Semana agitada no varejo brasileiro. No setor de eletroeletrônicos e móveis, a
Máquina de Vendas, formada em março pela fusão da Insinuante com a Ricardo Eletro, arrematou a City Lar, com forte presença no Norte e Centro-Oeste. Já no segmento de farmácias, a Drogaria São Paulo comprou a rede Drogão e assumiu a liderança no segmento, desbancando a Pague Menos.<br /><br /> As duas transações fazem muito sentido, uma vez que a Máquina de Vendas passa a ser relevante no Centro-Oeste e a Drogaria São Paulo finca pé nos shopping centers, onde tinha apenas cinco lojas. É interessante, porém, observar esses movimentos de uma perspectiva mais ampla.<br /><br /> Em um país de dimensões continentais, é muito complicado falar em redes nacionais. Mesmo os Estados Unidos contam com diversos varejistas de abrangência regional em vários setores. Supermercadistas como a Publix ou redes de farmácia como a Duane Reade saturaram alguns mercados (Flórida e Nova York, nesses casos), tornando muito difícil a entrada de um novo <i>player</i>. A solução, assim, é fazer como a Walgreen, que adquiriu a Duane Reade no início deste ano e, com isso, finalmente conseguiu ter uma presença forte em Manhattan.<br /><br /> E isso acontece mesmo em um mercado com uma evolução histórica e uma estrutura logística que favorecem muito mais a circulação de bens, pessoas e negócios que no Brasil. Nos Estados Unidos, houve uma movimentação nacional rumo ao Oeste, com o desbravamento das grandes planícies, das Montanhas Rochosas e da Califórnia entre o final do século XVIII e a primeira metade do século XIX. Processo que trouxe a reboque uma infraestrutura de transportes e foi criando no interior do país uma série de cidades importantes, que hoje são polos econômicos regionais.<br /><br /> No Brasil, por outro lado, a colonização ficou por séculos restrita à costa, com exceção de Minas Gerais, por conta do ouro disponível na região. Após a independência o cenário não mudou: apenas em 1960, com a construção de Brasília, começou-se a perceber que o país poderia deixar de ser um vasto terreno inexplorado.<br /><br /> Historicamente, esse é um processo ainda muito recente, o que necessariamente cria empresas locais, sendo que algumas crescem e se tornam regionais. A precária infraestrutura logística nacional, porém, dificulta o desenvolvimento econômico do interior e, com isso, restringe as possibilidades de evolução do varejo. Uma situação que pode vir a mudar radicalmente na próxima década, na esteira do binômio Copa/Olimpíadas.<br /><br /> Com isso, temos pouquíssimas redes realmente nacionais, e essas se desenvolveram por meio de franquias. É o caso de O Boticário, com 2.840 lojas em 1.550 municípios em todas as regiões do país, um caso que pode ser considerado <i>benchmark</i> mundial em diversas facetas de seu negócio. Excluindo as franquias, o que elimina o capital dos empreendedores locais, e considerando apenas os recursos das corporações, o cenário é de uma capilaridade muito menor.<br /><br /> Com a aquisição da City Lar, a Máquina de Vendas se tornou a rede de eletroeletrônicos e móveis de maior abrangência nacional, mas não possui nenhuma loja na região Sul. No setor de supermercados, o Walmart é líder no Sul e no Nordeste e está solidamente estabelecido no Sudeste, mas tem presença muito pequena no restante do país. Os grandes <i>home centers</i> limitam-se ao eixo Rio-São Paulo, à exceção da Leroy Merlin, que conta com lojas mais espalhadas pelo país; e da Telhanorte, com algumas unidades no Paraná. No setor de farmácias, até muito recentemente as redes líderes estavam em apenas um Estado.<br /><br /> A estabilização da economia nos últimos 16 anos vem permitindo o desenvolvimento de uma série de macroestruturas que ajudam a impulsionar o desenvolvimento de novos negócios. De um ambiente macroeconômico menos sujeito a solavancos, passando pelo aumento do crédito disponível para empreendedores, chegando ao mercado de ações e vitaminado pela criação de fundos de investimentos capazes de trazer uma gestão mais moderna e profissional às empresas, tudo contribui para criar um novo cenário não apenas para o varejo, mas para a economia brasileira como um todo.<br /><br /> As perspectivas para o mercado nacional são bastante positivas, levando em conta o já intenso ritmo de crescimento da economia e os negócios que serão gerados em inúmeros segmentos pela Copa do Mundo, Olimpíadas, Pré-Sal e o próprio amadurecimento do mercado e da sociedade. Mudanças demográficas, como o envelhecimento da população e o aumento do número de famílias não tradicionais (<i>singles</i>, casais sem filhos, casais com dupla fonte de renda, famílias monoparentais), criam novas demandas por produtos e serviços e abrem novas oportunidades de geração de negócios.<br /><br /> A consequência é um aumento da escala dos grandes operadores, que ganharão massa crítica para investir na consolidação de seus mercados, replicando em diversos segmentos o que foi visto no final dos anos 90 no setor supermercadista, quando Pão de Açúcar e Carrefour multiplicaram suas vendas pela aquisição de diversas redes de menor porte. Movimento que passou a acontecer há alguns anos no setor eletroeletrônico, com a ida do Magazine Luiza às compras e, mais recentemente, com Pão de Açúcar (Ponto Frio) e Máquina de Vendas. E que, certamente, será visto cada vez mais vezes, levando o varejo nacional a um novo patamar de maturidade, capilaridade e capacidade de atração de recursos (inclusive humanos).<br /><br /> Um ciclo muito positivo, pois levará à profissionalização de todo o varejo, inclusive dos independentes, por meio das Centrais de Negócios; e gerará novos negócios segmentados, que aproveitarão demandas hoje sequer imaginadas.