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Percepgao da influéncia no contexto do poder organizacional Elaine Rabelo Neiva' Maria das Gragas Torres da Paz? Resumo Este estudo considera a distingao entre poder organizacional e influéncia pessoal, e apresenta como objetivos: 1) identificar as configuracées de poder de duas organizacées ptiblicas; 2) verificar o quanto os individuos percebem-se como usuarios dos sistemas de influéncia organizacionais e o grau em que se percebem como influenciadores da unidade em que trabalham (autopercepgao); 3) verificar o grau em que os individuos sio percebidos como influenciadores da unidade em que trabalham (heteropercepgao); e 4) estabelecer relag6es entre as varidveis anteriormente citadas'¢ as varidveis demograficas. Foram aplicadas, a 202 funciondrios de duas organizagoes, as escalas de configuracao de poder organizacional e de autopercepcao do uso dos sistemas de influéncia organizacionais ¢ uma escala de percepgio de influéncia no setor de trabalho. Os resultados retratam que as organizagdes tém configuragées semelhantes e os sujeitos consideram que exercem mais influéncia do que realmente exercem, de acordo com a percepgio dos colegas. Palavras-chave: poder organizacional; influéncia pessoal; sistemas de influéncia; auto e heteropercepgao de influéncia. "Doutora em Psicologia pela Universidade de Brasilia, Proféssorado Departamento de Psicologia Social ‘edo Trabalho da Universidade de Brasfia(ekiine@unbbr). *Doutoraem Psicologia pela Universidade de Sio Paulo. Professora da Universidade Catilica de Brasilia. Professorado Departamentode Psicologia Social edo Trabalho da Universidade de Brasilia (orrespaz@uolcom br). tor [voroues | Gueso 1 [ weveno sono [sone pon ae | 199 104 | Elaine Rebelo Newe | Maria dao Gragae Toros da Poe Influence perception and power in organizations ‘There isa lack of clarity on the definitions of power and personal influence. The study here described had the following aims: 1) identify the power configurations in two organizations, in the public-sector; 2) verify the extent in which individuals perceive themselves (self ratings) as users of organizational systems of influence; 3) investigate the degree in which individuals perceive themselves as influential in their workplace; 4) evaluate the degree in which individuals are perceived by others (colleagues ratings) as influential in their workplace; establish relationships between self and colleagues- perceptions of influence and power configurations and demographic variables. For that purpose, a self-perception scale was used in order to measure the usage of organizational systems of influence (constructed and validated). All scales were applied in 202 employees of two small Brazilian organizations, in the public sector. Results were analyzed focused on the relevance of this study for power and influence theories in organizations. Key-words: organizational power; personal influence; organiza tional systems of influence; perceived influence. tor [vous [Noveno 1] aneno sone [sons] prone Prcepgie de infunola no contexte do poder orgaizaclonal 1. Introdugéo O ambiente organizacional é extremamente dinamico. Qualquer observador atento pode perceber o movimento das pessoas e dos grupos em diregao a realizagao de seus interesses € interesses da organizacao. Esse movimento afeta diretamente os resultados dos membros e da organizac&o, além de construir uma “ordem social” organizacional. Nesse sentido, cabe perguntar: O que realmente orienta o movimento dessas pessoas? Uma das varidveis explicativas dessa dinamica € o poder. Foucault (1979) preconiza que o poder somente pode ser concebido no exercicio, ou seja, no movimento. Thibaute Kelley (1959 apud Paz, 1992) e Mintzberg (1983) fornecem um conceito de poder baseado na capacidade de afetar resultados das pessoas e da organizacéo, 0 que implica movimento. Diferentemente desses autores, outros retratam um poder estatico, caracterizado apenas pela dependéncia de recursos (Bachrach & Lawler, 1998; Abdalla, 1987; Dahl, 1957). Em virtude dos enfoques serem divergentes, é importante investigar empiricamente se todos percebem o poder que exercem e o poder que é exercido pelos outros, verificando em que medida essa percep¢io relaciona-se com a dinamica organizacional. Muitos autores tratam o tema poder como atributo pessoal — capacidade, em Hobbes (1651/1988). Outros o tratam como movimento que perpassa as redes sociais capilarizadas (Foucault, 1979). Mintzberg (1983) preocupa-se com a anilise do fenémeno no ambiente organizacional. Sua definigao é ampla, mas nao se reduz a comportamento, como a capacidade de A afetar B (Luke, 1980). Por retratar varios componentes do poder nas organizagées (coalizées, sistemas de influéncia, bases de poder etc.), Mintzberg foi escolhido como findamentacéo primeira deste trabalho. Influéncia e poder para © autor sio sinénimos, embora, na literatura de psicologia, influéncia seja tratada como atributo pessoal (Raven, 1993). Ha ainda limitagdes metodolégicas, confusées teéricas e uma visio pejorativa do termo. O estudo empirico do fendmeno ainda apresenta poucas pesquisas. Inclusive, Pagés, Bonetti, Gaulesiac e Descendre (1987) salientam a dificuldade de acesso As organizagées para investigar tais questées. Além disso, o poder veer [vorowes[rovero 1] weno aura [ zones ee | 10s 100 | lame Fabelo Nowa | Ms do Gragas Torres da Paz envolve diferentes niveis de investigacéo, que vao desde uma relagéo diddica até uma estrutura das relagées de poder na organizago e fora dela. No nivel pessoal, como ressalta Chacon (1979), os conceitos de poder e influéncia tém uso intercambiavel em alguns casos eem outros nao. Parece sensato admitir que as pessoas tém alguma percepgao do exercicio do poder, tanto que participam dos jogos de poder nas organizagées. Entao, quais so os fatores envolvidos nessa percepgao? Seriam fatores contextuais, pessoais ou ambos? Uma teoria que aborda essas questées é a teoria do Poder Organizacional de Mintzberg (1983), que contempla varias dimensdes do poder, articulando os niveis individual e coletivo, interno e externo, intra e intergrupos. A teoria parte da premissa de que © comportamento organizacional é um jogo de poder, no qual varios influenciadores procuram controlar as ag6es organizacionais mediante 0 uso dos sistemas de influéncia. A teoria aborda o poder como algo que se manifesta nas decisGes € ag6es organizacionais, definindo-o como capacidade de afetar os resultados da organizacao. A dinamica do poder ocorre em fungao das interag6es entre as coalizées interna e externa e o sistema de metas da organizacao, o que da origem A configuragao de poder organizacional. Na coalizio externa, estariam os membros de fora da organizagao, que exercem o poder de trés formas: dominadora, controlando as regras do jogo nas decisées organizacionais; passiva, submetendo-se a coalizdo interna; ou de forma dividida, provocando conflitos na coaliz4o interna. A coaliz4o interna é constituida pelos membros que vive o dia-a-dia da organizag’o ¢ a cla esto diretamente vinculados, usando os sistemas de influéncia organizacionais: ideolégico, de especialistas, politico e de autoridade. O sistema de autoridade mantém unidade de esforgos dentro da organizagao. A autoridade é o poder refletido em Pposigdes formais na organizacao e, por isso, constitui poder legitimo, formal, que pode ser delegado, e divide os membros da organizagao em “subordinados” e “superiores”. No sistema de autoridade, ha utilizagao de dois sistemas de controle de comportamento ~ pessoal e burocratico —, por meio dos quais ha delegacio de autoridade e subordinagao, além da construgao de regras e manuten¢do da disciplina e ordem. ror | vowuve 6 | Ndseao 1] JaneiRo - suno | 2005] p.103-128 Infancia na contenta do pede O sistema de ideologia tem natureza viva, uma vez que a ideologia tem carater informal, constr6i uma unidade de compor- tamento e constitui um sistema de crengas sobre a organizacao, partilhado por seus membros. Tal sistema age via um conjunto de idéias “plantadas” na organizacao, a partir da missio defendida pelo fundador. Essa ideologia é desenvolvida por meio de tradi- Ges e hist6rias organizacionais, reforcada por identificagdes de seus membros, selecionada por recompensas ¢ premiagées ou evocada, no caso de envolvimento calculativo com a organizagio. O sistema de especialistas provoca diferenciagaéo de poder na organizacao. O profissional é aquele que exerce o poder na organizacao, por meio da detengéo de um conhecimento, e € capaz de executar um trabalho complexo, especializado. As fun- Ges criticas sio aquelas que podem interromper o fluxo de tra- balho da organizagio, carrear maiores percentuais do orgamen- to e que tém habilidade de introduzir mudangas significativas. As fungées criticas constituem instancias em que os profissio- nais aplicam sua especializagao. Por dltimo, o sistema politico é informal, ilegitimo e toma corpo nas situagées de fraqueza dos outros sistemas. Nesse siste- ma, ha distorgées dos objetivos organizacionais, press6es grupais, uso de acesso politico para influenciar, inversao de meios e fins organizacionais e uso do poder legitimo de maneira ilegitima. Os jogos de poder sao mecanismos de exercicio do poder para atingir objetivos pessoais e reordenar objetivos organizacionais. Da combinacao desses fatores, surgem seis configuragées de poder organizacional, descritas a seguir. 1. Instrumento: As organizagées com esse tipo de configuracao servem de instrumento para 0 alcance dos objetivos estabele- cidos por um individuo ou um grupo, que é influenciador dominante ¢ esta fora da organizagao. O sistema de autorida- de, baseado no controle burocratico, predomina nessa confi- guragao. 2. Sistema fechado, sistema auténomo: A coalizéo interna é forte, com sistema de metas claramente operacionalizado, e nenhuma meta é imposta de fora. A dinamica do poder war | vo.uMe 5 | NERO 1] JANEIRO. sunHo | 2006 [p.103-128 107 108 | Abele Nowe | Man loa Gragsa Torres dt Paz € mais horizontalizada, pois se jogam todos os tipos de jogos. O sistema de influéncia mais presente nesse tipo de organizacéo € o de autoridade, baseado no controle burocratico.O sistema de autoridade funciona de forma diluida entre os varios CEOs. Os técnicos e especialistas so considerados no processo de tomada de deciséo, que nao é€ centralizado. 3. Autocracia: O poder concentra-se no mais alto chefe da organizacio. O sistema de autoridade baseado no controle pessoal € o mais presente. 4, | Missiondria: O grande influenciador é a ideologia que favorece uma forte identificagdo de seus membros. A ideo- logia constitui a prépria misséo da organizacéo. O principal sistema de influéncia é o sistema de ideologia, que con- templa forte prestacdo de servicos 4 comunidade. 5. Meritocracia: Os especialistas dominam o sistema, mediante o dominio do conhecimento. A ideologia profissional é forte o sistema de especialistas é preponderante. 6. Arena politica: Essa configuragio é tipica de uma organi- zacéo em crise, podendo ser caracteristica de uma fase de mudanga, no estagio de desenvolvimento das organizagées. ‘Os jogos politicos e os conflitos séo constantes. O sistema politico encontra-se mais presente. Mintzberg (1983) considera que todas as configuragées se encontram presentes na organiza¢do, embora apenas uma delas seja a mais caracteristica. O autor apresenta a possibilidade de existirem configuragées hibridas, em que duas delas aparecem como preponderantes. O corpo teérico apresentado por Mintzberg (1983) encon- tra respaldo empirico nos trabalhos de Paz (1997). A autora reali- zou diversas pesquisas em organizagées publicas e privadas, com o objetivo de construir e validar uma escala de configuragdes de po- der organizacional. Na primeira validacio, foram encontradas cinco soot [verona [woneno | en -somio [eos] probes Percopyée de infusncia no conteate SF oxgankzaconst configuragées de poder distintas, que so: meritocratica, missiondria, sistema fechado, autocratica e instrumento partidario. A partir dos resultados da anilise fatorial para validagao da escala, foi concebida a configuragao instrumento partidario, que parece aglutinar as configuragées arena politica e instrumento. Essa nova interpretagao dos dados pressupée que tal configuragao tem como caracteristica servir de instrumento aos interesses dos partidos politicos, Numa segunda validacao, as configuragées pro- postas por Mintzberg (1983) aparecem distintas, entretanto, esse trabalho usou a primeira verséo da escala. Como dito, o estudo do poder nas organizagées pode abran- ger varios nfveis (entre individuos, inter e intragrupos etc.). Esses niveis do fendmeno do poder, certamente, sao interdependentes no ambiente organizacional, nao s4o exercidos de forma isolada. No entanto, alguns autores, por limitag6es conceituais ou metodolégicas, optam por andlises pontuais ou diddicas que, muuitas vezes, desconsideram fatores contextuais ou estruturais do poder. A influéncia pode ser entendida, portanto, tanto como componente do fenédmeno do poder organizacional, como no caso de Mintzberg (1983), quanto ser vista de maneira pontual, as vezes limitada, como nos estudos sobre poder social e influén- cia social. Mintzberg (1983) ndo diferencia poder de influéncia', ¢ apresenta a influéncia num quadro mais amplo: 0 da capacida- de de afetar os resultados da organizagao. Para Mintzberg (1983), a participagao na dinamica do po- der organizacional pode ocorrer de trés maneiras: lealdade, saida e voz. A lealdade consiste em ficar e contribuir, conforme o que é esperado, a saida consiste em abandonar o sistema € a voz € a opcao por ser influenciador e usar os sistemas de influéncia, a par- tir dos requisitos para exercicio do poder, ou seja, as bases de po- der organizacional ¢ os recursos pessoais. As bases de poder sao 0 controle sobre recursos, sobre habilidades técnicas e conhecimen- tos criticos para a organizagao, as prerrogativas legais para impor escolhas € acesso a quem tem as outras bases. Os recursos pessoais sao atratividade pessoal, vontade, habilidades politicas etc. A outra tradigdo de estudo da influéncia pessoal teve sua origem na psicologia social. Esses estudos nem sempre estive- 'Sobreandlises diidicas do poder ver Shetty (1978 apud Abdalla, 1987}c Friedkin (1993) ror [vouuwe 8 [wowero 1 aene -sowno | aan arenas | 105 Elsina Robelo Neiea | Maria dos Grages Toros da Paz ram ligados ao contexto organizacional, e seu inicio deu-se nos _ trabalhos que consideram os grupos (familiares, de amizade ou de trabalho) os principais meios em que o fendmeno ocorre, contemplando anilises que envolvem relacées diddicas. Embora os estudos sobre influéncia pessoa! tenham se inicia- do sem considerar o contexto organizacional, algumas pesquisas j4 enfatizam as interacg6es nesse contexto, considerando situagdes de tomada de decisao ¢ contratos da rede de interagao no trabalho. Ao investigar os fatores determinantes da influéncia, considerando situagdes de tomada de decisio durante a resolugdo de um problema organizacional, Friedkin (1993) analisou a influéncia pessoal, por meio da estrutura da rede de comunicagio no trabalho. A influéncia interpessoal, segundo esse autor, tem dois componentes principais: visibilidade interpessoal e relevancia, ou seja, para que A influencie B, é preciso que B conhega e valorize as opinides de A. Outros estudos optam por examinar as varidveis individuais ¢ as varidveis contingenciais no estudo do poder pessoal, verifi- cando quais s4o os preditores desse poder. Shetty (1978 apud Abdalla, 1987) desenvolveu um modelo que determina a efetividade da aquisigéo de poder e de seu uso € obteve duas conclusées: a) gerentes com sucesso tém consciéncia de varias fontes de poder no local de trabalho; b) a autoconfianga tem sido apontada como um dos fatores presentes em pessoas que alcancam posigées de poder. Enfim, o estude do poder tem esbarrado em caracteristicas pessoais ¢ na comparagio da percepgao pessoal com a percepgao do outro. Estudar o poder percebido indica em que medida o poder exercido é percebido por terceiros. Uma comparagao entre a per- cepgao pessoal da influéncia (autopercepgio de influéncia) ¢ a per- cepgao do outro sobre a influéncia exercida pode fornecer subsidios sobre como o fenémeno é€ percebido pelo individuo e por outros e indicar as caracteristicas daqueles que s4o ou nao percebidos como poderosos. Imai (1993; 1989) tem pesquisado a relagéio entre 0 po- der percebido socialmente e a percepgao de ser influenciado, abor- dando, dessa forma, a questao da “visibilidade” e do consentimento das ages de exercicio do poder. Esse autor destaca trés categorias interdependentes de fatores que englobam a influéncia social com- preendida como mudanga de atitudes ou comportamentos de ou- wor | voume § [Ndmeno1 | Janeiao - sumo | 2005 p.103-128 Percepcho de ifluéncie no contesta do poder organicactnal tras pessoas. Esses fatores seriam o contetido da influéncia exercida, as estratégias de influéncia ¢ os atributos do agente influenciador. O autor também se preocupa com determinantes da per- cepcao de poder como motivagao para o poder, aceitagiio e satisfa- ¢ao com as relagdes de poder. Segundo suas investigacdes, os influenciadores usualmente obtém sucesso em suas demandas e tém persuasao eficaz, quando os influenciados aceitam seu poder social. A motivagéo para 0 poder, definida como a “preferéncia recorrente ou predisposigao para experiéncias de se sentir forte e ter impacto sobre outros” (Imai, 1993:691), também tem sido po- sitivamente associada com a percepcio de influéncia. Os motiva- dos para o poder véem mais prontamente as relaces interpessoais na perspectiva da influéncia social, pois os mais motivados fazem- se mais visiveis de varias maneiras, arriscam-se para obter visibili- dade, demonstram mais prontiddo para responder ao estresse grupal e avaliam seus seguidores positivamente. A comparagao entre a percep¢ao do individuo e a percepgao do outro constituiu a mola mestra deste estudo, numa tentativa de investigar como as percep¢ées particulares contribuem para a cons- trugéo da percepcio geral sobre o poder organizacional. Além dis- so, ela constituiu o motor para compreens4o de como a influéncia pessoal distingue-se e processa-se no Ambito do poder organizacional. 1.1 Descrigaéo das variaveis do estudo Como desenvolvimento pratico desta e de outras abordagens, este estudo pretende estudar a influéncia pessoal sob a perspectiva de uma abordagem sistémica, em que esse fendmeno compée o qua- dro do poder organizacional, Dessa forma, tem varios determinantes. Sua fundamentagao teérica parte de alguns pressupostos tedricos da Teoria do Poder Organizacional de Mintzberg (1983), a que acres- centa alguns construtos, como auto e heteropercepgao de influén- cia, procurando determinar alguns preditores desses fenémenos. Como variaveis independentes da pesquisa, est&o as cinco configuragGes de poder (autocracia, missiondria, meritocracia, sis- tema fechado e instrumento partidario), as varidveis demogréficas, que se dividem em biograficas (idade ¢ escolaridade) ¢ funcionais (tempo de servic¢o, cargo de chefia e instituig4o pesquisada). vwpor | vouume 5 | ncameo + fF sawerno sumo | 2008]p.103-128 Jn na Elaine Rebelo Net | Mara dn Grogs Tres Pet A categoria de varidveis dependentes inclui a auto e a heteropercep¢ao'de influéncia. A autopercepgao de influéncia diz respeito a percepcao que o sujeito tem da influéncia exercida por si préprio na organizagao. A autopercepcao de influéncia, neste estu- do, é abordada de duas maneiras: a) a partir da percepgio do sujeito sobre o uso dos sistemas de influéncia, ou seja, essa varidvel concebe aautopercepgéo do ponto de vista da caracterizagio do modo como ela opera, sobre como ela se manifesta por meio dos sistemas de influéncia, como os funciondrios percebem sua forga como usudrios dos sistemas de influéncia; e b) a partir da percepgao do grau de influéncia exercido pelo individuo na unidade da organizagio em que trabalha. E importante ressaltar que, por opgdo metodolégica, a primeira variavel atinge o Ambito da organizagao, enquanto a segunda restringe-se ao setor de trabalho do sujeito. A heteropercepgao refere-se 4 percepgao do outro sobre a influéncia exercida por determinado sujeito, membro da or- ganizacdo. A heteropercepgio, também por opgao metodolégica, foi avaliada no 4mbito do setor ou da unidade em que o indivi- duo esta inserido. A partir da investigacao de duas organizacées puiblicas, a pes- quisa em questo tem como objetivos: a) identificar as configura- goes de poder; b) verificar 0 quanto os individuos percebem-se como usudrios dos sistemas de influéncia organizacionais; c) verifi- car o grau em que os individuos se perceberm como influenciadores da unidade em que trabalham; d) verificar o grau em que os indi- viduos s4o percebidos pelos outros como influenciadores da uni- dade em que trabalham; ¢ e) estabelecer relagées entre as varidveis mencionadas nos itens a, b, c, d e as variaveis demograficas. 2. Método 2.1 Amostra Participaram deste estudo 61 (72%) funcionarios da organizagao A e 141 (17,5%) funciondrios da organizacao B, totalizando 202 sujeitos, que estavam nas organizagées h4 mais woos [vou 6 [nonena | “anno ano [ss] posse i | E i : Percepgto de infuincla no contexte de poder orgarizecione, de seis meses. A amostra foi estratificada quanto as unidades organizacionais de ambas as organizacoes. 2.2 Caracterizagao das organizagdes estudadas A organizacao B foi criada por meio de norma legal, com a finalidade de cuidar da manutengio predial e gerenciar a area de uma instituigéo de ensino. A organizagdo conta com 805 funciondrios, que se dividem em contratados por empresas de servigos terceirizados e concursados. Dentre As responsabilidades que competem a organizacao, listam-se reunides periddicas com a administrac4o superior da instituicdo, para informar as atividades desenvolvidas e prestar contas peculiares a tais atividades. Aorganizacao A tem carater de entidade de classe e compée © grupo de organizacées do servigo pdblico, sendo dotada de personalidade juridica e forma federativa, apesar de nao manter vinculo funcional ou hierarquico com os érg4os da administragdo © publica. A organizacio tem por fim promover, com exclusividade, arepresentacao, a defesa, a selegao ea disciplina dos profissionais da 4rea em todo o Brasil. A organizagdo conta com 65 empregados e¢ cinco conselheiros, dos quais faz parte seu presidente. E entidade de classe. 2.3 Instrumentos Os instrumentos da pesquisa foram: a escala de configuracgao de poder organizacional (40 itens) e os dois instrumentos de autopercepgao de influéncia: a escala de autopercepgao dos sistemas de influéncia e o questiondrio de percepcao da influéncia no setor de trabalho. Os dados de validagéo de todos os instrumentos s4o relatados por Neiva (1999). A escala de configuragdes de poder organizacional foi validada por Paz (1997) e tem 40 itens, cinco fatores com alfa acima de 0,80, cargas fatoriais acima de 0,30. O instrumento de autopercepcio do uso dos sistemas de influéncia tem 40 itens, quatro fatores com alfa acima de 0,70 e cargas fatoriais acima de 0,30. Os itens abordam o grau em que os sujeitos se percebem ear | votume § | wumeno 1] Janeiro. sunto | 2005 103.128 Jus 114] des Grogan Toros da Pat Ehaine Rateto Nove | Me participantes do jogo do poder e usuarios dos sistemas de influéncia {Neiva, 1999). O questionario de. autopercep¢ao do grau de influéncia no setor de trabalho consistiu em uma avaliagao que © sujeito fez de si ¢ dos demais colegas de setor sobre o grau de influéncia de cada um (Neiva, 1999). Os respondentes atribuiram nota de 0 a 4, para o grau de influéncia do colega no setor em que ele trabalhava e na organizagao. 2.4 Procedimento de andlise dos dados Foram feitas andlises estatisticas descritivas para as configuraces de poder e autopercepgao do uso dos sistemas de influéncia, para os dados de auto e heterepercepcao do grau de influéncia na unidade de trabalho e para os dados demograficos. Os escores da heteropercepgio para cada sujeito foram calculadosa partir da média dos valores atribuidos a ele pelos demais colegas de setor. Para verificar o grau de predigao das varidveis e do modelo, realizaram-se andlises de regressdo multipla - método stepwise. Os componentes da autopercep¢ao do uso dos sistemas de influéncia tiveram como varidveis independentes na regressao varidveis demograficas (cargo de chefia, escolaridade, idade, tempo de servico e instituigao pesquisada), as configuragées de poder, a auto e a heteropercepgao do grau de influéncia no setor de trabalho. Para as varidveis dependentes auto e heteropercepedo de influéncia, estabeleceram-se como variaveis independentes da regresséo miultipla as variaveis demograficas, as configuragées de poder e os componentes da autopercepcao do uso dos sistemas de influéncia. Finalmente, com o objetivo de comparar as médias dos fatores entre os diferentes grupos da amostra, foram realizadas analises das variancias, considerando-se, como varidveis independentes, a instituigio pesquisada (organizagao A ou organizagdo B) e o cargo de chefia (sim ou nao) e, como varidveis dependentes, as configuragées de poder, a autopercepgao do uso dos sistemas de influéncia e a auto e heteropercepgio do grau de influéncia no setor de trabalho. wot [roues [niuero va “soe | sas] pee | reuse mnt pee ein 3. Resultados 3.1 Configuragées de poder preponderantes As anilises estatisticas descritivas foram realizadas para verificar quais configuragées de poder e componentes da autopercepgao do’ uso dos sistemas de influéncia apresentavam mais forga nas organizagées estudadas. A Tabela 1 mostra que a organizacio B apresentou maior média para a configuragéo missionaria, entretanto, as médias das configuracées autocracia, meritocracia e sistema fechado ficaram acima do ponto médio da escala (2 numa escala de 0 a 4), principalmente a média para autocracia, que ficou préxima da maior média. Segundo os resultados da anilise de variancia e do teste Tukey, nao houve diferenga estatfstica significativa entre as médias das trés configuragdes preponderantes na organizacao B. Assim sendo, a configuragdéo mais presente na organizagio B é a missiondria, seguida pela autocracia e meritocracia. ‘Tabela 1: Médias desvios-padrao para as configuracées de poder na organizacao B ‘Sistema fechado 137 | Q.183¢ | 0,7676 Mistonar 138 | 24644 70,0812 Meritocracia 188 | 23518 | 0,616 Instrumentopartidario | 138 | 41,7119 | 0.8310 Na organizagéo A, a maior média apresentada foi para a configuracao autocracia, seguida pelas configuragées missionaria e sistema fechado. Também na organizacao A, houve proximidade nas trés maiores médias, todas acima do ponto médio da escala, conforme mostra a Tabela 2. Segundo os resultados da anilise de variancia e do teste Tukey, nao houve diferenga estatistica significativa entre as médias das trés configuragées preponderantes na organizacao A. A organizacao A apresenta a ror [vouune s [wcnenov[ aveno aunwo | as pronas ns ue | uit te | Mata die Gi Toe Pc configuracéo autocracia, seguida por missionaria e sistema fechado. As duas organizagées diferem apenas quanto 4 tercetra configuragéo preponderante, sendo que as configuragoes autocracia ¢ missiondria sio comuns, o que retrata semelhanca entre as organizagées. “Tabela 2: Médias e desvios-padréo para as configuragbes de poder na organizagio A. ia | OK “Autocracia 54 4 ‘Sistema fechado: 54 2.1652 0,6741 ‘Missionéria Bt 23215, 0,7509 ‘Meritocracia Bd 15410 0,7015 Instrumentopariidario | 54 | 11160 | 0.7335 3.2 Autopercepgao do uso dos sistemas de influéncia preponderantes A maior média para os componentes do instrumento de autopercep¢io do uso dos sistemas de influéncia, considerando-seo grupo da organizagio B, foi para o sistema de especialistas, seguida do sistema. ideolégico. As médias, exceto para o sistema de especialistas, ficaram abaixo do ponto médio da escala (2 numa escala de 0 a 4), Esses dados so mostrados na Tabela 3. Segundo os resultados da andlise de variancia edo teste Turkey, nao houve diferenga estatistica significativa entre as médias de autopercep¢io do uso dos sistemas ideologico ede especalistas, havendo diferencas entre elas e as médias dos demais componentes. “Tabela 3: Médias ¢ desvios-padrio para a autopercepgio do uso dos sistemas de influéncia na organizagio B Média. 14319 “Aulopercepgio do usodo sstemadenutoridade| 140 0.9264 Aulopercepgiodo uso do sistema de especialista| 20719 | 0.7433 ‘Autopercepgio do uso dosistenta ideolbgico 19083 | 08266 14009 | 0,754 “Autopercepgio do uso de sistema politico ; wror [vouuMe 5 [iweno +] santa - suno T 2006] ».103-128 Porcopsio da Hla no oontexto do poder Na organizacao A, todas as médias de autopercepgao do uso dos sistemas de influéncia situaram-se abaixo do ponto médio da escala. Dentre elas, a maior foi a do componente sistema ideolégico. A menor média e 0 menor desvio-padrao foram apresentados pelo sistema politico, de acordo com os dados da Tabela 4, o que denota que a grande maioria dos respondentes, de maneira homogénea, percebe que faz pouco uso do sistema politico, Houve diferenga estatistica significativa, segundo os resultados do teste Tukey, entre a média da autopercep¢ao do uso do sistema ideoldgico e as médias dos demais componentes. Enfim, os individuos da organizagio B percebem que fazem mais uso dos sistemas ideoldgico e de especialistas, enquanto os individuos da organizacao A fazem mais uso do sistema de ideologia, o que novamente retrata semelhanca no processo vivido pelas duas organizacées. Tabela 4: Médias e desvios-padrao para a autopercepgio do uso dos sistemas deinfluéncia na organizacio A “Aulopercepgio do usodo sistema deautoridade! Autopercepgiodo uso dosistema de especialista | 53 0,7915 Autopercepgio do uso do sistema ideoligica 0.8126 Autopercepgio do uso do sistema politico 3.3 Auto e heteropercepgao do grau de influéncia na unidade de trabalho As médias das varidveis auto e heteropercepgao do grau em que 0 sujeito influencia os resultados e as decisées do setor sao apresentadas na Tabela 5. De maneira geral, as médias situaram-se acima do ponto médio da escala. Os sujeitos do grupo da organizacao B percebem-se mais influentes do que os da organizacdo A. As médias para autopercepg’o foram mais altas do que as médias para heteropercepgao, considerando-se a amostra € seus grupos por institui¢ao. Pelos resultados da andlise teat [vounaés [noweno | vaveno sone | Sms a6 v7 Elaine Rabelo Neiva | Morin das Gragat Torres da Paz de varianda, houve diferenca estatistica significativa entre as médias da auto e da heteropercepgao do grau de influéncia no setor para a amostra e para os grupos da organizagao B. Os dados acima indicam que os individuos se percebem muito mais influentes em comparagao com as informacées fornecidas por seus colegas de trabalho. ‘Tabela 5: Auto e heteropercepgao do grau de influéncia no setor para os grupos da Organizagio B, organizaco e para a amostra 2.60] Heteropercepgio| 138 | 50 234 248} 257 240! 236 3.4 Analises da Variancia ‘As andlises da variancia foram usadas para identificar as diferencas e semelhangas dos grupos que comp6em a amostra. a) | Comparacées entre as instituicdes As duas instituigdes, quando comparadas, apresentam diferencas quanto as configuragées instrumento partidario, meritocracia e a autopercep¢ao do uso do sistema politico. A percepgo dos sujeitos da organizacao B, para as trés varidveis citadas, € mais forte. Os funciondrios da organizagio B também mostram tendéncia maior ase perceberem como influentes por meio do sistema de especialistas, enquanto os membros da organizacao A tém tendéncia maior a se perceberem como usuarios do sistema de autoridade. b) Comparagao entre os grupos que tém ou no cargo de chefia Quanto aos grupos da varidvel cargo de chefia (sujeitos que tém ou nao cargo de chefia), os chefes, nas duas instituigdes, percebem mais acentuadamente a organizagao tor [votuwes [nGnero 1 | weno sane | aus] preoses Peroopgi da infltneia no conterta do poder erganizaconat como um sistema fechado, além de se perceberem mais influentes por meio do uso dos sistemas de autoridade e ideologico. Os chefes também sao percebidos e se percebem como mais influentes dentro da unidade em que trabalham. Os chefes da organizacao A apenas se percebem mais como usuarios do sistema de autoridade do que seus subordinados. Ja na organizagao B, os que exercem cargo de chefia também percebem mais acentuadamente a organizagao como um sistema fechado, além de se perceberem mais influentes, pelo uso dos sistemas de autoridade e ideoldégico. 3.5 Regressao linear multipla (método stepwise) Aautopercepgao do grau de influéncia na unidade de trabalho esteve presente como preditora de quatro variaveis: autopercepgao do uso dos sistemas de autoridade, de especialistas e ideolégico e da heteropercepgao do grau de influéncia no setor de trabalho. A autopercepcio do grau de influéncia na unidade de trabalho foi, portanto, a preditora mais forte apresentada pelos resultados da andlise da regressao multipla. A configuragao instrumento partidario ea existéncia do cargo de chefia apresentaram-se como as segundas melhores preditoras das varidveis dependentes desta pesquisa. O cargo de chefia foi preditor das varidveis autopercepgao do grau de influéncia no setor, da heteropercepgao do grau de influéncia no setor e da autopercepgao do uso do sistema de autoridade. A configuragéo instrumento partidario foi preditora das variaveis autopercepcio do uso do sistema ideolégico, do sistema de autoridade e do sistema politico. Vale ressaltar ainda que as configuragées meritocracia e sistema fechado apareceram como preditoras de duas varidveis. A meritocracia foi preditora da autopercepc&o do uso dos sistemas de especialistas e de autoridade. O sistema fechado apareceu como preditor das variaveis autopercepcao do uso dos sistemas de autoridade e de ideologia. Esses dados sao apresentados pela Tabela 6. veer [vou « [paveno 1] eno awe | aos prs | Elaine Rabelo Nabe | Meta dae Grapno Toros de Pat ‘Tabela 6: Preditores da auto eda heteropercepeio do grau de influéncia no setor = Heteropercepcio do grau de infludncia no setor Bscolaridade Cargo de chefia Autopercepgio do grau de influencia no setor Meritocracia| 70 Cargo de chefia Instrumento partidério Autopercepgio do grau de influencia O26 9s 0.006 Instrumenta partidétio Instromenta partdario Ons a500 "0.000 “Tempode servigo 0361 aad gs p< 0005 4. Discussao Organizacdo B A configuragao de poder preponderante na organizacao ib é a missiondria, entretanto, as configuragdes autocracia € meritocracia (nessa seqiiéncia) aparecem igualmente fortes, uma vez que nao houve diferengas entre essas médias. Essa presenga de duas ou mais configuracgdes preponderantes pode ser explicada pelo processo de desenvolvimento da organizagao. Aorganizago B parece se encontrar em um processo de mudanga organizacional, em que a configuracdo autocracia cede espago para a configuragao misstondria. Tal hip6tese é corroborada por relatos de sujeitos (bilhetes deixados no verso dos instrumentos de coleta de dados), que mencionam o autoritarismo das gestdes evar | voume s [NERO 1 | saneino - susHo | 2005 | p.102-128 Percepabo da inflianc no contexte do poder ergenzactonal anteriores na organizacdo B ¢ a introdug&o de uma missao mais voltada para a prestagao de servicos 4 comunidade. Aconfiguragao missionaria, nessa organizac4o, parece indicar movimento recente de implantagao de uma missio voltada para a prestagao de servigos 4 comunidade, fazendo com que a ideologia passe a configurar um forte influenciador. A organizagio B, de acordo com o relato dos funciondrios e com a presenca da configurag4o autocracia nos resultados das médias e desvios-padrao dessa organizacéo, parece ter funcionado sob a égide de uma autocracia dos individuos que a administraram em épocas anteriores. Outro dado importante nas duas organizagées refere-se 2 presenga de quatro médias muito préximas. Esse dado pode ser interpretado como a presenga de instabilidade na organizagao, uma vez que a proximidade das médias das configuragées pode ser indicativa de uma configuragao arena politica, conforme os achados de Martins (1998). Nos resultados da anilise fatorial (Paz, 1997), a configuracio instrumento partiddrio aglutinou as configuragées arena politica ¢ instrumento. Entretanto, o aspecto de instabilidade que compée a configuragao arena politica pode nao ser claramente caracterizado pelos itens da escala que compéem a configuracéo instrumento partidario. Assim sendo, a presenga de duas ou mais médias para configuragées que apresentem for¢a similar em uma mesma organizagdo pode indicar instabilidade nela. Essa instabilidade da arena politica pode assumir varios graus, num processo de introdugao de mudangas na organizagao. Ouitra possibilidade de explicagio das médias proximase sem diferenga estatistica est4 na presenga de configuracées hibridas, em que dois ou mais sistemas de influéncia se caracterizam igualmente como preponderantes na coalizo interna. Essa possibilidade é pouco explorada, mas é mencionada por Mintzberg (1983). Os sistemas de influéncia percebidos como aqueles de que os sujeitos da organizagao B mais fazem uso, em parte, nao constituem totalmente os que a teoria indica como presentes na configuragao preponderante na organizacéo. Os funcionarios da organizac¢ao B percebem-se mais como usuarios do sistema de especialistas e do sistema ideolégico. Os sistemas que determinam as configuragées preponderantes seriam os sistemas ideolégico, de autoridade e de especialistas. wear |vouowes | wincro | amo. suo [ens pases Jia Eline Rebelo Neiva {Marin can Gragne Torrey da Paz O uso do sistema de ideologia ¢ do sistema de especialista parece estar bem presente na percepcao dos individuos. Os mem- bros da organizagao B, por exemplo, séo pequenos especialistas nas atividades que exercem: marceneiros, carpinteiros, jardineiros, vigias, pintores etc. ¢ so lotados em unidades especificas para cada atividade especializada. Quando ha problemas na estrutura fisica de algum prédio ao qual prestam servigo, eles sio chamados para estabelecer solugées para o problema, dentro de suas especialidades. De fato, os empregados da organizacao B so usuarios do sistema de especialistas e percebem-se como tal. Nesse caso, eles sao valorizados pelo gestor da organizacio e tém direito a voz, no que se refere a tarefa que executam. Além disso, os funciondrios da organizagéo B parecem também sedimentar o processo de transmissao das crengas e da ideologia do servigo na organizagao. Organizacgao A Aorganizagao A apresenta trés configuragées preponderantes, sendo que a média mais alta foi da configuracao autocracia, seguida pelas configuragées missionaria e sistema fechado. As duas instituigdes estudadas nesta pesquisa parecem viver um processo semelhante, em que aparecem como fortes influenciadores a ideologia ¢ 0 controle pessoal. No caso da organizacio A, a configuracao preponderante € a autocracia, seguida pela missiondria ¢ pelo sistema fechado. As trés configuragdes apresentam-se igualmente fortes, pois nao houve diferenga estatisticamente significativa de média. Apesar de essa organizagao ter tempo de existéncia maior, o ciclo da ideologia preconizado por Mintzberg (1983) ainda est4 em processo de introdugdo. Mintzberg (1983) afirma que as crengas sao introduzidas na organizacao por seus fundadores e, com 0 tempo, os membros da organizacao disseminam a ideologia, que adquire forga de influéncia maior no ambito da coalizdo interna. Como se trata de uma organizagao pequena (65 funciondrios), a configuragao autocracia parece inevitavel, pois essa configuracao € caracteristica de organizag6es pequenas. Além disso, o fato de os empregados da organizagéo A apresentarem percepgao muito restrita do uso do sistema politico parece peor | vouuncs [hUeno 1] JaneiRo - sunHo | 2008] p.10s. Pereepgte da inlutnca no contexte do poder orgenizacional reforcar os dados que apontam a forca da autocracia nessa organizacéo. O aspecto da ideologia da prestacgao de servigos para associados da organizagao A esté presente como instrumento de influéncia organizacional e pode estar se cristalizando, & medida que a organizacio se desenvolve. A organizacao, por forga de estatuto, foi criada para regulamentar uma profissao no Pais, ser uma organizacdo do servigo piiblico e prestar servigos juridicos para a populacao brasiliense. Como essa organizacao apresenta periodo de existéncia de mais de trinta anos no Distrito Federal, esse processo de sedimentagao das crengas e dos ideais de prestacao de servico parece ocorrer de mancira lenta. A organizacao A apresenta médias para os componentes da autopercepgao do uso dos sistemas de influéncia bem abaixo do ponto médio da escala (no caso, 2 numa escala de 0 a 4), ou seja, esses valores sio baixos, o que indica que tais funciondrios se percebem como influentes na organizacao, em um nivel menor do que os da organizacio B, por exemplo. Realmente, numa autocracia, 0 espaco para exercicio da influéncia pessoal e da realizacao de jogos é bastante restrito. A influéncia pessoal € exercida pelo dirigente da organizagao e o poder somente é exercido 4 medida que esse dirigente outorga poder para realizagéo das metas impostas por ele. Portanto, a possibilidade de voz € inexistente, restando apenas a lealdade ao chefe. A influéncia para afetar resultados das pessoas e da organizacio somente ocorre em situagdes em que a autoridade é delegada para um fim especifico e limitado pela vontade do dirigente da organizacio. No caso da organizagéo A, os funciondrios também se percebem mais como usudrios do sistema ideolégico, em virtude da constatagaéo de que as atividades da organizagao tém carater de prestagao de servicos, sendo as tarefas dos funciondrios direcionadas para o fornecimento de cursos e possibilidades de pesquisa, além de julgamentos de agées de individues vinculados a ela. Entretanto, esse sistema de influéncia nao é 0 mais acentuado na organizagao, de acordo com os resultados da configuracgao de poder preponderante. O sistema de autoridade nao é passivel de ser utilizado por funciondrios em geral. Na autocracia, ele é carac- teristico dos funciondrios que usam a autoridade, o controle pessoal delegado pelos dirigentes maiores da organizag’o. veo [vouue =| oveno v] waneRO Jono | soso 28 | 123 ve | Flaca Rabe News| Mana dan Gaps Te da Pit A questio da autopercepc¢ao de influéncia Aspecto que chama bastante atengio nos resultados de autopercepcao do uso dos sistemas de influéncia sao os indices altos que a autopercepgao do uso do sistema de especialistas atingiu nas duas organizagoes. Esse resultado sugere que os funcionarios de ambas as organizagées se percebem acentuadamente como usuarios do sisterna de especialistas. O que caracteriza basicamente o sistema de especialistas ¢ o uso de conhecimento indispensavel 4 organizacao e a manipulagao de tarefas e fungées criticas para o funcionamento organizacional, como instrumentos para exercer o poder. Os itens que refletern essa caracteristica de tarefa indispensavel e aut6noma apresentaram cargas acima de 0,50, sendo extremamente fortes para a construgao do fator, Esses itens ressaltaram a caracteristica de tarefa indispensdvel e complexa para a organizacio, ¢ tal fato parece indicar que os funcionérios percebem a tarefa como fonte de poder bastante forte na organizacéo, mesmo que esse sistema de influéncia nao seja © que prepondera na configuragao de poder da organizacao. Os resultados mencionados no paragrafo anterior confirmam os achados de Erez e Rim (1982), em que as tarefas sao vistas pelos individuos como componentes principais do processo de influéncia no Ambito organizacional. Entretanto, o instrumento desse estudo pode induzir a um erro de interpretagao: a tarefa especializada, por si, nao caracteriza o uso do sistema de especialistas. Esse sistema envolve também a nogio de fungao critica e o uso do conhecimento técnico e da atividade especializada, para afetar a tomada de decisées e introduzir mudangas na organizagao. Se todos os itens desse instrumento para a autopercep¢ao do uso do sistema de especialistas fossem elaborados mais enfaticamente, como “Eu uso 0 conhecimento técnico que possuo para afetar decisdes nesta organizacao”, a precisao ea confiabilidade do instrumento poderiam apresentar indices mais significativos, Na construgao do instrumento, nem todos os itens apresentaram essa tonica do exercicio da influéncia de maneira clara (“Eu sou alguém que executa um trabalho complexo indispensdvel a organizacao”; “Eu sou um reflexo da ideologia dessa organizagao”), 0 que pode ter contribuido para a extracgdo de componentes que nao refletem tao confiavelmente as caracteristicas do uso efetivo dos sistemas de influéncia. rror | vouume 5 | isceno + | saneino - suo | 2008] ».103-128 Pereepie da inluincia no cocks A influéncia que o agente percebe que exerce numa unidade organizacional é superior ao poder percebido pelos colegas de trabalho, tanto para toda a amostra quanto para os grupos das duas instituigdes pesquisadas. Esse fato corrobora alguns achados da literatura, que indicam indulgéncia maior e tendenciosidade nas auto-avaliagées, quando comparadas As heteroavaliacées em situages de avaliacao de desempenho (Lane & Herriot, 1990; Farh & Dobbins, 1989; McEnery & McEnery, 1987 apud Magalhaes, 1996). Nos resultados apresentados por este estudo, parece haver indulgéncia dos individuos, no que diz respeito a influéncia que exercem na unidade em que trabalham, quando comparada a influéncia percebida pelos outros membros da secao. Parece que os individuos se percebem mais influentes na unidade em que trabalham do que efetivamente sao. Os preditores mais freqiientes na regressao muiltipla foram: aautopercepgao do grau de influéncia no setor (preditor de quatro variaveis), cargo de chefia (preditor de trés varidveis) ¢ a configuragao instrumento partidario (preditora de wrés varidveis). Assim, os individuos que se percebem como mais influentes no setor também se percebem como usuarios mais acentuados dos sistemas de autoridade, de especialistas e de ideologia. Parece que os determinantes da autopercep¢ao do uso dos sistemas de influéncia s&o constituidos desde fatores com cardter macro, como aspectos do poder organizacional — configuragoes — a fatores relacionados 4 existéncia do cargo de chefia ¢ a fatores de natureza individual - a percepcio dos individuos sobre a influéncia que exercem no setor em que trabalham. No caso da andlise da amostra deste estudo, os fatores individuais e os relacionados a tarefa e 4 ocupacio de posigées hier4rquicas parecem ser preponderantes no quadro da influéncia pessoal, uma vez que, além de eles aparecerem mais freqiientemente como preditores, também hé algumas divergéncias entre os sistemas de influéncia percebidos como mais usados pelos membros das duas instituigdes pesquisadas e os sistemas de influéncia indicados pela teoria como preponderantes nas configuragées investigadas. Aconfiguracao instrumento partidario esteve presente como importante preditora da auto e da heteropercepgao de influéncia, aparecendo mais vezes como preditora, junto com as varidveis autopercepcio do grau de influéncia no setor e cargo de chefia. | 12s Elena belo Neva | Main ds Geags Tres da Pet Além disso, é importante ressaltar que a variancia explicada pelos preditores para as varidveis de auto e heteropercepcao de influéncia nao atingiu indices elevados, ficando apenas em torno de 20% e 30%, o que indica que mais de 70% da variabilidade dessas varidveis permanece obscura. O fenémeno necessita de varias outras pesquisas para ser compreendido de maneira global. A atual tendéncia de pesquisa multinivel podera apresentar grandes contribuigdes ao estudo do fendmeno do poder. Por meio da investigagao do poder como fendmeno que emerge na dinamica organizacional, nao tendo ele unidade, nem sendo compartilhado uniformemente no contexto organizacional, algumas descobertas sobre o movimento dos membros da organizacio ¢ sobre o uso n4o uniforme dos sistemas de influéncia se tornam mais claras. ior [voumes [wnero | anno aor [wn] sae Percapgio oe inflbncla no contexte do poder organizecional Referéncias ABDALLA, I. H. Predictors of effectiveness of supervisory social power. Human Relations, v. 40, 1.1L, p.721-740, 1987. BACHRAGH, S. B.; LAWLER, E. J. Political alignments in organizations: contextualization, mobilization and coordination. In: KRAMER, R. M.; NEALE, M. A. (Eds.). Power and influence in organizations. London: Sage Publications, 1998. CHACON, V. Autoridade e poder: Brasilia: Ed. da UnB, 1979. DAHL RA. ‘The concept of power. Behavioral Science, v 2, p.201-215, 1957. 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