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© que sabe quem erra? Maris Toren Esteban Editoragio e capa iin Kipp CIP-BRASIL., CATALOGACAO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL. DOS EDITORES DE LIVROS, Rd Exeban, Maria Teess © gue sabe quem eer Ry eDe Pees er Alii, 2013 200. ISBN 978-85. J Mart Teresa Eseobsn.~ [20d]. = Petrdpeli 613906 | Praesss escolar ~ Brasil, 2, Profesones « Form fo educacionat - Brasil. 1 Tinto. Bri, 3.Avaia- 26 cpp: 370.45 DU. 37.0153 17.40.42 23.10.12 139868 | Maria Teresa Esteban O que sabe quem erra? Reflexées sobre a avaliacao e fracasso escolar DP ue © De Petrus ot Alii Editora Ltda. Conselho editorial Alfiudlo Veigi-Neto (UFRGS); Betinis Raralho (UFRN); Elizabeth Macedo (UERJ); Elizeu Clementiio de Souza (UNEB); Juarce Davrell (UFMG) Silvio Gallo (UNICAMP): Timothy Ireland (UNESCO). Proibida a reprodusio, etal ou pater, por qualguer meio 001 co, grifico, mneroflmagem process, sya repro ete, Eats proibigBes apicam-setamibim is earacceristesgriticas eon editors. A siolagko dos direxos auroras & punivel como art, 184 © 65; Let 6.895/80), com busca, {510/98 ~ Let dos Direras 124 ¢ 126). crime (Cédigo Pens aprecnsio e mndenizagbes diversas (Le 12 Aicorais~ as, DP et Alii Bditora Ltda. Raa Henrique Raffard, 197A ~ Bingen ~ 25665-0602 PETROPOLIS - RJ ~ BR ~Tel./ Fas: (24) 2233.2101 cedizora@sdepetrus.com.br — Home page: wwwdeperras.com.br Impresso no Brasil 2013 Sumario Inteodugde Capitulo 1 Agio escolar e identidade social: conflitos e possi A escola: austnema sempre presente na lua por hege (Umma aprosimagio 4 realidade mvestigada Capitulo 2 A formagio docente: apagando fronteiras & redefinindo territorios A formagio dacente com pritiea socal A agio docente: ugar de confi entre teors ¢ pita Enssnande novee cenae em anngor ceninios A rote Incerpeetando 0 testo 10 come tude myportante para a eranaformagio A imadesuagio do texto 20 contesto Novos marcos redrico-pratices do provesso de ensino-aprendizager ‘A esol: engre a manatengio ¢ a tansformagio A priuea pedagogcz coma priv dislogiea Capitulo 3 ‘A ambiguidade do processo de avalia¢io escolar da aprendizagem A sealing dos ‘Avaliaglo escolar e construgo de ums displ social a teorts dt medio 4 nove sears Pritcisdisntae! 15 23 33 43 44 46 49 54 67 70 23 81 87 97 99 104 109 {A quantiicagio das qualidades:o pesiwsnio como paradignn de pesteas desumantzad A recupemgio da sipen ecolat ¢ 0 disancramento do sujet social Cosses,dilemas ¢ perspectnas pandigmites A ssalingio como price netusio: lua perspectn tebrico-pritica em conserugio Vistumbrando prineas com nova qualidade Ao dis professoss no proceso de redelingio reérics e econstrugio princa Aviliando 0: rewltados ¢ mvesigindo os processos Conclusto [owes carpio a serem percorrides Reteréncias 14 16 121 123, M41 148 156 167 187 Pettit Introdugao A acio escolar tem sido objeto de muitas pesquisas, traba~ Ihos, reflexdes, incervencdes, movimentos diversos mutas vezes ortentados pela intencio de contribuur com a consttucio de uma escola de melhor qualidade, Este livro € mais um trabalho que fala deste movimento, tomando como referéneia uma tese de doutorado! que se pretende um espago de reflexio coletiva sobre o fazer cotidiano da escola Pretendendo ser parte de um diflogo, o texto focaliza a pritica escolar atravessada pela vida, cuja dindmica praduz mar- as ¢ delineia percursos. Nossa escola, igje, esti imersa em um mundo caracterzado por profundas e velozes transformacBes, uum mundo que se apresenta através de flagmentos e muitas vezes no encontramos o fio que possa conectilos. Fragmentos que compartilham 0 mesmo cenario sem no entanto compartilharem © protagomsino, alguns sujertos e algumas agdes esto sempre 4 frente ¢ fortemente ihummados, enquanto outros sfio postos nas margens,suas vores quase nio sio ouvidas e pouca ow nenhuma uz os atinge. Esta dinitmea invade a escola, Neste momento, as atengdes se dirigem para um mundo as vias de nformacio através do espaco cibernetco (parece linguagem dos annigos filmes de fic¢io cien~ cifica, mas significa que o futuro ja chegou). Este movimento permute superar as frontesras e diminunr as distincias, mclusive entre os “paises desenvolvidos” e os “paises em desenvolvimen- fo, entre conhecimento e ignorineia.""Tedos” se sntegram nas grandes redes de comumeacio, pelo menos, esta é a promessa, que se move, ou snavega, “Tise de dourorado morula La reansnacii dl saber doce sre lato y la iia de enue, que apresenter na Universdice de Santiga de Cams portels,na Espana, © que sabe quem evrat Em poucos mmutos,sem dersar a comodictade do eseritéti0, ‘ou da sala de aula como afirmam alguns, & possivel mover-se pelas principas bibliotecas do mundo, fazer consuiltas, obter informacées, estabelecer contatos com as pessoas mars diver sas, colocar-se a par do que ocorre nos lugares mats variados ¢ ‘outras tantas corsas mais, apenas com o movimento dos dedos sobre um simples teclado, © maravilhoso desenvolvimento da tecnologia diminun as distancias,agiliza a producio e divulgacio, de conhecimentos, estrutura novas relacdes de tempo, ce espaco, de trabalho ¢ de lazer e, sem nenhuma diivida, forja novos pos de relagdes humanas. No entanto, tecnologie que une tambem pode servir para substituir a figura do ent, como parte de wm processo de criagio de uma realidade virtual que pode se tornar ‘mais “verdadeira” que a propria realidade, (O ser humano se distancia da existéncia humana dentro de tum contexto em que a presenca do oun ~ fabricado? ~ é vivida e sentida como real, Isolaco em seu confortivel espaco pessoal, distanciado de mustos dos fatos que efetwvamente ocorrem na realidade, torna-se cada dia mais ficil esquecer que a vida € muito mais dindmuca ¢ complexa do que a mfimdade de nformacdes, situacdes e possibilidades que, com imensa vartedade de recur sos e detalhes, surgem na tela. A vida e 0 conhecimento estio — virtnalmente? ~ 4 disposicio de todos. A tecnologia promete, @ algumas vezes permite, a democrattzi¢io do conhecimento, que associa & melhora nas condigdes de vida Enquanto 1ss0, € nem sempre no outro lado do mundo, mas do outro Indo da rua, pessoas sobrevivem em condicdes degradantes.A realidade mostra que a miséria e a riguieza, assim como 0 conhecimento e a ignorincia, nio se separam somente pelas fronteiras nacionais, pors estio mensamente separadas pelas condigdes sociais dentro de cada pais, Apesar das imagens que uniformizam, as contradicées permanecem. Porém, como as condigdes degradantes esto na zona de sombra no sio ca~ Introdugao pazes de embagar 0 brilho da cena principal. Mesmo estando za sombra, essa tensio se revela no cotidiano escolar ¢ marca a pritica pedagogea A tecnologia redefine as relagdes, eria novas demandas, para a educago anuncta a possibilidade de mcrementar 0 tio desgastado processo de ensino-aprendizagem realizado na escola. Ajmagem de um mundo alamente informado, informatzado. tecnologicamente desenvolvido, com altos niveis de conforto © bem-estar se apaga quando pensamos nos milhdes de pessoas analfibetas que compdem a populacio mundial, denunciando a grande quantidade de pessoas que estio 4 margem de uma vida de qualidade média. O alto indice de criancas que nio rm aceso escola di uma razoivel previsio de que o ficuro no anuncia uma melhora expressiva nesta situacio global.A grande carculacio da riqueza produzida ofsca o fito de que ela esti concentrada nas mios de uns poucos Uma nova cosmovisio se inaugura com o enorme de- senvolvimento das tecnologias de produgio, de comunicacio e€ transportes, tornando possivel uma reordenagio social que cr uma sociedade de estruturas e relagées novas, fandadas na informagio, tendo como traco mais marcante a subordinagio da vida 20 capital © conhecimento, como os demats bens, privanieado e posto a servico de uma pequena parcela da humanidade, é um dos fatores que contribuem para ampliar o abismo que separa as pessoas de acorco com o que possuem, parte constituinte de uma sociedade mundial, que sob o manto da democracia for~ mal, é desigual, musta ¢ exploradora, No entanto, se olhamos para as margens, para os excluidos, para as miniicias da vida cotidiana, dentro e fora da escola, também podemos encontrar lacos de solidanedade, marcas de colaboracio, pistas de pro- cessos em que a vida € compartilhada, O intenso processo de exclusio traz a urgéncia de se repensar toda a ordem social, os © que sabe quem evra? processos de produgio cientifica ¢ a escola como msuicutcio integrada ¢ integradora da realidade passada, atual e, a0 que tudo mdica, future Neste trabalho, buscamos sair da visio unidimensional que caracteriza o pensamento hegemémico e incorporat a pluralidade ‘como caracteristica central da dininmica da pritica pedagogies como parte das relages humanas. Centramos a aten¢io na reconstrugio do saber docente sobre a avaliagio, que do nosso ponto de vista € demandada por diversos fatores, entre 0s quais destacamos 0 fiacasso escolar: Com esta perspectiva, olhamos para a relagio teorta-pratica nas atuagdes escolares cotidianas.Tomando como ponto de parti das professoras sobre 10 processo de avaliacio dos seus alunos ¢ altinas, anvestigamos 0 processo de formagio docente em suia agio € no movimento de reflexio sobre sua propria auvidade profissional. dla para a reestruturag Valorizamos aqui tanto a teora quanto a pritica, A exis- téncia da teoria nio é sempre percebida pelos(as) proprios(as) professores(as), algumas vezes a teorm adquire uma presenica “silenciosa” que ocuilta seus fundamentos e se revela e se difunde através de auvidades entendidas como exclusivamente “priticas) Os fendmenos educativos, pela complexidade ¢ singulart= dade que caracterizam os fendmenos sociais, nfo podem ser pesquisados fora da interagio dialégica entre ceoria ¢ praica ‘A pesquisa educacionai tem como finalidade 0 aperfeico- amento da pritica, portanto, teoria e pritica se conectam com o objetivo de transformagio da realidade pesquisada Estes tracos peculiares demandam um desenho metodolégrco gue incorpore a dinimica do process educativo que, come construgio histérico-culcural, esta articulads 8 intenctonalidade humana, 2 sua potencial criatvidade, 4 polissemin,enfim,a uma compreensio da realidade soci como mstivel, mutante € em n 10. Esta opeio nos coloca permanente processo de reconstru 10 Introduce como parte do movimento de ruptera epistemolégica, em que sio questionadas as virias formas de produgio social, inclusive a sumbélica. Para muitos, este € um convite atraente, Apresenta belas pa lavras e concertos estimulantes: dialogia, mteracZo, mulplicidade, polissemia, singularidade, subjetividade, partlha, reconstrucio, ruptura de fionterras, vozes, cendrios, territérios, cartografias, mesticagem... Palavras que soam como novidade no ambito do discurso pedagdgico, que de alguma maneira jé se havia acostumade # monotonia do discurso univoco. Palavras que ptometem imprimir um novo ritmo a uma escola que parece do atrair ninguém. A mucanga certamente atrai. Porém, 118c0s a0s quais nao podemos eludir, Estas novas palavras estio repletas de signi ficados; signiticados que nos obrigam a reconsteuir nosso olhar para a realidade; reconstrucio que implica destruicio de formas consolidadas de interpretacio da realidade e de organizagio da vida, Nem sempre é ficil questionar e substituir nossas crencas, preconceitos, valores, conhecimentos e costumes. Falamos de um territério em construgio. Seus limites sio pouco nitidos, sio poucas as certezas e muitos os desafios, cendo como pano de fundo a imagem de um mundo cambiante, com= plexo, dindimico, mstavel, inacabadio. Hi um contorno eénue que delimita posicdes e perspectivas, pos 0 diflogo entre a teoria e a pritica, ou entre a pricica ¢ a teorma, vat defininde 0 movimento necessario/possivel de desenvolvimento da pesquisa, conectada transformadora A acio que desenvolvemos sublinha as idetas de didlogo ¢ polifonis, que implicam em interagio entre a multiplicidade de vozes existente, Consideramos o enfrentamento democritico da diversidade de vozes uma pratica indispensivel 20 desen- volwimento da perspectiva de mudanga conceitual em que nos sstuamos. A interacio dialégica exercita a capacidade de assumur n | Se SSeS EERE (© que sabe quem erra? perspectas diferentes e de incerprerar a perspectiva do outro. Gera um processo coletivo em que a sutyetidade,a consciéncia critica ¢a augonomia sio permanentemente fortalecichs Com esta pretensio de nio provocar rupturas entre teorta e pratica e de coloci-las'em dislogo, assumimos o desafio de construir um texto em que a realidade investigaca e os aportes, teoricos estejam sempre presentes. Aventuramo-nos a buscar enfagar o discurso da pratica e o discurso da teoria através de wm texto que expresse esta mnteragio dialética e dialégica. Tratamos de teorvzar constantemente 0 observado, em um movimento em {que teoria e pritica se incerrogam mutuamente e proporcionam chaves para a compreensio do contexto investigado, © eixo que conduz o discurso & 0 debate realizado sobre © processo de avaliacio dos(as) alunosias) que as professoras realizam em suas salas de aula. Escolhemos este fio condutor por sua capacidade de cone: social, pois, como pritica em que se “valora” os alunos e aluinas, € ssmultaneamente um importante veiculo dos valores sociats em diregio 4 escola ¢ de informacio do desempenho escolar, que atua como instrumento de controle social, Entendemos também que 0 processo de avaliagZo & um potente organizador do entre prittea escolar e pritica do discurso e da acio pedagogica Aavaliago & um processo signifi 18No para a reflexio sobre a pratica social,a pratica escolar e a interac 10 entre estes imbicos Sua eapacidade reconstrutiva do processo contribu coma refle- io sobre a acto pedagogica, possbilitando o desenvolvimento de ‘um processo de avaliaco da propria pritica docente.A avalia¢io, como ato de reconstrugio se constitu em processo formativo para as professoras, articulando dialeticamente reflexio e acio: teora e pritica; contexto escolar € contexto social; ensino € aprendizagem; processo e produto; smgularidade e multiplicidade; sabet € nao saber; dilemas e perspectivas, Introdugs0 A reconstrucio das priticas escolares, mais concretamente da pritica da avaliagio neste estudo, tem como cenirio 0 processo de ressignificacio da dinimca social, de modo que a sociedade da exclusio possa tornar-se uma sociedsde mais inclusiva © proceso de ressignificacio é parte de um movimento em que o paradigma dominante reduz sua capacidade explicativa € propositiva ¢ paralelamente emerge uma nova possibilidade de configuracio paradigmética, Esta transformacio demanda 4 escola a defim¢io de um processo de ensino-aprendizagem articulado pelo objetivo de construnr 0 sucesso escolar de todas as criangas, ressaleando as «las classes populares, as mats atingidas pelo fracasso escolar como parte de uma dindmica de exclusio social. Aleangat este propésito nao & rarefi facil, O erajeto é longo, sintioso e muitas vezes obscuro. A complexidade do objeto de estudo exige 0 manejo de muitos fios e tem sido bastante dificil, para ns, fazé-lo com clareza e coeréncia,afrontando a dinimica particular da pritica € a flesibilidade dos dados recolhidos. Este trabalho é uma tentativa a mais de percorrer um novo caminho, © que imprime uma dinimiea em gue o erro é mnevitivel. Estes sio os fios que vamos manejando para tecer a anilise sobre 0 processo de construcio de conhecimentos pelas pro- fessoras, demarcado por um processo mais amplo de comada de conscigncia da insuficiéncia do paradigma hegeménico para articular © dar respostas a diversidade de demandas, possibili- dades, saberes € fazeres presentes no movimento condiano de construgio da vida Escutando atentamente os discursos instituidos, procuramos encontrar o insnruinte, 0 que apenas se antineia, 0 que se de- senha através de contornos quase impercepriveis. Valorizamos estes aspectos por entendermos que trazem chaves para ve ‘compreender ¢ participar do movimento de transformagio social (€ logicamente escolat) que esta sendo demandado e eriado nos 2 fo espacos didntos silenciados e postos na sombra; ceniirios que re- velam 2 msuficiéneia do p: a potencialidade da formulacio de novos paradigmas que tomem a diferenga nio como a excecio, mas como a regea ridigma dommnante e a possibilidade e © protagonismo dado as vozes encontradas no interior da escola se vincula 4 perceprio de que a invisibilidade da teorna mersa nos fazeres cotidianos contribu para que os professores € professors no reconhegam valor em suas ativicades, que percebem como uma pritica sem consisténcia devido & caréneia de teoria. Este processo fiz com que os professores e professoras, saber que come tantos outros sujeitos socias, aprendam a sabem" (RIBEIRO, 1996) Como todo ato pecagogico & um ato politico (FREIRE), parece-nos fandamental para a construcio de relacdes humanas, mais justas ¢ solidatias desenhar uma pritica pedagogica capaz de contriburr para que as pessoas cheguem a “saber que saber”, com sua razio, sentumentos e afetos. 4 Db ert Capitulo 1 Aco escolar e identidade social: conflitos e possibilidades Pensar e fizer uma escola piiblica de qualidade para as classes populares tem sido um grande desafio para os educadores comprometidos com a construgio de uma sociedade verda~ deiramente democritica. Em periodos de transformac6es tio profimndas como © que estamos vivendo, este desafio parece tomat-se ainda mais complex, pois a incerteza acompanha cada passo. © confronto entre o mundo real e o virtual, entre a pro- ducio de riquezas e sua distribuicio, entre a qualidade de vida possivel e os estreitos limites da sobrevivéncia torna pertinente © questionamento da propria ideia de progresso que naturaliza a relacio entte progresso tecnolégico e progresso social, Boaven- tura de Sousa Santos (1995) nfo s6 interroga este conceito, que interpreta como e1Xo da construcio da derrota dos excluicos, mas também afirma seu abandono como condicio para a construgio de um pensamento alternativo e emancipador A promessa de progresso como ponto de partida para © bem-estar nj 0 se tornou realidace, © que fez for forjar um lunico cammnho que nos leva a todos a um futuro de exclusto Boavenmra coinerie com Benjamin (1990) na ideia de que no passado esquecido estio saberes e formas de vida que devem ser recuperados.Também compartilham a anilise de que concepeio hegeméntca de progresso, que articula © passado, © presente e 6 futuro, reduz a foren do passado e nos indica um fturo que 15 (© que sabe quem erra? se apresenta cada vez mais como um resultado “natural” ¢ a- -hustérico, desconsiderando sua esséncia social Segundo estes aucores, no pasado esto latentes camininos ro tracados que podem indicar outras dimensdes da € novas configuracdes da realidade, recuperando a abertura de horvzontes e a cratwidade na acio, Obviamente € possivel frzer novas escolhas ¢ definir outras formas de vida que considetem ‘que grande parte das opcdes fertas até agora esti na base do so frimento humano, do epistemicidio (SANTOS, 1995), do apartheid global e da destru a vida humana, jo acual jo do bem comum que também caracterizam A claboragio de propostas de novos caminhos deve ter claro que nas agdes e oprdes atuais esto sendo condicionaces formas de vida para as proximas geragdes, formas que trazem em si mesmas erros e acertos do passado e que o presente no pode antever com precisio seus resultados faturos. Este entramado de presente, passado ¢ futuro é furndameental para que se possa pensar 0 processos educativos. Em um mundo cada dia mais comperitivo e excludente pode ser novo € transformador (re)visitar as antigas priticas de solidartedade e cooperacio. O pensamento diverge e polifémco aporta as matores contribuncées & formulacio de alkernacivas € 2 resalucio dos problemas cotidianos. E preciso _dissonante reforcar que a escolha s6 & real dentro de um processo no qual 1a diversidade se faz efetwvamente presente, a opcio mio pode limitar-se a ser uma possibilidade, ela tem que concretizar-se nas priticas cotidianas. ‘Omodo dominante de asseyurar maternal e msoeucion ‘9 aumento das escolhas fz com que, paraiclamente 30 ati~ menco das escolhas, se asasta a dimimungio da capacidade de eicolher. A crs de escolher nfo a ter no momento seguinte, Por outro lado, 20 fim cos monopélios de anteepretagio (da fami, da Kgrey io de urna dacs escolha cna a mpossibilidade Ago escolar ¢ identidade social 01 do Esto), leva & cabo com exo pelo paradigm da mo~ demidade,nio parece seguut-se a auconomia de mempreagio, mas antes renuneia a miempretcio, (SANTOS, 1998, p.81). A imposiedo de uma logica iamca, de um s6 saber, 0 reco- nhecimento de um conyjunto de conhecimentos como anico ¢ legitimo tem o sentido de eliminar todas as outras possibilidades, fazendo da ignonincia a nica alternativa para quem nio domsna © conhecmento valorizado.A aceit da auséncia de determi= nados conhecimentos como ignorincia transforma o potencial crrativo dos miilupios saberes em impossibilidade. Na escola, na sala de aula, como nos demiis contextos sociats no hi espaco para o divergente, para a solidariedade, para a cooperacio, para © retrocesso. © monopélio do saber eseolistico, exercendo-se como uma massa opressiva, mancémn © povo no s6 wnorante mas confor= mado com sua ignorinen. Eles sabem que nio sabem, asim ‘como sabem que sio pobres ¢ nada pocem fazer. (LIBEIRO, 1996, p18) © saber que nao sobem & uma dura aprendizagem de uma falsa verdade, que serve para ocultar que 0 conjunto teérico-pratico denominado iguonincia muntas vezes nio € outra coisa além de conhecimentos construidos a partir de experiéncias, realidades, cosmovisdes, objetivos de vida, relagde poder, eradicdes histéricas ¢ vi sooiais, estruturas de neias culturais diferentes dos conhecimentos valorizados pelo pensamento hegeméntco. Criar alternatvas para o desenvolvimento da sociedade € urgente. Escutar as culturas silenciadas em nossa historia é indispensivel, Encontrar as crithas apagadas pela imposicio de hima lagies fines é findamental Fazer emengir a8 perspectivas abandonadlas € essencial para refazer a vida... presente tem as marcas do passado que, mesmo senclo imperceptivess, precisam set (re)interpretadas como sinais de possbilidade de luta e de transformagio. & preciso, como nos recorda Apple (1996b), "7 (© que sabe quem erraé recuperar constantemente 2 memiéria coletiva para identificar as conquistas e explorar a contradigo para recuperar, reforcar e criat lutas contra-hegemonicas. Para construit o futuro, ha que se ter também 0 olhar posto no passado, Este movimento se faz necessitio sobretudo quando o e¢ nirio montado & um ceninio de exclusio. Cenario que mpede que as diversas vozes se expressem € que muitos reconhegam legittmmdade em sua propria voz. Reconhecer-se como igno- rante, no sentido de auséncia de conhecimentos relevantes, & assumir uma identidade gue se fandamenta na desvalorizacio de s1 como individuo € como sujeito social. Tem um sentido posto 4 percepcio de que todo o conhecimento é provisério & parcial, © que fiz com que o desconhectmento, ou a ignorincia, atue no sentido de ampliar 0 saber individual e/ou coletivo. A diivida revela a necessidade do questionamento dos limites entre conhecimento € desconhecimento, entre saber ¢ agnorancia A ignorincia nfo @ uma reslidacle individual. No sentido a que nos referimos é a defimicio da cultura de todo um grupo: social como carente de sabetes e de valores. A identidade se conshitui na tensio entre subjetividade individual € subjet dade coletiva, revelando o movimento dialégico de construgio do individuo e da sociedade. As subjetivadades que monizam com as subjentvidades hegeménteas, tomadas como universiis,sio descontextualizadas e negidas. E estabelecida uma incomunicabilidade entre as diversas rdentidades, dificultando 0 desenho de alternativas que concentrem as resisténcias de carter emaneipatorio e partam de projetos coerentes que se diferenciem do proyeto hegeménico. se har- Quem define as fronteiras? Como sio construidss? Quais sio os ecutérios para determani-las? E possivel estabelecer um dilogo tespeitoso e produtivo entre os diferentes saberes existen~ tes na soctedade? Mais saber gera mais democracia? Que novas cartografias estio sendo desenhadas na vida cotidiana? 16 Agio escolar e identidade social Questdes relevantes para pensara realidade brasileira, const~ tuida pela diferenca e pels mestigagem, fortemente mareada pela dindmica mnclusio/exclusio soctal e pela nterdigio de culturas ¢ subjenividades, caracteristicas que aprofiandam o fosso entre saber € ignorincia. Mesmo um olhar superficial pode pressentir a exis- téncia de dors “Brasis”:um nico, legitimado, proprietirio dos bens materiais © do conhecimento, consumidor; e outro miserivel, exciuido, ggnorante,silenciado, que nos revela o lado feio do que denominamos realidade mundial globalizada.A esasténcia destes mundos, que aparentemente no se comunicam, parece importar cada vez menos € vai ctiando uma ignordncia da humanidade do ure, SS0 segmentos da realidade que seguem divorciados, com pontos de contato pouco, ou quase nada, visivers. Partilhando © mesmo espago e tempo os diversos grupos soctats parecem ndo compartilhar © mesmo mundo, embora cada tum de seus mundos se configure na mteracio com os demas. Um olhar mais minucioso pode substituir a dupla imagem, que implica ruptura ¢ isolamento, pelo cenario multiforme apresen= tado pelo concerto de eulturas fibridas, formulado por Canclini (1989).A proposca das cultura hibvidas se guia pela finalidade de construir formas mais democriticas de vida social. Uma polities democranzadors & os bens * cetendh 10 apenas 2 que socraliaa legiumos” mas a que problemanza 0 que deve « por cultura e quais io 0s dinertos do heterogéneo, Por sso, primeira cons que deve ser questionada & 0 valor daquilo que a cultura hegeménica excluiw ou subesnmott para constifunr-s.|..] Deve problematizar os principios que rgamizann esst hegemonsa, que consagram a legutmidade de tum upo de bem simbélico ¢ de um modo de se aproprar dete. Uma politica & democritica tanto por construit espagos para o reconhecimento ¢ 9 desenvolvimento coletvos quanto Por suscitar as condigGes reflexwas, critica, sensiveis para que Soja pensado © que pBe obsticulos a esse reconhvermento. (CANCLINI, 1998, p, 156-1 (© que sabe quem evra Em lugar das culeuras tradicionats organtzacas, classificadas, fierarquizadas e soladas segundo padres rigidamente cefinidos, a hibridicio mescla os prineipios orgamzadotes dos sistemas culturass, desterntorializando e reterntortalizando os processos simbélicos, os conflitos e as identidades. Proporciona condicdes para a expansio de novos modelos 4 margem dos contextos tradicionais, getando algumas propostas em que se vishumbram canunhos para o estabelecimento de relagdes de poder em que a autoridade seja democraticamente compartilhada, ‘Ainda que busque transbordar as margens,o movimento de hibridacio nio se desconecta das priticas sociais e econémicas, ros contextos nacional ¢ internacional, portanto, hi que cudar dias andlises para que a dialética territortalizagio/reternntorializa~ io nfo sirva para tornar opacas as antigas opressSes (de origem sexual, racial ov &tnica) ainda nio solucionadas nos émbitos em que se desenvolvem. © esquecimento destas relagdes poe em sco a possibilidade de construcio efetva da democracia.. ‘A multidimensionalidade pressuposta na ideia de auturas Infbridas no apaga os conffios, aporta aspectos que coneribuem para a relanvizagio e para 0 questionamento do paradigma domunante. Permite a incorporagio ce miiltplas perspectivas que tanto podem gerar uma atitude mais tolerance em relacio i diferenga cultural e as diversas alternativas discursvas ~ 0 que pode interferir positivamente para relagdes mats horizontais entre alternativas epistemol6gicas, culturais e sociais existentes—, quanto podem ser fonte de novos preconceitos, teafirmando 0 separatismo e a falta de comumicacio ~ 0 que amplia as distincias causa inseguranca, pois a instabilidade das tradiges marca a possibilidade de descontestualizacio da identidade e de mudangas em sua constitui¢io ~ ampliando a ntolerancia, A cultura como uma construgio fronteirics petmute mil tuplas combinacdes artaculando distintos movimentos e codigos eutturais nos entrecruzamentos dos territérios, que adquirem © 2 Aco escolar e identidade social sentido de cenario, ji que sio os lugares que permitem que os relatos sejam expostos, Por sua grande disponibilidade, as posst- bilidades de sdentificacio e de ersacio cultural sio muntas, mas no permanentes, tampouco estivers. © movimento amplifica o debate sobre temas como a veracidade, 2 cientificidade, a liberdade, a individwalidade © 2 coletividade. Nao obstante, estas lentes cheias de ambiguidade sio fundamentais para um olhar que possa aproximar-se mais da realidade, sobretudo a brisileira. E 0 ca0s, nfo a ordem, que se instala como ponto definidor desta realidade. Um caos que, Jonge de significar a auséncia de estrucura, contribun para que se faca visivel a muluplicidade de estruturas possivess, Tas combinagdes ¢ relatos nio est Amargem da estrutura € da acio dos ambitos de poder. Tampouco o poder é concebs- do desde uma perspectiva meramente verticalizada, também se aricula pelas formas obliquas que se anstalam no tecido social: 08 atos de comunicagio, de unio ¢ de oposicio também sio construidos nas pequenas interagdes que ocorrem na vida cot diana; eambém fazem parte da configuragio do poder os modos como as pessoas se subbmerem a ele ou as astitcias de que se valem para dele escapar. © fiaro de as culeuras nio se construire de modo 1solado significa uma horizontalidade nas relagdes pessoas, econd- micas ¢ politieas;as inerarquias se mantém,embora muitas vezes adquiram novas configuracdes que ocultam a verticalidade que sustenta as relacBes. Concordamos com a afirmacio de Can- clim (1998) de que “todas as culturas sio de frontetra”, o que nos desafia @ imprimir novas earacteristicas 20 contesto escolar 20 revelar um processo que nos leva inevitavelmente a0 ques- tionamento da oposisio entre conhecimento e ignorincia que constitut a base para o distanciamento entre saber e nio saber nos procedimentos escolares. n ‘© que sabe quem errat © conceito de eniinras hfbridas tem grande poténcia expli- cativa por nio cristalizar as margens, nio fortificar as frontetras, tampouco limitar 0 trdnsito 0 espaco commnicatwvo no qual as culturas se recriam a partir da negocracio dos significados. Por ineluit © movimento, amprime maior dinémmca 4 anilise, permi- tindo uma imagem mats nitida deste processo de constituicio de miluplas culturas, com diversos pontos dle contato e de conffito, As diversas formas de vida condiana nfo se constroem i margem de todas as outras. Mesmo fisica ou culturalmente distanciados, 05 modelos se interpenetram € em seus contornos esti presente a figura do oun. Obviamente, a soctedade brasileira ainda no consegumn ga- rantir os direitos fundamentais a seus cidadios, 0 que amplifica as possibilidades de relagdes confiituosas. A auséncia de condigées mateniais necessitras para uma vida digna for um aspecto aborda- do em diversos momentos das entrevistas realizadas a0 longo da pesquisa que onginou este livro. As professoras trouxeram por exemplo trabalhos onde crangas revelam identificar a profunda desigualdade social, e mostram perceber que estas caréncias nio caracterizam toda a sociedade, mas se localizam em determinados segmentos sociais~ os pobires. Em seus trabalhos traduzem os nit meros apresentados pelos mdicadores socioecondmicos, Neste contexto, aumentam as preocupagdes fiente & cons- trugio de uma politica de rediugio do papel do Estado, pondo no mercado © papel de agente organizador e dinamrzador da so- ciedade.Aunda que a realidade brasileira seja bastante singular, ela nio é isolada. Sew desenvolvimento esti fortemente vinculado a0 proyeto neoliberal que amplia as fraturas fazendo crescer 0s seto- tes marginalizados e reduzindo as esferas de particrpacio social. © presente exige a recuperacio do movimento, sempre permeado por rensdes e lutas de carater popular. Numa realidade consttuida pela diferenca cultural, complexa e multifacética que, como um calerdoscpro, tem suas formas refeitas depencendo do 2 Agio escolar ¢ identidade social olhar e dos movimentos, a vida cotidiana se revela local prwvilegia~ do de contradicdes em que emergem tragos contra-hegeménicos que também constituem e (re)definema realidade, as possibilidades de sua mterpretacio e as altemnativas para uma intervengio, A vida se move com certezas € incertezas, que estio em permanente diflogo e alimentam 0 debate a respeito do contexto escolar como parte desta realidade social. Tal ealidade representa um enorme desafio para a educacio, demandando um olhar munucioso para o contexto, revelador de necessidades e de possi~ bilidades peculiares.Trazer a vida escolar para 0 cenario significa colocar os focas sobre os professores, professors, alunos e alas, que dio vida e visibilidade 8 sala de aula A escola: auséncia sempre presente na juta por hegemonia Neste quadto de transformagio ¢ tensio social, a escola se mantém como uma instituigio socialmente relevante. Sendo um espago plural, que interage com 0 movimento de conformacio das culturas hibridas, é umportante na {uta pela constituicio dos significados e pritieas sociais A medida que o acesso ao sistema escolar se “democrati- za", permitindo que eriangas ornindas dos segmentos menos favorecidos da sociedade frequentem a escola, cresce o muimero daqueles que nio conseguem responder adequadamente is exigéncias escolares, constitunndo um problema em seu proprio interior. Como a construgio de uma sociedade baseada em relagdes simétricas nio € possivel, ji que a atual estrutura social depende das diversas hierarquias nas quats se organiza, torna~ sc indispensivel @ producio de metamsiius de wceiwede Uo binémo inclusio/exclusio sobre © qual se assenta a dinimica teal da sociedade. A dinnnca inclusio/exciu 1 faz com que processo social de universaliza¢io da escolarizacio seja acompanhado pelo fracasso escolar soc © que sabe quem errat Elabora-se um discurso ambiguo sobre a escola a partir do apelo i igualdade e do elogio a diferenca.A ampliacio de vagas no sistema eduicacional se apresenta como uma prova de que a sociedade se esforga no sentido de dar oportunidades aguais para todos.A diferenga de resultados se entende como a confirmacio de que pessoas diferentes devem ocupar lugares diferentes, 0 que em nossa sociedade significa possuir direitos e qualidades de vida diferentes. E importante recordar que a ampliagio das vagas escolares sempre for uma resposta As lutas das classes trabalhadoras. Entretanto, ha uma verdiadetta negacio do ditesto fundamental de que os indi- \iduios sejam reconhecidos como aidadlios. O fiacasso escolar ocorre num quadro de privacdes miiluplas, que configura um processa dle exclusio das clases populares do direto a vida Se a ampliacio de vagas nio significa uma efetiva de- mocratizagio do ensino, jé que abre a possibilidade de acesso a escola, mas nega as criancas 0 conhecimento que a escola promete socializar, obviamente configura um importante passo nesta direcio. Este aumento quantitanve @ uma conquista, pois se ainda nfo significa a real escolarzagio, no minimo a apresenta como uma possibilidade. Outro aspecto fundamental do processo & que 20 abnir a escola para as criangas de classes populares, e consequentemente a suas familias, produziu-se um novo modelo de escola, formulando novos problemas, novas possibilidades, exigindo novas elaboragies te6ricas e praticas, gerando um amplo processo de indagacio e redefimeio do papel da escola na soctedade ¢, stmuultaneamente, das proprias priticas pedagogicas. Em diversos locais, muitas pessoas tra~ balham seriamente com o objetivo de construir uma escola efotvamente entrelacada is d mandas ¢ possibilidades das clas- ses populares. A realidade escolar reflete, maném e em certa medida reproduz em seu cotidiano as profundas desigualdades, tensdes ¢ possibilidades sociais Pn Agho escolar e identidade social A preocupacio com 0 fracasso escolar € constante entre muitos pesquisadores e educadores. © foco é posto na individu- lidade, que ilumina os argumentos dominantes no debate sobre 0 fracasso escolar-Vrias sio as yustificativas usadas, recolhidas de aportes tedricos diversos © algumas vezes divergentes, embora tratem, quase exclusteamente, das criangas das classes populares, © jogo desses elementos propicia uma diversidade de ex; plicagBes possivers para 0 fracasso dos altinos ¢ alunas. Como consequéncia da amplitude tedrics e da fragmentacdo da andlise, € comum que os professores ¢ professoras encontrem justificativas diferentes que se encais’m em cada um dos casos de fincasso de sua curma, sem observar que muttas vezes as explicagdes sio excludentes entre st e que recolhem fragmentos da questio, m- pedindo, on ao menos dificultando, a percepgio da complestdade de todo processo. Esa centralidade no mdividuo também é 0 fio condutor da constittgio teética e ptitica do processo escolar de avaliacio da aprendizagem, O(a) professorta) avalia ¢ classifica cada aluno(a) sem considerar 0 processo global do individuo e da sua turma, tendo como base modelos de aprendizagem e desenvolvimento xdealizados que nfo aportam fandamentos tedricos que permt- tam uma reflexio profinda sobre os fatos observados. Como consequéncia desta fragmentacio, no encontra meios para estabelecer as conexdes necessirias e perceber que sio poucas as criangas que conseguem responder 3s exigéncias do modelo utilizado como referénens, As explicacdes elaboradas desde uma perspectiva indivi- dualizadora esto chetas de estereétipos que se confirmam nas ‘manifestacdes cotdianas aparentes, 1mpedindo, ou dificultando, 6 aprofimdamento necessario da questio para que se alcance os aspectos fandamentals que atuam na construcZo do resultado es- colar. A exclusio social consticui um dosaspectos centrais de nosso cempo, devendo consticunr um objeto de reflexto privilegiado no 25 © que sabe quem errat contexto escolar para que seja possivel avancar no processo de dar voz as classes populares, historicamente exeluidas e fortemente silenctadas, reconstrumdo as relagdes sociais € redefinindo a vide humana (GARCIA;VALLA, 1996), Portanto, os(as) professores(as) se encontra atividades cottdianas com a necessidade de instrumentos p: em stias responder 20 fiacasso escolar. Ao fiacasso escolar associamos a avaliagio, processo realizado pelos docentes cuyo resultado define 19 sucesso ou 0 fiacasso dos alunos(as) na vida escolat. E preciso, portanto, indagar também a formacio docente que deve atender as demandas proprias da realidade na qual esta imersa. Certezas ¢ incertezas emolduram a acio ¢ a formacio dos(as) professores(as), que t2m qu profisstonais e como cidadios. Formar professores e professoras nfo é uma tarefi exclusivamente téemca, ¢ sobretudo uma acio enfrentar os desafios como ética. Temos que pensar num profissional capaz de enfrentar as demandas provenientes de toda uma nova realidade que se cons- t6i no cotidiano, considerando as novas tecnologias inclusive, ‘mas devemos dar especial atencio ao fato de que este profissional tem que enfientar desafios nuiltiplos que sio, sobretudo, dilemas humanos. ‘Uma vez mais as perguntas emergem: A que estamos chamando educacio? De quem falamos quando dizemos educando? A quem se dinge a educagio escolar? Que objetivos temos a0 entender que & necessina a universalizacio da escolandace? Estes questionamentos estio em grande medida vincuilados definicdo do papel do Estado € da sociedade civil nos projetos educacionais formais, como & a escola, Atribuir ao Estado um pape! exclusivamente subsidiéio no que se refere i educagdo € especialmente importante para a discussio sobre a umversalizacio do suber e democratizagio da educacio. O novo discurso sobre a qualidade da edu caractenza pelo reforco de uma escola seletrva em detnmento de uma escola ign cima, 6 Agio escolar e identidade social A formula, quase magica, que propde mars educagio, mats qualificacio, mais ¢ melhor trabalho ¢ melhores condigdes de vida, encontra-se acompanhada do deslocamento dos trabalhos rio qualificados para o terceiro mundo e da extingio de postos de trabalho. Nio sio os nivers educativos que impulsionam os individuos para melhores posiedes Inborais, fortalecendo as estruttiras de produgio e melhorando a distribuigfo de renda; sio as escruturas mundiais de produgio que condicionam a dindmica ocupacional mundial, definindo as relagdes de tra~ balho e direcionando o sistema educativo mundial ¢ nacional podemos esquecer, entretanto, que as priticas escola res contribuem para a socializacio dos conhecimentos e valores, sendo um importante mstrumento no processo de eriagio de consenso em tomo das concepcées de mundo de um grupo social determinado, é, portanto, tm importante espaco de luta pela hegemomia. A acio escolar contriban com a dindmica de produgio da dicotomia saber/ignorineta a que nos referiamos anteriormente, Ainda assim, o interesse pela escolartzacio pode ter significados distintos segundo © sujeito que olhamos: as classes populares buscam a escola com a perspectiva da qualifi- cacdo € os grupos hegemdnicos vem a permanéncia na escola desde a perspectiva da socializacio. E importante ressaltar que osaltos indices de fiacasso escolar evidenciam a mcapacitiade da escola aleancar coletivamente resultados sacsfat6rios, porém a repeténcia pode estar revelando que escola é desejada petos(as) alumos(as) © suas fi as cniancas continuam tentando aprender ¢ enquanto podem voltam Js aulas, mesmo permanecendo muitos anos na mesma séne, Da mesma forma, nilias, pons, apesar de todas as dificuldades s fimilias continuam acreditando na postividade da escola, poss fizem muito esforgo para manter seus filhos ¢ fillas estudando. Hi uma tensio permanente, matcada por mteresses diver- 508, de modo que 0 discurso da husca de qualidade pode estar y (© que sabe quem errat ocultando uma pritica exjo objetivo & aprofumdar as distincias socinis, econémicas ¢ culturais entre os individuos, de: definitivamente relegado 0 colenvo e assumindo claramente a 6tica do mdividualismo. Apesar desta anilise, nio discordamos dda necessidade de uma crescente ¢ permanente melhoria da qualidade da escola piblica; precisamos deixar claro que quali dade estamos buscando para que seja possivel a construcio de uma escola verdadeiramente conectada as necessidades, desejos © possibilidades das classes populares. ando A qualificacio tem que se relacionar com os processos de emancipacio humana, que supdem novos conteiidos € novas pritieas sociais. A mucanca depende da possibilidade de organ zacio e de construcio de um proyeto de sociedade que substicua 1 énfase no mercado pela énfase no humano, tendo como questio fancamenral a solidariedade. Portanto,o sucesso escolar, do nosso. ponto de vista, esta entrelacado 4 construcio de formas mais demoeriticas de vida soctal Na perspectiva de reconstrugio das priticas e resultados, escolares como parte de um processo mais amplo de recria~ Gio social, adquire destaque ofa) professor(a) como sujeito que avalia na sala de aula ¢ suas possibilidades coneretas de elaboracio de priticas cotidianas capazes de contribuir com a construgio do sucesso escolar de todas as criangas que chegam A escola, Neste sentido, @ relevante incluir a discussio sobre © processo de formagio docente, enfatizando sua vertente de formagio continuada, © modo como os professores e professoras percebem stia pritica € umportante na medica em que os(as) entendemos como sujeitos que constroem conhecimentos sobre sua pritica profis- sional, que estio mediados por seus miluplos conlecimentos, sensimentos, valores, crencas finalidades ¢ percepedes. Para no cair no neoteenicismo (tio 20 gosto da ideologia neoliberal), a formacio docente tem que por énfase na dimensio humana do AgBo escolar ¢ identidade social rocesso de ensmo-aprendizagem, fundamento de todo trabalho m pr g ceducativo, Humantzar o discurso e as priticas implica um debate sobre as relacdes de poder que guiam a dinimica melusio/exclusi dos diversos conhecimentos e discursos socialmente conseeuidos nas priticas escolares. Estas relagdes so importantes porque Jegitimam determinados discursos em detrimento de outros, Os discursos que circulam na escola sio significativos na cons~ tirmgio da subjetividade € na elaboracio das acdes docentes, E preciso indagar as vozes silencradas e as vozes amplificadas nos discursos da escola e sobre a escola; interrogar os discursos Jeginmados sobre a infincia,sobre a aprendizagem, sobre 0 ensino, sobre os usos escolares da linguagem escrita, sabre os parimettos de sucesso ou fracasso escolar. Tomar estes temas, entre tantos outros possivess, para verificar de que modo a retbrica favorsvel ds criancas com frequéncia oculea pensamentos ¢ priticas que cexclutem a muitas delas. E necessino tomar isives os discursos his téricos subjacentes 3 pritica pedagogica (POPKEWITZ, 1994) Recuperar 2 voz, estando atentos aos diversos didlogos ‘entrelagados a realidade escolar, faz-nos destacar a dinimica de construcio dos resultados escolares alcancados pelas criang: Entre tantas questées presentes ste movimento ressaltamos 0 pedlagogico, em suas dimensdes te6rica e pritica, como possivel elemento articuladar do sucesso escofat. Uma dimensio impor- tante deste sucesso & que as criancas adquiram a linguagem escrita como um instrumento de compreensio ¢ intervengio ma sua realidade,o que significa, no processo de alfabetizacio, abandonar as praticas que calam assumir priticas que ayudam a “falar” Nio queremos com esta afirmacio sobrepor a atiwidade escolar a complesa rede de interagdes socims na qual se tece © resultado escolar. Sem desconhecer a multiplicidade de aspectos presentes na configuragio da realidade escolar coudiana, en- tendemos ser relevante 0 reconhecimento da existéneia de um 2» (© que sabe quem errat espaco de relativa autonomua na escola, Este deve ser explorado. no sentido de utilizar todo seu potencial para permutir 0 desen~ volvimento de tima pritica pedagégica definida no dilogo com as condigdes externas, mas no aprisionada por elas. fracasso escolar & apenas uma das faces da desigualdade social, Desigualdade que penetra no cotidiano escolar, onde se revela ¢ se desenvolve com caracteristicas peculiares. A escola nio é simplesmente um espago de reproducio do contexto social, uma vez que nela sio geradas priticas especificas através das quais a desigualdade se constréi e, em alguns momentos, permite a construcio de prittcas alternativas que superam, ou tentam superar, as desiguialdades mciats © modo como a escola, ofa) professor(a) e ofa) alunota), suyertos do processo de ensmo-aprendizagem, assumem 0 dilogo entre © saber e © ndo saber dentro do movimento de constr de conhecimentos organzado pela escola é um importante articulador do movimento de manutencio/transformacio das priticas pedagdgicas ¢, em consequéncia, da producio dos re- sultados escolares, Jo Em funcio da relacio estabelectda, nem sempre se concre- tizam momentos potenciais de sucesso escolar, demonstrando que o fiacasso murtas vezes (talver seya mais correto dizer fre- quentemente) & consequéncia de uma possibilidade de sucesso nfo percebida como tal.Assim, a avaliagao do resultado, 0 modo como os enunciados sio anterpretados, mais que o proprio conhecimento, é que define, ou condiciona, a continuidade do processo de ensmo-aprendizagem.A avaliacio demarca a distancia entre a “ignorincia ¢ © conhecimento. Na busca de caminhos que nos conduzam ao sucesso esco- lar nfo podemos limttar-nos a denunciar as causas do fracasso, devemos anunciar, ou explicitar, os aspectos potencralmente construtores do resultado deseyado. A compreensio da vida es- colar como parte da realidade social é um e1xo importante p; 30 Ago escolar ¢ identidade social as articulagdes que se fazem necessinias. Conferir a0 proceso de ensino-aprendizagem uma nova qualidade contribu: para que seam geradas condicdes significativas para uma releitura do proceso vivido pel demais parneipances da auvicade pedagégica nas esferas intra € extrnescolar, além de redefinir a perspectva de anilise da relacio entre 0 que € intemo ou externo 4 escola. Neste mo- ‘vimento, 0 processo de ensino-aprendizagem se anuncia como tum processo interatvo e dialégico, Como assinala Freire (1993), nfo ha ensmar sem aprender porque o processo de ensino- ~aprendizagem traz implicito 0s dois atos em cada um deles. criancas, professores, professoras e Estas propostas nos colocam frente 4 oportunidade e & necessidade de realizar nosso trabalho desde um novo ponto de vista Em vee dlsinen exitiea, a prosimidade ettica, Em ver de compromuso orginico, 0 a capacidade de espanto e de revo, volvimento live. Em vee de sere- ‘nxdade aurocomplacente, (SANTOS, 1995, p.21) A escola como lugar de interagzo humana tem as marcas da posttvidade e da miséria social, © processo de ensino-aprendi~ zagem esti impregnado desta realidade, o que nfo permite dela distanciar-se.Tampouco podemos perm que esta prosimidade seja impedimento para que possamos ver 0 contesto no qual nos movemos e nosso vinculo com ele Imersos no problema a que nos comprometemos em re- solver nio podemos paralisar-nos frente as perplexidades que Se aptesentam, A prasinidade critica, o envulver-se Beremente, a capacidade de espanto ¢ revolta Sio mecansmos importantes para amalisar as perplesadades, encontrar seus aspectos contiaditénivs € realear stia produtividade como desafios. Este processo destaca a necessidade de sntertogacio constante da realidacle da qual somos parte como sueitos socials que se desafiam a vivé-la 3 (© que sabe quem erat? Se as perplesidades nos paralisam, os desafios nos inst movimento. A vida, meluindo a escola, & espaco dialégico de aprendizagem e de ensino, © ponto de paruda € 0 diilogo que, criando espaco para que seja explicitada a pluralidade de vozes existente na vida escolar cotidiana, permita e estimule a reflexio, individual € coletwa, sobre 0 processo desenvolvido na sala de aula ea busca de formas coletivas de intervencio no sentido de ampliar a democratiza¢io do ensino. © horizonte é a construgio de praticas pedagogicas favoriveis 20 sucesso de todas as criancas na escola publica, numa sociedade que tenha como finalidade uma democracta real, que ultrapasse os limutes da realidade virtual A utopia & a exploragio de nowss possibilidades e vontades bhumanas, por via ds oposigio da imaginagio & necassidade do aque exist, $6 porque existe, em tome de algo radicalmente melhor que a humanmdade tem direto de desear € por gue merece a pena tutar. |... A imaginagio do novo & composts em parte por novas combinagdes © novas esealas do que exste ‘Uma compreensio profanda da realidade & asim essencial 20 cexercicio da ttopra, (SANTOS, 1995, p. 278), A construcio das utopias ¢ das formas que possam torni- las realidade tém como um de seus fundamentos, junto com a indagacio do conceito de progress dominante, 0 exer de uma anqueologia virtual SANTOS, 1995, p. 279) que procu encontrar ¢ entender 0 que nio chegow a ser realizado, as alter- nativas nfo escolhudas, os siléncios,a subaltermidade, 0 oprimido, 0 periférico, o desconhecido e o proibido; as vores latentes que, por no serem escutacas, parecem ausentes, icio 2 Agae escolar e identidade social Uma aproximacao a realidade investigada Encontramos a argueologia virtual como um exercicio de iluminar as sombras e buscar 0 escondido por este jogo de cla- ro/escuro, As pequenas pistas, os pormenores mais negligencidveis, ‘9s indictos secundirios, as observagdes arrelevantes, os dados, margmais, 0s siléncios sio aspectos de grande amportincia para 4 compreensio da realidade subjacente as atuagdes visivess. Estes sinais nos permitem entrar em areas ocultas que, como sio pouco noradas ou mesmo despercebidas, sofiem menos censura ¢ ha menor preocupacio de exercer controle sobre elas, no sentido de adequé-Ias 20 esperado (GINZBURG, 1991). Para encontrar 0 que nio esti visivel num primero olhar hecessitamos um instrumental especifico para ver melhor as expressdes, 05 detalhes, as » funciona como uma lente que interfere na qualidade de nossa observagdo; a perspectiva tebrica em gue nos colocamos potle nos proporcionar visBes e interpretacdes diferentes ca realidad © paradigna indiciénio (GINZBURG, 1991) nos parece 0 mais adequado para realizar a angueolaeia virtual 2 que nos referimes. nnficas, as peculiandades. A teoria ‘A teoria nos ajuda a olhar, ver, idagar, interpretar ¢ organizar a realidade. E um dos fatores que onenta a tradugio do real em ade1as (MORIN, 1999) e ttm produto da relacio entre a capaci- dade humana € 05 contextos sociats, que contém os problemas, intencSes e compromissos. Estes estio emoldurados por um discurso social especifico que se vincula a uma determinada dind mica de atividade humana e de sua anterpretagio, definindo tanto 15 obyetos sociais quanto 0s objetos naturals. A producio teérica configura objetos sociars dentro de um processo no qual interage com 05 sistemas sociais, convencdes e prioridades previamente estabelecidas na sociedade, se redimensionando constantemente de acordo com © movimento social. Como anvidade humana, a ciéneia participa de um processo de construcio/producio de realidades que abarca as dimensdes simbélica e étca. 3 © que sabe quem erra? © paradigma indicdrio nos parece aclequado para explorat os discursos da pritica por nos ayudar a encontrar o que se oculta nas dobras das atuagdes condianas, além de mostrar a relevancia de reconhecer os tragos singulares do ser humano no estudo das pritncas sociais e de utilizar todos os sentidos para a compreensio do observado com © ausilio dos eventos mvoluntirios, muntas vezes insiguificantes, mas reveladores. Ginzburg (1991) busca as milaplas formas de conhecimento desenvolvidas na histéra humana, Encontra modos variados de se relacionar com a vi fazer perguntas e encontrar respostas que geram., por conseguunte, saberes distintos. Mostra como até um momento esta pluralidade podin conviver; como a imposigio de um paradigma for colo- cando na marginalidade as outras possibilidades, nfo sem antes se apropriar de grande parte dos saberes produaidos desde essas perspectivas;e fiz emergir algumas praticas de procucio do saber silenciadas com o desenvolvimento do paradigma positivist Neste pont abriam-se dors eamunhos: ou sserificar 0 conhe snerlizagio (mais ou mienes gorosa, mars ou menos formulivel em linguagem materi cou procu elaborar, tales apalpadelas, um paradigm die rente, fundido no conhseamento cientifico (mas ée toda ums ‘crentifiexdade por se definr) do mdivdual. A pometra via for percomda pelas cidnerss natura, 6 muito tempo depos peas j@ncias humans, O monvo éevidente. A wendénema apagar os tracos ndividuass de umn objeto direaamente proporeional 3 dis= inci emocional do obsersador. (GINZBURG, 1991, p. 163) ‘eamento do elemento individual Voltamos 2 nos conectar & ideia formuiada por Santos (1995) de oposicdo entre distancia critica e provimidadeettiea como elemento significativo na definico/construcio dos paradigms epistemolégicos. © paradigna indiciério nos oferece metos pata estabelecer 2 _prowinnidade etica que buscamos no processo de pesquisa. Nas nar- rativas das professoras~ e de alguns outros sujettos = procuramos as similitudes, as diferengas, as singulardades, as incertezas, 3 AGio escolar ¢ identidade social 05 dilemas, as temtatiwas, as conquustas, os siléncios, os sabercs. PPistas que nos permitem compreender situagdes que nio exper- mentamos diretamente, mas com as quais nos comprometemos a manter uma provimidade citien. Fazemios uma interpretacio deste conjunto de dados, articulando as pistas encontradas § teoria de ‘que dispomos, com a finalidade de chegar a uma melhor com- preensio da realidade, que se nega a ser transpatente. Esta ope teorico-epistemolégica nos indica umta teajet6- ta cheta de instabilidade na qual nos aventuramos a expressar a relacio dialética entre teoria e pritica num contexto de ruptura com 0 limites de uma estrutura académica que dicotomiza a realidade em teora e pritica, Ousamos afirmar que tompemos com 0s concertos de obyetividade € neutralidade e tentamos desenvolver um trabalho de investigagio coerente com esta posicio. A auséneia destes dois fatores pode par em questio a propria validade do conhecimento com que trabalhamos? Outra vez, damos a palavra a Ginzburg: ‘Mas pode um paridiyana wdiciino ser ngoroso?A orientagio quanntatva e antantopocéntriea das cidnens da natureza 3 parar de Galileu colocou as cigneras humanas num desigrad— vel dilems:ou assur um estar cientifico frigil, para chegae 1 resultados relevantes,ou assur umm estatuto crenifico forte para cheyar 3 resultados de pouea relevinena, [| Mas ve divida de que ese nyo de rigor & nio s6 mnatingivel mas tam bem ancesejivel para as formas de saber mass ligadss a expe- rignei coudiana ~ ou. mas preeisamente,a todas sttuagdes fem que a umieidade ¢ © cariter insubstituivel dos dados sio, 03 olhos das pessoas envolvidas, deesives. | Em siuagaes como esas, rigor lesivel (v nos for permindo o aximero) do paradigm indiciimo mostra-se inelimnivel. Tata-se de das ~ no kendo de gus formas ee cher re conto ji cssemos, sins reyras no se prestama ser formalizadss, nem digas, |..] Nese apo de conhecimento entram em Jogo. (diz-se normalmente) clementos mponderavesolfito,goipe de vista, ncuigio. (GINZBURG, 1991, p. 178-179), 35 (© que sabe quem errat © trabalho 2 partir dos indicios pée em didlogo spos distintos de conhecimento e de interpretacio da realidade, es pecialmente aqueles vinculados aos aspectos qualitativos, que so podem ser alcancadios indiretamente, ¢ aos saberes clerivados das experiéncias concretas, Revela-se especialmente significatwo para as investigacdes em que as cavsas no podem ser reproduzidas ares. os efeitos ndquirem caracteristicas sing © paradigina indicdvio demarea nossa pretensio de rupeura com os modelos de investigacio que distinguem, ssolam, 0 territério tedrico do territério pritico.A ideis de didlogo, que percorre todo nosso trabalho como conteiido ¢ como metodo, permite ima opeio teérico-metodologica de wt recorvendo 4 teoria segundo as exigencias que formula a leitura da pritica, através do que nos é dito e do que observamos. Tratamos de teotizar constantemente o observado, contrastando perspectivas teonieas e priticas. Como 4 teorta € a pritica estio em interacio dialética & ialoguea, nosso olhar paraa realidade esta ampregnado da teorsa de que dispomos, que orienta nossa observacio-a¢do, pautada na formulacio das indagagBes © das mterpretagdes que conduzem a pesquisa. A pritica que analisamos, por sua vez, também for- hece pistas que nos fazem mterrogar a teoria de que dispomos, revelando algumas vezes a necessidade de novos conhecimentos e outeas confirmiando a validade de nosso instrumental te6rico. Sea realidade é opaca, existem zonas prvilegsadlas~ sat ddicios — que permitem decifii-l. (GINZBURG, 1991,p.177) ‘As pistas precisam ser encontradas ¢ anterpretadas. Trazé- tae & luz jf representa uim processo interpretativo, poss, come ‘08 abjetos de conhecimento sio construidos, 0 modo de con- certuat a realidade interfere em sua transformacio em objeto de conhecimento (ago da teoria). Para a Jetura das pastas temos fato de que estamos trabalhando com situacBes que ressaltar © 36 Ago escolar ¢ identidade social socialmente produzidas € com seres humanos que claboram reflexivamente suas atuiagdes nos contextos a partir de seus co- nhecimentos, sentiments ¢ intengdes. Sendo assim, nem todas as pista sio percebrdas, nem todos, 6s fatos sio valorizados de modo uniforme, nem todas as in= terpretagdes sio cocrentes om verdadeiras. A subyetividade — ou as mélaplas subjenividades em interacio ~ € um dos fios que atravessim 0 tecido da invesngago e aruam na selecio e com= preensio do vivido/observado. Buscando uma anélise que possa articulat-se dentto da ideta de complexidade, sabemos que traba- Ihamos com fragmentos, com petceprdes parciais num processo de permanente construcio-desconstructo-reconstrugio, cheio de lacunas ¢ rupturas. Arnscamo-nos a buscar neste mosaico fios aque trazem em st as marcas da toralidade & qual pertencem, com a coeréncia possivel e com os instrumentos necessiriose disponivers A anilise que realizamos enconera na hermendutica proposta por Santos (1993) uma referencia importante. Considera toda verdade uma realidade intersubjetiva que alcanca 0 consenso mediante uma relacio argumentativa, construida segundo a tes- situra dos auditérios em que se apresentam e dos episédios em que se desenvolvem os argumentos. Sublinha a natureza social de todo conhecimento, ressaltando que a mterpretagio de cada uma das formas de conhecimento s6 pode desenvolver-se satis- fatoriamente se esti imbricada na interpretacio da pritica soctal A qual prope se adequar. (SANTOS, 1993, p. 31). pritica & a origem € a finalidade do desenvolvimento teérico. Desde esta perspectiva, 0 conhecimento se constrdi por meio de rupturas, partindo de uma profinda anilise das diversas, ce muttas vezes conflicuosas, concepcdes.A producio do conhect= mento um proceso ininterrupto e, por sua natureza historica, todo conhecimento é relativo, parcial e provisorio, Nio preten= demos a complerude de uma andlise que possa ser generalizacia e que aporte verdades definitivas e defimdoras. Desafiamo-nos a 7 © que sabe quem crea? realizar uma andlise dentro da incompletude do conhecimento que caracteriza 2 complexidade do mundo em que vivemos ¢ 40 que construimos (MORIN, 1999; 1995). Conforme estes pressupostos, desenvolvemos @ pesqunsa buscando uma mtegtacio com © contexto da mnvestigacio, sem tentar camuflar a situacio real de que a pesquisadora é um agente externo a0 contexto investigado, mantendo a especificicade de cada wm dos profissionats envolvidos no processo. Assuumindo a diferenga nio pretendiamos criar distancia, tampouco quetiamos gue nossos papéis profissionais servissem de escondetijo evitando que nossa humanidade pudesse expressar-se em sua totalidade. Afirmando nosso objetivo central, deixamos emergir razio, emogio e intuicio.Talvez por concordarmos com a adverténcra de Gramser (1987): Ocmod comipreendere,prancipalmente sem senare estar apatsonado (ra so pelo saber em si, mas eambém pelo objeto do saber). sso em aereiar que o melee posa serum intelectual (e ‘nfo um mero pedante) |. som sent as parxGes eh ol mo se far polite esta conexio sentimental (p. 139). intelectual consnte em acteitar que se poss sabersern storia Sem esta parsfo, 1860 €, sem Neste jogo que marca a dimensio politica das ages ecica- tnvas e de pesquisa, buscamos realizar tuma leitura critica das apre- cragdes, opmnides ¢ categorias existentes no contesto estudado de maneira que possamos utilizar o potencial de dijlogo critico ¢ reflexivo da producto cientifica, que representa seu contetido essenczal.A dinaimca estabelecida teve 0 objetivo de transformar fo sentido da ciéncia de modo que esta dersasse de ser um objeto indo a relagio epistemologica, para converter- estranho, mat -se num objeto familiar que permita emergir sua dimensio hermendutica. Valorizamos mats 9 processo de conhecimento como pritica social dialégica do que © conhecimento acabado. 38 Agdo escolar ¢ sdentidade social Parstesparam da pesquisa oxo professoras, que trabalham em «escolas piblicas da perifena com eriangas das clases populares, em turmas envolvidas no processo de alfibetizagio?. As professoras unham realidades bastante diferentes, 0 que contribuzu pata a dindmnica das discusses ¢ para a refiexio.A diversidade permitia novos olhates para os faros cotidianos, ajdando a desvelar al~ gumas de stias faces ocultas e coloeando em debate temas ances no percebidos ou considerados sem importincia, Trabalhamos no sentido de dar visibilidade a fios ocultos que dio sustentagio 4 realidade aparente. O debate entre as participantes ia pondo sobre a mesa um amplo leque de questdes que sinalizavam ma- ‘azes significanvos para ir delimitando nosso ambito de a¢io, pois 4 elaboracio geral da acto colocava marcos amplos com virias possibilidades de onentacio, que 1a se coneretizando segundo a8 definicSes do proprio grupo. Com: este procedimento, garantiamos espago para que as professoras atuassem também na defimgio do desenho da pes- quisa. Construiamos a possibilidade de vivenciar um processo coletivo e coope Wo de construcio do conhecimento mcor- porando também a polémica,os dilemas ¢ os conflitos, merences 80 processo de construgio do conhecimento ¢ 3s atividades coletivas, Esta estrututa de trabalho gerava melhores condi¢des para que cada uma pudesse expressar seus conhecimentos, att tudes, percepedes, desconhecimentos ¢ sentimentos segundo suias perspectivas singulares, sem esquecer que a participacio no grupo interfere na dinimica individ Conforme 0 paradigma mdicisno, apro: mamo-nos do contexto escolar com o obyettvo de encontrar novas pistas que nos ajudassem a tecer 0 complexo entramado que relaciona * Consideramosafaberzagio como wm proceso amplo aue va alént dt apren- izagem ment da lexura¢ de scr, seguinda as propostas de Freie, em que vu pessoa esti se alfabewzando de modos varuadoscrante toc sua vida, Mas ro caso espeitico desea ves Jo. delinneamas como ea pas de af io 0 alunos ahas deste a ed infin até 6 5° ano de essauridade 9 © que sabe quem evra? fracasso (sucesso) escolar, avaliacio e formacio docente, den~ tro ce um determinado cenirio histérico € cultural. Dentre a diversidade de possibilidades existence, nossa escolha esteve direcionada pela intengio de encontrar metos que permutissem 3 expressfo das vozes das professoras e que o proprio processo da pesquisa se desenvolvesse como uma atividade de interacio entre teoria € pritica, Queriamos uma agio coerente com 0 marco tedrico-epistemolégico nto qual nos situames. Além das entrevistas ¢ observacSes nas salas de aula, const deramos oportuno analisar docimentos elaborados pelas seerctarias de educago as quass as professoras estavam vinculadas; trabalios de alunas(as) 08 relatérios fextos pelas professoras e relatéris fertos pela familia Ao mcorporar as discusses anvidades desenvolvidas pelas professoras com seus alunos ¢ alunas, entendiamos que estivamos trazendo elementos para que as professoras pudessem confiontar as representagdes que expdem de sua realidade aos resultados obtidos em suas proprias salas de aula, Este procedimento nos pareceu importante por consti cuir um significativo mstrumento de anilise, para as proprias professoras, de sta atuacio conidiana ¢ das representagdes que constroem a seu respeito. As diversas formas de relatos sobre 2 vida escolar cotidia~ na apresentadas através dos diversos tupos de dados com que trabalhamos foram assurmidas como textos compostos desde mmiluplas perspectivas e expressos em linguagens variadas que nos permitem, também, confrontar as diferentes representa ses das priticas e buscar sua contnudade, suas contradicées fe rupturas, Eram textos em que os siyettos manifestavam suas vozes, colocavam em didlogo suas concepgdes e explicitavam. as diferentes culturas que permeavam nosso trabalho, {Os eabilhos devas) stunos) ambi pie ser comsiderados como abjetos de ‘sersago indies, pos permite um wxorno priticapedagoniea e erzeM nov snformnades par ante ecomprensto mas prafandada ininca da sala dea 40 Gao escolar ¢ identidade tocial A diferenca se revelou uma chave mdispensavel para nosso trabalho. A heterogeneidade dos contextos gerou uma heterogenerdade nos procedimentos da investigacio ¢ dos temas abordados, como poderemos constatar nos préximos capitulos. A opcio teérica tem como uma de suas condigdes.a peculia- ridacle da realidade em que se desenvolve o trabalho educative, no qual se movem alunos, alunas, professores ¢ professoras, uma vida cotidiana que apresenta situacdes problemiticas com frequéncias pouco definidas e bastante desordenadas, Situagées em que 0 proprio problema nio esti claramente definido e que rampouco se pode soluciona-lo mediante a aplicacio de um conjunto de conhectmentos técnicos. Ou, nas palavras de Schén (1992 Quando um priuco define um problema, elege e denomina aguilo que va reparr..1 Median agBes complementares de denominagio e estruturagio. o pritico seleciona seus pontos de atenio e os organiza guiado pelo senndo da stungio que facilta & eoerénera © marca umn diregio para a acho. Neste 10 do problema & umn processo ontolégico ima forma de constrair 0 mundo. (p. 18). Isto leva a que uma mesma situagio pode ser abordada desde varias perspectivas segundo as bases em que se fundamen- tam as agdes, A plaralidade gera conflitos que nio podem ser solucionados desde uma Otica exclusivamente instrumental A solucio mmtas vezes requer alguma dose de mproviso, criz~ tividade e coragem para expetimentar na pritiea as conclusdes pessonis, indicando que uma prética competente pode no ser tuma questio excluswva de conhecmento profissional. Estas necessidades da pritica pedagégica estio em conso- nineia com o panorama reffetido neste capitulo, que sublinha a dimensio de desafio implicita na pratica pedagogies vineulada A inclusio em uma sociedade de caracteristicas excludentes. Se a diferenga aparece em sua dimensio de dilema, pode ser compre- a (© que sabe quem erra? endida pelo porencral que implica a heterogeneidade no process de construgio de novas possbilidades. A diferenca se compée de movimentos simultineos, com ntensidade e finalidades distintas que, em seus encontros € de- sencontros, vio desenhando 2s cartografias do concexto social A relacio pratica escolar-pritica social que constréi o fracasso escolar se cruza com outras possibilidades de mteracio escola -sociedade que se estio tecendo em diversos mbitos, Ainda que estejam desarticuladas entre st possuem em comum a compree! da necessidade de se instaurar uma pritica— escolar e social ~ dialé- gica, em que haya lugar para a expressio cas muiluplas vores socias. Se é assim, em que consiste a formacio profissional? Que aspectos, devem ser considerados 20 planifici-la e desenvotw: Depende, seria. a melhor resposta de acordo com o que ndicam nossas observacdes. Depende dos objetivos e condigdes, escolares ¢ sociais, € das teorias que fixndamentam as préticas € sua anilise, Mantas sio as possibilidades em consequéncia da existéncia de miiliplas formas de mterpretar a redlidade © de anteragir com ela 2 DP ert Capitulo 2 A formagao docente: apagando fronteiras e redefinindo territorios A tealidade pode ser entendida desde varias perspectivas, embors a cosmovisio dommante apague, ou ofusque, as outras possibilidades. Este processo implica luta ¢ frequentemente os perdedores” continuam tentando tornar-se visiveis ¢ dar vi- sibilidade a suas formas de interpretar o mundo ¢ conseruir a vida. A acio ¢ a formagio docentes, em suas dimensdes tedrica € pritica, organizam-se dentro dos parimetros e censdes soctalmente construiidos, também estio imersas nesta luta. O movimento de construcio e desenvolvimento de priticas pedagogicas é demar- cado pelo patadigma da modermidade, defimdo pela cigncra post~ tuvista ¢ pelo pensamento liberal, de modo que os limites da aco escolar correspondem aos linmtes do paradigma que a sustenta € di sociedade da qual é parte [Neste momento, a discussio sobre a formacio docente emer- Be como elemento significaivo do discurso hegeménico sobre qualidade da educacio, ci proposta,frequentemente se confimde formagio com tretnamento nstituido na perspectiva tecnicista. Nesta ese rediiza interacio social ea dinémica eultwral que catacterizam © processo de ensino-aprendizagem 4 sua dimensio técnica, hie- tavquizando teoria e pritica; o movimento se estabelece desde a torts, frequentemente reduzida A tecnica, em ditegio a prin, ‘Anda que esta se a postura predomunante, outras vozes po- dem ser ouvicas ¢ formulam demandas e possibilidades de atuagio diferentes no temntono da formagio docente. O discurso da pritica a (© que sabe quem errat? e odiscurso reénco estruturam umn panor ado no qual mit tuplas perspecttvas Sio apresentadas, permitndo também a expressio. de concepedes contra-hegeménicas. Neste capitulo, enfocamos 1 formacio docente, observando seu: desenvolvimento teénco & princo, com o objeavo de discunir o movimento de construgio ~reconstrucio paradigmritica implicizo no debate. A formagao docente como pratica social ‘A concepcio hegeménica parce de uma ideia de formagio ‘como um lugar de trinsito entre o mdivicuo € 0 profissional ¢ constitu a base para diversas perspectivas eoncas. Eo momento de preparar-se para a atuacio; o momento de recolher tudo o que for necessinio antes de assumur e desempenhar a fiancio docente. Esta adena tem primazia mesmo no émbito da formacio continuada, que frequentemente tem o objetivo de proporctonar aos professores & professoras “novos” instrumentos, metodologias ou conhecimentos, destinados a “eransformar” sua pritica, conferindo-Ihe “melhor” qualidade. A formacio se caracteriza por agdes pontuats, para suprit determinadas deficiéncias O contexto da formacio tem se desenvolvido dentro dos limites postos pela definicio soctal do processo educativo, o que significa prepa sional para responder de modo ade~ quado aos pressupostos ¢ necessidades do sistema educactonal ar © prol O desenvolvimento tedrico € pritico do campo da forma- docente vem ocorrendo como parte de um movimento em que a resposta insuficiente da pritica is elaboragBes tedcicas gera redefimides superficias da teorma, sem interfere no sentido global da acio escolar como pritica social. Sfio modificacdes pontuass, geradoras de novos enfoques, eraduzidos em novos mnsiruntet= tos e métodos, apresentados 3 pritica como novas sugestées, complementares Js anteriores com 0 objetivo de aperfeicoar a aplicagio do paradigma a A tormagio docente Hi um proceso de transformagdes progressivas cam 0 objetivo de solicionar as crises do paradigma e dar mas vigor a0 pensamento positivist e liberal que desenha 0 paradigma da modermdade; mantém a concepio a-histérica de humanidade e de suas praticas, sustenta um olhar mdividualizador para a cons- tuauicio ¢ aco do sujerto, sea aluno(a) ou professor(a) e aceiza como naturais os resultados obudos. A idea predomunante é a de que a sociedade & um sistema harménico, em que os indi duos compartilham um sistema homogéneo de valores ¢ normas dentro de um quadro de interesses coletivos. © processo se constitur, sobretudo, na perspectiva do de senvolvimento teemieista que se refere esseneialmente ao ensino ¢ ressaita a faceta de tecnologia educativa, confirndinde pritica com técnica. Pautado pela racionalidade tecnica, o desenvolvi- mento te6rico-pritnco se refere essencialmente busca de formes para proporcionar um “conhecimento mais sélido”."cientifico” uma clara negacio do senso comum ¢ dos conhecimentos forjados em esferas io cientificas” Embora este seja o sentido hegeménico,o desenvolvimento teorico € pritico nio & uniforme, ha espaco para desvios ¢ rup- turas que sinalizam novas demandas para a forma € indicam tryetos diferenciados, cenirios todavia emergentes, em processo de construcio, vislumbrados pela andlise teérica & anuinctados em muitos momentos da pratica de formacio-acio docente. Hé um movimento, nos contextos reérico e pritico, em. (0 docente gue se tecem propostas que consideram a implicagio docente na auvidade pedagégica, a complexidade do processo de ensino- ~aprendizagem, a existéncin de dilemas nas praticas condianas, os problemas, as caractetisticas de cada suyerto ¢ as singularidades das situaeSes condianas, Propostas que no pretendem aperfeagoat 0 modelo dominante, poxs partem do questionamento da logica postavisea 45 (© que sabe quem errat Parece-nos mportante observar que nas prisicas cotdianas na escola se encontram mesclados aspectos dos diversos modelos tednicos estruturados, inclundo os que consideramos em processo de cons mucio. Conforme Rockwell e Mercado (1989), a quem cadwamos [As priticas [dos proftstores| sio heseroyéness dito de outro ‘modo, no restita possivel classificar professores segundo “potogis” simples que remetam a metodos (eradicionais/ a1avos) a personalidade (autorstiri/democritico) ou a etapa de formagia (empirico +s, erentfico). Na privca de ead professor tende a se apresentar essa heterogeneidade © pode ser ampla vartedade de ages gue empreende, em distintos ‘momentos do dia, om diferentes eurmos, marerns, grupos, ou ‘tapas de vida, (p. 70) Como este amalgama tampouco € suficiente para enfientar 1s demandas, o movimento apanta a construcio de novas propos «as, demarcadas por outro horizonte epistemolégico, que possam, contribunr com a redefintcio do sentido das praticas pedaggicas cle modo que estas se vinculem & construcio do sucesso escolar de todas a5 erianeas. ‘Aacio docente: lugar de conflito entre teoria e pratica No percurso de construcio teoriea sobre a formacio docente, determinados problemas representam uma crise de crescimento (KUHN, 1975) que tevela a poréncia do paradigma para explicar/ conduatr o desenvolvimento tedrico ¢ pratico. Outros, como for sinalizado ma disevssio anterior, provocam rupturas, introduizem vores e dilemas que deixam antever a configuragio de uma crise de degenerescéncia (KUHN, 1975), indicio da insuficiéncia do paradigma. Os “pequenos consertos” no conseguem produzit solugdes para as demandas socis, surgem fraturas nas formu- Iagdes tedrica e pritica da formagio profissional que indagam © proprio paradigma, expondo uma reducio de seu potenciat explicanvo e proposinvo. 46 A lormag3o docente A percepcio desta insuficiéncia nfo se restringe a0 con texto educacional, pois esti demarcada por um processo de questionamento, em diversas éreas do conhecimento, das bases que constituem o paradigma dommance de cigneia.A mudan- a no enfoque epistemoldgico assinala lacunas no paradigma domunante e constrdi pontes para a redefimgio paradigmatica Emerge a imagem da sociedade como uma construcio conflituosa cm que diversos grupos se opéem entte si como consequiéncia dos objetivos diferentes, muttas vezes antagemicos, que possuem.A dimensio étco-politea adquize primazia sobre a ecmica, que representa apenas uma das dimensdes exstentes. O conhecimento cientifico pode ser um instrumento importante para a acio docente na medida em que contribu para a compreensio de realidades complexas e pata a intervengdo nestes contextos. Mantendo © foco do debate na realidade escolar ¢ nas dis- cusses teénicas a seu respeito, observamos a presenca da tensio entre © modelo positivist, jé consolidado, ¢ os modelos demar- cados por uma petspectiva sociocritica, dialética ¢ dialdgica que apenas se anunciam, © processo de ruptura tem duplo sentido, poss denuncia a insuficiéncia do paradigma domunante ¢ anuncia 4 posibilidade e necessidade de outra configuracio patadigmética, Diversas imerativas, dentro e fors da escola, vém eriando um movimento de redefinicio da formagio profissional (CANDELA ct al, 1994; EZPELETA; ROCKWELL, 1986; GIMENO SA- CRISTAN, 1995, 1996; HERNANDEZ, 1991; MONTERO, 1996; ROCKWELL, MERCADO, 1989). Ressaltando a di- mensio histérica do processo de forma jo docente, incorporam a formacio como parte de um trabalho realizado por sujeitos particulares em situac3es socians especificas, Este movimento de de dar visibilidade 20 processo de transfor macio paradigmatica interado e de construir praticas que atuem no sentido de consolidi-to, revela a necessic a © que sabe quem ercat Um aspecto significativo & a percepcio dos professores ¢ professoras como importantes mediadores entre a cultura,em sua acepcio mais ampla, e seus alunos ¢ ahunas. Se voltamos ao fato de que a transformacio mas priticas escolares tenta conectar=s movimento que busca uma maior democratizacio da sociedade, esta mediacio se torna mais relevante, pois a acio docente € entendida como uma agio politica para a qual é impreseindivel, amda que nio seja suficiente, a qualificacio téemea (FREIRE, 1985; 1993) E evidente a necessidade de uma formagio teorico-pri- tuca (ou pritico-teérica) abrangente € flexivel que ofereca aos professores © professoras a possibilidade de afrontar, perceber € desenvolver em suas aulas a varredade de conhecimentos culturas presentes no contexto escolar e social. © processo de formacio deve considerar que a atuacio profissional congrega ‘© conhectmento tacito, 0 contexto subjetivo, os significados e a estrutura cognitva Frequentemente os(as) professores(as) reconhecem a necessi- clade de novos conhecimentos, mas sio criticos 26s programas de formacio profissional (imictal ou contimuada) existent. Professorial: A gente vem de uma formacao do nao, uma Formacao em que tudo é nao, certinho, muito medida. |.) Ai vocé eat ld no povio mesmo, 9 cara que nao almacou, 0 cara, gue vu a mie transando com 0 vizinho, o cara que viu © pal fazendo uso de drogas, que apanha. Uma dificuldade que a gente tem la e atrar esse pessoal para alguma capacitagao, algum cursinho, alguma coisa diferente... Geralmente vocd ouve que sles ja fizeram tudo aquilo, que & Sempre a mesma coisa, mesmo tendo muita coisa nova, muita, corsa diferente, Eu atribuo 1ss0 ala falta de tormacao que a gente tem. |..J Eu tenho onze anos de Estado, Pouguissimos cursos. As declaracdes afirmam a necessidade de ampliagio do conhecimento. Sio indicios do mteresse das professoras por um 48 Se A lormagio docente conhecimento que possa trazer outras perspectivas para sua priti= ca cotidiana, oferecer novas e mais porentes chaves de leitura dos dilemas que atravessam sua pritica didrta, e facilitar a mteragio entre as ideias e a realidade (GIMENO SACRISTAN, 1995) Ens indo novas cenas em antigos cenéi s sabemos ser possivel a transformacio, também reconhe- cemos nio ser facil empreencer mudangas tio radicais como as exigidas pela pratica escolar. As ideras de movimento, processo, continuidade, reconstrucio, mdagacio, entre outras, remetem- -nos a uma concepgio de que a formagio ¢ a aio docentes estio estreitamente vinculadas uma 4 outra, Neste sentido, toda formacio esta umpregnada de ago, do mesmo modo que toda acio tem em si um forte potencial formative, embora,na pritica, rem sempre seja visivel esta articulacio. Como vimos, ii: mudaneas que expdem as insuficiénesss do paradigma dominante, seus dilemas, e desxam emergir suas fraturas, a necessidade de uma nova defimi¢io paradigmatica ¢ 05 processos em que as alternatiwas vio se configurando. Nosso trabalho se mnsere neste processo de redefinicio paradigmatica, tomando como referéneia una perspectiva teérica que analisa eriticamente a realidade e se propde a interpretar a realidade social, em que esti compreendica a escola, com o objetivo de cransformicta Este movimento tem como um de seus pressupostos fim damentars a ideia de que todos os homens e mulheres podem participar de uma soctedade usta © democritica como sujeitos livres ¢ iguars, Propostas constrnidas desde uma perspectiva critica & eserucura arual da soctedade & de uma anslise da escola piiblica 10 que participa do processo de exclusio social por no desenvolver possibilidades igualitanas (0 que no significa a busca da homogeneidade) para todos os seus alunos ¢ altinas como uma anseitun 9 © que sabe quem errat Nesta 6t1ca, a fangéo da escola é atuar em consonaneia com, © processo de transformacdo social, trabalhando com as erencas pressupostos sociais para cesvelar como determunadas forgas atuam como obsticulos a democratizagio. Entende-se 0 conhecimento escolar em relagio com interesses de classe, raciasse de género, que se entretecem gerando miiluplas ¢ mutantes configuracBes, dentro de uma concepeio libertadora da educacio (FREIRE, 1996), pedagogico ulteapassa a dimensio séemca, mnsuficiente para responder aos dilemas e ambiguidades entranhados no processo educativo, dando relevi dimensio humana. Ofa) professor(a) € definsdofa) como um(a) intelectual transformador(a), capaz de refletircriticamente sobre inci 8 multiplicidade que compde sua sua pritica, Assume 0 ensino como uma atividade politica que frequentemente tem que optar entre objetivos educativos confli- thosos, tecidos por perspectivas étrcas diferentes. © paradigma emergence exige transformagdes na logiea snbyacente 4 andlise dos processos e 4 configuracio das ages. Implica um novo olhar para 0 contexto social ‘coisa jd esta na boca, na lingua do povo, na lingua do profes- Sor. Mas na hora da pratica vocé nlo vé se concretizar, agente rnBo consegue fazer. Porque & tho forte aquela outra referéncia, {que mesmo a gente tendo um discurso diferente, a gente n30 Consegue colocar em pratica [.} Entdo fica facil vocé dizer que J& esta na boca essa coisa de vamos mudar, vamos fazer uma corsa progressista, diferente, ‘vamos trabalhar oldie, a cranga nao esta ainda no nivel do nag se 0 qué A transformacio pretendida deve ser qualificada, sob pena de se limtar a um aperfeicoamento téenico, de orienta pragmatica, que no reconhece 0s objetivos educanvos que perpassim a pritica escolar e as normias como construcées socias, suscetiveis 4 critica ¢ substituivers. Outro movimento & desencadeado quando a transformacio se articula 20 movimento contra-hegemémico, configurado, sobretuco, pelos disctsos & A tormacio decente priticas construdos em oposicio 4 légica dominance, portadores de experiéncias vividas ¢ representagdes que direta ou indire~ tamente comportam relacdes de dommacio, a possibilidade de emaneipagio e expressam a heterogeneidade. As “experiéncias vividas” ressaltam a heterogeneidade do processo, sfo consequéncias de situacSes diversas ou resultam de circunstincias semelhantes envolvendo pessoas diferentes. Assummndo 2 perspectiva apresentada por Voloshinov (1976), afirmamos que uma experiéncia € que sio as representagdes que dela fazem os sujeitos. A representagio da experiéncia & resultado do encontro de signos de natureza interna ~ consci- erna as mensagens que provém do mundo exterior. A consciéncia individual se constitu neste movimento semuético em que mteragem a atvidade mental e a atvidade social. Snew—e ‘Toa compreensio verdadeira tem nacureza dialogal [.J Para cada palavra do crunciado que estamos em proceso de com preender propomos, por asm dizer, um conyunto de palavres, ‘nossts como respost || 0 significado se nealiza 6 no proceso ca compreensio ats e responsiva. (VOLOSHINOV, 1976, p. 128-129), A escola, local onde diversas experiénens, palavras e com= preensdes se configuram ¢ se confiontam, é espaco social de futa pelas defimicdes da realidade onde se pode desenvolver o espirico critico € o respeito pela dignidade hum: vista como um E possivel vistumbrar um projeto pedagogico amplo, capaz de antegrar 0s problemas pessoats e sociais com 0 objetivo de contribuir com a construgio de endadios crincos e ativos, sendo fiandamental que os professores e professoras possam constituir- ¥¢ como forca coletiva.A pritica pedagdgica, os contestos que 4 circunsctevem, 0 discurso educatio e os critért0s soctais sio questionavers e passives ce redefimcio. 'Na vida escolar cotidiana estio presentes diversas eoncepedes, e escola, que muntas vezes se colocim em ura, 0 que produz mo- (© que sabe quem erra? ‘vimentos em seu interior que buscar formular alternativas a parti de concepedes distintas, Na busca de alternatrvas,trés aspectos nos parecem fandamentais: a mtera¢io teona-pritica, © conhecimento profissional que mangjam os professores ¢ professoras, ¢ 0 signifi- cado de autonomia profissional, A construgio de uma pritica de nova e melhor qualidade demanda a conquista e manutencio da autonomua, que se encontra articulada a0 reconhecimento de que 8 pritica profissional est ancoraca num posicionamento. Auto noma que se revela na capacidade ca professora criat, individual € colenvamente, slternativas para a sta aco. Eu mudel a postura. € uma coisa muito lenta mesmo, mas eu percebo que nao € por pena do aluno, mas & tendo um pouco mais de citetio, €... ponderando mats por que ele nao chegou Jaqvele objetivo, par que ele nao respondeu como eu gostaria, Por que tem que ser como eu quero? A avaliacio me propor: Gaonay esse questionamento. Pra mim, esses momentos foram muito ricos, mut ricos mes: mo. Muito bons! Eu comecei a exercitar 8 minha visio. Esse Tempo inteire eu fui percebendo que eu passe! a ver 0 que eu nao via. Eu tinha olhos, eu olhava, mas eu no via. A telagio teoria-pritica é especialmente significativa pata a construgio da autonomia. Frequentemente & um de seus entraves, em especial pelo distanciamento entre a reflexio ¢ a a dificuldade para pér em pritica as discussdes te6ricas, e pela [As vezes ev acho que no esta dando nada certo, que eu estou. fazendo tudo errado, quero desist. E melhor procurar outra profissao. Mas eu pego € vejo que aqullo que eu dei a crianca, festa reproduzindo, que ela vem: "Tia, olha o que eu fiz! E ela vem e te mostra que ela escreveu, mesmo sendo da preescola, cheio de letras, que ela tem nocio, tem nogio de Hinguagem, tem nocao de escrita fala claro, As vezes elas se embolam um pouquinho. Mas e barbara! |.) Mas agente tem que crescer, Viver novas experiéncias @ multo bom. €a gente faz curso, curso, curso eas vezes agente acha aque a pratica e uma coisa ea teona e outra, Entao a gente fala, agente vem para aqui e faz coisas lindas e maravilhosas, mas A tormagao docente ‘haga na hora a gente nfo faz, As vezes eu me pergunte: por ‘qué? Sera que eu no me esforgo? Sera que... No se... Que chega aqui eu falo muito, tudo o que eu tinhe vontade de fa Zer, mas parece que tem hore que eu chego na sala e nao d3. Seu dilema pode ser entendido pelas diferencas existentes ras dimens6es teorica ¢ prinica e pela necessidade de colocé-las ‘em diglogo com o objettvo, em seu emso, ce construir uma pritica distinta.A proféssora, nesa sttuacio, vé a teoria como instrumento para superago de uma pritica cotidiana que pode ser transformada, Reconhece as especificidades de cach uma das vises e demonstra reconhecer também a necessidade de se sraduzir as concepedes teéricas em atuacdes priticas. Busca caminhos para reconsteuir sua atuacio mediante as novas leituras de seu fazer quie © dominso da ceoria que possun Ihe permite. Para a reconstrucio tedrica e pratica da atuacio pedagégi~ ca no basta a escolha de um modelo diferente, € preciso uma ruptura com @ teoria que atravessa a pritica, A necessidade de indagacdo, critica, ruptuta e reconsttugio da matriz teérica nem sempre é claramente percebida. Nio reconhecendo a existéncia de teorta em sua prittca, nfo tem clareza das concepedes que a ‘mantém e quats aspectos devem ser redefimidos com a assungio de uma nova teorsa. O seu dilema parece indicar uma contradic¢io centre a teoria que sustenta esta pritica que se revela insatisfatori € a tort que anuneia a possibilidade de novas acées priticas. Sem perceber quais sto as concepgées de ensino, aprendi- zagem, infincia € conteiido escolar que demarcam 0 desenho e 0 desenvolvimento das agdes cotidianas, a professora frequentemente ‘muda o modelo das tarefis propostas para os altanos e alunas, man= tencto as concepedes intactas, Para analisar esta questio, temos que apresentar também a hipotese de que nio esteya claro o significado. de teona, conforme adverte Gimeno Saenstan (1994): E frequente que certos profesores proposes gue lifiquem de wonss toda se jist a suas expectanvas ou necessidades amediatas. |. Hii que dizer que © que chamamos teorsa tem, 33 (© que sabe quem errat a missio de romper 2 forma de entender a pri vigentes da print, abrir-se 2 outros mundos.a wtopi que pedir uma mentalidade mais aberta para ver a wilidade dla teorta. (p84). A reflexéo como atitude importante para a transformacao ‘A teansformagio do senudo da pritnca pedagdgiea demands um questionamento tanto das condicdes materais do trabalho, de sua estrutura, objetivos ¢ organizagio, quanto das concepedes, valores e conhectmentos subjacentes ao processo de ensine-aprendizagem, Os condicionantes externos parecem bem-identificacios pelos professores, sio apresentados com detalhes como elementos que impedem ov dificultam o desenvolvimento de uma pricica pedagdgica de nova qualidade. Os condicionantes internos no sio tio visivers, ainda que também sejam mencionados Eu acho que o professor nao tem... trabalha igual a um robé, rné? Voce tem que cumprir aqueles objetivos ¢ aqullo tem que estar correndo tudo murto certo. Tudo naquela linha. Voce esta, vendo que as vezes no ¢ por ali, mas esta seguindo aquele ‘eaminho, né, Porque vocé também e muito cobrado do lado Ge fora pelos pais, pela ortentacdo, pela directo. Porque vocé tem que andar na linha. O caderno das criangas tem que estar corngido, tem que estar certo. Imagina voc® devolver um texto helo de erro, Isso e incancebivel. Nao pode acontecer. Vem tum monte de gente em cima de vocé: por que esta chero de ‘ero? Nao pode deixar cheio de erro, Entdo eu acho que o primeiro obstaculo seria a minha mudan- 2 de postura, minha, Depors tambem a escola, que & muito Sonsetvadora, muito reacionana. A escola exclut mesmo a rianga, ela leva a 1550 mesmo, uma persequicao velada, de {ue se no copiar, se nio entrar no esquema que ela propee, prupoe nav, que cla dita, ela dita mezmo, ele tam mai @ que ‘quando completar 10, 12 anos, estar saturado de escola, car, nna vida: “estou fora, \Vocé tem de ter um instrumento, ate o escrito mesmo que é 0 {que a5 pessoas te cobram. |..] Eu tenho o compromisso com nota. |] Ea tenho que atender a padrdes externos. A tormagio docente ‘A presenca velada dos condicionantes internos sinalizou a necessidacle de proporcion 1 as professoras atividades em que fosse possivel questionar as concepedes em que findamentam suas priticas. Desvelar as contradicdes existences nesta relacd fondamental para uma mudanga efetwa, pors duas teortas disti- tas podem se opor sem que cada uma delas perca sua validade dentro da perspectiva em que se originou. Por pertencerem a ractonalidades diferentes nio so igualmente vilidas para atingit todos 0s objetivos, apesar de se manterem igualmente coerentes se tomamos seu ponto de vista como referéneia da andlise ‘A pose de uma forma de conheeimento implica auroma- ticamente tama reforma do espirito. E preciso, pos, dingy hhossis pesquisis para uma nova pedagogia. (BACHELARD, 1970, p. 105) A observacio, inverrogacio e anilise de exercicios feitos pelos alunos e alunas sio procedimentos interessances para interrogar 3 teoria e a pritica dh avaliacio, confrontando a op¢io teénca explicitada as marcas de teorias presentes nas attvidades propostas. ‘Acho que quando nés paramos para buscar isso, paramos para ‘buscar o nosso wabalho, eu considero um avango mutto grande, ‘quando te incomoda, quando nos comecamos a nos perguntar: mas © que faze’? Estamos no tradicional, no estamos? Que instrumentos usar? Nessa busca de que instrumentos user, nes nao temos a resposta, estamos construindo a resposta |) Eu me pergunto quando eu olha as avaliac6es das alunos que esto Comigo, eu me pergunto pelo nstrumento. Porque eu continue Usando'e tradicional, continuo buscando e melhorando. Mas fe que eu posso fazer para avancar? Legal e que... eu num tempo nao murto longo, nao parava para refleur sobre o que eu posso aprovertar, sobre o que eu posso fazer com o que eu tenho a mao. Eles produzem muito mais fem arupa, no coletivo, do que sozinhos. Acho que € mesmo 2 zona de desenvolvimento proximal que a gente esta vendo na pratica, Eu estava com 0 Jornal, ¢ levet para a escola e eles viram. Eu estava lé escrevendo, fazendo 0 desenho que ia trabalhar, € esti eles Id falande do flamengo. |] © que sabe quem errat ‘Ai eu comecei a trabalhar em cima disso: quantidade, os nomes. {60 Flamengo no quadro, eles foram idea... pediram para copiar fe copiaram do quadro. Fu néo estou induzinde, porque foram cles que quiseram. les copiaram do quadro, desenharam. & Foi um baratol Eu até mostrei para a diretora, joguel, party eles ¢ a aula fo: otimal |.) As vezes, a gente nio dé liberdade a cranga. A gente no acredita que a criang2 possa. A gente tolhe muito a crianca, ‘Acho que na pratica acaba nao fazendo. Por exemplo, essa ques ‘ho da lista, a gente andou conversando. Lembra, que a gente andou conversando? A gente conversou a beca com ajaque, ¢2 gente sabe que o ideal & trabalhar com o texto, @ escrever todo ‘© dia. Mas voce... eu acho até que pra gente, a gente consegue perceber, mais ou menos, em que hipotese a crianca esta mals laramente, quando voct faz alistagem. Eu acho que nlo ¢... Acho que é uma preocupagio que a gente tem de ter controle mais ou menos da situacao, de perceber, de forma mats imediata, como a crianca esta. Porque no texto ‘a crianca, mesmo sendo silabica, as vezes voc® no consegue perceber.J..1 Enquanto que a listagem, no. Ju] E voce vai ercabendo, voce vai passando pela sala e vocé consegue ‘lhar methor. E como vocé se surpreende quando vocé v8 o texto da crianca uma historia de uma cranca. I.) A/eu fic assim: Puxa, como ‘rque eu fui boba, por que que eu née deixe! a gurizeda mats solta para escrever ha mais tempo, Por que que eu fiquel tao preocupada em ficar..” Nao ¢ segurando. Atraves de exemplos distintos, as professoras mostram como 1 avaliacio dos trabalhos que desenvolviam com as criancas assinala aspectos significatwwos para uma melhor compreensio da relagio teoria-pritica no processo de ensino-aprendizagem. Indicam também que o erro tem um sentido positivo que deve ser incorporado 4 dinimica pedagégica Eles usam muito a borracha. E eu acho 1s50 muito legal. Porque feles percabei que Ha ela burn © apagam mesmo: "eu ere! ‘A gente tem trabalhado musto essa coisa do erro. O erro & Importante na consttucao do conhecimento. Ninguem quer ver, ‘o erro, Ninguem nasce sabendo tudo. Iss0 vai surginde com as tentativas, Entdo eles usam mesmo a borracha, ¢ apagam e 56 A tormagio docente vo 14 ¢ ajudam, quem consegue... "sabe mais” vat la ¢ ajuda ocolega, Por outro lado eu queria aprovertar de alguma forma, ate para valorizar e trabalhar a questao da producao, mas néo sei como. J} De repente esse trabalho pode ser feito no geral. Destacar um trabalho que ele vem fazendo e puxar isso, quais so as dificul- dades que vim mais na hora que esta escrevendo. f.] Voce sente que a crianga vai ficando cansadla. Vat abanxando @ cabeca, vai cansando, de tanto erro, For outro lado, tambern nao pode devcar passar as sificuldades, porque ai voce mio) esta atuando, Tal conciusio nos anima a debater dors temas que condi- ctonam a ago, mesmo quando nao sio percebidos: a acettagao do erro como parte do processo de construgio de conhecimento © © papel que o conhecimento cientifico desempenha no de~ senvolvimento de novas perspectivas no processo de ensino- -aprendizagem. Frequentemente a polénuca em torn dos resultados que as, ‘evzangas apresentam diz respeito a seus errs: enquanto algumas professors vem 0 erro como parte do processo de ensino- ~aprendizagem, outras percebem 0 erro como a confirmagio da impossibilidade da crianca.A presenca do erro, mais do gue do acerto, caloca em discuss 0 pritica pedagogica (© que sabe quem evra? As praticas escolares sio tecidas também pela tensio re- sultante do confronto entre concep¢des distintas do proceso de ensino-aprendizagem. Concep¢Ses muitas vezes opostas, contradiénias, embora igualmente apotadas no conhecimento produzido sobre 0 desenvolvimento infantil, 0 ensino © 3 aprendizagem. Em determinados momentos ha um grande bismo enitre os varios pontos de vista, ¢ as professoras tentam conciliar seus conhecimentos sobre 0 processo de ensino~ ~aprendizagem com as exigéncias escolares. Em nossa pesquisa, este movimento foi levando algumas professoras a deixarem. para tris aspectos importantes do campo teorico-pritico em que procuravinn muvei-se ¢ a contrarem enda vex mais sua pratica em anvidades que Ihes permtissem classificar seus alunos e alunas dentro do padrio proposto pela teorta em que fundamentavam sua acio. 58 A tormagio docente Por que nos fizemos essa escolha? Pameiro porque a gente ‘quis buscar algo que nos desse seguranca, acreditando que ‘este tipo de trabalho ina nos assegurar que o menino fosse se ‘apropriando mais rapidamente da base alfabetica, E... Por sar um texto que memorizado, no caso a parienda & lm brinquede cantado, e que e facil memorizar. € depots que ‘© menino ja esta reescrevendo, seria mats facil ‘Ao inves dele estar pensando em cnar, naquele momento, cle ‘estara reescrevendo. Mas a gente sabe o Gnus que isso causa. ‘Quando vocé opta por fazer um trabalho de reescritura vocé esta ‘irando, sea gente no ter cuidado, a oportunidade do menino estar construindo, dele estar pensando, dele estar jogando sdeva dele para o papel. |. Ea gente teve uma pressio muito grande esse ano, como se ‘as pessoas estivessem colocando em xeque o nosso trabalho. Eagente optou por manter o trabalho centrado no texto, mas, tum texto que ao mesmo tempo favorecesse, desse uum pouco mais de seguranca, para garantir a base alfabetica A gente produziu muito essas listas para dar até questio de Seguranca para a gente, ne. Aquela coisa assim, eles estto escrevendo. Ai, quando vocé bota eles para escreverem, ontem ‘me deu uma inseguranca, me senti pequenininha, Desde que eu entrei aqui na escola, a preocupacio que era cessencial era com a escrita da criance. Desde ento a preocu- aco das orientadoras era buscar aeserita da crianga, Nilo $¢ Preocupande com a ortografia, se preocupando entrel aqui Nao @ de hoje que com a critividade, com a cnanca botar para fora o que ela sente, 0 sentimento,.. a escrita mesmo, eriat, escrever mesmo, E esse ano nao aconteceu isso. Construiram 0 processo de ensino-aprendizagem da leitura e eserita tendo como rel 1a principal as hupéteses desenvol- vidas por Ferreiro ¢ Teberosky (1987), hrerarquicamente estrt= tutadas, que devem ser sucessivamente superadas, Estas hipdteses, na pritica condiana, passaram a con! igurar uma referéncia para a classificagio das criancas. A psicogénese da lingua escrita se comou mais um padio para classificar as criancas do que um nstrumento de compreensio da processo de construcio de co- mhecimentos sobre a lingua escrita;ngo permitia que explorassem, 59 (© que sabe quem errat sufictentemente as pistas erradas (GOODMAN, 1992), ou sepa, {que percebessem as negociagdes e conhecimentos implicitos nos cer10s dos alunos e alunas, chegando a compreender o comprecirder das crrangas, ‘Como eu poderia dizer. ea nao alfabetica ainda, eae muito insegura para escrever, claro, ela nao vive situacdes de escrita, ‘Como @ que ela vai escrever? Em casa eu nio sei que tipo de ajuda recebe. E uma cnanca que tem dificuldade de trabalhar sozinha, mas Ja comhece todas as letras ele escreve algumas vezes sllabica- ‘mente com letra cursiva, ndo esta alfabetico. |} ‘Outra crianca que também ainda nao esta alfabetica é 0 Lucas, mas ele tem demonstrado ser silabico, quando ele organiza como se fosse palavras ele faz a separaglo, ele tem se preo- cupadlo muito com as iniciais das palavras. Fle saiu do préfescolan sliabico. EntBo, quando ele chegou na Luiza, a Luiza acreditou, Se fosse uma outra professora de repente tera dito 0 seguinte “Ele nao esta sabendo nada, nao esta escrevendo nada" ‘A teorta castnutivista fou assurmda como um novo parimetto para classificar os estudantes, mantendo a perspectiva classifica torta da avalingio, Nao podemos desconsiderar, no entanto, que metro produiziu modificagdes no cenirto da sala de aula, contribumndo para Ihe dar um novo desenho ¢ movimen- to.A escrita incorreta deisava de ser um erro, ov um resultado por alguma das hipéteses, que Ihe conferma uma inrerpretacio posttiva na medida em que anunciava 0 processo mnfantil em diregao ao acerto (FERREIRO; TEBEROSKY, 1987). este novo pari negative, quando podia ser explicad Apesar da aparente acexta¢io das respostas erradas, 0 erro continusvs mantenda um matiz negatien, embara fossem reln- tivizadas, as demareacdes buscam isolar erro e acerto. A proclucio infantil no era avaliada desde a multplicidade que a car: rveava, sua realidade multifacéttea era reduzida aos limites das 60 A tormag3o docente dimensbes apresentadas pelo parimetro defimdo pela teoria que se estava utilizando, A possibilidade de interpretar os erros como parte do processo nfo evitava que os conhecimentos dos alunos e alunas fossem hierarquizados ¢ recebessem valores distintos, Sob esta perspectiva, o trabalho das eriangas continua sendo avaliado a partir da referéncta das professoras. A qualidade da produgio infantil € vinculada 4 sua capacidade de atender aos aspectos valorizados pelo aduito que 4 avalia (NEWMAN et al., 1991) Professoras diférentes, com opcdes tedricas distintas e com mods particulares de conduzira pritica, avaliam de modo dife~ rente o resultado dos alunos e alunas. O que algumas entendem como positive, como uma evolucio, como parte produtiva de tum proceso, outras interpretam como excesso de err0s, como ausénea de conhecimentos, como problema da erianca, como resultado de um proceso de ensmo-aprendizagem maldesen- volvido. A necessdade de classificar as ertangas segundo o padrio condiciona 0 desenvolvimento do processo de ensino-apren~ dizagem. Segundo afirmacao de uma professora, elas foram construindo atwwidades que Ihes proporcionassem condicées para “avaliar” os(as) alunos(as) em relacio as “hipéteses”. Da- vam prioridade is atividades que permitiam cantralaro processo infantil descte os limites postos pela teoria que gutava sua aco. Exca opcio levow a um empobrecimento da pritica peda ogi: condi¢des necessirtas para una “avalingo continu marcada pela necessidade de controle do process. as atividades mars eviativas e dinimicas no geravam as .forremente Eu tenho observado isso. Eu estou sendo sincera mesmo. Por: Que as vezes eu... Tem assim, eu elaboro uma folha de registro escrito em que eu coloce... Eu tenho vontade de botar omenino para escrever uma lista, ele escrever sozinho esta lista. € nem sempre eu coloco esse menino para escrever. Eu tenho optado por gitar aquela lista, claro, uma lista que tem uma unidade. Por 6 (© que sabe quem errat exemplo, uma lista sobre animais, ou uma lista sobre esportes, as olimpladas, mas eu fico me batendo nessa coisa da evolucao dda escrita mesmo, da conquista alfabevca |.) Eu nio estou preocupada com a correcao em si. Eu estou pre ocupada em que momento o menino esta, essa evolucio da escrita, esses estagios para ver 0 quie pode ser feito all. ‘As professoras ficaram paralisadas pela opco teérica que fizeram'. A necessidace de comparar a dinérmca mfantil a-um determinado modelo, considerado umversal, restringia suas possibilidades de acio. Algumas atvidades dersaram de ser pro- postas por nfo permitirem encasar 0 processo das criangas 20 padrio que usavam, ou talvez por mosttarem outeas realidades que podiam questionar sua teoria, A qualidade do contetido tornado relidade ¢ 0 resutada ca aneragio adaptauva entte a qualidade culeurl e pedagégica do profssorado,a dos textos e demais materia curncalaes, ©-contexto escolar insaitucional, com sas formas ritualizadss de onganizagio espacial e temporal das atvidades, a8 posbr- liaades das eres aeadémuesse 0s processes osmoncos com o ambiente externo, que mantém os alunos coin indviuos «a escola como mnstgio. (GIMENO SACRISTAN, 1996, p43) Que papel a teorma jogou neste processo? O episédio que estamos analisindo nos indica que a introdugo do conhecimento cientifico na orgamizago da pricica pedagégica pode atuar tanto de modo a fortalecer o processo de mudanca como para fr E verdade que.a teoria ajudou as professoras a muidar suas pracicas ea nterpreti-las desde uma perspectiva mais ampla. Porém, nio io vanes realize um anise do marco teanico escolhido pelts professors, Dos © gite nos meses neste pont co trabalho e discuss © maviment en ndido por eli mo vant de srticular oor « privica conta Finaldade de redefimr a atuugio docente. Enmetanto,screditamos ser ymportnte asi gee © constronyism esta mawado peas Mls de que 0 proceso de enano- aprendizagem ¢essenculmentepscoligico,solando as questées scm palticas © cultura envolvidas nos endmenos educanvos. (DAVID; SUMARA, 1997; VARELA.s.d: POPKEWITZ, 1994: SILVA, 1993), a A tormagao docente deixa de ser relevante o fato de que este mesmo conhecimento fez com que elas estancassem 0 movimento de mudanga no ponto que a tcoria utilizada definia como final. As professoras atuiavam como se uma parte do processo (a parte enfocada pela teoria) fosse © processo em sta toralidade;recolhiam da realidade ‘© que servia a"“sua” teoria, colocando 4 margem todo 0 demats Este movimento nio thes permitia observar que era necessirio ar além dos limites em que se moviam; que o ponto aleangado deveria significar um novo ponto de partida tedrico e pritico. A certeza de que posstiam o conhecimento, e nio nm conhecimento, sobre 0 processo de aprendizagem da esceita transformou a mesma teoria que havia sido ail pars que elas ampliassem seus conhecimentos num elemento que impedia a continudade deste processo. Estavam presas 4 concepeio de que © conheemmento cientifico vercula a verdade, o que nio estimula ‘4 mudanca,a continuar avangando em direcio a novos horizontes, a desenvolver novas possibilidades ¢ a superar 0 conhecimento 4 consolidado. © que a gente quer na verdade, !é no fundo, e que 0 menina fesereva, E que ele escreva de forma que ele passa comunicar 0 escrito dele. £ at quando eu pago de fato uma esenita da crianga, eu olho essa coisa da coerénecia, eu olho para ver se 0 menino consegue resgatar mesmo o que ele conseguiu apreender. Se ele consegue resgatar na hora que escreve, ainda que ele ‘escreva utlizando as diversas hipoteses que ele pode, que ele tem. Mas, sendo sincera, o que hoje eu olho @ a parte da. como é que esta a evolucao da escrita da cnanga. |} Eu percebo, por ter feito esse ano muita pouco, e é uma coisa que 2 gente ver discutindo, a construgdo da historia; a nossa bratica e a gente botar 0 meno para escrever historia, nd ddar prioridade so reescrtura, que a gente resolveu priorizar a seescritura.Justamente para ver se forca um pouco o menino & se apropriar o mais rapido passival da bare alfabstes, ne, por Achar que é o caminho mais facil, que a gente vai produzar um ouco mals. |.J Parece que a gente mudou um pouco © exe do trabalho. £ uma coisa que esta nos angustiando, 63 © que sabe quem evrat Simultaneamente, reconheciam © risco de que a pritica tenia uma aparéneia de novidade, mas que na realidade sustente teorias € objetivos que desejam negar. Reconheciam também a necessidade de estar permanentemente refletindo sobre a pritica para garantir que as novas praticas desenvolvidas possam ser\ efetwvamente aos novos objetivos. Eram capazes de fazer refe- réncia a esta necessidade mesmo quando haviam abandonado a pritica de reffexdo na acto. Nao ¢ soa questio de estar olhando aquele conteudo especif 0, da voe@ ver se a crianga da conta cas letrinhas, da letrinha cofreta, tém outras coisas nesse meio. ‘Agora, as vezes por nao estar refletindo, a gente perde contet: dos da alfabeuzacto, que para mim s8o fundamentais, agente perde. Porque se nao ficaratento, se perce mesmo e se volta, finda que com uma roupagem de construtivismo, com uma Toupagem de progressista, a gente ca numa coisa tradicional fe que trata a questi da alfabetizacio... No minimo esquece ‘essa formacio do leitor e escritor que pode ser feita agora. Dispunham de uma teorta que podia ayndi-lasa compreender uma parte do processo de construcio de conhecimentos sobre a escnita, mas nfo todo processo, porque a aprendizagem da eserita as palavras no garantea aprendizagem da linguagem escrita, Esta reona conduaia seus olhares ¢ delimitava sua anterpretacio, de modo que deisavam de considerar diversos outros aspectos que compdem 0 processo de construcio de conhecimentos sobre a esenits (FOUCAMBERT, 1990;GARCIA, 1992; GOODMAN, 1992; TURRA, 1997; ROGOFE 1993; VYGOTSKY, 1987) Quer dizer, 0 outro retorne aquela coisa dita da alfabetizacdo tradicional, que e a gradacao de fonemas... Nao houve retorno isso. Mas alguma coisa a gente... Eu se! que a gente perdeu. isso que a gente optou, a gente perdeu. Hoye o que esta se tomando para este ano um pouco dificil é fazer este resgate. A gente esta tentanda. A gente mudou um pouco de referencia 64 A tormacao dacente Ainda que estivessem de certo modo mobilizadas pela teoria que manejavam, sua historia tina as marcas do trabalho coletivo, da constante interrogacio da pritica desenvolvida © da busca de articulagio entre teorma e pritica. Esta historia indicava a possibilidade de criticat sua propria atuagio, de identificat os momentos em ue a dindmica for favoravel, ce buscar os nds que ampediam 0s avangos € de tracar novos objetivos, 0 que implica em nova busca te6rico-metodolégica ‘Ai, quando isso acontece na minha turma, ¢ aconteceu agui, fol ‘que eu comecet a acordar de novo, E como se vocé estivesse ormente, eu me senti assim, dormente, ate um determinado ‘momento. De repente, dew aquela lembranca, € como se how. vvesse um esquecimento. Ai, eu penser: "sabe o que esta faltando também? Devear constr no coletvo, nvestirne texto coletivo" Vocés lembram do pre lescolarP A gente levava para o centro de estucos e como € que isso instigava. Quando viaa producto da crianga... Porque eu nao conheco professor nenhum que nde avance, Nao existe 1850 Lembra como a gente fazia? Um fazia,trazia 0 trabalho da crian- ‘8, alaoutra, que ndo tinha tido coragem, imitava;“entao, deu Certo com vocd? Eu vou fazer tambem. Agente trocava mul, Recorreram a seu repertonio de conhecrmentos articulados a parair de sua pritica. A reflexio coletva assinalava as necessidades de mudanca, mas cambém ressaltava seus acertos, atuars e ante- ores, Avaliando seu movimento, encontravam a reflexio sobre 4 pritica, que propde também uma teflexo sobre a teoma. Neste proceso, sentiam-se capazes de reconstruir sua atuagio pedagogica Efrute de umaexperiéncia que agarotada esta, que as ciangas esti construindo fora da... mas e produto de que esta sendo feito aqui também, Porque 0 menino foi eserevendo e fol se sentindo seguro, ele hoje, ele se solta tambem. Quer dizer, nas perdemos, e acho que perdemos algumas coisas, mas nao pperdemos tudo. Eu acho que a gente pode estar mesciando Co 525, Eu acho que o nosso erro foi estar centrando uma coisa $6, Quando comecou a discussio sobre a avaliacao, nos fomos, eu acho, forcadas a estar revendo isso. Eu me sent forgada, foi 0 ‘ganho deste ano. Porque senao, a gente la cometer 0 erro, se 65 © que sabe quem erat no tivesse tudo essa oportunidade, de ficar naquele trabalho de reescritura sim e trabalho de listagem sim. |..] (O.que fica realmente @ essa questio de estar levantando a discus so ¢ estar nos forgando a buscar espacos depois, mesmo fora aqui, fora de horario dotrabalho, a estar discutindo, eu ia muito ‘com a Solange ne Snibus e a gente conversava a respeito, |.) ssa possibilidade de ter nos feo repensar e ter nos feito Fetornar. Como se fosse assim, tentando... mexendo para tequilibrar de novo, J. sso e um alerta Ja para o ano que vem fe tambem como a gente vive um momento de construcao, fs vezes a gente nfo sabe mesmo como segurar determinadas fondas que vm ai, como fo! esse ano. {Eu acho que a gente ficou muito preocupada de ter um resu tado imediato. O que faltou foi estudar. ..] Entzo, foi a partr dos poucos encontros que nds tlvemos que a gente passou a ter um tempinho para conversar. Se aquele momento néo era Xo rico, a gente corria na hora do intervalo e vinha conversa. ‘A manutencio de uma pritica favorivel a0 diflogo é es sencial para a construgio de unta escola de qualidade. teoria & potente quando contribu: para conhecer melhor a realidade e, partindo deste novo conhecimento, para manter uma atitude de indagacio, Nenhuma teoria ssoladamente € capaz de atender a todas as questdes presentes na diniimica do processo de ensino- -aprendizagem.Tampouco, toda teora serve a qualquer objesvo. ‘© movimento de interacio entre teoria ¢ pritica com 9 sentido de que ambas se indaguem e se reconstruam encontra muitas dificuldades para tornar-se parte da realidade escolar. A escola quase nunca abre possibilidade de especulacio, como nos mostra, por exemplo, a avaliagio dos(as) alunos(as) ¢ os obstaculos Gin- ternos e externos) que as professoras en mudangas em suas atividades cotidianas. ‘oneram para promover Apesar de tudo. © novo se constréi. As rigidas estrucuras existentes no conseguem apagai hhegemonia/contss- hegemomia ¢, como nos dizi uma professora, em alguns mo- mentos despertamos de uma donnticia © nos recordamos do trabalho coletivo ¢ das miiluplas alcernativas ainda no explotadas 66 A tormagao docente Interpretando 0 texto ‘As mudaneas que se fazem necessirias na formacio ¢ agio docente ¢ as possbilidades de transformacio em sua configaracio no serio gestadas exclusivamente no mterior das instirmcdes educativas ou no Ambito das prittcas pedagogicas. O movimento de mudanga ou de manutencio & um processo social que, nio sendo especifico da escola, deta seus rastros nas atvidades es- colares, também sendo por ela r rarcado. © movimento de transformagio social demanda uma redefimeio paradigminca no processo de produgio do saber. Rompendo coma iceia bisica de homogeneidade epistemolégica entre ciéncias sociais e ciéncias natura, as prametrss j6 conse- guiram afirmar sua cientificidade e formular teorias ¢ métodos mais adequados a stias caracteristicas peculiares. Enmretanto, este processo de ruptura precisa ser radicalizado para que.a partir da especificidade das ciéneias socials, chegue-se a superar a simples adapracio/aplicagso de um modelo construido nas cignetas naturats, € se possa atuar sobre os pontos fragers da constituigio das proprias ciéncias sociass. As cigncias humanas sio estrunuralmence colonialistas ¢ euro centnstas, iniciando o seu discarso pele slencamento ~ ou 1 folelonzagio ~ dos siberes indigenas, negros ou popu Colomadoras, esis cignens soffem também, na area cxentfic, uma colomzagio pelos modelos de cientficidade ortundos das cidnens da natureza, (GAUTHIER, 1996, p. 339). ‘As mudaneas que se revelam necessirias implicam um questionamento profando sobre as finalidades da ciéncia, Ou sea, escolher entre tratar a cigners “como sistema de producio de conhecimentos ou como sistema de producio de ignorineia” (SANTOS, 1993. p. 159). Tal questionamento se mostra indispensivel pela insuficién- |guns problemas fica, A distincia entre as possibi- c1a do paradigma hegemdmco pars soluciona substanciais § produgio cient “7 © que sabe quem ercat lidades paradigmaticas e as necessidacies reais instaura pequenas exises no intertor do paradigma. Como respostas amediatas enises sio propostas reformmulagdes parciais que,nio conseguindo solucionar a problematica geral, terminam por ocasionar crises novas mats profundas que assinalam um processo global de redefinigfo da ciéneia, estas ‘A acumulagio das pequenas crises ~ de crescimento ou de degenerescéncia ~ produzidas no mentor do paradigma ¢ mani festadas em diversas esferas cl producto e aplicagio dos conhea ‘mentos cientificos, consaui uma cnse de cariter mas global, a ense epistemolégica (KUHN, 1975). A crise epistemologica indica a existénei de um periodo de msuficiénea ¢ de transic¢io em relagio a0 paradigma domanante de ciéncia, que parece carac- erizar 0 momento vivido atualmente (SANTOS, 1993; 1995) Hi um movimento no sentido de produzir uma nova con- cepeio de produgio, articula¢io e uso do conhecumento, Uma concepefo essenciaimente dialgica que ultrapasse as cereas que ‘marcam as fronteiras como lagates de sepatagio, para converté-las em espagos-tempos de convivéners em que os miiluplos saberes possam ser revelados, confrontados, interrogacdos ¢ reconstruidos. © que nio é necessariamente harménico € ssento de tensbes Impée-se uma nova racionalidade composta por diversas di- mensdes além da razio, cujo desenvolvimento e consolidacio demandam o reconhecimento de que a realidade social & opaca e que a rizio nio tem a capacicinde de tornicla transparente, ainda que possa nos ajudar a compreender alguns dos epis6dios que a configuram (GAUTHIER, 1996). Uma questio a ser colocada em debate € em que medida ‘os caheres que os docentes martejam rompem efetvamente com o paradigma hegeménico e acrescentam conhecimentos que contribuam com a c que nos referiamos, Outros aspectos igualmente significativos so: perceber como os(as) professores(as) estabelecem as rela nstrucio do didlogo e da polifonia a 0 A tormacio docante ees entre os diversos saberes, que upo de hierarquia produt- zem (ou nao), se criam em suas aulas um ambiente favorivel ao didlogo. Hé que lembrar também que a transformacio da pritica profissional muitas vezes impli em transformagdes no proprio suyeito. _ Estes pesos profstoal &temanzads por aguas professoras: Eu estou aprendendo. Eu estou aprendendo. Se fosse em autre anos, eu ia dizer "Néo, prontotacsbou tla sabe, ev estou melhorand, |.) Na mesma h fa mesma hora eu pense ‘Que ersfo" vamos parar com 10. Ve ¢ una professor ahh 6a taza, oa 9 qe eh ado ho pode ai eu penser: “vou ouvir.” € fil ra carmba.Es4 cosa de dzer no de nce estou aprenden, Apolo ese ane tom sscrangse © ls mudangas) sio de dentro... pessoais,€ isso ai ‘As pessoas que esto junto com a gente mudaram.. [oJ mudou! £ mudou em diversos sentidos, ...J” . o No undo ¢ ss0 mesmo, agente mudou o trabalho, como pessoa tamer, sens oouowabalte,masmudeu E amprescindivel encontrar metos para conectar a producto te6rica ea pritica pedagogies. além le fizer emergye a phuralidade de conhecimentos ¢ relacdes presentes no cotidiano da sala de aula, © conhecimento cientifico é importante, mas nio suficiente, hha que utilizi-lo esr além de seus limes, proponde mterro- wacdes dle caricer ético e social. Nesta ruptura com @ modelo hegemsnico o confronto entre as crengas, os conhecimentos, os resultados buscados eos resultados alcangados ¢ amportante para a formulacio de questdes que alimentam o processo de construcio 6 © que sabe quem erat de novos conhecimentos € de uma nova pritica pedagogica. Po- lemuzar a realidacle pode ser um meto para questionar as pees fertas e revelar os limites do saber especializado, cemarcado por uma perspectva de ausilio técnico, servindo mars a uma pritica compensatoria do que a um movimento libertador (GIMENO: SACRISTAN, 1996). A inadequacao do texto ao contexto Os exemplos recolhidos no espago escolar sio partes da auséncia de sintoma entre 0 desenvolvimento crentifico e a di nimica social. So as consequéneias sociais da producio cient qne marcam essencialmente a crise do paradigma hegeménico, cornando-se um problema epistemolégico prioritirio. © apro- findamento da fissura entre o desenvolvimento técmico-cientifi- co ea possibilidade de configurar solugdes concretas is demandas reais da populagio faz emergira necessidade de construgio social ‘de um novo paradigma capaz de dar respostas efetivas as questes apresentadas sociale historicamente apresentadas. © conceito de dupla mipmint epistemoldgica, elaborado por Santos (1993; 1995) a partir do trabalho de Bachelard (apd SANTOS, 1993), € relevante para a discussio do sentido da redefinigio do paradigma dominante de ciéneia e para a incor poracio da produgio teérica pela pritica escolar. Q concerto de mptura epistemoligica (BACHELARD apud SANTOS, 1993) concebe a construgio cientifica como um processo de nega- Gio do senso comum e de superagio da experiéneia imediata. Encende a ciéncia e 0 senso comum como formas dicotémicas de conhecimento da realidade, poss a primena & vista como co- inhecimenra micinnal ¢ vélide ¢ 0 segunda como conhecmento falso e deturpado. A ruptura epistemolégica & parte do paradigmia que, guiado pelos principios da racionalidade mstrumental, supde © conheermento cientifico como o tinico vilido e identifica rigor s rela cientifico com rigor maremiinco. Assi es mterpessonis sio 70 A tormagao docente analisadas como relacdes sujeito-objeto, dentro de um processo que nfo valoriza os elementos no observivers imediatamente, dificilmente passivers de quantificacio. Considerando 0 potencial do conceito de ruptura episte- moldgica, Santos (1993) afirma a necessidade de aprofundar 0 processo de ruptura criando um segundo movimento onde se rearticulam ciéneia e senso comum, configurando a dupla mip- ‘wus epistemolgica, Este ato complementar viria consolidar uma perspectiva de mudanca paradigmatica, através da qual se pode enlacar, sob novo enfoque, cigneia ¢ senso comum, levando 0 conhecimento cientifico a se transformar num senso conuun re- novado. Este processo traz consigo a necessidade de interrogar 0 significado tanto de ciéncia quanto de senso comum. Sem diivida,o senso comum tem uma forte marca de aco- modagii mas é indiscutivel que também guarda wma importante dimensfo de resistencia, Mesmo que 0 senso comum esteja cheio de preconceitos, estes ndo podem ser simplesmente negados, ji gue sio parte da constituicao da subyetividade e da historieidade (MESZAROS, 1996;TAMARIT, 1996), Com o objetivo de reconstruir a relagio entre ciéneia © senso comum, Santos (1993) prope uma releituta do significado de senso comum que possa dar énfase a seus aspectos positwos (© senso commun fiz comer causa ¢ meno; subyaa-Ihe wma visio de mundo asente ma aegio © no principio da enatvidade hs responsabilcadtes individuass. © senso comum & priico & ragmatico;reprochtz-se colo is myecroms e is experiéncis de vida de um dado grupo soet © nesa_corespondéneta se wnte. © senso comum & eransparente bopaerdite dos abjetos ewenalégicos € do esotensmo do conhecimiento em nome do principio a rgualdade do acesso 30 discus, & compettnen cogmava ¢ 4 ccompeténena linguistica, O senso comum & superficial porque fe exadente; descontia n (© que sabe quem errat esdenha cas extruturs que esto para aléen da eonseiénem mas, por so mesmo, 2 eximo em captar a profirndidsde horzontal cs relies conscientes entre pessons# entre pessoas e CoH. O senso comum ¢ andseiplinae ums pritica especificamente onentada para o produaat:reprodz=se expontaneamente no suceder quondiano da vida. Por gilamo, fo senso comm & retina e metafEnco, nio ensina, persuade (GANTOS, 1993, p44) imesédico; no resulta Esa visio retoma a primeira ruptura epistemologica aprofundé-la numa segunda ruprura, através da qual 0 senso comum se modifica tendo como suporte a ciénena, que também se altera neste processo, Pretende alcangar uma praxis em que © conhecimento cientifico, a técnica e a realidade social sirvam como instruments da mteracio humana ¢ de reflexio a respeito clas consequéneas globas da acio empreendida.A busca da verdiade cientifica carece de sentido se nio esta delimitada pela reflesio sobre a verdade social do conhecimento crentifico. A reflesio estabelece um diélogo permanente entre producio cientitica & contexto social, sendo a ciéncia entendicls como pritica social de conhecimento. Particrpam deste didlogo as diversas formas de conhecimen- to existentes, configurando um mosatco com miiltiplas cores formas resultantes da contribuicio dos varios sujestos ¢ con- textos mplicados no processo de produgio de conhecimento.A, emergéncia de novos atores sociais que aportam novas dimensdes © percepedes da realidade € a aceitacio da multiplicidade © da complexicade do conhecimento (MORIN, 1999; 1995) acuam sobretuco no sentido de redimenstonar © conceito de prints ca tem © segundo movimento de ruptura epistemolog come abjenve emifir que 8 ei@neia se aproxime da vic diana, superando a distincia que a caracteriza e instaurando for mas de comunicagio com a sociedade que explorem e excedain a maluplicidade de linguagens € de formas de conhecimento consnituaivas do cotidiano. Desta perspectiva, a ciénen & 0 n A tormagio dacente senso comum compartilham © movimento de compreensio & de transformagio do mundo, como parte de um proceso que substitu relacBes mecdmecas por relagdes dialogicas. A comumicagio entre o conhecimenta cientifico eas mil tiplas formas de saber se desenvolve como parte da concepgio de que todo saber é em st uma pritica social desenvolvida para dar sentido @ algumas praticas sociais ¢ para contribuit com a modificacio de diversas outras.A pluralidade de priticas sociais & caracteristica de uma sociedade complexa como a atual,composta por um entramado de priticas que origina conhecimentos adequados a elas. Neste sentido, a critica a um determinado modelo de conhecimento ¢ uma forma de critica & pritica soctal nna qual ele se constréi, A nova relagio busca a construedo de am conhecimento 20 mesmo tempo pritico, profiindo, s6lido e prudente, que seja democraticamente repartido, Para alcancar este objetivo hi que desenvolver esttuttiras sélidas de controle social da produgio ¢ socializacio do saber que estimulem a transformacio da ciéncia num senso comum renovado. Aadeia de conhecimento verdadeiro e mutivel cede ugat a0 processo de conhecer, movimento permanente em que a producio do conhecimento ¢ o saber resultante sio interroga- dos, tendo como base a diniimica social em que se conjugam subjetvidade, objetividade, individualidade e coletivo. Prevale- cea compreensio do processo de conhecer como pritica socal Novos marcos te6rico-praticos do processo de ensino-aprendizagem A ongunizicio da realieade escolar cotdiana numa pers pectiva transformadora adqanre o sencido de articular a escola- rizacio ea formacio docente a0 movimento de construcio de tuma sociedade maus justa e demoe aca, marcada pela pratica 2 © que sabe quem errs? dialogica. A pratica pedagogica e 0 processo de formacio sio arnagées que transcendem a simples aplicacio de métodos, instrumentos ¢ técmicas derivados de uma producio centifica desenvolvida em Amibitos, te6ricos e priticos, distanciados da realidade escolar (GIMENO SACRISTAN, 1996). O contex- to escolar é ternitorio de producio ¢ de utilizacio do saber, de modo que a teoria ¢ a pratica sio mutuamente tmpregnadas uma da out A teansformagio demanda novos caminhos, que podem ser articulados por uma acto que explore as ambiguidades do real, pondo em alerta © pensamento com o sentido de provocar modificagdes ¢, pela negacio ou interrogagio dos conbecimentos anteriores, gere conhecimentos mais complexos.A filosofia dialé- ‘tea do por que nit, apresentada por Bachelard (1970), como uma teoria caracteristica do novo espinito ctentifico que inaugurava 2 possibilidade de constr uma teorta sélida que desafiava a realidade comum, sinaliza questdes favoraveis ao movimento que tentamos estabelecer. Sé bi um mero de fazer avangar a cignen, ¢ & contradi ji consntuids. que é como dizer mudando sta (BACHELARD. 1970, p. 30) do a cigne As professoras com quem trabalhamos parecem ter a mntt- Jo de que & preciso perguntar 4 teorna e 4 prittea: por que no? Nio aceitando o instituido abrem camunko para a construcio de novas possibilidades ¢ de novas questdes. Encontramos com frequéneiaa pergunta por que mifv? oculta em suas ages, civics, certezas e indagacdes: Por que no fazer diferente? aor que nia mudar as regras? ‘Apevar ds usuiciincta ds Fornnilacio da rus epstemolégica para promover ss wansformagSes necesarns path a constrigio de nova a“ prinea,entendemos que o tabalho de Bachelaré proporciona conribungdes signifistvas part» coneinutdase do movment, 74 A tormagse docente Por que ne obtenho bons resultados com munhas tentatwas? Por que no aprendem estas eriangas? Por que nie chego a fazer tudo © que me proponho? Enfim, por que ndo buscar novos camunhos, partir de outros, prinefpios, imagmar construir outros resultados, Encontramos esta inquietacio,em maior ou menor medida, em todas as professoras. Mas uma,a que trabalhava com uma clas csperial, parecia ter mais clareza da urgéncia deste desafio; alvez porque a fimica manesra de enfrentar sua realidade seja olhando: seu avesso, Nio estamos afirmando que ela tenha construido: uma nova teorta, porém, stia acio-reflexio desafin a realidade encontrada, a formagio profissional recebida e 0 que lhe diz 0 senso comum. Tudo afirmava a ampossibilidade de seus alunos € alunss. Diante daquela realidade © que fez for perguntar-se: or que nia? Por que uiio serio estas criancas capazes de aprender coisas? Por que uio podem estar em contato com corsas betas? Por que no podem superas-se e superar as expectativas que os outros tém delas? Por que nio podem ser diferentes dos demas sem que a diferenca seja inferioridade © infelicidadte’ Interrogando-se sobre as possibilidades de seus alunos alunas, sobre 0 contexto em que atua, sobre seus proprios co- nhecimentos profissionais também devia indagar-se sobre suas proprias dificuldades/possibilidades e questiona porque ni seria capaz de desenvolver um crabalho diferente e de permitit-se ser quem “se aventura pensando e que pensa aventurando-se, [.-] encontra una muncio além do pensamento formado (BACHELARD, 1970, p. 35) A seguinte fala nos di prstas de seu modo de olhar para seus alunos e alunas que confirmam nossa rdeta 7 (© que sabe quem errat? {As vwvancias do aluno geralmente sao usadas para justificar 0 Fracasso, Sera que essas cotsas interferem tanto assim? Essa vivencia dele? A crianca aprende menos? € claro que ela nao ppode ser feliz, uma crianga assim nao pode ser feliz. u pode ser, no sai... Como 0 disco do Caetano... Ou pode ser outra coisa... OU NAO. |v] Entao par que © que tem tude para ser infeliz no pode ser feliz? (© ser humano @ um bicho muito pretensioso. Da valor a tudo, molda tudo, bota tudo em forma... Nos somos terivrs Interrogando-se, implementou um trabalho considerado impossivel para uma turma como a sua, usando novos cami hos, encontrou meios (métodos?) para ultrapassar com seus alunos ¢ alunas alguns limites estabelecidos ¢ construit novas possibilidades, para as criancas e para ela propria. Nio s6 porque alguns de seus alunos, com graves comprometmentos, chegaram uma turma regular, mas, sobretudo por ela ter propiciado con- digdes para que todas as ériancas fossem incluidas no proceso de construcio de conhecimentos, em seu sentido amplo, ¢ por ter conseguido perceber a aprendizagem ¢ o desenvolvimento das crmancas pelo que mostravam, sem preocupacio de compari-las a padrdes preestabelecidos. ‘Tomamos a formulacio de Bachelatd (1970) como mecito- 18, pols filamios desce um Ambxco diferente do seu, No entanto acteditamos que se a atuagio teérico-pritica a que nos referimos nio gera conhecimentos novos no plano da eiénesa, de uma maneita geral ela contribut com sua pritica € com sua refleio & consolidagio de novas relagSes tearicas e praticas. Pe em primeno plano questdes que estio pouco presentes na pesquisa ‘educacional ¢ de certo modo marginalizadas, ‘Tem uma coisa muro legal. ela lalunal antes faziaesse movimento Jamassar 0 papell e ela agora ja esta abrindo o livro ese fixando fem alguma gravura, uma cor. e esta quase mudanda de pagina Masa cllentela que eu trabalho é diferent: "Eun sou assim, eu nl ‘me enquadro, eunio estou dentrodesses moldes.l, merespeita.” 1 A tormagae docente Entdo, eu estou tendo mesmo que mudar, de acordo... mediante '& pressio, vamos dizer assim, entre aspas, que eles. fazem a0 ‘trabalho da gente. £2 gente... Como que eu aval. nao tem essa coisa formal, como eu ja coloquel, mas um texto que ele produz, um comentario que ele faz, umn ndo que ele diz para mim... Entdo, eu acho que a gente avalla por essas corsas da. Tem que ouvir mais o aluno, a gente tem que ir a casa da crianga, conhecer a familia, saber por que... fazer uma outia leitura da crianga, Eu acho que as vezes... Eu acho que as vezes no, eu acho fue e quase sempre, a genta e musto pretensiosa, A gente vat ‘com tude pronto. Ai ver © aluno e diz:"Oh, mio ta fim, no ‘quero fazer..." Joga isso ai no lixe da sua pretensio, ndo quero, Vocé tem mais e que ir pra casa e quebrar a cara, onde que eu ‘estou errando? A mudanga parte muito dai: do ndo da crianca Observamos em sua agio e reffesio a compreensio da realidacle como em evolucio € mulndetermunada, espaco de questiona- ‘mentos ¢ aprendizagens constantes, Tal modo de aproximacio da realidade, que analisa as experiéncias vividas sob miiluplos enfo- dues, leva a pluralizacio do conhecimento, amplia a sensibilidade is diversas varidvers envolvidas no processo e favorece a produc’ perspectivas do conhecimento desde no Todas as experiénenss vividas oferecems elementos signifi- cativos a0 pensamento ¢ devem ser aproveitadas para explorar a variedade possivel de pensamentos, mportante exercicio para consolidar teorias e priticas que superem a crenca, todavia do- ‘minante, na existéncia de uma razio absoluta e amutivel. O nao estimuila a teflesto sobre a pritica, nncorporando outras dimen- ses além da técnica, indaga os limites das explicagdes formuladas © das acdes desenvolvidas, procura os trajetos no percorridos © intertoga os significados visiveis para encontrar significados ainda nao constderados. A refiexio tem o sentido de busca de alternativas, fundamental para a consolidacio de um processo de ensino-aprendizagem de nova qualidade, e mp6e novos hori zontes pata a for ” (© que sabe quem errat 2 possibilidade da agio positiva no sentido da demecratizagio das priticas escolares € soci, © proceso reflexivo nos conecta 4 concepeio de Schén (1992) de reflex amportante para questionara formacio docente como tarefa fundamentalmente técmca e para claborar novas perspectivas. Ao desenvolver stia proposta, Schén trabalha com dots conceitos basicos: prtieatonica.a qual critica, a praia reflexiva, que apresenta como indicio de novas perspectivas A ideia da teflexio na acio cem como referéncia signifi- cativa a compreensio de que é tarefi do profissional organizar as situacdes problemancas para delimitar os objetivos a aungir ¢ determinar os meios atraves dos quats se pode chegar a cles Como a pritieatknica,articulada pelo pensamento hegeménico, nio pode responder a estas exigéncias, Schén propde a prétca refiexiva como alternacia. A pritiaa relexina valoriza © processo de reflexio sobre © conhecimento na ago, Esta atitude reflesiva ¢ importante por que na pritica as pessoas utilizam ronnas construidas a parur do conhecimento coudiano, sendo uma parte deste conhecimento técita, implicita, desarticulada, envolvendo também os pressu- postos, valores e crencas sociais € individuais.A reflexio sobre 0 conhecimento na acio conduz 0 sujeito 4 indaga¢io sobre sua 10, anda condigdes favorivers 4 transformacio da situacdo, atu: ilumanando aspectos nfo observacos € possibilicande a percep- Gio dos fatos desde novas perspectivas em que Se considerem os dilemas ¢ oposicdes presentes na pritica rea ‘Ainda que nio privilegie o estabelecimento de um movie ‘mento que relaciona a atuacio na sala de auila a0 entorno escolar ed realidade social globalmente consiriersda, 0 conceito doa) professor(a) como proisona zjfexiny (SCHON, 1992) contribu com a democratizacio do processo de ensino-aprendizagem 3 medida que 0 exercicio da reflex s interagdes na aula pode ser um importante passo em direcio i 1 sobre os cemas especificos das 7” ‘ A tormagio docente reflexdo global sobre as condicdes de escolarizagio e de vida. Na perspectiva de transformacio, ofa) professor(a) como profissional reflesivo pode conectar-se a um processo mais amplo e coletivo que vise 20 processo de reconstru¢io social. A pritica reflexava em st nio é a solucio para os problemas escolares; nfo é condigio suficiente para a mudanga das circuns- téncias em que a dindnmica pedagogica se desenvolve. Entretanto, pode set parte constitutiva co processo de configuragio de novas priticas escolates no sentido da relacio dialégica entre teoris © pratica necessitia 4 consolidacio da dupla rupinra epistemeliica (SANTOS, 1993). © compromisso com uma pratica escolar ar- tuculada aos mnteresses cas classes populares assinala a centralidade das discusses necessiruas. O debace ¢ redimensionado quando atravessado pela pers- pectiva dle escola democritica reivindicada por Freire (1985; 1993; 1996), defendendo sew carter popular e © compromisso com o processo de real democratrzagio da sociedade, afirmando © potencial da diferenca cultural, reconhecendo a legiumidade a cultura como objeto plural e ressaltando a importincia dos conhecimentos que a compée. Ofa) professor(a) radicalmence comprometido vive oato eduicativo com tal intensidade que supera a concepgio de ensino como atividade técnica de transmussio de conteticlos. Coloca-se no processo ce ensino-aprendizagem com sua subyettvidade, busca ofa) aluno(a) como parcerro(a),tomando © didlogo ea critica como principios fiimdamentais pata que 0 conhecimento os fortaleca nnutuamente, peemitindo a constante ampliacio do conhecimento que ji possuem e de suas possibili- dacies de compreensio € de intervencio no mundo, no sentido da transformacao social Como ji silieneet antes, uma preocapagio que nio podia demar de me haver acompanhaeio |... fot a que me engaye, desde fiz mutto, na lutaa favor de uma escola democritica, De uma escola que, coninuande a ser um tempa-espago de 7 (© que sabe quem errat produgio de conhecimentos em que se enna e em que se Aprende, compreende, contud, ensinar e aprender de forma diferente, Em que ensinar ji no pode ser ese esforgo de transmissio da chamado saber acumulado, que faz um: tagio § outa, aprender nio & a pura receprio do objeto ott do conteiido transferide, Pelo contrane, girindo em tare da compreensio do mundo, dos objetos, da criago.da bomeza, di esatidio crentifica, do senso comum, ensinar e aprender ‘guram também em rorno da produgio daquels compreensio, Ho socul quanto a producio dt linguagem, que & também conhecimente. (FREIRE, 1993.p.6). io basta ampliar,ou universalizar,o acesso das crianeas das, classes populares escola. Tampouco é suficrente, no ambsto da formagio docente, oferecer mais mformagdes de cariter exclu swwamente cientifico e/ou tecnico, O questionamento tem que set mais profundo, E preciso reverter 0 processo de producio, sclecio, legitimacio e distribuicio do conhecimento coma fina lidade de vinculi-lo a perspectiva das classes suibordinadas. Esta proposca estimsla 0 debate, desenbando uma realidade chera de confitos, incertezas, polémucas, dilemas e pluralidade. Introduz necessatiamente a dimensio ética no debate sobre a cultura escolar, porque a presenca da diferenca cultural ¢ a discussie sobre 0 acesso 20s bens culturais e sobre a dinémica social no podem realizar-se num ambiente que busque a neutralidade ¢ © consenso estivel (GIMENO SACRISTAN, 1996). Os professores ¢ professoras attuam nesta realidade, sua formagio nio pode se resmngtr a oferecer mais conhecimentos demarcados por uma ética de exclusio ¢ distanciados de suas reais necessidades. Ao contrario, deve estar conectada a suas represen= tagdes, conhecimentos, singularidades e demands, com o sentido de indagilas e de amphar suas possibilidades de compreensio da rede que constitu a pritica pedagogtca. Pode o saber efimnar ou am a amoralida alent 0 autoritansmo,9 musts, A conduia dos que "sabem” menos € menes 80 A tormagio docente euca solidina, humana” que a dos que “sabem mars"? Que typo de “saber” & requeride para se promoverei sociedades mais democrinias, justas¢ solidirias? (TAMARIT, 1996, p. 134) A relacio pedagogica esti marcada pelos saberes cotidianos, de senso comum, representacio de verdades restiltantes das ex. perignctas pessoas e parte significativa de todo o conhecimento futuro de cada sterta. Os saberes cotidianos sio contextulizados ¢ colettvos, entranhados nas milluplas aces escolares cotidianas, condutores do olhar, constitumntes dla compreensio, fios que ccosturam as praticas ¢ estabelecem vineulos.A pritica vai sendo configurada no dislogo entre os diversos conheeimentos que carculam no espago escolar, Nao se pode pretender, portanto, uinia formagio docente que contraponha ciéncia e senso comum, 0 que fortalece nossa hupotese de que a dupla mptura epistenligica indica um sentido importante para repensar a producio de co- nhecimento, nciuindo o conkecimento escolar. Este debate nos ajuda a refleur sobre o movimento de cons- ‘io de uma escola efenvamente popular, capaz de patticipar da cru construcio/consolidacio de um movimento contra-hegemonico, Um movimento cujo honzonte sep od logo dentro de um cenino construido sobre a fragmentacio € diferenca culeural, trabalhando a possibilicade da cultura da escola incorporar a diferenca sem produzir um relativismo que leve 20 isolamento e go mcremento da hierarquia social € questionando os saberes existentes para definir quais sio importantes para a construgio de uma sociedade de nova qualidade, que stpere a realidade atual A escola: entre a manutengao e a transformagao A necessidade de mterrogar atentamente as experiéncias vividas para gerar prinieas que marquem a intencio de uma escola eritica esti presente no cotidiano escolar. o © que sabe quem errat Havia uma professora que sempre falava de suas dividas sobre 0 modo como estava avaliando seus slunos ¢ alunas. Mos- trava seu reconhecimento de que 2 avaliacio deveria refleur 0 processo de aprendizagem e desenvolvimento das criangas, mas revelava também seu rece1o em rela¢io 4 adequagio do processo de avaliacio que usava: {Mas para mim, para mim, ¢ uma coisa muito grande, Pra mim essa cranca tem que estar no ano que vem promonida de serie. Eu fico numa diviséo, certa do que estou fazendo, feliz com aquele progresso! Eu estou vendo que eles estio progredindo, tles estio lend, estao entendendo o que esta se passando, ¢ fico dividida se meso a cranca por 1ss0, Vejo que © valor da avaliagdo eserita ¢ muito grande para defiir sea crianca vai ser bromovida. Porque se ela esta alcancando, se ela esta subindo de producao, ela nao tem C igual aos outros... mas ai tem diferencas. A gente pensa assim. Al eu fico pensando, quando chegar 0 ano que vem, eu nao vou estar mais na escola, fico com receio de que esta cranga saja posta de lado, Mas nio le assim... Jee] Eu ser 0 que estou fazendo, mas tenho medo pela enanga Observamos neste depoimento a existéncia de dois con~ ceitos de avaliagio. Um esti presente quando a professora se tefere a0 proceso vivido pelas criancas, como tenta observar a cada alunofa) em sua propria dindrmca, suas possibilidades dificuldades, com a intencio de entender seu movimento de aprendizagem. Revela a postura investigadora da professora, que procura captar 0 movimento em sua complexidade, iden- Tificando os progressos a partir de onde estava ofa) aluno(a). 0 outro conceito diz respeito 4 avaliag aprendizagem a partir de parimetros predefinidos que permitemt 2 classificacio © erarquizacio, realcando apenas o resultado que € descontestualizado ¢ comparado a0 padrio previamente definico, Ambos estio presentes na escola, ainda que sejam ex- cludentes, porém o segundo participa com maior intensidade do senso comum. 10 como forma de medir 2 Quando a professora afirma: “porque se ela esti aleangando, se ela esta subindo de producio, ela ndo tem C igual aos outros. mas ai rem diferengas”, © conflito se anuneia sobretudo ao se 82 A tormagio docente referir is crianeas que demonstram avangar em sua produgio sem, no entanto, conseguirem alcancar os obyetivos considerados, “minimos” para serem aprovadas. A professora percebe que em sua pritica vé e valoriza aspectos que no sia vistos e valorizados com frequéncia; em consequéncia, quer encontear formas para dar visibilidade a0s diversos processos de seus alunos ¢ ahinas € 05 aspectos que valorizon positwamente em sua avalingio. No processo de reffexto e transformagio de sua prinea de avaliacio procurou aplicar 0 conceato de zona de desenvoloi- ‘mento proximal (VYGOTSKY, 1987; 1988). Gradualmente, suas tentativas de utilizar no processo de avaliagao este conceito foram gerando uma nova configuracio da pritica pedagogica, pois as atividades cotidianas ¢ 0 processo de avaliagio estavam jo. Sem produair grandes rupturas com © processo pedagégico instituido, for mtroduzindo pequenas modificacdes que conferiam novos significados a suas priticas, como ela deseyava. em constante inter fu uso a prova. Estava fa hoje tudo bonitinho, tudo arruma- dinho, as duas de portugues, as duas de matematica, tudo arrumado, mas procurel ver mais esse lado de trabalhar com a pesquisa e de nao mandar tarefas para casa. Notamos que ela fo! adquinndo seguranca em relago a suas propostas ¢ se amscando a pé-las em pritica. A interpretacio que fazia dos resultados aleancados a animava a amscar-se um pouco ‘mais, ela comegou a assumir e @ expressar seu proprio pensamento. Tomava a palarm, © que, segundo De Certeau (1994; 1995), € fundamental pata um projeto social emancipatério que precisa trabalhar com a diversidade de saberes e de formas de vida, existentes no contexto social e, portanto, presentes no condia~ nnn escofar, pars redimensionar as priticas escalares condianas, desafiando 0 fiacasso es construcio do sucesso, colar e colocando bases sélidas para a Para esta professors, recuperar sta palavra for findamental. Preocupada em permitir que as diferencas existentes em sta sala 83 (© que sabe quem errat de aula se expressassem, o que seria dificultado por uma avaliacio baseada em parimetros infiesivers que buscam a homogeneida~ de, ayudava seus altinos e alunas a recuperarem ¢ assumarem sua propria palavra. A palavra, ¢ explicitacdo das miiltiplas identidades, também € central na pritiea pedagogica. A escola representa um importante espaco de encontro, explicitacio © configuracio da diferenca — ou de suia negacao. Os discursos, polifomicos e polimorfos, se configu- ram em seus usos, esto modelados pelas relagdes nas quais se constituem, mdicando © processo de sua elaboraga movimento no qual os proprios sistemas de representacio sio rampula¢o por parte de seus ustirios. mento essencial na constitui¢io como um. instrumentos de Pensando num processo escolar que partiape do movimen- to em favor de que os exviufdos tomem a palavra & indispensivel considerar a necessiciade de transformar nosso ponto de obser- vacio do processo pedagégico, como parte de uma realidade social especifica, ¢ tentar uma aproximacio 20 mundo através da dtica constituida na exclusio. E preciso reconhecer que estes grupos sociats tém: por especificicade viver nfo i margem mas nos ineerstcios dos, cédigos que desmanchalm| e clesiocalml [A delinguéncr social consisuria em tomar 0 melato ap pi da letra, comi-lo como © principio da existéncin Fisica onde una socsedade no oferece mas saldas sunbélicas ¢ expectanvas de espacos 4 pessoas ou grupos, onde mio hi mars outra alternatia a ser o alinhamento disciplinar e o desvio ilegal. ou saya, uma forma ou outra de prisio a errinera do lado de fora. (DE CERTEAU, 1994, 216). Este pensamento assinala otra 16gica para o processo de ronermngin de canherimenras qe se confi posicio social de desvio ilegal, o que faz com que suas vidas se estruturem segundo normas ¢ territérios que Thes sio impostos. Excluidos, constroem sua vida nas brechas encontradas na reali- nea desde uma BH A tormagio docente dade concrets, No ¢as0 a que nos referimos, os alunos e alunas se sentem seguros para trazer para a sala de aula as palavras que confirmam sua posicio de desvi ilegal. Seu mundo, sua vida, sua palavra nfo sio rechagados. Nio tém que substitunr suas palaveas pelas palavras do outre. Os miluplos significados sio frequence- mente aceitos e trabalhados e os temas sio tratados na medida em que sio trazidos 4 sala de aula ‘Crar espaco e aproveitar as oportunidades que porventura aparecam so as licdes fiindamentais que 0 modo de vida dos excinfdes proporciona.A pritica pedagégica tem que incorporar esta Logica para que 0 diflogo possa instaurar-se.A agio escolar se potencializa & medida que é mcorporada a0 processo social capaz de estabelecer uma rupture instanradora, que possa criar lugares de transite, compostos por caminhos anda nio tragados, onde se pode buscar perguntas ainda nfo formuladas. A relevin= cia deste processo esti em denunciar 0 que falta através de um olhar de possibilidade e gerar espacos simbélicos onde possam ser propostas questdes ate entio consideradas impossivess. A professora, cuyo trabalho analisamos, move-se entre dos, ex és, mundo”: 0 mundo cas priticas escolares hegemdnica ‘© mundo real no qual vivem seus alunos, e © que consideramos poder ser o terceiro, o mundo das priticas pedagogteas transfor- imadas, cemarcado pela adeia de uma escola critica. Jogando com as miluplas expectativas e perspectivas que perpassam tal mo= vimento, ela ocupa os espacos que consegue de acordo com as oportumdaces que surgem na pratica cotidiana, como nos indica 4 forma “silenciosa” como foi articulando as mmudancas. Esco mio hugar The permite sem david mobilidade, mas uma Gocilidade sos azarot da tompo, para eaptar no voo ae pordbii- dades oferecidas por um mnsance.Tem que ucilizar, vgilnte, 3s fathas que as conjuneuras particulates vio abrando na vigilincia ddo poder proprietina, |.1 Crta ali sappresas, Consegue estar conde minguém espera, Easeiea. (DE CERTEAU, 1994,p.10), as © que sabe quem ereat Os novos lugares, mutantes e alternatwvos, estio marcados pela pluralidade, outorgando novo valor a diferenca e dando rele~ vineia rede de interacdes que sustenta 0 processo de construcio de conhecimentos. As certezas, subscituidas por incerrogagdes, cO- Jocam em tensio os processos de reprodugio, negacio, constr € superagio dos conhecmentas. Apagados os limites rigidos, saber endo saber emergem como momentos do processo de conhect- mento, representando tanto respostas como perguntas, segundo onde se inicra e para onde se orienta o olhar. Neste movimento hi um intenso processo de formagio docente. Dentre as novas priticas desenvolvidas naqueia sala de aula estava uma avaliagio que procurava investigar 0 processo pedagé- gico em sua totalidade. Sua seguranca em relagio a seu trabalho aumentou € a professora chegou a abandonar sua preocupagio com a avaliagio que a outra professora poderia fazer de seus alunos e alunas e, por extensio, de seu trabalho. Continuon se interrogando, porém superava a insegurang@ inicial, Porque eu trabalhava muito pensando nos outros. eu pensava rutto ne futuro: € a proxima? Nao, quem fem de ver sou eu Eu astou vendo, o que ele asta querendo passar. Eu passei 2 dar maior peso a esta parte. |.) Eu nfo se... €uma divide mumto grande: como que vamos nos livrar da prova escrita? (Questionari-se sobre os instrumentos de avaliacio, ou melhor, como romper defintavamente com um tipo especifico, revelava, certeza sobre a necessidade de pesquisar 0 movimento de apren- dizagem das cnangas. Petcebia-se capaz, vivia de modo potente a necessidade/possibilidade de estar em formacio permanente. (uno aspecto interessante nesta sua afirmacio é o papel que cumprem as expectativas na configuragio do trabalho, ¢ qutem si0 os suyeitos reconhecidos como relevantes para que se considerem, suas expectativas. Desde 0 comeco da pesquisa havia uma pessoa ndefinida — outra ~, que simbolizava o senso comum da escola 86 A tormacdo docente sobre o que deve ser 0 trabatho.A professora foi se distanciando desta magem e comegou a dar mais vor a seus alunos(as) & 2 es- Ccutar mais snas proprias expectatvas em fisngio do que Ihe mos- trava sua interagdo com as crianeas. Estas pessoas reais, os alunos ¢ alunas, passaram a ter maior relevineia do que a figura intuida, seguramente de muntas maneiras presente, mas niio corporificada nas relacdes cotidianas estabelecidas na sala de aula. Constatando que as criangas avangavam em seu processo de aprendizagem e desenvolvimento e percebendo que as modificagdes feitas na atuacio docente estavam permitindo e estimulando este methor desempenho, permntiu-se ousar e redefine sua ago. Ensnando, aprendia, ¢ a0 aprender melhor. ensinava. A prtica pedagégica como pratica dialégica A tomada da palarm, no sentido apresentado por De Certeau (1995) colocada em dilogo com a perspectiva assinalada por Voloshinoy (1976) ¢ Bakhtn (1988), sobre a multiacentuali- dade do signo, ressalta a palavra como arena de luta ideol6gica, instrumento e espaco de poder, forma de expressio semidtica constituida por miluplos fragmentos da experiéncia humana. ses da Iuta social, reflete € refrata a realidade em transformagio. © signo traz em st as (Os grupos hegemdmcos tentam ocultar a muitiacentualids de do signo e universalizar sua propria incerpretacio, fizendo crer que o signo é uniacentual. © controle da palavra é uma forma de controle das possibilidades de reconhecimento e afirmagio da existéncia de realidades, conhecimentos € valores distintos. Negar a diversidade de sentidos presente nas palavras & negar 1 hustoria social que a constieui e a possibilidade de expre:sio € fortalectmento da diversidade de interpretagdes da realidade, além de impedir a configuragio de alternativas, soctalmente reconhecidas, de interven¢io na realidade. 8 (© que sabe quem errat O sncesso escolar se articula com a capacidade do processo pedagégico para permuttr,¢ estimular, que a palavra se apresente em sua variedade de significados, com seus miiltuplos acentos € que a diversidade seja elemento de indagacio sobre as relacdes sociais que geram a desigualdade de significados e de valores. Sew potencial esti na possibilidade da aprendizagem escolar contribuir para que 0s professores, professors, alunos e alunas se reconheram, como sweitos que utilizam a lingua e simultaneamente atuam no sentido de constrii-ta, se construindo nesta interacio. Tal compreensio anuncia novos horizonces para a formaci com a finalidade de proporcionar aos professores e professoras ferramentas que Ihes permitam participar desta realidade plural © desenvolver tim processo de ensino-aprendizagem findado na. heterogenerdade, Uma formacio profissional que possa interrogar 0s (préjconceitos ¢ estimular 0 disloge. docente A austncia/exsténer de condicdes para que o diilogo efetivamente ocorra se vincuta as telacdes de poder estabelecidas, Estas relncdes, constituidas nas prinicas sociais, refletem-se nas atividades escolares conidianas e as condicionam, ainda que nem sempre sejam claramente percebicas A molaplicicade, caracteristica central de uma escola pensa- dda como ona fiouteinga deerezanwnts (GIROUX, 1994), tem que ser incorporada s praticas escolares cotidianas, 0 que imprime um movimento distinto do que se fz frequentemente na escola, que esti configurada pela busca de homogeneidade, Esta zona Jronteirga de ertzamento 86 pode emergsr se as diversas realidades sio emunciadas. Portanto.a pedagogia critica tem que dar voz 403 alunos ¢ alunas, mcorporando ao coudiano escolar suas exper- éncias, formas de conhecamento, significados, amagens relevantes © aletos. A ref para a discussio e um recurso fandamental para instaurar uma edagygia da possbilidae, tendo como finalidade construnr novas formas de vida que, embora nio existam, podem ser intuidas na complexa cessirura que constitu a realidade coudiana, jo sobre a experiéneia vinida € um caminho a8 A tormacio docente Centrada no devir, a pedagogia critica yamats se conclu, estabelecendo permanentemente novas necessidades formativas 20s professores ¢ professoras. Partindo de possibilidades, on seya, de realidades apenas antnciadas, organiza se dedicar 20 ainda nfo coneretvaado que se revela como algo por que vale a pena lutar. Os edinendores que compartilham esta petspectiva critica buscam formas para conectar suas propostas a0s problewas ¢ experitucias reais. fundamental, portanto,ressaltar nas priticas e conhecimentos condianos os aspectos que coincidem com as propostedes que buscam a transformacio, se como tentativa ce 89 (© que sabe quem errat A possibilidade de reteitura esti presente em todos os dmb tos socias, inclusive nas priticas escolares cotdianas. Todo texto permite miiluplas leituras e a apreensio de significados diversos e contraditorios, mesmo dentro de um processo social em que os grupos dominantes tentam reduzir o universo de mterpretacdes possiveis. Toda leitura escolar, por mais que se proponha fechada, constrdi-se através de um diglogo em que es petigncias que tanco os estudantes quanto os(as) professores(as) trazem como individuos ¢ como participantes de realidades so- j0 presentes as ex- cis especifieas. Hi um processo de contaminaci @ interno e externo A dinénmica escolar. Este diflogo, entretanto, nido é linear nem simples j4 que 0 contexto social gera uma as- simetria entre as diversas formas culturais, definindo ternitérios de conflito e tensio na relacio entre a producto cultural ¢ a reprodugio social e cultural. A assimetria se torna um traco das relacdes entre as diferentes culruras, estabelecendo limites para a constitnicio e explicitagio da pluralidadte, entre 0 que Um mesmo texto pode gerar interpretagdes diversas se- gundo as experiéncias, conhecimentos e légicas que cada um. possi em consequéncia de suas vivéncias pessoais, Portanto, a existéncia de um indice anico de avaliagio nao permite que esta diversidade seja captada e posttivamente valorada, O desenvolvimento de novas tecnologias smprime novas ca- racteristicas aos processos de producio ¢ distriburicio cultural, inclusive na fangio da oralidade, mas ainda no significa uma reducio do papel social da cultura escrita, Mantém-se, sobretu= nico dos significados do, a assimetria nas possibilidades de defi sociais das pritteas culearas A escrita assume importincia cultural como um anstra= mento que facili a distribmigio téomea da produyio cultural 20 mesmo tempo em que serve como elemento de controle do acesso, por nio haver transformacées na eséncia das condigdes de distribuicio social. A criagio da cultura escrita reduziu a m= | | | por ne A tormagio docente portincia social da cultura oral, servindo como um instrumento importante para a estratificacio social;o domimo de cultuzas com valores sociais distintos confere aos individuos valores diferentes na dindmica social (WILLIAMS, 1992). Nem sempre © crescimento quantitate das pessoas al- fabetizadas esta vinculado a uma ampliagio qualitatwa de sua utilizacio. A posse do conhecimento se torna um processo de {uta social, que marca profiandamente a fungio e 0 desenvolvi~ mento da escola, como institur¢io soctalmente responsivel pela “alfabetizario",¢ a formagio-acio dos professores e professoras, profissionais que conduzem a sistemanizagio do processo, Mesmo quando ocorre uma ampliagio do domino da escrita, permanece a tensio oral-escrito no Ambito da valoragdo social da cultura, Esta anilise e significativa para a compreensio da partic! pacio dos parimettos de avaliacio na dindmica de construgio do fracass0 escolar no processo de alfabetizacio. Estes critérios tém como referencia os valores de determmados setores ¢ sio aplicados 4 totalidade social. A concepcio de homogeneidade, em que tanto a dinérmica de avaliacio desenvoivida na sala de aula quanto a formacio docente se constituem, conecta a agio pedagdgica a um contexto social excludente. A concepcio que compreende a riqueza ¢ poténeia da heterogeneidade pode ayudar os(as) professores(as) a identificar a existéncia da assimetria entre as culturas, a perceber que os parimetros de avaliacio que buscam a homogeneidade atvam no sentido de perpetuar tal assimetria e levilos a considerar necessidade de consteuir outros modelos de atuacio pedagogica que possam valorizar a diferenca em sua posinvidade. Ginzburg (1998) aprofinda a tensio entre cultura oral ¢ cultura escrita e mostra que além da existénena de indices de valor social distintos, ocorre uma recriacio do testo escrito a partir de uma leitura fiandamentada na cultura oral. Discute como a fasio de elementos singulares de cada uma das culturas redefine 1 © que sabe quem errat a apropria¢do que © sujerto faz da realidade, mostrando que a interagio entre modelos, logicas, saberes c significados peculiares dé uma maior complesidade & lentura, Falando da construsio da capacidade cognoscente da espécie humana, mdica que a possibilidade de realizacio de lerturas diversas, integrandlo a adi~ vinhagio € a decifiagdo, gera ¢ enriquece tal capacidade através de um movimento em que passado, presente e futuro so inter -relacionacios pondo em dislogo diferentes culturas. Com osaltos indices de fiacasso escolar no processo de alfi- betizacio, tanto as crianeas quanto seus profesares e professoras podem estar revelando a intensidade cesta assmerria, Domunar a leirura e a escnita pode representar um importante passo no sen= tido da assimilagio da cultura dommante e do abandono de sua propria cultura, Nao s6 as crianeas se encontram nesta tensio entre 4 cultura dominante e as culturas subordinadas, das quars quase sempre elas io parte. Tamibém as professoras ¢ os profestores estio rmarcadas(os) por este “rito de passagem”, jf que sio elase eles que devem atuar para favorecer esta traetona, numa estrucura social ‘que busca mancer, talvez ampliar, esta assimetria. Que veneno tm as letras, senbor, que todo aquele de nos que asaprende voles contra nés! (YUPANQUI apt TAMARIT, 1996, p. 136) Em nosso contexto, grande parte das criangas de classes populares & afiodescendente, o que indica uma forte influéncia da cultura oral e a presenca de vozes nio codificadas no resteito universo senudtico da cultura ocicental, masculina branca, que atuam imprimndo aos signos comuns, acentos peculiares Portadores de uma linguagem socialmente desvalorizada, por sua matri7 oral ¢ por 2 cistiners da linguagen rl, estas orvancas vivem permanentemente o confito entre s aquisicio da lingua gem escrita como instruimento de fortalecsmento ou de negacko de sua idenudade 2 A tormagio docente Acconstrucio de uma escola democritica é parte do proceso de configuragio de uma sociedade vercadeiramente democrs- ‘aca, capaz de estabelecer um movimento em que todos possam participar anwamente da criacio ¢ reeriacio dos significa dos textos ¢ de seus valores. E um processo le inca politica que revela, ¢sustenta, os conflitas e acordos presentes na constituicio dos significados \dos Este debate desvela alguns caminhos possivers para 6 proces- so formativo e para a pritica pedagégica no sentido de construir uma pedagogia da melusio.O contexto atual exige que os profes sores ¢ professoras desenvolvam novas competéneias, cornando- -se bons professores © professoras desde perspectivas diferentes das assinaladas pelos modelos tecmicistas.A nova perspectiva sublinha 4 interacio, a mterlocucio € 4 teflexio como elementos-chave do processo de ensino-aprendizagem dentro de uma perspectiva ampla que mncorpore a heterogeneidade, circunserita 4 perspec~ tava de configuragio das relacdes sociais de nova qualidade. Esta nova dtica, que tem na relagio dialégica seu eixo de sustentacio, adquire sentido por sew vinculo ¢ compromisso com os setores sociais excluidos. Este movimento indica o esgotamento do paradigma positivista que di origem as teorias sobre formagio docente , simultaneamente, simaliza um processo de reconstrugio pa- radigmatica que, compromerido com as exigéncias dos secores sociass excluidos, fanca raizes na di epistemolégica (KUHN, 1975) podemos perceber mostras da necessidade e viabilidade de um novo paradigma, mica escolar. Com a crise A relacio teori ~se para alcangar 0 senso conan renovado, como propde a dupla ruptura epistemoligia (SANTOS, 1993; 1995), de maneira que se fortalega sua capacidade para desenvolver uma pedagogia da possibilidade que explore todo 0 potencial da realidade esco- lar como uma zona fronteirica de cruzamento de culturas, Esta pritica. ou ciéncis-senso comum, redefine- 93 © que sabe quem errat pedagogia da possibilidade, essencialmente plural, compartilhada, dialogica e democritica, ressalta « necessidade de se substtuir a dein dos percursos indivicuais pela ideia de trajetorias coletivas (ALVES, 1996). Substixutcio que nio implica o abandono da individualidade, mas que pretence enriquecer a subjetrvidade propondo o abandono do egocentrismo ¢ o estabelecimento de redes de solidariedade. A formacio docente se encontra no dilema de seguir pro~ pondo o processo de ensino-aprenlizagem nos estreitoslimates da sala de aula, o que significa continuiar a busca por conhecimentos, métodos € técnicas que possam produzir melhores resultados escolates, ou assumnr a pritica pedagégica como pritica social, portanto conectada 4 realidade que esta além dos muros esco- Jares, Hi que escolher entre seguir construindo novas teorias & 11 do paradigma domnante ot se aventurar no exercicio de desenhar novas cartografias que consolidem o paradigma emergence, formular propostas priticas na es Os elementos priticos ¢ teéricos que recolhemos indicam que a segunda &a opeio necessirna, o que na realidade correspon- de a um movimento que ji pode ser percebido nos Ambatos interne e externo 4 princa pedagogica. A impossibilidade do paradigma positivista continuar oferecendo solugdes a0 pro- cesso de desenvolvimento da cinema ¢ sua insaficiéneia para atender as verdadeiras demandas do conyunto da sociedade & uum fato que se pode observar jogando Iuz nas zonas de sombra do cenino social. Se esta impossibilidade produz uma grande perplexidade, também estimula um processo nico e cranvo de reconstrucio dos paradigmas sobre os quars se constitur a vida social (SANTOS, 1995) A escola, parte do complexo tecido socral, participa deste movimento. Os professores e professoras tém que arwar, mesmo que imersos neste contexto mutante e frequentemente cadtico. Esta realidade demanda novos esforgos e propostas na esfer 94 A tormagio docente da formacio docente, que jé esboga alternativas articuladas 20 movimento de reformulacio do processo de producio e sociali~ zacio do conhecam condigdes de vida a todos os homens e mulheres. ito coma finalidade de promover melhores Neste concexto, uma das chaves para a atuagio no vendre escolar & a organizagio do proceso de ensino-aprendizagem nna perspectiva de permanente investigacio da pritica, o que se articula 4 concepcio de que a formacio docente € um processo continuo ¢ coletivo de desenvolvimento profisstonai-pessoai. O objetivo & que os(as) professores(as) interroguem, compreendam e critiquem os valores vinculacios 4 pritica social ortentada pelas adenas de homogenerdace e de exclusio e que formulem alterna lavas a este conteNto escolar e social. A atitude pesquisadora ¢ reffesiva sobre 0s episédios co- tadianos € tmportante para a mteragio entre teorin & pritica € para a construcio do senso comum renovado. A compreensio da complexidade do processo de ensino~ ensinar¢ o aprender como movimentos compartilhados,em que (95 suyertos transitam entre os dots pontos, mesclando os papéis. Ola} professor(a) como profissional reflexivo val compreen- dendo que participa da aprendizagem dos alunos ¢ alunas, mas iprendizagem indica o nio a determina, e procura adquinr as ferramentas concestuais vel § aprendizagem © 20 desenvolvimento das criangas ¢ a0 seu proprio desenvolvimento. pritieas para atwar de modo fio! A dimensio social da mudanca proposta rem que set subi nnhada, pois critiea ao modelo vigente de producio de conhe- cimento e de validagio de saberes na realidade é uma critica & configuracio das praticas sactais estabelecidas, Em consequéne 2 redefinicio no ambito dos conhecimentos 56 pode efetat= ~se num contexto de revonsteucio das pritieas sociais. Este & © sentido da pedagogia da uirusie, Como vimos, j& podemos vislumbrar, mutas vezes nas sombras, ndicios de seu desenvol- vimento na vida escolar condiana.A formacao docente favoravel 95 © que sabe quem errat & perspectiva de formulacio desta pedagagia da inclusio, articu- lada por um discurso de possibilidade, meorpora em sexi debate te6rico-pratico maluplos aspectos vinculados & construgio de uma escola comprometida com o sucesso dos alunos ¢alunas das classes populares, historicamente marcados pelo fracasso escolar. 6 | DP tits Capitulo 3 A ambiguidade do processo de avaliacao escolar da aprendizagem Assumindo 0 fracasso escolar como um desafio, é impor- tante avangar no sentido de discunr os mecanismos escolates que © produzem ¢ assinalar movimentos que constitwem possiveis alrernativas pata sua superacio, Um aspecto relevante é a atu- aco docente no processo de avaliagio, poss, sio os professores € professoras que 4 realizam, sendo o resultado deste processo determinante do sucesso ot fracasso escolar dos alunos e alunas. A avalingio tem estreita relagio com a mterpretagio que ofa) professor(a) faz das respostas dadas, especialmente significativa no caso das crianeas que chegam 3 escola portando estruturas de compreensio diferentes daquelas aceitas pela norma estabelecida, Num contexto de diferenea cultural, marcado pela hibridagio € pela mestigagem, a pluralidade de significados cruza as nteragbes pessoatse se plasma nas eserururas subjenvas de compreensio: rages anterpsicol6gicas diferentes resultam em distintas possbilidades de fangdes intrapsicoisgicas (VYGOTSKY, 1988).Tal compreensio. aumenca a complexidade da avaliacio, pois os diferentes grupos € 08 diversos suyeitos podem utilizar nstrumentos (psicolégicos oui materias) similares cle modos variados. Nests realidade heterogénes, @ discurso pedagogico te 1 de que os enunciados sio univo- cos. No cotidiano a tensio homogeneidade-heterogeneidade frequentemente cria sittiacdes em que ha impossibilidade de estrucura com a concep\ o © que sabe quem errat compreensio dos significados que sustentam as diversas vozes que se explicitam, 0 que pode ser uma explicacio fecunda para a produgio social do fiacasso escolar, poss une a dinmica escolar 4 dinimnca social Dentro de politicas educativas de perspectva neoliberal, a discussio sobre o fracasso escolar se relaciona cada vez mais com a ideta de qualidade da educacio (FERNANDEZ ENGUITA, 1990; TORRES, 1996).A énfise nesta expressio reafirma a ne~ cessidade de constrcio de instrumentos fidvers para determin’- -la, sobretudo quando a qualidade & o parimetro que informa, e Justifica, 20 nivel macro,a distribuigo dos recursos na educagio @,20 nivel micro, 0 trayeto do(a) aluno(a) na escola. A avaliago adgunre grande importincia como um problema admimstranvo, nfo do conhecimento, A qualidade educativa construida nesta perspectiva nfo tem muitos elementos para fomentar a supera- cio do fracasso, um problema social, nio técnico e buroctatico. A avaliagio, na étca do exame, atende as exigéneias de natureza administrativa, serve para reconhecer formaimente a presenga (ou auséncia) de dererminado conhecimento, mas 1id0 dispde da mesma capacidade para indicar qual & 0 saber que suyeito possun ou come esta mterpretando as mensagens que recebe. ‘Tampouco pode informar sobre o processo de aprendizagem dos estudantes ou questionar os linutes do referencia! interpretative do(a) professor(a) A parr do exame, ofa) professor(a) pode avaliar se ofa) alunofa) fo1 capaz de responder adequacamente a suas perguntas. Porém, o erro ou acerto de cada uma das questdes nio indica «quats foram 0s saberes usacios para respondé-la, nem os processos de aprendizagem desenvolvidos para aclquirir 0 conhecimento demonstrado, tampouco 0 raciocinto que conduzn & resposta dada, Para a construcio do processo de ensino-aprendizagem, estas io as questdes efeavamente significativas, ¢ nfo 0 erro ou acerto como ressalta a Logica do exame. 96 ee eeeeieces a, A ambiguidade do proceso de avaliag30 A avaliagio, organizada segundo esta légica, responde a necessidade de usar 05 resultados como explicagio para o fia casso/sucesso escolar numa dimensio sem der usivamente técnica, 1 transparecer a dinimica de inchusio ¢ exclusio que implica a concepeio de homogeneidade em que se fundamenta Setia possivel extrair do exame mais informagdes que 0 ert0 ou acerto da etianea? Melhor serta 0 desafio: pode-se construir uma perspectiva de avaliacio capaz de contribusr para que 0 processo de ensino- -aprendizagem seja mais favoriivel a0 sucesso escolar? Este desafio nos nstiga a por em diflogo a teoria e a pritica a avaliagao com a finalidade de observat 0 perc io deste conceito, identificando os indicios que revelam novas demandas € perspectivas no sentido de articular a pritica da iacdo & construcio de uma pedagogia critica comprometida com 0 sucesso escolar so de constru- A avaliagao dos alunos como mecanismo escolar de exclusdo social © exame nem sempre consttuiu um problema central para a escola ow para a pedagogia em geral (BARRIGA, 1993). A pritica de examnar estava relacronada com a aprendizagem, como parte do método de trabalho, nio se caracterizande como: instrumento de verificacto e de classificagio. O estabelecimento da avaliacio formal se insere no processo de criaco de um sistema centralizado de ensino, como parte do movimento de raciona- lizacio dos processos sociais (PERRENOUD, 1990), que levou © conceito de exame a se consolidar como medida educacional. Nosso seculo se ocupou especialmente da medida edutcactonel, ressaltando seus tracos de objenvidade, fabilicade, valide, efieiénena e neutralidade, representados pela preocupacio de construnr provas estandardizadas capazes de revelar cientificamente os anteresses, 9 © que sabe quem errat animides, capacidades, desenvolvimento, progresso, rendimento © inteligéncia dos estudantes. Esta avaliagio se apon essencialmente 1o estabelecimento de um padirio que serve como termo de com= uacio, diferenciacio, clasificacio ¢ exclusio. O aperfeicoamento do sistema de avaliacio educacional se vincula 4 necessidade de atender as crescentes demandas socias de educacio reduzindo a0 miximo o investimento pitblico. Com © crescimento da popula adquite duas fancdes basicas, dé das pelas 1deologias do progresso © da competicio: definicio da distribuicZo dos recursos econdmicos s instcurcdes educativas e regulagio do acesso dos individuios ao mercado de trabalho. escolarizada, a avaliagio educacional \ureza econdmica, demarca: O desenvolvimento técnico da avaliagio é uma consequén- cia da centatwa de ampliar a eficdcia e a eficiéncia do sistema, medidas prioritariamente através de parimetros econdmicos. A avaliagio vai se distanciando do processo de ensino-aprendi- zagem, ressaltando sua fungio de controle social mediado pela pritica pedagogica. A dimensio ideol6gica € fundamental neste proceso, entendendo-se ideologia como um conjunto estrutu- rado de representacdes e normas que guram o conhecimento € a acio, com 0 objetivo de untversalizar uma magem peculiar produzindo sua identificacio com os diversos swjeitos sociais (CHAUI, 1990), © controle ¢ a classificagio dos individuos segundo modelos cestandardizados atuam no sentido de homogenerzar comporta~ mentos, atitudes € conhecimentos, consolidando 2 concepcio de umicidade de significados. Elimmando as diferencas © as contradigdes, dé importante contribmigio para a selecio e uni versalizacio desejadas, © projeto de avaliacio, em suas diversas formulagdes praticas, esti demarcado por uma concepcio que associa a aprendizagem & memorrza¢io e & repeticio do ensina- do. Nesta perspectiva é dificil distancrar medida, classificagio miénito da concepcio de avaliagio. 100 ‘A ambiguidade do proceso de svaliag0 O eixo de todo discurso @ a qualidade da educagio, No entanto, a avaliago educactonal, ao assumur a tarefa de controle, atende principalmente @ necessidade de selecionar e exclu. Estas fimeSes que responcem a exigéncias ex «raescolares marcam profindamente seut desenvolvimento tedrico € pritico, Ewacho que a avaliacao € muito restnta. Porque ela nao conse- ue captar a diversidade de conhecimento que a crianca tem. [oa A avaliagdo, © que a gente vé, tem 0 objetivo somente de trabalhar aquele determinado conhecimento que 0 professor trabalhou em salade aula e pronto. Quer dizer, ¢ mecit mesmo, 520 aluno aprendeu ou se nao aprendew aquele conhecimento. Entao, o sentido amplo, crevo que a avaliacao nao consiga dar conta. Essa avallacZo que a gente tem nao consegue dar conta, Bu acho que os professores na escola se detém multo non. na {quest@o do final do ano mesmo, da aprovecdo & da reprovacSo, Entho, aquilo fica assim... so tem como objetivo dar nota ou conceito para no final do ano vocé aprovar ou reprovar A dicotomia entre erro e acerto, conhecimento e ignorincia, saber € nido saber é assurmda como fio condutor da atividade escolar.A avaliacio, demarcando as fronteiras,facilita 0 1solamento dos styeitos. A ago escolar fortalece 0 pensamento convergente, a subordinacio as normas @ a propagacio das ideias de repro~ ducio ¢ de conformismo. O discurso da competéncia articula controle e organizacio, dando sentido a classificacio produzida nas priticas pedagégicas cotidianas e a exclusio escolar, Através estes mecanismos a sociedade burocratizada define quem esti autorizado a saber; quais sio as vores socials reconhecidas; nsere em tereitorios distintos, com valores diferentes na hierarquia social, 0 conhecimento € a ignorincia, produzindo 0 sucesso € O sistema de avaliagio ¢ uma parcela do sistema educativo iteady por uuna suede que tem come uin de seus piles igualdade formal.A norma exerce uma ago coercitiva no pro- cesso de ensino-aprendizagem, pors,a igualdade da norma torna gusta a desigualdade de resultados. A definicio de uma norma 108 (© que sabe quem ercat permite um jogo duplo — qualificacio/quantificagio ~ crando espaco para a classificacio das condutas quie, hierarquicamente ordenadas, imprumem valores diversos aos proprios suyeitos, O aperfercoamento dos instrumentos, ecnicas e modos de registro de medida educacional, var distanciando cada vez mais a avaliacio das questdes relatvas 20 conhecimento. O importante no & o que efetwvamente se sabe.mas a possibilidade de demons- trar 0 dominio do conhecimento solicitado. © rendimento dos alunos e alunas — bom ou maui ~ converte-se numa qualidade intrinseca do proprio suyeito, attando na dinémica de melusio/ exclusio social, A estreita relagio estabelecida entre 0 exante, a qualificacio atribuida por seu intermédio e a promogie doa) akuno(a) fortalece a competigio no interior da vide escolar.A questio fundamental subjacente a0 debate sobre a avaliaga qui 0 conhecumento socialmente produzido ¢ valorizado € 0 que significa possui-lo (ou nio).. parece set quew iri ad- Se a escola tem como objeto principal o saber, sobretudo 4 aguisicio dos conhecimentos socialmente defimdos como significativos e necessirios*, que sentido tem desenvelver teorias € recnicas pedagégicas que nia se vinculain ditetamente aos pro- blemas de construi Numi sociedade caractertzada pela diferenca, tem sentito desen= volver pritieas que tenham como finalidade a homogeneidade do conhecimento? eapreensio do conhecimento? © estudio da avaliacio, responder questBes internas a0 processo pedagogico, pretende dar solugdes, desde 0 interior da escola, a problemas colocados pelo contexte social. 6z1ca do exame, nfo se propde 2 Frequentemente as professoras reconhiecem a pequiena efi- icra da 6grca do exame no processo de ensino-aprendizagem,o " Absteme-nar de midngir, neste momento, quis 0s process de defimco desses confines 102 — A ambiguidade do processo de avaliaga0 que representa um estimulo para a procura de um novo sentido paca a avaliagio, Buscando alkernativas para as atwwidades pedago- gicas mplementadas em suas aulas se encontrar limitadas pelos parimetros e princas da avaliacio ji consolidados. £ multo um produto do que o sistema imp6e. Que vocé tem que ter um padrao, um concerto, uma media, e vocé, mesmo com tum discurso de que nao, de que iss0 e um absurdo, voc® aca- ba fazendo de alguma forma. |. Estou pensando seriamente fem chegar para as escolas que eu trabalho e dizer que eu nao You particpar, porque eu saio angustiada. E uma coisa assim e abrir um livro, um didrio ¢ fulano ¢ fraco, fulano ¢ medio, vocé enquadrar alguem, vocé rotular alouem dessa manetra Eu seria injusta, na minha opinido eu seria musta se eu desse tuma nota barxa para a crianca por causa daquela questao se ele interpretou de uma outra forma, Entio 0 que aconteceu com ele Foi o qué? |. Uma avaliagio nos moldes que vocé véna escola € muito fac Vocé pegou, pronto, ele esta ali. Dentro dos seus limites. Nes ses moldes ¢ facil € por isso que se anrovae se reprova nesses Dadrées e que cobram de vocé e que vocé tem que atender. que ev considero que ¢ uma crianga alfabetzada, o que eu ser que ela esta crescendo A légica do exame nio pernte a observacio do processo de aprendizagem-desenvolvimento em sua complexidade, A fragmentacio do processo torna dificil a implementacio de uma pritice pedagogiea estruturada a partir da ideia de apren- dizagem como uma acio permanente, marcada por avancos, rupturas ¢ retrocessos. Tampouco serve para a compreensio dos = de logieas diferentes da Logica exco- lar e para sua incorporacio como objetos de estudo na sala de aula. As declaracdes indicam a necessidade de outro referencial no qual fandamentar © processo avaliativo, um marco favorivel conhecimentos resultant A smteracio entre teoria e pritica ¢ 20 dislogo entre alunostas) e professores(as) com a finalidade de compreender os processos desenvolvidos na relaco peda 2 € 05 resultados alcancados. 103 © que sabe quem erca? Tal mudanca implica, como vimos nos capitulos anteriores, uma transformacio do senndo de aprendizagem escolar ulerapas sando o objetivo de aqunsicio do conhecimento valorizado como. conhecmento escolar ¢ tendo como horizonte a ampliacio constante dos saberes que os suyeitos posstiem, (fe)eriando sempre anecessidade de obter novos e mais complexos conhect jentos. As proféssoras, em nossa pesquisa, revelavam compreender que a avaliacio escolar vem dificultando a explicitacio,na sala de aula, da polisserma, da polifoma e da diversidade de processos ¢ ritmos, constituindo-se tim fator de exclusio de muntas criangas. Os resultados alcangados ano apds ano por seus alunos e alunas indicam que 0 denominado rendimtento escolar nem sempre refiete 6 real conhecimento de cada umia). Avaliagao escolar e construgao de uma disciplina social ‘Mudanga e permanéncia se entrelagam na dindmica esco- lar. Observando o processo histérico de configuracio da escola como instituigao social verificamos que a ampliacio aparente das oportumdades de acesso & eciucagio sempre gera formas ve- ladas de efetiva redugio destas oportumdades. O exame & um potente instrumento de tal restricio uma vez que se relaciona &s possibilidades (ou nao) de continmidade do estudante na vida escolar, 0 que tem profundos vinculos com sta mnsercio socal prévia e posterior a escolaridade (BARRIGA, 1982; GIMENO SACRISTAN, 1982). A prioridade dada 4 avaliacio como um processo es- sencialmente técmico, que confere lugar destacado ao exame, oculta a Complexa rede socrat que define & sustenn as priticas escolares. Quase sempre 0 processo avalianvo serve para justifi~ car um resultado previamente esborado. Nas palavras de [cura (1997):"*como se pode inferir dos dados, quem vat A escola & a genealogia, nio o individuo” (p. 11M), 104 A ambiguidade do processo de avaliagso ‘A escolanzagio tenta proporcionar um aspecto de exclusiva conquista € ménito indivicual ao que esta socialmente delineado, Tais relacdes sio especialmente visivess em sociedades como a nossa, extremamente excludentes. A avalia¢io escolar fiinciona como um sistema de oferta ¢ suspensio de direitos, tanto nos fi tos cotidianos da sala de aula, como em relagio 4s possbilidades faeuras. Contribun para dar & estrati de consequéneia natural das dferenras mndividuais que caracterrzam 0s seres humanos. A homogeneicade buscada através da indivi- dualizagio erta um campo de company que, fancionando como esparo de diferenciacao, yustifica a heterogeneidade de resultados aleancada, As diferencas individuais, nesta otca, naturalizam legitimam as diferencas sociais. Foucault (1978) ¢ um dos autores que nos qjidam a compreender a Logica que sustenta esta pritica de avalia¢io do rendimento escolar. .¢io socral uma aparéncia ‘© exame combina as entcas da hierargus que vagia € as da jo que normaliza. E um olhar normalizador, uma vgs clasificar e easnyar. Eobelece sobre 05 individuos uma visbilidade através da qual sio di farencrados # sio sancionados. (FOUCAULT, 1978, p. 189) inet que permite aualifi © exame fanciona como um procedimento que circuns- reve 0 sujeito nos marcos do poder e do saber pela possibilidade de avaliagio mdividual que carrega.Tornando a mdividualidade visivel e estabelecendo pautas ‘omparacio entre os diversos ndivicluos, proporciona metos para sua classificagio ¢ distribun= cio no espectro soctal. Através da vigildncia hienirguica e da sangio normalizadona, que comjugam 6 exercicio do poder e a posse do saber, ata no sentido de disciplinamento da individualidade, stiometida a um poder anémmo, (FOUCAULT, 1978, p. 189). A avaliacio escolar, que mantém a légica do exame e em certa medida a amplifica, pode ser entendida como um dos ‘métodos sociais mais suaves, corporalmente menos violentos isualmente menos perceptivers, de manter a disexplina; um 105 © que sabe quem erra? dos instrumentos capazes de atuar com mntensidade ¢ amplitude sobre o steito em sua cotalidade. Tem o sentido de diseiplinar {io s6 0 corpo, mas também 0 pessamieno, a vontiade, as disposigdes O disciplinamenco ocorre através de um conyunto de agdes sutss, de dificil identificagio. A violéncia stmbélica, menos percep- tivel, dificulta que 0 sujesto identifique 0 agressor, o que contribu para que ele va intemnalizando um forte sentmento de inferio~ nidade e de culpa por seu fracasso, por suas impossibilidades. Tal compreensio indica um aspecto significativo para a discussio do baixo rendimento escolar nas classes populates, Se o castigo passa 1 efetivar-se através da suspensio dos direitos ~ 0 que na escola se traduz em notas barsas, repeténcia ¢ tmpedimento (formal ou no) de prosseguimento da vida escolar ~ é bastante compreensivel que tenha um poder muito pequeno para impor a disciplina aos estudantes pertencentes a estas camadas sociats. Eles ja tém uma vida cotidiana de negagio dos direitos mais elementares:alimen- tagio, habitagio, sauce, trabalho ete. Tendo como referéncia uma vida caracterrzada pela auséncia de direitos. a privacio de dire1- tos no dia a dia escolar on a privacio de direitos futtiros como consequéncia da nio escolariza¢io, nfo servem como ameacas suficientes € no exercem pressio bastante para moldiclos § exigéncaas escolares. A vida conidiana constréi seu sentmento de incapacidade, © fracasso escolar & apenas um fracasso a mars Na perspectiva apresentada por Foucault (1978), 0 exame representa tum processo bastante disciplinado e disciplinador que mescla as relacSes de poder e de saber através de aos fortemente ritualizados, E uma atrvidade de vigilincia constante e regular que define os contornos da pritica de ensino, condicionando © processo de aprendizagem e requer um aparato instrumental que permita 0 jogo de luzes e sombras necessirio. Um elemento importante és documentacio. © exame é acompanhado de um sistema de registto que permute uma acumulagio documenta e coloca todos os sujeitos num canipe de vigiléncia 105, | | I | | | A ambiguidade do processo de avaliagio No contexto escolar, as modificagdes propostas no processo de avaliacio fiequentemente sio acompanhadas da implantagio de novas estruturas de registro, Este jogo de visibilidade, como tuma diniimica do exercicio de poder,na constituicio do proceso de avalia 0 ¢ pressentido pelas professoras: Se 0 professor diz para o aluno que ele ficou [reprovado) porque nao sabe dividir, mas ele teve uma producio bea... no Conselho acho que a gente tamibem tam que estar levantando (98 pontos positivas do aluno. Ai eu acho que vai da leitura das pessoas que estao ali envolvdas... Vio argumentar, Acho que o papel das pessoas que estdo a ¢ argumentar em cima da fala do professor: "Vai deixar em matematica por qué? O menino vat devxar de passar de ano so porgue ele nao sabe Gividit? © que ele ja fez?” Interpretacio que se fortalece com o seguinte dislogo: Uma coisa que eu ache! interessante foi que a gente antes ‘uvia no eomeco do ano: “Esta turtma & horivel,v2o passar pouguissimos Agora eu estou vendo, com a participacio do canselho... porque b conselho vem parvicipando durante todo o ano, mas agora fle vat ter poder de deci Ai elas las professoras] estio se preocupando com a maneira de olocar, com ter que ter argumente para convencer as pessoas da retengdo do aluna |.) Uma falou assim: “Eu vou apresentar os dois: poraue que eu Feteria © 03 avancos dele, ¢ 0 grupo vai me ayudar a decidir’ ‘Quando que um professor... Porque antes era assim: *Quantos alunos?” ‘Ah, eu vou reter tantos, Se perauntasse porque, no saberia. Nao tinha essa discussao, ‘A rede de mformagdes demandada para a demarcagio do campo de vgiliucia depence da homogeneizagio das caractersticas individuais, que permite a codificacio, criando a possibilidade de chassificacio, comparagio e identificacio dos desviantes.O exame, outa légica nele encarnada,e inscrumento desta homogeneidade, 107 See © que sabe quem errat Estabelecendo a sonia define os padrdes de avaliacio e os irmites para a constituigio € desenvolvimento da individwalidade. Um olhar investigatwvo para 0 condiano indica que as re= laces, mesmo hterarquizadas e estrucuradas dentro de padrdes restritos, esto marcadas por tenstonamentos constantes,de modo que esse campo de vigildncia nio se configura completamente, assim, como sio mantidos espacos de heterogeneidade. Uina sociedade caracterizada pela acumuulacio privada dos bens coletivamente produzidos e pela troca de mercadonas trata © conhecimento como um objeto de troca e a avaliacio escolar como um dos mecansmos sociais de categonzagio dos sujestos como possuidores, ot nio, deste bem. A avaliacio escolar tem importance papel simbélico na apresentacio e no reconhecmento do individuo no grande mercado em que se move a sociedade. Tanto os alunos ¢ alunas quanto os professores e professoras io aprisionados pela légica seletiva da avaliagio escolar, que no tem como objeto o ptocesso de conhecimento.A légica do exame dificulta @ verdadeira aprendizagem ¢ contribui com a reducio das potencialidades discentes e docentes. Professores(as) € alunos(as) no trabalham na perspectwwa de ensino-aprendiza- gem, mas de treinamento, O conhecimento € substicuido pela aprendizagem de estrategias que facilicem a memoriza¢io do contetida, © que geralmente recuz 0 conhecimento a fatos e ati~ ttides mecanicas. Tal reducio permite que o resultado analisado seja claramente abservado, nfo contenha ambiguicades € possa ser comparado 4 norma, permitndo © posicionamento do(a) altno{a) no quadro classificatério previam: te defimdo, ‘A quantificacio exige o fractonamento da totalidade do conhecimento em partes simplificadas, imitando a0 mixime 0 campo de estirdo, eliminando tudo 0 que nio seja observavel. A aprendizagem fanciona como uma acumulagio de fagmentos do conhecimento que, somente quando sio corretamente art culados, permite o dominio da totalidade do conhecimento. 108 A ambiguidade do proceso de avaliag20 A pritica da avaliagio distanciada do processo de conheci- mento tem o sentido de identificar os desvios, propor sances, para que o “bom camunho" seja retomado € se possa justificar a mcapacidade daqueles que “insistem” em nfo se adequar & norma estabelecida ~ ou no conseguem tanto em termos de informacdes quanto de aticudes. Da teoria da medicao a avaliacao: novas teorias. Praticas distintas? Muitos sio 0s estudos criticos ao movimento teénco-pritico no temt6no da avaliacio. Foucault (1979), como vimos, faz uma radical ao proceso social de controle da subjentvidade que representa a consolidagio das institurgdes modemnas, destacando 0s procedimentos avaliativos como instrumentos para modelar critica ‘05 indivichios. Observando especificamente as priticas escolares cotidianas Gimeno Sacrstin (1982; 1996) ¢ Barnga (1982; 1993) fazem uma anilise critica do movimento de (re)formulagio teérica dda avaliacio da aprendizagem e de seus desdobramentos priticos, Amos concordam que 0 desenvolvimento teorico do campo da avaliacio nio se direciona ao processo de ensino-aprendizagem, mas aos processos de controle social e de distribmigo econémuca, Trazer a teoria para o didlogo tem 0 sentido de confrontar posigdes e fazer emergir contradiedes, nio percebidas ou no tematizadas, entre a teorta que se pretende articuladora da pritica submersas no fazer cotidiano. Queremos amplificar as vozes que se revelam/escondem nos discursas que organizam 4a pritica e naqueles que a tornam realidade. eas teort Gimeno Sacristin (1982) analisa a pedagogta por objetivos, vertente que desenvolveu ao masime a dimensio tenica da avaliacio escolar do rendimento dos alunos e alunas. As dectaragdes das professoras ¢ os documentos que orientam a prittca escolar dla avaliagio, que a alisamos, indicam-nos que esta proposicio (© que sabe quem erat continua exercendo forte influéneia sobre a construgio escolar do processo av: A avaliacio, na pedagogia por objetivos, inse cedimentos de racionalizacio da pritica pedagogica, aplicando 20 processo educanvo o modelo empresarral:a maror eficiéncra das priticas @ apontada como o caminho para aperfergoar © processo.A teorta ~ guia para a acio e instrumento normativo — presenta como prioridade para a educagio © desenvolvimento dos aspectos com maior potencial de aplicagio pritica media A agio escolar, visando a aumentar a eficiéncia das priticas que potencralizam a assimilagio ¢ reproducio dos contetidos, mint~ miza o cariter eriador do proceso de ensino-aprendizagem, 0 que limita 2 ago tanto dofa) professor(a) quanto dota) atuno(a). ¢ nos pro- A pedagogia por objenivos se apoia na psicologia compor- tamental, o que amprime uma aparéncia de que sew primero objetivo é facilitar a aprendizagem. Nao obstante, este enfoque no desenvolve explicagdes teorteas suficientes para uma melhor compreensio dos processos psiquicos humanos, que seria mis- pensivel para a melhora do processo de ensino-aprendizagem. Desconsiderando a complexidade da ago pedagogica, nio esta~ belece distincdes relevantes entre objetivos ¢ resultados e entre estratégias de ensino € processos de aprendizagem, Revela-se uma proposta eficiente para a avaliacZo dos resultacios demanda- dos por uma sociedade utilitarista como a nossa. A avaliacio se configura como um recurso instrumental, neuro, que di destague 4 linguagem técnica que utiliza, deveando 4 margem as questées de valor € 0 debate teérico. Os obyetivos fincionam como elementos de defimicio ‘operacional € consideram exclusivamente os aspectos que po- dem ser medidos. devem ser formulados de modo a possibilicar suia observacio, permitindo que se passe do mundo abstrato 20 nivel do diteramente observavel. Os objetivos propostos nio sio questionados porque se parte do principio de que o conteido & 110 A ambiguidade do proceso de ovaliagao sum produto acabado e a-histérico, sendo valorizada a dimensio utilitarista do conhecimento, Observa-se uma grande preocupacio coma formulae dos objetivos, que devem ser claros e de ficil compreensio, tendo como ponto de partida os obyetivos germs, estruturados como uma definicio mass global, portanto, mais ambiguos e ambiciosos. Com a aptesentacio de objerivos com significados concretos, uunivocos, que indicam as mudangas de comportamento desejadhs, aprisionadas na defimigo de um sentido tinico, busca-se ocultar a polissemia das palavras. Ao ocultar, revela uma questio ideol6aica, pots a selecio de significados ¢ demarcada por eritenos de valor. © processo educative & desumanizado. A descrigio deta- Ihada e estatica do comportamento dé énfase as categorias mas ‘mecimeas da aprendizagem, desconsiderando © homem ¢ 0 processo de aprendizagem como rotalidades complexas. O ensino, eso articulador de todo 0 trabalho, ¢ entendido como meca- nismo de transmissio, enquanto 3 aprendizagem se confere um papel passivo, tarefa de assimilacio, desprovida de significado. Seus tacos dominantes sio: linenridade, meorporagio do real através de fragmentos, gerando distorgio na realidade,e auséncia da perspectiva do suyeito que aprende, Neste Jogo de ensino- -aprendizagem ofa) aluno(a) & considerado um sujeito a ser moldado pela agio pedagdgica e na avaliagio ha identifi do resultado comportamer al com o resultado de aprendizagem, © conceito de aprendizagem ¢ bastante Jimutado por se referir 3s mudancas elservinvis de conduta. Refere-se quase ex- dlusivamente a0 aparente e 20 memoristico, menosprezando o proceso de aprender e as relacdes que se estabelecem e que nio se revela 1 imediatamente, Nao se ocupa da relagio sujeito-objeto no processo de conhecimento, com suas miiltiplas mediagSes ou das relacdes entre avaliador-avaliado, que sem qualquer diivida se estabelecem no processo de ensmo-aprendizagem.A avaliagio € proposta como um processo que compara a resposta doa) alunofa) a0 padro detimido pelos objenvos desenhados, 11 © que sabe quem erra? Segundo a anise de Gimeno Sacristin (1982), este modelo de avaliago, como parte de uma concepcia de ensino e de apren- dizagem, comeca a desestruturar-se com a crise da propria teorra comportamental, Esta crise € um reflexo das novas perspectivas de desenvolvimento humano que si incorporadas, gerando critcas importantes 4 perspectiva quantitatva, No entanto, apesar da crise tedrica,a concepeio de avaliacio por objetivos continua sendo uma referéncia para 0 condiano pedagogico, Barniga (1982) mantém a visio critica fazendo um corte mars profimndo: denunena a auséncia de uma teora de avaliacio verdadeira, Considera que © percurso teénco tem favorecido © desenvolvimento de uma teona de medida, permeada pela légica do exame, ¢ 2 criagio de mecanismos para oculti-ta sob uum conceito insuficiente de avaliagio. Interpreta¢io que poderia explicar, em parte, a dificuldade das professoras na construgio de um proceso de avaliagio que abandone a pers- pectiva quantirativa © primeno aspecto sublinhado pelo referido autor & a grande quantidade de estudos tratando da avaliagfo que no apresentam como questio fundamental a refe: © processo de aprendizagem. Os estudos centram a discussio nos 10 teérica sobre instrumentos de avaliagio, mantendo a perspectiva tecnicista € revelando molégica que sustenta sua lestura da realidade e 2 formulacio de suas propostas priticas. auséncia de uma anilise profi nda da base episte- Barnga afirma que as diferencas entre os trabalhos tebricos representam mats elementos modernrzadores do dliscurso do que ransformagdes na esséncia de seus principios epistemolégicos aprendizagem ¢ sociedade. Ambos mantém a Psicologia comporcamental como a base da teoria sobre a avalia- ¢fo, que, eito traduzindo, “a leva a efetuar uma reducio de seu objeto de estado, o homem, restringindo-o 20s fendmenos com- portamentais observivers no suyeito”. (BARRIGA, 1982,p. 18) sobre educa 2 A ambiguidade do procesto de avaliagae A visio mecinica do ser humano gera uma ideia igualmente mecinica do ensino € da aprendizagem, partes de um sistema de armazenamento e reproducio de informacdes, e sustenta a possibilidace de medira apren de conduta mais ou menos permanente nos sujeitos. igem,entendida como mudanga A primazia do pensamenco comportamental, que afirma que © nio observivel nio pode ser investigado, justifica e sustenta a dina nica tecnicista, Prescinde do convex (0 € da natureza do objeto de estudo, neste caso o processo de ensino-aprendizagem vivido por pessoas concretas no sistema escolar, porque nesta relacio existem aspectos que nfo podem ser observados ¢ ma- nupulados. Como os fenémenos no dmbito das ciéncias humanas sio constituidos de uma expressiva patcela que nio se presta a0 tratamento empirico, abandona-se a preocupagio com & sua totalidade. Ecos desta configuracio tedrica podem ser percebidos no cotidiano escolar. As professoras muntas vezes partem de uma concepeio que Ihes permite perceber a complexidade do proceso de ensino-aprendizagem da escrita, porém ainda no conseguem construnr uma pritica de avaliacio que ultrapasse os limites das mformacdes que podem ser observadas ¢ mampulacas, Encontram-se frente ao desafio de estruturar uma pritica capaz de incorporar as pistas que 1nformam sobre os fendmenos que nio sio imediatamente observivers e que s6 adguirem sentido hho territorio qualicacivo, Embora 0 proceso de estruturagio € transformacio do campo da avalia positnsta fo venha se dando nos marcos do paradigma as possibilidades t26ricas de andlise da avaliacio escolar nfo estio reduzidas a uma dinica perspectiva epistemolégica, As mudaneas propostas para a pritica avaliattwa decorrem de modificacdes nas disciplinas que se ocupam de explicar o de~ senvolvimento humano e as transformacdes operadas no cenar10 social, Os e1sos quantitattvo e qualitatwvo conduzem a dindmica 13 © que sabe quem evra? no mbito da avaliagio, sendo evidente a hegemonrz do para- digma quantitatwo. A quantificagao das qualidades: 0 positivisme como paradigma de praticas desumanizadas Aadeia de neutralidade do conhecimento demanda muta atencio com a avalia¢do, pois © ato de avaliar contém o risco de softer a interferéncia da afetividade, dos preconceitos, da subje- tovidade amplicita na prOpria palav com a atribuicio de valores, que podem se referir simultanea~ mente 4 qualidade € 3 quanndade. A subjetividade tem que ser ssolada, controlada, de modo a nfo contamunara anilise objetiva dos resultados, garantia da eficicia pretendida. anuliagie por seus vinculos Tendo a eficacia como obyettwo central, a avaliagio quan- ‘tanva se organiza fundamentalmente como um processo de controle da aprendizagem, sendo uma das priticas escofares em que podemos observar com maior nitidez o fomento a0 mdi vidualismo e 4 competicio. Numa dinimica social fortemente excludente, onde hi que se vencer a qualquer custo, a avaliacio contribu para que os(as) alunos(as) no desenvolvam uma real preocupacio com o que podem saber ou nio, e sim que valo- rizem findamentalmente a possibilidade de ganhar dos demats, ou seja, de obter uma pontuagio alta. Aprender, nesta perspectiva, nfo & tio importante como alcangar bons resultados nas avaliagdes, © que contributi para que as criancas se familiarizem com a estrutura hierdtquica e se cap tem a0 off de alinte (PERRENOUD, 1990).A nota obrida, que jo tem rela¢io real com o processo de ensino-aprendiz; passa scr o estimulo para a aprovacio, o que nem sempre ests relacionado com ampliacio e aprofuundamento do conhecumento, O marco tedrico que delimita esta pratica de avaliacio tem dduas dimensdes muito claras.A primera diz respeito 4 auséncis 4 A ambiguidade do proceso de avaliaga0 de preocupacio com a formula¢io de uma explicagio profun: da dos fendmenos observados. A segunda dimensio se refere primazia das técnicas empregadas para quantificar ¢ aumentar a dos resultados obtidos. eficici Como consequénea, a discussio sobre a avaliacSo da énfase a0 como fazer, Questdes como: por que se avalia,com qual finalidade, desde quais perspecavas, o que significam os instrumentos de svaliagio usados, 0 que significam as perguntas formuladas nos diversos instramentos avaliatvos € as respostas dadas, como os professores elaboram seus instrumentos de avaliacio, como os alunos e alunas chegam as respostas dadas, que relacdes existem entre 0 ato avalianvo e a pritica pedagogica em sua totalidade, como se explica o processo de aprendizagem de um mndividuo ou de um gropo, entre tantas outras, nfo sio significativas nas discusses tedricas e nas defimicdes priticas sobre a avaliagio. A.avaliacio deve fazer emergir a diferenga existente entre 1 estudantes: uma resposta objetiva a suas capacidades naturais. Alguns mas esforcados,mats estudiosos etc, © que se reflese em suas notas escolares. Aunda que se reconbeca a interferéncia do meio social nos resultados aleangados, esta diz resperto, funcamentalmente, a0 entorno familiar, que pode agudar a desenvolver, nos alunos ¢ alunas, uma consciéncia mais ou menos favorivel & vida escolar. 10 mais nteligente ‘Os mecanismes seletivos conduzem 0 processo de avalia- 30, que por sua vez serve 3 construcio de uma determinada representacio da realidade em que se ofisca a relanvidade do Julgamento da escola sobre as criangas. © rendimento escoiar & interpretado como uma sincese quantitativa cas qualidades, reve- ladas através das concluras observavers ¢ objetivamente recolhdas pelos procedimentos de avalia¢io cuidadosamence estrururados, aplicados e analisados.A nota (ou concerto) ¢ assumuda como uma informagio relevante sobre as qualidades do sujeito esfa- celadlo € tratado como objeto de anilise © que sabe quem errat A abordagem quanuitativa rompe com a humamdade da relacio ensino-aprendizagem e entre os fragmentos resultantes elege aqueles que se adaptam légica tecnocritica da sociedad. A recuperacio do sujeito escolar e 0 distanciamento do sujeito social © modelo quancitativo se mostra insuficiente para responder & complesadade da dinémuca social, ncluindo a agao escolar. Cr tucamente vio sendo formuladas concepedes em diversas ireas de conhee:mento, articuladas pelo subjetrvismo, que fandamentam a abordagem qualitativa da avaliagio escolar: © novo quadro teérico, no qual 0 processo de avaliagio & articulado, impde inovacdes ao papel atribuido ao avaliador, que passa a ser um "educador dos educadores” A avaliagio se apresen- ta como um fator significatwo da politica de formagio docente. Nesta perspectiva, renia-se a énfase do objeto de conhecimento, colocando-a no sujexto que conhece, na tentativa de mudar 0 exxo de anilise dos fenémenos observados. Hi uma relaivizacio da objevidade na cinema e o proprio conhecimento passa a ser entendido como parcial ¢ em grande medida determinado pelo sujerto cognoscente, A cransformagio na matriz te6riea, articulada js transfor~ maces operadas na sociedade, nio significa 0 abanciono total do positvismo. Se nio se pode falar de mudancas na légia do desenvolvimento soctoeconémico, ¢ evidente que a consolidagio da soctedade urbano-industrial e uma certa expansio da demsera- cia como valor apresentam novos problemas e simultaneamente cram novas condigdes, gerando outras formulagdes nos diversos campos de conhecimento. [nicia 2e um guestionsmento da pritica cientifice em si mesma e suas relagdes com a estrutura social dando inicio a um movimento de desdogmatizagio da ciéncia (SANTOS, 1993). 16 t | A.ambiguidade do proceso de avaliagao Neste movimento, destaca-se a tentativa de ruptura com © modelo de avaliacio por objetivos proposta pelo trabalho de Scriven (SHAKER, 1990). Embora se dinigisse priorttariamente a avaliacio externa de programas educacionas, constitur um ‘marco importante na reconceitualizacio do campo da avalingio a0 propor que o avaliador desconheca os objetivos do programa a ser avaliado, pors sua finalidade central é verificar a utilidade lo processo educacionat desenvolvido para 0 consttmidor. Busca avaliacio baseada nas necessidades do syjeito, assumdo como siyjciro consuuidor. Recomhece na avaliacio duas fianedes prinerpais: formative, realizada como parte do desenvolvimento do programa, cendo como funcio ausiliar seu aperfeigoamento, devenco ser feita pelos proprios participantes do processo com © objetivo de reconstruir 6 que nio funciona adequadamente; somativa, deve ser desenvolvida por agentes externos 20 programa buscando comparar os efettos alcancados com as necessidades dos consumidores, gerando uma valoracio sobre 0 produto oferecido em relacio aos demas. A avalagio somanea pode ser para que os adminstradores clcidun 0 eunicnlo completo, plido pela ublizago do pro coso avalianvo em sus pment forma (frau), representa un avango suficrscemente sigfieatwo sobre as alternanvas lsponives, par pstiica Ox gatos de ogo pr parte de um sem escoir. Fo que é mis mporane, oavaiador deve _yud os consunudoresa denefcae valorar os bens seragos stermvos. (STUFFLEBEAN, 1987, p. 241), ‘A vertence qualitatva é demarcada pelo declinte da mifluéncia do pensamento puramente racionalista ¢ concomitante ascens: das perspectivas naturalists & da elaboragio de propostas ecléa~ eat. Procitiose criar sum estilo earcterizadn pela flesibilidade nteracio e complesidade. Posteriormente, as fungdes formation & somativa do processo avaliacivo sio adaptadas pars a organiza¢io da avaliagio da aprendizagem (PERRENOUD, 19922, b) (© que sabe quem errat © sujeito que comhece & posto no centro do processo pe~ dagogico, sobrepondo-se a0 objeto de conhecimento, ¢ a énfase da relagio pedagogica & colocada no processo de aprendizagem As priticas escolares pretendem fivorecer a atvidade dos(as) alunos(as),havendo uma forte preocupagio no sentido de adequar as propostas a0 ritmo de cada estudante. Estas transformagdes se refletem na teoria sobre 2 avaliacio, que passa a atribuir grande valor a autoavaliacio e as propostas que levam o suyeito a elaborar suas proprias respostas Aaavaliacio assume como tarefa a apreensio das habilidaces Jif adquiridas ow em desenvolvimento, buscando compreender (0s processos cognitivos ¢ fazendo emergir os tragos subjetivos do individuo, Aceita-se 2 mterferéncia da subjetividade tanto na construco dos resultados observactos quanto em sua andlise, que aborcia também os aspectos afetivos do styeito que aprende e as condi¢des emocionats que mterferem na aprendizagem. Ese movimento de critica e de transformacio nfo se restrnge 41 teona. Mudam os dacios entendidos como necessirios 3 avaliacio, ‘que demanda novos instrumentos ¢ procedimentos. As perguritas echadas que esperam respostas padronizadas sio substituidas por formulacdes abertas que permitem ao sujeito construnr sua propria resposta revelanclo suas concep¢Ses, sentimentos, conhectmentos, habilidades, etc. A perspectva qualitativa mntroduz a necessidade de tratar a questio metodoldgica com pluralidade mator fle xibilidade, para que se possa desenvolver uma metodologie: de avaliagio sensivel as diferencas No amibito da pritica pedagdgica condiana, a nfluéncia da abordagem qualitativa nas anvidades avaliatwwas nfo chegou 3 promover uma transformacio no modelo de avaliacio. A mustura os dois modelos permit a reconstrucdo da pritica avaliatrya com ‘ senndo de ampliar a funco da avaliacio no processo educativo. Generaliza-se uma compreensio de que a avaliacio nio deve ser cio e exclusio dos alunos e reduzica a um mnstrumento de classifi ue e A ambiguidade do proceso de avaliagao alunas, mas deve constituit-se como unta ferramenta para a tomada de decisBes em todo 0 processo de ensino-aprendizagem, Nossa pesquisa indica a construcio de um modelo hibrido, que mantém como perspecava global 0 modelo quantiativo, sendo, de alguma maneira, suavizado pela melusio da andlise de alguns fitores subjerivos ia avaliagao do rendimento. As mudancas \troduzidas coscumam ser superficiats, nfo chegam a significar uma real cransformagio no paradigma da avaliagio. Muitas vezes observamos, tnto na sala de aula quanto nas propostas que chegam 4 escola, a manatencio da pritiea de avaliagio flandamentada na Logica classificatdnia € excludente, ainda que a pritica adquira uma aparéncia movadora e que 0 conceito de avaliacio escolar associa do a quantificacio do rendimento do(a) aluno(a) seje objeto de antimeras e profiindas criticas. Fala-se em avaliaglo de conteiidos, conceitos, procedimentos, atituctes, mas ha que se stntetrzar todo 0 proceso num conceito ou niimero (SANTOS GUERRA, s.d.) Aida que ndo se possa negara mcorporacio da abordagem qualitetiva como um avango na proposta de avaliacio escolar; ela nio é suficrente para a reconstrucio global da prisis avalianva, No funéo, © problema da avaliaglo no poder ser vista & analisado com outro enfoque enguanto subsite © meso paradiggna epsstemol6gico para sua andlise. E preciso tentar “uma rapeura epistemol6gics" com o trabalho realizado até 0 jo escolarsé preciso também revisar 46 as premissas upiswomologieas deste discurso, mas construtt uma proposgio teorico-epistemolégica diseinta, que se Fan= damente em outta concepeia de aprendizagem, homem ¢ soctedade. (BARRIGA, 1982, p. 17) Como se pode aprender da discussio realizada até este ponto, as mudancas impressas nas priticas de avaliagio escolar ‘aram transformacSes no paradigma epistemoldgico. As concepedes qualitativa ¢ quantitativa mantém o sujeito indi= nio signifi vidualizado e no consideram a dimensio socal da constieuicio ng © que sabe quem errat dia subjetividacte, de suas caracteristicas peculiares, de suas pos- sibilidades, de suas dificuldades,etc., conservam a concepcio de que € necessirio harmonizar o individuo as condicdes postas. A avaliacio se mantém como um procedimento vinculado 4 esfera do poder. O mesmo ocorre em rela¢o 20 conheci~ mento, que nio tem mtegtalmente assunnida sua caracteristica de construcio coletiva € histérica, necessariamente demarcada = mas nio aprisionada ~ pelo contesto social. © processo de ensino-aprendizagem, centrado no individuo, nio se constitu: como um processo mterativo: num modelo, a énfase € posta no ensino e no outro, na aprendizagem. A mudanca fundamental se refere a0 polo mais forte ~ quem € 0 sujeito € quem é 0 objeto ~ € no 4 concepeio em s1 mesma. Em ambos os casos as priticas escolares estio subordinadas As praticas socims, mas esta subordinagio é mascarada pela excessiva mdividualizagio do processo de aprendizagem. Por nfo romper com alguns aspectos centrats da légiea po~ sitivista, mesmo rompendo com outros, abordagem qualitativa da avaliagio escolar serve para “arejat” 0 processo pedagogico, imobilizado pelo modelo quantitative. Nio podemos ignorar que a construcio teérica sobre as pritieas escolares, ncluindo a avaliacao, € um processo articulado, 20 desenvolvimento cientifico, tecnico € social.A avaliagao esco- Jar se mantém fundamentada em teorias de cariter conservacor que entendem a educacio como nma atwidade a servigo la reproducio social.A andlise proporcionada por tais formulacdes, tedricas faz com que os determunantes sociais da avaliagdo escolar sejam frequentemente ocultados pela pretensa objetvidade neutralidade que fundamentam as eas avaliacivas. 120 A ambiguidade do proceso de avaliagao Crises, dilemas e perspectivas paradigmaticas As continuas modificacdes realizadas nos instrumentos de svaliagio (especialmente no modelo quantitative) e em alguns de seus concertos (como na transformacio quannitativo/ qualicanvo) sho alguns eventos intraescolares, que refletem, ¢ contribuem para dar visibilidade 8 existéncia de uma crise no paradigma atual de ciéneia (KUHN, 1975). A redefinicio instrumental que caracteriza 0 desenvolvi~ mento da abordagem quantitativa pode ser interpretada como elemenzo constituinte de uma crise de resciento do patadigma positivista que demarca 0 desenvolvimento das teortas relativas & svaliagio. No caso da avaliacio escolar sio criadas novas escalas, tenta-se aperfeicoar os nstrumentos de coleta e anise dos dados, modifica-se o modo de apresentacio ¢ corre¢io dos exames, ou tantas outras mudaneas feitas com 0 objetivo de tornar a pratica avaliativa cada vez mats precisa, neutra e objetiva. A consttucio do modelo qualitavo imprime mudancas de ourtra natureza e pode revelar uma arise de degenerscéncia que coloca em questio a propria forma de inteligibilidacle do real que um dado paradigms proporciona © nio apenas os snstrumentos meto- lolgyicos e concepeuats que Ihe dio aces, |] A reFlexio, epstemol6, cconstruges anestes no paradigana em erie, SANTOS, 1993) uica & a consciénen eeonea da precariedade das A vertente qualitativa da avaliacio mtroduz aspectos que levam a uma mudanga na reflesio epistemoldgica, Embora a prittea pedagdgica permanega delimitada pelo modelo positivista, observamos o movimento que denuncia sua msuficiéncra para responder as demandas cotchanas coexistinda com outro que opera no sentido de stta reconstrugio tebrico-pritiea,a partir da teflexio sobre a producio do conhecimento cientifico. i © que sabe quem errat © movimento de permanénea/transformacio da nacureza da refiexio implicita no debate sobre a avaliagio pode ser en- contrado em diversos estudos. Numa anilise de corte te6r1co das diversas perspectivas desenvolvidas no ambito da avaliag¢Zo, Guba e Lincoln (1989), por exemplo, afirmam que este movimento for marcado por um processo de evolucio predommnantemente con- ceitual em que a perspectiva técnica vai sendo posta em discussio € vio sendo feitas novas exigéneias € usadas novas abordagens {que expSem 05 limites da perspecuva posttvista ‘A anilise do contexto escolar também aponta 0 esgotamen- to do modelo ceérico-epistemologico que define a avaliagao. Othando para o movimento de reconstrugio do processo de endizagem, Perrenoud (1992b) realiza wma in teressante anilise da dificuldade vivida nas priticas pedagogicas cotidianas no momento de desenhar e desenvolver uma avaliacio de nova qualidade, Entre os principais fatores que dificultam a mudanga, Perrenoud indica a necessidade de nip com nt modo de entender a avaliagao que privilegia a homogenextade dos procedimentos, processos ¢ resultados visindo a construcio de padres que permutam a produgio de merarquiss aparentemente neutras € objetivas, dando ao conhecimento tuma fe1gio p minea, cujo objetivo principal é a aquisicio de determinedas notas ou concertos. avaliagio da 4 Estes trabalhos detxam claro © descompasso entre 0 de- senvolvimento de uma critica tedrica a pritica avaliativa escolar © a formulagio de teoras que fundamentem a construcéo de priticas realmente novas que consigam romper com © para digma dominance, Suas and por Barriga (1982), que tomamos como aspecto significativo nesce trabalho, de que € udispenisivel cealizat unt eaptia cone 1 paradignna episte para que se possa formular uma teoria de ava lises confirmam a idera apresentada rlfgica que encunscteve o processo avaliativo , superando os limmtes da teoria da medida, ¢ tmplementar praticas pedagogicas com novos significados. 12 ‘A ambiguidade do proceso de avaliag3o © processo escolar constituido sob o prisina do pensamento liberal e do paradigma positivista determinou uma pricica de avaliacio essencialmente classificat6ria, A implementagio de politicas educatwvas de carter neoliberal pode tornar ainda mais dificil a reconstrucio do sentido da pe: medida gue a tendéncia do processo social rornar mais agua a sele¢o e ampliar a exclusio social. Como a exclusio se mascara no dis- curso das diferengas individunis e da qualidade educativa,torna-se bastante dificil na vida escolar cotidiana desvelar os aspects que ea avaliaciva, jem seu carter exclucente. A.compreensio deste processo demanda 0 desenvolvimento, de uma atuagio pedagégica atenta aos conflizos, contradicdes, fissuras, fragmentos, vozes que constituem o panorama escolar & que se escondem/revelam nos episodios coudianos, A avaliacdo como pratica de incluso: uma perspectiva te6rico-pratica em construgao As diversas atwidades escolares no sio individualmente estruturadas, ainda que possam adquirir a aparéneia de procedi~ mentos isolados. As priticas so articuladas por fios tedricos que Ihes dio significado ¢ coesio, nio se pode modificar as priticas, como por exemplo a pritica avaliativa,sem tocar nos fandamen- tos re6ricos que as sustentam. A redefinigio da teotia e da pritica da avaliagio escolar 38 se torna possivel dentro de um processo de reconstrucio do sentido da acio da produco de conhecimento em sua totali- dade, No que diz respeito 3 avaliacio, a busca de cientificidade fem sido um dos marcos centrass.A negacio do senso comum e fiew com 0 tied leginmo, resultam de uma determnada cosmovisio que no indaga seus proprios funcamentos © que sabe quem ertat redimensionamento do concerto de avaliagio escolar articulado pelo compromisso com a democracizacio do ato pedagogico, tem como caracteristica ser uma atvidade mats par- tieipatwva, desenvolvida através de um processo continuo. Deste ponto de vista, a teoria sobre a avaliacio precisa assinalar, para a atividade docente, estratégias que possam ayudar alunos(as) € professores(as) a compreender e mtervir no processo coletiwo de construcio de conhecimentos. Voltamos 20 concerto de dupla rprita epistemokiiea (SAN= TOS, 1993) para tomi-lo como um dos fios com que tecemos a reconstrucio da pritica avaliatwa, Este conceito aporma aspectos, importantes para a rediscussio e mcorporagio do senso comum, como conhecimento relevante ¢ necessirio 4 redefimeio da ce- orta sobre a escola e das praticas desenvolvidas em seu cotdiano, A base teérica do atual processo de avaliacio @ fiaturada quando 0 conhecimento cientifico deixa de ser 0 timco conhe- camento considerado legitimo.A ampliagio dos conhecinentos validados implica © questionamento da esisténcia de um anico modelo de respostas adequadas a partir do qual frequentemente se faz a avaliagdo, Estas mudancas mviabilizam a manutenco da avaliacio dentro do modelo atualmente predommante por questionar o sentido a ela atribuido. Tendo como horizonte a construcio de um senso comum renovado pela incorporacio das contribuiedes apresentadas pelo conhecimento cientifico, que também se redefine pela incor~ poracio do senso comum, sio apagados os cnsino ¢ aprendizagem, poss 0 significado do processo se di pelo logo entre os diversos saberes socialmente constituidos. Hi um fortalecimento do intercimbio entre os diferentes compo- nentes do processo de ensino-aprendizagem, na medida em que todos(as) possuem saberes e roctos(as) estio em permanente pro- cesso de ampliagio do conhecimento individual e coletivamente formulado. O senso coun renorado que nos propde Santos (1993) 124 ‘A ambiguidade do processo de avalia: pressupde 2 construgio de relagdes democriticas e horvzontais entre pessoas, grupos, instituncdes ¢ conhecimentos, Obviamente ssto representa uma dificuldade a mats numa sociedade tio hie~ rarguiizada e exclucente como a nossa No atual quactro de valotes, o senso comum & anterpretado como um conhecimento de “menor qualidade” que deve ser superado e substituido pelo “conhecimento cientifico”, nio se recomhece sett papel ativo, ¢ positivo, na producdo das sderas sobre a tealicade ¢ das formas de mnteragit com ela.A relagio € proposta unicamente desde a compreensio de que 0 senso co- mum esti constituido pela passividade e desprovido de capacidade de critica, Segundo Mészitos (1996), wma concepgio errénea que se apora na conclusio de que © senso comum “incernaliza” as dificuldades proibiavas de se entar no cammnho de uma verdaderra mudanga estra- ‘ral ~ mudanga que apresentaria uma alternatwa radical para © sistema estabelecido em sua toralidade ~ no apenas como dificuldades, mas como uma "impossbilidsde” pratca (MESZAROS, 1996, p. 539-540), Esta interpretagio do senso comum e do conhecimento caentifico se fundamenta na distin¢io ¢ antagomismo entre ig- norinaa € conhecimento, entre falso verdadewo, entre erro € acerto. Vemos, portanto, que a conclusio & equivocada porque a compreensio parte do pressuposto equivocacio de que 0 cienti~ fico ¢ necessariamente verdadero e certo. Morin nos mostra que todo conhecimento traz em sua origem verdade e erro, Nossas tas rio so reflexos do real, mas traducaes dele Esas tradtugdes comarama forma de mucotogis, de rligibes, de ae de teorias.A parte dab, come tod trachigde comport sco de erro, as radugdes mtolégieas, eligiosss, ideologies, ar uncessancemente indmezos £1708, [a CO aparecimento dh iden de verdade agrava o problema do corto, porgue quem quer gite se alge possuider da verdade

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