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Cone cc : Brilhante militarrusso Rao eset ie Semen) eee eax Meee Coen Cee OMRCUee Procure AR ee aes a : Bye Ney. Ed LOUCOS ANos 20 eee . ; x oN : 4 ROC Tee MUU Ce ste ee MUR K be Letty paises em consequéncia de guerras, terrorismo e perseguicoes BLACK BLOC: motivacoes e incoeréncias de um grupo que nao é um movimento e nem organizado Um livro em que o mito e o homem sdo revelados sem censuras NCR een Ne ea EDITOR Pe Preece eeieel escdla IMAGEM PARA A HISTORIA |Ret@ncraniel Nao! A Imagem para Histéria dessa edicdo é de um campo de refugiados na Europa, em 2016. Embora as condicdes sejam péssimas, esses espacos so a nica alternativa para milhares de mi Srantes e refugiados que tentam chegar ao Velho Continente, para escapar da miséria, violencia e perseguicao. Porém, quando eles conseguem atingir as fron: teiras da Unido Europeia (UE), da pior forma possivel, também descobrem que a seguranca permanece fora do proprio. aleance, fato que explica 0s rostos can. sados ¢ angustiados da grande maioria, que se vé perdida em um novo territério, onde verdadeiras fortalezas de arame farpado os mantém isolados da vida cotidiana que tanto almejaram e que forcam medidas desesperadas frente aos sistemas sofisticados de vigildncia e equipes de guardas de fronteira, A situacao € drastica! Mas os maltra- tados e expulsos ilegalmente, sem acesso 0s procedimentos de asilo, sob ameaca de detencao e condicdes que os colocam em grave risco, ainda preservam a exis téncia e, em consequéncia, a esperanca, diante da lembranca das incontaveis pes- soas que, desde 2000, jé morreram, ten- tando fazer a mesma jornada. Se nio bastasse, de forma contradi- tria, até o século 20, o acolhimento de refugiados tinha respaldo popular. Mas, hoje, devido aos atentados terroristas, aqueles que chegam Europa, causam aumento de brutalidade, intolerancia e até repugnancia, devido a insatisfacao das sociedades locais que, embora ale- ‘guem no compactuar com acdes extre- ‘mas, as colocam em prittica com seus se- melhantes, esquecendo-se que o Velho Continente também foi responsavel pelo imperialismo, colonialismo e ditatoria- lismo que, por anos, desestabilizaram tanto 0 Oriente Médio quanto a Africa. = LEITURAS DA HISTORIA | 3 = INOSSA CAPA are BS roe P CCU Se ea c Eatiiet ES aes scu) , uma legiad de sirios, paquistaneses, Pee eI 6 ESTHER SOLANO E WILLIAN NOVAES Black Bloc:quem séoos masca- rados que quebraram portas de bancos e de concessionérias de carros importados, enquanto enfrentavam toda a repreensao imposta a eles com uma violén- cia singular? 20 EXERCITO VERMELHO Aleksandr Vasilevsky qui via apenas ser engenheiro agrénomo, mas, a0 se alis- $ tarnoExército Imperial Rus- soacabouporserevelar um ilitar habile sensato DITADORES OU TIRANOS? Apesar de préximos na teoria ena pritica, esses 80 conceitos. distintos. Espécimes de duas ce- pas diferentes, pelo me- ‘nos no sentido classico, mas que usam 0 poder de maneira nefasta Seré que a legitima via democré- tica, que seria uma inteligente ¢ ativa cobranca dos representan- jf tes do povo, foi simplesmente suprimida e trocada pela esta tégia de vencer pelo cansago € pelo grito? i a il REVOLUCAO MEXICANA Responsvel por importantes transformacdes no pais latino-americano do norte, embora a Revo: lugao Mexicana tenha se iniciado em 1910, ela continua viva e polémica até os dias de hoje 56 MONA LISA DE ISLEWORTH Novos estudos sobre a gra- ciosa verso da obra-prima de Leonardo parecem in car que 0 quadro seja real mente auténtico 40 REFUGIO DE CONHECIMENTO Conhega 5 majestosas bibliotecas, seja pelo acervo, singularidade ou historia. Muito mais do que leitura, elas sao locais de contemplagdo, reflexdo e descobertas 4 | LEITURAS DA HISTORIA 0S LOUCOS ANOS 20 No inicio da década de 1920, enquanto a Europa passava por uma crise motivada pela desvalori- zago da moeda e aumen- to de precos, se via envol- ta em conflitos socials, num periodo de latente inquietacdo e instabilida- de, devido a paz aparente, i que, na Alemanha ena Italia, onazismo eo fascis- ‘mo iniciavam caminhadas galopante, sua Gnicaalter- nativa era pedir dinheiro emprestado aos bancos nnorte-americanos, ee Secdes imagem paraa Histia 12 Foose resisros 18 Datas 19 Limos eautres 26 jnelapareo passed 54 Opinibo 64cartes (65 Vejana proximal 66 Gente e sociedade EDITORIAL “O sonho acordado 6 ter dinheiro suficiente para viver num pais em que eu nao saiba a lingua e o que est acontecendo.” Paulo Francis (4930-1997) 60 pseudSnimo de Franz Paul Trannin da Matta Hellborn. Tragédia ou massacre? Quando nos referimos ao éxodo de refugiados que ocorre principalmente na Europa, por meio do Mar Mediterraneo, nos deparamos com um dilema mérbido: “tao préximo, po- 16m tdo distante”. Isso porque embora esteja ali, a apenas al- gumas horas de barco, a Unido Europeia nao esta disposta a ser um destino para essas pessoas. Asmanchetes se sucedem, trazendo mais e mais mémeros de mortos, ¢ todos sabem que os constantes desastres e afo -gamentos tém um carrasco: a Politica ~ a mesma que motiva 08 desajustes sociais e causa as fugas em massa. Tudo isso seria evitavel, porém a politica europeia esta determinada a tornar a viagem para aquele continente 0 mais dificil possi- vel para quem muito necesita de asilo. O artigo 4° da Convengao Europeia dos Direitos Humanos diz, inquestionavelmente: “E proibida a expulsao coletiva de estrangeitos.” Ele nao qualifica e nem abre margem, é inten- 80 por principio, mas marcado por sequelas: a primeira linha de um recente acordo entre a UE ¢ a Turquia, por sua vez, afirma que: “Todos os novos migrantes irregulares que cru- zam da Turquia para as ilhas gregas a partir de 20 de marco de 2016 serio devolvidos para a Turquia.” Apenas por deslize de interpretago linguistica nao se pode entender isso como uma “expulsdo coletiva”. 0 Conselho Europeu de Refugiados ¢ Exilados sempre foi uma parte da estratégia de contencao do assédio de imigrantes ilegais. Mas agora, diante dessa ca- CONSELHO EDITORIAL Foium jomalisa,crtico de literatura e ate, e escritor brasileiro. tastrofe humana, tomou-se a plataforma alinhada e expli da politica antirrefugiados da UE. Milhares nao conseguem passar para a Europa e os lo- cais reservados para acomodar quem consegue superar as desventuras da travessia oferece, segundo a Anistia Inter- nacional, “condigdes desumanas”. Seja em Lampedusa, na Itélia, onde o prefeito da ilha comparou 0 acampamen- toa um campo de concentracdo; ou na Bulgaria, onde os migrantes vivem atertorizados com a constante ameaga de agressao racista; ou em Calais, no norte da Franca, onde autoridades resolveram demolir as casas improvisadas em que 0s refugiados eram forcados a viver - mesmo sem terem algum outro lugar para ir. Os governos alegam ter muita dificuldacle em lidar com 0 nimero alarmante de imigrantes, e existe 0 panico pela segu- ranca provocado pela ameaca do Estado Isldmico. Por fim, a UE esta obcecada em controlar a imigracdo ilegal, entdo, os ntime- 10s ndo so o problema, a vontade politica, sim. Mais de 22 mil pessoas morreram tentando chegar & Europa deste 2000. Eles queriam atravessar a fronteira para salvar suas vidas, mas em vvez disso, a fronteira os matou... enada mudou, ainda. Até-a préxima edicdo, escreva-nos! ta Valter Costa leiturasdahistoria@escala.com.br (© Consetho ea redagda nao seresponsablizam pels artigos ecolunasassinados por espcialistas suas opines nelesexpressas) ‘Vale rancisco Muraro, professor door da UFSC responsivel por dscpinas sobre Brasil Colonial, Misses esticas, Teoria da stra eColonzaro,Cuturaeldentidade. Publica mais levantes:|avntude Opersia Catia: Ua Utopia Oper, Bbingrafia Cicada Etografia Guarani, Pade Anta Wir: Rerica engl ‘Monica Grin 6 profssoraajunta em Hsia Modem e Contemporinea do Departamento de Mistria edo programa de ps raduac3o em Mitra Soil da Universidade Federal do io dejan, Areatemstica de ensinoe pesquisa: pbs aboio, tilda relagBes racks, racismo,ant'ssemitismo, iigragdoeestodasjudaios. ‘nan Esperanca Rocha, doutor em Hstria pela Universidade de Sio Paulo (USP), professor de istrla Aten junto ao Departamento de Wistra da UNESP, campus de sss. Mara Helena Capelato, professor ular do Departament de Hisria da FL.CH (USP, pofesora de Hsia da América Independente no mesmo departamento,pesqusas deservokidas em Histria do Brasil eHistria da América: estadoscomparados, chef do Departamento de Histria da FLCH da USP, coordenadora do comit de avalagbo na fre de Hist ~ CNP, Publica principas: 0 Bravo Matutno em coautoria com Maria Liga Prado), Alia Omega, 1982, Os Arautos do ibealsm: prensa Paula 1920-1945 ed. Brasliense, 1987 Marcos Aatonio de Menezes & professor Adjunto do Dept. (att edo programa de ps graduaio (Gina) em Histria da Universidade Federal de Goi. Doutor em His- tra da ultra pela UFPR membso do conseho editorial da revista AtCutura. Publiou, em 2000, pela eltora Cone Sul Othaes sabre a Cidade: NarativasPoéticas das ‘Metrépoles Contemporaneos. Marcos Anta Lopes 6 doutor em Histria pela Universidade de Sto Paulo professor do Dept, de CidciasSocias da Universidade Estadual de Londrina.Pesquisador do (Pa (Bolsa Produtvidade em Pesquisa). Coautor de APeste ds Almas: Hsia de Fanatsmo Eitora FG) e autor de Votaire Poco Ecora Unesp) VotaireHISTORAdor (Papi, Voto Ler (imagincio). ilo Gra 6 pressor doutor de Hist Antiga e Medieval da UFF (Campos ds Goytacazes), doutor em Histria Cultural pela Unicamp, mestreem Histvia Social pola UFFe oordenador do Nido de Estudos em Histria Medival,Atigae ArqueologiaTransdiscplina(NEHMAAT) ‘Sidnel Muniz doutor em HistriaEcondmica pela USP Professor da rea de sia Contepornes na Universidade Estadual de Narngs(UEND: do programa de ps-gadua~ (oer Histra(UEM), do Programa de pés-graduaro em Histra Comparada (UFR) edo Consércio Programa Rode ane de Estudos de RelarBesIntemacorals, Segurancae Defesa Nacional (CPR Prodees).Prncipaspublicacbes: “Rots and Looting in So Paul City 1983" ILA, University of Glasgow, 1996. Fl um dos organizadores com Francisco (ats Tica da Siva} da tnciclopéca de erase Revaldes do SéculoX Elsevier/Campus, 2008, LEITURAS DA HISTORIA | 5 ENTREVISTA | Esther Solano e Willian Novaes Va Viele ay By ve ess ? Esta é a pergunta que nao se cala desde junho de 2013, més em que uma invasdo inusitada e violenta surpreendeu o povo que ocupava pacificamente as Cee eC OMe oc OCR RCC CRBC Com lc beer Utd assado mais de trés anos das Movimento Passe Livre, nao da para esquecer que Sao Paulo foi surpreendida por mascarados que, misturados aos demais manifestan- tes, comecaram a quebrar portas de bancos e de concessionarias de carros importados, enquanto enfrentavam com uma violéncia singular toda a re preensdo imposta a eles. Apés as pri meiras cenas de depredacao que, cer- tamente, tirou o sono das principais autoridades do Brasil, os adeptos da tatica Black Bloc tomaram conta dos noticiarios, momentos em que foram rotulados por preconceitos reforgados pelo foco especulativo da imprensa. Mas como ninguém sabia quem real mente eram eles, a pesquisadora, socidloga e professora da Universi- dade Federal de Séo Paulo — Uni fesp, Esther Solano Gallego, entrou no mundo, na cabeca e no cotidiano dos jovens protagonistas das cenas MANIFESTANTES “BLACK BLOCK” PROTESTAM EM PASSEATA CONTRA O GOVERNA\ de selvageria que assustaram a capi tal paulista e, em seguida, a maioria das cidades brasileiras. Desse contato emergiu a visdo que os mascarados tm de nosso pais, da sociedade, das autoridades e de si mesmos. A partir daf, ela se uniu ao jorna- lista Bruno Paes Manso que, durante uma cobertura jornalistica feita para um jornal de Sao Paulo, também pas sou a entender 0 raciocinio desse gru po. Mas ainda faltava dar a palavra aos adeptos da tatica. Entdo, coube ao também jornalista Willian Novaes mostrar tanto as origens distintas dos membros quanto 0 discurso conver- gente contra o sistema pol vigente no pais, bem comoa versio do coronel da Policia Militar que foi agre dido pelos mascarados. Com todo o trabalho finalizado surgiu & obra 0s Mascarados: A ver: dadeira histéria dos adeptos da tatica Black Bloc, de autoria dos trés. Polé mica para alguns e esclarecedora para ico-social 1DOR SERGIO CABRAL, NO RIO DE JANEIRO “Quem depreda pequeno comércio ou rouba nao é um adepto da tatica Black Bloc” outros, ela pretende acabar com os achismos e ainda esclarecer as estra- tégias e objetivos do grupo de preto, Por isso, considerando que ha grandes possibilidades de eclodir novas ma- nifestagGes que, inegavelmente, iro trazer de volta os mascarados para as ruas, decidimos entrevistar Esther So Jano e Willian Novaes para tentarmos entender a realidade do Black Bloc em meio ao contexto politico-social que vivenciamos na atualidade. = Quando, onde e por que surgiu 0 Black Bloc? Podemos dizer que se trata de um movimento ou nao? ‘Surgiu nos anos 8o, na Alemanha, a par- JRAS DA HISTORIA | 7 ENTREVISTA | Esther Solano e Willian Novaes MANIFESTANTE BLACK BLOC DURANTE UM CONFRONTO DIRETO COM A POLICIA, APOS UMA TENTATIVA DE INVADIR A ASSEMBLEIA MUNICIPAL DO RIO DE JANEIRO tirdos movimentos autonomistas, coma proposta cle ser uma tatica de protesto, sem lider, estrutura de poder ou cargos. E 6 exatamente essa estrutura auténoma que ainda confunde as avaliagées sobre © Black Bloc que, por sua vez, nao é um movimento. Na Alemanha daquela épo ca, por exemplo, 0 Bloco Negro dividia as manifestagdes de rua com os Blocos Verdes dos ambientalistas ¢ os Blocos Vermethos dos sindicatos. wee cA iONA — Quais so as principais ti ticas que os adeptos usam? = A violéncia performatica, simbélica contra alegorias do capita lismo e do sistema, além do preto e da mascara para representar tanto unida de de pensamento quanto a dissolugao da individualidade, — 0 que eles visam quando atacam os simbolos do capitalismo? — Provocar um debate so: bre a violéncia do sistema. Segundo eles mesmos, 0 verdadeiro vandalismo no provém do Black Bloc e, sim, do sistema. Portanto, eles querem atrair a atengao da midia para essa reclamacao. £ inegavel que a violéncia simbélica ou espetculo atrai os flashes. Consequentemente, a 16- gica do Black Bloc funciona da seguinte forma: uma manifestagdo pacifica nio chama a atencao dos veiculos de comu- UM POLICIAL CAMINHA EM FRENTE DE UM ONIBUS INCENDIADO PELOS BLACK BLOCS nicagdo; no maximo, ela vai conseguir ‘uma nota de rodapé. Ja ao destruir a fa- chada de um banco ou de uma concessio nétia, 0s adeptos conseguem a atencao. $6 que aqui no Brasil os ataques ficaram majores que as manifestaces e as pro- prias pautas do Black Bloc — De que forma e quando a tética dos mascarados chegou ao nosso pais? — Fundamentalmente nos anos 90, coma Cultura punk, mas ressurgecom forca nas lutas antighobalizagao dos anos 2000. — Qual o perfil dos adeptos bra- sileiros? Eles sao politizados? — A maioria 6 politizaca sim! Eles tem uma percepcio bastante estrutura- da dos problemas do sistema brasileiro e conseguem formular bem sua critica. S80 jovens ce periferia e semiperiferia que tra- TKO) INFANTIL balham, estudam e utilizam os servigos pliblicos precarios da cidade. — Eles tém consciéneia de que suasagdes impéem certo medo entre as autoridades e 0 povo? — Segundo a visio deles, esse medo vem da visio distorcida que a im prensa apresenta sobre as ages do Black Bloce da truculéncia que a Policia Militar exerce nas manifestagoes. ENTREVISTA | Esther Solano e Willian Novaes BLACK BLOC DEPREDA UM BANCO DURANTE UMA MANIFESTAGAO — Como éa percepcao que eles tém de nosso pais, da sociedade, das autoridades e de si mesmos? — Uma percepcao muito criti ca que nao difere muito da maioria dos cidadaos. Eles sao fortemente apartidarios. Portanto, contrarios a ideia de partido, por considerar que so estruturas de poder que nao re- presentam a populagdo, mas sim os interesses das elites. — As roupas e mascaras pretas que os grupos usam para garantir 0 préprio anonimato nao permitem a infiltragéo de baderneiros que dis- torcema intengao deles? — Eu acredito que isso é incon- trolavel, eles nao focam nisso, mas, com certeza, existe a infiltracao de ar- ruaceiros. No entanto, enquanto acom: panhei 0 Black Bloc durante as mani- festagdes que ocorreram em Sao Paulo, no vi essa distorgo, excetoem apenas tum caso, no qual houve saques realiza: dos em varias lojas no centro da cidade. Mas como 0 bloco normalmente era for- mado de 70 a 80 jovens, os baderneiros no ficavam até o final. Entdo, nao ha muito que se fazer. 10 | LEMTURAS DA HISTORIA — Ha alguma estratégia que esses mesmos grupos utilizam para restringir a ago desses elementos? = Os adeptos acabam reconhe cendo esses individuos pelos seus com- Portamentos. Quem depreda pequeno 1m adepto da comércio ou rouba nio é tatica Black Bloc. — 0 que levou os senhores a abordar o tema em um livro? — Era um assunto que levantava muito interesse social e da imprensa, mas normalmente abordado de forma superficial e enviesado. Nos- sa ideia era desmistificar este fendme no e entender 0 que realmente signi: fica, sem pré-julgamentos, escutando 05 protagonistas. Portanto, o livro é um registto da histéria no momento em que ela acontece. Sem o distancia ‘mento, propositalmente, para mostrar para sociedade um raio-x daquele ins- tante especifico. Além disso, devido a falta de informagao imparcial sobre essa tatica, j que 05 veiculos sempre satanizaram os jovens mascarados, a proposta foi desmascarar as razdes © quem sao os adeptos. E nés acredita mos que conseguimos! — Ap6s as primeiras cenas de violéncia presenciadas, enquanto fa- ziam o trabalho de campo, quais os conceitos que conseguiram desmisti- ficar em relagao ao Black Bloc? — Eles nao tém relagio pa tiddria. Sao poucos, embora pelas maté- rias da grande imprensa paregam mui- tos, nao fazem uma grande destrui¢ao e ha divergéncias entre eles mesmos sobre ‘uso da violencia. 0 que vimos eram jo- vens descontentes com o rumo do pats. Entre eles, além de praticantes engaja- dos no anarquismo, havia varios que tinham as suas proprias motivacées. Identificamos, entre muitas particula- ridades, a de descontar no Estado e nos bens privados a revolta pela violéncia policial que sofrem na periferia, 0 racis- mo da sociedade e até 0 assédio sexual. De certa forma, os adeptos formam uma boa amostra da sociedade brasileira, principalmente dos jovens. — Se os adeptos Black Bloc 86 atacam estruturas materiais ca- pitalistas, o que alega 0 coronel da Policia Militar Reynaldo Rossi sobre ‘a agressdo sofrida no terminal Dom Pedro, no centro de Sao Paulo, duran- “Alguns [adeptos BlacK Bloc] defendem que violéncia s6 pode ser simbélica e contra objetos” te os protestos do Movimento Passe Livre em 2013? ES — Essa é uma das questdes de di- vergéncia, alguns defendem que violencia 86 pode ser simbélica e contra objetos, enquanto outros defendem a brutalidade contra. policia porque, conformealegam, €uma corporagao violenta nas periferias e também contra os manifestantes, 0 coro- nel nao era um inimigo pessoal do Black Bloc, mas sim uma pessoa fardava que representava a Policia Militar. A violencia que ele sofreu poderia ter sido direcionada a qualquer soldado ou outro agente do es- tado. 0 proprio coronel em entrevista avi- sou que outros policiais também sairam feridos das manifestagdes. LM — Pelo senso comum, toda ago Black Bloc 6 anarquista, mas especialistas dizem que essa concep- 40 € err6nea. Por qué? ES — Porque, embora a ideologia principal deles seja 0 anarquismo, eles também se identificam com pautas na- cionais que consideram validas, como por exemplo, a reducdo da tarifa, a luta dos secundaristas, 0 Nao vai ter Copa, entre outras. Lil — Se nenhuma manifestagao pacifica atinge quem est4 no poder, Por que o Black Bloc ainda é tao re- pudiado por uma sociedade que pede mudangas urgentes? ES — Porque 0 uso da violéncia sim- bélica é muito polémico e dificil de ser entendido pela populagao. Li = Considerando a crise que vivenciamos na atualidade, é pos: vel fazer alguma observacao sobre 0 tema relacionando-o a ela? WN ~ Estamos vivendo uma épocade extremos, polarizada e dividida. A popu: Jago ainda nao captou que os adeptos do Black Bloc sao independentes. Na verda- de, ninguém acredita nisso, Mas muitos agem por impulso para criminalizar, seja para um lado, como pata 0 outro. 0 Partido dos Trabalhadores é identifica do como os mantenedores por parte da populacdo. J4 a esquerda acredita que os adeptos Black Bloc sao financiados pela direita para desestabilizar o pais. E tudo feito no achismo, sem a constatagéo in loco. Mas a violéncia simbélica esté sendo usada até por personalidades da imprensa e da sociedade em geral, que emitem opinides raivosas ou racistas e, assim, elas acabam se tornando figuras legitimadas por parte da mesma socieda- de. Esse é um dos perigos que presencia ‘mos com as polémicas que surgiram du. ante o langamento de Mascarados. Em varias circunsténcias fomos acusados de defender o Black Bloc, mas, o que é pior, 6s acusadores nao leram nenhuma linha do livro! Por isso, volto a frisar o proble: ma doachismo. A sociedade precisa, pri meiro, qualificar-se e entender o assunto, em ver de optar por palavras fceis.m MASCARADOS: A VERDADEIRA HISTORIA DOS ADEPTOS DA TATICA BLACK BLOC O livro escrito a partir da visio da pesquisadora, socidloga e profes- sora da Universidade Federal de Sao Paulo = Unifesp, Esther So- ano Gallego, e pelos relatos tanto do jor nalista Bruno Paes Manso quanto dos préprios _adeptos 5 do Black Bloc, bem oo SOBRE OS AUTORES como de um coronel da PM agredido pelos mascarados, revela os objeti vos do grupo de preto, a forma com que so tracadas suas acées e como funcionam as estratégias dele, na in- tengo de mostrar que os anarquis- tas, apesar dos rétulos que a midia Ihes impde — dentre eles selvagens e filhinhos de papai —, tem um intuito definido, perante os problemas so- ciais causados por um desgoverno. Por isso, além de a narrativa ressal- tar a verdadeira historia dos inte grantes, ela ainda ajuda a desmisti ficar os preconceitos que sao embuti- dos pela midia quase sempre parcial. Com 336 paginas, o exemplar fisico custa cerca de R$ 34,90, enquanto © E-book R$ 19,90. Publicado pela Geraco Editorial, ambos podem ser encontrados nas melhores livrarias, inclusive as virtuais. Da esquerda para a direita, des- tacam-se Willian Novaes, jornalis- tae atual diretor da Geraco Edito- rial, que jé trabalhou nas redagées de Isto£, Didrio de S. Paulo e Did rio do Grande ABC; a doutora em Ciéncias Sociais pela Universidade Complutense de Madri e também professora de Relacoes Internacio- nais da Unifesp, Esther Solano; e Bruno Paes Manso (0 tnico autor ‘com quem nao falamos), economis- tae jornalista, que atuou como re- pérter no jornal 0 Estado de S. Pau- lo, na Revista Veja, Folha da Tarde e Folha de S. Paulo, LEMTURAS DA HISTORIA | 11 FATOS & REGISTI VESTIGIOS DA BIBLICA CIDADE DE EZEQUIAS Tl Apés meses de escavacées, arqueé: logos israelenses descobriram um san: tuario do século 8° a.C., no Parque Na- cional Tel Lachish, entre 0 Monte He: brom e 0 Mar Mediterraneo, em Israel, cujos altares foram intencionalmente destruidos, tanto que uma latrina de pe dra — nunca usada — fol instalada entre eles, na intencdo de profanar a sala sa- grada. Como no local também ja foram escavados um grandioso portio, resquit cios de bancos com apoio para os bra 608, seis cdmaras divididas por uma rua BRASIL TEVE 5 12 | LEMTURAS DA HISTORIA central, alguns cdmodos, diversos jar ros e frascos, alguns com selos reais, além de pontas de flechas e pedras de fundas, que indicam batalhas corpo a corpo na entrada da cidade, em consen- 80, 05 pesquisadores passaram a afir- mar que tais evidéncias vio de encontro @ censura e a idolatria, conforme des- creve a Biblia, “Essa descoberta é um exemplo iluminado do verso que des- creve o rei Ezequias’, enfatizou Zeev Elkin, ministro de Jerusalém e de Prote: 40 do Patriménio e do Meio Ambiente. Mi conforme dados da 10° edic¢do do Anuario Brasileiro de Seguranga Pi blica, produzido pelo Forum Brasileiro de Seguranca Pablica (FBSP), que con- siderou somente os boletins de ocor- réncia registrados em 2015, ocorreu um estupro a cada 11 minutos e 33 se: gundos no Brasil. 0 estado com 0 maior nimero de casos foi S40 Paulo, que responde por 20,4% dos estupros no pais, com 9265 dentincias. Apesar do alto indice, houve uma reducdo de MAIOR RESERVA MARINHA DO MUNDO ee WA partir de dezembro de 2017, uma area de 1,55 milhiio de quilémetros quadrados, localizada no quase intocaclo Mar de Ross (na imagem), na Antértida, tera protecdo especial para a conservagao da vida mari nha. A decisio que visa limitar ou proibir totalmente algumas atividades para aten der a permanéncia especifica, a protecéo do habitat, 0 monitoramento de ecossiste- ‘mas eo manejo de pesca, foi tomada recen. tementeduranteuma reunidona Australia, da qual participaram os paises que inte- gram a Comissdo para a Conservacao dos Recursos Vivos Marinhos da Antartida, da qual o Brasil faz parte. “Embora a resolu- fo tenha levado varios anos para ser to mada e alguns detalhes sobre a area de protecdo ainda estejam sendo finalizados, no ha diividas sobre estabelecimentoda zona protegida. Por isso, também estamos incrivelmente orgulhosos de ter chegado a este ponto”, explicou Andrew Wright, se- cretario-executivo da comissio, ESTUPROS POR HORA EM 2015 7,6% em relac&o ao ano anterior, quan- do foram registrados 10.026 estupros no estado. Ja Roraima foi o local com 0 menor mimero de acorréncias registra- dos, ao todo 180 — 98 casos a menos em relaco a 2014. “Mas como esse cri- me € aquele que apresenta a maior taxa de subnotificagao no mundo, en- to, 6 dificil avaliar se houve de fato uma redugao da incidéncia no pafs”, enfatizou Samira Bueno, diretora exe- cutiva do FBSP. NOVO DEBATE SOBRE ORIGEM DO EXERCITO DE TERRACOTA Wi Dois milénios apés sua criagao e 42 anos depois de sua descoberta, 0 debate sobre a origem do Exército de Terracota de BASE SECRETA NAZISTA ‘Xian, na China, é acirrado novamente, de- vido aos mais recentes achados que apon- tam para uma possivel influéncia grega. Bi Considerada por muito tempo como um mito, a estagdo meteorolégica que abrigava clentistas nazistas na ilha da Terra de Alexandra, no Circulo Artico, depois de mais de 70 anos, foi final- mente encontrada por pesquisadores Tussos. Apesar da erosio, provocada pelo duro clima artico, ter praticamente destruido a base, indimeras reliquias da 2® Guerra Mundial ainda esto espalha- das em seu entorno (na imagem). “An- Tal hipétese ¢ defendida por um grupo de arque6logos que, depois de trabalhar em ‘mais uma escavacao, acredita ter encon- trado provas que indicam que o conjunto de mais de 7 mil estatuas de guerreiros que © primetro imperador chinés, Qin Shihuang, construiu para seu mausolé teve uma inspiracdo externa. Tal suposi ‘¢a0 é fundamentada em documentos bi toricos. “Se o Siji apenas menciona as 12 estatuas de bronze erguidas em frente a0 palacio, o Houhansu ja narra que o impe- rador conheceu 12 gigantes do Ocidente e, entéo, mandou construilas. Além disso, plantas de DNA europeu, encontradas em esqueletos da regio de Xinjiang, também. indicam presenga ocidental anterior ao reinado de Qin Shihuang”, explicou a pesquisadora Li Xiuzhen. tes a estagdo era conhecida apenas a partir de fontes escritas, mas agora também temos a prova real da existén- cia dela”, frisou o pesquisador Evgeny Ermolov. Até entio, sabia-se que, su- postamente, ela foi abandonada em ju- Iho de 1944, depois que cientistas for- ados a comer carne de urso polar in- fectado, durante um periodo de poucos suprimentos, adoeceram em decorrén: cia de triquinose (infecgdo parasitéria). APOS 500 ANOS A TUMBA DE JESUS E REABERTA Wi Localizada abaixo da Basflica do Santo Sepulero, em Jerusalém, ¢ cober- ta por uma edicula com placas de mér- ‘more hi 461 anos, a tumba de Jesus foi reaberta por pesquisadores gregos, que pretendem pesquisar e restaurar 0 lo- cal. Porém, assim que acessaram a pri- meira placa de marmore, eles encontra- yam uma quantidade inesperada de material de preenchimento e uma se- gunda placa, desconhecida dos histo- riadores e que provavelmente foi posta ali no século 12, Contudo, ela nao deve ser a diltima, pois, conforme jé fot reve- lado por equipamentos de iitima gera- G0, 0 Messias cristdo foi colocado em uma espécie de prateleira cavada nas paredes de uma caverna calcéria, que tem cerca de dois metros de altura. Ape- sar da exigéncia de a tumba ser selada rapidamente, para evitar possi filtragdes durante o reforco das estrutu- ras, 05 especialistas jé afirmaram que fardo 0 possivel para disponibilizar os dados da pesquisa, a fim de permitir que qualquer um explore o ambiente como se estivesse la dentro, LEMTURAS DA HISTORIA | 13, FATOS & REGISTI i Uma escultura masculina, talvez um personagem iconografico do Velho ou do Novo Testamento, com 1,85 metros de altura, mas sem cabega, foi encontrada enterrada junto a torre sul da catedral de Santiago de Compostela, durante traba- Ihos de restauro no interior do templo, conforme anunciou 0 consércio respon: savel pelo patriménio histérico da cida: de espanhola. Desde entao, acredita-se que ela foi feita no final do século 12 ou principio do século 13, na oficina do mestre Mateo, responsavel pelos traba- 14 | LEMTURAS DA HISTORIA Thos na catedral naquela época. Tal hi- pétese é embasada na forma de traba- Ihar uma tinica peca de granito, sobre- tudo no que se refere ao drapejamento das vestimentas, que é semelhante a de outras oito pecas identificadas como procedentes da fachada do Pértico da Gloria, que foram retiradas de 14 com as alteragées realizadas no século 16. Apés ser limpa ¢ estudada, a nova descoberta integrara parte de uma exposicdo sobre a obra do referido mestre no Museu do Prado, em Madrid, OQUE DOIS CHINESES FAZIAM NALONDRES ROMANA? Esta questdo intriga pesquisadores do Museu de Londres que, ao estudarem 22 esqueletos encontrados em um cemitério localizado ao sul da capita inglesa, em re- gido usada entre o segundo e quarto sécu- los i i i ‘AS PRINCIPAIS NACOES DE ORIGEM i ees Eritrea 23.878 Siria 78.390 Nigéria 10.747 ‘Afeganistdo 32.581 ‘Afeganistio 29.245 ‘Outros pases ere Paquistio 6.642 Kosovo 23.260 FronTex- Reto Eunopeia 0€ GEstKO Oa COOPERAGRO OFERACIONAL WAS FRONTEIRAS EXTERNAS, ORRO LkDe A ComUNIDADE EuROPtix gate de MSF, realizou oito operagdes de salvamento: seis botes de borracha que levavam entre 120 e 125 pessoas cada um; uma lancha com 21 pessoas; e uma embarcacao de madeira com 15 pessoas. A majoria dos resgates acontece & noite € quando os navios conseguem chegar préximos as embarcagées dos refugia- dos, muitos dos passageiros ja se perde- ram nas éguas do Mediterraneo. Outros vém a falecer depois de resgatados em decorréncia de afogamentos parciais, queimaduras provocadas por combus- tiveis, ou mesmo asfixiadas nos fundos dos barcos devido a superlotagao. De acordo com as organizacées Anistia Internacional, Alto Comissaria- do das Nacoes Unidas para Refugiados (ACNUR) e Comissao Europeia, o mundo enfrenta, desde 2014, a pior crise de re- fugiados desde a 2* Guerra Mundial. Um dos motivos mais cruéis dessa fuga em ‘massa 6 guerra na Siria que, apesar de ter atingido seu pico em 2015, continua alimentando a diaspora que parece es- tarlonge de terminar. Até outubro de 2016, de acordo com os dados do ACNUR, 327.800 pessoas chegaram a Europa através do mar Me- diterrineo, sendo que 166 mil entraram no continente pela Grécia e 130 mil de- sembarcaram (ou foram resgatados em alto-mar) nos portos da Calabria, na Itélia. Outros 3.500 perderam a vida afogados ou desapareceram depois de tentarem a travessia em velhos barcos, botes de borracha ou frageis jangadas de madeira. “Desde 0 inicio de 2014, quando comecaram a aumentar as tra- vessias de imigrantes no Mediterraneo e no mar Egeu, ja contamos mais de to mil mortos”, afirmou Adrian Edwards, por- ta-voz do Alto Comissariado das Nagdes Unidas para os Refugiados (ACNUR). POBRES ACOLHENDO POBRES Uma das consequéncias mais ne- fastas dos conflitos armados e guerras 6 0 dramatico crescimento de refugia- dos no mundo inteiro. As estatisticas demonstram que a maioria deles pro- cura abrigos em paises pobres vi VOUDELETU TUT UTU CVT ETA TTT ETET TTT TET “Metade dos refugiados no mundo, jovens e criangas de até 18 anos, conseguem ter o pedido de asilo aceito. Mas menores de idade sem documentos tornam-se alvo facil de abusos sexuais, escravidao e do trafego de drogas” nhos aos seus, enquanto os paises mais ricos da Unido Europea, da Asia ou das Américas recebem um menor niimero de imigrantes. De acordo com © relatério do Alto Comissariado das Nacdes Unidas para Refugiados (AC- NUR) divulgado em julho de 2016, 86% dos refugiados esto em regides ou paises considerados econo! ‘menos desenvolvidos. A razao para essa escolha € a maior facilidade que os paises menos desen- volvidos oferecem para os pedidos de asilo ou de imigracao, em contraposicéo ao elevado protecionismo dos paises de- senvolvidos, principalmente na Unido Europeia, que impée pesadas medidas de restrigdes a imigrantes ilegais e tam- béma refugiados. 0 outro dado alarmante do Relaté- tio do ACNUR mostra que metade dos refugiados no mundo é formada por jovens e criancas de até 18 anos de ida- de. Sé a Alemanha recebeu mais de 40 mil menores refugiados em 2015. De acordo com o Departamento Federal de Estatisticas da Alemanha (Desta- tis), 91% das criangas e adolescentes desacompanhados so do sexo mascu- Iino, Apenas 3.600 eram meninas. Dos 14.429 menores que pediram asilo, 71,3%6 tém entre 16 e 17 anos, enquanto 28,7% tém menos de 16 anos. Boa parte deles sofre de estresse pés-traumatico. Apenas 53% das criangas e adoles- centes desacompanhados entraram com pedido de asilo, Muitos dos que ndo so- licitam legalmente sua permanéncia, desaparecem das cidades onde foram inicialmente alojados. Esses desapareci- ‘mentos se transformaram em uma enor ‘me preocupagdo para as autoridades. LEMTURAS DA HISTORIA | 31 CAPA | Diaspora da guerra MEMBROS DA COMUNIDADE YAZIDI SAEM DO ACAMPAMENTO PARA PROTESTAR CONTRA SUPOSTAS AMEAGAS FEITAS A SUA COMUNIDADE Em margo altimo, varios deputados ale: mies assinaram um documento salien: tando que refugiados menotes de idade desaparecidos so alvos potenciais para gangues pan-europeias, sendo abusa- dos sexualmente e forcados a escravi dao e ao trafico de drogas. “As pessoas com maior necessida de de compaixao, ajuda e refiigio estao sendo abandonadas devido a enorme falta de financiamento e grandes fa: Thas no regime global de protegao das vitimas de guerras,”, afirmou Anténio Guterres, Alto Comissério da ONU para Refugiados. Essa triste realidade é constante em paises como Grécia que, apesar dos apertos financeiros ocorri- dos por conta de suas politicas inter nas, juntamente com a grande crise de 2008 que abalou a economia dos Esta- dos Unidos e da maior parte dos paises da Comunidade Europeia, recebe des: 32 | LEMTURAS DA HISTORIA de o inicio de 2015 uma enorme quan: tidade de exilados para a qual o pa nao estava minimamente preparado para abrigar. Os acampamentos, erguidos as pres- sas pelo governo grego, muitas vezes nao oferecem a seguranca nem conforto para os alojados. Nao ha escolas para as criangas nem postos médicos paraa po- pulacao abrigada, Em muitas ocasides, 05 refugiados s6 podem contar com a ajuda de organizagdes humanitérias que procuram dar todo 0 apoio possivel por meio de seus voluntarios médicos, psicélogos ou educadores, entre outros profissionais de inémeras nacionalida- des, que fazem o impossivel para ajudar 0 mais necessitados. Na Grécia, um dos maiores proble- mas das autoridades foi encontrar esco: las para as criangas refugiadas. No fim de outubro filtimo, milhares de menores dos acampamentos, depois de mais de seis meses sem educacio formal, come: garam suas aulas. Mas 0 primeiro dia para 1.500 menores foi uma experiéncia ‘amarga, na qual 0 tinico toque alegre foi dado pelas mochilas coloridas da Orga- nizaco Internacional para as Migraces (OIN). Vinte escolas foram selecionadas em todo o pais por sua proximidade com ‘os acampamentos onde vivem. Em mei a protestos e incidentes protagonizados por pais dos alunos gregos, os pequenos refugiados, na maioria das vezes sem A GRANDE DIASPORA De acordo com 0 relatério do Alto Comissariadlo das Nages Unidas para Refugiados (ACNUR) divulgado em julho de 2016, © niimero de pessoas que saem de seus paises por contra das guerras, conflitos, terrorismo, perseguicées politicas alcancou um novo ealarmante record e esta se acelerando cada vez mais rapido. A nova edico do retatério Tendléncias Globais (ou Global ‘Trends) revela um claro crescimento nessa terrivel estatistica. Ao final de 2014, este ntimero atingiu o nivel recorde de 59,5 milhies de pessoas, comparado com os 51,2 milhdes registrados no final de 2013 e0s 37:5 milhdes verificados ha uma década. Esta tendéncia de crescimento vem ocorrendo desde 2011 com o inicio da guerrana Siria. Em 2014, uma média de 42,5 mil pessoas por dia tornaramse refugiadas, solicitantes de reftgio ouse deslocaram dentro de seu proprio pais, fugindo das dreas constantemente atacadas por bombardeios ou pelo terrorismo {sldmico, um crescimento que quadruplicou em apenas quatro anos. “E aterrorizante verificar que, se de um lado, hd mais e mais impunidade para os contflitos que se iniciam, por outro, hha uma absoluta inabilidade da comunidade internacional em >Xconruos ecuensas cms A wouéncia Ermica ou pouinica & iste exrnema esunTOs oe DoENGAS Pe comtorsuciosoyanaqueestano isLAMico PRINCIPALS CORFLITOS HOS ULTIMOS 5 ANOS 2013 HITT 32,200 por 2012 HIMINININN 23,400 2011 IN 14,200 trabalhar junto para encerrar as guerras e construir uma paz perseverante”, afirmou Ant6nio Guterres, Alto Comissario da ‘ONU para Refugiados. 0 ‘elatério também mostra que as populagées forgadas a abandonar suas casas cresceram em todas as regides do mundo. *% DESDE 2011, PELO MENOS 15 CONFLITOS SE INICIARAM OU FORAM RETOMADOS: OITO NA AFRICA (COSTA DO MARFIM, REPOBLICA CENTRO AFRICANA, LisiA, MALI, NORDESTE DA NiGéRta, REPUBLICA DEMocRATICA DO CONGO, SuDA DO ‘SUL EBURUNDI); ® No ORIENTE Mép1o sio TRES: SiRiA, IRAQUEE IEMEN; *® NAEUROPA, A UCRANIAAINDA SE ENCONTRAEMESTADO DE ALERTA POR CONTA DO CONFLITO CoM A ROSSIA; No CONTINENTE ASIATICO QUIRGUISTAO, MIANMAR PAQUISTAO TAMBEM SOFREM COM SEUS CONFLITOS. Como poucas dessas situagdes foram solucionadas, a volta também quase nunca é possivel. Em 2014, apenas 126.800 refu- ‘siados conseguiram voltar para seus paises de origem, o menor nimero em 31 anos. 2 REFUGIADOS QUE CHEGARAM A EUROPA POR MAR EM 2015 Homens —Mulheres Criancas ote, “P10. MIL srorreram soma natravessia ‘na Europa do mar desde em 2036 2013 guerras mundo 2005-2010 PESSOAS DESLOCADAS POR MOTIVOS DE GUERRA DESDE 2011 Niimero de 2014 HMMM 42,500. Sescaindas ‘SOLICITAGGES DE REFUGIO APROVADAS EM 2014 PELA UNIAO EUROPEIA Todaa Unido at Europeia we 5 PAISES QUE MAIS ACEITARAM REFUGIADOS PAISES QUE MAIS SOLICITARAM TULVELT EVI ETT TTT EV OT TTOT ETE TEED ET ETE TTT ETE ETE > __ 9 DP4 ‘Alemanha Sata Franga la” Suge A 7 et / 47555 33.025 20.63 15.575 184.665 Fonte: a versio completa do relatrio Tendéncias Globais (Global Trends) voc® encontra em wwwaunherorg/20r4trends/ LEMTURAS DA HISTORIA | 33, CAPA | Diaspora da guerra NO ACAMPAMENTO DE DIBAGA, UMA EQUIPE MEDICA EXAMINA UM BEBE DE APENAS UM MES. SEUS PAIS E SEIS IRMAOS VIVEM NESSE ACAMPAMENTO DESDE SUA CRIAGAO, HA CERCA DE UM ANO MILHARES DE FAMILIAS CAMINHARAM DURANTE DIAS DESDE A SOMALIA ATE O CAMPO DE REFUGIADOS DE DADAAB NO LESTE DO QUENIAATRAS DE AGUA E COMIDA saber falara lingua, tiveram que entren- tar sozinhos a rejeigao social, sem a pre: senca dos pais, quando muito, acompa nhados apenas por voluntarios da OIM. As associacdes de pais dos alunos gregos alegam varios motivos para protestar: néo sabem se as criangas recém-chegadas foram vacinadas, quais so 0s habitos higiénicos nos acampamentos. A falta de condicées materiais e necessidade de contra tar trabalhadores auxiliares oneran: 34 | LEMTURAS DA HISTORIA do ainda mais as precarias finangas pablicas também foram motivo de revolta. Esta foi a primeira reacao or- ganizada das populacoes locais, que até agora se mostraram solidérias e acolhedoras, contra os mais de 60 mil imigrantes que foram parar no pais sabe-se la por quanto tempo. De for- ma gradual, 0 governo grego promete encaixar mais 20 mil criancas exila- das em outras escolas, apesar dos protestos que tendem a aumentar. Maria JOSE, MEDICA DE MSF, ATENDE AIBRAHIM, DOS CAMAROES, QUE DESMAIOU DURANTE 0 RESGATE O acordo entre a Turquia e a Uniéio Eu- ropeia (UE) sobre refugiados, que entrou ‘em vigor no dia 20 de marco de 2016, consi derado um éxito por autoridades de varios paises da UE, mas insatisfatério para a o- ‘ganizaco humanitéria Médicos Sem Fron- telra, estabeleceu que os imigrantes que cchegarem da Turquia até as ilhas gregas, a partir da assinatura do tratado, deverdo ser registrados e 0 pedido de asilo deverd ser tratado individualmente pelas autoridades gregas. Os exilados que no solicitarem asilo ~ e aqueles cujos pedidos néo sejam aceitos ~ serio devolvidos a Turquia, Depois do acordo, mais de 8 mil pes- soas ainda esto retidas nas ilhas gregas, incluindo centenas de menores desacom- panhados, vivendo em condigdes extre- mamente precérias, em acampamentos superlotados. Sem apoio juridico, muitos temem um retorno forgado & Turquia em uma expulsio coletiva, ainda que as au- toridades responsdveis pela decisio afir mem que tudo foi feito de acordo com as leis europeias e que nao havera a devolu- ‘¢40 em massa das familias provenientes da Siria, Iraque e Afeganistio. Poucos, entretanto, acreditam nessa promessa, “HA meses MSF tem se pronunciado abertamente contra 0 acordo, mais foca- do em dissuadir essas pessoas do que em Ihes oferecer a assisténcia e a protegdo de “As operagoes de resgate realizadas por oficiais da guarda costeira de paises como Italia, Espanha e Grécia, em parceria com organizacoes humanitarias, se transformaram numa corrida contra a morte nas aguas do Mediterraneo” que necessitam”, disse Jéréme Oberreit, secretario-geral internacional de MSF. “O acordo entre UE e Turquia ainda colocou em risco 0 proprio conceito de “refugiado” €.a protegio que ele deve oferecer”, com- pleta Oberreit. A organizagio MSF tem prestado assisténcia as pessoas que fazem a travessia do mar Mediterraneo para a Europa desde 2002. Apenas nos tiltimos 48 meses, médicos da organizagao trata- yam cerca de 200 mil homens, mulheres e criangas na Europa e no mar Mediterra- neo, Atualmente, atende refugiados eimi- grantes na Grécia, Sérvia, Franga, Italia e no Mar Mediterraneo, bem como em pai: ses na Africa, na Asia eno Oriente Médio. As atividades de MSF sao financia- das majoritariamente por doagdes pri- vadas (92%). No entanto, a organizagao também esté envolvida em algumas parcerias financeiras com doadores ins- titucionais para programas especificos. Em 2016, além da Comissio Europeia, MSF fez. parcerias com nove Estados- ‘membros europeus: Bélgica, Dinamar- a, Inlanda, Luxemburgo, Pafses Baixos, Espanha, Suécia e Reino Unido. Apesarde seus esforcos, 0s participan- tes da MSF sabem que uma solucdo defini- tiva paraa grande onda de refugiados que assola, em especial o Continente Europeu, esta longe de acabar em curto prazo. Se- sundo Stefano Argenziano, coordenador de operagdes de migracao de MSF, ofere- cer rotas seguras e legais aos refugiados 6a finica forma de acabar com as mortes, no mar, “As operacées de resgate esto se transformando em uma cortida contra as ‘martes de refugiados nas éguas. Sentimo- nos impotentes para impedit a perda de tantas vidas”, fmaliza Argenzianosa MARINHA BRASILEIRA EM OPERACAO RESGATE A corveta Barroso, da Marinha do Brasil, saiu do Rio de Janeiro no dia 8 de agosto de 2015 em direcaoao Libano para se juntar a uma misséo de paz nesse pais. Porém, no dia 4 de setembro, as 13h30 pelo horario de Brasilia, chegou um pedido de socorto proveniente do servico inter nacional de busca e salvamento iano, quando a embarcacdo passa- va cerca de 270 quilémetros da costa da Sicilia, na Italia, 0 servigo pediu para que a corveta navegasse para regido do Peloponeso, na Grécia. Dois navios-patrulha italianos se juntaram & aco, mas como eram de pequeno porte, a guarda costeira italiana pediu 0 apoio do da Mari: nha brasileira para fazer o resgate ¢ transporte dos refugiados para o porto italiano da Catania. Na opera- do, 220 pessoas foram resgatadas: 94 mulheres, entre elas uma gré- vida, 37 criancas com idades entre trés e quatro anos e quatro bebés de colo. Os refugiados estavam ha sete dias em alto-mar, a maioria proveniente da Siria. Mas também haviam imigrantes da india e do Libano. De acordo com o comandante da corveta Barroso, Alexandre Amen- doeira, 05 refugiados se apresenta- ‘vam muito debilitados, hé dois dias sem alimentos, desidratados e com muita sede. Todos foram atendidos pela equipe médica a bordo. Ain- da segundo 0 comandante, 0 barco usado pelos imigrantes ja estava com pouco combustivel dificil- mente chegaria até a Italia, No dia seguinte, os refugiados foram desembarcados no porto de Catania, deixados aos cuidados das autoridades italianas. A seguir, a corveta Barroso voltou a sua missio nicial no Libano, carregando tam- ‘bém uma hist6ria que, com certeza, ficaré para sempre na meméria de seus tripulantes. LEMTURAS DA HISTORIA | 35, TULVELT EVI ETT TTT EV OT TTOT ETE TEED ET ETE TTT ETE ETE MUNDO | Conceitos diferentes, tragédias iguais DITADORES OU TIRANOS? Apesar de préximos na teoria e na pratica, esses sao conceitos distintos. Espécimes de duas cepas poder de maneira nefasta Por Luiz Antonio Dias 36 | LEMTURAS DA HISTORIA jiferentes, pelo menos no sentido classico, mas que usam 0 jodos esses conceitos: ditador, ti- Teese é Antiga, por volta do ano 500 a.C, foi criada a figura do “ditador” ~ que era uum individuo nomeado, Exatamente! Por mais paradoxal que possa parecer, ditadores eram nomeados pelo Estado para que, em situagdes extremas (guer- ras, rebelides), pudessem concentrar poderes e, dessa forma, solucionar os problemas e resolver os conflitos. Deve-se destacar, porém, que o cargo de ditador era interino, ele s6 durava até a solugao do problema. As- sim, como a concentracao de poderes era justamente para solucionar rapi damente um confronto, esse cargo ndo era ocupado por mais de seis meses. No caso, existia uma legitimidade e necessidade desse ditador, situagdes extremas ndo poderiam ser atacadas com 0s trimites, geralmente lentos, do Senado. Nesse sentido, verificamos uma grande diferenca, a priori, entre ditadores e tiranos ~ pois a tirania nao era temporaria. Com relagao a legiti- idade, existia também certa proxi- midade, pois como vimos, se o ditador era visto como legitimo, o tirano, em certa medida, também era Para Aristételes, 0 que diferen- ciava um tirano de um monarca era a busca de interesses pessoais (do tira- no), ou interesses comuns (do monar- ca). No entanto, existem concepgies diferentes sobre a possibilidade de diferenciar um de outro, Maquiavel, no século 15, inaugurou a modernida- de, quando mostrou que a “acdo po- litica nao se mede segundo a moral”. Segundo ele, o principe (governante) deveria ser bom sempre que possivel € mal quando necessario. Para ele, nem sempre do “bem” decorre 0 “bem”, ou do “mal” decorre 0 “mal”. Dessa for- ma, seria impossivel estabelecer dife- rengas entre tiranos e monarcas, posto que os critérios so, segundo Maquia- vel, subjetivos. Nesse sentido, o pensador defende, ainda, que o soberano deve sempre jus- tificar os seus atos - sejam violentos, ‘mentirosos ou corruptos, mostrando sua finalidade (manter a ordem e a estabili dade para o bem de todos, ou sefa, o bem comum). Dessa forma, ele ndo se torna- tia odioso aos olhos dos séiitos. Assim como Maquiavel, Hobbes no século 17 também acreditava na ideia de impossibilidade de promover uma distingdo entre um rei e um tirano, ou melhor, que a tinica distincao possivel era passional e nao racional. 0 Estado Absoluto seria fundamental para ga- rantir a ordem, a propriedade e a vida das pessoas. 0 soberano nao deveria, segundo Hobbes, submeterse a nin: guém, sequer as leis. Na era Moderna, os conceitos sofre: ram transformagées e so pensados de diferentes formas. Segundo Norberto Bobbio, em sua obra Diciondrio de Po- litica, existem varias possibilidades de pensar, de acordo com cada autor, a ditadura no mundo moderno. Impor- tante destacar que Bobbio, no verbete “Tirania”, indica a conferéncia do ver- bete “Ditadura’, dando ideia que sio conceitos semelhantes. Podemos, por exemplo, dividir as ditaduras em trés grupos: simples, ce- saristas ou totalitérias. A ditadura sim- ples - ou autoritéria, se utiliza das for- mas tradicionais de controle coercitivo {exército, burocracia, policia). Teriamos, como exemplo, no século 20, Franco, na Espanha; e Salazar, em Portugal. A ditadura totalitaria é m: plexa, além dos meios tradicionais de controle, temos todo o aparato da propa- ganda, o controle dos meios de comuni- cacao de massas, da educacio, do par- tido, dos sindicatos, toda a sociedade civil € tutelada pelo estado forte. Dessa Os FILOSOFOS ARISTOTELES E MAQUIAVEL COSTUMAVAM DIFERENCIAR TIRANO DE DITADOR STALIN, COMO TODOS OS DITADORES, TINHA 0 COSTUME DE CULTUAR A PROPRIA PERSONALIDADE forma, a oposicao, as criticas tendem a desaparecer, temos represséo e coopta- 20, Podemos elencar como exemplos a Alemanha Nazista, a URSS Stalinista e, em certa medida, 0 Estado Novo no Bra- sil 4937). Finalmente, temos as ditaduras ce- saristas, semelhantes as totalitérias, no entanto, sem tanto controle da propa- ganda e sem a existéncia de um partido ‘nico de massas, podemos enquadrar nessa situacao o perfodo Napoleénico, por exemplo. De qualquer forma, temos uma con- centracdo de poderes o exercicio desse poder além do poder. A repressdo, as torturas, a supresso da oposi caracteristicas comuns nesses regimes. No entanto, é pouco pravavel que regi- ‘mes totalitarios sobrevivam por mui- to tempo sem 0 apoio da populagao e, também, que essa populacao seja tao plenamente cooptada. Sempre existem interesses, de lado a lado, em jogo. Tomando como exemplo a im- plementaco da ditadura do Estado Novo, no Brasil, em 1937, podemos perceber que houve um grande apoio, LEMTURAS DA HISTORIA | 37, MUNDO | Conceitos diferentes, tragédias iguais COMO NA MAIORIA DOS PAISES DA AMERICA LATINA, O BRASIL TAMBEM TEVE A SUA DITADURA.. inclusive, dos liberais. Algo seme- Ihante ocorreu em 1964, com a derru- bada do presidente Jodo Goulart e 0 inicio da ditadura militar. Varios liberais apoiaram a LSN (Lei de Seguranca Nacional, em 1935); € também o golpe de 1937, relegando a liberdade para segundo plano em de fesa da seguranca. Acreditavam que essa mesma liberdade seria recupera- da em seguida. Interessante notar que algo semelhante ocorreu em 1964 e, como em 1937, a liberdade ficou restri ta por muito tempo. No entanto © apoio ao Estado Novo, pela imprensa liberal, por exemplo, nfo durou muito, No inf cio de 1940, 0 Estado de S. Pauto foi ocupado. Jiilio de Mesquita Filho sé conseguiu recupera-lo em dezembro de 1945. Antes mesmo desse episédio, © jornal jé demonstrava descontenta: 38 | LEMTURAS DA HISTORIA E SEUS DITADORES mento com 0 governo Vargas, com seu discurso nacionalista e populista. 0 confisco do jornal tornou a relagio ainda mais conflituosa. Ou seja, 0 apoio ocorreu quando se acredita que Vargas seria capaz de conter uma su- posta ameaca comunista, quando a situagdo se normalizou 0 apoio ces: sou, verificamos aqui os interesses, de lado a lado. Nas paginas desse matutino, na- cionalismo, populismo e comunismo tornaram-se sindnimos. Figuras como Vargas e, posteriormente, Jodo Goulart foram responsabilizados pela propa- gacio dessas ideias que impediam a perfeita comunhio das classes brasi leiras. Qualquer proposta de reforma social ou mobilizacao dos movimen- tos sociais continuou a ser vista como obra dos “comunistas”, s6 que dessa vez infiltrados no proprio governo. MUSSOLINI, LIDER DO PARTIDO NACIONAL FASCISTA NA ITALIA Na ditadura do Estado Novo no Brasil, em 1937, podemos perceber que houve um grande apoio, inclusive, dos liberais. Algo semelhante ocorreu em 1964, coma derrubada do presidente Joao Goulart e 0 inicio da ditadura militar Assim como em 1935, quando apoiou a implantagao da LSN e pavimentou ‘© caminho para o fechamento de 1937, 0 jornal 0 Estado de S. Paulo, com seu discurso alarmista, também preparou, desde 1961, 0 terreno para um golpe militar de 1964, Na Italia de Mussolini nha de Hitler, também verificamos um na Alema- MAO TSE-TUNG, LIDER COMUNISTA E REVOLUCIONARIO CHINES A Ditadura Militar no Brasil foi diferente das que ocorreram na Alemanha e Italia, pois aqui verificamos uma acao mais focada no Estado, nao existiu um lider carismatico que pudesse ser responsabilizado pelos atos barbaros amplo apoio popular ao totalitarismo que, em tese, poderiam solucionar a situagio de crise politica e econémica reinantes. Dessa forma, fica evidente que sem 0 apoio de parte da sociedade 6 muito dificil a implementaco de um regime totalitario, Cabe destacar, posto que foram con- iderados governos distintos na mesma discussdo, que a Ditadura Militar no Brasil (1964-1985) foi diferente das que ocorreram na Alemanha ¢ Itdlia, pois aqui verificamos uma aco mais focada no Estado, nao existiu um lider carisma- tico que, posteriormente, pudesse ser responsabilizado pelos atos barbaros. Alids, que essa seria a grande diferenca entre a tirania e a ditadura no mundo contemporéneo: a tirania sempre neces- sita de um tirano, ao passo que a ditadu- ra pode existir pela aco do estado. Hitler, Mussolini, Stélin, Franco, Mao Tsé-Tung, Pol Pot, foram os grandes tiranos do século 20, 0 estado serviu de apoio para sua violéncia. Nesse sentido, ~ POL Por LIDEROU © KHMER VERMELHO NO CAMBOJA, RESPONSAVEL PELO GENOCIDIO CAMBODJANO temos uma diferenga das ditaduras mili- tares da América Latina nesse periodo, pois os ditadores eram “instrumentos do estado” ‘Além disso, os ntimeros apresenta~ dos por esses tiranos so muito mais as- sustadores: Hitler, apenas nos campos de concentragao (os nimeros variam), produziu entre 10 e 12 milhdes de mor- tos. Franco, na Espanha, apés o final da Guerra Civil, ordenou o fuzilamento de mais de 50 mil pessoas. Stalin, 0 “Czar Vermelho”, comparado a Ivan, o Terri vel, foi responsabilizado por deporta- Ges, prisdes e fuzilamentos que supe- ram 10 milhdes de pessoas entre 1930 € 1950. Mao Tsé-Tung, ultrapassa essa cifra, sendo responsabilizado pela mor te, por execucdes ou fome, de mais de 20 milhdes de pessoas. m {Lulz Antonio Dias é doutor em Histéria Social, Prof. do Departamento de Historia da PUCSP, autor de Cidade e Histéria: uma andlise de processos de urbanizaeao econstrugdo de cidadania, Curitiba: Editora CRV, 2010. LEMTURAS DA HISTORIA | 39 CULTURA | Refiigio de conhecimento 5 BIBLIOTECAS MAJESTOSAS Seja pelo acervo, singularidade ou histéria, as bibliotecas servem para muito mais do que leitura, podem também ser locais de contemplacao, reflexao e descobertas Igumas bibliotecas ao redor do mundo provocam fascinio e, de tao grandiosas, parecem coisa de filme. Elas abrigam obras raras, tém ar- quitetura tinica e merecem ser visitadas. Ea maior da Argentina e esté dite: tamente ligada a historia daquele pats, ‘com um acervo que reflete cada grande mudanga politica e social. Localizado no sofisticado bairro de Recoleta, o prédiose- sgue a linha arquiteténica brutalista, com concreto reforcado exposto e formato que Jembra uma escultura —foi erguido no ter- reno do antigo pakicio presidencial onde ‘moraram Juan e Evita Perén, ¢ onde esta veioa falecer e virar uma lenda. 0 parque no nivel térreo foi pre servado ¢ os andares so suspensos ‘0 | LEITURAS DA HISTORIA Da redacao Cidades como Buenos Aires, Berlim, Pra a, Nova lorque e Rio de Janeiro abrigam alguns destes templos do conhecimento, cuja visita é uma imersio em historias € visbes tinicas, A lista a seguir revela sin. gularidades como a Biblia de Gutenberg, simbolo da revolugao da impresséo de textos que ocorreu ha mais de 500 anos devido a prensa mével do inventor, além de outras joias escondidas. Biblioteca Nacional Mariano Moreno por quatro pilares, assim a sala de leitura principal com imensas janelas de vidro e pé direito duplo serve como mirante com vista para o porto e para © Rio da Prata de um lado e, do outro, paraa cidade. Em um conflitoentrees- tilo e funcionalidade, certas éreas in- ternas so diretamente atingidas pela uz do sol em algumas horas do dia e também é possivel ouvir um leve som abafado do trafego da cidade, o queal- guns consideram um charme, outros, uma irritagao. A biblioteca conta com 21 livros rarissimos, ou parte deles, como uma folha da Biblia de Gutenberg de 1450 € duas obras inteiras de autoria de Sao To- mas de Aquino, datadas de 1476, Quaes: tiones de potentia Dei e Quaestiones de duodecim quodibet. As demais salas S40 de hemeroteca, fotografia, audios, ma: pas, partituras, leitura em braile, aqui vo historico nacional, entre outras. Ex: posigées diversas ocorrem durante todo ano, consulte aadministragao quando planejar visitar a cidade. Conta com uma rede de prédios es- palhados pela cidade, sendo 0 mais fa: moso deles o localizado na Quinta Ave- nida, no palacio Stephen A. Schwarz- man. Facilmente confundida com um museu, com seus ledes de bronze ba- tizados de Paciéncia e Fortaleza guar dando a entrada principal, a biblioteca tem sélida fachada de marmore de 90 em de espessura e disponibiliza quatro Sew acervo fol iniciado para substituir a Livraria Real, consumida pelo incéndio que ocorreu apés 0 terremoto de 1755, em Lisboa, Portugal. As primeiras 60 mil pe- ¢@s, incluindo livros, manuscritos, ma- andares e mais de 60 mil metros qua- drados a visitacao. mais famoso salio de leitura é 0 Rose, com 24 metros de largura e 91 me- {tos de comprimento com teto generosa- ‘mente decorado com pinturas e entathes, dde madeira escura suspensos a 16 metros, dealtura. Asimensasjanelas deixam a luz do sol entrar e a iluminago apropriada para leitura 6 provida por mais de 20 mo- pas, estampas, moedas e medalhas, che- ‘garam ao Rio de Janeiro com D. Jodo VI, em 1808. Quando a Familia Real voltou 0 pats de origem, levou de volta os ma- nuscritos da Coroa. Mas com aquisigao de New York Public Library numentais lustres antigos esofisticados. Aeentrada paraa sala de catilogo é outa ‘obra de arte, com painéis de madeira em toda. parece e postes de ikuminacao es- tilizados de cada lado da imensa porta ‘com uma pintura barroca no topo. Lembra dos jovens presos em uma biblioteca tentando sobreviver as ondas sigantes e frio intenso que atingem a cidade no filme 0 Dia Depois de Ama- hd? Pois é, era essa a biblioteca, e sim, a Biblia de Gutenberg continua intacta € em seguranca. 0 prédio foi transfor- mado em Marco Hist6rico Nacional, em 1966, ¢ seus mais de 12 quil6metros de prateleira também guardam 15 milhdes de itens, incluindo manuscritos medie- vais, papitos japoneses, a copia mais antiga de Nican Mopohua, de 1531, & duas e6pias da primeira edicio de Co- ‘medies, Histories and Tragedies de Sha- kespeare, datadas de 1623, Biblioteca Nacional do Brasil colegdes particulates, compras em let les e doacées, inclusive por D. Pedro I, atualmente 0 acervo chega a 416,5 mil pecas ¢ esta exposto em um elegan- te edificio com estilo eclético, no qual ‘se mesclam elementos neoclassicos € de art nouveau com estruturas de aco, tombado pelo Instituto do Patriménio Hist6rico e Artistico Nacional (IPHAN), em1973. Grandes painéis e estétuas, de autoria de renomados artistas de suas épocas, decoram o salo prin- cipal de leitura e a Galeria da Pre- sidéncia, Entre as preciosidades da biblioteca, estéio um pergaminho do século 11 com manuscritos em grego sobre os quatro Evangelhos; Biblia de Mogimcia, de 1462; Crénica de Nuremberg, de 1493; Biblia Poliglota de Antuérpia, de 1569; primeira edi ‘glo de Os Lusiadas, de 1572; primeiro jornal impresso do mundo, de 1601 Preciosidades, de fato LEMTURAS DA HISTORIA | 4 CULTURA | Refiigio de conhecimento Possui mais de 11 milhdes de li v1os, dos quais 200 mil sio raros € quase 4,5 mil sao rarissimos, além de 13,5 milhes de imagens, 1 milhao de mapas, 60 mil manuscritos ocidentais € orientais, 1,4 mil arquivos de Esta do... enfim, é téo grande, abrigando obras de interesse académico de to- dos os periodos, linguas e paises, que dois prédios precisam abrigar o acer- vo principal, além de contar com mais dois prédios de apoio. A grandeza nao é medida apenas em niimeros, mas em exemplos, como uma Biblia de Gutenberg (adornada ‘2 | LEITURAS DA HISTOR » Gp 2ERLWN: Best State Library inteira!), as mais antigas ilustragdes biblicas, colegdes sem paralelos de manuscritos de Bach e Mozart, a parti- tura original da 9* Sinfonia de Beetho- ven e, no quesito maiores do mundo: atlas, biblia hebraica e pergaminho do Tord. Considerando o impacto das duas guerras mundiais, poucas biblio- tecas sobreviveram a tantos danos, negligéncia, divisio, unificagao e re- criagdo como esta, incluindo queima de livros por nazistas, bombardeios e uma operacdo secreta com varias fatalidades entre os bibliotecdrios, que esconderam 0 acervo em deze- nas de monastérios, castelos e minas abandonadas para protegé-lo ~ ainda assim, 700 mil volumes foram destrut- dos ou “sumiram”. Atualmente, 0 prédio bombar- deado em Haus Unter den Linden, em um (verdadeiramente palacial) estilo neobarroco, conta com um gi- gantesco cubo de vidro marcando 0 local da explosao sob a sala de leitura principal. Considerando os esforcos realizados para salvar as obras, os visitantes podem ~ e devem! - se sen- tir privilegiados em ter acesso a uma biblioteca tao dinica, 9 0 aw ms Pe De uma beleza barroca espantosa, ja foi considerada uma das mais ma- jestosas do mundo. Com a sede prin- cipal alocada no complexo de prédios Klementinum, ocupa pouco mais de 2 hectares do centro historico de Praga. Metade do acervo de 6,5 milhdes de li- v10s fica no edificio, ricamente decora- do do piso ao teto de 1578 a 1726 e que tem afrescos pintados por Jan Hiebel, prateleiras ornamentais e antigos glo- bos valiosissimos. 5) Buenos Aires - Royal Park Bue- nos Aires: http://bit.ly/2fgMyVJ Berlim — Citadines Kurfiirsten: damm Berlin: http://bit.ly/2f5KC20 Praga - Hotel Duo Prague: hitp:// we ro ~ ‘ Acessivel por um anexo classi: cista concebido por Matthias Hum- mel esté a Mirror Chapel, uma ca- pela atualmente utilizada apenas para fins seculares que conta com um némero substancial de espe- Ihos, além de pinturas, marmores, decoracdo em gesso com detalhes banhados a ouro e mais afrescos de Hiebel. Concertos e exposi¢des ocor- rem no local. A colegao de manuscri- tos da biblioteca inclui itens doados bity/2fVyTe Nova Torque - The Manhattan Chub: hetp://bit.ty/2f1EGPT Rio de Janeiro - Rio Othon Palace: https://royal-holiday.com/pt/br/ho- pelo Imperador do Sacto Império Romano Charles IV, em 1366, as- sim como papiros gregos; 0 Cédigo de VySehrad, evangelho latino, de 1085; 0 manuscrito Passional of the Abbess Kunhuta, de 1312; a Biblia de Velislav, de 1325 0 Mozart Memorial oferece varias obras para consultas relacionadas ao misico. Visitar este lugar ¢ como caminhar pelas bibliotecas particu- Jares de reis e rainhas de outrora. DATE OOS tel/rio-othon-palace Informe-se sobre o Clube de Férias a Royal Holiday: www.royal-holiday. com/pt/br LEMTURAS DA HISTORIA | a3 ATUALIDADE | Ocupacées escolares SOBRE A DEMOCRACIA... Uma das principais fung¢ées da democracia é a protecao dos direitos humanos fundamentais, como a liberdade de expressao, de religiao, a protecao legal, e as oportunidades de participacao na vida politica, econémica e cultural da sociedade EEE" s cidadaos tém os direitos e os Or ae arttprem de in meros sistemas sociais devida- mente organizados, visando proteger seus direitos e sua liberdade. Com base nesses principios ~ e diante das alar- mantes noticias sobre as ocupat escolas no Parané (e no Brasil) ~ como fica o dever de um professor em cumprir © seu labor? E 0 direito de um aluno de assistir A aula desse professor? Serd que a legitima via democratica, que seria uma inteligente e ativa cobranca dos re presentantes do povo, pplesmente ‘a | LEITURAS DA HISTORIA Por José Motta Filho suprimida e trocada pela estratégia de vencer pelo cansaco e pelo grito? Ha de se evidenciar 0 engajamento de muitos estudantes em querer fazer a sua voz ser ouvida no momento em que os governantes anunciaram a re- forma de um segmento importante da educagio basica: 0 ensino médio. Real: mente é possivel perceber pontos muito bons ~ e necessarios ~ nessa proposta. Como, por exemplo, permitir ao aluno que, a partir do segundo semestre da 2* série do ensino médio, ele escolha uma rea do conhecimento para se aprofun: ANA JGLIA PIRES RIBEIRO FICOU CONHECIDA PELO DISCURSO AOS DEPUTADOS DO PARANA, OCASIAO EM QUE. DEFENDEU A OCUPACAO DAS ESCOLAS dar, dentre cinco opcdes. Talver, dessa maneira, possamos efetivamente des- cartar varios contetidos que costumo chamar de “perfumaria desnecesséria nada estimulante” para jovens que sio altamente tecnolégicos e conectados. Porém, a medida proviséria, que foi apresentada de forma truncada e equi- vocada, também trouxe consigo varios Pontos negatives: educagio integral sem o devido recurso para fazer aconte- cer, areas de conhecimento que deixa- ao de existir, professores com “notério saber" etc. re ae eam re EAU eit 18 REVELADOS ee ee Rae) mais famosos do Egito, incluindo seus templos, LAM are = RIO DE JANEIRO Como professor do ensino médio (e também do ensino superior), reflito pro- fundamente sobre o fato de um reduzido ‘grupo de estudantes se aproprie de uma escola, fazendo com que todo um plane: jamento escolar académico seja quebra- do, prejudicando cada espaco escolar coma interrupgao das aulas eatividades diversas ~ cortemos, claramente 0 risco de praticar a antidemocracia. Podemos ainda, adicionar a esse cenario, a vasta desinformacao entre os estudantes so- bre ocontetido da reforma, a triste perda da vida de um estudante de apenas 16 anos em Curitiba, ea constante manipu- lacao da informacao e das pessoas en- volvidas em todo esse tragico proceso de ocupagao das escolas. Portanto, ndo se pode tolerar ou permitir que esse tipo de movimento perdure por tanto tempo. Quando os estudantes manifestan- tes, imbuidos das suas verdades e ra- Bes, impediram o funcionamento de centenas de escolas, faltoulhes a sere- nidade e o entendimento de que preju- CARTAZES PENDURADOS NAS GRADES DA ESCOLA FEDERAL PEDRO II, NO dicaram milhares de colegas que, por exemplo, se preparavam para 0 ENEM € para os iminentes vestibulares. Nao defendo que esse processo tenha sido ilegitimo, mas tive em varios momen- tos a sensacdo de falta de argumentos e “auséncia de um norte” nos discur- sos que li e ouvi. Estou certo de que, em muitos mo: mentos das nossas vidas, somos leva- dos erroneamente a tentar resolver pro- blemas por vias ndo pacificas e querer promover agdes para chamar a aten¢io. Porém, em um ambiente educacional, para comecar, é preciso ser educado e elegante nas acbes e palavras. Afinal de contas, a democracia expressa clara- mente o principio de que ha direitos que nao podem ser limitados pelos outros. Tentar defender ideias imprimindo a for ca, em detrimento ao dialogo inteligen- te organizado, jamais trara impactos positivos diante de uma sociedade que esta carente de bons exemplos, de boas pessoas e de boas aces. Jos@ Motta Filho ¢ engenheiro civil professor de Fisica no Colégio Positive e professor de Céculo Diferen: Cale Integral na Universidade Positive. LEITURAS DA HISTORIA | 45, AMERICA DO NORTE | Revolucado Mexicana “TIERRA Y L Responsavel por importantes transformagcoes no pais latino-americano do norte, embora a Revolucao Mexicana tenha se iado em 1910, ela continua viva e polémica até os dias de hoje ara muitos historiadores, o grande Previn : tio e anti-imperialista, que ocorreu no México, pais marcado por uma suces- sio de golpes, brigas pelo poder, planos e aassinatura de intimeros tratados, em sua maioria, infrutiferos, foi o evento mais im. portante do século 20, entre outros aspec- 16 | LEITURAS DA HISTORIA Por Morgana Gomes tos porque ele reuniu, em torno dos gru- pos de pequenos agricultores, diversos lideres comunistas, anarquistas, liberté rios e populistas, contra o ditador Porfirio Diaz que, ao incitar a classe latifundia. ria a assumir ideias da burguesia tanto norte-americana quanto europeia, negou todas as tradig6es indigenas mexicanas. Como governante maximo, desde que assumiu 0 poder em 1876, a po: jitica dele valorizava, acima de tudo, a entrada de capital estrangeiro, que passou a explorar os recursos mine- ais e vegetais do México, com o obje- tivo de fabricar produtos de exporta- co. Consequentemente, além de pro- ZAPATA, NO CENTRO DA FOTO, CERCADO PELOS DEMAIS REVOLUCIONARIOS QUE PERMANECERAM NA LUTA teger somente aqueles que detinham grandes posses, Diaz nunca respeitou 05 direitos das camadas sociais infe riotes, fato que acentuou ainda mais a pobreza de camponeses e indig Ao mesmo tempo, costumeiramente, ele forjava eleicdes, nas quais sempre se safa como vencedor. Em meio a esse contexto de total desequilibrio de forcas, a pressio da populagao, da igreja e de uma elite que ja fazia oposicao ao governo, im- pulsionou a chamada Revolugao Me xicana, cujo objetivo era revalorizar a cultura indigena e iniciar a reforma agraria que, por sua vez, poderia ga- rantir a distribuicdo de terras desa- propriadas — desde 0 perfodo colo: nial pelos exploradores espanhéis e, logo em seguida, pelos latifundiarios —, a0 camponeses que, nessa altu- ra, nutriam um édio imensurével por Diaz, em virtude da exploracdo que sofriam. Por isso, quase no final do préprio mandato que terminaria jun: to.ao ano de 1910, ele anunciow que ia se retirar da politica, sem concorrer a uma nova reeleicao. A partir de entéo, 0 latifundiario € opositor Francisco Madero comecou a rodar 0 México, na tentativa de for- mar um partido politico para poder competir pelo poder. Aos poucos, ele conquistou a populagao com promes: sas de reformas sociais que iriam di: minuir a exclusdo social. Diante desse novo fato, Diaz relancou-se para uma nova candidatura a presidéncia, en: quanto Madero era detido em San Luis Potosi sob a acusacdo de sublevacao contra a autoridade constituida. Rapidamente, novas eleigées fo- ram realizadas e, devido as supostas fraudes, 0 ditador assumiu o poder por mais uma vez. Nesse interim, Madero conseguiu fugir para San Antonio, ci- dade estadunidense do Texas e de 14 anunciou 0 Plano San Luis, que con: vocava 0 levantamento de armas em 20 de novembro de 1910, para derrubar © governo e estabelecer eleicdes livres e democraticas. Ele ainda se candi datou pela oposigéo para concorter a presidéncia, momento em que anun. ciou que sua plataforma de governo tinha como base a distribuicdo de ter- ras de forma igualitéria e a garantia dos direitos dos indios que tiveram seus territ6rios de origem usurpados. Era o que faltava para o conflito ar- mado comegar no norte do México e, aos poucos, estender-se a outras partes do pafs. Mas somente quando os revoltados ocuparam a Cidade Juaréz, no estado de Chihuahua, Diaz apresentou sua re- niincia e escolheu a Franca pata se exi- Jar. Em 191, novas eleig6es ocorreram e Madero se elegeu, mas, de ele ja entrou em atrito com outros lideres re- volucionarios. Com apenas dois dias de mandato, por exemplo, pediu a Emilia- no Zapata que estava em Villa de Ayala, no estado de Morelos, que dispensasse as tropas revolucionérias, Em resposta, 0 lider dos zapatistas exigiu a demissio de Ambrosio Figue- roa, governadordo estado, retirada das tropas federais, indultos e salvo-condu- tos para os integrantes do seu exército, além do estabelecimento de uma lei agraria que melhorasse a qualidade de vida no campo. Madero no aceitou a proposta e ainda enviou o seu exércitoa Villa de Ayala, para terminar com 0 mo- LEMTURAS DA HISTORIA | a7 AMERICA DO NORTE | Revolucado Mexicana Porrinio Diaz, 0 DITADOR MEXICANO vimento. Mas Zapata e os seus homens conseguiram fugir para o estado de Pue- bla e, em 29 de novembro, apresentaram © Plano de Ayala, redigido por Otilio Montaiio e assinado por elementos do exército zapatista do sul, que acusava Madero de ter imposto o vice-presidente € 0s governadores dos estados contra a vontade popular, de ser um novo ditador e de estar em “conluio escandaloso com © partido cientifico, fazendeiros feudais e caciques opressores inimigos da revo. lugio”. 0 mesmo documento também reconhecia o exmaderista Pascual Oro zc0 como chefe da revolucao e, caso ele no aceitasse, caberia a Zapata assumir a responsabilidade. Diante do plano, Madero que néo havia cumprido suas promessas de cam: panha e, em consequéncia, também gerava mais insatisfagdo entre os cam- poneses que reivindicavam a posse da terra, redobrou os esforcos para acabar com o movimento. Mas sem conseguir, ainda angariou a inimizade de muitos fazendeiros. Apesar disso, na época, suas tentativas reduziram o nimero dos revoluciondrios zapatista. ‘ag | LEITURAS DA HISTORIA SEGUIDORES DE OROZCO ENTRANDO NA CIDADE JUAREZ Dos 60 mil rebeldes, apenas 16 mil mantiveram-se na luta, apoiados por Zapata, que insistia em pedir que se cumprisse a restituigao das terras prometidas pelo governo antes do de. sarmamento do grupo. Dado o impas: se, tentando uma conciliagéo, em 18 de julho, o presidente reuniu-se com © lider revolucionario em Cuautla, Morelos, e, por mais uma vez, com: prometeu-se a resolver 0 problema agrario em troca do licenciamento das tropas zapatistas. $6 que 0 politico Francisco de La Barra que, aparentemente, apoiava as peticdes revolucionarias durante a negociago, em vez de continuar as conversagées, ordenou ao general Victoriano Huerta que reprimisse pela fora o movimento, Em decorréncia da situagao violenta que se estabeleceu, Madero regressou Cidade do México, enquanto Zapata e alguns dos seus homens retiraram-se para as serras de Puebla e Guerrero. Posteriormente, por meio de um manifesto ao povo de Morelos, 0 lider revolucionario des culpou Madero, enquanto acusava os Dos 60 mil rebeldes, apenas 16 mil mantiveram-se na luta, apoiados por Zapata, que insistia em pedir que se cumprisse a restitui¢ao das terras prometidas pelo governo, antes do licenciamento das tropas zapatistas “traidores cientificos” de querer re- tomar o poder. No mesmo documen- to, ele ainda proclamou a existéncia do Exército Libertador do Sul. Mas, nesse interim, Pascual Orozco, © rebelde do norte, também resolveu atacar a Cidade Juarez por motivos pr6- prios. Além de nao ter sido eleito para formar parte do gabinete do governo provisério, formado depois da assina- tura do tratado local durante as elei- Ges para governador de Chihuahua, ele ainda perdeu o pleito para o candi- dato apoiado por Madero, Em decorrén- cia, apés desconhecer 0 governo legal, CIDADE D0 MEXICO DURANTE 0 GOLPE DE ESTADO QUE TERMINOU COM 0 ASSASSINATO DE MADERO O movimento contrarrevolucionario demorou dez dias, mas Provocou um novo golpe de estado, conhecido como a Decena Tragica, que terminou com o assassinato de Madero, do seu irm&o Gustavo e do vice-presidente Pino Suarez ele incitou a revolta armada contra Ma- dero e, assim, conseguiu adeptos das classes populares, média e alta. Mas, para se defender, 0 governo enviow novamente 0 militar Victoriano Huerta para sufocar a rebelido. 0 oficial at git 0 objetivo, converteu-se em herdi e ganhou a confianga do presidente. Para complicar ainda mais toda a situago, durante 0 governo de Madero que ja proclamara uma série de medi- das nacionalistas, 0 embaixador dos Estados Unidos, Henry Lane Wilson, também decidiu derrubi-o, por nao ter 0s interesses comerciais de investidores estadunidenses favorecidos, em virtude da nova legislacdo sobre a exploracao do petréleo que obrigava os estrangeiros a pagar impostos. Para tanto, ele passou. @ enviar ao governo norte-americano relatorios drasticos sobre a situagao do México, o que levou os Estados Unidos a exigirem tanto a salvaguardada da in- tegridade dos seus cidadaos radicados no pais latino, quanto garantias para s investimentos realizados. Em conse- quéncia, em meados de 1912, surgiu uma nova conspiragao, dessa vez, encabeca- da por Rodolfo Reyes e os generais Gre- gorio Ruiz.e Manuel Mondragén. A DECENA TRAGICA Em 9 de fevereiro de 1913, 0 movi ‘mento contrarrevolucionario demorou dez dias, mas provocou um novo golpe de estado, conhecido como a Decena Tragica, que terminou com o assas: nato de Madero, do seu irméo Gusta- vo e do vice-presidente Pino Sudrez. Victoriano Huerta, entéo, assumiu a presidéncia e, apoiado pelos porfiris- tas, impés novamente a ditadura ao México, fato que ocasionou a reacéo de varios chefes revolucionarios, en- tre os quais Venustiano Carranza e Pancho Villa que, por sua vez, dirigiu- se ao norte, enquanto Zapata foi para ao sul. Ambos visavam a organizagio de novos movimentos revolucionérios contra as tropas federais. Com 0 au- mento da pressdo popular, apés quase um ano de luta e a ocupagao norte-a- mericana no Estado de Veracruz, em 1914, deu-se a rentincia presidencial de Huerta e, em seguida, a fuga dele para os Estados Unidos Francisco Carvajal, época, minis- tro das Relagdes Exteriores, assumiu 0 governo com a tarefa de entregar a ca- pital s forcas revolucionarias ¢ nego- ciar a rendicao das forcas federais. Logo apés, por indicagdo e apoiado pelos Es- tados Unidos, Carranza, até entéo chefe da revolucao de acordo com o Plano de Guadalupe, assumiu 0 poder proviso- riamente. No entanto, as diferencas en- tre as faccdes que haviam lutado contra Huerta tornaram-se evidentes, dando origem a outros confitos. Sem saida, 0 presidente convo- cou todas as forcas & Convencdo de LEMTURAS DA HISTORIA | 49 AMERICA DO NORTE | Revolucado Mexicana ZAPATISTAS ENTRANDO NA CIDADE D0 MEXICO Aguascalientes, com a intencdo de que elas nomeassem um lider ‘nico. Como delegados villistas e zapatistas compareceram, Carranza desistiu de assistir & convengdo, por acreditar que a cidade estava ameacada por Villa, Apesar do afastamento dele, durante as sessdes, que se prolonga ram até novembro, os zapatistas pedi ram que renunciasse o titulo de chefe da revolucao e que se aceitasse inte gralmente o Plano de Ayala. Em uma carta lida aos presentes por Alvaro Obregén, Carranza assegurou estar de acordo com o renuneiar, desde que Villa e Zapata também se retirassem da vida pablica e, em consequéncia, desistissem da lideranca de seus res- pectivos exércitos, Logo em seguida, a convencéo nomeou Eulalio Gutiérrez como pre: sidente interino, mas Carranza rejei tou 0 acordo, ao alegar 0 direito de nomear 0 novo presidente. Como os atritos recomecaram, as forcas dele 50 | LEMTURAS DA HISTORIA sairam da capital mexicana, ao mes. ‘mo tempo em que entravam os zapa tistas. Dias depois chegaram as forcas de Villa, Ambos os lideres se reuniram para firmar 0 Pacto de Xochimilco, que nada mais era do que uma alianga contra Carranza. Mas pressionado por Villa e Za pata, Gutiérrez também nao pode governar e, em 16 de janeiro, saiu da capital, na tentativa de estabelecer seu governo em San Luis Potosi. Em seguida, renunciou de forma defini- tiva. Entdo, Roque Gonzdlez Garza assumiu como presidente provisério, cargo que manteve entre 17 de janeiro 9 de junho, enquanto em Veracruz, Carranza governava de fato 0 pafs, tanto que, em 12 de dezembro de 1914, ele reformou o Plano de Guadalupe e, pouco depois, em 5 de janeiro de 1915, promulgou uma série de leis redigida por Luis Cabrera. Em 10 de junho, Francisco Lagos Chazaro recebeu da convencéo 0 Po: Em uma carta lida aos presentes por Alvaro Obregé6n, Carranza assegurou estar de acordo com o renunciar, desde que Villa e Zapata também se retirassem da vida publica e desistissem da lideranga de seus respectivos exércitos der Executivo. Em 2 de agosto, a capi- tal foi novamente tomada pelas tropas de Carranza e a convengéo teve que ser transferida para Toluca e, pouco depois, para Cuernavaca, onde ficou sem a presenca villista. Finalmente, em 6 de fevereiro de 1917, Carranza convocou a realizacdo de eleigées que se deram em marco, més em que foi eleito presidente com 98% dos votos. Em 1° de maio, ele tomou posse do mandato que se prolongou até 1920. E1917 Abril de 1919, quando Zapata transpés o portao da fazenda de Chinameca para uma reuniao com Guajardo, um clarim tocou a saudacao e dez soldados da guarda de honra que apresentaram armas, logo em seguida, alvejaram-no Ja na presidéncia, Carranza con: seguiu aprovar uma constituicao, considerada bastante progressista até pelos opositores. 0 conjunto de leis reconhecia os direitos dos indios, mas também dava pleno direito ao Estado de expropriar terras, caso fosse para uso e beneficio piblico, criava o sala. tio minimo e a jornada de oito horas para 05 camponeses, enquanto tam- VENUSTIANO CARRANZA JA COMO PRESIDENTE, EMt 1° DE MAIO bém separava o Estado da igreja, co- locando um fim nos beneficios que os eclesidsticos detinham. Apesar disso, 0 novo presidente no conseguiu conter 0 movimento contrarrevolucionario liderado_ por Feliz Diaz, nem outras rebelides que eclodiam em Chiapas, Oaxaca e chiacin. Entio, ele decidiu por um ponto final no movimento zapatista, para usé-lo como exemplo. Para tan- to, encarregou 0 general Pablo Gon- zélez Garza de realizar uma campa- nha de exterminio da populagao que ;cupava o sul do México. Embora ela viesse sendo dizimada pela fome © por epidemias, o oficial cumpriu a tarefa apenas partes. Em consequén- , © movimento zapatista persistiu € ele, entio, resolveu infiltrar Jesis Maria Guajardo, junto a um prision ro do grupo, somente para depreciar 0 governo legal. Logo depois, como foi permitido a esse mesmo prisioneiro fugir, Zapata foi informado sobre a 0 coRPO DE ZAPATA EXIBIDO EM CUAUTLA, LOGO APOS A SUA MORTE ae conversa e, ingenuamente, convidou Guajardo para integrar suas forcas. Apés uma série de negociacées, enquanto 0 oficial, para esconder sua real intencéo, mandava assassi- nar varios ex-zapatistas que haviam passado para o lado de Carranza, foi acordada uma reunido para selar a suposta alianga entre ele e o lider revoluciondrio na fazenda de China- meca. Porém, em 10 de abril de 1919, quando Zapata transpés 0 portéo do local, um clarim tocou a saudacao e dez soldados da guarda de honra que apresentaram armas, logo em seguida, alvejaram-no, Devido a traicao planejada, Guajardo foi pro movido a general e recebeu de Car- ranza 50 mil pesos pelos “notaveis servicos no exercicio”. Jé quase no final do mandato, Carranza indicou Ignacio Bonillas para a suicessAo. Ao mesmo tempo, ele acusou Alvaro Obregén Salido de conspiracdo, 0 que causou mal-es- LEMTURAS DA HISTORIA | $1 AMERICA DO NORTE | Revolucado Mexicana ‘ADOLFO DE LA HUERTA tar a Plutarco Elias Calles, Adolfo de La Huerta e ao proprio Obregén que, juntos, proclamaram o Plano de Agua Prieta, documento pelo qual desco- nheciam o governo constitucionalista e proclamavam a soberania do estado de Sonora. Com medo do grupo e sen: tindo-se incapaz de defender a capi- tal mexicana de um ataque iminente, Carranza tentou mudar-se para Vera cruz, levando consigo 0 mobiliério do palacio, maquinas para imprimir moeda ¢ o erdrio nacional. Mas im: pedido por uma emboscada, ele nao chegou ao seu destino final, pois foi assassinado durante o trajeto, na al- tura de Tlaxcalantongo, em Puebla, ‘em 21 de maio de 1920. Com a morte de Carranza, Adolfo de la Huerta foi nomeado presidente provisério pelo Congresso da Unido em 1° de junho de 1920. No cargo, 52 | LEMTURAS DA HISTORIA i H i conseguiu que Pancho Villa abando: nasse a vida militar depois da assina tura dos Convenios de Sabinas, que concedeu ao revoluciondrio a patente de general de divisdo e a fazenda de Canutillo, em Chihuahua, para onde se retirou, Em setembro, convocou eleigdes que conferiram a Obregén a presidéncia mexicana, Adolfo até ten- tou ser eleito novamente, mas como Obregén favorecia Calles, ele desco: nheceu 0 governo, desencadeando a chamada rebelido delahuertista, que foi apoiada por dois tercos do exército nacional. Mas como o movimento fra: cassou, em 11 de margo de 1924, Huer- ta exilou-se na California. Nesse interim, em 20 de julho de 1923, Villa, acompanhado pelo coronel Miguel Trillo, Rafael Medrano e Claro Hurtado, além do seu assistente, Daniel Tamayo, foi emboscado e morto por Je- sits Salas Barraza a entrada de Parral. Embora até hoje ninguém saiba expli- PANCHO VILLAS MORTO caras verdadeiras causas do seu assas- sinato, que foi dissimulado em um aci- dente de carro, muitos acreditam que ele se deu por ordem de Obregén ou até de Calles. Desde entao, com a morte dos dois lideres, 0 movimento revoluciona- rio perdeu forca e acabou por permitir a entrada do liberalismo em territério mexicano, com 0 devido apoio da elite proprietaria de terras. Pouco depois, em 1° de dezembro de 1924, Calles assumiu a presidéncia. Mas durante os dois dltimos anos do seu governo, devido & oposicéo que softia por parte da Igreja catélica, viu a situagao do México tornar'se critica, a ponto de favorecer o surgimento do movimento armado conhecido como Guerra Cristera, Diante de tal contexto, pouco antes de terminar o seu proprio. mandato, reformulou os artigos 13° € 82" da constituigéo de 1917, para asse- gurar a possibilidade de Obregon ser Rovamente eleito, fato que realmente aconteceu apés o pleito realizado em 1° de julho de 1928. Porém, antes de assu- mira presidéncia, que obteve com uma ampla margem de votos, Obtegén foi assassinado em um restaurante da Ci- dade do México por José de Le6n Toral, uum catdlico fanatico. Calles, entao, reassumiu 0 cargo e, de imediato, fez um discurso piblico, no qual assegurou que, além dos con- flitos terem chegado ao fim, estava de- cretado 0 inicio da etapa das institui ‘ces. Para tanto, ele fundou o Partido Nacional Revolucionario que, depois, passou a ser chamado de Partido da Revolugio Mexicana e, finalmente, Partido Revolucionario Institucional que, mesmo abandonando os princi- pios revolucionarios de 1910, governou ‘© México por mais de 70 anos. ATE HOJE 0 NGMERO DE MORTOS DA REVOLUGAO MEXICANA € APENAS ESTIMADO Apesar da sucesso de nomes que se revezaram na luta pelo poder, até hoje ninguém sabe precisar ao certo quando a Revolugo Mexicana chegou ao fim, devido ao reajustamento das forcas e dos assassinados dos principais chefes revo lucionarios — Zapata em 1919, Carranza em 1920, Villa em 1923 e Obregon em 1928. Por isso, enquanto alguns defendem que foi no ano de 1917, com a proclamagao da Constitui¢do do México, outros indicam 1920, com a presidéncia de Adolfo de la Huerta, ou 1924, com a de Plutarco Elias Calles. No entanto, ainda ha quem prefira assegurar que 0 processo estendew-se até 1940, conforme sugere o historiador inglés Alan Knight, da Universidade de Oxford A ele se contrapdem historiadores con: tempordineos que ja questionam os estudos feitos sobre essa etapa, porque grande par te deles foi realizada sob a dtica do Partido Revolucionério Institucional, que promo- veu tanto a institucionalizagao de caudi- Thos e mitos quanto o fato de que as suas principais demandas ndo serem atendidas. Partindo dai, eles ainda questionam se esse capitulo da hist6ria mexicana deve ‘mesmo ser denominado de revolucio. Em La Revolucién Interrumpida, por exemplo, ohistoriador Adolfo Gilly, de plista, sugere que a revolta popular lidera- da por Villa Zapata foi terminada pelos ‘grupos liberais de Carranza e Obreg6n, Apesar das intimeras hipéteses, in lusive as que ainda podem surgir, sabe- mos ao certo que Zapata se opds a varios governos sucessivos no México — Ma m modo sim- dero; Victoriano Huerta; e, por iiltimo, Carranza —, e, juntocom Villa, mantinha ‘como meta comum o retorno as origens, pois acreditava que, assim, haveria a re valorizacao da identidade indigena me xicana. Contudo, ambos também contes: MeMaROS ATUAIS 00 EZNL tavam a transformagao dos latifiindios em fazendas modernas, pois queriam a volta do antigo sistema indigena de co- munidades coletivas ~ 0s ejidos. Considerando esses detalhes, com © assassinato deles, o movimento revo: luciondrio realmente perdeu forca e im: portancia. Contudo, e dei xaram, germinou novamente em 1° de janeiro de 1994, com o conflito de Chia: pas, que deu origem ao Exército Zapatis: ta de Libertacao Nacional (EZLN), uma organizacdo armada de carater politico- militar, composta de maioria indigena, inspirada no movimento zapatista, Na ocasiéo, a organizagdo atacou ‘ocupou varios municipios do Estado, en- quanto entrava em vigor 0 Tratado de Li ‘vre Comércio da América do Norte, duran: te o governo de Carlos Salinas de Gortari. A pretensdo do EZNL era grande. Além de derrubar 0 presidente eleito democratica ‘mente, o grupo ainda desejava implantar ‘um governo Socialista no México. Contida em menos de duas semanas, @ operagio fracassou. Porém, 0 governo mexicano propds acordos aos novos zapa- tistas como parte de negociagbes de paz. Mas sem cumprir nenhum deles, o povo da regio se dividiu entre comunidades que © apoiavam e as que simpatizavam com 0 grupo que, por sua vez, caracteriza-se pela guerrilha de esquerda radical, com o obje- tivode subverteraordem, fazer arevolugio ceciar, assim, uma sociedadle mais justa. Desde entio, surgiram tensbes so- ciais na regiao e os incidentes paramt- litares aumentaram, culminando, por exemplo, com a morte de 45 pessoas na aldeia de Acteal em 1997 e, em varias ou: tras ocasiées, que exigiram forcas do go- ‘verno para conter a situacao. Porém, di de o inicio, o governo mexicano preferiu adotar uma postura indiferenteao grupo, que ainda sobrevive, gracas & populacéo {indigena local e apoio financeiro estran- geiro, reivindicando os mesmos dir que os lideres do século passado. = LEMTURAS DA HISTORIA | 53, OPINIAO | Eleigées americanas A INTOL et FN Avitéria do polémico Donald Trump a Presidéncia dos Estados Unidostraztemor Ee eee rei uae Ce eee eT eee ty possam resultar das promessas populistas do candidato republicano Cenc CE 54 | LEMTURAS DA HISTORIA rump venceu no bojo de uma onda Tessin como sistema e da- queles que canalizaram sua insa- tisfagdo no candidato que mais se iden tificava com sua visio de mundo. Com ‘Trump triunfou o politicamente incorre- to, 0 sentimento primitivo, o rancor ea intolerancia contra os imigrantes. Ven ceu 0 medo ao novo, ao diferente, aos ‘outros que ameacam seu modo de vida. Com o resultado da eleigao norte-ame: ricana sairam perdedores os seguidores da religio mugulmana, as minorias, os im srantes, os refugiados, os ambientalistas e todos aqueles que buscam a justica social 0 fim de qualquer tipo de intolerdncia e discriminagao. Saem vencedores os xend- fobos, os racistas, os intolerantes eos dis seminadores do medo contra a globaliza- (80, a diversidade e ao diferente. A extrema direita europeia comemo- rou a vitéria de Trump; sua ideologia se identifica com 0 fascismo mais abjeto merecedor da repugnancia da humani dade, mas, no entanto, saem fortalecidos. Mas, 0 que acontecera quando ele néo conseguir concretizar suas promessas de volta aum pasado glorioso, de bonancae de muitos empregos na indistria, cendrio ideal imaginado pelos seus eleitores? 0 emprego industrial prometido por Trump néo voltara. As indastrias que retornam aos Estados Unidos fazem uso intensivo de novas tecnologias, empregam pouca mio de obra, desemprego na indastria 6 estrutural e deve-se tecnologia e a0 proceso de globalizaco que aumenta a competicio entre as empresas, o que as forca a estarem melhor equipadas tecno: logicamente. N3o h4 volta ao passado. Expulsar imigrantes, barrar a entra da de refugiados n nomia, ndo traré de volta os empregos prometidos na campanha. 0 discurso do dio provocara deportacées, multiplica- das barreiras que impedirdo o ingresso de imigrantes. Mas a promessa de pros- peridade, tal como prometeu o vitorioso ‘Trump, ndo se cumprir, A quem o elei to culpard entio? O futuro nao oferecer respostas agradveis, pois certamente 0 inimigo sera externo. jo vai melhorar a eco- MIKE PENCE, © CONSERVADOR VICE DE DONALD TRUMP £ importante notar que dentre a série de medidas controversas que 0 eleito pre- sidente norte-americano prometeu implan- tar ha varias que impactam diretamente fem recentes avancos econémicos, sociais ambientais de cardter global. Em termos econémicos levara adiante uma politica protecionista, contratiando todo movimen- to global de liberalizagéio dos mercados e formacao de blocos econ6micos. ‘As medidas anunciadas por Trump colidem frontalmente com 0 movimen- to global de amparo aos refugiados e 0 estabelecimento de quotas para recebi- mentos destes. Promete barrar os imi- grantes latinos, construindo muro na fronteira mexicana e bloquear a entrada de praticantes do islamismo, a quem considera como provaveis terroristas. Do ponto de vista social a futura politica de Trump é catastr6fica. A luta contra 0 aquecimento global deve perder o apoio dos Estados Unidos, pois oleito a anunciou que reverd todos, (08 acordos assinados, os quais considera «que prejudicam a economia norte-ameri cana. A exploracio do petzdleo uti do o mecanismo do Fracking devera ser Aexpectativa nao é boa, mas as instituigdes norte-americanas, que sao s6lidas, poderao conter o impeto reacionario do candidato eleito. $6 temos que torcer ampliado, mesmo contrariando todos os estudos que o condenam, pois é um ele- mento fundamental para manter a auto- nomia norte-americana diante dos paises arabes ¢ outros produtores globais. A paz mundial regredir4, pois.a aten- 80 do futuro presidente estara voltada parao fortalecimento militar norte-ame- ricano, com maior presenca global. Sua provavel alianca com Putin devera favo- recer intervencoes militares em areas de conflito onde os dois pafses tenham inte- resses, comecando pelo Oriente Médio. ‘A expectativa no & boa, mas as instituigées norte-americanas, que s80 sélidas, poderao conter 0 impeto reacio- nario do candidato eleito, $6 temos que torcer para que isto aconteca, pois a al- ternativa é assustadora.m@ Reinaldo Dias é professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, campus Campinas, Doutor em Cléncias Socials e Mestre em Ciéncia Politica pela Unicamp.& ta em Ciéncias Ambientais, LEMTURAS DA HISTORIA | 55, » AJOVEM GIOCONDA CC recon Cee Ce MRO Om Tum Lm (Cy © quadro seja realmente auténtico e que a modelo de Isleworth seja a jovem Lisa Ce Or ORCC ROR Rene Racy CeCe Lee y entre, aproximadamente, ses- Da prena ie ~ ou Giocondas — espalhadas pela Europa, Estados Unidos e Japao, uma parecia se destacar por toda a sua discrigao: a Mona Lisa de Isleworth ~ ou Jovem Mona Lisa, um 6leo sobre tela pouco maior (84,8 X 64,8 cm) que a festejada versio do Louvre (78,8 X 53,3 cm), Paris, e mais antiga também. Basicamente, as duas pinturas séo muito parecidas e, a principio, chama a atengao o fato de a modelo dessa pri- meira verséo mostrar-se mais jovem e bonita. As origens mais seguras desse quadro remontam a metade do século 48, quando foi removido do Pakicio de Francesco del Giocondo, seu primei- 10 proprietario, para a Gra-Bretanha, onde faria parte do patriménio de um aristocrata de Somerset por quase dois séculos. Durante a 1° Grande Guerra, por razdes de seguranca, a pintura é enviada aos Estados Unidos. Emseure- torno a Gra-Bretanha, ¢ adquirida por Sir William Hugh Blaker, conservador do Holburne of Menstrie Museum of Artde Bath, perito e célebre coleciona- dor de arte, que logo a transfere para sua residéncia em Isleworth, subirbio aoeste de Londres (esta aquisicao teria ‘ocorrido em janeiro de 1914). Mais tarde, em 1962, o cientista americano e especialista em Arte, Dr. Henry F. Pulitzer, juntamente com um consércio suico, passaria a ser 0 novo proprietirio da obra. Neste tempo, ela permanece em seu apartamento de Kensington, também Londres. Pulit- zer 6 autor de um grande estudo sobre a pintura, publicado sob o titulo Whe- re is the Mona Lisa?, provavelmente em 1966 (na obra nao ha referencias exatas do ano de sua publicacdo). Apés sua morte, em 1979, 0 quadro se torna propriedade da companheira, Elizabeth Meyer, ao que, desde seu fa- lecimento em 2008, é mantido por um consércio internacional em um cofre de banco de Genebra, Sufca. Coube a The Mona Lisa Foundation (fundada em 2010 e com sede em Zurique) a ta- refa de pesquisar absolutamente tudo a seu respeito e de divulgé-lae promo- vé-la em escala mundial. A personagem de Jovem Mona Lisa, na opiniao do Dr. Pulitzer, seria a ver- dadeira Mona Lisa (sendo que “mona”, do italiano antigo, significa “senho- ra"), uma jovem 19 anos mais nova que a retratada no Louvre — que teria 34 anos 6poca da execucao do qua- dro. A modelo, de nome Lisa Maria de {anteriormente Lisa Camila Gherardini), era esposa de um comerciante de sedas florentino, um emergente chamado Francesco di Bartolomeo di Zanobi del Giocon- do. Naquela ocasiao, enlutada pela morte da pequena filha, trazia 0 que parecia um fino véu de luto cobrindo sua cabeca: algo no tao claro na clas- sica versio. J4 nesta dltima, a jovem seria a amante de Giuliano de Medici, Costanza D’avallos, a Gioconda, cuja silhueta fora supostamente usada no mesmo esquema de desenho manti- do da versao anterior. Assim, o termo “gioconda”, ou “sorridente”, nada te- ria a ver com Del “Giocondo”, apenas significando a expressao da retratada em seu idioma de origem. Para alguns pesquisadores, a verda- deira identidade de La Gioconda seria, ainda, Isabella Gualanda (uma outra amante de Giuliano), ou Isabella 4"Este ‘ou, mesmo, Cecilia Gallerani (a mode- Jo de Dama com um arminho, hoje em Crac6via), ambas figuras da sociedade italiana daquele tempo, assim como, talvez, Bianca Giovanna Sforza (filha de Ludovico, 0 Mouro), ou alguma cortes’ espanhola, dentre outras apostas. UMA TEORIA POLEMICA O famoso cronista Giovanni Loma- zz0, em 1584, menciona duas obras que identifica por “della Gioconda” e “di Mona Lisa”, fazendo clara distin- go entre esta e aquela. Ademais, na carta de um procurador de Isabella D'Este, ha referéncia sobre o fato de Leonardo estar trabalhando em dois retratos ~ e, pela data, podemos con- cluir serem, entio, as duas vers6es da Mona Lisa. Mais: em Cloux, 0 secreté- rio do Cardeal D'Aragon, Antonio de Beatis, toma nota das conversas que © religioso mantém com Leonardo, deixando bem claro em suas observa- 1 Um dos técnicos chamados para os exames na Gioconda apés ser roubada do Louvre em 1911, 0 Prof. Comendador Lorenzo Cecconi, dé como um auténtico Leonardo versao de Londres; 2 Hugh Blaker e também co- ecionador de arte, em sua publi- cago The Two Mona Lisas (1924), havia identificado na versio de Isleworth — a época em Somerset — as mos e 0 rosto como marcas inquestionéveis de Leonardo; 3 Segundo um artigo publi- cado na Century Magazine (edicdo de fevereiro de 1914) assinado por Walter Littlefield, mais outra verso, a recém-res- taurada Gioconda Velata, do Museu do Prado (Madri), teria sido adquirida por Carlos I de Espanha apenas para competir com Francisco I da Franga e a sua “original”. Essa pintura, & época, era tida como legitima, mas toda a glamourizagao e mistica em tor- no da de Paris foram gradativa- mente “embagando” sua impor- tancia ¢ legitimidade, Seja como for, a versdo mais aceita agora é a que atribui a autoria da “Velata” a Salaino ou a Francesco Melzi, assistentes de Leonardo, John Eyre, padrasto de Ges que a obra do Louvre teria sido encomendada para Giuliano de Medici (dai, Costanza) ~ ha, ainda, outros in- trigantes dados apresentados por Pu- litzer (VER QUADRO ACIMA). DISCUSSOES E MAIS EVIDENCIAS Henry Pulitzer argumenta que os catedraticos normalmente se mostram insatisfeitos quando surge uma obra inédita de algum génio. 0 apareci- ‘mento de uma peca nessas condi¢ées pode obrigé-los a interferir em suas pesquisas, teorias arduamente cons- truidas e, até mesmo, invalidar um nome ou vida académica. LEMTURAS DA HISTORIA | 57, ARTE | Mona Lisa de Isleworth PROF. ALESSANDRO VEZzO: Desde que foi adquirida com Pu litzer pelo consércio suico e, poste riormente, internacional, a obra tem passado por uma verdadeira cruza da para se confirmar nao s6 a auto ria de Da Vinci, mas também que se trata da mesma modelo do Louvre © que estudos posteriores acabariam por comprovar. Para tal, a Mona Lis Foundation tem buscado 0 maior n mero possivel de evidéncias advin das de varias éreas do conhecimen to. Seguiram-se retamente critérios de metodologia da pesquisa cien tifica sob a supervisdo de grandes especialistas, como o Prof.Alessan- dro Vezzosi, diretor do Museo Ideale Leonardo da Vinci — uma das maio res autoridades em Leonardo no mundo —, ow o Prof. John F, Asmu: fis nil sufgos como o Instituto Pesquisa em Arte. Baterias de testes foram realiza das com luz ultraviolet, datacao por carbono e exames de medicao por espectrometria de raios gama ao que, sobretudo em conjunto, condu. ziram a época de execugio do qua: co da Universidade da Califor San Diego, além de laborat6rios igo para 58 | LEMTURAS DA HISTORIA DIRETOR DO MUSEO /DEALE LEONARDO 0A VINCI, DURANTE UMA APRESENTACAO DA PINTURA EM GENEBRA Baterias de testes foram realizadas com luz ultravioleta, datagao por carbono e exames de medicao por espectrometria de raios gama ao que, sobretudo em conjunto, conduziram a época de execucao do quadro para o inicio do século 16 dro para o inicio do século 16. Em 2005, confirma-se que os pigmentos nele usados eram disponiveis na Florenca de Da Vinci. Ainda sobre sua datacao, ao longo destas incur: sées laboratoriais, descobriu-se que todo o tratamento ali empregado obedeceu com rigor as orientagées apresentadas por Leonardo no Trat- tato della Pittura. E foi ai que se viu que os pigmentos escolhidos para a base da pintura (uma combinacao de ocre vermelho-castanho e calcita —CaCO,, muito em voga na Alta Re nascenca —, e quartzo) so os mes. mos ou similares dispostos também como base para outros de seus tra CERTIFICADO Instituicdes e responsaveis pe los exames mais significativos sobre a pintura até hoje, fornecida pela propria fundagéo por meio de seu vice-presidente, David Feldman: © PROFESSOR HERMANN KUHN, Mu NIQUE — ANALIS Instrturo Suico Para PEs SA EM ARTE, ZURIQUE — A DE PIGMENTOS; @ Eprrecn (DR. MAURICIO SERA cin), FLORENGA PIGMENTOS E DO SUPORTE; © Lumiere cat CorTE), DE PIGMENTOS; TECHNOLOGY Paris ho MULTISPECTRAL; @ PROFESSOR ALFONSO RUBINO, ITALIA ~ ANALISE GEOMETRIC @ THE Mona Lisa Founparion, ZURIQUE PECTRAL E MATEM @ UniverstDabe DE OXFORD, La. BORATORIO DE PESQUISA, UK ~ DA: (Pas DIGITALIZA- ANALISES VISUAL, ES: TAGAO POR CARBONO: @ ESCOLA DE CIENCIA E TECNOLO- GIA (PROF, HANS-ARNO SYNAL), ZURIQUE - DATAGAO POR CARBONO; @ ProrEssor JOHN AsMus, UNI VERSIDADE DE SAN D1EGO, CALIFOR NIA — ESTUDOS CIENTIFICOS SOBRE REFLEXOS, IDENTIFICAG CELADAS, E VAS ESPECTRAIS EESPACIAIS, 0 DE PIN ANALISES COMPARATE Por fim, disponibilizou-se © resultado desses trinta e cin co anos de intensas pesquisas no site (/monalisa.org), além do langamento do livro Leonardo da Vinci's Earlier Mona Lisa. AS concluses parecem indicar que 0 quadtro seja realmente um Leo: nardo auténtico e quea modelo de “Isleworth” seja a jovern Lisa Ghe rardini, 11 a 12 anos mais nova do que a versao do Louvre. balhos, vide La Belle Ferronniére, A Santa Ceia e a Mona Lisa do Louvre. A respeito desta iltima, Asmus dird que similaridades espectrais indi- cam ter vindo da mesma paleta. MADONA DE BENOIS, DA VINCI, OBRA CONHECIDO PELO USO DA TECNICA SFUMATO, MUITO USADA PELO MESTRE Em 2005, foram descobertas anotacgdes datadas de 1503, de um secretario de Niccolo Machiavelli, Agostino Vespucci. Segundo consta dos escritos, o autor teria testemunhado o Da Vinci iniciando um retrato de Lisa Del Giocondo Em 2005, essa teoria recebe um con- sideravel reforgo: na Universidade de Heidelberg (Alemanha), foram desco bertas as anotagoes datadas de 1503, de um secretario de Niccold Machiavelli, Agostino Vespucci. Segundo consta dos escritos, o autor teria testemunhado 0 artista iniciando um retrato de Lisa Del Giocondo. Note-se que, hoje, grande parte do mundo académico ja concorda que a Gioconda de Paris, por razbes téc- nicas mais especificas, tenha sido exe- cutada em algum momento apés 1508. Sobre as criticas de que a obra tal- vez nio seja um original pelo fato de ser sobre tela, em vez de madeira (& época, de longe, 0 suporte mais usa- — aaa pnb goed et fs et Tasos rpeceknpin © cr CoRR TRATTATO DELLA PITTURA, € UM LIVRO SOBRE FUNDAMENTOS E TECNICAS DE DESENHO E PINTURA do), imagino serem despropositadas. Isso equivaleria a, daqui a quinhen tos anos, os estudiosos sobre Historia Cultural do século 20 recusarem-se terminantemente a admitir que Tom Hanks seja 0 mesmo ator dos drama- Ihdes Filadélfia ou 0 resgate do solda- do Ryan, somente por também ter sido protagonista das mais populares co- médias dos anos 80. Na mesma mao, a Madona de Benois, hoje no Hermi tage, Sto Petersburgo, é uma pintu- ra sobre tela autenticada por prati- camente todos os especialistas em Leonardo. E, trabalhar diretamente sobre a tela nos grandes centros ar- tisticos da Itélia renascentista estava longe de ser algo inacreditavel. Ora, se encaramos 0 artista como um génio aberto a quaisquer tipos de andlises e experimentagdes — inclu sive para exercer sua arte —, nao é nenhum espanto que ele efetive sua inclinagao a novos procedimentos, deixando 0 Alamo um pouco de lado. Tal vocacdo ja tinha, inclusive, oca- sionado o desastre que acometeu sua segunda mais famosa obra, A Santa Ceia, em Santa Maria delle Grazie, Milo, deteriorando-a consideravel- mente com uma mal lograda técni: ca a base de témpera. £ até curioso: quando Leonardo é mal-sucedido em novo experimento, aceitamos com na: turalidade sua responsabilidade na empreitada. No caso de Jovem Mona Lisa, entretanto, visto que tudo cor reu perfeitamente bem, é invidvel que se Ihe dé crédito? Alias, 0 proprio jé escrevera sobre 0 assunto “tela” em seu Trattato della Pittura, publicado postumamente em 1651, Entretanto, diferentemente de Pulitzer, a opiniio da fundacao 6 a de que ambas as personagens sejam, na verdade, a mesma pessoa. Logo, © Louvre exibiria nao Costanza, mas Lisa também, Um de seus mais fortes argumentos — quase que uma prova definitiva - 6 0 comentario sobre a visita feita a Leonardo pelo secreté tio Antonio de Beatis. Tal encontro aconteceu em 1517, na Franca, onde 0 artista ja residia a convite de Francis- co I. E. quando o secretirio faz mencao a um dos quadros apresentados pelo artista como 0 retrato “de uma certa mulher florentina, feito de observa- 40, sob 0 conselho do saudoso liano de Medici, 0 Magnifico...". Pela LEMTURAS DA HISTORIA | 59 ARTE | Mona Lisa de Isleworth O Sfumato era uma tarefa que dependia de carga extra de paciéncia e mindcia do autor. Coma técnica alcancava-se uma esfera magica, para além de tudo o que se tinha sido visto em termos de producao visual humana data do evento, sé podemos conc que o retrato seja o que hoje esta no Louvre, tendo em vista jé pertencer as colecdes reais francesas juntamente com Sant’Ana, a Virgem e 0 Menino e © Sdo Joao Batista, também citados por De Beatis. Assim sendo, Costan- za, de procedéncia napolitana, estaria definitivamente excluida de qualquer chance como candidata a musa — ape: sar da referéncia a Giuliano que, ao que parece, se coloca mais como um admirador de Lisa, O “SFUMATO”, EFEITO 3D SEM OCULOS Apesar de ter elevado a técnica co- nhecida como “sfumato” a um novo nivel a0 uni-la & pintura a 6leo, Leo nardo da Vinci nao é seu criador, como comumente se considera. Esse termo italiano significa “tornado fumaca”, “esfumacado”, “evaporado”, pois era © que acontecia com as marcas de pin céis sobre uma pintura: praticamente sumiam. O procedimento, na verdade, tem origem remota e imprecisa, cuja aplicagao sistematica vem sendo de monstrada ha milénios, sobretudo, no desenho e em técnicas a seco. Com Da Vinci, 0 cluindo uma nova técnica de “glacis” (nao confundi-la com aquela de seus primeiros trabalhos, executados antes do desenvolvimento dessa variante da vitrificagao), consistia na aplicacao de uma camada de éleo misturado com uma quantidade minima de pigmento colorido por sobre uma base branca no suporte da pintura. A partir dis so, obtinha-se uma fina camada que reproduzia um tom colorido etéi evanescente. Tal procedimento permi: “sfumato”, in: 60 | LEMTURAS DA HISTORIA A ADORACAO 00S MAGOS, OBRA INACABADA DE VINCI, EM RAZAO DE SUA PARTIDA PARA MILAO tia que a luz, ao atravessar esse “véu", esbarrasse naquele fundo do suportee refletisse para o expectador. Os varios tons de sombra nessas obras tardias do artista, na verdade, devem-se as sucessivas aplicagées dessas cama: das. Apresentando cada uma delas pigmentagio especifica, umas sobre as outras, obtinha-se um efeito de constancia vibrante. Como dito, 0 peculiar processo sur. ge apenas nas iltimas obras do artista e, provavelmente, a Gioconda do Lou vre foi a primeira em que foi utilizado. Algumas evidéncias a esse respeito foram confirmadas pelas _recentes descobertas sobre o quadro feitas pela especialista Mady Elias, do Centro Na cional de Pesquisa Cientifica da Fran- a, € pelo engenheiro Pascal Cotte da Lumiere Technology (digitalizagao multiespectral). Sem divida, do ponto de vista artistico, era uma tarefa que dependia de carga extra de paciéncia eminticia do autor. Por outro lado, por meio de suas maos, alcancava-se uma esfera magica, para além de tudo 0 que se tinha sido visto em termos de produgao visual humana, IMPLICACOES FILOSOFICAS Outro relevante fator renascentista sobre Jovem Mona Lisa parte do gran de interesse de Leonardo pela busca de um ideal da beleza (ordem) maior: 0 principio dual ou “dos opostos” nas coisas. Essa questio do dualismo nos remete a Hericlito de Beso (€.535-47 a.C.)e seus pensamentos sobre 0 cos- pattir dai, também os estudos sobre Fibonacci e a razdo aurea, a forga do equilibrio simétrico, seriam de uma importancia singular em suas compo- sigoes. Em especial, na iconografia de Da Vinci que aborda o tema juventude maturidade, temos alguns exemplos de como tais implicagées filos6ficas seduziam o genio do artista ‘Um bom exemplo de como Da Vin ci, na qualidade de artista-desi; deixava-se seduzir pela complexidade AS MARCAS DA RENASCENCA No que tange & compo execugio da pintura, as maos e 0 rosto da retratada sdo suspeitamente ‘leonardescos” demais, devendo ter sido, mesmo, executados pelo pr6: prio. Afinal, além do alto nivel técnico com que a obra foi executada, todo 0 tratamento aplicado aos elementos principais do quadro se encaixa per- feitamente ao melhor do estilo de de senho do mestre, Aléin disso, cabega, pescogo ea base das colunas indicam as pinceladas de um artista canhoto como Da Vinci. E mesmo aquele cli ma etéreo que se verifica na versio do Louvre também aqui é reconhecivel: aplicando-se a técnica do “sfumato” simples, emprestou certa aura de mis- trio a composicao. diversa que ha em tudo, pela ideta de que cada um de nés 6 um universo & de que 0 universo também é cada um de nés, esté no célebre 6leo sobre ma: deira A adoracdo dos magos, nos Uf fizi de Florenca, iniciado em 1481 deixado inacabado a partir de 1482. Ai, em detalhe, vemos um grupo de jo vens em torno de uma alfarrobeira em contraposi¢4o ao grupo de idosos que circunda a cena principal, a do epis6. dio neotestamentario da visitagao dos magos do titulo e seu reconhecimento Essa versdo ainda apresenta Lisa entre duas colunas gregas ~ um ape lo claramente renascentista — ine xistentes na de Paris, mas presentes num esbo¢o feito por Raffaello San. zio (de 1504), mesmo periodo em que Leonardo trabalhava nessa Mona Lisa mais jovem. Vale observar que exames recentes dao conta de que a Gioconda do Louvre jamais teve suas laterais cortadas. Tal procedimento era corriqueiro a época e em séculos subsequentes, visando a um perfeito encaixe da pintura com uma moldura previamente arranjada Isleworth, como em alguns tra balhos autenticados de Leonardo (A anunciagdo, dos Uffizi de Florenc: ou a prépria Mona Lisa do Louvre), @ divindade do Menino Jesus. Um en- tendimento mais profundo acabou por se abrir as mais diversas interpreta- ‘ges ao longo dos séculos. A alfarroba (e nao “gafanhotos”, como na Vulgata e maioria das tradu- es), juntamente com 0 mel silvestre, 6 descrita na Biblia como a dieta que Sai Jodo Batista, patrono de Florenca, adotava nos desertos da Judeia. Logo, 6 bem razoavel supor que essa arvore, tornando-se um simbolo da espiituali- dade do profeta na Itilia renascentista, também segue o uso da seco durea. Extensamente utilizada na Renascen- 6a, a secdo durea é um recurso estru: tural para composicdes matematicas em arte e engenharia descoberto na Antiguidade e que se opde ao princi- pio do cruzamento de eixos. Assim, © artista fazia com que, a partir da estratégica subdivisio da imagem em varios reténgulos, fossem produ- Zidas partes maiores e menores que se autogerariam ao infinito. Por con- seguinte, esse efeito conduz nossa vi séo a orientacao em espiral resultan: do numa transcendente ordenacéo no espaco, como também seria o ritmo natural. A propésito, falar em cons. trucdes geométricas sobre Isleworth & mergulhar em uma série deanalogias de clculos e referéncias a versao do Louvre onde, mesmo a Tese Goldblatt pode ser ai conferida. © pai desta descoberta, Maurice H. Goldblatt, foi um especialista e crftico de Arte na Chicago do inicio do século 20 - tendo atuado, inclu: sive, desmascarando falsificagoes da “Mona Lisa”. A tal tese assegurava que somente em auténticos dos” via-se que a linha da boca de um sorriso feminino era desenhada no arco de um circulo que, quando estendida, tocaria 0 canto externo em um ou ambos os olhos. Também aponta que, em casos onde a cabeca da modelo apresenta-se descoberta (como na “Mona Lisa”), seu contorno arco de outro circulo duas vezes 0 diémetro do primeiro circulo”. possa estar sendo objeto de veneracao por aquele grupo de rapazes na pintura inacabada. Tal visio bem se harmoni- zara ao grande interesse pelo gnosti cismo revisionista (inclusive, do pré- prio papel de Joao Batista no universo cristo) que circulava nos ambientes italianos mais eruditos e pelos quais Leonardo ~ a julgar por tantos de seus desenhos e anotagdes -, parece ter de- monstrado curiosidade. Finalmente ~ mas ndo definitiva- mente -, 0 cartone Sant’Ana, a Vir- LEMTURAS DA HISTORIA | 61 ARTE | Mona Lisa de Isleworth gem e 0 Menino com Sao Jodo Batista crianca (1499-1500), um carvao e giz sobre papel, hoje na National Gallery de Londres, confronta, numa apécri- fa cena imaginaria, a juventude de Maria 4 maturidade de sua mae. 0 interessante ai é 0 fato de essas duas personagens guardarem forte seme- Ihanga fisica com Lisa Gherardini tanto na juventude (Mona Lisa de Isle- worth) quanto na maturidade (versio do Louvre). Ai reside uma grande evi- déncia que corrobora meu pensamen- to: dois importantes seguidores de Da A ViRGEM, 0 MENINO, SANT'ANA & SAO JOAO BATISTA Vinci, Bernardino Luini (em A Sagra- da familia, na Biblioteca Ambrosiana, Milao) e Francesco Melzi (em Vertum nus e Pomona, na Gemiildegalerie de Berlim) realizaram adaptacoes do de- senho em pinturas que permitem ver facilmente a modelo de Jovem Mona a, de fato, como a Virgem Maria no original de Londres. Assim, a Jovem Mona Lisa, 0 con- traponto mais jovem a classica ver- sio de Paris, soma-se a obra icono- stifica dos opostos criada por Leo nardo. Sua correspondéncia perce- CarTao Da A VinGem € 0 MENINO com SANT'ANA bida em relacdo a do Louvre é mais que clara: 0 proprio aspecto geral da agem em si nos revela a represen- tacdo evidente de um rejuvenesci- mento de “La Gioconda”, E ainda ha mais um forte elemento circunstan- cial: a presenga de cosmético para 0s labios na jovem Lisa Gherardini, © que s6 vem a fortalecer a relacio direta entre as duas vers6es - uma jovem, outra mais velha, Em plena virada do século 15 para 0 16, 0 uso desses materiais em tons avermelha- dos e vivos em mulheres maduras portanto, reservadas - era extrema- mente inapropriado. Ademais, va- rios estudos para que se restauras- sem as cores originais na Gioconda do Louvre demonstraram que seus labios nao seriam muito mais cora- dos do que aparentam atualmente. De fato, nem a Mona Velata do Prado apresenta-se assim. ‘A Gloconda / Mona Lisa do Louvre, enfim, para Leonardo, apenas devera existir caso também exista um outro ponto de equilfbrio, a Jovem Mona Lisa. Sobre esse contraponto, ele refle- tiria ainda mais a respeito dessa real dade invisivel e maior, em que os opos- tos — mais que curiosamente — neces- sariamente orquestram 0 movimento da Historia e de toda a Criacdo. 0 professor Atfa Soares da Costa Filho ¢ designer. especialista em Historia, Antropologiae Filosofia; autor das obras A Jovem Mona Lisa e Leonardo eo Sudério. ‘Também écolaborador na Mona Lisa Foundation (Zuriqu). (62 | LEITURAS DA HISTORIA MOMENTO DO LIVRO A FILOSOFIA EXPLICA POR QUE E TAO DIFICIL SE RELACIONAR ENTENDER A QUIMICA DOS RELACIONAMENTOS E A CHAVE PARA CONSTRUIR LACOS VERDADEIROS. ‘Arabsoioes Desde a antiguidade, os mais importantes fil6- sofos nos fazem refletir sobre os caminhos para POR QUE vencer 0 distanciamento afetivo. 0 tema nunca foi E TAO DIFICIL to atual, ja que hoje vivemos numa época de so- lidao compartilhada, em que manter vinculos tor- SE RELACIONAR swou-se um grande dese. Neste livro, Platao, Rousseau, Schopenhauer, Nietzsche e outros pensadores abordam o assun- to das mais diferentes formas: do desejo ao casa- mento, da amizade a busca do parceiro ideal. Sao ensaios que oferecem ao leitor ferramentas para compartilhar a vida com mais equilibrio e amor. Livro: A filosofia explica - Por que é tao dificil de relacionar Namero de paginas: 100 Editora: Escala Avenda na loja Escala www.escala.com.br rag ‘A redacio agradece as mensagens recebidas, que poderdo ser resumidas para a publicacSo. Para falar com a LH: leturasdahistoriag@escala.com.br. Fare: paz ameacada? Entre todos 05 pontos apontados adequadamente no artigo sobre 0 nao ao ple- biscito da paz proposto as Fare, um de suma importén- cia foi esquecido: a influéncia dos lideres religiosos evangé- licos sobre um rebanho que engole aquilo que the é im- posto, devido a interpretacao irracional da Biblia. Como 0 acordo de paz rejeitado tam- bém visava promover uma sociedade mais igualitaria que, | por sua vez, deveria respeitar a “diversidade de género, é nica e cultural, para as populagées e 05 coletivos mais hu mildes e mais vulneraveis, em especial meninos e meninas, mulheres e pessoas com deficiéncia”, segundo calculos dos proprios evangélicos, das estimadas quatro milhées de pes soas que declararam ter votado, mais da metade preferiu © “nao”, por considerar que tal ajuste seria uma ameaga & “ideia tradicional de familia”, em um retrocesso inegavel, principalmente, se considerarmos que entre os mandamen tos cristdos, um deles sugere que deveriamos amar o proxi mo como a nés mesmos. Hernandes Irribarra, por e-mail, de So Paulo, SP. ALL Predominio da intolerancia = | versusresisténcia UER UMA | Interessante a matéria, C mas jé que ela diz que, gra- a ee No. . VESTIBULAR as.ao sistema de cotas, “vao ingressar nas universidades mais médicos”, no caso, negros, “que sabem menos Biologia, mais jornalistas”, também negros, “que sabem menos Portugués, € assim por diante”, queira levantar uma questo: 0 famoso Pro- grama Universidade Para Todos - 0 ProUni - também nao concede bolsas para alu- nos brancos ¢ incapacitados oriundos de escolas piblicas, que | recorrem a entidades particulares, muitas vezes desqualifica- | das, para obter o tio almejado e ilusério diploma do terceito | grau? O despreparo no é o mesmo, independente da cor da, pele? Partindo dai, o que concluo é 0 que racismo se mantém | extremamente ligado ao modus operand da sociedade, que | permite aos individuos brancos, normalmente mais abasta- dos, certas regalias ¢ quase nenhuma critica. Jorge Amaro Santos, por iPhone, de Cotia, So Paulo. (64 | LEITURAS DA HISTORIA | mais famosos crinios, um Estado policial? Diante da vigilancia constante imposta pelo macro e mi- cropoder, descritos to bem no século passado pelo francés Michel Foucault, nos resta apenas sorrir, porque estamos sen- do filmados e, em consequéncia, nos alienarmos por completo, como ja acontece com a maioria? Existe alguma outra op¢ao, em nome da seguranga e bem-estar que tanto buscamos? Acte- dito que no! Afinal, se o sistema ngo permite esse e nenhum outro tipo de operacao, é certo que ja nos transformamos em robés e, dificilmente, voltaremos a condigdo humana, se é que ela existiu de fato algum dia! Carla Siqueira, por e-mail, de Porto Alegre, RS. O enigma dos cranios de cristal Conforme foi publicado na revista cientifica Chemical & Engineering, nimero 91, de 2033, j@ € sabido que dois dos pertencente ao Museu Bi nico em Londres e 0 outro, a0 Instituto Smithsonian de Washington, so apenas falsificagées, de acordo com estudos realizados por uma equipe britanica liderada pela arquedloga Jane Wal- shar, Entre outros detalhes revelados, dois merece destaque. 0 primeiro se refere aos dentes retos e lineares das caveiras, que sio bem diferentes dos dentes esculpidos nas obras dos povos pré-colombianos. O segundo, que é bem mais revelador, aponta que microscépios eletrénicos de varreduras identificaram que os cranios tém marcas regulates em toda a superficie, o que indica que nao foram feitos com ferramentas mantais antigas, mas por modernas rodas girat6rias aliadas a abrasivos s6lidos. Portanto, 0 tinico enigma que resta, é saber quem realmente esculpiu as intrigantes pecas. Antonia Oliveira Munhoz, por e-mail, Alto Paraiso, GO. MSW a edhe ea) CORRUPCAO EM VERDE EAMARELO A origem do toma 14, da ca brasilet ro! Embora ja seja considerada cliché, a frase que diz que “a corrupgdo é uma ca racteristica do comportamento humano, mas que nado faz parte de nenhum cédigo ‘genético nacional”, tem a capacidade de revelar o grande problema que temos que enfrentar no dia a dia SE LUTERO NAO PROTESTASSE. As vésperas de completar cinco séculos, seu legado ainda & pouco conhecido dos brasileitos e vai mui- to além das questées religiosas. A bem da verdade, Lutero nunca quis separar a Igreja Cat6lica, suas criti- cas eram durissimas e inconciliéveis OBAMA (E 0 MUNDO) NAO MERECIA! Com Obama vai pela enxurrada a perspectiva de americanos ¢ de grande parte do mundo de viver sob um “Esta do do bem-estar social”, pois jamais um governo americano foi tio comprometido com os direitos individuais e sociais, e com as liberdades. com 0 pensamento do papado da época. Logo apés a publicagdo das 95 teses e sua consequente popula- rizagao por toda a Europa, tornou- se impossivel recuar diante de uma Igreja que nao queria dialogar sobre questdes teolégicas. HISTORIA LEITURAS OA HISTORIA ¢ une pticcio meno CBR ‘Ano VI Edic 80 98 Denise Glanagio CCOORDENADORA EDITORIAL Pusticioave. GRANDES E MEDIAS AGENCIAS PEQUENAS AGENCIAS € DIRETOS GERENCIA DE PRODUTO ‘ATACADO DE REVISTASE LIVROS REALIZAGAO Fioucncees prooucko oF fc roa Ket 51 Palo SP ltr Verde CEP 0256-000 S80 ‘anuneiar@escala.com.br SKOPAULO.(055)1 38577 SPrcaummusy 35) 9 9R2SES SP emnembo eros 55) 36671800 Ra ss\21z2040095 RS:(155)5132675358 PRe(ss)si 302017 BRASILIA: (055 62206228 $6: (655)47 20813323 Tee: mater blade escalacom sequira a edgbas anteriores de qulauer evista ‘Gu pblear da Escala (25) 19985008 ‘Sncsclacombr tee apoio eta Oe sea asx. as 9n seh. (35)1138554009 Far (5) 26579643. endinaceicaincom be Conra aclertas de roe revts-wwwescala.combr LEMTURAS DA HISTORIA | 65 Clerc | Retrato da alienacao ‘A imagem de Chris Marker, artista multimidia francés que morreu em 2012, foi captada em Paris, logo apés os pro: testos de maio de 1968. Emboraa senho: ra de preto que caminha pela Rue Gay Lussac, com expressao sisuda e indife- retorcidos e restos da barricada, tenha vivido um contexto préprio, a foto em si, além do belo flagrante das manifesta: g6es estudantis da época, também nos revela a alienagao a qual somos subme tidos diariamente, (6 | LEITURAS DA HISTOR Quando aceitamos essa condicao, perdemos o interesse em ouvir opi: nides alheias, apenas para se preocu par com 0 que nos interessa, devido a uma série de motivos sociais, que nos leva a se tornar insensiveis diante da comunidade do entorno, Portanto, além de deixarmos de agir e pensar por n6s mesmos, ainda perdemos a cons ciéncia do papel que desempenhamos nos processos sociais, principalmente, quando mantemos certos contetidos reprimidos na consciéncia. Dessa for ma, também entramos em um estado de despersonalizagao, no qual 0 sen- timento ea percep¢ao da realidade sio fortemente comprometidos por uma sociedade cruel que, além de oprimir 0s mais fracos, impée um padrao de conduta robotizado que, na maioria das vezes, parte dos poderosos que ne- cessitam da uma massa manipulavel para permanecer onde esto, com pri- vilégios de ditadores que, por sua vez, so incapazes de aceitar as peculiari- dades dos outros. = ey eee! (e) COLEGAO BIBLIA £0 CHURRASEO AS MELHORES DICAS E RECEITAS DELICIOSAS PARA UM BOM CHURRASCO! Se Mme Uae) ba EN a) —=— Contra todas as edicies e colecione! Acesse www.escala.com.br e aproveite! BINGE EF /editoraescalaoficial la NO DIRECTION HOME A VIDA E A MUSICA DE

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