar e a comprovar as conclusées trades, No primeiro quadro calculémos, por ordem decrescente de perma- néncia, o niimero total de dias em que o monarca se demorou nas locali. (0), Jofo Pedro Ribeiro, Dissertapses chronologicas ¢ criticas [..J, 2+ ed ‘Tomo II, Diss. VI, Lisboa, Academia Real das Cigncias, 1857, 2 33 dades, hoje conhecidas, do seu itinerério. Por ele verificamos que San- tarém era a cidade preferida do rei, seguida por Coimbra e por Guima- ries, embora com diferenca significativa em relagéo a Santarém e com grande diferenca, por sua vez, em relagdo as demais localidades. ‘QUADRO I Looalidades Numero de dias Hipéteses de comprovados ‘permanéocia Coimbra Guimaraes Lisboa 313 193 29 Alcobaca Balsemao Mesto Frio Obidos Pombal Pontevedra Pinel Quinteta Santiago de Compostela Torres Vedras ‘Trancoso pee NN OBES Porém, se observarmos com ouidado o quadro n° 2 (onde especifi- cAmos, por anos, o mtimero de dias que 0 monarca permaneoeu em oada localidade), verificamos que Santarém s6 ganhou importancia especial nos uiltimos anos de vida do soberano. Até 1217, este passou a maior 4 Parte dos seus dias, conhecidos, no norte do Pais. 0 que também se com- Preende. Até 1217, era 0 rio Tejo, grosso modo, a fronteira oul de Por tugal. Santarém localizava-se no extremo meridional do territério, era terra de fronteira. A partir de 1217, com as conquistas empreendidas pelas ordens militares além Tejo, D. Afonso II comegou a deter-se mais ‘tempo mo Sul, escolhendo mesmo Santarém para ai passar os trés tilti- mos anos da sua vida. ‘QUADRO It Localidade Amo ——-Niimero e «Marcil», A estar certo 0 ano, a data correcta seria, portanto, 28 de Fevereiro de 1217. Outro erro possi- vel ¢ 0 que se encomtra na confirmacdo do foral de S, Jofo da Pesqueira, firmado, segundo a cépia existente, transorita nos Portugiliae Mon. menta Historica, Leges (p. 348), em Guimaries, quatro dias de Junho de 1218, mas que o deve ter sido a 4 de Julho, pois o rei, no dia § de Junho, ainda se achava em Lisboa, ¢ no dia 9 em Torres Vedras, continuandy, depois a marcha para Guimardes. 34 Jodo Pedro Ribeiro assinalara que a maioria dos documentos era firmada vem se decarar 0 dia do més, eapparecendo bem poucos até ao Principio do Reinado do Senhor D. Diniz, que especifiquem mais que a ea, € 0 mez» ("). Assim, novo problema se nos levanta, quando dispomos de uma série de cartas firmadas no mesmo més e ano mesmo local: foram dadas om dias diferentes? foram dadas no mesmo dia? Amba: as hipote. Ses so acertaddas. Por isso optémos por um sé documento assinalando @ pnesenga régia na referida localidade. Quando nos surgiram documen. tos firmados com o dia e 0 més, ao lado de outros indicando 36 este liltimo, numa mesma localidade, menciondmos apenas os qu: tinham a data completa visto que os documentos sem dia podiam ter sido lavrados no mesmo dia dos outros. - * Seguindo estes critérios, elabordmos trés quadros e um mapa que nos vio ajudar a explicar ea comprovar as conclusées tirades. No primeiro quadro calcukimos, por ordem decrescente de perma: néncia, o nttmero total de dias em que o monarca se demorou nas locali. (*) Toto Pedro Ribeiro, Dissertarses chronologicas ¢ eriticas (..), ‘Tomo II, Diss. VI, Lisboa, Academia Real das Ciéncias, 1857, ed, dades, hoje oonhecidas, do seu itinerério. Por ele verificamos que San- tarém era a cidade preferida do rei, seguida por Coimbra e por Guima- des, embora com diferenca significativa em relagéo a Santarém e com grande diferenca, por sua vez, em relagao as demais localidades. ‘QUADRO 1 Lovatidades Numero de dias Hipéteses de comprovados ‘permanéncia Santarém 37 905 Coimbra 31 313 193 Lisboa 29 Meso Frio Obidos Pombal Pontevedra Pinbel Quintela Santiago de Compostela Torres Vedras Trancoso eee eee eee Porém, se observarmos com cuidado o quadro n° 2 (onde especifi- cAmos, por anos, o niimero de dias que 0 monarca permaneceu em cada localidade), verificamos que Santarém s6 ganhou importancia especial nos uiltimes anos de vida do soberano. Até 1217, este passou a maior 34 parte dos seus dies, conhecidos, no norte do Pais. © que também se com- Preende. Até 1217, era o rio Tejo, grosso modo, a fronteira sul de Pore tugal. Santarém localizava-se no extremo meridional do tervitério, era terra de fronteira. A partir de 1217, com as conquistas empreeadidas pelas ordens militares além Tejo, D. Afonso II comegou a deterse mais tempo no Sul, escolhendo mesmo Santarém para af passar os tris tlti- mos anos da sua vide, QUADRO IL Localidade Amo Nimero dias Niimero dias documentados possiveis see tee see 1214 1 1215 1 1217 3 14 1218 15 103 1220 2 1221 9 335, 1222 6 365 1223 84 Coimbra oe oes oan 12ML 4 4 1212 2 28 1213 2 24 1214 3 32 1215 1 1216 t 1217 8 35 1218 3 16 1219 ™ 10 1220 6 52 Guimarses 1212 1 1215 1 1216 1 1217 3 a 1218 a 7 1219 18 155 1220 1 Localidade = Ano. Lisboa. wo 1214 1217 1218 Guarda wo. oe ee 1220 OBIdos oe see oa wae 1218 Pombal os. sss soe ve 1217 Pontevedra ws. ws. vue 1219 Pinel see ov 1220 Quintela 1217 Santiago de Compostela 1219 Torres Vedras ... ... .. 1218 Trancoso see vss one 1217 Namero dias s no ee ee ee Numero dias possiveis 2b No terceiro quadro inscrevemos as localidades por anos, orde- nando-as, dentro de cada ano, por ordem decresoonte de permanéscia. Este quadro permite conclusdes sobre as localidades as regides que, em cada ano, eram alvo de maior interesse por parte do monarea, Duma andlise cous esta, destace-sc o eixo Coimbra-Guimaries, e depois, Coim- bra-Santarém, verificando-se também a pouca atencSo que D. Afonso II manifestou pelo Nordeste (nunca parece ter ido a Tris-os-Montes) € pela Beira Baixa, esta tiltima ainda em processo de povoamento. QUADRO IIT Ano ——_Localidade Numero dias Numero dias documentados calculades 1211 Coimbra Balsemao 1212 Coimbra Guimaraes 1213 Coimbra 121% Coimbra rn or Covilha, ‘Santarém * 1215 Coimbra — Meso Frio Santarém 1216 Coimbra: Guimaries 1 eee ew Ano 1217 1218 1219 1220 1221 1222 1223 Guimaraes Santarém Santarém Numero dias Documentados BS Be NNeet Bee eRe OO ENO Hee Numero dias calculados a “4 155 10 28 & Elaborémos ainda um mapa de fluxos de ligagio. No pudemos, aqui desenhar um mapa com os caminhos realmente seguidos, uma vez {que 03 pontos indicados se escalonam no tempo, com grandes diferencas entre si. Nao podemos, por isso, dizer, com toda a seguranca, que o rei seguiu este ou aquele caminho, sendo em raros momentos da sua vida (por exemplo, em 1217-18). Porém, analisando este mapa de fluxos, ficamos cientes da impor- tancia que 0 eixo Guimaraes-Coimbra-Santarém, quase paralelo & costa, desempenhava no panorama sécio-administrativo de entio. «Um aspecto que consideramos muito interessante, e que nos foi dado observar do confronto de varios itinerdrios régios, € o que deles se pode inferir sobre as caracteristicas temperamentais dos monarcas ("*) ‘Ao comparar as andangas de D. Afonso II com as de D. Pedro, D. Duarte ou até mesmo do seu filho D, Afonso IIT, depara-senos um caso bastante diferente de qualquer dos outros. No itinerdrio de D. Pedro podemos «relacionar as frenéticas deambulagées [...] com o eeu extremo nervosismo e instabilidade psicol6gica» j4 atestados por Fermio Lopes (*). Em D. Duarte, pelo contrério, encontramos uma estabilidade Jevada ao maximo. Nunca viajou para ld de dois paralelos —o de Leiria anorte ¢ 0 de Portela sul—que distam um do outro de 159 quiléme tros—demorandowe sempre muito tempo em cada localidade (“). De D. Afonso HHI, que foi um rei moderado, pouco nervoso, estével embora sem exageros, conquanto percorresse grande parte do Pais, gostava de permanecer nas terras que visitava ("). De D. Afonso II, que dizer? Nao nos chegam os dados recolhides para inferir o seu aspecto psicolégico, E um rei que, aparentemente, gosta de permanecer om cada terra, de comhecer bem cada localidade, talvez devido aos seus atributos fisicos, a uma prowwvel obesidade— lembremomos de que passou & hist6ria com 0 cognome de O Gordo— que nio lhe permitiria grandes cavalgadas. Também sabemos que Afonso II foi sempre um homem doente. Herculano, ao falar da sua juventude, afirma que sera o infante mai mogo, e A curta idade acrescia o ter uma satide téo débil que fazia duvi- dar a Sancho I de que chegasse a sobreviverthe, e ainda mais quando, entrando na adolescéncia, a acometen violenta enfermidade, cuja cura s6 (@%) Maria Teresa Campos Rodrigues, O Itinerdrio de D, Pedro I, p. 148. (9) Id, ibid. G9, Humberto Baquero Moreno, Itinerdrio de ELRei D. Duarte (@8) Joo José Alves Dias, Itinerério de D. Afonso III, p. 471. se atribuiu a milagre» (). Segundo Torquato de Sousa Soares, «o rei tinha uma espécie de lepra, caracterizada pela tumefaccio de todo 0 corpos, que lhe custou a vida (""). A partir de 1221, a enfermidade deve ter-se agravado, impedindo de todo quaisquer deslocacies e tornando- porventura iacapaz de governar. ¢A importéncia de qualquer itinerério régio como ferramenta de tra- balho do historiador ¢ indiscutivel. A longa lista de locais e datas onde um soberano permanece ao longo do seu reinado, bem como a possibili- dade que tal lista por vezes da de localizar, por inferéncia, no espago € no tempo, o monarca e a sua chancelaria possibilitam a resoluc3o de inume- ros problemas, E um facto que se consegue datar com precisio; é uma fonte literdria, como por exemplo uma arénica, que se analisa & luz de dados concretos; a verificagdo da importéncia de aglomeredos popu- lacionais através dos tempos; ¢ uma achega para o estabelecmento de vias de comunicacao; ¢ enfim muito mais. Bsperemos, pois, que 0 pre- semte Itinerdrio a todos aproveite» ("). ABREVIATURAS UTILIZADAS NO «ITINERARIO» (*) Arquivo Distrital de Braga (**) Fontes Impressas a* 6 » > » B > > > 4 > >» 2 J.P. Ribeiro, Dissertagoes. » >» I L. G. Azevedo, H. P., V. > > et M. H.C. Coelho, M. Arouca, > » 2 5 M, Lusitana we > 9 3 Mestre Silvestre... > » » 7 P.M. H, Leges.. -» > » 10 Reg. Afonso I. ah > 2 2 Tarouca... Cabido de Evora. = > > 2B Tr. = Arquivo Nacional da Torre do Tombo V. MH. = Fontes Impressas no 14 (+) Alecandre Herculano, Histdria de Portugal {...], Tomo If, Bdigio de José Mattoso, p. 191 (7) Td, Ibid, nota exitica de José Mattoso, N° 1, p. 333. () Maria Teresa Campos Rodrigues, Itinerdrio de D. Fernando, p. 10. () Fortes Tmpressas n- ...... vide nas Fontes ¢ Bibliografia 0 que significa cada niimero. () Vide nas Fontes Manuscritas os respectivos arquivos, an ano| Mes |pra| — LocaLipape FONTE 1211 | Abrit 6 Coimbra TT, Alcobaga, D. R, M. I, n° 9 Junho | 30 > ‘TT, Ord, Avis, R.”Portalegre, D. 6 Julbo: > Reg. Afonso II, fl. 67 > |30] Gouveia da Beira | TT, S. Jorge de Coimbra, D. R., Tar Setembro | 28 Balsemao P.M, HL, Leges..., 1, p. 555 Dezembro | 5 Coimbra Reg. Afonso If, fl. 38 1212 | Janeiro | 27 Coimbra ‘TT, 8. Cruz Coimbra, D. R, It, ar i3. Junho 6 Guimares P.M. H, Leges..., 1, p. 352 Novembro | 11 Coimbra L.G. Azevedo, H. P,, V, p. 68, ns 2 1213 | Dezembro | 8 Coimbra LG. Azevedo, H. P, V.p. 77 > 4 > ‘TT, S. Cruz, Coimbra, D. R., 11| ne it 1214 | Janeiro | 26 Mestre Silvestre... p. 33, 278 s at D.M. P, D.R, 1, D. 25. p. 216 Margo | 30 P.M. H, Leges.., 1, p. M15 Abril 8 D.M. PD. i, D. 35, p40 Junho | 27 ‘TT, Mitra de Braga, Cx. 1,748 Novembro | “1 ‘TT, Gaveta 3, M. 4,027 * 2 D.P.H.C. L, S. Lousada, p.236 1215 | yutho 1 TT, S. Jorge de Coimbra, D. R, 16 > 10 TT, Ord. Avis, R. Portalegre, ne 67 Agosto | 24 w [err Af. IIL, L. 2, 91.23 Dezembro | “2 TT, Sé de Coimbra, M. Il, ne 38 1216 | Fevereiro | 9 M, Lusitana, TV, £1. 95 v2 Julho 5 TT, Af TIT, 3,08 1217 | Fevereiro | 28 J. P. Ribeiro, Dissertagées, U1, Abril 7 > 8 Reg. Afonso I, Maio 1 > ‘TT, Alcobaca, D. R., M.1,n2 12 > 6 > Reg. Afonso II, 8.37 ano| mes |pra| — LOCALIDADE FONTE 1217 | Maio 7 Lisboa Reg, Afonso If, £1. 37 Junho ‘Alcobaca, TT, Aleobaga, D. R., M. 1, n7 14 > Coimbra Reg, Afonso I, f1. 37 ¥ Julho > ‘TT, S. Cruz Coimbra, M. If, ne 16 > 12] Terra de Sta Maria | Reg. Afonso I, 0. 59v2 Agosto =| 1 ‘Guimaries P.M, H,, Loges..., I, ST2 > 2% > Corpus Codicum..., I, p- 369 Setembro | 6 > TT, Colegiada Guimarses, D.R., 14 > B Leomil TT, Ord. Aviz, R. Portalegre, 4 8 Outubro ‘Trancoso P.M, HL, Leges..., 1, 382 > Quintela P.M. H, Leges, 1, 310 > Coimbra PLM. HL, Lopes... 1, 459 Novembro | 6 > P.M, He, Legesiny 1, 485 > 2 > PM He bazes- 1410 > 3 > a Dezembro | 1 > > 4 Pombal > 1 Santarém > |B » . 0 > 1s |saneiro | 25 > Reg. Afonso If, 81. 60 6 > Reg. Afonso Il, fl. 6060v" a * * [rr, Mestrados, 1. 178 > a > PMH, Leges.... 1, p. 4B > 31 > Ldem, p. 355 Fevereiro | 1 > nv | Idem, p. 533 > 3 > Idem, p. 348 > 3 > Idem, p. 514 > 9 > TT, Cabido Sé Coimbra, Cx: 21, 2,41 > 2 > Reg. Afonso I, 1. 3232 vs > 6 > Reg. Afonso Il, fl. 32v" Margo 2 > TT, Gaveta 6, n* 29 » 2 > Mestre Silvestre..., p. 6, n° 144 » > ‘TT, Alcobaca, DR, M. I, a7 19 Abril B > Mestre Silvestre... p. 48, n° 107 a ano} mes |pta] — Locazipape FONTE 1218 | Abril 15 M. Lusitana, TV, £1. 99 ‘Maio Mestre Silvestre... p. 75, 0° 154 Junbo 8 TT, 8, Vicente Lx*, M.'2, no 8 « 9 Reg. Afonso 11, fl. 41 5 Reg. Afonso I, fl, 41 » Reg. Afonso I, O. 41v> Jutho 4 P.M, H, Leges.., I, p. 348 Julho 5 > ‘TT, Af. 10, L.1, 8, 101 vs > 10 > PLM. H,, Leges.. 1, p. 519 > 31 Coimbra Reg. Afonso II, 11, 45 Agosto 1 > Reg. Afonso I, fl, > 5 > ‘TT, Sé de Coimbra, M. If, a2 44 1219 | Fevereiro | 1 Lega Reg. Afonso II, £1. 62 > 9 Guimarses Mesire Silvestre... p. 88, n° 171 » 5 > D.M. PD. R, I, 4. 8, > 2B > A.D. Braga, Cronolégico, 96 Margo. 1 > D.M. P, D. R, 1, D. 120, p. 142 > 3 > Adem, a. 183, p. 226 Abril 3 > PM. H, Leges... 1, p. 464 Maio “ > V. MH 1, p. 103, 131 > a > D. M. P, D. R, 1, D. 100, p. 124 Junho 2 > A.D. Brags, Gav. P. Part,,1.°295 > 4 > Reg. Afonso II, f. 2Lv: > 7 > Reg. Afonso II, 1. &2v> > BB] Vale de Varonceli LG. Azevedo, H. P, V, p. 111 Tulho 4 Guimarses P.M. HL, Leges..., I, p 44 > 7 » 3. P. Ribeiro, Dissertagdes, TU, a2 > 3 Pontevedra- Reg. Afonso II, £1. 43 Agosto [Santiago de Compostela | P. M. H., Leges..., 1, p. 423 > ” ‘Guimarties VM. H, 1, a. 190, £135 Setembro | “9 > Reg. Af > 0 > TT, Sei > 0 > v. MH, Dezembro | 22 Coimbra Idem, D. 1220 [Janeiro | 1 Coimbra DM. P, > 1 > Reg. Afonso IE, > “ Farminhio Reg. Afonso II, Fevereiro Pinhel P.M. H, > Guarda Idem, p. ano| mas |pta] — LOCALIDADE FONTE 1220 | Margo Coimbra Mestre Silvestre. p. 991 Santarém D.P. H.C. L, Cartério da Sé, > p. 182 Abril > P.M. H., Leges... I, p. 429 Maio Coimbra TT, &. Cruz, Coimbra, M. TK, ne 3 Julho 9 > ‘M, H.C. Coelho, M, Arouca, a. 23, p. 361 Novembro | 24 TT, At. TM, L. 2, f. 62 Dezembro | 1 Guarda P. MH, Leges. p. 588 * a Coimbra TT, Gaveta XIV, 6, 20 1221 | Janeiro Santarém Reg. Afonso If, fl. 64 v2 Margo > D.P. H.C. Le, Cabido da Sé, p. 190 Abril > TT, S. Paulo de Almeziva, M. 1,25 Mato 4 > TT, Gaveta 1, M. 7, 02 15 > 8 > ‘TT, S. Paulo de Almaziva, M. 17 i Julho B > Reg. Afonso IT, 11. 65 Agosto > ‘TT, Alcobaga, D. R., M1, n° 20 Outubro > Reg. Afonso 11, 8. 44 Novembro > Geneot.; Provas, 1, p. 34 1222 | Marco Santarém ‘TT, Ord, Aviz, R. Portalegre, 95 Abril > ‘TT, Af. IIT, L. 1, 1. 8&2 Maio > J.P, Ribelro, Dissertapbes, I, m Junho > P.M. H, Leges..., 1, p. 119 Agosto. | 15 > Mestre Sitvestre..., . 39, m2 193, ‘Novembro > Reg. Afonso IT, 1. 17 45 FONTES MANUSCRITAS Braga: Arquivo Distrital de Braga Colecgio Cronolégica, Caixa 3, n.+ 96 Gavetas Propriedades Particulares, n.° 295 Lisboa: Arquivo Nacional da Torre do Tombo Chancelaria de D. Afonso II, livros 1, 2, 3 Colegiada de Guimaries, Doc. Régios, maco 1, ‘Conventos Diversos: Seiga, maco 1, n: Corporacées Religiosas (I Incorporagio): Alcobaca (Santa Maria dc), Doc. Régios maco 1, ne 9,12, 14, 15, 19, 20; Almaz (S. Paulo de), mago 1, n.* 7, 25; Braga (Mitra de) mago 1, n= 48; Coimbra (Cabido da Sé de) Doc. Régios, maco 2, n~ 38, 41, 44; Coimbra (Santa Cruz de) Doc. Rég’os, maco 2, n= 13, 14, 16, 33, 40; Coimbra (S. Jorge de) Doc. Régios, ‘maco 1, n 4 © 6, Lisboa (S. Vicente de), mago 2, n° 8, Corporagdes Religiosas (2° Incorporacio): Alcobaga (Santa Maria de), maco 8, n* 206, Gavetas: I, 7, 18; IIT, 4, 7; VI, 29; XIV, 6, 20. Leitura Nova: Livro de Mestrados. Ordem de Avis (Reparticlio de Portalegre) n+ 61, 67, 68, 95. FONTES IMPRESSAS 46 ay @ ® “ © © Azevedo (Luuls Gonzaga de), Histérja de Portugal, ed. péstuma prefaciada revista por Domingos Mauricio Gomes dos Santes, vol. V, Lisboa, Edi. ‘g5es Biblion, 1942, Azevedo (Rui Pinto de), O Livio de Chancelaria de D. Afonso TI de Por- tugal (1217-1221), Sep. do Anuarit’ de Estudios Medievates, vol. IV, Bar. celona, 1967, Brandio (Fr. Anténio), Monarquia Lusitana, 4+ parte, 34 ed, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1974 Cabido da Sé, Sumérios da Lousada, Apontamentos dos Brandées, Livro dos Bens Préprics dos Reis e Rainhas— Documentos para a Histria da Cidade de Lisboa, Lisboa. 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