Você está na página 1de 22
i! Hegemonias antigas e novas: o Atlantico ibérico ao longo do século XVUI 1 Olhando para o Atlantico do século XVI, parece-me que ainda nos falta uma visio abrangente do que mudou durante esse perfodo, de onde devemos tracar suas fronteiras ¢ de como devemos interpretar as caracteristicas mais relevantes daquele século, Talvez tenhamos sido tanto demasiado gerais quanto demasiado especificos, tentando, ao mesmo tempo, explicar demais, com os sintetizadores ¢ explicar de menos, com a lite- ratura monogréfica mais especializada. Se comegarmos pelo Sul, que é © meu préprio ponto de partida, a situacéo € frustrante. Como a nossa historiografia sobre o Atlintico ibero-americano ¢ afro-americano ainda est em desenvolvimento, para nao dizer subdesenvolvimento, so- ‘mos, muitas vezes, forcados a criar do nada nossos contextos € estruturas € a fazer perguntas que, da perspectiva das histo- riografias mais desenvolvidas do Atlintico norte, devem parecer bvias, tolas ¢ até mesmo ingénuas. Somos obrigados, penso cu, a olhar para o “quadro mais amplo”, mesmo que apenas 20 KENNETH MAXWELL para ver se 0 que acontece em nossa esfera encontra alguma ressonancia em outras partes. Essa, pelo menos, é a minha mancira de me desculpar pelo titulo de meu trabalho. Talvez um modo melhor de explicar o que tentarei fazer nesta tarde seja dizer que pretendo erguer um espelho a partir do Atlin- tico sul para ver se os senhores conseguem encontrar, da pers- pectiva do norte, algum reflexo daquilo que estou dizendo. Tentarei tratar de dois temas: o primeiro se relaciona de modo muito amplo com as cronologias econdmicas internas a0 Atlintico portugués e espanhol, tentando determinar se 0 que aqui vemos nos permitiria falar, com algum sentido, sobre uum sistema atldntico setecentista, e de quais seriam as dimen- sOes € os limites de um tal sistema. O segundo tema se refere mais A geopolitica e as questées imperiais ou, se os senhores preferirem, 3s hegemonias imperiais ¢ aos desafios enfrentados por essas hegemonias a0 final do século. E certo que nos vemos em algum grau limitados, como no poderia deixar de ocorrer em qualquer especulacio his- t6rica, nfo apenas por nossa prépria pesquisa, mas também por aquilo sobre o que nossos colegas optaram por escrever. E, uma vez, que os escritos sobre histéria, a partir da Segunda Guerra Mundial, tenderam a minimizar o papel dos indivi- duos, das instituig6es e dos acontecimentos — tragando as tendéncias de longo prazo do desenvolvimento econémico ¢ delineando as estruturas sociais ¢ econémicas — as décadas mais recentes assistiram a maior acvimulo de informagées sobre © primeiro tema, os aspectos econdmicos dos sistemas atlénti- cos portugués e espanhol, do que sobre o segundo: as politi- cas € a politica imperiais. Embora muito tena sido alcangado pela énfase na andlise conjuntural econémica e na histéria so- cial, essa énfase, sem diivida, também levou a uma exclusio 5 mica — em parte marxista, ma também capaz de incorporar “\¢~ 6 muito do liberalismo cléssico; ou seja, que vé uma crise geral ‘y\)” do antigo sistema colonial afetando o império britinico na ( década de 1770 € os impérios espanhol e portugués em inicios sulo XIX, sendo que todos esses acontecimentos deriva- a riam dal guinrada do capitalismo comercial para 0 20 capialismo> V ~ |. JDe acordo com esse ponto de vista, a contribuigao yu lectual foi minima. (As revolugoes da América, taro doy) oe "Norte quanto do Sul, representariam uma passagem da domi- \\° \ // naggo formal para a informal, com os Estados europeus que | > |. entdo comecavam a se industrializar — em especial a Gra-Bre- /\o\ tanha — substituindo os impérios burocréticos € mercantilis- \ tas da Espanha e de Portugal, entdo em decadéncia. J” Historiadores brasileiros, como Fernando Novais, tam- bém véem-se preocupando em situar a experiéncia brasileira de fins do século XVII inicios do XIX no contexto de uma 214 KENNETH MAXWELL ctise do antigo regime ¢ do velho sistema colonial, em face das revolugGes atlintica ¢ industrial Na América espanhola, trabalhos dessa natureza foram realizados com menos freqiién- cia, embora{Tulio Halperity h4 muito tempo venha enfocando as complexidades econémicas e politicas do periodo da inde- pendéncia da regio do Prata ¢, de maneira mais ampla, da América espanhola (Reforma y disolucién de los imperios ibévicos, 1750-1850 (Madri, 1985)]. E(Naiey-Farrig, em seu brilhante livro sobre os maias, vé o impacto das politicas reformistas otoliberais dos Bourbons da Espanha como tracando o divi- [sor ctitico na historia da Mesoamérica.® Grande parte da nova hhistéria econémica dos tempos finais do México colénia vem buscando uma explicagéo para o paradoxo da coexisténcia de uum surto de producao ¢ de agitagao social crescentes, na mais importante das possesses coloniais da Espanha no hemisfério. ocidental. E temos © j& substancial corpo de novos escritos sobre as reformas dos Bourbons na América espanhola, com grandes contribuigées de John Lynch, John Fisher ¢ David ng Entretanto, parece-me que os historiadores da eco- nomia pertencentes & corrente dominante permanecem céticos quanto 4 importincia do sistema comercial de base atlintica ara o advento da industrializagio. O poito importante cesses desacordos é 0 quio aleatoriamente dispares eles sio, ¢, tam- bem deve-se ressaltar, qudo pouca discussio explicita vimos tendo sobre o contexto mais amplo de alguns dos elementos de importincia mais critica da hist6ria atkintica do século XVHI, bem como sobre suas implicagGes. Talver,fosse melhor falarmos sobre proceso, © que em parte incluiria repensar a histéria das idéias dentro de seus contextos sociais ¢ econdmicos — também a partir do sul, gue, aqui, é minha perspectiva bésica. No que diz. respeito & América Latina ¢ as poténcias ibéricas, isso implicaria, em gran- de medida, um novo olhar sobre o impacto das idéias do Thu- minismo que, na Espanha sob Carlos 1 (1759-88) e em Portugal durante 0 predominio do marqués de Pombal (1750-77), le- varam a grandes reformas na condugio dos assuntos coloniais. J Welragee 1Jerde witiganto facto ene Fegemonia anigas¢ novas ais { Em ambos os casos, essas reformas foram motivadas pela de- cisdo de fortalecer seus vinculos com as coldnias, retomar os beneficios do comeércio atfantico de seus concorrentes do norte ¢ restabelecer seu poderio e sua prosperidade, adaptando as téc- nicas que, segundo cles acreditavam, a Inglaterra ¢ a Franca, em/ especial, haviam usado para ultrapassé-los./Essas medidas to- ‘madas por Portugal e pela Espanha, em alguns casos, serviram também para esvaziar ¢, em outros, para mitigar o impacto da Revolugio Americana, embora nem a América espanhola nem a portuguesa tenham sido capazes de evitar as conseqiiéncias das InsurreigGes européias de fins do século XVI Em segundo Iu-(7 gar, contudo, ¢ importante olhar nfo apenas do sul para 0 norte, mas também do norte pata o sul. A questi da re- volugio como exemplo ¢ potencialidade, envolvendo a articu- oe lacio criativa de novos mecanismos institucionais de governo, fj era uma questo central para os que se pretendiam anticolo:_~r;” nialistas, em fins do século xvim,/Tanto no Brasil, em fins da dkada de. 1780, quanto na América espanhola, na esteira das guerras de independéncia, 0 modelo constitucional + americano_mostrou-se atraente. ainda, em tercciro lugar, «-(3) tamos tratando também da oposigéo colonial ao poder da metrdpole, ¢ € nesse aspecto, obviamente — a consecucéo da independéncia nacional — que a ambigiiidade do papel ibérico ¢ ibero-americano no Atkintico como um todo fica mais apar- ente. A Espanha foi um elemento importante da alianga européia que ajudou as treze coldnias da América do Norte a escapar do jugo britinico. Muitos latino-americanos que se pretendiam’, nacionalistas, por outro lado, passaram a ver a Gra-Bretanha que, anteriormente, aparecia como a poténcia colonial por exceléncia, como um aliado potencial contra a Espanha, em seus movimen- tos independentistas. O processo, portanto, é um elemento de importincia critica nesse periodo, uma vez que estamos tra- tando de interacdes complexas, envolvendo o impacto do Tu- minismo — tanto em sua forma absolutista, implicando uma reformulacio das politicas imperiais em linhas neomercantilistas, redefinindo assim os direitos do Estado, quanto em sua forma Fidl en KENNETH MAXWELL { mais liberal, como guia para experiéncias de novas formas de \governo e elaboracio de constituicées, definindo assim os di- Ireitos do individuo no processo de descolonizagéo. Ambos im- plicam uma quebra dos padrdes anteriormente estabelecidos € ‘uma perturbacio, uma mudanga e uma reestruturagéo do con- texto institucional nos quais as coletividades definem a si proprias. 2 ‘De que maneira 0 Atlintico portugués e espanhol se en- caixariam nesse quadro? O caso de Portugal ¢ do Brasil é espe- cialmente interessante, dado 0 foco atlintico no comércio entre ambos; a grande populagio escrava do Brasil, ¢ seu conse- qiiente vinculo com a Africa; ¢ a interpenetracao do sistema luso-atlintico, via Lisboa, pelo sistema comercial do Atlantico norte, dominado pelos britinicos. Mas, em primeiro lugar, é essencial estabelecer os parimetros do sistema do qual falamos — uma vez que, se o sistema comercial luso-atlintico do sé- culo XVII caracteriza-se preponderantemente pela ascensio da produgéo do ouro no Brasil e por sua queda subseqiiente, am- bos os ciclos tiveram lugar numa estrutura mais ampla, que mudou surpreendentemente pouco entre 1660 ¢ 1807, 0 ano | da invasio napole6nica de Portugal. Estamos, portanto, fa- | lando sobre 0 que eu chamaria de o longo sécuio XVI. Permi- \kamn-me examinar rapidamente as origens desse longo século | XVIII, ¢ explicar a razo pelo qual situo suas origens nos anos ‘1660. " Q assaito holandés as possess6es ultramarinas de Portu- gal, em meados do século XVI, foi de abrangéncia transatlan- tica. Os holandeses tinham perfeito conhecimento de que 0 controle do nordeste brasileiro, regio produtora de agticar, ser-thes-ia imitil caso nao controlassem também a fonte dos escravos, na Africa. Desse modo, em 1641, os holandeses to- maram 0 porto fornecedor de escravos de Luanda, a capital da ( ‘Hegemonias antigas ¢ novas 217 Angola portuguesa, o entreposto do trifico de escravos, si- tuado na ilha costeira de Sé0 Tomé, c também a capitania agucareira de Pernambuco, no Brasil. Esses sucessos holandeses, contudo, foram temporérios. Em 1648, uma forca expedidio-| niria formada pelo governador portugués do Rio de Janeiro] retomou Angola ¢, apés uma longa e amarga guerra de guer- rilhas, em Pernambuco, os holanxdeses foram expulsos de Re-| cife em 1654.6 a As vitérias portuguesas na Africa ¢ no Brasil ndo se re- petiram 0 Oriente. A década de 1650, alids, viu o poder por- tugués ser virtualmente climinado da Asia ou, pelo menos, reduzido a uma sombra do que havia sido no século XVI, s timensdes ocednicas dos interesses imperiais portuguescs, por-( ®) tanto, dos anos 1660 até inicios do século XIX, passaram a centrar-se principalmente no Atlintico sul. Aléin do mais, jé “ei 1644, 6 Comefeio direto entre a Bahia ¢ a costa ocidental —¢ ~ da Africa havia sido autorizado, a Bahia exportando tabaco ¢ (C5: oh importando escravos. Essa ligagdes comerciais ente a Améri-|" \S° ca do Sul a Africa ocidental permaneceram sendo importantes * até bem tarde no século XIX, fazendo com que os mercadores| baianos ligados ao comércio africano enriquecessem, tornando-| se virtualmente independentes de Lisboa. a No continente sul-americano, as fronteiras sul ¢ norte dos dominios portugueses também foram estabelecidas ou, pelo menos, a reivindicagio dessas fronteiras foi colocada no século XVI. Em[1670) por exemplo, foi criada a Diocese do Rio de Janeiro, sua jurisdigao alcanganda,em tese, as margens seten- trionais do rio da Prata. Em 1680} os portugueses estabele- ceram uma “nova colénia” (Nova Colnia do Sacramento) na margem oposta 3 cidade porttidria espanhola de Buenos Aires, ‘A reacio dos espanhéis foi répida, e a Nova Colénia foi to- ‘mada apés alguns meses, apenas. Mas, em 1681, os portugue- ses recriaram ¢ fortificaram aquele posto avangado. A questo da presenga portuguesa no rio da Prata era causa de atrito constante com a Espanha. Apesar de varios tratados, 0 pro- blema nfo foi solucionado, permanecendo, mesmo apés a in- 218 KENNETH MAXWELL dependéncia das Américas espanhola ¢ portuguesa, como um complicador nas relagdes dos Estados sucessores. No extremo norte, a fronteira amaz6nica também per- manecia em disputa — nesse caso, com a Franga que, em[1676 via estabelecido uma presenga estratégica na costa sul-ank ana, em Caiena. O interesse francés pelo Brasil, na verdade, hao diminuiu por todo o século XVI, apesar do fato de, em. 11712, apés a guerra da sucesso espanhola, a Franga ter re- rnunciado a todas as suas pretensdes sobre a margem esquerda do Amazonas. | Em fins do século xvi, portanto, © foco do interesse impetial de Portugal deslocou-se, de forma decisiva, para o Ocidente, abandonando a talassocracia dos postos de comés- | cio do oceano {ndico, estabelecida em inicios do século XVI, em favor das{gol6nias de base agricole do Atlintico Sty, ° . Scomplexo comercial atFintico-afro-americano, que era anterior \y2" a0 império asidtico, tendo prosperado mesmo durante a época em que foi eclipsado pelo comércio asidtico de especiarias, agora teve sua importincia plenamente reconhecida. Dentro do pré- prio sistema do Atlintico Sul, integrado pela interdependéncia triangular de Lisboa, dos enclaves de tréfico de escravos das costas afticanas ocidentais e centrais, e das cada vez maiores coldnias de populacio curopéia ¢ africana da América por- tuguesa, as prioridades imperiais foram reordenadas de forma a favorecer 0 apoio ao império territorial portugués no Brasil. ‘A América portuguesa, nos anos 1650, era, além disso, bastante diferente da colegio de pequenos enclaves costeiros que havia sido sessenta anos antes, 2 época da unio das co- roas da Espanha e de Portugal. O desenvolvimento de um sistema de frotas circulando entre Lisboa ¢ o Brasil, logo apés Portugal ter-se libertado da Espanha, ¢ a imposicéo de tarifas aduaneiras mais pesadas, para financiar a construgio de navios de guerra, em meados do século, bem como o recém-criado monopélio da Companhia do Brasil, mostraram-se benéficos para o sul do Brasil que, anteriormente, competia com a Bahia € Pernambuco em condigées seriamente desvantajosas, pelo Hegemonias antigas e novas, no acesso aos mercados curopeus. Os navios agucareiros, provenien- tes de todas as regides do Brasil, agora chegavam juntos a Lisboa. As embarcagGes de escolta deixavam 0 Rio de Janeiro em fins de margo, apanhando os navios agucareiros da Bahia em abril, ¢ a frota chegava a Lisboa nos primeiros dias de julho ou agosto. Entre meados da década de 1640 e da de 1650, os pregos) Qi do agiicar, na Europa, estavam altos, mas, apés aquela data, os pregos desse produto brasileiro caftam vertiginosamente no mercado de Amsterda, mantendo-se em queda até a década de 1680. A causa principal era a competi¢go do Caribe. Os ho- andeses, ¢ mais tarde, os ingleses, estavam desenvolvendo seu proprio comércio de agticar, e, no caso dos britinicos, come- ando a estabelecer um sistema de tarifas preferenciais para“ roteger os mercados britinicos para o agticar produzido por eles préprios no Caribe SA Teagio do § eiOr agucareiro do Brasil a) é&sa perda de mercados é entendida de modo muito imps | ito, e poucas pesquisas foram realizadas sobre a segunda me- J'tadé do século XVI. Hii algumas indicagdes de que 0s usineiros | / brasileiros teriam tentado reduzir os custos, integrando de forma } |_ vertical seus empreendimentos. A usina de agicar administrada | ‘pelos jesuitas, na Bahia, por exemplo, que, nos primeiros anos } do século calcava-se totalmente em esquemas de meagio, na | “ écada de 1680 estava produzindo diretamente 60% de sua kana. Os produtores também conseguiram transferir parte de suas perdas para os empregados assalariados, cujos ganhos sof- [recam uum decréscimo real signifcativo por toda a segunda j { metade do século xv? Tonseqiiéncias politica ¢ sociais da nova situagdo eco- nOmica foram significativas. Plantadores e usineiros tenderam a perder sua posi¢go dominante nas instituigées urbanas. E certo que os mercadores passaram a ocupar posigées de im- porténcia nas organizagdes urbanas de leigos voluntérios de maior prestigio, tais como as casas de misericérdia das cidades portudrias brasileiras. E, nos governos municipais, 0 antigo dominio dos agricultores foi ameacado, com a nomeagio de xs bol peetr ane po eres gy Cs NE PEON IEE? ee A GICOr 220 KENNETH MAXWELL advogados de formagio universitéria (os juizes de fora) para presidi-los, e pelo surgimento (a0 menos na Bahia, em 1641) de representantes dos artesaos urbanos, os juizes do povo.* | Ao mesmo tempo, as cimaras municipais brasileiras vinham Ladquitindo maior importincia no contexto imperial mais amplo. O fato de a retomada de Pernambuco dos holandeses haver resultado tanto das iniciativas dos proprios habitantes ¢ de seus aliados brasileiros de Sio Paulo ¢ da Bahia quanto da interferéncia de Lisboa, sem diivida incentivou essa autonomia, Alls, os pernambucanos, em. um determinado momento, quando © auxilio de Portugal & sua causa parecia problemstico, es- tiveram prontos a pedir 0 apoio do monarca catélico da Fran- (As cimaras muunicipais levantaram fundos para a defesa, € of _ fem seguida, insuflaram uma vigorosa oposig0 a0 monopélio| “2 Ida Companhia do Brasil e, com a ajuda da Inquisiggo (que se) a\ J opunha aos privilégios concedidos aos banueiros crist2os-novos| ww que haviam investido na Companhia do Brasil), conseguiram\ derrubar 0 monopélio da Companhia, em 1659. O sistema de \ frotas, que havia sido imposto & época da criagdo da Companhia, entretanto, foi mantido, continuando a operar sob a direséo | administrativa da nova Junta de Comércio, com sede em Lis- boa. As cémaras municipais brasileiras, entretanto, eram repre- {sentadas em Lisboa por procuradores, e a Cimara da Bahia obteve o direito de enviar dois representantes as Cortes, em 1653, privilégio este de alguma imporeancia, uma vez que as Cortes desempenharam um papel vital nos anos que se segui- ram & restauragio da independéncia portuguesa, reunindo-se ito vezes entre 1641 1698. A paz com a Espanha, em 1668; 0s tratados de 1661 ¢ de 1688, firmados com os holandeses; € 0s de 1654 ¢ 1662, com os ingleses, haviam sido comprados a pregos considerdveis, em termos da concessio de privilégios especiais para os comerciantes estrangeiros ¢ do pagamento de indenizagdes, incluindo o direito tedrico dos comerciantes ¢s- trangeiros de residirem no Brasil, o que, na prética, encontrou rigorosa oposi¢gao.? Hegemonias amigas enovis y mM, duro espera _ _ eS _/Kfraqueza de Portugal sem divida contribuia pari a te" lativa autonomia das instituigées brasileras. Portugal sabia bem da necessidade de tratar os brasileiros com cuidado ¢ respeito, } uma vez que 0 poder de Portugal de impor obediéncia pela, \\> sno mt nada de 1690, 0-agicar bra- vt iteiro AGO mais dominava os mercados mundiais, no tendo, 4) Re contudo, desaparecido de circulacao. O agticar branco brasi- xe Ieiro era de alta qualidade, ¢ continuow a ser um produto im- © - A portante de exportacio (e, para Lisboa, de re sagig) FO)" (rsa to pose do telativo declinio do valor do acticar } i estimular a diversificagio e dar novo alento a exploracio ¢_/ expansi sto. interior da América do SulO tabaco, por exemplo, tornou-se uma importantissima exportacio brasilei- » \(\> ra, tanto para Portugal quanto para a Africa, tendo a quanti- \ dade de tabaco enviada a Portugal duplicado entre 1666 ¢ <-"" 1672, Foram feitas tentativas de introduzit cravo ¢ cancla da 9 Apc Asia e de desenvolver 0 comércio do‘cacau.)A fronteira do gado também forgava caminho em direcio ao interior, abrindo ligagées entre 0 vale do rio S4o Francisco ¢ o planalto de $0 Paulo. Com a ajuda dos paulistas, o complexo de assentamen- tos de escravos fugitivos, conhecido como Palmares, que hé muito se mantinham nos sertoes situados entre Pernambuco ¢ Alagoas, foi destraido. A partir de 1670, a Coroa passcit a fazer largo uso dos paulistas para a exploragdo sistematica do |“ interior, recompensando-os com titulos de nobreza e com ad- misso nas ordens militares cavalheirescas, ~ ‘A mais espetacular ¢ decisiva conseqiiéncia da exploragio (4) (0) portuguesa do interior, contudo, foi a descoberta do ouro. A. procura de metais preciosos, € claro, havia trazido muitos dos primeiros europeus ao hemisfério ocidemal, ¢ incentivado as mais audaciosas exploragSes do vasto interior das Américas do Sul ¢ do Norte, tendo os espanhdis sido ricamente premiados ‘em suas primeiras exploragées. No Caribe, poucos meses apés Colombo ter aportado, foi descoberto ouro. Na década de 1540, nas dridas montanhas dos Andes, os espanhéis depararam com uma vasta montanha de prata, em Potos(, na atual Bolivia; ¢ 22 KENNETH MAXWELL no México, nas encostas orientais da Sierra Madre, tiveram igual sucesso na exploragio de minério de prata. Os portugue- { ses, por outro lado, foram menos felizes. Por mais de duzen- | tos anos apés Portugal ter reivindicado o territério que ficou conhecido como Brasil, eles tiveram de se contentar com pro- | dutos mais prosaicos. O pau-brasil — a madeira brasileira usada para produzir tinturas vermelhas — 0 agticar, 0 couro, 0 cacau €0 tabaco eram produtos nobres ¢ valiosos, todos eles, mas 0 ‘metais que os primeiros colonos esperavam encontrar conti- nuavam se escondendo deles. Em fins do século xv, con- @& tudo, 0s colonos mamelucos da pequena vila interiorana de | Sio Paulo tiraram a sorte grande. So Paulo era uma comuni- } dade pobre de recursos, que ganhava a vida capturando ¢ ven- dendo indios como escravos ¢ atacando as présperas misses | jesufticas do Paraguai. Os paulistas estavam sempre 4 caga de saques. Na década de 1690, apés anos de procura, acabaram "i, Bot encontrar ricos depésitos de ouro de alwvigo nos rios que <8" correm ao longo dos flancos da serra do Espinhago, que corre «© do norte para o sul entre as atuais cidades de Ouro Preto € Diamantina, no Estado de Minas Gerais, atravessando 0 grande planalto central do Brasil. Situada a cerca de 600 quilémetros, continente a-dentro, da cidade portudria do Rio de Janeiro, a serra da Mantiqueira marca 0 divisor de 4guas do grande rio Sio Francisco, que corre do norte, ¢ afluentes dos tributérios que correm para o sul, juntando-se & vasta bacia do Prata. Quando a noticia se espalhou, especuladores vidos usaram ambos os sistemas fluviais para chegar aos campos auriferos ¢, uma década apés a descoberta dos paulistas, a primeira grande yt Yecorrida do ouro da histéria moderna estava a pleno vapor. we [Mais que qualquer outra coisa, foi 0 ouro que empurrou a | ocupacio portuguesa para o interior do Brasil — primeiro para S 2 Minas Gerais, depois para Goiés e Mato Grosso — muito além 4 da esfera tradicional dos interesses portugueses determinados pelo ‘Iratado de ‘Tordesilhas. A questo das novas ocupagies do interior do territério, a partir de entdo, toraram-se objeto de aguda preocupacio, tanto para Lisboa quanto para Madri. Hegemonias antigas e novas, 223 A medida que progrediam as negociagdes de um tratado visando a estabelecer os limites entre a América portuguesa ¢ a espanhola, durante a década de 1740, passou a ser de acci- tagio geral que os marcos topogrificos claros, como rios ¢ cadeias montanhosas, serviriam para delinear as fronteiras. Os portugueses tinham dois trunfos, nessa barganha. Em primeiro ), ~ / ugar, possufam a Colénia de Sacramento, na margem oriental , | “"\ do estudrio do Prata. Em segundo, o extremo oeste da regio j | + mineradora portuguesa, no que hoje € Mato Grosso, havia |°'™iice sido integrado, tanto administrativa quanto economicamente, | com a costa norte do Brasil, por meio dos transportes fluviais ¢ x das rotas de comunicagio que corriam ao longo dos rios Guaporé, |b -e¢i, Mamoré ¢ Madeira, na parte ocidental da bacia Amaz6nica. |). { tar ‘Quando por fim se chegou a um acordo, esses rios passaram a constituir a fronteira noroeste das terras portuguesas, para gran- de satisfagdo das autoridades de Lisboa.}° E dentro desses limites geogréficos mais amplos que as caracteristicas econémicas do sistema luso-atlantico do longo século XVII devem ser consideradas. Essas caracteristicas fo- ram, portanto, antes de mais nada marcadas por fluxos em espécie (ouro e prata, esta tiltima obtida do contrabando com 08 espanhdis) € pelo predominio dos produtos bésicos colo- niais, em sua maioria brasileiros. Em segundo lugar, o cres- cimento, declinio € revitalizacdo das ind\strias manufatureiras de Portugal foi inversamente proporcional 4 ascensio e queda da produgao do ouro no interior brasileiro. O que vale dizéry _\ que a industria nacional portuguesa floresceu antes de 1700 e,| (# novamente, apés 1777, mas feneceu durante a era do ouro.} Esse fato teve implicages importantes-para-as-politicas ex- — tema ¢ colonial de Portugal. Portugal, além fs ay ~ -tod6 0 século XVII, continuou sendo um importador crénico (» de gros — do norte da Europa, no comeco do século, ¢ da América do Norte, em especial da Virginia e das Carolinas, J le ee ‘mais para o fim Esse fato, durante as décadas de 1780 ¢ 1790, teve um impacto importante nas atitudes da nova reptiblica norte;americana, marcadamente na pessoa de Thomas Jefferson, Hove, a ty e@ wis wwopordag Ss bu fins de AVIA ba cehes fePlicines 10 Soi J}para com os movimentos nacionalistas proto-republicanos no 'Brasil. Essas atitudes eram, na melhor das hipéteses, ambiva- lentes, quando 0 comércio da Virginia com Portugal foi posto na balanga contra 0 apoio aos movimentos nacionalistas que | queriam libertar-se de Portugal, movimentos esses de origem Jincerta, nos vastos territérios portugueses da América do Sul. ‘A terceira caracteristica importante do longo século XVIt we | foi a presens britica em Portugal ¢, indicetamente, em seu ws, inp, protegida por tratados ¢ exercendo direitos ¢ privilé- i " . : de fato, muito semelhantes aos qué mais Ni ene no século XIX, seriam impostos 2 China. Por exemplo, Yass todo 0 perfodo que vai dos tiltimos anos da década de 1660 a Xp 1807 foi marcado pela presenga dominan = com $8 tiam os portugueses — dominadora cas naan Sou “Omani ) f| dades de come © Porto Os mercadores britinicos em Lisboa e no FORO etavase” | Organizados nas chamadas factories, ou feitorias, que eram, na ' verdade, corporagées comerciais legalmente reconhecidas, ten- | do seus privilégios garantidos pelo tratado cromwelliano de | 1657, reforgado pelo Tratado de Methuen, de 1703. Por meio | de suas capacidades empresariais ¢ de seu acesso ao capital, os Sy Se | comerciantes britinicos penetraram toda a trama da economia ~)__; metropolitana ¢ colonial.” ‘A necessidade de apoio externo, tanto politico quanto «epee Imilitar, etavano cere das concessoes comerciais feitas por e !Portugal aos ingleses ¢ a outros, no século XVII. Essa necessi- dade permaneceu como um dado bésico por todo o século XVII, estabelecendo os parimetros segundo os quais a politica externa ¢ colonial portuguesa devia set conduzida. A depen- déncia politica e militar, contudo, nao significava que ndo hou- ‘vesse espaco para manobra em favor dos interesses nacionais, ou opsées abertas a um nacionalista portugués habilidoso, para extrair da relagdo anglo-portuguesa todos os beneficios pos- siveis, Na verdade, uma preocupacio central dos pensadores econdmicos € diplomatas portugueses, 20 longo de todo o século XVII, foi, precisamente, como alcangar um equilfbrio se Forsado re e a Plowatas fer Wueveses ear mo tise dutaee% 95 fle acu ferrdo "Ficseatnis sigs ins pe 22s C5 desituis Com 8 Inset sferts Ned, yor evita eso que se havia tornado tuma 1dacio desigual, mas que, intrinsecamente, néo precisava sé-lo, se uma verdadeira recipro- cidade pudesse ser conseguida. E nem todos os pensadores econémicos britinicos viam apenas beneficios na série de tra- tados e tarifas privilegiadas que regiam 0 comércio anglo-por- tugués. Essa questo, ao longo de todo o século XVII, veio a 4, ser um t6pico central do debate entre os luminares da nova | ciéncia da economia politica, no qual se engajaram Adam Smith | ¢ Ricardo? O mundo luso-atlintico do século XVII, por fim, foi apa- nhado na luta entre a Franca ¢ a Inglaterra, luta essa que cada ‘vez. mais comprometia Portugal. Lisboa tentou apaziguar a ambas, mas por sua prépria natureza atlintica, e em virtude do papel econémico central desempenhado pelo Brasil no siste- ma comercial !uso-atlintico, Portugal estava inextricavelmente vinculado 4 Gra-Bretanha e, embora sempre tentando manter-se neutro, conservando assim © préspero entreposto que funcio- nava em Lisboa para a reexportacéo dos produtos coloniais, ele raramente foi capaz de manter a neutralidade por muito tempo. Desse modo, 0 papel do Brasil nos célculos e na diplo- macia portugueses, tanto em termos econémicos quanto insti- tucionais, assumia uma prioridade muito mais alta que © peso colonial da América do Norte nos cileulos britinicos. As preo- cupagées com o desenvolvimento do império atléntico por- |“ tugués, por um lado, e com a estatura diminufda eo aparente | [. d araso de Portugal, por outro, permeavam os meios intelee-| — ys tuais portugueses da época. ne We A reformulagao mais dristica das politicas porraguesas\ aot com relaco a0 Brasil ocorreram durante o longo periodo domi- nado pelo marqués de Pombal, entre 1750 1777. 0 proprio f,..hs | Pombal caicou-se muito sobre a teoria ¢ a prética mercantilis- tas clissicas, tanto em suas origens britdnicas quanto francesas ou colbertianas. Mas usar o termo mercantilismo para descre- ver a politica de Pombal nao é totalmente apropriado, © mer- cantilismo, quando definido de forma estrita, como sabemos, Pomme! ob (wsylveve comgcanes pol tueyeses. ws 12 oon pii224. . tor Me las — (fedoses [hypieas form at ven |descreve uma politica pela qual o comércio & Tepuladol tribu- aad |tado € subsidiado pelo Estado, visando a promover o ingresso de our ¢ prata —o objetivo dessa intervengao do Estado sendo, |/em termos amplos, alcangar uma balanga comercial favordvel. ‘As politicas de Pombat erarn, a0 mesmo tempo, mais res- tritas € especificas do que essa definigio sugere. Seu objetivo (| era fazer uso das técnicas mercantilistas — compantiias mo- © | nopotists, regulamentacio, eributacdoe subsidios — de modo a facilitar a acumulagio individual de capital por parte de co- merciantes portugueses. Essa ajuda individual aos capitalistas portugueses tinha objetivos e conseqiiéncias mais amplos, por ser parte integrante de um plano que visava a fortalecer 0 po- der de barganha do pais no sistema comercial atlantico.!? © problema para um ibérico esclarecido ¢ favorével 20 nacionalismo ¢condmico, © que talvez.seja uma maneira mais [precisa de descrever Pombal, nao era tanto incentivar 0 in- jgtesso de metais preciosos, o que raramente foi problema para jos formutadores das politicas econémicas ibéricas, uma vez ‘que a Espanha e Portugal e seus impérios cram a principal fonte da oferta mundial de metais preciosos, nessa época, Ouro Xai (do Brasil e prata do Peru © do México. © dilema era pre- SS yeisamente 0 oposto, ou seja, os politicos precisavam invertar meios de manter os capitais dentro de seus préprios sistemas econdmicos e, ao mesmo tempo, multiplicar os efeitos econd- Lowe "_gicos positives ¢ diminuir os negativos, de serem produtores oe metas precios. & teoria € a prética do mercantismo, = afinal, foram criadas pelos paises do noroeste da Europa, to- rf) dos eles pobres em metais preciosos. A aplicagdo da teoria ‘s da prética do mercantilismo na peninsula Ibérica, rica desses ‘4, metais, seria fatalmente parcial, uma vez que © objetivo das <@°policicas era fiandamentalmente diferente dos objetivos perse- € elds pelos psi do mereanitoma Os bees van § ©) “@ ter os metais preciosos, enquanto 0 noroeste da Ei ava} \atrattos.[ (Os métodos de Pombal refletitm, na verdade, as peculiati- dades da posicdo de Portugal no sistema atfintico, e © impacto pe be. oS her collesnus | see a reap SKENNETH MAXWELL ped C0! foc Ye OYerues) ne f iS senovas 227 f keoryua ‘yew ry Casts « particular que reve sobre dcapacidade empresaral portuguesa © surto de produgio de ouro no Brasil, entre 1700 ¢ 1760. ) Bisencialmentéo-que feZ0 todo-poderoso iinistro Pombal, { foi colocar o poder do Estado, de forma decidida, de um =| } Iados dos contlitos que se haviam desenvolvido entre os em- presdrios portugueses, em conseqiiéncia do surto do ouro. | dew preferéncia aos grandes comerciantes solidamente estat / lecidos, tanto portugueses quanto brasileiros, sobre seus con | correntes de menor porte, por ver os pequenos comerciantes ry marcas pees eames | \ trangeiros. Ele esperava qué, com o apoio do Estado, os gran des comerciantes portugueses, com o tempo, chegariam a ser capazes de competit com os estrangeiros no jogo destes tlti- ‘mos. Sua politica econdmica era I6gica, em face da posigéo de_ Portugal no sistema de comércio internacional setecentista. Ela | protegia 9 comércio mutuamente benélico (como 0 comércio | portugués de vinho), mas também tentava desenvolver uma | poderosa classe de empresérios nacionais, dotados de recursos | \° de capital ¢ de capacidades empresariais que lhes permitissem competir, tanto no mercado internacional quanto no interno, com seus concorrentes estrangeiros, os britinicos em especial, Essa ado era usa politica fxcil de seguir, pelo menos de forma} ‘r aberta, uma vez que eta de importincia essencial alcangar ess objetivo sem colocar em questé0 0 apoio politico ¢ militar ¢garantido pelos tratados firmados com a Inglaterra, apoio esse fundamental para colocar em xeque as ambigGes espanholas. ‘Ao mesmo tempo, no Brasil, € em gritante contraste =| (0s reformadores Bourbons da América espanhola, Porrugal ren- tou incorporar ¢ cooptar a oligarquia brasileira. Portugal, afinal,, era um pais pequeno com um grande império, ndo possuindo' ‘os recursos da Gra-Bretanha ou da Franca. Ele nao possuia capacidade militar ou recursos econdmicos para forgar o Brasil a um papel de subserviéncia. Alids, enquanto Pombal assistia as tentativas britdnicas de reprimir os colonos rebeldes na Amé- rica do Norte de lingua inglesa, no decorrer da década de 1770, cle aa | sua crenga “Epo a eqaifiagao era uma Cotrsste com Av otics hela ¥ o Nteie \ Wma Kod We | soe 0) Tomball de, ag OHCLS fslowars ota eo ran ms et Ba7 = Cont ‘owl. “arma mais eficaz do que a forca militar contra sublevagées coloniais. ‘A politica colonial, sob Pombal, serviu para diluir de fato ) Is tensGes existentes no complexo colonial, evitando qualquer © lbp de polarizacio do tipo metrépole versus coldnia. A inter- vengio do Estado pombalino quase sempre foi setorial, ou . sia(ete fez pender 0 apoio esata part un Ws Taos onilitos preexistentes, que trai conteiras entre a.) | Metrépole e/a Coldnia,(Desse modo, Pombal dea apoio 20s | grandes eomerciantes Contra seus concorrentes de menor porte; 50g | anilion os reformadores da educaséo religiosa, como os Ora- | t6rios, ao mesmo tempo que destruit os jesuitas e seus alia- dos; ésmagou elementos poderosos da velha aristocracia, 20 ‘mesmo tempo que ineentivou 0 acesso de homens de n a) ppomibalino, bem Gomo a oposiczo suscitad2 por ele, ajudaram ¢ prejudicaram tanto brasileiros quanto portugueses, forjando uma série de aliangas que cruzaram Atléntico, bem como con- travaliangas que vincularam interesses portugueses ¢ brasileiros em diversos niveis. Alguns dos resultados dessa politica nao foram intencionais, mas 0 aspecto conciliador da politica de Pombal com relacéo a poderosos interesses brasileiros foi to- talmente explicito. © problema fundamental, para Porcugal, contudo, surgiu da légica do sistema atlintico com base no Brasil, dentro do | qual Pombal operava. Em iiltima andlise, o Brasil, inevitavel mente, tornar-se-ia 0 parceiro dominante no império de lingua portuguesa. Caso as limitagdes politicas que haviam regido todo 0 periodo entre 1660 ¢ o fim do século XVII também viessem a se alterar, ou seja, caso a Gra-Bretanha deixasse de ver-como sendo de seu interesse proteger Portugal de seus vizinhos de continente, os britinicos poderiam optar por uma relacéo direta com a Colénia, ¢ ndo mais com a Metrépole.'* \ Como toda a base da prosperidade de Portugal havia sido cons- * rufda sobre a manipulagao dos monopélios coloniais, do co- 4 me aude eases jo de. produtos agricolus de exporsfo, dos mercados Wy fh fowiidse et oe Mies yh ep pe Vhe de ge for acs fret 9% OU CO OTT AE ins antigase novas 229 coloniais ¢ do ouro da colénia, uma tal ruptura traria consigo mudangas fundamentais, matcando o fim de uma época. E irdnico que tenha sido a tomada de Lisboa pelos franceses, em 1807, 0 fato que forcou a real emancipasio politica e eco- némica do Brasil em 1808, neutralizando 0 poder daqueles que, em Portugal, se opunham ao reconhecimento do papel central, tanto politico quanto econémico, desempenhado pelo Brasil no sistema atlintico luso-brasileiro, fazendo desabar, por- tanto, a estrutura desse sistema luso-atlintico, tal como ele vinha existindo desde a década de 1660, ¢ substituindo Lis- boa, como intermedidrio indispensavel entre a América do Sul ¢ a Europa, pelo acesso direto entre a Europa ¢ os portos brasileiros.!8 3 Lay &e fe J. ‘Mas o que dizer do mundo atlintico hispano-americano? Aqui, o século XVI viu operarem trés processos principais Em primeiro lugar, a antiga conex4o comercial monopolista de comboios atlinticos formados por navios protegidos, via- jando em um padréo regular entre 0 Caribe ¢ 0 porto mono- |, polista de Sevilha (e, mais tarde, de Cédiz) foi superada por | uma diversificacdo comercial de fato. Parte dessa diversificacao / cra ilegal — mas tal como 0 comércio por intermédio da Ja" maica, ela acabou por se tornar uma contribuigio-significativa a0 total do comércio atlintico,/Apés 1715, na verdade, se) claro GUE © antigo sistema de frotas estava limitando o cres- cimento do comércio, 4 medida que a expansio econémica ¢- \ demogréfica ocorria por toda a América espanhola/X Espanha, além disso, acabou por permitir que outros portos espanhéis ingressassem no comércio atlintico, pondo um fim gradual 20 monopélio de Cédiz, entre 1765 ¢ 1789, ¢ deu reconheci- mento administrativo formal as regides costeiras periféricas da América do Sul, afastadas das dreas centrais de grande altitude ¢ populacdo indigena, onde, desde o tempo da Conquista, si- 230 KENNETH MAXWELL tuavam-se as principais bases espanholas no hemisfério 0% dental. Desse modo, apesar de Lima ¢ da Cidade do México \\ef | permanecerem sendo importantes (0 México, nesse perfodo, \e | ainda detinha metade da populagio da América espanhola) +c, | novas regides se desenvolveram, como a do rio da Prata, de | Caracas e de Cuba, que, anteriormente, eram apenas periferias (onginguas, que serviam para 0 fornecimento de géneros bési- | cos, mas que produziam muito pouco além disso. ‘Todas essas [ regides, em fins do século XVIH, tornaram-se grandes expor- | tadoras — Buenos Aires, exportando carnes salgadas, prata, | couro ¢ grios; Caracas, cacau e couro; e Guba, principalmente | apés a revolta do Haiti, como um grande centro do comércio | de agticar e de escravos. Em segundo lugar, a partir de meados do século, a Es- jpanha tencou implementar uma série de reformas administra- _, | tivas, mercantis ¢ fiscais de grande importincia, objetivando 0 . fora xento do poder da Metrépole, por meio de uma ex- ‘ploracio mais eficiente das cof6nias.}° Da mesma forma como ‘ocorreu em Portugal, havia, na Espanha, uma conscincia cada ‘vex, maior de que seu papel como grande poténcia vinha sendo ) gravemente comprometido por seu fracasso em se adaptar 3s condigdes modernas, © que, em termos setecentistas, signifi- (cava usar o poder do Estado para aumentar as receitas € impor \1um sistema administrativo mais centralizado. Essa preocupa- | go com a regeneracio nacional, durante a primeira metade do século XVII, era uma preocupacao prioritéria nas mentes de muitas autotidades governamentais, que viam a América ~ | espanhola como um meio de a Espanha recuperar sua posiczo ,/ na Europa, caso os recursos coloniais 1 ser utitizados de maneira mais eficaz. A sta de ffosé de Campilloministro das Finangas, datando de<1743} na qual ele pedia um “Novo Sistema de Administragio Exwinémica para a América” [Nuevo Sistema de Gobierno Econémico para ta América), encapsulava a intengio de(desenvolver o impéri i) _ Gukzearis espanholas ¢ como fonte de matérias-primas) Campillo cute er desejava ver uny sistema de inspetores gerais [Piieas generales], o Wp femerto Wo tetenroe we 1 Higemonin antiga ¢ nove 231 Townda k Yovdya Velade ona) de "pela mudaniga gual eram_governadas_ jés_indigenas do Ne J/S propostas de Campillo, contudo, s6 foram publi”) Zadas em 1789. Foi o monarca Bourbon, Carlos Mi (1759- | { 88), cujo reinado passou a ser associado & implementagéo de \ tuma série de novas medidas governamentais de longo alcance para a administracio dos vastos territérios espanhéis no Novo | yMando. A urgéncia dessas reformas tornou-se cada vez. mais (patente apés a tomada de Havana pelos britinicos, em 1762, _/ jurante a Guerra dos Sete Anos! Cada uma das grandes crises espanholas, no século XVII, eum componente colonial /A competigao comercial entre @] / Tnglaterra € a Franga pelo Contrato [asiento] de fornecimento | jq) de escravos afticanos para as eolénias espanholas na América havia sido um item imporane na Guerra da Sucessio Espanho- / __ lam meados do Segunda crise, ocorrida entre 1759 ©1762, foi precipita pela expansdo comercial inglesa na India, no Canad e no Caribe, este tltimo a porta de entrada para as col6nias espanholas da América Central ¢ do norte da Amé- rica do Sul, A tltima crise, j4 no fim do século, veio com :) te conflico entre 2 Inglacerra e a Franga napoiednica que, em grande c, girou em tomo do dominio maritimo ¢ do comércio com/ as colénias_espanholas,) 0 Guc” sas_crises El colénias ¢ a competigao, entre as. duas ec mais desenvolvidas, pela exploragio do América. be” Para a Inglaterra a Franga,a América espanhola epee CS sentava, antes de mais nada, um mefeado Bara suas manufacuras e uma fonte da prata que lhes era essencial para a expansio de 4, Ss ya (DY Wrereads con sienidet ctl & prt Leer? 1pério espanhol ny w. *y & Ina et 19eleSet 4 4 WT oAdea Vee db Voy FAR CF i Qe Wa (rte Zpaiol vTiadea PeMeo® de fovig x sistems eho. 1S saloon helenae a seu comércio internacional ¢ para sanar os desequilibrios no sistema de bancos privados sediados em Paris e em Lyon, que, ' balango de pagamentos. Ao fim da Guerra da Sucessio, con- ‘Por sua ¥e7, era vital para 0 comércio com a India e a China, e tudo, as formas britinica ¢ francesa de penctracgo comercial para as cro1 e deficitarias Tinangas do Estado francés. na Espanha passaram a diferir. Menos desenvolvidos em ter- rata, de fato, continuou a dominar tréfico hispano-ameri- ‘mos econémicos ¢ comerciais que os britinicos, ¢ ligados & ©1717 ¢ 1778, ela representava 77,6% de seu valor Espanha como aliados em tempos de guerra ¢ pelos vinculos Bs da dinastia Bourbon, os comerciantes ¢ navegadores franceses ¢ ainda era tim negdcio de pro- tinham de se expandir internamente ao sistema de comércio | porgdes substanciais — 0 valor do comércio da América es- colonial espanhol, Aquela época centrado em Cédiz. Os acor- | Panhola, na década de 1780, sendo o dobro do das {indias f dos de Utrecht confirmaram as concessies feitas por Madi, \ Ocidentais Britanicas.2” no decorrer da segunda metade do século XVII, beneficiando Ja Os comerciantes ingleses de Cédiz. tinham menos im- os mercadores ¢ navegadores estrangeiros residentes em Cédiz. portincia. Eles usufrufam de outros canais de comércio com Essas concess6es inclufam direitos de extraterritorialidade, isen- as colénias da América espanhola, em especial a0 longo das tavam de alguns controles alfandegérios as firmas ¢ embarca~ costas do Caribe espanhol’ Entre Utrecht eo inicio da gue | Ges, e cobravam tarifas menores sobre algumas importagdes, de 1739, os britinicos administraram 0 contrato de forneci- como o linho francés ¢ outros itens selecionados.'® \ mento de escravos (0 asiento) para Havana, Veracruz, Carta- jp, Durante as décadas de 1724-78, hava, em méla ceca \gena e Buenos Aires, onde, além de escravos africanos, eles \ introduziaram mercadorias contrabandeadas. A partir da Ja- oe ph \ Além do mais, os mercadores franceses respondiam por | maica, os britnicos desenvolveram uma vasta rede de contra- '£3% do valor declarado dos comerciantes de Cédiz, — sendo | bando para Havana e Santiago, na ilha de Cuba, para as costas ‘Ye que os comerciantes espanhdis cram responséveis por apenas | de Campeche ¢ de Belize, ¢ para 0 tinico porto importante da Oe > 18%, STATE T7897- oF Francesc continitaram sendo a maior colS->\ |\Nova Expanha no Caribe, Veracruz. A Jamaica, além disso, 2° pia estrangeira em Cidiz, sempre conspicua e sensivel, como i servia tanto de entreposto quanto de base naval, ¢ de Id as ( também o era a feitoria brtinica em Lisbos, a alquer in- ) /forcas navais britinicas podiam ameagar as ilhas agucareiras @ fragio de seus direitos-estabelecidos em tratado. Uma porcen- francesas ¢ 05 portos hispano-americanos. Essa ameaga, como significativa dos téxteis franceses eniviados para Cédiz, / | se sabe, acabou por se materializar na guerra que teve inicio yw era reexportada, e a venda de linhos, las ¢ sedas franceses em | { em 1757, quando as forcas inglesas tomaram 0 Canadé ¢ ocu- es vot Cédiz tinha repercussGes importantes no emprego € nos rendi- ' param, primeiro Gua ¢ depois a Martinica! "| Ne se | mentos dos centros franceses de producto téxtil.!? A indvistria ‘Para a Espanha, a ascensio de Carlos TI représentou uma sk | francesa, além disso, absorvia quantidades aprecidveis das expor- oportunidade de reformar as atitudes tradicionais. E para a (| \qg® | !260es primérias espanholas — Ii erua, barritha, seda erua — Franga, que viu desabar seu império colonial na fndia ¢ no axis | bem como produtos do México ¢ da Guatemala, como co- Canada, e para a Espanha, despreparada para enfrentar sozi- © Qo! shinitha e anil. Apenas 1096 das cargas coloniais eram const | nha os ataques ingleses a suas zonas de comércio no Caribe, a 1 ARN tuldas de mercadorias espanholas, sendo 0 restante produtos ascensio de Carlos II foi a oportunidade de, afinal, renovar ‘ dos aliados franceses da Espanha, As vendas para as colénias | sua alianga dindstica de muitua conveniéncia. Carlos II e Es- espanholas geravam um contrafluxo de prata que alimentava 0 , seu principal colaborador, trazido e ele de Népoles, \ \ aa — doc tise de coutishuds ar meng fps R adv YK 7 oe KENNETH MAXWELL Hegemoniss antigas e novas 1) 2 f OW Me AS nones Gal yes wry tal como Pombal em Portugal, desejvam diminuir as presses sistema foi introduzido no Peru e, em 1786, no México. A ®\\y, | feitas pelos interesses comerciais ¢ manufatureiros franceses, articulaggo do novo sistema muito deveu ao visitante geral | que hé muito vinham usufiuindo de participaggo direta e indireta reformador da Nova Espanha (México){ José de Galvez)(176: |_| no sistema comercial transatlintico espanhol, Entretanto, havia 71) que, mais tarde, veio a sex, por longos anos, o see na colaboragio diplomitica ¢ militar franco-espanhola um para- cit objetivo, no- México; ABFA % | doxo semelhante a0 que existia na alianga anglo-portuguesa. onopélio sobre o tabaco (para au \ af Carlos fez, reviver os projetos de reformas_econdmicas { mentar a receita), a organizagio e a elevagio do imposto sobre «9 tragados anteriormente, por homens como‘Campillo) As pri- _ a8 vendas (a acaba) €o incentivo & produ ce prata (pela meiras medidas tomadas por Carlos e Esquilache foram as de \Ceedugo do prego do merctirio). i: por fim as concessOes tarifirias seiscentistas, que punham obs- ‘Na pratica, 3 ReOmETCAMETITAO espanol se mostrou li- i tdculos ao desenvolvimento das industrias nacionais, a0 que se mitado em seu impacto. A intervengio estatal nfo criou uma seguiu a padronizacéo das tarifas e dos procedimentos em to- base industrial de manufatura de téxteis, exceto ra Catalunha, dos 0s portos peninsulares. Dada a importincia do comércio onde as fibricas de algodao resultaram de iniciativas privadas, | \ colonial no total das transag6es externas da Espanha, Madri, ¢ no da iniciativa estatal. Em meados da década de 1780, 0 | wh i na verdade, estava transferindo grande parte da carga das re- comércio colonial expandiu-se, mas © aumento das transagoes yu ( \ \g. ceitas alfandegérias para os consumidores das colénias. O gover- coloniais parece ter-se baseado, em grande parte, no prolon-“ Tce \no de Carlos tentou também reduzir a participagio estrangeira gado surto da mineracio da prata mexicana e na exportacio “ mae so | 2e Nyce nas transagGes da Espanha com suas colénias, tentando, de produtos coloniais bésicos, em mais carregamentos em em-c* i en ‘efctivamente, aumentar a participacao as vantagens da Espanha barcagdes de baixa tonelagem € no insacidvel apetite europeu oe | ‘<0 gomeércio colonial. E, & luz da colaboragéo diplomstica e de- por prata e por produtos primérios.?5_ conjunta do poderio comercial e naval dos ingleses. ameaga a0 sistema, proveniente do noroeste da Europa con- “yA (sO impacto das novas medidas governamentais sobre a ‘tinuava existindo’ Os industriais e comerciantes britanicos, a0 | SS“/Amética espanhola variou consideravelmente de tegigo para /darem preferéncia a seus postos no Caribe, a partir dos quais regio. Uma conseqiiéncia imediata foi o agravamento das ten- | eles participavam de forma direta (¢ ilegal) dos mercados co- |sOes entre os espanhdis europeus € as velhas oligarquias brancas | loniais espanhdis, ao invés de usar © método francés, de par- _, \dos crioulos latino-americanos que, como deve ser lembrado, ticipacio via Cédiz, estavam, na verdade, apontando para uma_/ | {0X por varios séculos haviam encontrado um nicho politico nas / das falhas bésicas do projeto neomercantilista espanhol, tir | NV" © dministragoes locais de’ todas as Américas. As reformas dos Aeapacidade dos espanhdis para conter 0 contrabando origindrio \ Se Bourbons, em especial o sistema dos intendentes, foram, por- dos portos do Caribe inglés ou das ilhas holandesas e france- | “ot © ‘tanto, introduzidas primeiramente nas regiées onde a oposi- “sas, por sinal, demonstrava com clareza 0 que os mercadores | Gao das velhas oligarquias crioulas era menos formidavel: em sempre entenderam: que as miiltiplas tributagdes sobre as mer- ‘Cuba, apés 1764, eno rio da Praga, apés 176. $6 em 1784.0 cadorias, existentes sistema comercial formal da Espanha — Ly sick douctos TS terleras eM TS Dev oo 236, KENNETH MAXWELL \ | tarifas repetidas, comiss6es e taxas de seguros — serviam para \, oo ae © Ww eo |elevar 0 prego das mercadoriaslegais, na América espanhola, a / ; |niveis que compensavam os riscos do contrabando. A Os fabricantes de produtos téxteis franceses também néo ram capazes de prover o sistema colonial espanhol de mer- adorias que pudessem competir com outras manufaturas euro- péias, em termos de quantidade, qualidade e prego. Para proteger sua posi¢go competitiva, jé ento em deterioragio, os france- ag? ses defendiam os privlégios comerciais tradicionais que eles detinham no comércio colonial espanhol. Mas foi exatamente nesse particular que os industriais franceses passaram a enfrentar a competigio da propria Espanha, que vinha tentando reduzir a condigio privilegiada dos mercadores ¢ das mercadorias france- sas no comércio colonial. A premissa fundamental do mercan- _tilismo era a competigio, ¢ nfo a cooperagio econdmica. [Desse modo, € irdnico que tanto os agentes comerciais france- ses quanto seus colegas espanhéis tenham deixado de perceber gue, jd no tiltimo terco do século xvi, as politicas econdmi- cas, tanto francesas quanto espanholas, estavam sendo ult \passadas ida da economia internacional/O [ fesenvolvimento industrial inglés vinha gerando produtos jos presos e qualidade permiciriam a eles penetrat a quaseto-/ talidade das barreiras mercantilistas. (7 al Yao “Nem os espanhdis nem 0s Franceses ocupados no comércio we colonial com a América espanhola queriam reconhecer que a era do mercantilismo estava rapidamente chegando ao fim. £ irdnico que, em fins do século XVIII, os ingleses j4 haviam dado esse salto, principalmente em sua relacdo com Portugal, em parte por causa do relativo, sucesso das politicas de Pombal, € nao pelo fracasso destas; ¢ foi a Franga, ou, mais precisamen- te, Napoledo, que levou a questo a seu desfecho. Fermitam- me explicar, } _ Entre 1785 e 1790, 2 baianga comercial entre Portugal e a Gri-Bretanha chegou quase a uma situagio de equilibrio. De | 1792 a 1795, pela primeira vez durante todo o século XVII, \as exportagées portuguesas para a Gr-Bretanha apresentaram Aro, ANE PorvrXel & IMSRMENS wh Kine ft, Ait “Meals ofS bNolewos™ ~ Hegemonias antigas € novas 237 um superdvit em relacio as exportacGes britanicas para Portugal. part de de 1783, e, principalmente, de 1788, verificou-se unt, | crescimento répido nas reexportagées de algodéo cru brasi-| | leiro de Portugal para a Inglaterra — e, na primeira década do \ | século xnX, cerca de um quarto das exportagées de li de al- | | godio de Lancashire vinha do Brasil, principalmente de Per nambuco ¢ do Mat Walpole, 0 enviado britani Vem Lisboa, assistia estupefato a Gi | Lisboa para pagar por sua balanga de comércio, agora desfa- \vordvel. “sso deve ser visto como uma especie de fendmeno \disse ele a lorde Grenville, em 1791. Seng an diane por pra) ‘uma reversfo de circunstancias que teria gratificado bastante o velho e sutil marqués de Pombal, tivesse ele vivido o suficiente para assist-la. Entre 1786 ¢ 1788, foram conduzidas, em Lon-| dres, amplas pesquisas « respeito das transformacées ocorridas| na relagio comercial anglo-portuguesa. Tanto as antigas in-) dstrias de 14 € vinho quanto os novos interesses das manu faturas de algodio pressionavam 0 governo ¢ a comiss4o dq Privy Council for Trade. Os fabricantes de fio de algodio e dé chita © musselina de Manchester ¢ arredores eram especial- mente veementes, como o era também 0 Bailio e Condestével de Manchester.* Em 1801, lorde Hawkesbury deu a0 minis- tro britinico em Lisboa instrugées para divulgar que “em caso de invasio, 0 enviado britinico estava autorizado a recomen- dar que a corte de Portugal embarcasse para 0 Brasil [...] € gue [os britanicos} estariam, por seu lado, prontos para garan- tir a seguranga da expedicZo, ¢ para combinar com [o governo portugués] as maneiras mais eficazes de ampliar € consolidar [seus] dominios na América do Sul”. Isso representou_uma_surpreendente mudanga-de_pali tica, ‘Sua implemetfago imediata, porém, nio era facil — as\, (Otganizagées comerciais tradicionais ¢ seus lobbies continuavam \ {pocerosas — nfo apenas sob a forma das feitorias britain ey al ‘em Portugal, mas também dentre a nova burguesia com bit industrial portuguesa criada_por Pombal,JO governo bri- 238 KENNETH MAXWELL WS \ eanico, porém, tinha toda a clareza quanto a questo, Como \" Cpe" escreveu Robert Fitzgerald, 0 sucessor de Walpole em Lisbos, wih “(- lorde Hawkesbury, “...Jas propriedades britinicas nio repre- e || sentam um objeto de grande importincia nacional, principalmente '| quando, no outro prato da balanca, pode-se ver as numerosas cor” \vantagens a serem auferidas de um comércio aberto ¢ irrestrito com os Brasis”.2” Foi necesséria a invasio francesa de 1807 . para que os velhos interesses fossemn neutralizados. Nao se po- de deixar de pensar que teria sido melhor para os franceses se cles tivessem deixado em paz a peninsula Ibérica, quando, apés as vitdtias de Nelson, foram incapazes de fazer face & supe~ rioridade naval britinica no oceano Atlintico. Fato esse, por sinal, que 0s cidadaos de Liverpool perceberam com clareza, nessa época. ad by (eqoly (oto Mas se as politicas do ———— tanto na Es- panha quanto em Portugal, foram frustradas, e frustradas, note- se bem, tanto nos pontos em que deram certo quanto naqueles em que fracassaram, ¢ se o absolutismo esclarecido mostrou-se incapaz, a longo prazo, de evitar a inexordvel ascensio da he- [ecponis comercial ¢ naval britinica no sistema atlintico co- ‘mo um todo, o que dizer das foreas do protonacionalismo do outro lado do oceano — ser que podemos, aqui, falar de uma | idade da Revolugio Democritica, como propos Robert Pal- | mer, ou de uma Revoluggo Atlantica, na acepgo em que Jac- ues Godechot usou 0 termo? Ou seré que, ma verdade, estamos vendo uma transformagio de base mais econémica, |\do dominio direto para o indireto, do antigo império de co- \mércio poderio industrial formal para 0 novo ¢ informal? O ermento das inovacées ¢ as dificuldades de implementar re- formas nas Américas certamente haviam revelado 0 quio complexa a sociedade colonial hispano-americana havia-se tor- nado, em fins do século XVII, ¢ também o quio dificil seria, 4 toting |, ov Iytio inborn re Dhelicdos 10 SUR 2nXO yan woreda \¢ele fence (._Hegemonias antigas e novas na América espanholaf‘o surgimento de um foco regional a PFotonacionalista, ou a cria¢do de uma base social coesa, capaz de apoiar algum tipo de rebelio contra a | Espanha. Divisoes internas, de natureza social, racial e de cas- | tas permeavam a sociedade colonial, ¢ seria muito dificil, em | | qualquer parte da América espanhola, que espanhdis europeus | |, vivendo nas colénias, magistrados crioulos, soldados ¢ homens | de negécios locais viessem a se unit, nem que fosse num mo- | / vimento independentista embriondrio, do tipo que, mesmo | que brevemente, tornou to pertinente, no Brasil de 1788-89, } a idéia de uma Minas Gerais tepublicana e economicamente / \dependente, nos moldes norte-americanos__~ ‘© exemplo da Revolugio Americana foi de particular importdncia no Brasil, em razo da coineidéncia de sua men- sagem anticolonial e das graves tens6es existentes entre Lisboa € segmentos importantes da elite focal, na tnica drea dos ter- ritdrios americanos pertencentes a Portugal com capacidade de articular ¢ de concretizar um Estado independente, pos- \ suindo, como 0 fazia na década de 1780, receitas adequadas, Y forcas militares, experiéncia administrativa ¢ a atengio vol- (j-(* tada para os acontecimentos internacionais. © fato de ela ter\ falhado, apesar de todos esses elementos, indica o quio dificil| seria a consecugio da independéncia das colénias na América! ibérica.® ‘Movimentos sociais de protesto, é claro, surgiram na Amé- rica espanhola, e com violencia, derramamento de sangue € perturbacées muito maiores do que jamais ocorreram no Brasil, ond Jos movimentos-protonacionalistas do século XVINI, por ‘ais articulados que fossem, nunca passaram de conspiracbes, Os Snovinentide: wrotesto social da América Sp, tudo, eram[limitados em termos de contetido idealogicoyseles jamais deram o salto do protesto contra maus governos para uum ataque ao dominio espanhol na América. O mais significa- tivo desses movimentos de protesto ¢ rebelido, a revolta dos ‘Comuneros, em Nova Granada (atual Colémbia e Venezuela), no ano de 1781; ¢ a rebelido de ‘Tupac Amaru, no Peru do winlts, % wpe fags fv 240 KENNETH MAXWELL norte (atual Bolivia), em 1780-81, jamais se langaram a uma | jluta anticolonialista, e ambas, a tiltima em especial, serviram \\ | para aterrorizar as elites crioulas ¢ torné-las agudamente cons- cientes dos riscos de violéncia racial ¢ étnica implicitos na | complexidade da formacio social da América espanhola.” i Dada a heterogeneidade da América espanhola em fins do século XVI, o impacto desigual das reformas imperiais, a diversificacdo do sistema econémico ¢ 0 fato de elas terem representado uma reorientacéo em diregio ao sistema comer- cial do Atlantico, nas novas areas de crescimento periférico, como a Venezuela e 0 rio da Prata, bem como 0 limitado sentimento anticolonialista evidenciado nas rebeliGes da dé- (m cada de 1780,{6 hacionalismo incipiente era, quando surgia, mais |G Garacferistica de individuos descontentes que das massas. / ‘Estas tiltimas, dé wiandira geral, estavam mais preocupadas com as desigualdades ¢ com a exploragao imediatas do que com as 42 injustigas intrimperiais, essentindo-se mais da opresséo das ss da Coroa de Madri(Na verdad, oF re<_ | >, _[beldes, tanto do Peru quanto da Venezuela, apelaram 2 Coroa,) ‘em busca de repara¢io pelos danos softidos/“A nocao de inde-| | pendéncia da Espanha, de emancipasi0 do dominio colonial |europeu, ficava pois restrita a1um nimero muito reduzido de) |integrantes da elite branca crioula, tendo-se desenvolvido quando | \ |as revoltas supostamente populares de inicios da década de| 1780 jé haviam sido reprimidas, Suas aspiragGes, além disso, | ® eram de natureza mais reformista que revoluciondria e, em- \ . bora muitas vezes inspirados no modelo institucional da nova | 7 nacio americana, em termos de contatos no exterior ¢ de cx: | Cav®® |pectativas de auxilio, era para a Gra-Bretanha que eles lan-/ | (gavam ‘os olhos, € nao para-os EUA, ~~ \ ‘Na virada do século é verdade que as obras de John Adams, \A\ George Washington e Thomas Jefferson circulavam tanto no wnltl® México quanto na América do Sul, ¢ os principais ideres dos | ,£2 movimentos independentistas da América espanhola, de ma- 0. « neira mais notével [Francisco de Miranda.)visitaram os EUA, Ax come também o fez|Simon B Bol var que ¢ era um admirador de a Hegemonias antigas e novas, 241 ‘Washington. Miranda, contudo, resumiu a complexa reagio dos brancos aos acontecimentos de 1776, na América do Norte, € de 1789, na Franca: “Temos diante de nossos olhos dois grandes exemplos”, escreveu ele em 1799, “{...Ja Revolucéo ‘Americana ¢ a Revolugdo Francesa: imitemos com prudéncia a primeira e repudiemos a segunda”. Apés a revolta da colénia francesa de So Domingos)em 1792, da mesma forma como aconteceu no Brasil,jos grandes pr¢ Proprietirios de toda a América | (eSpanhola tornaram-se ainda mais cautelosos, principalmente |) \se suas propriedades inclufam escravos_africanos, Confess “gue, por mais que eu descje a liberdade e a independéncia do Novo Mundo”, observou Miranda, “temo ainda mais a anar- guia e a revolta,*° O impacto da Revolucgdo Americana restringir-se-ia, em geral, As'dreas periférica) da América espanhola. Pouguissimo impacto pdde ser percebido nas duas grandes regides centrais dos dominios espanhdis, 0 Peru ¢ 0 México, Em muitos as- pectos, os norte-americanas, em termos de comércio, influén- cia ¢ contatos, seguiram as rotas maritimas, € seu papel teve grande importincia no Caribe e ao longo das costas onde, hi muito, eles vinham participando do complexo comercial tran- satlintico como fornecedores de bacalhau, acticar, esctavos, gros, tabaco e, mais recentemente, de algodio/Mas aqui, foi o pa- = (‘Pet womercat nortameficano no sistetia comercial alanrico | \ que teve importincia decisiva. O comeércio de gréos, em par- | ticular, encontrou fregueses ficeis na peninsula Tbérica e entre 98 grandes senhores coloniais da América do Sul ¢ Central. © comércio, mais do que a ideologia republicana, seria o lema | das transagGes dos EUA com a Espanha ¢ Portugal. Essas po- | téncias, a Espanha em particular, haviam prestado auxilio de | manciras muito significativas A consecusio da independéncia_| | americana, ssa era uma conexio que pedia alguma cautéla, ~” “quanidoS€ tratava de ajudar € dar apoio aos revolucionérios do sul, pelo menos até o periodo napoleénico, quando, para to- dos 0s efeitos, os EUA obtiveram acesso direto aos portos his- pano-americanos, ¢ a Espanha, na prética, perdeu 0 controle 22 KENNETH MAXWELL administrativo direto de seu império americano, em razio- de 8 briténicos estarem no controle das rotas maritimas.*! No caso de Portugal ¢ do Brasil, ficou fartamente evi- dente que o impacto da Revolucio Americana no Brasil, que havia sido uma influéncia poderosa antes de 1789, diluiu-se e acabou por ser repudiado em meados da década de 1790, Esse reptidio deveu-se em parte ao fracasso da conspiragio nacio- nalista e republicana de Minas Gerais, ocorrida em infcios de 1789, mas também a contra-influéncia da Revolugio Fran- cesa, € particularmente da manifestacdo desta nas Américas, a grande revolta dos escravos nas Antilhas francesas, ‘As elites brancas do Brasil, tanto os proprietirios de es- cravos quanto os que se opunham & escravatura, descobriram, Keee§ [ao longo da década de 1790, que o republicanismo ¢ a de- mocracia eram conceitos perigosos demais para ser tentados em uma sociedade que era metade escrava, ¢ onde os negros Leram duas vezes mais numerosos do que os brancos. Como conseqiiéncia, os que, antes de 1790, acompanharam de for- ma dvida € aprovativa os acontecimentos na América do Norte, abandonaram 0 modelo norte-americano ¢, incentivados pelos portugueses, que haviam aprendido suas prdprias lig6es a par- tir da revolta das treze coldnias, abragaram a monarquia, no interesse da preservacio do status quo contra as sublevagées Ae | raciais e sociais. Uma interacio semelhante entre a cronologia das revolugGes ¢ as atitudes das elites teve lugar em todos os je Estados e ex-coldnias americanas onde a escravidio era anaigada v \ ‘Na América espanhola continental, a independéncia re- sultou de acontecimentos mais externos que internos:Jo pid>\ «(Gags mics de. ‘Bourbon, na Espanha, em face do_) S > atau napolednico de 1808. 08. Diferentemente de Portugal, onde {a invasio francesa trouxe um desfecho para os dilemas da re- {N"lagdo metrdpole-colénia, com a transferéncia da Corte por- tuguesa para 0 Brasil, ¢ 0 estabelecimento de fato (¢ miais tarde, de direito) do Rio de Janeiro como a sede de uma monarquia do Novo Mundo, na Espanha, na verdade, cortou os lagos entre a América espanhola e a velha metxépoie por um perfodo » Cerandy fageRs duas con “Hegemonias antigas e novas 243, critico de seis anos, entre (1808 e 181)com conseqitncias importantes para a unidade e a estabilidade da América espan- hola. Muitas das reptiblicas sucessoras da América espanhola tomaram forma obedecendo as novas fronteiras tracadas pelos reformadores oitocentistas, mas todas enfrentaram problemas macigs de cossio sociale de desondens econbmicis € adminis: trativas,] As presses conflitantes, que tinham origem na desi> vGuildade entre os graus de crescimento econdmico das diferentes regides do império espanhol na América, as am- bigitidades de uma reforma administrativa que, em parte, era uma tentativa de reagir a essas mudangas, bem como as muitas ten social da. Ameética espanhola serviram, todas, para limitar, an-: s sociais, étnicas e raciais que permeavam a configuragio we teriormente a 1808, o desenvolvimento de um sentimento anti- | @ colonial de base ampla, e fragmentaram as bases do apoio social | ‘/ | a um projeto nacionalista calcado no modelo norte-americano, | limitando portanto © impacto potencial do exemplo da Amé- | \tica do Norte. Aqui também, como ocorreu nas baixadas tro- )picais do hemisfério ocidental, o exemplo da grande revolta dos escravos ¢ dos conflitos sangrentos que dai resultaram, | ocorrides no Haiti, reforcaram 0 medo provocado pelos le-/ vantes de inicios da década de 1790, no Alto Peru, {Os que admiravai jo niorte-americano tenderam, apos 1808, a.vé-lo como a(opcio conservadora} uma salu para. diem 0, porém, que 0 pa ee canchuse joann da Europa. Em busca de uma G10 parceria eficaz, 0 mais comum era que eles se voltassem para a (eee € para 0 comércio internacional, abracando 0 iberalismo no sentido mo democritico "No que se refere 2 América Latina, principalmente as regides onde predominavam as economias de cultivo de pro- dutos primérios ¢ a escravidao africana, a0 tentarmos demarcar © fim do longo século XVI, € essencial portanto, examinar a relagio entre as trés revolugbes de fins desse século: a ameri- “liberalismo”, no sentido do acesso ao comércio mundial, enio/ x a er) 24 KENNETH MAXWELL Sana, a francesa ¢ a haitiana e, no que se refere 8 América espanhola examinar as vicissinides-da-experitncia sctecentsta com refotmas e rebelides,\Da perspectiva das Américas da \_ (Wuetr epoca, a gFaANdE revolta dos escravos, ocorrida em 1792 nna Séo Domingos francesa, foi uma segunda revolucio “ameri- cana”, que no parecia menos importante que a primeira. Ela twouxe pata o primeiro plano da conscigncia das elites os me- dos € as tensGes inerentes aos sistemas de grandes plantagdes de todo 0 Novo Mundo. Deateo dos impérios da Espanha de Portugal, a revolta haitiana serviu para estimular tanto uma reaproximacio entre 05 oligarcas locais ¢ 05 elementos mais império de Kngua portuguesa, quanto para tomar inevitivel como ocotreu na América exspanhola, que os movimentos inde-| ppendentistas, quando por fim aconteceram, deparassem sem| re com questes de raga case estabildade social, bes préximas a superficie (Se, na década de 1780, os latino-ameri- ‘Ginos que se viam como revofucionérios encontraram inspi- ragio em George Washington, na década de 90 se crispavam de medo diante do exemplo de Toussais A revolta haitiana teve também grande impacto sobre as atitades dos governos da Espanha, Franca ¢ Gea-Bretanha, com | relagdo aos movimentos independentistas nas Américas. Para a Grd-Bretanha, em particular, © Haiti fez com que o incentivo | as rebetides coloniais assumisse uma extrema cauitela, cas0 es- sas revoltas implicassem uma ameaga de instabilidade ¢ violén- |. cia tamanhas, a ponto de destruir a propria riqueza que, antes \ de mado o mais, havia atraico os comerciantes ¢ mercadores \y britinicos Aquela regio. Foi entdo que of ingleses Jogo come- |\saram a se aperceber das vantagens da solucio luso-brasileira \\aos difemas da época das revolugées atlinticas. Como John Batrow sucintamente colocou, em 1896: ‘As revolugées, cm Estados onde cada individuo tem interesse no bemestar geal, no sio jamais concretizadas sem as mais graves calamidades. Quais, portant, seriam suas conseqin- progressistas dos governos metropolitanos, como sucedeu no / “Hegemonias ancigas ¢ aovas 245 cias, num pais onde © ntimero de escravos excede 0 dos pro: rietéries do solo? Tenho fé de gue a Inglaterra jamais se en- whet no patrocinio de eevolugdes, estando convencids de que, or mais que a América do Sul tenha a ganhar com uma troca discreta de tenhores, com revolugées, ela logo seri lancada de voles 2 um estado de barbitic, om Da perspectiva britanica de inicios do s zOes para essa postura essencialmente conservadora nao sao | dificeis de discernir. As poténcias hegemdnicas, tanto as de | entio como as de hoje, jamais apreciaram ver ameagados seus | interesses, ou assistir a seus negécios serem destruidos.par u-/ di radicais e imprevisiveis /Os recém-independentes norte- ameriGanos foranr os priiciros a perceber a verdade por tris desses estratagemas € de strs implicagdes para a America es- panhola e para o Brasil. O secretétio de estado americano, John Quincy Adams, escrevendo em 28 de junho de 1818, resumiu a posiggo britinica perante 4 emancipacéo politica da América do Sul, a0 afirmar: [As revolugGes da América do Sul abriram um novo mundo para seu comércio, 0 qual a resturasio do dominio colonial cspanhol tomaria a fechar para cla. Seu Gabinete, portanto, | coneetea tum meip-termo, uma sofugio de compromisso entre a legitimidade ¢ 0 trifco... Ela accita todas as pretenses de legitimidade até que estas entrem em conflto com seus pré= pio interesses, crusformanno-se enelo na padlorira dos prin- cipios liberais ¢ da emancipasio colonial.** Apenas dois meses mais tarde, 0 enviado britinico ao Rio de Janeiro, Henry Chamberlain, de fato, escreveu secretamente a0 visconde de Castlereagh (22 de agosto de 1818), em termos que reflediam, de forma exaca, as suposiydes de Adams: [A sitvagio politica nesta parte do continente sub-americano al- terouse de tal forma, com 0 estabclecimento da sede da monse- quia portuguesa nos Brass, que uma madanga no sistema sob o 246 KENNETH MAXWELL qual a Espanha antes governara suas col6nias do Prata tomou- se agora necessiria ¢ inevitivel, mesmo que estas tivessem per ‘manccido leais. Blas, entretanto, desfizeram-se da lealdade, € ‘vém mantendo uma luta pela independéncia que j dura varios anos [...] Quanto ao Brasil, que deixou de ser uma colénia, para tomarse tum reino independente, aberto 20 comércio mun- dial, € impossivel retornar a seu estado anterior Entretanto, ‘como considero impossivel o restabelecimento da autoridade espanhola, parece-me que os -eais interesses de Sua Majestade Catdlica estariam assegurados, se ele, o quanto antes, pusesse fim a essa rivalidade, [...] de modo a prometer estabilidade, Or fim 3s revolugGes ¢ restaurar a prosperidade nesses belos paises, beneficiando assim o mundo todo, € a ninguém mais do (que & Gri-Bretanha.# Tanto John Adams quanto Henry Chamberlain estavam certos. As caracteristicas ¢ as opg6es que haviam sido as mar- cas do longo século XVII, no Atlintico espanhol ¢ portugués, ( haviam sofrido uma transformacio definitiva. No entanto, isso ‘Ocorreu, pelo menos em parte, porque as opgdes abertas aos dois importantissimos participantes do mundo setecentista do Atlintico sul, a Espanha e Portugal, foram, em grande me- dida, superadas ¢ destruidas. Para eles, o longo século XVII havia chegado ao fim. ‘Tradugao de Patricia de Queiroz Carvalho Zimbres Notas 1. Latin, America and the Enlightment, editado por A. B. Whitaker, Ithaca, 1961. Bascio-me, nesta segio, em meu capitulo “O Impacto da Re- volugio Americana sobre 2 Espanza e Portugal ¢ seus Impérios”, The Blackwell Encyclopedia of the American Revolution, editada por Jack P. Greene ¢ J. R. Pole, Oxford, 1991, pp. 528-43. Como minha palestra neste seminério, em Liverpool, teve a intengio de ser um ensaio inter- “Hegemonias antigas enovas, 247 pretativo, mantive apenas um niimero minimo de notas de rodapé. Nos ‘e250 em que baseei meus argumentos em meu préprio trabalho, a do- ‘cumentago completa poder ser encontrada nas fontes citadas. Nos de- mais casos, indiquei as principais contribuigées de outros estudiosos, sem fornecer uma bibliografia ampla, em cada caso. 2, Immanuel Wallerstein, The Modern World System, 2. vols., Nova York, 1980. 3. R. R Palmer, The Age of Democratic Revolutions, 2. vols., Princeton, 1959 ¢ 1964; Jacques Godechot, Les revolutions, 1770-1799, Patis, 1964 © L’Burope e PAmérique i Pépoque napolienne, 1800-1819, Paris, 1967. 4. Femando Novais, Portugal ¢ Brasil na crise do antigo sistema colonial, 1777-1808, Sio Paulo, 1978. Ver também Emilia Viotti da Costa, “In- ‘troducio 20 Estudo da Emancipagio Politica do Brasil”, em Brasit em perspection, ed.) Carlos Mota, Sio Paulo, 1969. 5. Nancy Farris, Mayn Society Under Colonial Rul, Princeton, 1984. 6... R. Boxer, Salvador de Sd and the Struggle for Brasil and Angola, 1602-1680, 1952, 7. Stuart B. Schwarz, Sugar Plantations and the Formation of Brazilian Society: Baba, 1550-1835, Cambridge, 1985 8. A. J. R. Russell Wood, Fidalyos and Philaathropists: The Santa Casn de Misericirdia da Babia, 1550-1755, Berkeley, 1968. 9. Catl Hansen, Economy and Society in Baroque Portugal, Minneapolis, 1981; também a obra clissica de C. R. Boxer, The Portuguese Seaborne Empire, 1415-1825, 1969, ¢ The Golden Age of Brasil, 1695-1750, Berkeley, 1962, 10. David Davidson, “How the Brazilian West was Won”, em Colonial Roots of Modern Brasil, editado por D. Alden Berkeley, 1971; J. R. Amaral Lapa, Economia colonial, Sio Paulo, 1973. LL. K. R. Maxwell, Conflicts and Conspiracies: Brazil and Portugal, 1750- 1808, Cambridge, 1973 (doravante citado como Maxwell, Conflicts and Conspiracies]. 12. H. E, S, Fisher, The Portugal Tinde: A Study of Anglo-Portuguese Commerce, 1700-1770, 1971. Também, Virgilio Noya Pinto, 0 Ouro Inasileiro ¢0 comércio anglo-portugués, Sio Parlo, 1979. 248 KENNETH MAXWELL 13, Macwell, Pombul: A Paradox of the Enlightment, Cambridge, no prelo [doravante citado como Maxwell, Pombal] e Francisco José C. Faleén, A ‘poca pombalina: politica econdmica e monarquia ilustrada, S20 Paulo, 1982, 14. Houve, é claro, comércio clandestino direto entre os mercadores britinicos e o Brasil, principalmente trafico de escravos. O tabaco de rolo da Bahia, grande parte dele proveniente das regides de Cachoeira e Mantiba, era a principal mercadoria de troca na costa africana, € tio necesséria a0s demais mercadores de escravos europeus quanto aos por- ‘tugueses {de José da Silva Lisboa para Domingos Vandelli, Bahia, 19 de ‘outubro de 1781, Anuis da Biblioteca Nacional, do Rio de Janciro (ABNRD, oo, 1920, 505; J. H. Rodrigues, Brasil and Africa, Berkeley, 1965, € Pierre Verger, Flux et Refluc de la Trnite des Nigres entre le Golfe de Bonin et Bahia de Todos os Santos dis Dix-sepri¢me au Dix-neuvitme Siecle, Paris, 1968. Cerca de cingiienta navios, corvetas ¢ embarcagées de menor porte, deixavam a cada ano a Bahia rumo a Aftica, quatro quintos delas dirigindo-se A Costa da Guiné, e as demais a Angola. [Lars dos Santos Vithena, Recopilagio de noticias soterpolitanas ¢ brastlicas (2802), 3 vols., Bahia, 1922, p. 35. Mercadorias europtias ¢ ouro em pé retornavam 3 Bahia juntamente com as cargas de escravos. O Secretério de estado paca os dominios altramarinos, Melo ¢ Castro, indignava-se com esse comércio clandestino, e também com 0 gran de controle exercido pelos ‘mercadores da Bahia sobre o comeétcio afticano, em detrimento dos comer- cGantes da metrpole. [“Instrucgio para o Marquéz, de Valenga", Martinho de Melo ¢ Castro, Queluz, 10 de setembro de 1779, aay, xxx, 1910, pp. 412]. Os baianos sempre se queixavam de serem forsados, pelos ‘outros mercadores de escravos que necessitavam de seu tabaco, a accitar mercadorias européias. [“Oficio do desembargador Gervsio de Almei- da Paes para o governador marqués de Valenga, no qual informa 2 ces- peito da referida devassa..., Bahia, 4 de fevereiro de 1788, iid, p. 529) ‘As manufaturas contrabandeadas, no entanto, tinham pregos menores que as importadas da Metrépole, restringindo assim o mercado para os produtos metropolitanos. [De José da Silva Lisboa para Domingos ‘Vandell, Bahia, 19 de outubro de 1781, ébid., p. 505.] O prospero negécio subsididrio que acompanhava o comércio de escravos ¢ tabaco contribuia para a balanca favordvel usufruida pela Bahia em seu comér- cio com a Metrépole. Grande parte do capital obtido era empregado na ‘Hegemonias antigas ¢ novas 249 compra de mais escravos. Martinho de Melo Castro afirmava que 0 funcionamento do comércio entre a Bahia ¢ a Africa era o mesmo que “segundo os ingleses, os franceses ¢ os holandeses, um livre-comérci através dos portos africanos, entre aquelas nagées ¢ os dominios por- tuugueses no Brasil, sem a intervengio dos comerciantes da metropole” [“Instrucgfo para o Marquéz de Valenga”, Martinho de Melo ¢ Castro, Queluz, 10 de setembro de 1779, Anny, XXXH, 1910, p. 444.) 15. José Jobson de Andrade Arruda, O Brasil no comércio colonial, Si0 Paulo, 1980; Joseph Miller, The Wiy of Death: Merchant Capitalism and the Angolan Slave Trade, 1730-1830, Madison, 1988, 16. Baseio-me aqui no trabalho de Stamey J. Stein ¢ Barbara Stein, “Concept and Realities of Spanish Economic Growth, 1759-178, Histéria Ibérica, 1, 1973, pp. 103-19. Ver também Carlos C. Noel, “Charles IIL of Spain”, Enlightened Absolutiom, editado por H. Scott, 1990, pp. 119-48. 17. John Fisher, Commercial Relations Between Spain and Spanish Ameri- cain the Era of Free Trade, 1778-1796, Liverpool, 1985; ¢ Antdnio Gar- ciaBaquero Gonzales, Cilia y el Auldntico, 1717-178, 2 vols. Sevilha, 197%. 18. Fernando Murillo Ribiera, ’Amérique et le changement economique de PEspagne du xvmn sitcle: administration et commerce, 11-26; Lutgardo Garcia Fuentes, El comércio espariol en Aménicn, 1650-1700, Sevilha, 1980; Miguel Artola, “América en el pensamiento espafiol del Siglo XVIIP, Revista de indias xx0%, 1969; e N. M. Sutherland, “The Origins of the 30 Years War and the Structure of European Politics”, Englith His: torical Review, Cv, julho de 1992, pp. 386-625. 19, Catlos D, Malamud, “Espa, Francia y el comércio directo com el espacio peruano, 1695-1730”; “Cédiz y Saint Marlo”, La economia xpafiola al final del antiguo regime: comércio y clénias, 1, Madri, 1982 ‘Também, Albert Girard, Le commerce francais Seville er Cadi ax tempos des habsbourgs: contribution & Pétude du commerce etranger en Espagne aus _xvt et XVIP stcles, Paris, 1932. 20. LAmérique espagnole a Pépoque des hamitres: Tradition — innovation —~ répresemtation, X\, Patis, 1987. Também o excelente panorama apre- sentado por D. A. Brading, “Bourbon Spain and its American Empire”, 250 KENNETH MAXWELL Cambridge History of Latin America, 1, editado por L. Bethel, Cam- bridge, 1984, pp. 389-439. 21. Dorothy Goebel, “British Trade to the Spanish Colonies, 1796- 1823”, American Historical Review, x1, 1938, pp. 288-320. 22. Allan Kuethe € Douglas Inglis, “Absolutism and Enlightened Re- form, Charles 1 and the Establishment of the Alcabala”, Past and Pre- sent, Ci%, 1985, pp. 118-143; e Jacques Barbier, “Indies Revenues and ‘Naval Spending: The Cost of Colonialism for the Spanish Bourbons, 1763-1805”, Jabrbich fiir Geschichte von Stans, Wirschaft wnd Gesell- schaft Latinamerikas, xX, 1984. 28. Jacques Barbier, “Peninsula Finance and Colonial Trade: The Di- Jemma of Charles 1¥’s Spain”, Journal of Latin American Studies, Xu, 1980, pp. 21-37; John Fisher, “The Imperial Response to ‘Freé Trade’: Spanish Imports ftom Spanish America, 1778-1796”, Journal of Latin American Studies, Xvi, 1985; € A. Garcia-Baquero Gonzélez, “Comét- cio colonial y producci6n industrial en Catalofia a fines del siglo xvi, Actas del I coliquio te histiria economica de Exparia, Barcelona, 1975, pp. 268-94. 24, Michael M. Edwards, The Growth of the Brith Trade, 1780-1815, Manchester, 1967; Arthur Redford, Manchester Merchants and Foreign Tide, 1794-1858, Manchester, 1934; ¢ [Robert Walpole] para [lorde Grenville}, Lisboa, 12 de outubro de 1791,PRO,FO 6/14. 28. “Minute of Propositions Impeding the Treaty with Portugal”, setembro de 1786, Chatham Papers, pR0 30/8/342 (2) f. 59; Office of the Committee of Privy Council for Trade, 25 de junho de 1787, PRO, Br 3/1, 102; [W. Fawkener] para [6 Bailio| e {condestivel de Manches- cer}. Office of the Privy Councit for Trade, 23 de agosto de 1788, PRO, Br, 3/1, 290. 26, De D. José de Almeida de Melo e Castro para Dom Jodo I, 1° de setembro de 1801, Arquivo do Instituto Histérico © Geogréfico Brasileiro, Rio de Janeiro, lata $8, doc. 17. 27. [Robert Fitzgerald] para [lorde Hawkesbury], Lisboa, 21 de ou- tubro de 1803, ROO, 63/42. 28, Maxwell, Conflicts and Conspiracies, especialmente pp. 115-40. ‘Hegemonias antigas € novas 281 29. Jobn Lady Phelan, The People and the King: The Comtenero Revolu- ion in Colombia, 1781, Madison, 1978, 30. Peggy K. Liss, Atlantic Empires: the Network of Trade and Revolution, 41715-1826, Baltimore, 1983. 31, John Lynch, The Spanish Ameritan Revolution, 1808-1826, 1973 The North American Role in the Spanish Imperial Economy, 1760-1819, editado por Jacques Barbier ¢ Allan Kuethe, Manchester, 1984; também ‘The Eaonanies of Hexic and Peru Dusring the Late Colonial Period, 1700- 1810, editado por Nils Jacobson e Hlans-Jiirgen Pubhle, Berlim, 1986. 32, John Barrow, A Vijage t0 Cochinchina in the Years 1792 and 1793, 1806, pp. 133-4; Ver também John Lynch, “British Policies and Spanish Anmetica”, Journel of Latin American Studies, 1, 1969, pp. 1-30; Si0 Domingos havia estado produzindo cerca de 40% do agiicar consumido em todo © mundo, ¢ mais da metade do café, segundo David Geggus, quando a revolta dos escravos de 1791 ocorreu. © governo de William Pitt ¢ Henry Dundas enviou para a morte, em Sio Domingos, cerea de 15 mil soldados, ¢ gastou cerca de der milhGes de libras tentando con- quisté-la. Geggus chama esse episédio de “um dos maiores desastres da histéria imperial britinica”. D. Geggus, “The British Government and the Saint Dominique slave revolt, 1791-1793”, EHR, XCVL 1981, pp. 285-305. 33. Diplomatic Correspondence of the United States Concerning the Inde- penence of the Latin American Nations, editado por William R. Man- ning, 3 vols, Nova York, 1925, 1, p. 72. 34, “Britain and the Independence of Latin America, 1812-1830”, Se- lected Documents from the Foreign Office Archives, editado por sir Chatles ‘Webster, 2 vols. 1938, 1, pp. 190-3.

Você também pode gostar