Você está na página 1de 17
SUMARIO 18 2 82 A 108 KI a) Introdugao Eero Belle gt] 0 poder das palavras Cem milhdes de pobres a menos As quatro causas da desigualdade eel) Bolsa Familia ao contrario 0 PT contra o Bolsa Familia Em defesa dos inimigos imaginarios eM aTiCoMo lo c=) er-1 ao -terelp 1 0) As leis trabalhistas prejudicam os trabalhadores ‘190 198 210 on) Ny ny 278 aL 298 Airrelevancia dos sindicatos Por que as mulheres ganham menos que os homens Muito além da Petrobras As tolices que eles disseram Autossuficiéncia ¢ coisa de pobre Ainddstria mimada OnE Meio a Malm (ordeal) neste pais Agradecimentos ifn ter Tee Te) oe Doe oC mer erty Re Projeto grafico de miolo ANA CAROLINA MESQUITA jo. de provas EDUARDO CARNEIRO fos noe a Pr eeu MUL Ree aD aor} oles er is as emo rae) Apuragao IVANILDO TERCEIRO E FELIPPE HERMES eerie SaaS Emme ETS Eset Ceo aL a7 LW ode Ca OM TAOS PAU TE CIN Mra ne ele My Ae Marae sol coll XO (ele. A -7N PAGINA 267; Revista SUPERINTERESSANTE, EDICAO 317, ABRIL/2013 ete een) | Prete t eee ead DEC pe erin) ee een en eee Toe Tey ea Gre Means etek et Et eay TEN acces at eed Dect Cee ee CN Was ee el Cee etme) as BE SEaC i} Merete eer oar pac eee eae meciee Ber eeter een ce eee my Cae ee RE ieee leet el tees ot a sore GUIA POLITICAMENTE INCORRETO DA ECONOMIA BRASILEIRA LEANDRO NARLOCH I Sh TRABA Bayt prejudica: os trabalhadore Governos do mundo todo, para convencer as pessoas a deixar de fumar, costumam aumentar im- postos e estipular um prego minimo para o cigarro. Com 0 prego maior, menos gente compra cigarros, ea incidéncia de cancer de pulmio cai. Um estudo do Banco Mundial estima que, para cada aumento de 10% no prego do cigarro, 0 consumo em paises de renda baixa e média cai 8%.' Na Franga, os im- postos chegam a 80% ¢ 0 mago mais barato sai por 26 reais. Do mesmo modo, para desestimular as pessoas a comprar armas, 0 governo impéde regras, barreiras e multas. Para ter uma arma no Brasil, é preciso en tregar pelo menos nove documentos a Policia Fede- ral. Quem deixar a arma ser extraviada e nao avisar a policia em 24 horas pode pegar até dois anos de cadeia e ainda ser multado. Com tanta burocracia e tantos riscos, menos gente se interessa por armas. Legal. O estranho é que 0 governo toma medi- das muito parecidas com uma mercadoria que ele 162 deveria incentivar as pessoas a adquirir — 0 trae balho. Para contratar um funciondrio no Brasil é preciso apresentar tantos documentos quanto para conseguir um porte de arma, e pagar quase tantos impostos quanto para comprar um maco de Mark boro. Sao 8% de FGTS, 20% ao INSS, 1% a 3% referentes aos Riscos Ambientais do Trabalho (RAT) e geralmente 5,80% de contribuigao a érgaos como Senai, Sesc e Sesi. Se 0 negécio nao der certo e a empresa tiver que demitir os funciondarios, tera de pagar uma multa pela demissio equivalente a 40% do FGTS acumulado pelo empregado. Segundo um estudo da Fundagao Getulio Vargas, a legislacio tra balhista pode representar até 48% do custo de um empregado. No total, a lei trabalhista brasileira tem 922 artigos.” O efeito dessas leis é 0 mesmo que no caso do cigarro e das armas; tiram o incentivo para adquirir horas de trabalho. Menos incentivos, menos contra~ tagdes. Se as outras varidveis ficarem estaveis, quem esta procurando emprego tem de enfrentar mais concorrentes por menos vagas. Por oferta e procura, as leis pressionam os salarios para baixo. Outro efeito é 0 mercado negro. Se o custo do cigarro é alto demais, abre-se a oportunidade para o mercado negro de cigarros contrabandeados do Pa- raguai. Se o custo de uma contratagao é alto demais, cria-se um mercado informal de trabalho. A Consolidagio das Leis do Trabalho (CLT) é uma vaca sagrada no Brasil. Sindicatos e gente que supostamente defende os pobres se alvorogam com a menor was na CLT, Basta um comentario de um ministro sobre mudangas na CLT para ser chamado de traidor dos trabalhadores e alia~ do das grandes corporagées. Logo surge uma gritaria geral contra o que seria a “flexibilizagao das leis tra- balhistas”, a “precarizacao do trabalho” e “ameaga As conquistas dos trabalhadores”. Mas a verdade é que a CLT, ao aterrorizar os patrées, diminui a de- manda por trabalho e prejudica os trabalhadores. Centenas de estudos relacionam a rigidez das leis trabalhistas (multas para demissao, aviso prévio, dificuldade ao contratar, gastos além do saldrio e proibigdo de contratos de trabalho flexiveis) ao de- semprego ~ ¢ menores salarios. Por exemplo, uma analise de leis trabalhistas em 73 paises concluiu que se a Italia adotasse uma legislagao tao flexivel quanto a dos Estados Unidos, seu desemprego cairia de 8% para 5%. Ja a Indonésia, se tivesse regras tao flexiveis quanto as da Finlandia, teria uma taxa de desemprego 2,1 pontos percentuais menor; € 0 ntimero de jovens desempregados também diminui- ria 5,8%./ Outro estudo, de 2009, analisou 14 paises latino-americanos ¢ concluiu que leis trabalhistas mais flexiveis expandiriam 0 mercado de trabalho em 2%, eriando cerca de 3 milhdes de vagas.? A diferenga aparece até mesmo dentro do pré- prio pais. Um estudo de 2004 comparou os efeitos da legislagao trabalhista na india (onde os estados po- dem fazer emendas na lei trabalhista nacional) entre os anos de 1958 ¢ 1992. Concluiram que os estados que tornaram a lei mais rigida tinham investimento, 163 rigida — e teve um crescimento de 1,5% por ano.® No Brasil, uma lei de 1990 endureceu as regras: do mercado de trabalho. A multa por demissdo sem Justa causa passou de 10% para 40% do FGTS; o adicional de horas extras passou de 20% para 50%; a licenga-maternidade aumentou um més surgiu o adicional de um tergo de férias. Na década de 1990, a parcela de trabalhadores com carteira assinada en- colheu de 38% para 27%, Para os economistas Ma~ tian Bosch, Edwin Goni e William Maloney, uma coisa tem a ver com a outra. Para cles, “as regulagdes dos custos de demissio, horas extras ¢ o poder dos sindicatos” reduziram o saldrio inicial dos contrata- dos ¢ evitaram a criacao de vagas formais.’ Sea ideia de que as leis trabalhistas prejudi- cam os trabalhadores é correta, entao é preciso pro- var que os trabalhadores tém uma vida melhor em paises com leis trabalhistas menos rigidas. Pois com- pare os grupos de paises a seguir: Estados Unidos, Canada, Austrdlia, Cingapura, Hong Kong (China), Maldivas, ilhas Marshall. Bolivia, Venezuela, Guiné Equatorial, Sao Tomé e Principe, Tanzania, Congo e Reptiblica Centro-Africana. Quem acredita na magica das leis trabalhis- tas diria que elas sio mais Protetoras nos paises do alguns dos lugares mais rieos do mundas Na yerdade, no grupo | estao os sete paises com as leis trabalhistas mais permissivas, se- gundo 0 Banco Mundial. As pessoas sao livres para combinarem as regras ¢ a duragao da jornada de tra- balho. Nos Estados Unidos, nao ha multa para de- missdes, férias remuneradas nem adicional de hora extra estabelecido por lei (somente por contratos pri- vados). Cingapura nem sequer tem uma lei geral de salario-minimo. Ja o grupo 2 retine os sete paises cujas leis mais protegem os trabalhadores. Na Venezuela, a lei proi- be a demisso de quem ganha até um salério-minimo e meio (0 que faz funcionarios terem medo de serem promovidos, pois os patrdes costumam aumentar 0 salario para entao demiti-los), O dono de uma pa- daria na Guiné Equatorial, se sofrer uma queda no movimento e tiver que demitir funcionarios, tera de pagar alguns anos de salério aos funcionarios du- rante a resciséo do contrato. O mais curioso é que as nagdes do grupo 1 cos- tumam receber imigrantes interessados em partici- par do mercado de trabalho, enquanto as do grupo 2 costumam exportar trabalhadores. Sem emprego no pais natal, as pessoas se mudam para onde hé mais oportunidade — geralmente os paises com as leis me- nos protetoras, Nao sdo os ingleses que procuram trabalho em Portugal (onde o governo obriga as em- presas a tentar encaixar 0 empregado em outra po- sigao antes de demiti-lo) ou na Espanha (que faz o empregador pagar uma multa no valor de 30 dias de trabalho porano queo funciondrlo trabalhou na com: panhia se quiser despedi-lo); sso antes 08 portugue- ses € 08 espanhdis que sonham com um trabalho na Inglaterra. A lei trabalhista da Indonésia 6 das mais Protetoras - se um empregador quiser demitir um empregado com um ano de casa, tem de pagar uma multa equivalente a 17 semanas de saldrio e ainda pedir aprovagdo do governo. No entanto, 4 milhdes de indonésios trabalham em Cingapura, na Australia ena Malisia, onde as regras sio mais brandas.® Mais de 300 mil brasileiros trabalham nos Estados Unidos € outros 180 mil no Japao, onde sequer existe uma Justiga do Trabalho (os conflitos sao resolvidos em tribunais cfveis). Quem gosta de leis trabalhistas sao intelectuais ¢ sindicalistas. Jé os trabalhadores fogem delas na primeira oportunidade. 0 salario-minimo no Brasil é alto demais Imagine que um dia 0 governo, por pressio dos fri- gorificos e criadores de gado, anuncie uma medida Pproviséria determinando um prego minimo para a carne vermelha. Durante um pronunciamento ofi- clal, o ministro da Agricultura informa que tanto o acém de 10 reais quanto a picanha ou o filé-mignon de 30 reais terdo de ser vendidos por nao menos que 50 reais 0 quilo, Uma medida como essa pravocaria duas con- sequéncias imediatas. A primeira é que a venda de ‘de um prego alto demais, a8 pessoas trocarlam a carne de boi pelo frango de padaria ou filé de pescada. A segunda é que sobra- ria acém no supermercado. Tendo que pagar 50 reais 0 quilo, quem decidisse comprar carne escolheria o melhor corte que pudesse obter por esse prego. Iriam todos em busca de picanha, filé-mignon ou baby-beef, cnquanto as carnes menos nobres fica- riam encostadas na prateleira. O dono do supermer- cado, preocupado com tanto acém prestes a passar da data de validade, tentaria dar um fim ao produto. Provavelmente ingressaria num mercado negro para vender acém a um preco mais baixo que o estabele- cido pelo Ministério da Agricultura. Para resumir, a interveng¢ao do governo no preco diminuiria 0 consumo total de carne, prin- cipalmente o de carnes menos nobres, ¢ criaria um mercado negro do produto. Agora suponha que, no dia seguinte, fosse a vez de o Ministério do Trabalho anunciar um prego minimo — desta vez, 0 prego de um més de trabalho. “A partir do dia |? de janeiro”, anunciaria com orgu- Iho 0 ministro no Jornal Nacional, “‘nenhum traba- Ihador ganharé menos que mil reais por més”. A medida causaria as mesmas consequéncias do prego minimo da carne. Diante de um prego alto demais, muita gente desistiria de contratar traba- Ihadores. Donos de fabricas teriam um incentivo a mais para investir em méquinas; familias contrata- riam diaristas menos vezes na semana. Tendo de pa- gar um minimo, as pessoas contratariam os melhores encontrar por aquele vas lor, Pe ens, menox produtivas ou menos qualificadas fleariam encostadas na prateleira — ou Seja, desempregadas, Esses trabalhadores provavel- mente ingressariam num mercado informal para ven~ der sua forca de trabalho a um prego mais baixo que 0 estabelecido pelo Ministério do Trabalho, A interveng&o do governo no valor dos sald- Tos diminuiria o mimero de pessoas empregadas, principalmente mais jovens e menos qualificadas, ¢ criaria um mercado informal de trabalho. O leitor talvez rejeite a comparacao entre pes- soas € pedagos de carne. E claro que pessoas € filés tém direitos diferentes. A questao, como nota 0 eco- nomista Walter Williams, € que os dois, apesar de serem coisas bem distintas, est3o sujeitos 4s mesmas leis.” B 0 caso da lei da gravidade. Pessoas ¢ nacos de filé-mignon caem igualmente a uma aceleragao de 9,81 metros por segundo ao quadrado. “Do mesmo modo”, diz Williams, “a demanda por cortes de car- ne ¢ influenciada pelo prego, o que também acontece com a demanda pelo trabalho de uma pessoa”,!° Os perigos do saldrio-minimo nao sio nenhuma novidade. Estéo em qualquer apostila de economia basica, como a do professor Gregory Mankiw: “O sa- lario-minimo aumenta a renda dos trabalhadores em- Pregados, mas reduz a renda dos trabalhadores que nao conseguem emprego”, diz ele." Essa é a teoria, © favor dela ha algumas provas. Depois de décadas @ décadas de piso salarial (a maioria delas ¢ do co- mego do século XX), economistas montaram uma boa ‘goes e os danos cau- minimo, Alguns deles: © FMI estima que, quando o salario-minimo dobra em relacao a renda, o nivel de emprego entre os jovens brasileiros diminui entre 30% e 60%. Jovens pobres e imigrantes sao os mais afetados, pois geralmente sdo os candidatos menos qualificados. Em 1938, a primeira lei que criou o salario-m{- nimo nos Estados Unidos incentivou a mecani- zagdo e causou desemprego. Pesquisas baseadas na contabilidade de 87 fabricas de tecidos do sul dos Estados Unidos mostraram que, somente nos dois primeiros anos apés a lei, o uso de ma- quinas de fiago mais caras ¢ rapidas aumentou 69%, a importagdo de roupas subiu 27%, en- quanto o nimero de trabalhadores caiu 5,5%. Nas fabricas que, antes da lei, pagavam menos que 0s 25 centavos por hora (valor do primeiro salério-minimo), a queda do numero de empre- gados foi bem maior — 17%." O interessante ¢ que 0 efeito foi muito menor no norte dos Esta- dos Unidos, onde o salario imposto pelo gover- no nao ficava longe dos salarios usuais. Uma revisdo da literatura feita pelo National Bureau of Economic Research, o Ipea dos Es- tados Unidos, analisou mais de 102 estudos e revelou que 94 deles concluiam que aumen- tar o salario-minimo significava diminuicdo de oportunidades de emprego para trabalhadores pouco qualificados."? eo cco amu tie tna r Pome ORCUTT Tce ete ee cscs mance ecu enon ter areee eT Cem Thy ot Wa cel Loca cece Tiger coer eee eee a ator Rodrigo aS Ul ear CTea Come CR tam eet nt een Se Laer meen eae Mose ro LeCTBee seme menan ne mert Seo el eros sce ‘cost Cnn SC i Lh. aes ea Te meee coset a s seus dez funciondrios sejam garcons-loiros-parecidos-com- ~0-ator Rodrigo-Hilbert, © dono de restaurante prec Sue a desembolsar is com cada um ~ ou 4 mil reais pox més. Esse seria 0 Pyare eae perce ew est ene Tey pee LS CoCo esr Tee slechac ete cater eee ees donos de restaurante preferem garcons nordestinos. Quase chet dos gargons de Sao Paulo vem do Ceara e do BCU Se tt sti ETi eT neen RCM MICO eRe ncU Chom PT eRe ke Coa Ob rece CUS CCR he ee Pere cac ee Om hscc Re moan de piso salarial dos Estados Uni- Ae) ome Ae es Ptesipeae reas ess CUTS STU Persie we Victor kori ittel elu Neola Cc oc ea eho as, Em geral menos qualificados, 0s negros aceitavam menores salarios, Peter e een nce Gees Irae meen Roe cro emprego na industria da construcdo, eu apoio o salirio-minimo Ren ieee eet Gri en Cerca CN nets moe ceo mE oe ic Pee eae eee a eesrecr nt meron Ue (coe cna racista Building Workers, da Africa do Sul. Em 1925, a Comiss a do Sul adotava a mesma estratégia era Peotone ea EAN “© método seria fixar uma faixa [salarial] minima por ocupagdo ou vem da Regio Sul; somente Pedro II, uma cidade de 38 m 4 ire bita a a r ea Arent Ponies CLM OT imc ent te ee een ere eae PEO ERC hn ent Cesk Reco ic Comes Lo oT ms Br Uhre NCCU Omen ences era Coc ence cco Conon RCL 0 SALARIO-MiNIMO CONTRA OS NEGROS E SCR Uncen On nse ae senna OSs NT fe} Pisani een MSR RCC Rec te Ure OCU Cass RANTES Reena nena ge a comek tren en hua Pe eRe ee scm Cemeteries ace Meee tnee Cn MU eo tr CEcesc ocr) SPREE EN Coe ORC ca Cheeta Rae CCE Reeders ieiat esl eeaComeo er Cemetery epee i eats Cmca eMe ae Laer eee eines ESC Lea Peeler etc) Mas, Se Tete) i SSR See Teens ee ele ee eee restaura B ante serd obrigado a pagar esse valor tanto para garcons-| eet eerie , Pre ears ee ecu vindos de Pedro IL, % Co Peano is or Tec nT ede Yel Cord CMe tardy hic we Mem oenne Ce acs omemer rec loesy OO a aa atae ea CaS Caco eta ee ee sre, x primeites, Um salério-minimo alto demais anu eens lee Sea oer ances mico do preconceito ¢ tiraria do mercada grupos discriminados. Te ¢ Alan Krueger provocaram chiliques em colegas li berais ao mostrar que a relagdo entre saldrio-minimo € desemprego nem sempre bate coma realidade dos Estados Unidos. Em Nova Jersey, por exemplo, 0 sa- lario-minimo aumentou 18% de uma tacada sé, em 1992. Passou de 4,25 para 5,05 délares por hora. Em teoria, o reajuste deveria provocar desemprego de gente com salario haixo. Mas Card e Krueger analisa- ram a folha de pagamento de dezenas de lanchonetes da cidade (onde os funcionarios no costumam ter muitos digitos no holerite) e concluiram que acon- teceu 0 contrario. Oito meses depois do aumento, o McDonald's e seus concorrentes tinham até aumen- tado levemente 0 ntimero de funciondrios. © Brasil também poderia estar na lista de exemplos de Card ¢ Krueger. Entre 2002 ¢ 2014, 0 salario-minimo aumentou 75% acima da inflagao. Pela cartilha liberal, esse aumento deveria resultar em desemprego e aumento da informalidade. Mas 0 que aconteceu no mesmo periodo foi o contrario. O desemprego desabou e a informalidade caiu de 43% Para 22%, Como explicar tantos dados a contrariar a teoria econdmica? Bem, de varias formas. A primeira é que, em economia, é imposs{vel isolar todas as variaveis. No exemplo de Nova Jersey, talvez o crescimento da economia tenha aumentado a venda de Big Macs, levando gerentes de lojas a contratar mais funciondrios, apesar do salario maior. Ou oc ia em baixa € 0 bolso vazio, 08 moradores evitaram restaurantes caros € optaram pelo McDonald’s como um “bem inferior”, 6 tipo de produto cuja demanda cresce em momen- tos de crise. Refutagdes a estudos cconémicos cos- tumam atacar por esse flanco — outras varidveis que podem ter influenciado a histéria. Bo caso do Brasil. Entre 2002 e 2014, outra va- ridvel influenciou a nossa vida — a alta do prego da soja, do minério de ferro e outras matérias-primas. Investidores internacionais derramaram no Brasil um balde gigantesco de dinheiro, empurrando para cima as agées brasileiras, a criagdo de vagas de traba- lho, a economia em geral. O pais cresceu em média 3,38%. Ganhou 217 novos shoppings. Isso significa mais pedreiros para construir tais centros comer- ciais, caminhoneiros para levar cimento até a obra, vendedoras de loja e atendentes do McDonald's (que teve 266 filiais abertas nesse periodo). Muito além da carteira assinada, construtoras ofereceram até massagens para atrair pedreiros de patios de obras de empresas concorrentes. Talvez. 0 aumento do sa- Jario-minimo tenha pressionado para baixo a taxa de emprego, mas o crescimento da economia teve forea muite maior para aumentar salarios e multipli- car vagas formais de trabalho. Outra explicagao ¢ que, mesmo com o aumen- to, o salério-minimo nao superou 0 prego de equili- brio. Voltando ao exemplo da carne, se 0 Ministério da Agricultura estabelecesse um prego minimo de 12 reais o quilo, e nao de 50 reais, criaria poucas barato que o filémignon. A imposigéo do nimo s6 atrapalha se o prego estabelecido for demais. A questao, portanto, é: qual valor é alto de- mais para 0 saldrio-minimo? A revista The Economist, apds analisar deze nas de estudos sobre o tema, concluiu 0 seguinte; 0 piso mais ajuda que atrapalha se for um pouco me- nor que metade da renda mediana do pais.! Renda mediana é quanto ganha 0 sujeito que fica exata- mente no meio, entre 0s 50% mais ricos e 50% mais pobres. Por esse critério, 0 piso dos salérios nos Es- tados Unidos é baixo, pois equivale a 38% da renda mediana. Eis o motivo de aumentos do salario-mini- mo nem sempre causarem desemprego por 14. No caso do Brasil, temos um problema. 0 nos- so salario-minimo tem subido rapido demais em re- lagio a produtividade: Brasil: O salério-minimo esta aumentando muito mais que a produtividade & === Produtividade do Trabalho (PB Real Forca de Trabalho) ————= Sadtlominimo Real con ‘ 14 2004 2095 2006 2007 2008 2009 20)0 2011 2012 2013 2074 2015 Fonte: Calcules de Mercado Popular com dados de IBGE bem mais rapide que a yenda mediana, fim 2002, 0 piso de 200 reais cor- respondia a 45,5% da venda mediana no Brasil (de 439 reais), Hm margo de 2015, era de 788, ou 69,7% da renda de 1.298 reais. Isso sem contar os pisos regionais. Para 0 economista Mansueto Almeida, o saldrio-minimo brasileiro esta entre os mais altos do mundo em termos relativos.'® Tao alto em relagdo a renda mediana quanto o da Franga — que causa um dos maiores desempregos entre jovens da Europa. Veja s6: Em relagao a renda mediana dos cidadaos, o salario- -minimo do Brasil é um dos mais altos do mundo 0% 70% rm 62% 66% 60% | 53% 50% 47% 44% ao. 38% 30% ve Fane wa Fonte: Salirio minimo em relagao a renda média -OECD Pelo critério da renda mediana, o salario-mini- mo brasileiro, para nao excluir gente pouco produti- va do mercado de trabalho, deveria ser em torno de 45% da renda mediana. Ou aproximadamente 584 reais. Do jeito que esta, € alto demais. Alguas problemas jd estio aparecendo, Os | balhadores mais produtivos tiveram aumento de lario a custa dos menos produtivos e escolarizados, que esto sendo excluidos do mercado de trabalho. Para os brasileiros com até trés anos de estudo, estd cada vez mais dificil encontrar emprego, Como mon» tra este grafico do Tpea: Porcentagem de brasileiros com 0 a 3 anos de estudo, por condicao no mercado de trabalho 40/- [ a Ocupns 35 ~~ > betenmegies 30- e = mG? Fonte: Escolaridade e ocupagao - IPEA A valorizagio do salério-minimo também pode estar relacionada ao aumento do numero de jovens que nem estudam nem trabalham — 0 que os economistas chamam de “gerac3o nem-nem”. De 2000 a 2013, os “nem-nem” passaram de 18,2% para 20,3% dos jovens entre 15 ¢ 29 anos. $40 quase 10 milkées de brasilciros, principalmente mulheres (69%] e pessoas com pouces anos de estudo. A in- sisténcia na valorizagao do salario-minimo esta dei- xando os jovens brasileiros sem salario algum. Se pudessem ganhar menos, teriam a chance de apren- der fazendo, aumentando aos poucos 0 salario e a ehamam de “que deveria proteger os twabalhadores coloca ox jovens num beco sem saida: pouco experientes, nao conseguem emprego; sem emprego, nao adquirem experiéncia. ‘A solugao liberal para evitar esses danos é simplesmente extinguir o salario-minimo e deixar 0 mercado regular © prego. Mas ha pelo menos trés solugdes mais moderadas: 1. Tirar dos politicos o controle sobre o valor dos pisos salariais. Politicos querem votos —e um bom meio de ganhar votos é dar uma de ilusionista capaz de tirar da cartola leis que aumentam salérios por magica, Na Inglater~ ra, politicos podem espernear, mas tém pouco poder sobre 0 salario-minimo, Quem decide o reajuste anual é a Low Pay Commission, um comité de especialistas semelhante ao Comité de Politica Monetaria (Copom), conselho que regula a taxa de juros no Brasil. 2. Quebrar o salario-minimo em diversos valores conforme a idade do trabalhador. 0 exemplo também vem da Inglaterra. Em 2014, 0 salario- -minimo por la era de 2,73 libras para apren- dizes, 3,79 para menores de 18 anos, 5,13 para jovens entre 18 € 20 anos € 6,50 para trabalha- dores maiores de 21 anos. 3. Dar forca a valores regionais do salario-minimo. Um piso nacional pode prejudicar quem mora nas regides mais pobres do pais em beneficio WT 178 fabrica no Menaito: Dade pagaria | nores que no Rio de Janeiro, Se a lei tmp um salario-minimo nacional acima dos valores do mercado, nio haverd vantagem em construir uma fabrica no Maranhao. O dono da fabrica preferird regides com melhor infraestrutura ¢ proéximas dos consumidores, enquanto os ma- ranhenses ou ficario desempregados ou irao para o mercado informal. E claro que, em termos absolutos, 788 reais € um saldrio mixuruca. Todos concordamos que, num mundo ideal, os brasileiros deveriam ganhar o suficiente para comer bem, morar com conforto, passar as férias no sul da Franga e comprar muitos guias politicamente incorretos. A questao é que leis para aumentar a renda por decreto mais atrapalham que ajudam. O que realmente ajuda os trabalhado- res vem a seguir. Como nao defender os trabalhadores Tanto economistas da esquerda como os de centro ou da direita concordam: o que realmente aumenta o sa- lario € 0 crescimento da produtividade e da economia. “Produtividade nao é tudo, mas no longo prazo € quase tudo”, diz Paul Krugman, Nobel de no mercado, Ricardo Paes de Barros, que até o comego de 2015 liderou os programas sociais do governo do PT, vai na mesma linha. “A melhor politica social hoje, no Brasil, ¢ o crescimento econdmico”, disse ele numa entrevista a © Globo.” “Para reduzir a pobreza, fortalecer a clas- se média e continuar num processo de ascensao ¢ de melhoria das condigdes de vida, 0 mais importante nao é a redugao da desigualdade, mas o aumento da produtividade”, repete ele em quase toda conversa com jornalistas.* A quantidade de bens ou servigos que uma pessoa produz por hora é quase sinnimo de rique- za. Pescador que passa o dia todo na beira do rio para conseguir um lambari: pobre. Pescador que em 15 minutos no mar descobre um cardume imenso de atum-azul: miliondrio. Quanto maior a produtivida- de, menos a pessoa precisa trabalhar para ter uma boa renda. Nas empresas, a produtividade determi- na 0 maximo que um funcionério pode receber sem dar prejuizo. Uma construtora sé vai pagar 3 mil re- ais a um mestre de obras se ele render pelo menos 3.001 reais. Quanto mais o sujeito produzir por hora, mais alto é 0 teto que 0 saldrio dele pode alcancar. Alguém poderia dizer que, muitas veres, @ produtividade aumenta € os salarios nao. E verdade. Isso acontece porque 0 piso dos salarios depende de outro fator: a lei da oferta e da procura. Se houver muitos mestres de obras se candidatando para pou- * cas vagas, a construtora podera oferecer bem menos 180 que 3 mil reais por més, Um candidato avina que toparia o trabalho por 2.500 reais; outro, por 2.200 reais; um terceiro j4 arredonda para 1.500 reals. “Duas coisas governam os salirios: produtividade — ou até que ponto o trabalho é importante para o trabalhador — e oferta ¢ procura por trabalhadores de determinada capacidade”, resume 0 analista eco- némico Eduardo Porter.’? A produtividade define 0 maximo; ja 0 valor minimo do salario é definido pela segunda melhor alternativa do trabalhador. Ou seja: quem quer dedicar a vida a ajudar os trabalhadores precisa, além de lutar pelo aumento da produtividade, torcer para que haja mais obras precisando de mestres que mestres precisando de obras. Isso acontece quando a economia se expan- de. Se mais negécios so abertos e mais prédios sao construidos, ha mais vagas de trabalho. A empre- gada doméstica pode dar adeus a patroa que a trata mal ¢ virar vendedora de sapatos em um shopping. A vendedora de sapatos vira secretaria executiva. Uma construtora avisa os mestres de obras que acei- ta contratar por 1.800 reais; outra, por 2.200 reais; uma terceira ja arredonda para 2.500 reais. Quanto maior a alta do PIB, mais a lei da oferta e da procura favorece os empregados. O mais intrigante dessa histdria toda ¢ 0 se- guinte: por que os sindicatos, a Central Unica des Trabalhadores (CUT), os intelectuais que lutam por um mundo melhor € os ativistas que dizem defen- der os pobres desprezam as duas forgas que mais elevam salarios? Nenhum blogueiro de esquerda sai histérico | aando que 0 PIB cres= ceu s6 0,1% no semesire ¢ que isso é terrivel para os trabalhadores; a CUT jamais fechou a Paulista ou invadiu ministérios exigindo aumento da produti- vidade no Brasil. Eolha que hd um bocado de mas noticias nesses dois assuntos. Depois de flamejar entre 2005 ¢ 2012, a economia brasileira se apagou. Noticias decepcionan- tes sobre 0 PIB apareceram nos jornais sem que ne- nhum dos supostos defensores dos pobres lamentasse. Sobre a produtividade, 0 noticidrio também no costuma ser dos mais empolgantes. O Brasil estava em 56° lugar no ranking de produtividade do Férum Econémico Mundial de 2013, oito luga- res atras da posigao de 2012. A produtividade dos brasileiros esté patinando ha trinta anos. Encolheu 1,35% ao ano na década de 1980 e mais um 1% ao ano na década de 1990, S6 cresceu nos anos 2000, mas devagar — em média 0,9% ao ano. A da Coreia do Sul, que em 1960 era menor que a brasileira, hoje é quatro vezes maior. A China, um décimo menos produtiva que o Brasil em 1970, deve nos deixar para tras em breve. Brasilia costuma dar de ombros a quase tudo que aumenta a produtividade de um pais: educa- cio, infraestrutura, acesso a inovagio & tecnologia e facilidade de fazer negécios. O pescador de Jambari citado neste capitulo, por exemplo, teria uma vida muito mais fAcil se fizesse um curso avancado de pesca em rios, se tivesse um barco, talvez um sonar para encontrar cardumes, ¢ se a estrada para 0 rio eee 181 182 A lee nio fosse esburagada © congestionada, Mas a edu- cagdo publica e a infraestrutura sio uma lastima, o governo impoe barreiras e taxas para a importagio de maquinas e equipamentos, e exige uma burocta~ cia imensa para quem quiser manter uma empresa ou contratar funcionarios. Enquanto a produtividade patina no Brasil, outros paises avancam gu ze « 10 reer 1950 1985 1980 1965. 1970 17S 1980. 1985 1980 1985 2090 2005 2010 ZOI Fonte; SAE / PR com base em Penn World Tables, & como se 0 pescador de lambari, depois de gastar o dia na beira do rio, ainda tivesse que preen- cher uma papelada imensa para transportar ¢ ven- der 0 unico peixe que obteve. “Horas e mais horas de trabalho sao utilizadas em tarefas que pouco adi- cionam ao produto final, contribuindo para a redu- 40 geral da produtividade da economia brasileira”, afirma 0 economista Pedro Cavalcanti Ferreira.” Sem abrir a boca em defesa da produtividade e do crescimento da economia, os sindicalistas agem como um ativista do meio ambiente que nao liga na cozinha. ‘DA para entender o desprezo pela produtivi- dade e pelo crescimento da economia. Admitir a im- portancia dessas duas forcas nos saldrios implicaria reconhecer verdades dolorosas. A primeira ¢ que eles (0s sindicalistas, os movimentos sociais, os ativistas que dizem defender os pobres, enfim, os bons moci- nhos em geral) so pouco relevantes na luta dos em- pregados por um salério ¢ um trabalho melhor. A segunda é que um bom jeito de ajudar os pobres é facilitando a vida de empresarios ¢ homens de negécio. Se 0 crescimento da economia ajuda os pobres e os trabalhadores, isso se deve a seus prota- gonistas, ou seja, 0s homens de negécio, alguns de- les ricos, quase todos interessados somente em botar dinheiro no bolso. Mas sindicalistas e intelectuais jamais ficariam do mesmo lado que homens de neg6- cio, Preferem ficar do lado da ideologia. O que me faz acreditar que eles sao movidos por um ressentimen- to, um desejo de vinganga contra os ricos, € nao por uma vontade genuina de ajudar os trabalhadores. 183 errs Geer Cen ue ee bok Pee CMA ae Ne ceseore ne ee mic cee UrC enel ene movimentos sociais tomerem as ruas “exigindo melhor rence Biter omer Iconic arene rie Ree inser Waa set ror y talismo”. Quem pensa assim precisa explicar uma coisa: como e por re Leet rene Secee Mee Ou iaas recs hoe temen roel salario nos anos 2000? COMO EXPLICAR i= annul ORI NBA Tole) aey.NS cam ne ows wine wr vt eA OW errs EMPREGADAS DOMESTICAS . EE Ter ome RCC nar een ccc PIB em baixa, salarto das empregadas em baixa {cia éalei Nc} Pere eee cr ei aia : is ea i re Rathy imec clea Caras Reon reemCnte Ene g Cenc en Cur corasrant Caco POCONOS no cm Lamy 4 : al Ihdes de pobres Hae ee ee a ema dos outros (como ja contei no capitulo “Cem milhies de F PO ene teuns ee CEO tte acm erer toe merreen) Pere Meter teal COMO OC cures ns Perec Le ewan cre Pr ea Cesn ty aire Peet aCodie erect Ey ne ecm accion Ree ali ou diarista filiada a algum sindicato. ntre 2005 ¢ 2012, a econo- Ree es caekeee eget em ete parte eine tate Renee Me ton eve vat See Cie ree eatin cen mc uc onoe ia Rrretony Ree Re RTE MRSC ere iar omen oe te salario real (descontada a inflacdo) quase dobrou Pe ener eC RE Ce sco et Lc cn Penne Prenat rece vocs ON UEC tte Lao ea ae cc ean ead ea ty fle BSCE Pe Coe Coen C an ea a Prenat 10 "1 2 18 u Banco Mundial, “A epidernia do tabagismo - Os governos & ¢ aspectos econdmicos do controle do tabaco”, 1? edi¢Ao, 2000, Presidéncia da Republica, “Decreto-lel n.° 5.452, de 1” de malo de. 1943”. Disponivel em:

Você também pode gostar