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Estocolmo, 1993, pp. 469 ss.; penal y criminolo, § 4. O HORIZONTE COMO CONDICIONANTE DA COMPREENSAO 1. Fungdes punitivas manifestas e latentes 1. A legislagdo penal é 0 ma A partir de uma pr isico de interpretagio do dircito pe~ ita aproximagiio pode-se entender por le izam sua decisdo segundo areas particulares (ci- izagdo ndo muda a esséncia dos modelos decisdrios adotados, porque dieito nfo pode progra- mar mais do que o socialmente possivel. Os pr 0 niio é muito adequado para combinagées com os. mais flexiveis para serem combinados vo, dissolve 0 conflito, Iangado ao tempo para que se apague. Este mecanismo de dissolugao atua sobre o ser sen- do do humano: no decorrer do tempo vamos nos refazendo e mudando, ¢ 0 imento do conflito ao tempo espera que os protagonistas se transformem, ‘u tranquilizando-se a seu respeito, pouco importando 1m ou nio deste esquecimento, No ha sociedade na qual todos os conflitos tenham duzir uma solugo por via is 3. O poder estatal concede as suas instituigdes funcdes manife sto expressas, declaradas e ptiblicas. Trata-se de uma necessidade rept um poder orientador que nao expresse para que ¢ exercido no pode subn se a0 juizo de racionalidade. Porém, em geral, essa fuungdio manifesta nko coi cide por completo com 0 que a instituigo realiza na sociedade, ou seja, com suas funcBes latentes ou reais, Tal disparidade deve ser sempre objeto de critica institucional, porque ¢ a tinica maneira de controlar a racionalidade do poder, pois, em caso contrario (se a discussdo se mantiver ao mero nivel das fungdes stas), 0 controle seria de pura racionalidade do discurso. O poder estatal ingio manifesta ndo-punitiva e fungdes latentes punitivas (ou seja, que no exprime discursivamente suas fungdes reais) € muito mais amplo do que fom a seu cargo as fungdes punitivas manifestas. ’4 de um lado poder estatal desprovido de fungées punitivas a administragao hospitalar ou escolar, ¢ as as funges sto claramente puniti- ‘autor de um homicidio. Mas fora jionalizago de criangas e adolescen- itela®); b) situagdes mais confusas, porque a fungi exercicio desse sentenga pode ter por objeto evitar a continuidade da leso ou impedir um con- flito maior, mas ela também pode ser utili 8b Il Leis penais manifestas, latentes e eventuais direito penal ficas ‘eo e de todos os princi tes normativos de hierarquia maxima, ‘uma lei, flanges manifestas diversas ou limitando-se a omitir o nome das penas. 2. Para evitar tal expediente é necessaiio construir 0 conceito de lei penal de modo que abranja: a)_as leis penais manifestas (cédigo penal, leis penais ireito penal: 0 caso mais notério é o direito penal dos ‘cuidado extremo nessa dtea é que se 0 estado de policia nela irrompesse desba- rataria todas as relagdes econémicas. 8 IIL. O probleméitico horizonte de projegéio do direito penal 1.A partir de sua denominago mais usual, verifica-se que a pena deli- mita o horizonte de projesao do direito penal’ . Mas a pena esta muito Jonge de ser um conceito dotado de certa precisio®. Pelo contririo, pareceria que a sociedade industrial oculta-Ihe até a prépria etimologia, pois pena provém da 1a poena, que tem por vor grega poné, mo, abandonou-se Pein, e com isso a denominagao de peinliches Rec passou-se a Sirafe ¢ a Strafrecht, para mencionar a pena ¢ o direito penal © essa mudanga nao obsta a que em alemao ico vingado ¢ justo (gerdcht y gerecht) distantemente, no pode ignorar-se a cercania com a palavra pluma, através da raiz sinserita pet-, que sugere a ideia de voar, mas também de precipitar- sse!?, Parece que os gregos chamavam de pharmakos as vitimas humanas que ‘eram sacrificadas ~ precipitadas ~ em momentos de crises para absorver as impurezas do ambiente, o que provocava um efeito farmacutico"”; a metafo- ra do pharmakon emprega-se em termos dialéticos para assinalar a ambivaléncia do veneno e do antidoto"* ito pouco claro, é s6 0 comego itadora do horizonte do saber ‘so, sem 0 que nao existe ambito ou universo del reiterar tal afirmagao sem distinguir a pena de outras formas de coergio, tere~ | berg Jarblcher, n° 5, p. 25 ss; Noll, Sirafe, Volk, Klaus, en ZStW, i 83, dela pena, p. 339 8 sérios e abertos, ¢ pressupdem a par jonte de sua origem. Por isso é sempre necessario estabelecer o horizonte de projegaio antes de ensaiar o sistema de compreensio: torna-se mister saber 0 que ios perguntaremos, antes de comegarmos a fazé-to. provisoriedade, porque a medida percebemos que year os ho- rizontes de projegio &, todos os saberes. Nao obstante, nfo se deve pensar que internos de cada saber na forma de comy relagdes com outros saberes ¢ com 0 proprio poder o impulsionam, pois 0 novo paradigma continua sendo um saber-poder; sticede que o poder que pro- Felizmente tal fato ~ como fruto da ineludivel parcializagao do saber ~ ¢ ine- vitével e, assim, garante a dindmica do mento, O paradigma causal da pena caiu como consequéncia da revolugdo qudntica na reducionismo biolégico ¢ do speni depois de sua assungio pelo nacional cujo racismo entrou em colapso ismo. IV, Direito penal e modelo de estado de policia 1, Com a afirmagéio de que a pena proporciona o horizonte de projegio do direito penal ¢ de que seu universo deve abarcar a legislagtio manifest latente ¢ eventualmente penal propria de est (0s tedticos incompativeis para ultrapassar um beco sem saida, 2. Nao é possivel pre de perto a fungao politica dar a ideia de estado de polici mas se omite que e! Tem progressos € retrocessos: § 5. DireTo PENAL E MODELO DE ESTADO DE DIREITO 1. Delimitagao do horizonte por uma teoria negativa da pena as da pena correspondem & seguinte estrutura coergées predispostas em outras Ieis ou em (o interpretativo das coergées com a fungio nuida, as agéncias juridicas decidem a seu respeito em cada caso, com ex- sso traz duas consequéncias: a) Fica statal que ndo corresponder & fungio por arbitraria definigao, no for ainda que material- 2. Comoas fungdes manifestas atribuidas pelas teorias positivas da pena foram enunciadas em quantidade ¢ disparidade tais que as fizeram aparecer s ¢ incompativeis, os “direitos penais sual, Constitucional ¢ intemacional para roded-lo de limitagdes gxteras ¢ formals, o que em nada se assemelha & regulame! trata de conter uma aN ‘ustenta que & um aributo da soberenia; no ‘de regular um suposto jus punie di, Isso evidencia a impossibilidade de limitagao material, mas legitinia o poder. 3. Nao se transpée esse atoleiro com uma nova teoria punitiva, mas sim apelando para uma ‘eoria negativa ou agndstica da pena: deve-se ens undo generalizveis) em toro de fungSes manfestas Adtando-s na 1 Y aprrddonon o juridica artificial: 0 maior poder do sistema penal néo reside na pena, mas sim no Poder devia, observar, controlar movimentos¢idias,obterdados da vida privada ‘ele, Se existe alguma divida acerca do enorme poder verticalizador do sistema penal, bbasia olhar para a experiéncia historica: 0 sindicalismo, o pluralismo democritico, 0 or conseguint,fzer dela sua matéia assim como desautoriza os elementos 7. Sem diivida & assombroso descobrira existéncia de numerosos atos de poder que ndo correspondem ao modelo reparador nem de coergao direta, rivam de direitos ou provocam dor, ¢ quase nunca so considerados penas. sam observar que o poder, em matéria que com raziio Ihe & tio mais cara que outras, nao s6 gera saber como também, com o maior zelo, condiciona 0 sujeito cognoscente, mediante um adestramento juridico dirigido para a izagio de discursos tedricos que ocultam o carder de pena da maioria delas, as quais conseguem assim, por omissio condicionada dos operadores juridicos, legitimagio para sua imposig&o fora de qualquer hipétese delituosa ¢ penal encarregou-se,j far os elementos negativos, seus esforgs para rcionalizar um retrocesso de seu poder dco, ter escolhido exereé-lo como poder de discurs to negativo de pena tem o efeito discur nentes negativos, pois permite ~ mediante seus vinculos énticos ~ poder punitivo em todas as suas dimensdes. Nao ha ditvida de que ‘do desse poder ao discurso do direito penal e, por conseguinte, ao controle ¢ redugio juridicos, scra uma tarefa lenta e dificil, quer para declard-los inconsttucionais, vdando-thes espagos de abuso ou transigéncia, quer para Jos as deeisées jurisdicionais. Trata-se de qualquer Ie ou exercido com abuso da hal de pena as torturas, as ameagas, itos de penas licitas, como espancamentos disciplinares prisionais, maus-tratos, riscos de contagio, de suicidio ou de enfermidade fisica ‘ou mental, de lesdes, mutilagdes, violéncias sexuais etc. Tado esse exercicio do wa as decis6es orienta- doras de casos particulares® II, Pena, coergdo reparadora ou restitutiva e coergdo direta n por exclusdo, torna-se das outras duas grandes formas de ‘ac da coergao direta ou policial. A dominante no direito privado) tem uma fungo manifesta que, em linhas gerais, é verdadeira, ao passo que a Pena no tem em todos os casos ~ nem sequer na maioria deles ~ nenhuma fungdio manifesta em correspondéncia com a r ide. E possivel objetar que tiva no corresponde & sma ee np sane enna iago do acesso a justiga é um bem desejév toda a populagio, alo so pode dizer nunca que a realizago com- pleta do programa de crimi ria seja um bem, porque destruiria a sociedade, especialmente com ‘a amplitude que este programa osten- tanos estados contempordineos, que com absoluta irresponsab © ampliam incessantemente. Ainda que sejautépica a total r ‘4 manifesta do modelo reparador ou restitutivo, é indul ‘em diregao a essa meta melhoray inalizagdo secundaria em vo é de deciséto de conflitos (que de fato niio nas suspende no tempo). A extensio do pri- tos resolvidos e melhora a coexisténcia; a do referir-se a interesses ou direitos, individuais ou coletives (mesmo difsos), mas sempre juridicos e concretos. A nebulosidade metajuridica de uma ordem pabli- canio-juridica equivale a pretensio penal de sancionar ages pelo mero fato da violagdo do dever, eludindo a lesividade. ¢) A pretensio de estender a coergiio direta, a fim de prevenir os perigos antes que ocorram, tampouco difere muito do que se pretende fazer em dircito penal com o chamado perigo abstrato como suspeita de perigo ou como perigo de perigo” 5. Os tés aspectos assnalados demonstram que a coergio direta requer ito embora insuficientes — consistem pi revistio jurisdicional, reconhecimento de interesses difusos, resp estado pelos excessos, facilitagao de procedimentos ungentes etc. Se a coergiio direta ndio ¢ imediata ou instantinea (se a execugo no coin administrativo que a disp6e) os pr a possibilidade de revisio ju coergio ndio admite qu: olugio de continuidade temporal com oato que a dispée, porque se isso acontevesse supostamente o perigo se concret ano ou 0 dano em curso se tor piblica nebulosa ¢ metajuridica, culdade para precisar a proporci .cas0.¢ 0 frequente desloca- ‘mento do perigo de lesa para o perigo de perigo ou prevengo do perigo, so todas racionalizages das agéncias executivas para ampliar seu poder, o que sta circunstancia provoca um raz idade de reconhecer ivo, mas sim mera coergao direta diferida. Costuma-se pensar que esse iecimento pode provocar um reclamo de concorréncia por parte das agén- cias executivas ¢, portanto, a consequente extragio da hipétese ao controle judi- 1. Esse temor é neutralizado pel ev c or conseguiinte, ‘sua aplicagao deve submeter-se ao controle das agéncias juridicas. De qualquer maneira, énecessério analisar com atcngao todas as hipéteses de coergio direta, bbem como aquelas que, estando excluidas, participam de uma estrcita vinculagio eventual com poder © impedimento por intervencio policial de um estupro) nar o segundo. Entretanto, atinica possbilidade de confundir a coergao ado os pressupostos da primeira para usi-a como prtexto. Sejarecorrendo ao excmplo do reboque compulsério de um carro est «em lugar proibido (que no passa de coergao drela para facta o trast), sea men- cionando os dolorosos casos de resgate de reféns em poder de sequestradores (0s qua a coer direta implica 0 emprego de forca par sa), esa confusio € explorada como argu dito que a coergao direta pode sr 80 de armas para deter 0 ‘confit ndo se estabe- ‘como coergdo direta é uma racionalizago para encobrir a pena de mort roscrigio co al da pena de morte (art. 5 inc, XLVI, al, a CR) bem como adequada interpretasio dos dispositives legais concementes ao ato da piso, res- igindo o emprego de forga (art. 283 CPP) ao nivel da resisténcia oferecida (art. 292 CPP), confortam este entendimento** 7. A coergao direta de execugao diferida ou prolongada é a que se confun- de mais frequentemente coma pena. Em regra, tende-se a k lando para exemplos de delitos praticados em forma grupal -xercido para a interrupgao da atividade grupal d ém, que, em qualquer caso, a partir do momer espontaneam ‘omno iminente, 0 poder que continuar sendo exercido sobre as pessoas envolvidas sera poder punitivo € deixar de cumprir uma fungao limpidamente determinada, 8. Trata-se de um campo em que o poder punitivo e a cocreao direta podem mente a converter-se ivo pelo qual se tora indispensivel que cla scja sempre matéria integrada ao direito penal, bem como seja sempre exercida dentro dos © garantias deste. De modo inverso, esta coergao direta é 0 perfeito para reduzir a fungao limitadora do direito penal e dar ‘entrada aos componentes mais autoritarios do estado de policia, Figuras como 0 agente provocador, o funcionario delinquente (agente infiltrado), o participante

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