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Pavlov Skinner | “Apenas uma coisa na vida tem um interesse verdadeiro. para ns — nossa experiéncia psiquica. Mas seu mecanisme foi € permanece ainda co- berta de mistério. Todos 0s recursos humanos — arte, religiao, literatura, f fosofia € cé@ncia histérica — se combi naram para lancar juz nessa escuri- dao. © homem tem & sua disposicgo ainda outro recurso poderaso; a cién- cia natural cam seus métades estrita- mente objetivas.“ PAVLOV: Os primeiras passas certs no caminho de uma nova investigagso “AS principals reagoes_nerwasas do animal e do hamem sio inatas c tom a forma de reflexos. PAVLOV: © trabatho dos grandes he- mistérios cerebrais “Do meu ponto de vista, a psico- logia da Gestalt é uma das tentativas menos bem-sucedidas dos psicélogos. Seu papel, eu penso, ¢ inteiramente negative.” PAVLOV: Critica da Psicologia da Ges- talt "A linguagem € um conjunto bem conhecido de contingéncias reforgado- ras. Burame centenas de anos, as ho- mens falaran sem a beneiicio das re gras codificadoras, Algumas sequén- clas de palavras eam mais eficazes, outras menos, ou simplesmente nao 0 cram. A descoberta da gramatica foi a descoberta das propriedades bastante estaveis. das contingéncias mantidas por uma comunidade,”" SKINNER: Contingéncias do Reforgo Os Pensadoré$ 83-1334 CIP- Brasil, Cotalogacdu-na-Poblicagao- Cimara Brasileira do Livro, SP Paviae, Ivan Powovich, 1849-1936, ‘Textos escolhides / Ivan Petrovich Pavlov; tradugdes de Ra chel Moreno, Hugolino de Andrade Uflaker ¢ Elena Olga Maria Andeea Continpéncias do reforgo | Bucrhus Frederic Skinner; tradugie dle Rachel Moreno. — 2. ed,— Sto Paulo: Abril Caltural, 1984, (Os ponsadores) Inclui vida e obra de Pavlov © Skinner. Bibliografia, 1. Comporiamenta turmano 2. Psicologia fisialdgica 3. Relexos con- dicionadoy 4. Reforgo (Psicologia) L, Skinner, Burrus Frederic, 1904 - il. Titulo, UL. Titulo: Contingéncias do reforen, IY, Série, eDD-152,322: -150) indices para catillago sistenviticn: 1, Comportamento humany : Psicologia 150 2 Psteologia fisioligica 152 3 Reflexes condicionados ; Psicologia experimental 192.3224 4. Reforg Psicologia 152.3224 AVAAIN FEINRWVICTIFAYLUY TEXTOS ESCOLHIDOS Tradugdcs de Rachel Moreno (1. il, IV. Vi, VII. XI), ‘Hugotino de Andrade Uflaker ¢ Elena Olga Maria Andreoli (MY, VOT, EX, BURRHUS FREDERIC SKINNER CONTINGENCIAS DO REFORCO Uma Anidlise Tedrica ‘Tradugies de Rachel Moreno EDITOR: VICTOR CIVITA ‘Tiealos or Texins de 1. P. Pavios *STive First Sure Steps Alen the Pah of New Investigation’ “Experimental Psychology and Peyckopathotigy in Auituals”” “Seientific Study of the So-Called Poychical Processes ithe Higher Animal” “the Concept of the Reflex and as Extension The Conditioned Reflex" The Batablishment of Sleep” Hypnotic Stages in Dogs: Parsdaxical and! Ultraparadoxical Phases of Diffuse Uahibition"™ “Lactates on tee Work af Corebral Hemispheres: Lecture Ce" Reply of a Physiologist to Psychologists" ‘“Feagaients of Statements at the 'Wedacsday’ Gathiriags. Stugyle af. P. Paviov against Ideatisia" “An Attempt of « Physiologist to Digress into the Demin of Psychiatry” ‘Texto te B. F, Skinners Contingencies af Retrfarccment: A Theurediedl Analsis © Copyright Abs $A. Cultural, Sia Paula, 1980 — 1 ealigto 198d ‘Texto publicada sob licenga de Prentive-Hull, te, N, J., USA, (Coniegencias de Reforcos- Original \aag wage edition. published by! Copyigh © 196) by Mente: he Allies cose Trhcuoes peblicaas sob licenga de Hemus - Levrana Editora Lida., $0 Paulo: “A Prigologia ¢ a Psicopatologia Experimentaic dos Anlusis "0 Reflexe Condictonadn’” ‘0 Trahatho dos Grades Heomicterios Cershraie* ““Resposta de ua Pisidlogo eos Psicdioga ‘"Frapmentas dos Debates Palestray das “Qhusetas- Peas! ireitiisexelusivos sobre as demass aradugies deste volume, ‘Abril S.A. Cultural, ip Paulo, Diteitis exttusivis sobre "*Paviow — Vida ¢ Obes” # 'Sidoiner — Vida-e Obra”, Absil 8.A, Cultural, S80 Palo, PAVLOV VIDA E OBRA Consultoria: Antonio Branco Lefevre {x Petrovich Pavlov nasceu a 14 de sotembro de 1849 em Rya- zan, ha Rassia central. Seus estudos foram iniciados no semina tio da cidade natal e continuados na Universidade de Sao Petersbur. 30, onde trabalhou scb a diregdo dos fisiologistas Ousiannikov © Cyon, Em 1883, doutorau-se em medicina e dirigiu-se 3 Alemanha, a fim de trabalhar com Karl F. W. Ludwig (1816-1895) @ Rudolph Hei- denheim (1834-1897), Retornanda & Russia, em 1890, assumiu a ca- deira de farmacologia da Academia Militar de Medicina de Sia Petors- burgo @ dirigiu a construo do primeiro centro cirtirgico do munde, Em 1891, passou a lecionar fisiologia e dedicau-se aos problemas do funcionamento do pancreas, obtendo uma medalha de ouro pela va- lor desses trabalhos. Depais disso, Pavlov resolyeu estudar o panel do sistema nervar so sobre 9 coracaa; em seguida, espantado pela imprecisio do que se conhecia na época sobre os fendmenos da digestéo, passou a se apro fundar nessa drea, realizando experimentos que se tormaram clas tos. A publicagdo dos resultados dessas pesquisas, em 1897, valeu- Ihe a obtencio, sete anos depois, do Premio Nabel. Contudo, seria um outro Campo de estudos que the conferiria lu gar de maior relevancia dentro da histéria da citncia, Desde 1901, Pavlav dedicou-se a pesquisas sobre secregdo sulivar ¢, a partir dat, comecou a estudar os reflexos condicionados, demonstrando sua de. pendeéncia des hemisférios cerebrais ¢ criando um novo métode de in- vestigagiio do cérebro, de suas fungées ¢ de suas relagdes cam 0 meio externa. Uma teoria revolucionaria Em 1927, foi criada a cidade-laboratério de Koltuchi (mais tarde chamada Faviovol, onde Pavlov, até sua morte, em 1936, concen- trou-se na aplicacao dos principios do condicionamento aos proble- mas de clinica priquitrica. vill PAVLOV Dos trabalhos de Pavlov a parte mais conhecida, e também a Sue acarretou as mais amplas censeqtencias nos terrenos da psicolo- gia © da pedagogia, refere-se as estuxlas sobre os reflexos, sobretu- do, & teoria dos reflexes condicionados, Para Pavlav, um reflexo comporta seis elementos que formam uma cadeia: primeiro, uma estimulac3e que pode ser uma cor, um som etc.; segundo, um orgdo receptor (olho, ouvido, receptores olfati- vos © gustalivos, comiisculos receptores da sensibilidade superficial ‘ou profunda); terceito, uma terminagdo nervosa quic transmite a exci- fagdo a Um centro nervoso; quarto, um centro nerves, constituldo de indmeras células, cujas sinapses permitem circuits miltiplos para a difus3o do influx nervoso recebido; quinto, um nerve efetor, que transmite © impulso desencadeador da resposta: finalmente, um Or- a0 (figado, estémago, glandula salivar etc.) que efetua a resposta. Es- sa cadeia constitu os refiexos que Pavlov chama de inatas ou absolu- tos; eles formam 0 proceso basico de tode © comportamento nao aprendido @ sio necessdrias, mas nao suficientes, para a unidade do organisme com @ munda externa, © segundo tipo de reflexos investigados por Pavlov sdo os refie- xos condictonados. A diferenca dos primeiros, os reflexos condiciona- dos nao sio inatos ou absolutas, dependendo sua existéncia das expe- rigncias pelas quais passam os organismos vivos em seu relaciona- mento com o mundo extarior. Pavlov desenvolveu a teoria dos réflexos condicionados a partir de suas famosas experiéncias com cies. Inicialmente, a fisidlogo rus- $0 investigou o compartamento inato ou absaluta dos cées, calculan- do com exatidac a saliva gue os mesmos produziam ao ser-lhes apre- sentado um pedaco de carne, Depois ce bem conhecida esse m nismo, Pavlov passou a tocar uma campainha, ao mesmo tempo que apresentava a came aos cies; depois de repeltidas experiéncias nesse sentido, conseguia obter a respasta (salivagao}) ao simples toque da campainha sem apreseniagio da carne, Em outras palavras, 0 cio pas- sou a dar a mesma fesposta a um estimulo associado ao primeiro, A esse novo tipo de comportamento, Pavlov deu o name de "reflexo condicionado” @ chegou & elaboragdo de uma teorla fundamental pa- fa @ conhecimento do animal e do homem, inclusive em seus niveis superiores de organizacsa, como a linguagem eo pensamento. Segundo Pavlov, as leis principais que regulam os reflexos candi- clonados s40 quatro. A primeira diz qué toda resposta condicianada 6 resultado da repeti¢aa de um comportamento, associado a certo es- timulo e seguido sempre de uma recompensa. Assim, fazendo-se soar yma campainha sempre que se oferece carne a um cao, depais de ra- petidas vezes o cio salivard 20 simples soar da campainha, nda sen do necesséria a visdo da came, Por outro lado, a resposta “‘saliva- C40", referida samento.& came, é uma resposta Incondicionada. Uma segunda lei deserave a extingaa do roflexo condicionada. Is- so acorre quando, depois de estabelecida um condicionamento, 0 es- limulo — “som de campainha’’, por exemplo — nao & repetidamente acompanhado de recompensa. A terceira lei mostra como uma resposta pade ser retardada. E 0 que acantecerd se for estabelecica um invervalo de tempo entre 0 esti- mulo ‘som de campainha"’ © ¢ oferecimento da carne, Nas primeiras VIDAEOBRA IX vezes, 0 cdo salivard imediatamente apés ouvir 0 som, mas pouco a pouce atrasaré sua resposta. Finalmente, uma quarta lei é a de condicionamento seletivo. Ao se fazer sear alicrnadamente duas campainhas de sons ligeiramente diferentes — e s@ 0 C30 for recompensado em apenas um dos casas —, inicialmente ele salivara tanto para uma como para a outra, mas Jogo faré uma selegao, respondendo apenas a que é acompanhada de premio. Novos rumos para a ciéncia Aa lado da teoria dos reilexos condicionados, Paviov fez outras contribuigées importantes para a ciéncia. Desenvolveu uma teoria da unidade funcional do cérlex contrapando-se ds teorias classicas das localizagoes cerebrais. Fara Pavlov, 0 cortex cerebral apera sinteses, constituinde cadeias, associagées, ‘reflexos corwlicionados, que for- mam esteredtipos. Estes sio dindmicos, tencem a persistir, nda sio de- finitivos e so modificavels em fungdo do desenvolvimento de novas. excilagoes € inibigdes, Todos os processes entram em interagiio € con- flito, desenvolvendo-se para produzir um comportamento qualquer, ‘om um “sistema dindmico grandiosa”. Em Intima vinculagso com suas idéias sobre a unidade funcional do cértex cerebral, Pavlov desenvolveu uma teoria dos tipos nervo- 508, COMUNS aos animais € aos homens. Esses tipos sdo o colérico, o sanguineo, 0 fleugmética e o melancdlico; todas eles seriam resultan- tes de ume heranca nervosa da espécie, mas estariam sujeitos a modi- ficagées, em fungao do meio, nao implicands, portanto, nenhum fata lismo ou predestinagao obrigatoria ou hereditaria, Outro campo de investigagao em que Pavlov fez contribuigocs importantes foi 9 da fisiopatolagia cértico-visceral. Em sua época, os médicas tinham perdido de vista o conjunto do organismo sadio ou doente, bem como as relagdes com o mundo circundante. No maxi- mo, justapunham fatos sem aprofundar caracteristicas particulares, tendo chegado a algumas tentativas de sintese: as “teorias” humoral ¢ do simpitico, Pavlov mostrou que no se pode reduzir 0 conjunto dz fisiologia e da patalogia as atividades normais ou anormais dos fa- tores humorais, sobretudo dos endécrinos, sem levar em conta o siste- ma nervaso, Unindo; assim, 0 cortical e 0 visceral, lancou as funda- mentos da medicina psicossomatica e desenvolveu inimeras investi- gagdes sobre as neuroses experimentais. Provocando sobrecargas ner- vosas em suas Cobaias, Pavlov conseguia reproduzir manifestacdes pa- toldgicas, como eczemas ¢ atites, Indmeras foram as conseqiéacias e aplicagdes praticas das des- cobertas de Pavlov. Entre outras, 2 sonoterapia, que permite a restau- ragio de processos nervosos alterados; os tratamentos quimioterdpi- 03, que modificam a dinamica cerebral; as lécnicas de parto sem dor etc. Para a histdria das idéias em geral, a extraordinaria contribui- gio de Paviov constitui uma das mais completas concepgdes cientifi- o-naturalistas do homem, que levaram a psicologia ¢ a pedagogia a se libertarem de pressupastes metalisien-ospiritualistas, tradicionais No pensamento cristao ocidental, x PAVLOV Cronologia Bibliogratia 1849 — Petrovich Pavlov naxce em Ryazan. Russia, a 74 de sotembre 1867 — Pavlov entra na Universidade de Petersburg, 1879 — Formarse em modicina, 1881 — Casa-se com Seraphina Karchevskaya. 1983 — Doutorrse em medicing com uma tese sobre inemacao de cara Glo. 1884-1886, — Trabalha na Alemanha.com K. Ludwig eR. Heidenhein. 1888 — Rescobre os nervos OU Borie 1889 — Escreve sobre “alimentiac sinnilada” ¢ “secrogdes psiquicas” gds- (rica. 1890 — Assume a cadcira de Farmacologia da Academia Miliiar de Medici a, 1891 — Ditige 4 constragio do departamento cintirgica do Instituto uke Metli- cine Experimental, no qual € chete de departamento. 1895 — £ nomeade protessor de fisiofogia na Academia de Medicina Mili- lar. 1897 — Publica seus trabiliwos sabee a atividade das glindulas digestivas 1901 — Pavlov comera suas pesquisas sobre secregiae saliva. 1904 — Recebe o Prémia Nobel 1906 — E eleifo memlbro da Academia Russa de Citncias, 1907 — Eeleito memlue estrangeiza do Rayal Society, de Lonaes, 1924 — Dermte-se da Academia, esr protesto contra 2 dscrinitnagdo. ant clerical. 1928 — Estuda ¢ aplicagde de seus princioies de candicionamento em ctini- a psiquiiirica, 193 — £ eleito membra hanorétia do Royal Colloge iof Physicians div Lon- re 1936 — Morte em Leningrad, no dio 27 de fevereina, Astatvan:E. A. Ivan Petrovich Pavlov, Mis Life and Work, Moscou, 1953: Baskin, 8, P.: Pavkay: A Biography, Chicago, 1960, Plarono. K. Lt The Word as 9 Physiological ane Therapeutic Factor — The Theary and Practice af Psychoierapy According to Ivan Petrovich Paviev, Moscou, 1954, Was. H. X.: Pavlov and Freud, 2 volumes, Nova Yorke Londres, 1962, Frowov, ¥. P.; Paylav and His Schoo! — The Theory of Conditioned Rerlexes, Nova York © Lortdras, 1947, IVAN PETROVICH PAVLOV TEXTOS ESCOLHIDOS ‘Tradugies de Rachel Moreno (1, 112, 1V. V1, VI, XI). Hugolino de Andrade Uftaker c Elena Olga Maria Andreoli (UM, ¥. VIN, IX. X) tf OS PRIMEIROS PASSOS CERTOS NO CAMINHO DE UMA NOVA INVESTIGACAO"* Nifo é por mero acaso que todes os fendmenos da vida humana sio domina. dos pelo pao nosso de cada dia — o mais antigo clo de ligagdo de todas as coisas vivas. incluindo o homem, com a natureza circundante. O alimento, que acha seu caminho no organismo, no qual sofre certas modificagdes — dissocia-se, entra em novas combinagdes, ¢ novamente se dissocia — corporifica 0 processo vital, em toda a plenitude, desde as propricdades fisicas elementares do organisa, tais como a lei da gravidade, a inércia, ctc., ds mais altas manifestagdes da natureza humana. O conhecimento preciso do que ecorre com o alimento, adentrando o organismo, deve ser o objeto da fisiologia ideal, a fisiologia do futuro. A fisiologia contemporfinea pode apenas engajar-se na acumulagao continua do material necessirio 4 consecugio desse objetivo remoto. O primeiro estagio, através do qual as substéncias alimenticias, intraduzidas de fora, devem passar, ¢ o canal digestivo; a primeira agdo vital exercida sobre essas substiincias, ou, para ser mais exato ¢ objetivo. sua primeira participacio na vida, no progesso vital, é efetuada pelo que conhecentos come digestio. © canal digestivo é uma espécie de tubo que passa ao longo de todo o orga: hismo ¢ esti cm comunicagin com o mundo externo. isto 6, atinge também a superficie externa do corpo, mas esté virado para denwo ¢, consegientemente, ooulto no organismo. © fisidloge que-consegue penetrar cada vex mais profundamente ao canal digestivo se convence de que este consiste em uma séric de Laboratérios quimicos. equipados com virios csquemas mecanicos. Esses esquemas mecanicos si for- mados pelo tecido muscular, que € parte constitutiva das paredes do canal digesti- vo. Eles tanta facilitam a passagem dos components alimentares de um labora- rio para cutro, como Os retém, por algum tempo, num determinado laboratério, ou, finalmeate, expelem-nos quando cles provam ser prejadiciais ao arganismo. Além disso, participam do processamente mecdnico do alimento, acclerando a agao quimica sobre o mesmo, pela mistura compacta, ete. O tecido glandular especial, que & parte constituinte da parede do canal Gigestivo, ou fica 4 parte na forma de massas separadas, comuni¢ando-se com ele através de tubos de ramificagio, produz reagentes quimicos*, os chamados sucos ' Diserrso do Pranic Nobel, conferido em Baoccime, a 12 de dezembro de 1904, > Substineia que produs uma reagan epshecida ecgractessiica cin owva subptinaia, 4 PAVLOV digestivos, que fluem em segmentos separados do tubo digestivo. Os reagentes, por um Lado, so solugdes aquosas de conhecidas substancias quimicas, tais como Acido hidrecloridrico, soda, etc. por outro lado, sio substincias encontraveis somente no organismo vive © que dissolvem os principais componentes do ali- mento (proteinas, carboidratos, ¢ gorduras) com muito maior facilidade, isto & muito mais rapidamente ¢ numa temperatura mais baixa, e em quantidades meno- Tes qué quaisquer outras substincias estudadas quimicamente. Essas substancias, que tanto funcionam Ja visro,* coma no canal digestivo, ¢ que, portanto, sao obje- to natural da investigagio quimica, tém sido até agora de dificil analise. Como é sabido, clas silo chamadas fermentos. * Dessa deserigio geral do processo digestt- ‘vo, cu me voltarei para os aspectos relativos a esse processo estabelecido por mim ¢ pelo laboratdrio, de qual sou enearregado. Em assim fazendo, julgo ser meu dever lembrar, com profunda gratidao, meus inimeros colaboradores de laboratério, Para investigar o desenvolvimenta da sccregio nas glindulas digestivas grandes, * que se comunicam com o canal digestivo através de ramificagies de tubos, cortamas pequenos fragmentos da parede do canal digestivo, em cujo cen- (ro se enconiravam as aberturas normais dos dutos secretérios. Nés, entio, castu ramos as aberturas na parede do canal, os fragmentos cortados cam as abcrturas dos dutos secretores foram suturados ds partes correspondentes na superficie da pele, do ludo de fora, Gragas a esse procedimento 0 suco fol desviado do canal digestivo ¢ coletado em recipicntes especiais, Para coletar 0 suco produzido pelas glandulas microscépicas, localizadas diretamente na parede do canal digestivo, grandes fragmentos foram cortados dessas paredes ¢ foram feitos quistos artifi- siais com aberturas para o lado de fora, No caso do estémago, a preparacdo dos quistos urtificialmente isolados envolveu sempre o seecionamento des nervos das célulax glandulares, ¢ isso, naturaimente, desordenou o trabalha normal do estamago. Levando em conta as relagées anatémicas mais delicadas, modificamos a ‘operagao de tal forma que deixasse as vias nervosas normais intactas, quando se fazia um quista isolado das partes da parede do estémago. Finalmente, ja que 0 canal digestivo é um sistema complexe, assim dizendo, uma porgio de laboratérios quimicos separados, eu costumava cortar a comuni- cagio entre eles, de forma a investigar a ocorréncia de fendmenos em cada labora: t6rio particular; ew dividi, portanto. o canal digestivo em varias partes distintas. Isto, € claro, exigia passagens répidas ¢ convenientes do exterior para cadu labo- ratorio separado, Para isso, estiveram em constante uso tubos metalicos, Eleg slo Introduzidos nas abernuras artificiais, * e, durante os intervalos entre as experién 4 Osorrende fora de arganivmo vivo, geraimente awin (cipitate de vidro, como um tubo de easaio ow * Hoje. setiam mais provavelmente channades enaimas. * Pavioy serefere squi a drgios como w pancreas, * citar pode encontrar um termo malt tignivw para es abertura, como por excmplo ital: sias, podem ser fechados. Dessa forma, freqtientemente realizamos Operagdes bem completas ¢, algumas vezes, muilas aperagGes em um dmico animal. Carece dizer que 0 desejo de cumprir @ nossa larefa com maior confianga, para evitar perda d¢ tempo ¢ trabalho, ¢ para poupar o animal tanto quanto possivel, fez-nos observer estritamente todas as precaugdes tomadas pelos cirurgides com seus pacientes. Aqui, também, tivemos que aplicar a anestesia prépria, observar limpeza impeca- vel durante a operagda, providenciar compartimentos limpos depois da operagio, ¢ observar meticuloso cuidado com os ferimentos. Nossos saudaveis € felizes ani. mais ficeram seu trabalho de laboratério com verdadeiro. Prazer. Eles sempre saiam de suas jaulas para o laboratério ¢ Prontamente pulavam sobre as mesas onde nossas experiéncias ¢ observagSes eram conduzidas, Em noysas observagies em cies, logo notamos 0 seguinte fato fundamental: 9 tipo de subsiéncias que entravam do mundo externo pare o canal digestivo, isto €, quer camestiveis, quer ndo, secos ow liquides, tanto quanto as diferentes subs- tancias alimentivias, determinava 0 principio do trabalho das glandulas digesti vas, as pecutfaridaces de seu finclonamento em cada ceso, a quantidade de rea- Gentes produzidos por elas e sua composicado.? Isso pode ser provado por intimeros fatos, Veja-se, por exemplo, a formacao de saliva petas ghindulas salivares muco sas. Com cada refeigio, quando substancias comestiveis se introduzem na cavie dade oral. uma saliva grossa ¢ viscosa contende muito muco brota dessas glandu- las. Com a int odugio de substincias ofensivas, como o sal. Acido, mostarda, etc,, na boca do animal, a saliva pode brotar na mesma quantidade que no primeiro CuSO, Mas sua qualidade é bem diferente — é fluida e aguada. Se forem dados ora carne, ora pio comum uo cio, sendo iguais ay outras condigdes, a secrecdo de saliva, no segundo caso seré mais abundante que no primeiro. Igualmente, algu- mas das substincias que sao rejeitadas pelo animal, por exemplo, tio irritantes como © Acido, o dleool ¢ outras, prevocam uma seoregdo mais profusa de saliva Que outras, quimicamente indiferentes, como as amargas; conseqiientemente aqui, também, observa-se uma atividade diferente das glandulas salivares, As glandulas gastricas reagem da mesma maneira; elas scerezam seu sumo ora em maiores, ora em menores quantidades, ora com mais alta e ora com mais baixa acider; seu conteido de pepsina — um fermento dissolvente de proteina — € algumas vezes maior. algumas vezes menor. Pao provoca a secregio de suco gastrico com a mais alta concentracao de fermento, mas com uma avidez muito baixa; leite provoca a menor concentragiio de fermento, enquanto a ¢arne proyooa a maior concentragao de dcido. Sob a ago de certas quantidades de proteina, introduzidas na forma de pao, as glandulas produzem de duas a quatro vezes mais fermento de proteina, do que no caso da carne ou do lei Entretanto, a diversidade do trabalho das ylandutas gastricas nao é restrita aos fendmenos acima mencionados, Ela se manifesta também em flutuagdes pecu- liares na quantidade ¢ qualidade dos reagentes durante o periodo de funciona- * Itétiods do editor, 6 PAVLOV mento das glindulas, depois da inweduglo de uma ou outra substncia alimenticia. Mas isso sera suficiente. Eu abusaria da atengiio dos senhores, dando um relatirio de todos os dados coletados por nés neste campo. Quero apenas ressaltar que correlagdes similares foram obser vadas por nds na atividade de todas as ou- tras glindulas do canal digestivo. Agora pode-se perguntar: que significa essa diversidade no trabalho das glandulas? Em resposta, vamos recair no fendmeno da secregao Salivar. As subs tancias alimenticias provocam a sccregio de saliva mais grossa ¢ mais concen- trada. Por qué? A resposta, obviamente, & que isso possibilita a massa de alimento passar facilmente pelo tubo, partindo da boca ao estémago. Sob a ago de certas substinciss desagradaveis ao cio, as mesmas glindulas segregam saliva fluid. Para que serve 4 saliva em tais casos? Obviamente, ou para diluir essas substan- cias ¢ dessa forma atenuar sua ago quimicamente irritante, ou, como sabemos por experiéncia propria. para limpar a boca dessas substancias. Neste caso é necessario agua, ¢ nao muco, c € realmente segregada Agua. Come vimas, 9 pia, ¢ especialmente © pao seco, provoca secregio de quanti- dades de saliva consideravelmente maiores que a carne. Isso também € perfeita- mente compreensivel: o consumo de pio seco requer saliva, primeiramente, para dissolver os componentes do pao, ¢ tornar assim possivel sentir-Ihe 0 gosto (pois qualquer coisa totalmente nfio comivel pode entrar na boca!), ¢ em segundo lugar, para amaciar o pio duro ¢ seco, caso contrario ele passarin com dificuldade ¢ poderia mesmo ferir as paredes do esdfago, ao mover-se da boca ao estomago. As relagdes dentro do estémago siio exatamente as mesmas, A proteina do pao produz a secregio de mais fermento de proteina, que a do leite ou da carne. poden- do-se observar um fendmeno semelhante no tubo de ensaio: a proteina da carne ¢ do leite ¢ dissolvida mais faciimente pelo fermento de proteina que a proteina vegetal. Aqui, novamente, cu poderia citar numerosos exemplos adicionais de tais lagos, exclusivamente funcionais, entre o trabalho das glandulas digestivas ¢ as. propriedades das substdncias que entram no canal digestivo (mas eu © farei mais tarde, quando e se surgir oportunidade). NZo ha nada de surpreendente nesse fend meno; ¢ nia se poderia esperar outras relagdes. Est& claro para tedos que o orga- nismo animal é um sistema altamente complexo, consistindo em uma quantidade quase infinita de partes, relacionadas tanto entre si quanto,como complexe tinico, com o meio circundante, com © qual esti em estado de equilibrio, O equilibrio desse sistema, como 0 de qualquer outro, é uma condigo indispensivel para sua cxisténcia. E se em certos casos somos incapazes de descobrir as relagdes funcio- nais nesse sistema, @ razdio disso € nossa caréncia de conhecimento. Isso nao quer dizer que essas relagdes estejam ausentes de um sistema que tem a qualidade de permanéncia. Passaremos agora a outra questiio que surge do que foi dito acima; Como se da esse equilibrio? Por que é que as glandulas produzem no canal os reagentes necessarios para o ratamento bem sucedide do respective objeto? E claro que se TEXTOS ESCOLHIDOS: 7 deve admitir que, de alguma forma, as propriedades definidas do objeto atuam sobre a glindula, provocam nela uma reagao especifica ¢ causam sua atividade especifica. A analise dessa influéncia sobre 2 glandula ¢ um assunto muito intrin- sade, que requer muito tempo. © principal ¢ revelar no objeto as propriedades que, no caso particular, atwam como estinmios sobre as glandulas em questio. Uma investigacao dessa espécie nfo é tio facil como parece 4 primeira vista, Eis aqui alguns fatos para provar isso. Nés introduzimos carne, através dos tubos metilicos ja mencionados, no estémago yazio ¢ inalivo do ea, sem qué 6 animal © perecba. Em poucos minutos, o reagente gAstrico, uma solugao do fermento-pro teina gastrico, comega a exsudar das paredes do estimago, Mas gtral foi a proprie dade da massa de carne que ogiu como estinulo® nas glindulas gastricas? Seria mais simples admitir que esta ago foi provocads por suas propriedades mecani cas — pressio, ou fricgdo nas paredes do estomago. Mus essa suposigio seria absclutamente incorreta, As influéncias mecanicas su inteiramente ineficazes. com relaco is glindulas gastricas. Podemos influenciar mecanicamente a parede do estémago, de qualquer maneira — fortemente, ov fracamente, continuamente ou com interrupedes, em freas limitadas ou esparsas —, mas sem obter-uma sim ples gota de suco gastrico, Na verdade, so os componentes da carne dissolvidos na agua as substincias estimulantes. Entretanto, ainda carecemos de conheci- ‘mento sobre essas substincias, pois as substéncias extrativas da carne formam um vasto grupo que aguarda uma investigagdo mais aprofundada. Eis aqui outro cxemplo: poucos minutos depois que o quimo® se encontra na parte mais préxima do canal digestivo — no duedeno — uma das glandulas do mesmo enira em ago; 6 o parereas — um grande 6rgio localizado ao lado do canal digestive e ligado a este por um cuito exeretor, Mas qual das propriedades do quimo, avangando nos intestinos, atua como um agente estimulador sabre a plandula? Ao contririo das nossas expectativas, verificou-se que essa ago era exereida, nao pelas propriedades do alimento consumido, mas pelas propriedades do suco que se juntou a cle no estamage, isto é, por seu contaido aeida, Se despe- Jarmos suco giistrico puro no estémago. ou diretamente no intestino, ou simples- mente o dcido que ele contém, ou mesmo qualquer outro acido, a citada glandula ‘comegard a funcionar tio vigorosamente ou mais que no caso do quimo normal, passando do estémago aos intestinos. A grande significancia desse fato inespe- radoé bem clara. O laboratério gastrico utiliza seu fermento de proteina sob uma reagio acide. Diferentes fermentos intestinais, e, entre eles, naturalmente, os fermentos Pancreaticos, nao podem desenvolver sua atividade num meio acide. Consegien- temente, é claro que a primeira tarefa do laboratdrio é providenciar a reagdo neu- ta ou ulcalina neeessaria para sua atividade trutifera. Essas relagdes sao afetadas pelas acima mencionadas inter-relagdes. j4 que o conteido dcido do estémago, como ja foi dito, induz & secregao do suco pancreatico alealino (¢ quanto maior o * Tileos do ecto. > Termo téonioa, que designa 6 bolo alimectar apie alguma iemsformaigSe por pedo péstrica. ® PAVLOV conteido Acido, maior a seeregZo). Assim, « sueo pancreatico atua, antes de mais nada, come uma solugio de soda. Mais um exemplo: sabia-se de longa data que o sueo pancredtico contém todos os trés ferments que agem nas principals substancias alimenticias — 0 fer- mento de proteina, que é diferente do gastrico, o fermento de amido. ¢ 0 fermento adiposo. Como foi provado pelas nossas experiéncias, o fermento de proteina no seco pancredtico & constantemente ou as vezes, inteira ou parcialmente (isso & ainda temirio de controvérsia) uma forma inerte, latente. Isso pode set explicado pelo fato de que um fermento de proteina ativo pode comprometer os outros dois fermentos pancredticos ¢ destrui-los, Simultancamente, estabelecemos que as paredes da parte superior dos intestinos distribuem em sua cavidade uma subs- tancia fermentativa cuja finalidade & transfarmar o fermento de proteina paner: ico inerte, em ative. O fermento ative, entrando em contato com as substancias da proteina do alimento nos intestines, perde sua agio nociva com relagdo aos ow tros fermentos. O fermento intestinal especial, acima mencionado, & segregado pele parede do intestina, devido unicamente d agdo estinuladora do fermente de protetia pancredtica. Assim, a relagdo oportuna de fenémenos é baseada nas propriedades espee!- ficus dos estimulos e nas reagdes igualmente especificas correspondentes a eles. Mas isso, de forma alguma, esgota o assunto, Agora deve-se colocar a seguinte questio: come & que as dadas propriedades do objeto, os dados estimuladores, aleangam o proprio tecido glandular, seus elementos celulares? © sistema do organismo, de suas imimeras partes, ¢ rcunido numa tinica entidade de duas for- mus: por meio do tecido especifico que existe apenas para manter relagdes mu- tuas, isto & 0 tevidy nervosa, ¢ por meio dos tecidos fuidos, que lavam todos os elementos do tecido. Sao esses muitos intermediérios que transmitem nossos mulos go tecido glandular. Investigamos por completo a primeira dessas inter-relagdes. Muito antes de nds, foi estabelecido que o trabatho das glindulas salivares é regulado por um aparato nervoso complexo. As terminagaes dos nervos sensoriais na cavidade oral sao irritadas por diferentes estimulos; a irritagdo ¢ wansmitida através desses nervos ao sistema nervoso central e dai, com a ajuda de fibras ner- vosas seeretérins, eferentes especiais, diretamente ligadas com as células glandul res, alcanga os elementos secretores ¢ 0s induz a certas atividades. Coma ¢ sabido, esse processo, coma um todo, ¢ designade como reflexo. Afirmamos, ¢ provamoy experimentalmente, que normalmente esse reflexo é sempre de uma natureza especifiea, isto é, que as terminagdes dos nervos que rece- bem a estimulagio siio diferentes, cada qual eliciando uma reagao somente quan do ha estimulos externos definidos. De acordo com isso, 0 estimulo que atinge a célula glandular é também de um carater especifico ei . Esse é um mecanismo muito profundo, Como cra de s¢ esperar, a descaberta do aparato nervoso das glandulas sali- vares impeliu imediatamente os fisidloges a procurar um aparato similar em ou- tras glandulas que se encontram nas profundezas do canal digestive. Nossas experiéncias nao apenas provarum a existéncia de um aparato nervo so nessas glandulas, mas também cxtrafram dados que mostraram claramente a barticipagao desses nervos na atividade normal. Eis aqui um exemplo admiravel. Executamos duas operagocs simples muito facilmente suportadas pelos caes, edenois das quais, se adequadamente cuidarmos de sua sobrevivencia, eles vivem por anos, absolutamente saudaveis ¢ normais. As operagdes foram feitas como segue: (1) 0 esdfago foi cortado na altura do pescoco v ambas as extremidades foram suturadas na pele do pescogo de tal forma que s¢ evitasse a passagem da comida da boca para o estémago do animal — ela escoava através da abertura. superior do canal: (2) uma sonda metalica foi introduzida no estémage através da paredé abdominal — uma operagio mencionada anteriormente e ha muito tempo praticada, Entender-sc-A que os animais cram alimentados de forma que permi- lisse 4 comica entrar diretamente no estmago através da sonda. Quando, depois de um cespago de muitas horas. ¢ depois que o estmaso vazio do ede fora inteira mente lavado, o animal cra alimentado da mancira normal (0 alimento, como ja foi mencionado, caindo fora do eséfago. sem atingir o estimago), em poucos minutos 0 esimago vaio comegava a segregar sco gastrica puro. A sccregio continuava, enquanto se dava comida ao c&o, algumas vezes persistindo muito de- pois da interrupgo da chamada alimentagao simulada. Nessas condigics, a secre- Gio de suco é muito abundante, ¢ é possivel obter centenas de centimetros cibicos de suco gastrico, Em nosso lahoratério, nds realizamos essa ‘operagao em muitos ses ¢ 0 suco gdstrico assim obtido néo apenas serve as finalidades da pesquisa, como é também um étimo remédio para os pacientes que sofrem de insuficicncia de atividade das glindulas gistricas. Assim, uma parte dos suprimentos vitais de fossos animais, que vivem por anos (mais de sete ou vita) sem revelar mesmo o mienor desvio da salide normal, € benética ao homem. Das experiéncias acima mencionadas, fica claro que o simples process de comer, mesmo qué o alimento ndo atinja o estémago. estimula as glandulas gastri- cas, Se cortarmos of nervos vagos do pescoge desse animal, a alimentagio simu- lada no provecurd qualquer secrecio de suco gastrico, néo importando a idade do clo e seu estado fisico. Assim, a estimulagia praduzida pelo proceso de comer atinge os glandulas gastricas através das fibras nervosas contidas nos ner- vos Vagon, Entre os estimulos das glandulas digestivas ha uma caiegoria — ainda n&o mrencionada — que, muito inesperadamente, atingiu o primeiro plano de nossas investigagies. E de hi muito conhecido que a visio de comidas saborosas produz agua na boca de um homem faminto; a falta de Apetite, também, foi sempre consi- derada como indesejavel, do que se pode deduzir que o apetite esta intimamente gado ao processo da digestio. Na fisiologia, tem sido feita mengiio da (assim- shamada)'® estimulagao psiquica das glindulas salivares @ gistricas, Deve-se ressaltar, entrctanto, que a estimulagao psiquica das glindulas gdstricas nao foi ** A expresso "asvim-chamada” foi ullizaca aqui para soeniwar que Pavlov usou @ lermo psiguien come ‘étulo, mais proprismente que para wma explieacdo des fendmenos que tequeriam investipagies sistem ftican, 10 PAVLOV recomhecida universalmente, e, de um modo geral, a papel especial da estimulagfo psiquica no processamento do alimento no canal digestive nao tem encontrado o devide reconkecimento. Nossos estudos nos forgaram a levar adiante essas influéncias. © apetite, a ansia pela alimentagao, é um estimulo constante ¢ poderoso para as glandulss gistrieas, Nao hd cdo no qual uma habilidosa provocagao com ali- mentos nao produva uma consideravel secregiio de suco no até ent3o vazio e inati- vo estémago. A simples visio da comida, animais nervosos ¢ excitaveis segregam centenas de centimetros aibicos de suco gastrico, enquanto que o animal calmo ¢ quieto segrega apenas alguns poucos centimetros, Mudando a experiencia de maneira definida, uma secregdo extremamente profusa de suco ¢ observada em todos os animais sem exces%o. Tenho cm mente as experiéncias anteriormente descritas com alimentaggo simulada, quando a comida nao pode ir da boca para © esiGmage. Uma andlise muito completa e freqiientemente repetida dessa expe- riéneia convenceu-nos de que, nese caso, a seeregao de suco no pode ser consi- derada como sendo a resultado de uma estimulagao reflexa simples, da boca garganta pelo alimento ingerido, Qualquer substancia quimica irritante pode ser introduzida na boca de um cao operado dessa forma, e ainda assim aestimulagao nao produsira a secregéo mesmo de uma tinica gota de suco gastrico, Disso se pode conchiir que a cavidade oral é estimulada no por todas as substncias qui- micas, mas apenas por substancias especificas contidas no alimento ingerido. Entretanto, observagdes continuas nite confirmaram essa suposigao, A agiio de um Unico alimento, como um estimulo glandular, difere, dependendo de se 0 al mento foi comido pelo animal com avidez ou com contrariedade. em obediéncia. Geralmente, € observado o seguinte fendmeno invariavel; cada tipo de alimenta ingerido pelo cao durante a experiéncia atua como um forte estimulo'’ apenas quando esti de acordo com o gosto do e&o,'* Devemos admitir que, no ato de comer, 0 apetite serve como um poderoso e constante estimulo. Provou-se ser excepcionalmente grande 0 significado fisiclégico desse suco, que denominamos suco do aperite, Se nds introduzirmos pio no estémago do do através de uma sonda metalica, de forma a ¢' que cdo o perceba, isto ¢, jem estimular seu apetite, o pio permanece no estémago, sem mudangas, por uma hora inteira, sem provocar mesmo a menor secrecdo de suco, j4 que faltam as substancias que estimulariam as glindulas pastricas. Mas quando 0 mesma pio & devorade pelo animal, 0 suco gastrico segregado neste caso, isto é, 9 seo do ape- tite, exerce uma influéncia quimica sobre as substdncias protéicas do pia, ou, na terminologia popular, digere-o, Algamas das substancias obtidas da proteina sub- metida @ essa mudanga atuam por sua vez sobre as glindulas gastricas como esti- mulos independentes, Desse modo, elas continuam 9 trabalho iniciado pelo pri- "Isto é, um forte estinnto para n seceapiia da-suca pice, "Ou melhor, (...) “quand assim parece ao observader estar de acordo cam o'gostb do eo", TEXTOS ESCOLHIDOS ul meiro cstimulo, o apetite que agora, no curso normal das coisas, esti regredindo. '# No deeoirer do nosso estudo das glindulas gastricas. ficamos convencidos de que o apetite atua mao apenas como um estimulo geral para as glandulas, mas que ele também estimula as mesmas em um grau variado, dependendo do objeto para o qual ¢ dirigido. Para as gldndulas saitvares a regra estabelece que todas as variagoes de sua atividade, observadas nas experiéncias fisioldgicas, sdo exata- mente duplicadas nas experiéncias com estimulagdo psiquica, isto é, naquelas experiénctas nas guais o objeto dado nao é levado ao contato direto da membrana mucosa da boca, mas atrai a aten¢do do animal a disténeia.'* Por exemplo, a visio do pio seco provoca uma sccregio de saliva mais intensa que a visio da carne, embora a carne, julgando pelos movimentos do animal, possa excitar um interesse mais vivo. Ao mostrar-s¢ a carne ao cio. ou qualquer outra substincia comestivel, uma saliva altamente concentrada brota das glandulas submaxilares. A visio de substincias desagradiveis, ao contrario, produz uma sectegiio de sali- va muito fluida das mesmas glandulas. Em uma palavra, as experiéncias com esti- mulagiio psfquica provam ser modelos exatos, porém miniaturas, das experiéncias com estimulagdes fisioldgicas pelas mesmas substincias. Assim, com respeito ao trabalho das glindulas salivares, 2 psicologia ocupa um lugar proximo dagucle ocupado pela fisiologia. Mais quc isso! A primeira vista, o aspecto psiquico dessa atividade das glan- dulas salivares parece mesmo mais incontrovertivel que o fisiolégico. Quando qualquer objeto que atrai a atengao do animal a distancia produz secrecao salivar, tém-se todos 05 motivos para se admitir que esse é um fendmeno psiquico ¢ allo fisiokbgico, Quando, entretanto, a saliva comega a bratar depois que 0 cio ingeriu algo, ou substiincias foram introduzidas a forga em sua boca, é ainda necessario provar nesse fendmeno a presenga de uma causa fisiolégica, para demonstrar que nao é de carter puramente psiquico, reforgado devide as condigdes cspeciais que © acompanham, Essa concepgio parece bem verdadeira, ja que, depois do rompi- mento de todos os nervos sensoriais da lingua, a maioria das substancias que en- ‘Fam na boca, pelo processo de alimentagao forgada, provocam, por estranho que parega, a idéntica agio pré-operatéria das glandulas salivares. E necessério ir mais adiante erecorrer a medidas mais radicais, como envenenar o animal ou des- truir as partes superiares do sistema nervoso central, a fim de ficar-se convencido de que entre substincias que estimulam a cavidade oral e as glindulas salivares ha nao apenas uma relacdo psiquica, mas também fisioldgica. Assim, temos duas sé- ries de fendmenos aparcntemente diferentes. Mas como deve o fisidlogo conside- rar os fenémenos psiquicas? £ impossivel desconsiderd-los porque eles estiio em estreita ligagio com os fendmenos puramente fisiolégicos no trabalho das glindu- las digestivas com o qual estamos ocupados. E se o fisilogo pretende prosseauir seu estudo delas, ele se defronta com esta questdo: Como? “4 0 emprego por Paviow da termo apetite (de feorda com ofta wi akagiwil nie parece ear em afinidade com sau habitual rigor clenficn, Implica gue é uma espicie de eatidade que tanto estimmule quanto € estimulada, mas 0 referente do tarmo ndo ¢ operacionalmente especificaco. ** Tuilicos do citar, 12 PAVLOV Desde que bascamos nossa abordagem na experiéneia adquirida por nos com Os Tepreseatantes organizados inferiares do reino animal, ¢, naturalmente, deseja- mos permanceer fisidlogos ao invés de nos tornarmos psicilogos, preferimos man- ter uma atitude puramente objetiva com relagiio aos fendmenos psiquicos em nos- Sas experiéncias com animais. Acima de tudo. tentamos disciplinar nosso pensamento ¢ nossa linguagem com a finalidade de ignerar o estado mental do animal. Limitamos nosso trabalho a completa observagiio ¢ exata descrigio da influencia exercida por objetos distantes na secreeiio das glindulas salivares. Os resultados corresponderam As nossas expeciativas — as relagGes entre os fendme- nos externas ¢ as variagdes no trabalho das glandulas podium entao ser sistemati- adas; clas provaram ser de cardter regular, jd que podiam ser reproduzidas & vontade. Para nossa grande alegria. vimos por nés mesmos que haviamos tomado © caminhe certo em nossas observagies, sendo levaidos ao éxito. Citarei alguns exemplos ilustrando os resultados obtides por nés com a ajuda desses novos métodos. Se 0 cio for repetidamente estimulade com a visio de objetos que induzem a secregao salivar a distancia, a reagio das glindulas salivares se torna mais fraca ¢ finalmente cai a zero. Os intervalos mais curtos entre estimulagGes separadas fazem com que a reagao atinja mais rapidamente o grau zero, e vice-versa, Essas regras sio manifestadas intciramente somente quando as condigges das experién- cias siio inalteradas. A identidade de condigdes, entretanto, pode ser apenas de um carater relative; pode ser restringida apenas aqueles fendmenos do mundo externo que foram previamente associados com o alo de ingerir ou com a introdugao for ¢ada de substincias correspondentes na boca do animal; a mudanga de outros fendmenos nao teria signifiedncia, Essa identidade ¢ facilmente atingida pelo experimentador, de forma que um experimento, no qual um estimule aplicado repetidamente a distancia perde gradualmente seu efeito, possa Scr prontamente demonstrago no curso de uma conferénein. Se numa estimulagao, repetida @ distineia, uma certa substiincia se torna ineficiente, isso néo significa que a influéncia de outras substincias esta por isso eliminada, Por exemplo, quando o leite para de cstimular as glandulas salivares, a ago do pio permanece fortemente ficiente, e quando 0 po perde seu cfeito, devido a repetigao da estimulagao expe rimental, © deido ou outras substincias produzem ainda agio completa nas glan- dulas. Essas relagGes também explicam o real significado da identidade acima mencionada das condigdes experimentais. Todo detathe dos objetos circundantes surge como um novo estimulo, Se um certo estimulo perdeu suo influéncia, cla pode ser restaurada somente depois de um descanso de muitas horas. Entretanto, 4 agiio perdida pode ser restaurada sem falha, a qualquer momento, por meios especiais. Se 0 pao, mostrado repetidamente a0 c&o, nao estimula mais suas glindulas salivares, ¢ necessario apenas deixar 0 animal comé-lo ¢ 0 efeito do pao colocada a distancia sera inteiramente restaurado. O mesmo resultado é obtido quando ¢ dado 90 ¢0 algum outro alimento. Mais que isso. Se uma substincia que produz uma secregdo salivar, acide por exemplo, for introduzida na boca do cao, ainda entdo © efeite distante original do pao sera restaurado. De um modo geral, tudo 0 que estimula as glindulas salivares restaura a reagdo perdica: quanto maior sua atividade, mais completamente sera restaurada. Entretanto, a reagao pode ser inibida com a mesma regularidade por certos meios artificiais, se. por exemplo, alguns estimulos extraordinarios aruarem sobre 9s olhos ou ouvidos do cio, provocando nos tiltimos uma forte reagao motora, digamos, um tremor de todo o corpo. Como 0 tempo é curto, eu passarci para uma consideracdo tebrica dessas experiéncias. Os resultados obtidos por nds con- dizem inteiramente com nosso pensamente fisiolégic. Os efeilos produzidos pelos estimulos que atuam a distincia podem certamente ser denominados ¢ consideradas reflexos. Uma observacio cuidadosa mostra que. neste tipo de refle- xO, a atividade das glandulas salivares é sempre excitada por certes fendmenos externos, que, coma 6 reflexo salivar fisioldgico comum, & causada por estimulos externos. Mas, enquanto o ultimo emana da cavidade oral, o primeiro vem dos olhos, olfato, etc. A diferenga entre 08 dais refiexos € que nosso velho reflexe fisio- légico € constante ¢ incondicionado, enquanto o novo reflexo esta permanente- mente sujeito 4 flutuagao, ¢ é, portanto, condicionado.' * Examinando os fendme- nos mais de perto. podemos ver a seguinte distingdo essencial entre os dois reflexos: no reflexo incondicionado, as propricdades da substincia awam como estimulo com 0 qual a saliva tem que lidar fisiologicamente, por exemplo, dureza, secura, propriedades quimicas: definidas, etc.: nos reflexos condicionados, pelo contrario, as propriedades da substaacia que atuam como estimulo nao tém rela- ao direta com 0 papel fisiolégico da saliva, por exemplo, a cor, ete, Essas dltimas propricdades surgem aqui como sinais das primeiras. Nao podemos senao notar, em sua agdo estiladora, uma adaptagao mais ampla e mais delicada das glandulas salivares aos fendmenos do mundo externo. S aqui um exemplo: estamos prontos para introduzir dcido na boca do clo: pela imtegridade da membrana mucosa bucal, ¢ obviamente desejavel que, antes que o acido pencire na boca, haja nela mais saliva: por um lado, a saliva impede 9 contato direto do Acido com a membrana mucosa e, por outro, dilui imediata- mente o Acide, enfraquecido assim seu efeito quimico prejudicial, Entretanto, em esséncia, os sinais tém apenas um significado condicional: por um lado, eles estio Promtamente sujeitos & mudanga, ¢, por outro, os objetos sinalizadores no podem entrar em contato com a membrana mucosa da boca. Conseqiientemente, a me- Thor adaptagao deve consistir no fate de que as propriedades dos abjctos sinaliza- dores estimulem agora as glindulas salivares, ¢ outras vezes, nao, E isso é real- mente 0 que ocorre, Qualquer fendmeno do mundo externo pode temporariamente ser feito sinal do objeto que estimula as glandulas salivares, desde que a estimulagdo da mem: 1 sCondicional” de asorde com o Ls, Gantt, 6 lgtmo enprepedo eriginalrnente por Pavlov ¢ fod presen Yyedo-em runeSs € alemilo pela tradugis. “Condictomads” xe tornos: cor vencional sit portugaés cmbura © term original de Paviow parega mais apropriade: isu & tende a enfatizar quic o cstebelecimence da nowa rebar «gle catimulerresponta krefleca) é contingente ou condicional sabre w oeoerénein de vertas eventos necessérios, 14 PAVLOV brana mucosa da boca pelo objeto tenha sido associada, uma ou mais vezes, com @ agao do fen6meno externo determinado em outras areas Teceptoras da superficie do corpo. Em nossso laboratdrio estamas tentando muitas com binagdes altamente paradoxais: ¢ @ experiéacia est sendo bem sucedida. Por outro lado, sinais pron- lamente ativos podem perder seu efeito estimulador, se repetidos por um longa periods sem levar o objeto correspondente a0 contato com a membrana mucosa da boca. Se é mostrado alimento comum ao cdo por dias ¢ semanas, sem the ser dado a comer, entao a visio da comida cessara. finalmente, de produzir secregiu salivar, O mecanismo de estimulagao das glandulas salivares através das proprie- dades sinalizadoras dos objetos, isto € o mecanismo de “estimulagao condiciona- da”, pode ser facilmente concebido, do ponto de vista fisiolégieo, como uma fun- 80 do sistema nervoso, Como acabamos de ver, na base de cada reflexo condicionado, isto ¢, de estimulagao através das propriedades sinalizadoras de um objeto, ha um reflexo incondicionado, isto é, uma estimulagdo através dos atribu- fos essenciais do odjeto. Assim, pode-se supor' ® que o ponto do sistema nerveso central que é fortemente estimulado durante o reflexo incondicionado atrai para si estimulos mais fracos procedentes do mundo externo para outros pontos do siste- ma nervoso central, isto é, gragas ao reflex incondicionado ha um caminho aber- to para todes os outros estimulos externos, levando ao ponto central desse reflex. AS condigées que influenciam a abertura ¢ fechamento do caminho constituem 0 Mecanismo interno da eficiéneia ou ineficigneia das propriedades sinalizadoras dos objetos externas: elas so a base fisiolégica da mais delicada reatividade da substincia viva, da mais delicada adaptagdo do organismo animal, £ minha firme convicgao que a pesquisa fisiolégica avangard cam sucesso ao longo das linkas que esbocei aqui. De fato, apenas uma coisa na vida tem um interesse verdadeiro para nos — Nossa experiéneia psiquica. Mas o seu mecanismo foi ¢ permanece ainda coberto de mistério. Todos os recursos humanos — arte, religiao, literatura, filosofia, & ciéncia histérica — se combinaram para langar a luz nessa escuridio, O hamem tem a sua disposicao ainda um outro recurso poderoso — a ciéneia natural com seus métodos estritamente objetives, Essa ciéncia, como todos sabemos, esti fazendo grandes avangos todos os dias, Os fatos e consideragdes que thes coloquei sio tipicos das numerosas tentativas de empregar um meétoda de pensamento consistente, puramente cientifico, no estudo do mecanismo das manifestagies vi- tais superiores no cao, o representante do reino animal que é0 melhor amigo do homem. “8 Esta suposigio — como muitas das especilagdex de Professor Peviov tobre o que aonteve denna de sls tema nervosio — ao é um fro compravado, Tl A PSICOLOGIA E A PSICOPATOLOGIA EXPERIMENTAIS DOS ANIMAIS* Sendo a linguagem dos fatos a mais elogiente, eu me permito passar, direts- mente, aos dudos experimentais que me autorizam a falar a respeita do objeto escolhido para a minha dissertagao. Ides ouvir como um fisidlogo foi levado a passar de questées puramente fisiolégicas para 0 dominio dos fendmenos habituaimente denominadas psiquicos, Embora inopinada, essa transigfo ocorreu naturalmente ¢, 0 que me parece ser 0 mais importante, sem mudanga dos prineipios metadolégicos. Durante muitos anos, cu me ocupei da atividade normal das glandulas diges- tivas e, analisando as condigdes permunentes das suas fungées, deparei com ele- mentos de ordem psiquica que ja tinham sido mencionados por outros. Nao havia agnhuma razdo para deixar de lado essas condigées psiquicas, porque concor- riam, de modo permanente, para a boa marcha dos fendmenos considerados, Meu dever era ocupar-me delas, j4 que minha intengao era « de aprofundar 0 mais pos- sivel © objeto de meu estudo, Mas, instantaneamente, se apresentou uma questiio: de que modo? A exposigdo que segue é a resposta a essa questio, Vou deter-me, somente, numa parte de nassos dados, ou seja, as experiéncias efetuadas sobre as glandulas salivares. O papel fisiolégico deste érgao é, provavel- mente, muito restrito, mas se converter — estou seguro disso — no objeto chis- * Diswerse promuneiado per veasiio de uma dua reunider plonitias dla Congresso Mitticu Internacional, rea fizado em Mari, em abril de 1903, Publicado pela primeira ver mas Nouvelles de (Academe de atone ‘Militaire, 1903, pak 103, Depois de ter elahorada ox métodos de esuido das ceagiee reflexes do urpanisme eda seetego das elindulas digestivas. em um animal praticémente win, Paview, cm sims obras a rexpcito da digestio, vin mencionado J8 9 possibiidade de uma “secregio. psuica”. ao lady da seeregiy prowess por faery puramene fisiol6gices. Por vota dos ditimos anos da daceda de 90, Pavlov empreendet 0 estedo experimental da mecanismo da “se regia priguica”, 0 célebre discurvo dy Madi comprecads 0 programa miximo que © genial eriador da doutrina da atividade 6 YO superior 9¢ havia proposio realizar © que se puis a camprir, com perseverange, no curso dos wrist leés unos soguintes de atividade clemtifica. A atitude materialisia de Pavlov em celagdo aos fenndmmenos psigui- cox manifesta-se claramente aesse discurso: ele considera © pskquisme sob um ponto de vista biokigico « evolucionista, rejeitande o§ potas de vista "mecano-tisica” e wicalista Nests diseorso, foram oprssenindas, pola primeirn vez, as definigies de reflex comdivionade e reflexo incom Ecionado, (Nots dos Edltores Usrangeiros,) 16 PAVLOV sico dum dominio de investigages novas, cujos primeiros ensaios tenho a honra de lhes expor, parcialmente realizados ¢ parcialmente projetados. Quando se observa a atividade normal das glandulas salivarcs, é inipossivel que © ¢xperimentador nao se surpreenda com o alto grau de sua adaptagdo funcio nal. Dando-se a0 animal alimentos sdlidos e secos, a saliva corre em grande quan dade: dando-lhe uma alimentagdo rica em dgva, haverd uma secregio salivar muito menor. Evidentemente, « degustagao quimica dos alimentos, sua mastigagao ¢ a for- magao de um bolo alimentar deglutivel exigem a presenga de gua, que é propor- cionada pelas glandulas salivares. Uma saliva rica em mucina & derramada pelas glindulas salivares de muco sobre todos os alimentos ¢ se constitui em um ele- mento lubrificante que facilita 9 caminho dos alimentos até o estimago. A saliva &, igualmente. derramada sobre todas as substincias cuja agdo quimica é irritan te: cides, sais, ete, A quantidade e a composi¢o da saliva dependem do grau de irritago produzida por esas substancias. Trata-se, com efeito, de neutraliza-las, de dilui-las ¢ de lavar a boca com ela, como é demonstrado pela observagiio diu- turna sobre nds mesmos. As glandulas salivares segregam, neste caso, uma saliva aquosa, pobre em mucina, Com efeito, para que serviria a mucina nessas condi- ses? Se metermos na boca de um cdo alguns calhaus limpos, de quartzo inschi- vel, 0 co os revolve em sua boca, procura mastiga-los e, finalmente, os pde fora, Nenhuma salivacda, ou, no maximo, uma ou duas gots. Para que serviria, neste caso, a saliva? As pedrinhas sio langadas fora da boca do animal sem deixar nada atras delas, Ponhamos, agora, arcia na boca do cio, ou seja, o mesma pedre- gulho reduzido a uma forma mitida ¢ fragmentaria; 0 cho segregara muita saliva. E facil de ver que, sem saliva, sem derramamento de Nquide na cavidade bucal, a arein no poderia ser expelida, nem conduzida ao estémago. Estamos em presenga de fatos precisos ¢ constantes, fatos que parecem demonstrar uma espécie de discernimento, Entretanto, o mecanismo desse discer- nimento ¢ claro como a luz do dia, A Fisiologia dispde, com efeita, desde hit muito, de dadas sobre os nervos centrifugos das glindulas salivares, que nio 9} fazem-nas segregar uma saliva rica em igua, como também com que ela seja enti quecida com substincias orginicas especiais. Ademais, a parede interna da cavi- dade bucal apresenta zonas que possuem uma irritabilidade especial diferente, meciinica, quimica, ou térmica. Estas espécies de irritabilidade se subdividem por sua vez, como, por exemplo, a irritabilidade quimica se divide em sensibili- dade aos ficidos, aos sais, etc. Outro tanto se pode supor em relagdo a irritabi- lidade meeinica: nervos centripetos especinis partem dessas regides dotadas de irvitabilidade expecifica, Deste modo, um simples ato reflexo estd na base das adaptagdes, ato que tom, em sua origem, certas condigdes exteriores que exercem a sua gio sobre um grupo determinado de terminagdes aferentes, donde uma excitaglo se propaga, Por intermédio de uma via nervosa apropriada, até a glindula, na qual se origina um trabalho definido, Noutros termos, temos uma influéncia exterior especifica TEXTOS ESCOLHIDOS. 7 Gue provoca uma reagio, iguakmente especifica, da matéria viva, Vemos aqui, assim, sob uma forma tipica, 0 que se designa pela palavra adaptagiio, isto & conformidade com um fim. Detenhamo-nos sobre estes fatos ¢ sobre estes termos, que representam, evidentemente, um grande papel no pensamento fisioligico contempor neo. Que é adaptacao, prepriamente dita? Como vimos, nada mais do Que uma relagao adequasa entre os clementos de um sistema complexo, por um lado. entre 0 conjunto desse sistema € 0 meio ambiente, pelo outro. Isto €, exatamente, o que se observa, em qualquer corpo inanimado. Teme- Os um corpo quimica complexo. Este corpo nao pode existir como tal, seni enquanto seus dtomos ¢ grupos de dtomos estde em equilibrio entre si, e seu con: Junto ost, igualmente, em equilibrio com as condigdes exteriorcs, Do mesmo modo, tanto os organismos superiores quanto os inferiores nao podem existir como um conjunto, na sua complexidade grandiosa, a menos que as suas partes constituintes permanecam exata e estrcitamente ligadas entre si e com us condiges exteriores, A aniilise das condigdcs necessirius para © equilfbrio desse sistema é 0 que constitui a primeira das tarefas e o fim das investigagbes fisioldgicas puramente objetivas. Nao ¢ provavel um desacordo sobre este ponto. Desgragadamente, porém, nfo temos para designar este principio fundamental do organismo, sos condigdes de equilfbrio interno © externo, um termo puramente cientifico. As nogées de conformidade ¢ de adaptagao, utilizadas com essa finalidade, apesar da analise biolégica que Darwin efetuou & seu Fespeito, continuam, segundo alguns, levando 0 selo do subjetivismo, o que crigina mal-entendides de ambos os lados, Os purtidarios de uma concepgao puramente fisico-meciinica da vida entendem gue essas palavras encerram uma tendéncia anticientifica, que elas canstitiem um retrocesso em relagao ao objetivisma puro, conduzinde 4 especulagc, A teleolo- sia.* Por outro lado, os bidlogos com tendéncia fisiolgica véem em cada fato de adaptagdio ou de conformidade a prova da existéncia de uma forga vital ou, como 8 diz, cada vez mais freqiientemente, de uma forga espiritual (como se vé. 0 vita lismo transformou-se em animisma),# que fixa um fim, elege seus meios, adapta- se, ete. Conseqiieatemente, nos experimentos sobre as gliindulas salivares, de que acabamos de falar, permanecemos nos limites das investigagées rigorosamente dioligicas. Prossigamos nessa exposigao c passemos a um dominio de fendmenos completamente diferentes, na aparéneia. Todos os abjetos antes enumerados, que, na cavidade bucal da eo, agem de mancira diferente, mas, 20 mesmo tempo, determinada, sobre us glandulas saliva- Tes, exercem sobre clas, igualmente, a mesma agiio — ao menos sob 0 aspecto qualitative — quando se encontram a certa distancia do animal, Os alimentos seeos fazem correr muita saliva, os aquosos fazem correr pouca. As glindulas de 2 Teleologia, Teoria ideallita qué peoctima estore todos on Jenimenoe clo mundo condi inluemcia de forgas que obedecem a urna finalidadle. (5. das F.E.) ® Animism, Teoria que reconheee 9 exdsiéncia de uma alnia nos UbjetOa inaniniathin Pata Pauloy, «ani sipmo se idontiffea esr o idealisma, (N. dos EE.) ce pot is PAVLOV muco derramam uma saliva lubrificante ¢ espessa sobre os alimentos, Diversas substancias nao comestiveis ¢ ifritintes condicionam a secregdo de uma saliva aquosa, pobre em mucina, de todas as glindulas salivares, inclusive daquelas que contém mucosidade. Seixos, mostrados ao animal, deixam as glandulas em repou- 50; areia, ao contrdrio, faz segregar saliva. Os fatos foram obtidos ¢ sistemati- zados pelo Doutor S. Voulfson em meu laboratério, O cao vé, ouve, cheira essas substancias, tem sua atengao atraida por elas e sabre elas se arroja se Si0 comesti- veis; se silo substancias desagradayeis, foge delas, opde-se a que sejam introdu- zidas em sua boca. Dir-se-4 que se trata de uma reagao psiquica por parte do ani- mal, a excitagiio psiquica da fungao das glandulas salivares, Que deve fazer o fisidlogo com esses dados? Camo estabelecd-los? Como analisé-los? Que sao, em comparacio com os dados fisiolégicos? Que t&n em comum uns ¢ Outros, ¢ cm que se diferenciam ? Devemos, para compreender esses fatos novos, penetrar no intimo do animal erepresentur, a nossa maneira, as Sues sensagdes, sentimentos ¢ desgjos? Na minha opiniao, o naturalista nio pode dar senao uma resposta a esta ilti- ma questo: um “nfo” categérico. Onde encontraremos um eritério mais ou menos indiscutivel e que acreditemos justo? Poderfamos, com proveito para a Investigagio, aproximar do nosso o estado interior de um animal, mesmo o de um tio altamente desenvolvido como o clo? Prossigamos. Nao é uma infelicidade continua, na vida, que a maior parte das pessoas nio s¢ compreendem mutua- Mente, nem possam colocar-se uns nz situagao dos outras? Os fatos que conhece- mos nos permitem, porventura, reconstituir, com seguranga, o estado de outrem? Nos nossos experimentos psiquicos (continuaremos por enquanto, empregando esta palavra) sobre as glandulas salivares, comegamos por tratar de explicar, conscientemente, os resultados obtides, deixando- correr nossa imaginacao sobre o possivel estado objetivo do animal. mas nada obtivemos com isso, seniio discus: sdes iniiteis ¢ algumas opinides pessoais, fsoladas ¢ incompativeis. Nao nos resta: va outra alternativa, senfio a de prosseguir nossas investigagdcs sobre um terreno. estritamente objetivo, assinalando, como tarefa urgente ¢ da mais alta importan. cia, o abandonar © costume natural de substituir o mecanismo da reagdo no ani mal de experiéncia pelo seu estado subjetivo, para concentrar toda a nossa aten- go sobre 6 estuda da conexdo dos fendmenos exteriores com a reagio do ‘organismo, isto é com 6 trabalho das glandulas salivares, Esta é a realidade, que deve decidir se o estudo de novos fendmenos nessa direcdo é ou nao possivel. Atrevo-me a pensar que a exponigdo que se segue convencé-los-d, tanto quanta a mim, de que, no caso presente, se abre perante nds um campo ilimitado de investi- gagdes fecundas, uma imensa segunda parte da fisiologia do sistema nervaso, estabelecendo, principalmente, as relagSes, nao entre as diversas partes do orga- nismo — de que nes temas ecupado sobremodo até o presente — mas, sim, ene © organismy ¢ 0 meio que o rodeia. E lamentavel que até agora a influéncia do meio ambiente sobre o sistema nervoso ndo tenha sido estudada aprofundada- TEXTOS ESCOLHIDOS 19 ments, a nao ser do ponto de vista da reago subjetiva, 9 que forma v contetido da fisiologia atual dos érg3os dos sentidos. Em. nossos experimentos psicologicas, tomamos alguns objetos exteriores que excitam o animal e provocam nele una reagao deierminada, no caso, 0 funcionamento das glandulas salivares. A influéncia desses objetos, como acaba- mos de demousirar, é mo essencial, a mesma que nas experiéncias fisiologicas, quando aqueles objetos entram em cantato com a cavidade bucal. Estamos, por- tanto, em presenga de uma adaptacao mais nitida: ¢ objeto mal se aproxima da boca do animal ¢ ja é capaz de atuar sobre as suas glandulas salivares, Que ha de carateristico nestes fatos em relagdo com os fatos fisiolégicos? Parece, antes de mais nada. que a diferenga consiste em que, na forma fisioldgicn do cxperimento, a substancia entra em contato direto com o organisnio, enquanto que. na forma psicclégica, stua a distfincia. Quando, porém, se medita sobre o assunto, ver! ‘Se que essa circunsténcia, por si mesma, nao constitai a diferenga esseacial entre estes experimentos ¢ os puramente fisiolégicos. Trata-se, simples- mente, do fato de que, nestes experimentas, as substancius exeream sua agdo sobre a superficie de Grgaos especificamente excitaveis: nariz, olhos, ouvidos, por inter médio dos meios em que se encontram o organismo ¢ as substaneias que a irritam (0 ar. 0 éter), Quantos reflexas fisiolégicos simples sia desencadeados pelo nariz, pelos olhas, pelos ouvides, iste ¢, a distincia! No entanto, ainda nao é nisto que teside a diferenga essencial entre esses fatos novos os fendmenos puramente fisiolégicos, E necessario, portanto, ir busca-la mais profundamente e ao que parece, na comparagdo dos seguintes fatos. No caso fisioldgico, a atividade das glindulas salivares esti vinculada as propriedades dos ebjetos, que safrem, diretamente, a agio da saliva. A saliva molia o que esta seco, lubrifica as massas deglutidas, neutraliza a agio quimica das substincias. So, justamente, essas propriedaces, as que constituem ox excitantes adequadus de uma zona especifica da superficie bucal. Por conseguinte, nos experimentos fisioldgicos, o animal é exeitado pelas Propriedades absolutas, essenciais, da objeto, com relacdo ao papel fisiologico da saliva, Nos experimentos psicoligicos, sdo as propriedades dos objetos exteriores, sem importineia para a fungdo das glindulas salivares e, inclusive, completa- mente ocasionais, a8 que excitam o animal, As propriedades luminosas, aciisticas é, inclusive, as puramente olfativas dos objetos considerados nao exercem, por si mesmas, quande pertencem outros abjetos, nenhuma influéncia sobre as glandu- las salivares; estas, por sua vez, nao mantém nenhuma relagdo funcional com essas propriedades. Nos experimentos psicoldgicos néo siio somente as proprie- Gades dos objetos semi importancia para a fungao das glandulas que fazem o papel de excitantes, mas também tudo o que rodeia lais objetos, mdo o que se relaciona com eles de uma ou dé outra forma: a vasilha que os contém, os méveis onde esto colocadas, 0 recinto, as pessoas que 0s conduzem, os ruidos praduzidos por estas pessoas (mesmo quundo invisiveis, no momento), sua Vor, 9 ruido dos seus a PAVLOV passos. Desta maneira, nos experimentos psicolégicos, 2 relagiio com os objetos que provocam a excitacZo das glandulas salivares se faz mais longingua ¢ ténue. Nao resta divida de que estamos diante de uma adaptagao mais adiantada. Admi- Timos que, no caso presente, a sutil ¢ distante relagio entre o ruide caracteristico dos passes de uma pessoa que, diariamente, leva ¢ alimento ao animal, ¢ 4 funcio- namento das glndulas salivares, no tem grande importaneia fisiologica ¢ nfo chama a atencao sendo por sua sutileza. Mas basta pensar ad ¢aso de uni animal, cuja saliva contenha um veneno defensive, para conchiir-se a grande impartancia vital desta preparngao antecipadora do meio de defesa, diante da possivel aproxi- macao do inimiga. A importancia dos sinais que revelam, a distincia, a presenga dos ebjetos & evidente para todos, no caso de uma reacko motora do organismo. Estes indicios distantes e, as vezes, ocasionais, dos abjetos, permitem ao animal encontrar 0 seu alimento, escapar do inimigo, ete. Se isto ¢ assim, o centro de gravidade dos nossos estudos Tepousa sobre a questao: ser4 que podemos sistematizar essas felagdes aparentemente cadtica! Ser d que podemos estabilizar esses fendmenos, descobrir as suas leis ¢ 0 seu meca- nismo? Alguns exemplos que vou citar me dio, a0 ue parece, 9 direite de respon- der com um “sim” categorico a essas perguntas ¢ encontrar, na origem desses experimentos psicolégicos, o mesmo reflexo especifico, como mecanismo gerale fundamental. Em sua forma fisiolégica, 0 nosso experimento da sempre 0 mesmo resultado, salvo, evidentemente, os casos extraordindrios: trata-se de um reflexo absoluto, O uspecto caracteristico ¢ fundamental do experimento psicoldgico é a sua inconstincia, a sua aparéneia caprichosa. No entanto, ¢ fora de divida que os resultados dos experimentos psicoldgicos se repetem sempre, sem o que, alias, nao haveria interesse cientifico em estadé-los, Por conseguinte, trata-se, somente, do fato de que um maior nimero de condigées influem sobre os resultados des expe: rimentos psicoldgicos, em comparagiio com 0$ experimentas fisiolégicos, Trata:se de um reflex condicionado, Fis aqui alguns fatos que provam que 0$ nossos dados psicolégicous podem. igualmente, ser incluides dentro de limites precisos ¢ que podem ser submetidos a leis. Foram obtidos em meu laboratorio pelo Dr. 1. Tolotchinoy. Nos experimentos psicoldgicos nd é [cil constatar, desde logo, quais sejam a8 principals condigGes que garantem os seus resultados, isto & a sua constancia, Quando realizamos um experimento excitando as glindulas salivares de um ani mal, mediante alimentos apresentadds a distancia, os resultados obtidos estiia em estreita relagio com a preparagie de animal para o experimenta, mediante um Jejum prévio. Um anima! bastante esfomeado dara resultadas Ppositivos; por outro lado, o mais glutdo © © mais versatil dos animais deixa de reagir a comida apre- sentada a distincia, desde que j4 tenha saciado a sua fome. Fisiologicamente, podemos dizer que estamos na prescnga de dois diferentes graus de excitabilidade do centro nervoso que comanda as glandulas salivares: exeitabilidade muite acen- tuada, em um caso, muito baixa, no outro. E licito admitir que, da mesma forma que a taxa de acido carbénico do sangue determina a energia do centro respira- trio, as Muncagdes supra-indicadas, da irritabilidade ¢ da reatividade dos centros TEXTOS ESCOLHIDOS 1 salivares, esto condicionadas pela diferente composigiio do sangue do animal ali- mentado e do animal faminto. De um ponto de vista subjetivo, isto poderia corres- ponder ao que se chama de atengo. Em jejum, a agua vem facilmente boca, a vista dos alimentos, mas, quando o organismo esté saciado, esta reagio é muito débil, ou pode, mesmo, faltar totalmente. Prossigames. Sc mostrarmos, varias vezes, ao animal, alimentos ou substan- ciag repugnantes. 0 nosso experimento, em virtude da situagio, passard a dar resultados cada vez mais fracos, até cessar toda ¢ qualquer reagdo por parte do animal, Um meio eficaz de renovar o efeito ¢ dar de comer ao cio ou introduzir- the, na boca, as substancias que deixaram de excita-lo. Fazendo isto, abteremos, naturalmente, um reflexo comum inteaso, depois do qual o nosso estimulo reco- megard a atuar a distancia. Para se obter o resultado mencionado, é indiferente introduzir, na boca do animal, um alimento ou uma substancia repugnante. Por exemplo, se a carne em pé deixou de excitar, a distincia, o animal, para restabe- lecer 0 efeito, ¢ indiferente da-la de comer ao animal, ou verter-Ihe, na boca, Acido, isto é, algo que lhe seja desagradavel. Pode-se dizer que a excitabilidade do centro das glandulas salivares aumentou gragas ao reflex directo ¢ que um cstimule fraco — © objeto a distincia — constitui, agora, um estimulo suficiente. Nio é o mesmo que se verifica quando © nosso apetite desperta ao comegarmos a comer, ‘ou quando clerenasce depois de fortes excitagdes desagradaveis? Eis aqui outra série de fatos constantes. A distingia, um objeto excita as glindulas salivares, néo somente pelo conjunto das suas propriedades, mas tam- bém por algumas das suas qualidades isoladas, Podemos aproximar de um cio a nossa mao, cheirando a carne, ou a pd de carne, ¢ isto, comumente, bastara para produzir uma reagio salivar. Da mesma forma, a visio de um alimento distante, €, por conseguinte, o efeito dptice que ele produz, pode provocar o funcionamento das glindulas salivares, Mas a agao combinada de todas as propricdades do obje to produz. sempre, um efeito mais seguro e mais importante, o que é a mesma coisa que dizer que: a soma das excitagdes exerce uma ago mais intensa que as excitacdes isoladas. ‘Um objeto afastade néo awa sobre as glandulas salivares somente por meio das suas propriedades constantes; todas as qualidades ocasionais, que the so adrede incorporadas, podem agir igualmente, Acido ou agua coloridos de preto agirdo, a distancia, sobre as glindulas sulivares, Mas estas qualidades ocasionais, atribuidas ao objeto, niio adquirirdo capacidade de atuar a distancia a nao ser quando 6 objeto provide da sua neva propricdade ja tenha estado, pelo menos uma vez, em contato com a cavidade bucal. A 4gua preta no podera exeitar, a distancia, as glandulas salivares, a nfo ser depois de se ter. previamente, derra- mado dcido colorido de preto, na boca do animal. As propriedades que excitam os nervos olfativos constituem, igualmente, estimulos condicionados em relagdo as glandulas salivares, Os experimentos efetuados no nosso laboratério pelo Dr. Snarsqui demenstraram que os reflexos fisiolégicos simples das glindulas saliva. ras as excitagdes que pravém da cavidade nasal ce formant a partir de nervos'sen- sitivos pertencentes ao trigémeo, O amoniaco. a essencia de mostarda, etc, exer- 2 PAVLOV cem uma a¢do sempre segura sobre um animal curarizado. Uma vez seecionado ‘9 nervo wigémeo, esta ago cessa. Os odores sem ago local irritante nfo atuam sobre as glandulas salivares. Um eo normal, com fistulas permanentes. nao apre- Sentara nenhuma salivagao ao sentir, pela primeira vez, o cheiro da esséncia de anis. Mas se, concomitantemente, esfregarmos esta esséncia (que é um violento repulsivo local) na mucosa bucal do cac, este passara a salivar abundantemente sempre que vier a sentir 0 mencionada odor, Se reunirmos a um objeto comestivel outro que é repugnaate, ou acrescen- larmos ao primeiro alguma propriedade de um objeto que inspira repulsa (por exemplo, se mostrarmos, a um cao, carne umedecida com Acido), apesar de 0 ani- mal sentir-se atraido pela came, obtercmos uma salivagdo parotidiana, salivagiio esta que nao & provocada pela came apresentada isoladamente, Em outras pala- ‘was: obteremos a rcacdo que 0 animal apresenta diante de um objeto repugnante. Além disso, se 0 efeito a distancia, produzide por um objeto desagracavel, foi ate- nuado pela repeti¢ao, é bastante associar este objeto repugnante com substancias comestiveis, pelas quais 0 animal se sente atraido, para que o primeiro efeito fique reforgado. Como ficou dito acima, os produtos comestiveis secos provocam uma saliva G40 intensa ¢ os produtos aquosos, a0 contrdrio, uma salivacao fraca ou nula. Se atuarmos, a distancia, sobre um cio, com a ajuda de dois objetos de qualidades contrrias, como pio sece ¢ carne crua, 0 resultado dependera do objeto que mais excitar o animal, a julgar pela sua reagdo motora. Se a substincia mais estimula. dora for, como de costume, # carne, somente ela é que atari e ndo haverd, pois, salivagao. O pio que o animal tem diante dos olhos ndo constituiré estimulo, Pode-se comunicar ao pio seco o odor da lingdiga ou da carne, de tal modo que nao reste, destes tiltimos, nada mais que © Seu aroma, ¢ que somente o pao atue sobre a visdo do animal; neste caso, entretanto, vamos obter a reagdo prevocada pela carne ou pela lingtiiga, A influéneia dos objetos a distancia pode ser inibida por outros procedi- mentos, Se, a0 lado de um co excitavel ¢ avido, se dé a outro edo po seco para comer, as glinduias salivares do primeiro, que até entdo reagiam vivamente a vista do pio, permanecem sem reagio, Um cio, colocado, pela primeira vez, Sobre uma mest, deixa de apresentar qualquer reagio salivar & vista do mesmo pe. dago de pio seco que, ha pouco, Ihe provocava abundante salivagdo. Acabo de citar fatos que se repetem facil e exatamente. Evidentemente, um. Brande mimero de fatos surpreendentes, relacionados com 0 adestramento dos animais, pertencem 4 mesma categoria de alguns dos nossos fatos, e, portato, testemunham, ja hé muito tempo, a presenca de leis fixas em certos fenomenos psiquicos dos animais. E de lamentar que, durante tanto tempo, no tenham atraido a atengdo da ciéncia. Nao se encontram, até agora, em minha eXxposigao, fatos correspondentes aos que, nd Munda subjetiva, chamamos de desejos. porque, na verdade, nao os encontramos. Estivemos, 20 contrério, em presenga de um fato fundamental; Constantemente © pe seco, em relagio ac qual o cdo apenas movia # cabega, TEXTOS ESCOLHIDOS 23 fazia, a distancia, correr uma grande quantidade de saliva, enquanto que a carne, sobre a qual o cio se atirava com avidez ¢ @ vista da qual fugia de trabalho e ran- gia os dentes, a distincia, deixava em repouso as glandulas salivares. Assim, pois, ‘a8 desejos, como os denominamos na vida subjetiva, encontram nos nossos expe- rimentos expresso unicamente na reagao motriz do animal e nao tém, no sentido positivo. nenhuma influéncia sobre a atividade das glindulas salivares. Disto se depreende que a frase: “um violento desejo excita a fungiio das glandulas salivares ou géstricas” nao corresponde a realidade, Eu fui, também, sem diivida, culpado dessa confusae, em artigos precedentes. Devemos, pois, em nossos experimentos, distinguir, claramente, chive a reagdo seeretéria do organismo e¢ a sua reagio motora. Tambim, no caso do funcionamento de glindulas, quando comparamos nossos resultados com fendmenos de mundo subjetivo. devemos falar nfo da pre- senga de descjos no ello, mas da presenga da atengao, condigao fundamental para obtermos éxito nos nossos experimentos, A reagio salivar do animal poderia ser considerada, na vida subjetiva, como o siebstracturm de uma imagem pura, elemen- tar, isto & como 0 substractum do pensamento. Os fatos citados permitem tirar algumas conclusées, a meu ver nao despro. vidas de importiincia, concernentes 208 processos do sistema nervoso central e pedem, por outro lado, ser submetidas a uma andlise ulterior, fecunda. Estude- mos, do ponto de vista fisiolégico, alguns desses fatos. particularmente 0 nosso fato fundamental. Quando 6 objeto considerado, esta ou aquela classe de alimento ou substancia, é capaz de produzir uma agae quimica irritante e entra em contato com uma porgio especial da superficie bucal, éle provoca uma irritagiio em razao daguelas de suas propriedades as quais corresponde, justamente, o trabalho das glandulas salivares. As outras qualidades, insignificantes no que respeita a ativi- dade salivar, assim como tudo o que rodeia o objeto exercem, ao mesmo tempo; uma excitagiio sobre as outras superficies sensiveis do corpo ¢ entram, pois, em relagdio com o centro nervoso das glindulas salivares, para o qual se dirige, por uma via centripeta constante, a excitagio produzida pelas propriedades essenciais do objeto. Poder-se-ia admitir, neste caso, que o centro salivar & no sistema ner- voso central, o ponte de atragdo das excitagdes que chegam de outras superficies irritadas. Certa via esti, pois, aberta até o centro da salivago 4s excitagdes provenientes de outras regides irritadas do carpo, Mas essa uniao do centro sali- var com esses pontos ocasionais é fragil e se rompe por si mesma, Necussita-se de uma repetigao continua da excitagao simultanea, exercida pelas qualidades essen- ciais do objeto o potas suas propriedades ogasionuis, para que essa unido se conso- lide cada vez mais. Estabelece-se, entao, uma relagdo temporaria entre a atividade de certo érgio ¢ os objetos exteriores, Essa relagdo temporaria, assim come a sua Tegra, que é a de reforgar-se pela repetig&o ¢ de desaparecer com a auséncia da repeti¢io, stio de uma importncia enorme para a prosperidade e a integridade do organismo; gragas a elas o organismo adquire um grau de adaptagao cada vez maior, uma correspondéncia mais sutil de sua atividade as condigées que o rodeiam. As duas partes desta regra sao igualmente importantes: se o organismo ganha muito com esta relagdo temporaria com o objeto, nao é menos certo que a a PAVLOV rutura desta relagao € necess4ria, no mais alto grau, a partir do momento em que a realidade nao mais a justifica. Se as coisas niio se passassem desse modo, as relagdes do animal, em lugar de serem sutis, seriam cadticas. Detenkamo-nos em outro fato. Como explicar-se, fisiologicamente, que o aspecto da carne anule a efcito produzido pelo pie sobre a parétida, isto & que a saliva, que antes era derramada sobre 0 pao, cesse de correr, quando se excita, ao mesmo tempo, o animal, por meio de carne? Podemos supor que a uma violenta Teagao motriz 4 carne corresponde uma forte irritagdo do centro motor, em conse qliéncia do que, segundo a regra enunciada, a irritagdo ¢ desviada das outras regides do sistema nervoso central ¢, em particular, dos centros salivares, 0 que equivale a dizer que a excitabilidade destes centros baixa, O experimento sobre a agiio suspeasiva que a visto de outro clio tem sobre a secregio de saliva provo- cada pela vista do pao confirma esta interpretagio. Aqui, com efcito, a reagdo motriz provocada pelo pito € muito forte. O experimento seria muito mais convin- cente se tivésiemos um cio que gostasse mais de alimentos secos, do que de ali- mentos com maior propor¢do de agua, ¢ que manifestaria, no primeiro caso, uma reagao motriz mais violenta, Teriamos absoluta razdo, no gue concerne ao experi- Mento mencionado, se este cio nao segregasse nenhuma saliva, ou segregasse menos que um cio comum, a vista de alimentos secos. Todo mundo sabe que, freqiientemente, um desejo demasiado intenso pode inibir certos reflexos especificos. Porém, entre os fatos citados, hd alguns que, no momento, sio muito dificeis de explicar do ponto de vista fisiolégico: por que, por exemplo, um reflexo condi- cionade torna-se. obrigatoriamente, ineficaz pela repetigio? A idéia natural de que isso resulta da fadiga nd0 parece constituir a explicagio adequada, pois s€ trata, justamente, de um excitante fraco. Tanto mais que a repetigao de uma exci- tagiio forte cm um reflexo absoluto, jamais causa uma fadiga tio tipida. Estamos, sem divida, diante de relagdes bastante particulares da excitagio conduzida por vias centripetas ocasionais. Tudo o que precede demonstra que nosso novo objeto pode ser submetido a um estudo objetivo. bem como que ele 6 essencialmente, um objeto claramente fisioldgico, £ indubitivel que a andlise deste grupo de irtitagdes, chegadas ao sis tema nervoso desde o mundo exterior, nos revelurd leis da atividade nervosa & far-nos-d ver aspectos do seu mecanismo, que, até o presente, permanecem na sombra ou siio apenas cnirevistos, enquanto nos ocupamos dos fenémenos nervo- SOS que Se dio no interior do organismo. Apesar da extrema complexidade destes novos fatos cles apresentam yrandes vantagens para a investigagdo, Nos estudos realizados atualmente sobre o meca- nismo do sistema nervoso, os experimentos sio primeiramente efetuados cam um animal que acaba de ser mutilado por uma operagao; em segunda lugar, ¢ isto ¢ © mais importante, nesses experimentos se excitam os troncos nervosos, 0 que quer dizer que submetemos, simultancamente, A mesma irritagao, um conjunto de fibras nervosas das mais diversas naturezas, combinagaio essa que, na vida real, jamais se praduz. Naturalmente, temos grande difieuldade para descobrir as leis TEXTOS ESCOLHIDOS 25 da atividade normal de um sistema nervoso que deixamos em um estado cadtice em virtude da irritagSo artificial. Nas condigdes naturais, assim como nos nossos. novos experimentos, as excitagGes sdo conduzidas separadamente, bem como sdo respeitadas algumas relagdes de intensidade. Isto se refere de modo geral a todos os experimentos psicokgicos, mas, no nosso caso, de fatos psiquicos observades sobre as glindulas salivares, vamos ter uma vantagem particular. Num objeto. complicado por natureza, 6 importante, no interesse da investiga, introduzir aleumas simplificagdes. Tal é 9 caso. no ter- reno que estudamos no momento. O papel das glindulas salivares € tio simples que suas relagoes com 0 que rodeia 0 organismo nao sao, também, complicadas, ¢ sao faceis de estudar ¢ de interpretar. Entretanto, niio se deve crer que o papel fisiolégico das glindulas salivares se limita as fungdes indicadas nesta exposigao. Por certo esta muito longe de ser assim. Por exemplo, o animal se serve da sua sa- liva para lamber e curar as suas feridas, coisa que pademos ver constantemente. Deve-se pensar ser esta a raziio pela qual obtemos saliva pela excitacdo de diver- sos nervos sensilivos. Assim mesmo, as conexoes fisiokigicas das glandulas sali- vares estio longe de ser tio complicadas coma as da musculatura esquelétiea, que felaciona, de diversos modos, 0 organismo com o munde exterior. Apesar disso, a confrontagio da reagio secretéria salivar, com a reagdo motriz, nos dard a possibilidade, primeiramente, de distinguir © particular do geral, ¢. em segundo lugar, de renunciar a estas concepgies erpretagées antropomérficas ¢stereoti- padas que se vém acumulando a respeito das reagGes motoras dos animais. Depois da constatagdo das possibilidades apresentadas pela andlise e pela sistematizagio dos nossos fatos, a fase seguinte do trabalho (e ja entramos nela) Sera a fragmentagao ¢ destruigao sistematicas do sistema nervoso central, com a finalidade de observar as mudangas suscitadas nas relagdes estabelecidas, Entregar-nos-emos, desta forma, a uma anilise anatémica destas relagdes. Isto & © que constimira a psicopatologia experimental de um futuro que, estou seguro disto, nao estd muito distante. Sob este aspecto, as glindulas salivares, como objeto de investigagio, vém se destacar sob um Angulo extraordinariamente favoravel, O sistema nervoso rela- cionado com 0 movimento é tao volumoso, doming a tal ponto a massa cerebral, que a destruigao de uma parte infima desse sistema da, geralmente, um resultado molesto ¢ extremamente complexo. © sistema nervoso das glindulas salivares nao constitui — dada a sua insignificancia fisiolégica — mais do que uma débil porcentagem do total da matéria cerebral e por consepuinte, est repartida, no cé- rebro, de uma maneira tio difusa que a sua destruigao isclada, ou parcial, nfo produzi iculdades que sobrevém, no mesmo caso, com © aparelho que inerva os movimentes. Por certo, os experimentos psicopatolégicos datam dos tempos em que 08 primeiros fisidlogos realizaram 2 ablagio de tal ou qual sex. mento do sistema nervoso cenwal ¢ a obser vagio dos animais que sobreviveram a essa operagdes. Os titimos vinte cu trinta anos tém dade, sab este aspecto, fatos importantes, Conhecemos ja a extrema limitagao das faculdades de adaptacio nos animais, depois da ablagdo dos grandes hemisféries ou da extirpagao de uma ou oulra porgiie deles. Mas as investigagdes a esse respeite ainda se nfio agruparam em um capitulo especial, cuje estude prosseguisse sem parada, e die acordo com planos predeterminados. A causa disto € segundo me parece, que os investiga. dores ainda no estiio de posse de um sistema suficientemente completo ¢ deta- Ihado das relagdes normais do animal com @ mundo exterior, que permita uma comparagao abjetiva ¢ exata do estado do animal, antes ¢ depois da operacao. Somente © caminho das investigagSes objetivas nos conduzira, progressiva- mente, & analise completa desta adaptagao ilimitada que & em toda a sua amplitu- de, a vida sobre a terra. O movimento das plantas para a luz, a procura da verda- de pela andlise matematica, nao séo, em sua esséncia, fendmenos do mesmo géncro? Nao estarfo af os tltimos elos da corrente quase infinita das adaptagdes realizadas em todo o mundo vivente? Podemos analisar os fendmenos da adaptagio, em suas formas mais simples, apoiando-nos sobre os fatos objetivos. Que razao teriamos para mudar de proce. dimento quanto ao estudo das adaptagdes numa ordem mais elevada? Comecou-se o wabalho nesta diregio, nas diversos niveis de vida, e ele avan- ¢a brilhantemente, sem encontrar obstaculos. O estudo objetivo da matéria viva, que comeca pela teoria dos tropismas nos seres vivos mais elementares, pode ¢ deve permanecer fiel a si mesma, inclusive quando se refere as manifestagdes supremas do organismo animal, os chemados fendmenos psiquicws nos animais superiores, Cedo ou tarde, apolando-se sobre a analogia ou a identidade das manifesta. g6es exteriores, a ciéneia aplicard os dados objetivos ao nosso mundo subjetivo e, fo mesmo tempo, exclarecerd, de forma surpreendente, nossa natureza tao miste- tiosa. fara compreender o mecanismo e o sentido vital daquilo que preocupa 0 homem mais que tudo, ou seja, a sua conseiéncia, ou mais Precisamente, os tor- mentos da sua consciéncia. Por isso me permiti, nesta exposigaio, certa contradi- Go no uso das termos. No titulo do meu discurso, ¢ durante toda a minha exposi- gio, cu me servi do termo “psiquic nquanto que durante todo o tempo no fiz mais que apresentar investigagdes objetivas, deixando completamente de lado o subjetivo, Os fendmenos vitais chamados psiquicos, embora abservados objetiva- mente nos animais, s¢ distinguem, ainda que somente pelo seu grau de complexi- dade, dos fendmenos puramente fisioligicos. Que importincia tem chamé-los de fendmenos psiquicos ou nervosos complexes, para distingui-los dos fatos fisiold- sicos simples, desde o instante em que compreendemos ¢ reconhecemos que 6 bid- logo nao pode aborda-los sendo do lado objetivo, sem se Preocupar com © pro: blema da sua nature: Nao é claro que o vitalismo ou o animismo atuais confundam dois pontos de vista distintos: o do bidlogo ¢ 0 do fildsofo, Os bidlogos fundamentaram, sempre, Seus Exitos grandiosos sobre © estudo © a comparagio dos fats objetivos, ignv- tando, por principio, a questo da esséncia das coisas e de suas causas finais; a fildsofo, que encarns a suprema tendéncia do homem para 2 sintese, sintese que, em nossos dias, no pode ser senao fantastica, deve desde agora, quando se esfor- $4 para dar uma resposta para mido © que preocupa o homem, fundit num todo nico 0 objetivo ¢ 0 subjetivo. Para 9 bidlogo, tudo reside ne método, que Ihe dé probabilidades de conquistar uma verdade silida ¢ inquebrantavel ¢, desde este ponto de vista, o dnico obrigatirio para ele. A alma, enquanto principio natura- lista, ndo s6 nao the serve para nada, mas, inclusive. sera prejudicial para a seu trabalho, ag limitar, inutilmente, a audacia ¢ a profundidade da sua andlise. tl ESTUDO CIENTIFICO DOS ASSIM-CHAMADOS PROCESSOS PSIQUICOS NOS ANIMAIS SUPERIORES' O ussanto da conferéneia de hoje, dedicada a Thomas Huxley, eminente representante das ciéneias naturais ¢ 0 mais enérgico defensor da maior principio bioldgico (a doutrina da evolugao), ¢ 0 estado naturalista dos processos psiquicos no animal superior, Comegarei com um caso real que ecorreu em meu laboratério ha alguns anos atras, Entre os meus colaboradores havia um javem doutor de mente ativa, capaz de apreciar as alegrias ¢ os triunfos da pesquisa. Grande foi o meu espanto quando esse leal amigo da ciéncia ficou profundamente perturbado ao ouvir os nossos planos de investigacao da atividade psiquica do cio, no mesmo laboratério € pelos mesmios meios que usaramos para a solugdo de problemas fisiolégicos. Todos os nossos argumentos foram em vaio. Ele profetizava e esperava apenas o malogra. A causa disso, tanto quanto pudemos entender, era a sua idéia de quee vida psiquiea do homem dos animais superiores era tio individual ¢ tio elevada, que nao apenas no se prestava a estudos, mas serin mesmo violada por nossos grosseiros métodos fisiolégicos. Apesur disto, cavalheiros, poder ser um exemplo um tanto quanto exagerado, julgo-o caracteristico ¢ tipico, Em se lidando com fenémenos vitais mais importantes, nao pode ser negligenciado o fato de que uma apreciagiio sistematica da ciéncia natural até seus extremos nao deixard de produ- zir juizos falsos e oposigao por parte dos que estio habituados a considerar esses fenGmenos de um outro ponte de vista e esto convencidos de que tal ponto de vista é incontestavel. E por isso que me vejo na abrigagao de, primeiro, explicar exata ¢ clara- mente os meus pontos de vista com relagio as atividades psiquicas dos animais superiores, e, depois, passar das preliminares ao assunto propriamente dito, a mais rapido possivel. Eu me referi as atividades pstquieas como as “assim-chama- das”, intencionalmente. $e o naturalista desejar fazer uma analise completa das atividades dos animais superigres, ele nfio tem 0 direito de falar dos processos psi- quicos desses animais, e nao pode fazé-lo, sem abrir mio dos princfpios da ciéncia natural, A ciéncia natural é o trabalho da mente humana aplicado a natureza, € a pesquisa da natureza, sem qualquer espécie de conjetura au explicagdo de outras * Conferdacia en homenagem a Thomas Huxley, reulicada na Charing Crass Meuival Schout, Landres, ‘ourebro de 1906. fontes, sendo a prépria natureza. Se o pesquisador fosse falar das faculdades psi- quicas dos animais superiores, estaria transferindo idéias de seu proprio munda interior 4 natureza, repetindo o procedimento de seus predecessores que. a0 obser: varem a namireza, estavam acostumados a aplicar, aos seus fendmenos inanima- dos, pensamentos, desejos, ¢ sensagdes proprios. O naturalista deve considerar apetias uma coisa: qual é a relacio dessa ou daquela reagdo externa do animal ‘com os fenémenos do mundo exterior? Essa reagdo deve ser extremamente com- plicada em comparagao com as dos animais inferiores, e infinitamente compli- cada em comparacao com a de qualquer objeto inanimado, mas o principio envol vido permanece 0 mesmo, Falando precisamente, a ciéncia natural tem por mister determinar apenas a relagdo exaia que existe entre o fendmeno natural ¢ a reagio do organismo vivo a esse fendmeno, ou, em outras palavras, averiguar inteiramente como um ser vivo se mantém em constante equilibrio com seu meio, Essa afirmativa é dificilmente contestivel, além do que se sustenta por estar recebendo, dia a dia, mais e mais accitagao geral na investigagao dos estdgios inferiores e intermediarios da escala zooldgica. A questdo ¢ simplesmente se esse preceito ja ¢ aplicado para o exame das fungdes mais importantes dos vertebrados superiores, Uma séria tentativa de instituir pesquisas nesse sentido é, a meu ver, a tinica resposta razodvel para essa questo. Eu e meus muitos colaboradores comegamos esse trabalho hé alguns anos atras, ¢, ultimamente, nos devotamos a ele quase que exclusivamente. Bu pediria, agora, a atengdo de yooés para um cémputo: primeiro, dos mais impor- tantes resultados dessa pesquisa, que me parece ser muito instrutiva; ¢, depois, das inferéncias que podem ser tragadas de acordo com ela. Nossas experiéncias foram realizadas exclusivamente no cio, ¢ nelas a rea- gdo particular usada foi um proceso fisiologico sem importéncia: a secregiio de saliva, O experimentador trabalhou sempre com um animal perfeitamente normal, isto é, um animal nfo submetido a influéncias anormais durante a experiéncia, Obseryagoes exatas do trabalho das glandulas salivares podiam ser feitas, a qual- quer momento, por meio de um método simples, A saliva brata, como todos sabe- mos, quando algo é dado ao cio para comer, ou é introduzida em sua boca & forga. Tanto a qualidade quanto a quantidade da saliva, sob essas condigdes, dependem estritamente da qualidade e quantidade das substancias levadas a boca do cio. Nesse processo fisiolégico bem conhecido, temos diante de nés um refle- x0. A idéia de acao reflexa, como uma fungio basica especial do sistema nervoso, € um velho ¢ estabelecido truismo em fisiologia. B a reagdo do organismo ac mundo exterior, efetuada através do sistema nervoso, pela qual um estimulo exter- no € transformado num processo nervoso ¢ transmitido ao longo de um roteiro em eirculo (das terminais periféricas* do nervo centripeto, através de suas fibras, a0 aparelho do sistema narvoso central, e ao longo da via centrifuga até que, alcan- fando um ou oNtro Orgao, excita sua atividade). Essa reagao é especifiea ¢ perma- * 4sto &, da parts externa do nervo; 0 mais distame possivel da cérebeo-e da miedhula cspinhal (0 sétema wer voio contral) ¢ eontendo as eélulas reteptoras especinis, que responulem a, ¢ percebem 08 varios aspecios da meiv (sons. cheiror ere) TEXTOS ESCOLHIDOS 31 nente. Sua especificidade ¢ uma manifestagdo de proxima c peculiar relagio do fendémeno externo com 3 ago fisioldgica, e ¢ fundamentada na sensibilidade espe- cifica das terminais do nervo periférico, na cadeia nervosa dada. Essas agdes refle- xas especificas na vida normal, ou, mais exatamente, na auséncia de condigées vi tais anormais, sio constantes ¢ imutiveis. As respostas das glindulas salivares as influéncias externas nao sio, entre- tanto, limitadas pelas agdcs reflexas comuns citadas acima. Todos nds sabemos nao apenas que as glandulas salivares comecam a segregar quando o estimulo de substancias aprapriadas é provocado na parte inferior da boca, mas também que, freqiicntemente, comegam a segregar quando outras superficies receptoras, incluindo os olhos ¢ as ouvidos, so estimuladas. As iiltimas ages mencionadas so, entretanto, geralmente consideradas A parte da fisiolugia e recebem o nome de estimulos psiquicos. ‘Tomaremos outro curso. e tentaremos restituir 4 fisiologia o que pertence a ela, Essas manifestagdes inquestionavelmente excepcionais tém muito em comum com a agao reflexa comum. Cada vez que comega tal secregiio de saliva, ela é atri- buivel & ocorréncia de algum estimulo especial entre as influéncias externas que podem ser identificadas, Numa atengiio muito acurada o observador percebe que © mimero de secregdes espontineas de saliva forma uma série ligeiramente decres- cente, © € muito provavel que as secregdes de saliva bastante infreqientes, para as quais nfo ha uma causa particular aparente & primeira vista. sao, na realidade, resultado de algum estimulo invisivel ao clho do observador. Por isso conclui-se que as vias centripetas sio sempre estimuladas primeiramente, ¢ as vias centri- fugas sccundariamonte, com a interposigio, ¢ claro, do sistema nervoso central. Esses so realmente todos os clementas de uma agio relfexa, faltando apenas dados exatos do mode de operagdo do estimuto no sistema nervosa central." Estax remos nds familiarizados com esse tiltimo mecanismo nos reflexos normais? Em geral, pois. nossos fendmenos séo reflexos. mas a diferenga entre esses reflexos recentemente identificados € os ja de ha muito conhecidos é, de certa forma, imen- 8a, pois foram destinados a setores bem distintos da ciéncia. A fisiologia tem, pois, diante de si, o problema de avaliar essa diferenga experimentaimente, ¢ de estabelecer as propriedadés essenciais dos refloxos que foram recentemente identificados. Em primeiro lugar, eles se originam de todas as partes superficiais do corpo, que sio sensiveis ao estimulo, mesmo de regides como os olhos ¢ os ouvidos, dos quais nunca se soube que dessem origem 2 uma agdo reflexa que provocasse as glandulas salivares, Deve-se mencionar que os reflexos salivares normais podem ter origem nio sé nas cavidades da boca, mas também na pele e na cavidade nasal. A pele, entretanto, somente praduz esse efeito quando é submetida a um processo destrutivo como o corte, ou o desgaste por substancias céusticas, enquanto a cavidade nasal produz esse efeita através do contato com yapores ou 7 Wilieos do editor. E esse Kipo de questde sobr> 4 qual Pavlov espeaula tio extensemente, 32 PAVLOV gases, como a amOnia, que provocam irritagao local, e nunea pelo efeito dos odo- Fes comuns, Em segundo lugar. um aspecto notiivel desses reflexos & que eles sao dos mais inconstantes. Todos os estimulos aplicades & boca do cdo dao infalivei- Mente um resultado positivo no que tange A secregdo de saliva, mas, quando os mesmods sao dirigidos aos olhos, ouvides, ete, podem ou nao algumas vezes ser cficientes, Em conseqiéncia do tiltimo fato mencionado, apenas. nés denomina- mos, provisoriamente, os novos reflexos “reflexos condicionados”, ¢, para efeito de distingdo, denominamos os antigas “incondicionadas" A questo posterior, que surgiu naturalmente, & seas condigdes que determi- ham 2 ocorréncia dos “reflexos condicionados™ podiam ser investigadas, ¢ se um completo conhecimento das condigSes tornaria possivel dar a esse reflexos um carater de constancia, Essa questio, me parece, deve ser considerada como res- pondida com a afirmativa, Vou lembrar para voces algumas leis hem estabele cidas, que jf foram publicadas pelo nosso laboratério. Todo estimulo eondicia- nado se torna totalmente sem efeito na Tepetigao. * Quanto mais curto foro inter- valo entre as repetigies do reflexo condicionado, mais rapidamente esse reflexo se extingue. A extin¢ao de um reflexo condicionado nao afeta a operagdo de outros. A restauracio espontinea dos reflexos condicionados extintos naa ocorre até de- pois do espago de uma, duas, ou mais horas, mas existe uma forma pela qual nosso refleto pode ser restaurado imediatamente. E necessirio apenas obter uma repetic¢do do reflexo incondicionado, como, pot exemplo, despejando uma solugao fraca de Acido na boca do cio, ¢, da mesma forna, mostrando-a a cle, ou deixan- do-o cheiré-la. A agdo desse iiltimo estimulo, que foi anteriormente e! iminada por completo, ¢ entio restaurada em toda a sua dimensio, O ‘seguinte fato pode ser regularmente observado: se por um longo tempo, dias ou semanas, continua- mente, um certo tipo de comida é mostado ao animal, sem the ser dado para comer, ela perde seu poder de estimular a distdncia,® isto & seu poder de agdo sobre os olhos, o nariz, etc, Esses dltimos casos mostram plenamente a intima relagio que existe entre os efeitos estimulanves das varias propriedades das subs- Uincias — a saber, os efeitos das propriedades que excitam a secregao de saliva Guando 4 substincia esti na boca — e os efeitos de outras propricdudes da mesma substincia agindo sobre outras partes receptivas do corpo, Esse fato nos permite sustentar que o reflexo condicionado se origina, de alguma forma, devido & existéncia do reflexo incondicionado. E, ao mesmo tempo, percebemos os princi. pais aspectos do mecanismo que dA origem ao reflexo condicionado, Quando um objeto é colocado na boca de um cilo, algumas de suas propriedades excitam o aparato dé reflexo simples das glandulas salivares, ¢ pela produgdo do nosso refle xo condicionado css agio deve estar em sineronia com a agao de outras proprie dades de mesmo objeto influenciando outras regides receprivas do corpo, de onde a excitagilo ¢ conduzida para outras partes do sistema nerves central. Assim como os efeitos estimulantes devidos a certas propriedades de um objeto colocado * Centanto que mia sea sepuids dem estima incondclonadlo, Ese fendmeno & mais tatde denominad extincdo, © Egneridncias feitas por Tolochinow'e Babbin, TEXTOS ESCOLHIDOS 3B na boca (reflexo incondicionado) de um cao pedem coincidir com um mimero de estimulos originados de outros objetos, todos esses imimeros estimulos podem transformar-se, por repetigo freqiiente, cm estimulos condicionados para as glan- dulas salivares. Tais estimulos podem originar-se do homem que alimenta 0 cio, ou que, forgosamente, introduc certas coisas cm sua boca, ou podem ser devidos a0 ambiente geral no qual se realizam. Por essa razio, ab experiéncias acima mencionadas, através das guais as leis dos reflexos condicionados podem ser estabelecidas, precisam de um expcrimentador bem treimado para desempenha-las, de modo que possa realmente investigar apenas a agdc do estimula condicionado determinado ou um mimero definido de tais estimules, sem introduzir inconscien- temente novos estimulos com cada repetigao sucessiva. Se essa Ultima condigio nao for observada, as leis em questao serao naturalmente obscurecidas. Deve-se lembrar que ao alimentar um cdo, ou ao introduzir algo @ forga em sua boca, cada movimento ¢ cada vuriagio de um movimento pode representar por si um esti- mulo condicionado, Se for esse 0 caso. ¢ se nossa hipdtese da origem do reflexo condicionado for correta, decorre que todo fendmeno natural escolhido & vontade pode ser convertido mum estimulo candicionado, Isso, com efeito, tem provado ser correto. Qualquer estimulo visual, qualquer som desejado, qualquer odor, ¢ a esti mulagio de qualquer parte da pele, quer por meios mecanicos, quer pela aplicagio de calor ou frio, nunca deixaram, em nossas mos, de estimular as glindulas sali- vares, embora antes fossem todos ineficientes para esse fim. [sso foi executado com a aplicagao de estimulos, simultanea com a acdo das glindulas salivares, cuja agdo foi provocada ao se dar certos tipos de comida, ou intreduzindo a forga. certas substincias na boca do cia. Esses reflexos condicionades artificiais, 0 resultado de nossos (reinos, mostraram exatamente as mesmas caractertsticas dos reflexos condicionados naturais jé deseritos. ® Quanto A sua extingdo e restaura: 80, cles seguiram essencialmente as mesmas leis dos refexos condicionados naturais. Temos, assim, 0 direito de dizer que a nossa aniilise da origem dos refle- X08 condivionados ¢ comprovada pelos fates,” Agora que tanto foi apresentado sobre o assunto, podemos avangar mais além do que era possivel no comege, para a compreensiio dos reflexos condicio nados, Nas manifestages da energia nervosa que foram, até o presente, submeti- das a cuidadoso exame cientifico (nosso velho reflexo especifico), os estimulos com os quais nos houvemos foram comparativamente pequenos em niimero, mas i 0, ¢ houve muita evidéneia de uma relagiio constante existente entre as influéncias externas ¢ os efeitos fistolégicas definides, Entre- tanto, numa ouwa parte mais complicada do sistema nervose enconvames um novo fendmeno, a saber, o estimulo condicionado. Por um lado, esse aparate ner voso torna-se responsavel, no mais elevado grau, isto é, suscetivel aes mais varia. dos estimulos externas, mas, por outro lado, e3s¢s estimulos nae siio constantes em sua operagio ¢ nao so definidamente associados com certos efeitos fisiald. * Thalicos de editors ” Experiéncias reatizsdas por Roldirev, Kasherininova ¢ Voskoboinikowa-Gransicem, gicos, Num dado momento, eneontramos poueas vireunstincias favoraveis, comparativamente, para esses estimulos se tornarem ativos no organismo por um period mais longo ou mais curto ¢ produzirem resultados fisioldgicos distintos, A introdugio da idéia de estimutos condicionados na fisiologia parece-me ser justifienda por muitas razées. Em primeira lugar. isso corresponde aos fatos que foram apresentadas, jd que representa uma inferéncia direta deles. Em segundo Ingar, esté em conformidade com as hipéteses mecanicas gerais da ciéncia natu- ral. Em muitos tipos de aparelhos e maquinarias, mesmo de construgao simples, certas forgas ndo podem ser desenvolvidas a no ser que, no momento devido, as condigdes necessarias existam. Em tereeira lugar, esta completamente coberta por idéias de facilitagao (Bahnung) e inibigdo," idéias que foram suficientemente ela boradas na literatura fisioldgica recente. Finalmente, nesses estimulos condicio- nados, vistos através de um enfoque da biologia geral, temos um mecanisme mais perfcito de adaptagao, ou, a que da no mesmo, um mecanismo muito delicado para manter um equilibrio com o meio circundante. O corpo tem a capacidade de reagir de uma forma sensitiva aos fenémenos do mundo exterior, que so essen- ciais para cle. porque todos os outros fendmenos do mundo exterior, mesmo as. mais insignificantes, coincidindo ainda que temporariamente com @ esseneial, tor- nam-sc seus indicadores ou, como podem ser chamadas, setts estimulos sinaliza dores. A delicadeza da reagio & demonstrada tanto na produgaa do estimulo condicionade, como no seu desaparecimento, quando deixa de ser um sinal apro priado. Deve-se admitir que existe, nesse pont, um dos principais mecanismos para outra discriminagao no sistema nervoso. Em vista de tudo isso, é admissivel, Peso cu, considerar a idéia de estimulos condicionados coma o fruto de trabalhos anteriores de bidlogos, ¢ considerar este meu relatério como uma ilustragdo do resultado desses trabalhos, em um enfoque mais complicado, Seria irracional ten- tar determinar, no momento, os limites do imenso campo conseqientemente aber- to ¢ dividi-lo. O que sogue deve ser considerado como, ¢ nada mais que isso. uma organizagio provisdria de material que foi coletado, dando apenas o« pontos indispensaveis para fins de explanagio, Ha rages para se considerar 0 processa do reflexo condicionade como ele- mentar, isto €, um proceso que consiste apenas na coincidéncia de qualquer um dos intimeros estimulos externos indiferentes com o estado de excitagiio de um ponto, numa parte definida do sistenta nervoso central, Assim, @ estabelecido um ¢aminho entre o estimulo indiferente (neutro) precedente ¢ esse ponte determi- nado, O primeiro argumento em favor dessa hipdtese é u acorréneia repetida dese fenémeno: © reflexo condicionado Pode ser obtido em todos os cies, ¢ pode ser produzido por todos os estimulos imagindveis, Por outro lado, ha a infalibilidade dessa ocorréncia; sob condigdes definidas, cla so reproduz inevitavelmente, Vemos, portanto, que 0 process niio é dificultado por quaisquer outras condigdes (e desconhecidas), Deve-se mencionar, aqui, que varios estimulos candicionados, F Pavlov se refece uel ds metyos-qur acclerain ¢ dette, respectivamente, um procevin Oa urha aye Cie Nopiea, TEXTOS ESCOLHIDOS: 3 qué se tornaram efetivos, foram aplicados a distancia, como a de um outro compartimento; o experimentador, que, no propdsito de obter o reflexe condicio- nado, geralmente ou dava ao cio algo para comer, ou colocava ura substncia de qualquer espécie em sta boca, nao estava cntio muito préximo do animal, mas 0 resultado dos estimulos foi, todavia, o mesmo. Ja foi colocado que qualquer fendmeno imaginavel do mundo exterior, afe- tando uma parte receptiva-especifica do corpo, pode ser convertide num estimulo condicionado, Depois que foram obtidos reflexos condicionados do alho, do ouvi- do, ¢ da pele, era interessante saber que relagio tinha a cavidade bucal com a pro- blema geral, e se um reflexo condicionado se originava na boca. A resposta a essa questaa nao podia ser simples, pois, nesse caso, do apenas as partes receptivas aos estimulos dos reflexos condicionados ¢ incondicionados, mas também os pro- prios cstimulas, estavam todos reunidos. Observaghes cuidadosas, entretanto, tor- haram possivel separar o estimulo condicionado do estimulo incondicionado, mesmo nesse caso. Quando substancias incomestiveis, irritantes, cram muitas vores colocadas sucessiva ¢ forgadamente na boca do cio, pudemos observar os Seguintes fatos: Se, por exemplo, uma certa quantidade de acido era despejada na boca do cAio, muitas ¢ sucessivas yezes, em cada nova repetigao desse procedimento, havia um maior fluxo de saliva. A mesma coisa foi repetida numa série de dias sucessi- vos, até que um certo maximo foi atingido, em conseqtiéacia do que a secregao permaneceu constante por um tempo consideravel, Se as experiéncias fossem interrompidas por alguns dias, a quantidade de saliva segregada se tornaria muito menor. Esse fato pode ser explicado muito simplesmente, como segue: na primeira aplicagio da solugio dcida, a seeregio da saliva dependia, principalmente, ou mesmo exclusivamente, dos reflexos incendicionados que o feido provocou, enquanto que © aumento ocorrido subseciientmente na secregdo indicava um reflexo condicionado produzido, aos poucos, sob a influéneia do mesmo dcido, ¢ tendo como parte receptora, também, a cavidade bucal.* Vamos agora considerar as condigdes que determinam a formagdo de refle- xos condlicionados, Essa questio, abordada amplamente, é naturalmente vasta, A cxplicago que segue servird para dar-Ihes apenas uma ligeira idéia da esfera com- pleta dese vasto assunto, Embora haja grandes diferencas no tempo necessirio para o estabelecimento de um refiexo condicionada, foram vistas algumas relacdes existentes. Por nossas experiéncias, tornou-se evidente que a intensidade do estimulo ¢ de essencial importancia. Temos alguns cdes, nos quais 0 aquecimento ou esfriamento de um lugar definido de sua pele agia como um estimulo condicionado para as glandulas salivares, Uma temperatura de 0° C ou 1° C, numa experiénein repetida por 20.00 30 vezes, causava um fluxa de saliva, enquanto que, uma outra, repetida 100 vezes a 4° C ou 5° C, nfo surtin qualquer efeito. Ocorre cxatamente a mesma coisa com as altas temperaturas. Um calor de 45° C, aplicado como estimulo © Expeinivivs realiaeas por Zetheim e Haldirey, 36 PAVLOV condicionady, nao apresentou. igualmente, efeitos, mesmo depois de 100 splica gées. Uma temperatura de 30° C, por outro lado, provocou uma secrecio de sali- va, depois de 20-30 aplicagdes.’° Fm contraste com isso, devemos dizer que, com relagao aos estimulos acisticos, sons muite altos, como o sear muito violento de uma campainha, no estabeleceram rapidamente, em comparacdo com os estimu- los mais fracos, um reflexo condicionado. Pode-se considerar que estimulos acis- ticos poderosos obtém alguma outra reagae importante no corpo (por exemplo, a motora), que retarda a evolucdo da reagao salivar. Ha um outro grupo de fendmenos relacionados, que merecem mengdo, Quan- do um odor, que nfo excita naturalmente v reflexa condicionado — como o da canfora, por exemplo — é difundido por meio de um aparato especial, essa dilu- sfio deve ser feita para coincidir 10 ou 20 vezes com a agao do estimulo incondi- cionado, como o acide despejado na boca do c&o. Mas sc o material odorifero é adicionado ao acido, o novo odor atua como um estimulo condicionado, depois de duas ou trés aplicagdes. Deveria perguntar-se se a circunstanela importante, nessa experiéncia, é a coincidéncia exata, no tempo, do reflexo condicionado, ou qualquer outra."' Para ser breve, vou omitir imteiramente os detalhes técnicos, tais como os métodos pelos quais os reflexos candicionados sio melhor obtidos: se com comida ou outra substfincia nao alimentar; quantas vezes os varios esti. mulos podem ser aplicados em um dia; com que periodos de intervalos, ¢ assim por diante. A seguir. pela ordem, surge a importante questo: quais so os estimu- los que o sistema nervoso do co identifica como fendmenos individuais no mundo exterior? Ou, em outras palavras, quais sio os clementos de um estimulo? Com referéncia a isso, ja existe uma boa quantidade de evidéncias. Se a aplicagio de baixa temperatura, numa frea definida da pele (um circulo cam um didmetro de 4 a 5 centimetros), age como estimulo condicionado para as glandulas saliva- Fes, a mesma aplicagéo, a qualquer outra parte da pele, provoca a secregio de saliva, como na primeira ocasiiio, Isso demonstra que a estimulagao pelo frie é generalizada numa parte considerdvel da pele, ov, talvez mesmo, sobre toda ela, Mas a aplicacio da baixa temperatura na pelo é claramente distinta, por exemplo, da aplicagiie do calor e da estimulagao mecaniea, Cada um desses estimulos devem ser elaborados separadamente, a fim de que fornecam um reflexo condicio- nado. Como no caso do frio, a aplicagao do calor a pele, como estimulo condicio- nado, também se generaliza. Isso equivale a dizer que, se uma aplicagao, feita numa regido da pele, estimula as glindulas salivarcs, uma feita a outra dren cutd- nea produziri, também, a secregao saliver. Resultados totalmente diferentes foram revelados pela estimulagdo mecinica da pele, camo, por exemplo, eafre- gando uma excova aspera (por meio de um aparelho especial), Quando esse trata- Mento se converteu num estimulo condicionado, ao ser aplicado numa certa area da pele, ficou completamente sem efeito em qualquer cutra érea. Outras formas de estimulagao meciniea, como a pressio de um objeto pontiagude, ou aspero, 1° BxperiSicins realizadas por Boldirey, Kasherininova e Vostubainikove Grassitrens, "' experiéneias realtzadas por Vurtanoy. TEXTOS ESCOLHIDOS: n revelaram-se menos eficientes. Aparemtemente. 0 primeiro estimulo mecanico for- mava, apenas, uma pequena parte do dltime.'* A estimulagao por sons musicais, ou por ruidos, é notadamente conveniente para determinar a Faculdade de diseri- minagdo ou andlise do sistema nervoso do cAio. Nesse aspecto. a preciso de nossa reagado é muito grande. Se uma determinada nota de um instrumento é empregada come um estimulo condicionado, ocorre geralmente que nde apenas todas as notas pravimas, mas mesmo aquelas que diferem em um quarto de tem, nao con- seguem produzir qualquer cfeito.** O timbre musical (qualidade) ¢ identificado com preciso similar, ou ainda maior. Um agente externo atya como estimulo condicionado no apenas quando surge. mas também quando desaparece, de modo. que ou seu inicio ou seu fim possum lornar-se 0 estimulo. Decerto, uma anise separada deve scr realizada, a fim de explicar a natureza de tais estimulos. Falamos até aqui da capacidade analitica do sistema nervoso. como se ela Tepresentasse, para nds, um estado complcto, Mas temos ja material acumulado que indica um continuo ¢ grande aumento dessa capacidade, se 0 experimentador persistir em subdividir ¢ variar os estimulos candicionados. Bis, de novo, um nove campo de enorme extensio. No material relacionado aos diversos estimulos condicionados, nao sio poucos os casos em gue pode ser perecbida uma relagao evidente entre a intensidade de um estimulo ¢ seu efeito, Quando uma temperatura, de 50° C comegou a proyocar o fluxo de saliva, descobriu-se que mesmo uma de 30° C tiaha um efeito similar, embora menor. Um resultado andlago pode ser observado em casos de estimulagao mecdnica. Esfregando-se com a escova, cm intervalos menos curtos de tempo (5 escovadas, ao invés de 25 ou 30 por minuto), provoca-se menos saliva que num intervalo normal, e as escovadas aceleradas {acima de 60 por minuto) provocam mais saliva. Ademais, foram tentadas combinagdes consistindo em estimulos do mesmo. tipo c, também, de tipas diferentes, O exemplo mais simples é uma combinagaio de diferentes tons musicais como. por exemplo, um acorde de trés tons, Quando isto € utilizado come estimulo condicionado, os tons tocados em pares, e cada tom isolado do acorde, produzem um efeito, mas os pares provocam menos saliva que 08 trés juntos, ¢ as notas tocadas separadamente menos ainda que as tocadas em pares,’ * © caso se torna mais complicado, quando empregamos uma combinagiio de estimulos de tipos diferentes, como estimulo condicionado, isto & atuando sobre partes receptivas diferentes. Apenas algumas dessas combinagdes foram experimentadas provisoriamente, Nesses casos, um dos estimulos se tornow, geral mente, um estimulo condicionatio, Numa combinagiin em que escovadelas ¢ bai- xas temperaturas foram empregadas, as primeiras foram preponderantes como estimulo condicionado, enquanto as seguintes, agindo por si mesmas, produziram um efeito apenas perceptivel. Mas, s¢ for feita uma tentativa de converter, separa- damente, os estimulos mais fracos num estimulo condicionada, eles agem "2 paperiénciin oealivdis por Uoldirey, Kashietininova © Voskoboinikows-Granstrem. ‘® Keperiéneia reslizada por Zetiony. 1+ Experiencinrealizada por #eliony, one PAVLOV logo enerpicamente. Se aplicarmas agora os dois estimulos juntos, temos diante de nés um efeito crescente resultante da soma des estimulos, ' > O problema que segue tinha por objetivo 2 expticagiio do que ocorre a um estimulo condicianado ativo, quando um novo estimulo é associado a ele. Nos cases que examinumos, vimos que a acdo do estimula condicionado fermado anteriormente foi perturbada quando um outro de mesmo tipo foi somado a ele. Um novo odor similar inibiu'a atuagio de outro que era, j4, um estimulo condicio- nado. Uma nova nota musical, isualmente, impediu a agio da nota empregada como estimulo condicionado, ¢ j4 aplicada antcriormente. Acho que nao deixa de ser interessante informar que nds comecamas esses experimentos com ouira obje- tivo em vista. Estavamos tentando obter um reflexo condicionado com a ajuda de Gutro reflexo condicionade, que se produzira anteriormente. Conseqiientemente fizemos eaperiéncias com combinagdes de estimulos diferentes. Pesquisas nesse sentido estio bem adiantadas. Temos que discriminar entre casos diferentes. Podemos dar alguns exemplos. Cogar (ou esfregar uma escova) pode ser um esti- mulo condicionado rapide ¢ eficiente. Quando juntamos a ele o tique-taque de um mewGnomo, aplicando ambos os estimulos simultaneamente, o ato de cogar perde imediatamente sua eficicia como estimulante durante as primeiras aplicagdes (primeira fase). E essa sitiagao perdura por alguns dias, mas a eficdcia é recupe- Fada, apesar da associago do metrénomo, e, entio, nosso estimulo duplo tem quase 0 mesmo efeito que 9 ato de cogar separadamente (segunda fase), Mais tarde, © ato de cogar, quando aplicado simultaneamente com o metGnomo, para de atuar ¢ a influéncia desse duplo estimulo chega, entio, completamente ao fim (tereeira fase). Quando a luz de uma limpada comum € associada ao ato de cogar,”* que é um estimulo condicionado, esse tltimo produz, de inicio, o mesmo efeito de antes, quando estava sem a lampada, mas, depois da combinagio do eogar ¢ da estimulo luminoso, deixa de atuar.'? Aparentemente, um fendmeno do mesmo tipo foi observade quando a ago de outros estimulos mecanicos foi experimentada em lugar do ato de cogur, que fora claborado para desempenhar a fungao de um estimulo condicionade. Em pri- meiro lugar, a secregio de saliva foi provocada pela presso de um objeto pontia- gudo e Aspero, mas em um grau menor que a do ato de cogar; na repetigdo, entre- tanto, 0 efeito do estimulo de pressao foi se tornando pouco a pouco menor, até que, finalmente, desapareceu de todo. Podemos admitir que uma parte da estimulagiio por abjetos pontiagudos ¢ Asperos era idéntica ado ato de cogar, ¢ que esse componente cra responsavel pela agdo desses objelos, durante suas primeiras aplicagdes, Mas uma parte da agdo ra especial. No decorrer do tempo, Jevava 4 destruigao da influéncia da primeira, Nessas inibigdes vemos 0 seguinte fendmeno, que se repete rogularmente em todas as experiéncias. Depois que um estimulo condicionado foi aplicado junta com um outro, que inibiu a sua ago, 0 efeito do primeira, tentado separadamente, foi bas- '® Expericneias feitay por Zetiony. ' Experiéncia: feitas por Vassilyev. " Pavlow chamava exse tina de fendmeno de“ ibigao condicionada”, TEXTOS ESCOLHIDOS x» tantc enfraquecido, e, algumas vezes, completamente suspenso, Isso é ou um efeito posterior do estimulo inibidor, que foi aplicado, ou extingiio do reflexo candicio- nado, pois. na experiéncia com o stimula condicionado. o reflexo condicionado nio foi fortalccida pelo reflexo incondicionado. A inibig&o do reflexe condicio- nado ¢ observada, também, a9 caso inverso. Quando se tem uma combinagae de agentes atuando come estimulo condicionado, na qual. come ja foi dito, um agen- te isolado nao produz por si mesmo quase nenhum efeito, conseqientemente 2 repetigio isolada freqiente de estimulo poderosamente ativo, sem 0 outro, leva a uma nitida inibigdo de sua aga, quase a ponto de aniquilé-la, A magnitude rela tiva de todas essas manifestagdes de estimulagao e inibigfio depende muito das condigSes sob as quais surgem. O que segue é um exemplo. Admitimos que o estimulo do ato de coar age come reflex condicionado da seguinte forma: em primelro lugar, nada algm do ato de cogar foi utilizado por 15 segundos; ai o 4cido foi despejado na boca do efo, continuands © ato de cogar até completar | minuto. Se voce aplicar. agora, ‘© ato de cogar durante exatamente 1 minuto, produz-se uma grande seeregio de saliva. Tente conservar esse reflexo. isto é, continue a cogar par mais | minuto, 86 entao despeje 0 Acido na boca do cdo. Se voee fizer isso muitas vexes succesiva- mente, 0 efeito do ato de cogar diminuiré rapidamente durante o primeiro minuto ¢ cessard, por fim, completamente. Para que o ato de cogar possa recuperar sua eficiéncia, durante o primeira minuto, é necessario apenas repetir a experiéncia virias vezes. De fato, seu efeito serii até maior que nos experiments anteriores. Observamos um curso similar de ocorréncias também na extensio exata do efeito inibitério. Finalmente, pode-se mencionar que foi {vita a wntativa de formar reficxos condicionadas a partir dos indicios’® dos Giltimos vestigios ou efeitos posteriares, tanto de um estimulo condicionado camo de um incondicionade. Isso foi executa- do, permitindo-se ao estimulo condicionado atuar por | minuto imediatamente anterior ao estimulo incondicionado, ou mesmo por 3 minutos antes, Houve sem. pre intervalos de alguns segundos a virios minutos entre os estimulos. Em todos 96 casos se dexenvolveu o reflexo condicionado. Mas, nos casos nos quais’v esti- mulo condicionado foi aplicado 3 minutos antes do incondicionade, e foi distan- siado do posterior por um intervalo de 2 minutos, obtivemos um resultado que, embora inesperado © muito peculiar, ocorreu sempre. Quando o ato de cogar, por exemplo, foi realizado num certo ponto da pele como estimulo condicionado, de- pois que cle se ativou, descobrimos que o ate de cogar em qualquer outre lugar também produzia um efeito; frio ou calor, aplicado pele. novos sons musieais, estimulos visuais ¢ adores — todos estes tinham o mesme efeito como estimulo condicionada, A secregio de saliva desusadamente grande e os movimentos muito expressivos do animal chamaram nossa atengio. Durante a ago do estimulo sondicionada, @ cio se comportou como seo dcido, que serviu de estimulo incon- dicionado, tivesse sido realmente despejado em sua boca, '* '* teilicos do editor. 1 Experiéncias feitax por Pimeaay. 40. PAVLOV Pode parecer que esse fendmeno seja de uma outra ordem. diferente daqueles om os quais nos ccupames até aqui. O fato é que, nos primeiras experimentes, foi necesséria pelo menos uma coincidéncia do estimulo condicionado com o incondicionado. Mas, nesses experimentos, fendmenos que nunca haviam ocor- tido em simultaneidade com um reflexo incondicionado estavam atuando como ¢stimulos candicionados. Aparece aqui, naturalmente. uma diferenga inquestio navel, mas, ao mesmo tempo, € obser vada uma propricdade ¢: menos. comum aos precedentes, que é¢ a existéncia de um ponto facilmente excit vel no sistema nervoso central, ag qual, como resultada de sua condigio, sao ditigides todos os estimulos essenciais do mundo externo, que atingem as células das partes superiores do cérebro. Aproximo-me agora do final do meu ligeira e muito mcompleto sumario de dados que foram obtidos nese novo campo de pesquisas. Tras aspectos caracte- risticos desse ussunto marcam profandamente o pesquisador. Em primeiro lugar, esses fendmenos sic acessiveis a investigagio precisa, sendo nese aspecto dificil mente inferiores aos fendmenos fisioldgicos comuns. Refiro-me a facilidade com # sencial desses fend- qual podem ser reproduzidos — acima de toda expectativa —, 4 sua uniformi dade sob condigSes similares de experimentagao, ¢ a0 fate de serem adequados a andlise experimental. Em segundo lugar ha a possibilidade de se considerar esse assunto objetivamemte, A introdugdo de algumas consideracdes subjetivas, que aceitamos, de vez em quands, para fins de comparagio, parcccu, numa reflexo posterior, ser um ato de violéncia ou uma afronta contra um esforgo intelectual sério. Em terceiro lugar, o assunto envolve um mimero incomum de questies esti muladoras para o pesquisador. Como classificar o assunto? A que parte da fisiologia ele corresponde? A Fesposta a essis perguntas nao apresenta dificuldade. Corresponde, em parte, a0 que foi, no comego, a fisiologia dos Grgdos especiais dos sentidos, e, em parte, a fisiologia do sistema nervoso central. Até o presente momento, 4 fisiologia dos olhos, ouvides e outros érgaos receptores foi considerada quase exelusivamente em scu aspecto subjetivo; isto apresentava algumas vantagens, mas, ao mesmo tempo, clara, limitava o alcance da pesquisa. A investigagio pelo método dos est mules condicionadas nos animais superiores evita esta limitagao, ¢ uma quanti- dade de quest6es importantes nexse campo de pesquisa pode ser imediatamente examinada, com 0 auxilio de todos esses imensos recursos que 05 experiments com animais colocam 4 mae do fisiélogo. © pouco tempo que resta nao me permi- te dar ilustragSes dessas questdes. A investigagao de reflexos condicionados ¢ mesmo da maior importancia para a fisiologia das partes superiores do sistema nervoso central. Até agora esse departamento da fisiologia, em sua maior exten- so, tem sido atravancade com idéias estranhas, emprestadas psicologia, mas agora hd a possibilidade de liberté-lo dessa dependéncia nociva, Os reflexos condicionados deseortinam ante nosses ollios o vasto campo das relagdes ¢ rea- ges dos animais 4 natureza; isto é um campo de imensa extensao, ¢ que deve ser tratado com objetividade, © fisiblogo pode ¢ deve examinar essas reagdes, lan- gando mao do uso correlato de remoeio progressiva e sistemditica de partes do sis- tema nervoso central, para finalmente chegar ao conhecimento exato do meca- TEXTOS ESCOLHIDOS 4 nismo envelvido. E al surgem imediatamente algumas questOes urgentes & praticas, Sobra ainda um ponto. Que reiagao ha entre os dados psicolégicos e os fatos recém-ieseritos? Que puntos de mitua correspondéneia hi? Quem se vcupard dessas relagdes? E quando? Esse relacionamento pode ser interessante mesmo agora, mas deve-se confessar que a fisiologia nao tem, no momento, nenhuma razao séria para discuti-lo, Sew problema imediato ¢ coletar ¢ analisar o intermi- navel aciimulo de material objetivo que se apresenta. Mas € evidente que a con- quista a ser feita ainda pele fisiologia consiste, na maior parte, na solugio real daqueles problemas que até agui tém molestado ¢ desconcertado a humanidade. A raga humana terd uma incalculavel vantagem ¢ extraordindrio controle sabre o comportamento humano quando o pesquisador cientifico for eapaz de submeter seu semelhante & mesma andlise externa que ele utilizaria para qualquer objeto natural, e quando a mente humana se contemplar n&o interiormente, mas exteriormente. Devo cu dizer alguma coisa sobre a relagao que existe entre a medicina e 0 assunto de minha coaferéncia? Fisiologia ¢ medicina sio fundamentalmente insepardveis, Se 0 médica é, em sua pratiea real, e, ainda mais importante, em seus ideais, um mecanico do organismo humano, entdo, inevitavelmente, todas as novas descobertas na fisiologia aumentardo, mais cedo ou mais tarde, o seu poder sobre essa extraordinaria maquina, seu poder de conservar e reparar seu mecanis- mo. E-me extremamente gratificante que, honrando a memoria de um grande naturalista ¢ homem da ciéncia, eu possa fazer uso de idéias ¢fatos que a partir deste singular ¢ auspicieso ponto de vista prometem aclarar a maior ¢ mais com: plicada parte do mecanismo animal. Sinto-me inteiramente persuadido, ¢ ouso expressar minha confianca no triunfo final desse nove método de pesquisa, ¢ con- fesso-o destemidamente. pois Thomas Huxley. que ¢ um exemplo para todos nds, luteu com rara coragem pela liberdade € pelos direitos do ponto de vista cientifico. Iv O CONCEITO DE REFLEXO ESUA EXTENSAO™ Nosso ponto de partida foi © conceito cartesiano de reflexo.® Esta é uma concepgao genuinamente cientifica, desde que implica necessidade, Pode ser resu- mida como se segue: Um estinulo externo ou interno chega a um ou outro recep tor nervoso e di origem a um impulso nervaso; esse impulso nervoso é transmi- tido ao longo das fibras nervosas ao sistema nervoso central, ¢ age em fungSo da existéncia de conecges nervosas, dando origem a um novo impulso que passa ao longo das fibras que sacm para o érgao ativa, onde excita uma atividade especial das estruturas celulares. Assim wn estimulo parece ter ume ligagde de necessidade com uma resposta definida, como a causa com 0 efeito.? Parece dbvio que a atividade global do organismo deva se conformar a leis definidas. Se o animal nao estiver em exata correspondéncia com o meio ambiente, ele deixar, cedo ou tarde, de existir. Para dar um exemplo bioldgico: ss, a0 invés de ser atraido para o alimento, a animal fosse repelido por ele, ou ao invés de fugir do fogo, se jogasse dentro dele, perece- ria entéo rapidamente. O animal deve responder a mudangas do meio ambiente de tal modo que sa atividade respandente seja dirigida a preservagdo de sua existén- cia, Esta conclusdo também se aplica ao considerarmes 0 organismo vivo em ter- mos da ciéncia fisica ¢ quimica. Todo sistema material s6 pode existir como entidade enquanto suas forgas internas, atragio, coesio, ete., contrabalangarem as forgas externas que agem sobre cle, Isto s¢ aplica tanto a uma pedra comum quanto 4 mais complexa subs- tancia quimica; e sua verdade deveria ser reconhecida também no organismo ani- mal. Sendo um sistema material circunscrito, definido, pode samente existir como 1 Reimpresso com ligeirae modifieagtes de Antep, 1927, pp. 7-18. 2 Muitos estudiosos de comportamento farem uma distingie entre 08 lermos reflexo € ured réflesion Usain reflexo come rétulo para designar a tcl, a relagdo observada entre extimulo ¢ resposta. deixando para 0 Gsi6 logo espevificar en seu arco reflexo — como Pavlov fax agai — a cadein de células receptoras espeei sstruturas nervosas.cefetores que medeivm a relago entre estima ¢ espera. ‘Uma discussion introducéria do assunto pode ser ensontrada em Principios de Peivalogia, FS. Keller © W. N. Seheenteld, Nova York, Appleton Century-Crofts, 1950. pp. 114. Teatamentos avasigados e filosotica mente safistisados podem sor enicontfades em The Melavior uf Ovganivms, B. F. Skiancr, Nova York, Apple- ton-Contury, 1938; ¢ “O concgito de reflex na deserigio do comportamento”, B. F. Skinner, Joumal af General Psychology, 1931, Volume 5, pfs. 427-458, * Indios do uaduter. As PAVLOV tal enquante em equilibrio com as forgas externas a ele: tao logo este equilibria soja seriamente perturbado, o organismo deixard de existir como a entidade que era. Refleaos so as unidades elementares no mecanismo do perpétuo equilibrio. Fisidlogas estudaram ¢ esto atualmente estudando estas fumerosas ¢ inevitaveis reagbes do organismo semelhantes as de maquinas — reflexos existentes desde 0 nascimento do animal, e devidas portanto a organizagio intrinseca do sistema nervoso. Reflexos, como corrcias transmissoras de maquinas de modela humano, podem ser de dois tipas — positive e negative, excitatério ¢ inibitério. Embora a investigagio destes reflexos por fisiélogos venha prosseguinda h4 muito tempo, esta atualmente longe de seu térming, Novos reflexos esto continuamente sendo descobertos. Nos ignoramos as propriedades destes Orgaos receptores para os quais © cxlimulo efetivo surge dentro do organismo, e os reflexos internos em si micemos permanecem um campo inexplorado, Os caminhos pelos quais os impul- Sos nervasos sio conduzidos no sistema neryoso central sio na sua maior parte pouco conhiecides, quando nao ignorados de tado, O mecanismo de inibigSes con. finado dentro do sistema nervose central permanece bastante obscuro: sabemos algo apenas daqueles reflexes inibitérios que se manifestam ao TJongo dos nervos eferentes inibitérios. Além disso, a combinagiia ¢ interagao de diferentes reflexos sao ainda agora insuficientemente vonhecidas. No entanto, fisidlogos esto sendo cada vez mais bem sucedidos no deslindamento do mecanismo destas utividades, semelhantes as das maquinas, que ocorrem no organismo, e ¢ razoavel esperar a ‘sua elucidagio e controle finais. Ags reflexos que tém sido h& muito tempo matéria de investigagao fisiolé- gita, ¢ que esto relacionados principalmente com atividades de Orgaos ¢ tecidos separados, deveria ser acrescentado outro grupo de reflexos inatos. Estes também Ocorrem no sistema nervosa, & constituem reagdes inevitaveis a estimulos perfeita- mente definidos, Eles se relacionam com reagdes do organismo como um todo. compreendem aquele comportamento geral do organismo chamado “instintivo” Desde que nao sc chegou a um consenso quanto a afinidade essencial dessas rea. gGes com oreflexo, devemos discutir a questiio mais profundamente, Devemos ao filsofo inglés Herbert Spencer a sugestio de que reagdes instintivas slo reflexos. Ampla evidéncia foi posteriormente acreseida por zodlogos, fisidlogos e estudan- tes de psicologia comparada, em apoio a isso, Eu proponho aqui reunir os varios argumentos a favor deste ponto de vista. Entre o reflex mais simples ¢ o instinto, podemes encontrar numerosus esti- Bi08 de transi¢ao, entre os quais nos perdemos ao buscar uma linha demarcatéria, Para exemplificar isto, podemos tomar um pintinho recém-saido da casca, Esta Pequena criatura reage bicando qualquer estimulo que cai no raio de sua vis: seja um objeto real ou apenas uma mancha na superficie onde ele esta andando. De que mancira podemos dizer que isto difere do inclinar da cabega, ou do fecher das palpebras, quando alguma coisa sibita atingiu seus olhos? Deveriamos cba mar este dltimo de reflexo defensivo, mas o primeiro foi denominado instinto ali- TEXTOS ESCOLHIDOS: a5 mentar, mesino se no bicar nada ocorrer além deuma inclinagao da cabega eum movimento do bico. Também se sustentou que 0s instintos sdo mais complexos que os reflexos. Ha, contude, reflexos extremamente complexes que singuém denominaria instin- tos. Podemos tomar o vomitar como exemplo. Este € muito complexo e envolve a coordenacda deum grande nimero de misculos (tanto estriades come lisos) espa- Ihados por uma grande 4rea ¢ normalmente empregados em fungdes muito dife- rentes do organismo. Também envolve uma atividade secretéria da parte de certas glindulas, normalmente evocada para um propésito bastante diferente. Noavamente, considerou-se que a longa série de agdes envolvidas em certas atividades instintivas propicia um ponto de contraste que o distingue do reflexo, o qual é visto sempre como sendo constituide de um padrao simples. Como exem- plo podemos tomar a construcdo de um ninko, ou habitagdes em geral, de ani- mais. Associa-se uma cadeia de incidentes: 0 material ¢ reunido ¢ transportado para © local escolhido; ali ¢ construido ¢ fortalecido. Para considerar isso como teflexo, devemos pressupor que um reflexo inicia © seguinte — ou, em outras palavras, devemos ver isso como uma cadcia reflexa. Mas essa associagao de ati- vidades| ‘@ somente os instintos, Estamos familiarizados com nume- roses reflexos, a maior parte dos quais se fundem cm cadeias. Assim, por exem- plo, se estimularmos um nervo aferente, p. ex., 6 nervo cidtico, ocorre um reflexo de aumento da pressio sanguinea; a pressdo alta no ventriculo esquerdo do cora- gio e na primeira parte da aorta serve como o estinulo efetive para um segundo reflexo, desta vez um reflexo depressor que tem uma influéncia moderadora sobre 0 primeiro. Podemos também mencionar uma das cadeias de reflexos recente- mente estabelecidas por Magnus.* Um gato, mesmo quando desprovido de seus: hemisférios cerebrais, na maioria das vezes cairé sobre suas patas quando langado do alto, Como consegue isto? Quando a posigdo espacial do drgio autolitico é alterada, um reflexo definido ¢ cvoeado, o qual ocasiona uma contrago de mus- culos do pescogo restabelecendo a posico normal da cabeca do animal. Este é 0 primeiro reflexo. Com o endir¢itamento da cabega, um novo reflexo ¢ ocasionado, © certos misculos do tronco ¢ dos membros svio postos em jogo, restaurando ao animal sua postura erecta. Este é 0 segundo reflexa. Alguns, de novo, objetam contra a identificagio de instintos com reflexos neste terreno: instintos, dizern eles, freqiientemente dependem do estado interno de um organismo, Por exemplo, um passaro somente constrdi seu ninho na estagdo de acasalamento. Ou, para tomar um exemplo mais simples, quando um animal estA saciado de comida, entio o alimento nio tem mais atragio ¢ o animal para de comer, Novamente, o mesmo é verdade para o impulso sexual. Este depende da idade do organismo, ¢ do estado das glindulas reprodutoras; e uma conside- rivel influéncia é exercida pelos horménios (os produtos das glandulas de secre- * Rudolph Magnus er um fisilago: holandés. Na sn0 lisiow monoprafia A:itpersteung, publicada em 1924 cic ewabeiecea a nature refiexs do mesanisme postural, Gio interna}. Mas esta dependéncia ndo pode ser reivindicada come uma proprie- dade particular dos “instintos”, A intensidade de qualquer reflexo, na verdade sua propria presenca, & muito dependente da irritabilidade dos centros, que por sua vez depende constantemente de propriedades fisicas¢ quimicas do sangue (estimu- lagdo automitica de centros) ¢ da interagao de reflexos. Por tiltimo, afirma-se algumas vezes que, cnquanto os reflexos determina apenas as atividades de orgdos simples e tecidos, os instintos envolvem a ativi dade do organismo como um todo. Sabemes agora, contudo, de recentes investi- gagdes de Magnus ede Kleijn, que fiear de pé, caminhar ¢ a manutcneao do equi- librio postural cm geral n3o sao nada além de reflexos, Segue-se de udo isto que instintos c reflexos sao analogamente as inevitaveis fespostas do organismo a estimulos internas e externos, e pertante nés nao preci. samos denomina-los com dois termos diferentes, Reflexo detém mais vantagens entre os dais, por ter sido usado, desde 0 inicio, com uma conotagae estritamente cicntifica. © agregado de reflexos constitui o fundamento da atividade nervosa tanto hos homens quanto nos animais. E portante de grande importancia estudar em detalhe todos os reflexos fundamentais do organismo. Até © presente. infeliz- mente, isso esta longe de estar completo. especialmente, como eu mencionel antes, n0 caso daqueles reflexos que tém sido conhecidas vagamente como “instintos™, Nosso conhecimento destes tiltimes é muito limitado ¢ fragmentario. Sua classifi- cagdo sob titulos tais como instintos “alimentar™, “defensive”, “sexual”, “pater- no" ou “materno”’ ¢ “social” é completamente inadequada, Sob cada um destes th- tulos agrupa-sc freqiientemente um grande niimero de reflexos individuais, Alguns destes so quase inidentificados; alguns estéo confundidos com outros; ¢ muitos estiio apenas parcialmente apreciados, Eu posso demonstrar de minha propria experiéncia em que medida o assunto perm anece incipiente ¢ cheio de lacunas. No decorrer das pesquisas que eu irei explicar, nds estivamos completamente perdi- dos. em certa ocasifa, para encontrar alguma causa para o comportamento pecu. liar de um animal, Era evidentemente um ¢i0 muito décil, que logo se tornou muito amigavel conosco, Nés comesamos com um experiment muito simples. O cde era colocado em um esirado com lacos frouxos em torno de suas pernas, mas de modo a ficar bastante confortavel e livre para dar um ou dois passos. Nada mais era feito exceto apresentar alimento repetidamente ao animal a intervalos de alguns minutos, Ele ficou bastante quieto no inicio, e comeu bem prontamente, mas com o tempo tornou-se excitada ¢ lutou para do estrado, arranhando o chao, mordendo os suportes, ¢ assim por diante, O incessante exercicio muscular foi acompanhado por resfolegamento e continua salivacdo, que persistiu em todos 9s experimentos durante varias semanas, o animal piorando, plorando, até que n@o mais se adequava a nossas pesquisas. Por um longe tempo nés ficamos surpreendidos com o inusitado comportamento deste animal. Tentamos experi mentalmente numerosas interpretagdes possiveis, mas, apesar de termos tide uma longa experiéncia com cies em nosso laboratério, iio podemos achar uma solu- gao satisfatéria para cate estranho comportamente, até que nos ocorrey final- TEXTOS ESCOLHIDOS a7 mente que podia ser uma expresstic de um especial reflexo de liberdade,° ¢ que 0 co simplesmente ndo pedia permanecer quieto enquanto era forgado a fiear no estrado. Este reflexo foi superado pela oposicao de outro — 0 reflexo pelo alimen- to, Nos comegamos a dar ao cio toda a sua comida no estrado. No inicio o ani- mal comia pouco, ¢ perdeu peso consideravelmente, mas gradualmente ele come- gou a comer mais, até que finalmente toda a racfo era consumide. Ao mesmo tempo o animal foi ficando mais quieto durante o transcorrer dos experimentos: 0 reflexo de liberdade estava senda inibido. Esta claro que o reflexo de liberdade é um dos mais importantes reflexos, ou. se usarmos um termo mais geral, reagdes, de seres vivos. Este reflexo tem ainda que encontrar sey reconhecimento final. Nos escritos de James nao é sequer enumerado entre os “instintos” especiais hamanos. Mas é claro que, se 0 animal nao fosse provide de um reflexo de protesto contra limitagSes postas a sua liberdade, o mais simples obstacule colocado em seu caminho interferiria com o desempenho adequado de suas fungdes. Alguns ani- mais, como todos nds sabemas, tém esse reflexo de liberdade em tal grau, que quando colocados em cativeiro recusam qualquer alimento, adoecem ¢ morrem. Como um outro cxemplo de reflexo muito negligenciado, devemes nos referir a0 que pode ser chamado reflexo investigatério. Eu o chamo de reflexo “O-que-é-isso?”. E este reflexo que ocasiona a resposta imediata no homem € nos animais As mais ligeiras mudangas no mundo em volta deles, de tal forma que cles imediatamente orientam seu Sérgio receptor apropriado de acordo com a quali- dade perceptivel no agente ocasionador da mudanga, fazende completa investiga- gio dele, A significagdo biolégica deste reflexo é Sbvia. Se o animal niio fosse pro- vido de tal reflexo, sua vida estaria suspensa a cada momento por um fio, No homem este reflexo foi enormemente desenvolvido com resultados que vao longe, sendo representado na sua forma mais clevada na curiosidade — o pai daquele método cientifico através do qual nds podemos esperar um dia chegar a uma ver- dadeira orientagéo no conhecimento do mundo a nossa volta. Menos ainda foi feito no sentido da elucidagiio da classe de reflexos negati- vos ou inibitérios (instincos) que sao freqientemente evocados por qualquer esti- mulo forte ou mesmo por estimulos fracos, se inusitados. O chamado hipnotismo animal pertence a esta categoria. Como as reagées nervogas fundamentais, tanto nos homens como nos ani- mais, sdo inatas, na forma de reflexos definidos, eu devo enfutizar novamente 0 quo importante € compilar uma lista completa compreendendo todos esses refle xos com sua adequada classifieagao. Porque, come ser mostrado, todas as res- tantes fungdes nervosas do organismo animal sao bascadas nesses reflexos. Agora, ainda que a posse de reflexos tais como esses recém-deseritos constitua a condi¢ao fundamental para a sobrevivéncia natural, eles nao sao cm si mesmos suficientes para assegurar uma existéncia prolongada, estavel e normal. Isto pode > Enguante a noo de eadelar complacas de reflex certarnonte & justificdvel nesta e-em alpumas ouwas extens6es do conceito de-reflexo, ¢ sentido por alguns estudiosos desta matéria que Pavlov ulirapasson a si mesmo, De qualquer modo, ele tinha bow razio para ver 0 dominio de suas investigagbies come se estendendee paraalém das relagict mais simples de estimulo.resposta. ct PAVLOV Set demonstrado em caes cujos hemisférios cerebrais foram removidos. Deixando de contar com 0s reflexos internes, um tal cdo ainda retém os reflexas externas fundamentais. E atraido pela comida; é repelide por estimulos necivos; cxibe 0 reflexo investigatorio, erguendo a cabeca e levantando as orelhas a0 som. Além disso, exibe o reflexo de liberdade, oftrecendo uma poderosa resisténcia a qual- quer sujeigaio. No entanta, é completamente incapaz de se cuidar e, se deixado a si mesmo, logo morrera. Evidentemente algo importante esta faltando em sua atual constituicao nervosa, Que atividades netvosas podera ter perdido? Vé-se facilmente que, neste cdo, o mimero de estimulos evocanda reagdes reflexas esta consideravelmente diminuido: aqueles remanescentes sao de uma natureza ele- mentar, generalizada, ¢ agem num fmbito muito reduzido, Conseqientemente 0 cquilibrio dindmico entre as forgas internas do sistema animal e as forgas externas em sew meio ambiente se tornou clementar se comparado ¢om a refinada adapta- bilidade de animal normal, ¢ o equilibrio mais simples ¢ obviamente inadequado: para a vida, Vamos agora retornar para o reflexo mais simples do qual nossa investigacio comegau, S¢ comida ou alguma substincia rejeitavel encontra-se na boca, produz-se uma secregao de saliva. O propdsito dessa secreg’o no caso do alimento é alteré-lo quimicamente, no caso da substincia rejeitdvel, diluir ¢ lavar 4 boca, Este éum exemple de um reflexo devido a propriedades fisicas e quimicas de uma substincia quando entra em contato com 2 membrana mucosa da boca ¢ lingua. Mas, além disso, uma secregio reflexa similar ¢ evocada quando esas substincias estéo colocadas a alguma distingia do cio e os Orgaos receptores afe- tados siio apenas aqueles de olfato ¢ visio. Mesmo a vasilha onde o alimento foi dado € suficiente para evocar um reflexo alimentar completo em todos os deta- ihes; ¢, mais ainda, a secregio pode ser provocada mesmo pela vista da pessoa que trouxe a vasitha, ou pelo som de seus passos. Todos esses inumeriveis estimu- los caindo sobre vérios receptores de distiincia finamente discriminantes perdem sua forga para sempre tio logo os hemisférias sejam retirados do animal, e apenas aqueles que tém um efeito direto sobre a boca lingua ainda mantém seu poder. A grande vantagem para esse organismo no reagir as estimulos anteriares é evi- dente, porque é em virtude de sua agio que o alimento, encontrando seu caminho: na boca, imediatamente a encontra cheia de saliva umedecedara, ¢ substancias rejeitiveis, freqiienternente nocivas para a membrana mucosa, encoatram uma ca- mada de saliva protetora ja ne boca, que rapidamente as dilui ¢ leva-as para fore, Maior ainda & sua importincia quando evocam, 0 componente motor do com. plexo reflexo de nutrigio, i. ¢., quando cles agem como estimulos para oreflexo de procurar alimento, Aqui esti outro exemple — 9 reflexo de autodefesa. O animal carnivero forte ataca animais mais fracos, ¢ estes, se esperarem para se defender até que os dentes do adversdrio estejam em sua carne, serao rapidamente exterminados. O caso assume aspecto diferente quando o reflexo de defesa é chamado a cena pela visdo ¢ pelos sons do aproximar do inimigo. Entio a presa tem uma chance de se salvar, escondendo-se ou fugindo, Como podemos descrever, em geral, asta diferenga no equilibrio dinamico da TEXTOS ESCOLHIDOS 49 vida entre © animal normal o descorticalizado? Qual é 9 mecanismo geral ¢ lel desta distingao? E bastante evidente que seb condigdes naturais o animal normal deve responder nio apenas a estimulos que Ihe tragam imediato beneficio ou dano. mas também a outros agentes fisicos ¢ quimicos — ondas de som, luz, & assim por dianté — que em si mesmos sao apenas sina! de aproximagao desses estimulos; embora nao seja a visio ou o som da fera apresadora que sao em si mesmos dunosos ao animal menor, mas seus dentes ¢ garras, Embora os esifmulos sinalizadores desempenhem uma flangdo nestes reflexos telativamente simples que demos como exemplos, cste nao é ainda o ponto mais importante. O aspecto essencial da atividade superior do sistema nervose central, com © qual estamos tratando e que nos animais superiores pertence inteiramente com maior probabilidade aos hemisférios, consiste nao no fato de que inimeros estimulos sinalizadores iniciam reagGes reflexas no animal, mas no fato de que, sob diferentes condigdes, estes mesmes estimulos podem iniciar reagSes reflexas bastante diferentes; c, inversamente, as mesmas reagdes podem ser iniciadas por diferentes estimulos, No exemplo acima mencionado do reflexo salivar, o sinal em uma vez éuma vasilha particular, em outra vez, outra; sob certas condigées, um homem, sob dife- rentes condi¢des, outro — dependendo estritamente de qual vasilha tivesse sido usada para alimentar ¢ de que homem tivesse trazido a vasilha ¢ dado alimento ao cho. Isto evidentemente torna as atividades respondentes do organismo, seme Ihantes as de miquinas, ainda mais precisas e acrescenta-lhe qualidades de perfei 20 ainda maior, Tao infinitamente complexas, assim continuamente em fluxo, so as condigdes no mundo a volta, que esse complexo sistema animal, ele mesmo em fluxo vivente. ¢ apenas esse sistema, tem uma chance de estabelecer um equili- brio dindmico com o meio ambiente, Assim vemos que a fungio mais geral ¢ fundamental dos hemisférios é a de reagir a sinais apresentados por numerosos estimulos de significagao intereambiavel, — a | | SSeS — = __- 2. aL | v O REFLEXO CONDICIONADO' Reflexo cendicionado é, atualmente, um termo fisioldgico proprio, que desig- na um fenémeno fisiolgico determinado, cujo estudo conduz & formagiio de um novo capitulo da Fisiologia Animal — atividade neryesa superior, primeira parte da fisiologia do segmento superior do sistema nervoso central. Ha muito tempo se vinham acumulando observag3es empiricas e cientificas: sabia-se que uma lesiio mecnica ou uma afecsiig do cérebro ¢, sobretudo, dos grandes hemisférios, pro- vocava transtornos no comportamento superior muito complexo do homem e dos animais, geralmente chamado atividade psiquiea. Na nossa época quem quer que haja recebido uma instrugio médica néo negara que as neuroses ¢ as psicoses esto relacionadas com o enfraquecimento ou desaparecimento das propriedades fisiolégicas normais do cérebro, ou com a sua maior ou menor destruigio. Surge, entiio, uma questdo fundamental ¢ obsessiva: qual é a relagao que existe enue 0. cérebro e a atividade nervosa superior do homem ¢ dos animais? Como por onde comesar o seu estudo? Paraceria, se a atividade psiquica fosse o resultado da atividade fisiolégica de certa massa cerebral, que seria Preciso que o seu estudo fosse empreendido a partir de um ponto de vista fisiolgico ea sua exploragao le- vada a efeito com tante éxito quanto a da anilise funcional de outros 6rgaos. No entanto, nada disso ocorreu, durante muitos anos. A atividade psiquica & ha muito tempo, © objeto de estudo de uma ciéncia especial: a Psicologia. E surpreendente quo, 86 recentemente, a partir de 1870, 2 Fisiologia obteve, gragas ao seu método de excitagdo artificial, os primeiros fatos precisos relacionados com determinada fungéo fisiologica dos grandes hemisférios, a fungio motora. Por intermédio de outro método também habitual, o da destruigdo parcial, foram adquirides dados suplementares sobre a formago de conexdes entre outras partes do cérebro € 05 principais receptores do organismo, ¢ ollio, o ouvide, ete. Isso ins: Pirou grandes esperangas, tanto aos fisidlogos, quanto aos psicdlogos, a respeito da intima relago existence entre a Fisiologia ¢ a Psicologia. Os psicdlogos, por um lado, adquiriram o costume de comegar seus tratados de Psicologia expondo * trabalho “O Refleay Condigionido”” fai escrite por Pavlov, em 1934, para a Granite Encielopéala Mis ‘8 Apresents vm resumo. de profundidedk © alcance excopsianeds, da cearin «as refleaws condieionadon, Neose trubalio Pavlov éomonstra a imeusa importincia biolipica geral, pera a Psicologia c a Psicopataloaia, ‘tanto do principio ds conexic temporirin, quanto Uo métedo objective de investigagio da alivadade nerwen superior das animais. (N. dos BE.) 2 PAVLOV a teoria do sistema nervoso central e. particularmente, des grandes hemisférios (Stgios dos sentidos). Por outro lado, os fisiélogos interpretaram de uma mancira psicolégica os resultados da interrupeio experimental da atividade de certas por- ghes dos hemisfécios dos animais. analogicameate ao que se passaria, no mesmo caso, no mundo interior do homem (por exemplo, o “cle ve, porém nao compreen- de", de Munk),* Mas © desiinime tomou logo conta dos dois campos. A fisiologia dos grandes hemisférios se imobilizou depois destes primeiros experimentos, ¢ quase cessou de progredir. Entre os psicdlogos aparecem, como antes, autores que se pronunciam resolutamente a favor da independéncia total do estudo: psicoki- gico, com relagdo & Fisiologia. Foram realizadas outtas lentativas para unir as ciéncias naturais riunfantes com a Psicologia, pelo método da valorizagéo numé- fica dos fendmenas psiquicos. Durante certo tempo se pensou em abrir, na Fisio- logia, um capitulo especial de Psicofisica. gragas a feliz descoberta de Weber € Fechner,* de uma lei que leva seus nomes, da relag’a numérica entre a intensi- dade da excitagdo exterior, ¢ da sensago. Mas 0 novo capiwlo néo ultrapassou essa dnica lei, Wundt. * antigo fisidlogo, convertido em psicdlogo e fildsofo, inten- tou, com mais éxito, aplicar a experimentagiio ¢ as medidas numéricas As manifes tagdes psiquicas, ¢ fundow a Psicologia Experimental. Desta maneira, foram cole- tados iniimeros dados, Alguns, a maneira de Fechner, dio o nome de Psicofisica 4 anilise mateméticn dos dados numéricos da Psicologia Experimental. Mas no ¢ raro encontrar, agora, desencantados da Psicologia Experimental entre os psicd- logos c, sobretudo, entre os psiquiatras, Que fazer, enti? Apesar de tudo, um novo cuminho comegava a sedelincar, 4 se deixar distinguir, caminho esse suscetivel de conduzir A salugao da questiio fundamental. Nao seria possivel encontrar um fendmeno psiquico elementar que, 80 mesmo tempo, pudesse ser considerado, inteiramente, como um fendmenc Puramente fisioldgico a fim de que. partindo-se dal, por um estudo rigorosamente objetivo (como sempre, em Fisiologia) das condigdes de seu aparecimento, de suas implicagSes © de yeu desaparecimento, pudéssemos obter o quadro fisioldgico, objetivo e completo, da atividude superior dos animais, do funcionamento normal do segmento superior do encéfalo, em lugar dos experimentos anteriores, baseados na excitagio artificial ¢ na destruigio? Ha muito tempo, esse fenémeno havia Felizmente chamado a atengio de muitos (entre os quais merece especial mengio Thorndike, * que, j4 tendo empreendido o seu estudo, se detiveram, por qualquer raziio desconhecida, no inicio, sem fazer, dos seus conhecimentos, a base de um método fundamental, essencial, de exploragao fisiolégica sistemitica da atividade nervosa superior do organismo animal, Esse fendmeno é o que, agora, chamamos “reflexo condicionado” ¢ cuja estudo, energicamente realizado, justifica por intei- ? Vor VIN, note 2:(N, dor RB) ® Segundo a lel ce Weber c Fechner. que citibeleve uma dopendéncia mumcrica entre a inlemidade: de esi tule ¢ ds semapao, x Intensidade da sensagao é preporcianal ao Jogaritmo da intensidude do estinulo, nao variando, assim, paralelamente és variagGes do valor ubsaluto deste. (N. dos FF.) © Ver WILL, nota 4. (N. dow. E.) * Wer WIIL nota 12.(N. dos E. Rp TEXTOS ESCOLHIDOS 53 Fo @ esperanca que acabamos de enunciar. Fagamos dois experimentas simples, que todo mundo pode realizar com éxito. Derrame-se, na boca de um edo, uma solugdo fraca de um dcido qualquer. Isto provoca, habitualmente, uma reagho defensiva: a solueao é repelida por meio de movimentos bruscos da boea, a saliva € expelida abundantemente na cavidade bucal (e, em seguida, para fora), fieando nela diluido 0 dcido, e a mucosa purificada. E, agora, outro experimento. Antes de introduzir o Acido na boca do cao, submetamo-lo a ago repetida de um agente exteme qualquer, de certo ruido, por exemplo. Que vemos? Bastard tio-somente repetir o ruida, para que se produza a mesma reagiio: os mesmos mavimentos da boca ¢ o meso derramamento de saliva. Estes dois fatos sia igualmente exatos ¢ constantes. Ambos devem ser desig- nados pelo mesmo termo fisiolégico de reflexo. Ambos desaparecem uo se seccio- narcm 0s nervos motores da musculatura bucal ¢ os nervos secretores das glindu- las salivares, isto ¢, os comandos efetuadores, ou os nervos aferentes, que partem da mucosa bucal ou do ouvido. ou, ainda, ao se destruir 0 centro de transmissao do fluxo nervoso (isto é, do processo dindmico de excitagdio nervosa) dos nervos aferentes, para os eferentes. Para o primeiro reflexo, este centro sera o prolonga- mento da medula e, para o segundo, os grandes hemisférios, O mais severo pensamento nada tera a dizer sobre. esses fatos, contra esta conclusao fisielégica, Todavia, a diferenga entre estes reflexos ja & clara. Fm pri- meiro lugar, 05 seus centros so diferentes, como acabamos de ver. Em segundo, como o demonstra a propria organizagio dos experimentos, o primeiro reflexo se produziu sem nenhuma preparagio prévia, sem nenhuma condigao, a0 passo que © segundo foi obtido gragas a certo processo. Que significa isso? No primciro caso, a passagem do fuxo nervoso de uma das vias para as autras se realiza dire- tamente, sem qualquer proceso especial, No segundo caso, esta passagem exige uma preparagio especial ¢ prévia. E mais natural imaginar a coisa da seguinte mancira: ne primeiro reflexo, di-se uma condueie direta do flux nervoso, no segundo, para a passagem do fluxo nervoso, deve ser formada, previamente, outta via. Esta nogdo jd era conhecida em Filosofia pelo nome de Bahnung.* Existem, pois, no sistema nervoso central, dois aparelhoy diferentes: o da condugao direta da corrente nervosa, ¢ 0 do seu fechamento ¢ abertura, Seria estranho que esta conclusiio. provocasse um sentimento de surpresa. O sistema nervoso &, sobre 0 hosso planeta, o instrumento mais complexo ¢ mais aperfeigoado de relagdes e de conexfo entre todas as partes do organismo, ¢ entre este Gltimo, como sistema de grande complexidade, ¢ vs inumerdveis fatores do mundo exterior, Se o fecha- mento ¢ a abertura do circuito elétrico é de aplicagdo técnica corrente, em nossos dias, como objetar contra a admisstio do mesmo principio neste admiravel instru. mento? Raseados no que acabamos de enunciar, é fegitima chamar de reflexo absoluto a relegéo permanente entre 0 agente externo ¢ a atlvidade do organismo Por ele determinada, ¢ de reflexe condicionada a relacao tempordria. Como siste- * Ralmung, formagie de uma via no sistema nervose: fucibitagio da condugho de ume reflex por ‘oveio de sua repetic#o (N, dles EE.)

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