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pyngbe® batons ta Deco, 188 “ia origina em fac: Ape ch Gre (apa ny ser ‘rgd de cae Pn com a aks ess & coi pelo deus Hermes, ote co et ose ce dose Va pontine eng estes kg, Cee oP aos de Canloprso nh Pubeayso (CH) Iemacoal ‘Sime Bre do Lem Sea ‘eran Jame toe pensimento enti args eu de pico tin, ‘eau de Hagneh Saran, ede ane Po Tea, 130, ‘toga, Trent ign 2 Milos regs 1 Tel, copava08 soos 90 fice pars casio series 1. lst eg aig 180 2 Flésofsgresoe ages 18) 2 Gi npr Fle 180 4 Grech aig: Mtg «rept 20208 5. log gran 29208 (Rat eps ace 1 eo: 1973 Diao Buropéa do ve § Pale Diss adds pla Bra Ps Tera /A (1212S Palo — fat Gn 3387.6595| us General Verne Fores, 305 — Sl 904 22isa50 he dene). sapusiaare heb reser propia deta ado, ‘ngeso no Bel roe Bra Jean-Pierre Vernant -MITO E PENSAMENTO ENTRE OS GREGOS Estudos de psicologia bistérica Tradugto de Haiganuch Saran Museu de Arqueologiae Etnologia da USP Revisio técnica de Erica Pereira Nunes Baigho revista ® PAZ E TERRA sgruagem por instrumento comum: a arte do advogado, do pro fessor, do orador, do politico.” A razio grega € a razio que permite agir de modo positivo, refletido, metadico, sobre os homens, mas nao transforma 2 natureza. Nesses limites, como ras suas inovagdes, ela & bem filha da Cidade. 7 postage da vein © da sofia gic, cf Jacqueline de omy aire raon ches Tad, Pari 1956, 9p 181-28. Ait rote snc anitencos, as alg, conv, ploestabeecnento Shs Sigaescomune do dscso, pela anise das ests da demonst {o, pas weaida'e aindtie dos arguments opossums cnc do Fachtinio pur. 474 As origens da filosofia! Onde comega a filosofia? Ha duas maneiras de entender ‘esta questio. De inicio, pode-se perguntar onde situar as fron teiras da filosofia, as margens que a separam do que ainda no 4 ou no 0 é por inteiro. Em seguida, pode-se perguntar onde apareceu pela primeira vez, em que lugar surgit — e por que ai em vez de noutra parte. Questio sobre a identidade, ques- Ro sobre a origem, ligadas uma 8 outm, insepariveis; mesmo se numa Idgica demasiado boa e simples, a segunda questo, parece jf pressupor a primeira como resolvida. Dir-se para estabelecer a data e o local de nascimento da filosofia,é ainda necessitio conhecer o que ela é, possuir a sua definigte para dlistingui-la das formas de pensamento nito filoséficas? Ao con- trario, porém, quem no vé que no se podria definir a filoso- fia no abstato como se ela fosse uma eterna esséncia? Para se saber 0 que ela é, € preciso examinar as condigdes do seu nascimento, seguir 0 movimento pelo qual se constitulu histo- ricamente, quando no horizonte da cultura grega, 20 colocar roves problemas e ao elaborar os instrumentos mentais que a solugo deles exigia, ela abriu um campo de reflexio, tagou 7, Philosopher le interrogations contemporaines Sob drscio de ‘Cuisinn Delacampagne ¢ Rober Maggio, Pas, Fayard, pp. 16371 5 lum espaco de saber que antes nao existia, onde ela propria se estabeleceu para explorar de maneira sistemitica 2s suas di- rmensbes. £ pela elaboraglo de uma forma de racionalidade © de um tipo do discusso até entio desconhecidos que a pritiea dda filosofia © a figura do fildsofo emergem e adquirem seu Proprio estatuto; delimitam-se, no plano social e intelectual, atividades profissionais como fungdes politicas ou religiosas ‘tuadas na cidade, inaugurando uma tradigao intelectual origi- nal que, a despeito de todas as transformagbes por ela sofridas, nunca cessou de se enraizar em suas origens. “Tudo comecou no inicio do século VIa.., na cidade grega de Mileto, no itoral da Asia Menor, onde os jénios estabelece- ram colénias ricas e présperas, No espaco de cingtienta anos sucederam-se ttés homens, Tales, Anaximandro e Anaximenes, ‘cujas pesquisa s20 bastante préximas pela natureza dos pro- biemas abordados e pela ofientagio espiriual para que se os tenham considerado, desde a Antigbidade, como os formado- res de uma vinica e mesma escola. Quanto a0s historiadores rmodernos, alguns acreditaram reconhecer, na florescéncia des- ta escola, o fato decisivo anunciador do ‘milagre grego’. A Rac Bio ter-seia subitamente encarnado na obra desses tes fl6- sofos milésios. Pela primeira vez, em Mileto, descendo do céu. para a tera, ela ter-se-ia isrompido no cendrio da historia; a sua Jz, doravante revelada, como se tivessem enfim caido as escaris dos olhos de uma humanidade cega, no teria mais cessado de iuminar 0s progressos do conhecimento. Assim cscreve John Burnet; “0s fil6sofos jOnios abriram a via que a ciéncia, desde centlo, s6 fez seguir"* ‘O que sucede na realidade? Os milésios jé slo fildsofos no sentido pleno do terme? Em que medida 2s suas obras — que alias 86 conhiecemos, no melhor dos casos, pela fragmentos ‘muito raros — marcam um corte decisivo com relagio a0 pas- sado? Em que sentido as inovagdes que fornecem justificam {que se hes creditem o advento desse novo modo de reflexio ¢ 2 j. Burner Bark grech pilesphy, 3 ed, tondtes, 920, V (radueao Stance: uroe de a pospbie grec, Pas, 1919). 976 de pesquisa que denominamos filosofa? Nao hai resposta simples para esas questdes, Mas € precisamente encarando essa comple- ‘idade, dedicando-se a ela, que se pode tera esperanca de situar 1s diversos aspectos do problema das origens da filosofia. ‘Para comecat, uma questio sobre o vocabulrio. No século V1, nfo existiam ainda as palavras “fil6sofo" e “filosofia”. primeiro emprego de pbilésophosatestado figuraria em um frag mento que s¢ atribui a Hericlito, no inicio do século V, Na realidade, esses termos adquirem direto de cidadania somente com Platio e Aristéceles a0 tomar um valor preciso, t€enico e, de certo modo, polémico. Afirmar-se “filésofo”, mais do que ligarse aos seus predecessores, é distanciar-se com relaglo a cles: € ndo ser umm “fsico” como os milésios, limitando-se a uma investigagdo acerca da natureza Chistorta per pbsseos), no set também um desses homens que ainda, nos séculos VI e V, se designam pelo nome de sophés,sibio, como 0s Sete Sibios, entre os quais figura Tales, ou sopbistés, habil no saber a manera esses peritos na arte da palavra, desses mestres da persuasao, de competéncia pretensamente universal, que se tornario ilus- tees no decorrer do século V, © que Platio recusara no fil6sofo asuténtico a fim de, por contraste, estabelecer melhor 0 estatuto de sua diseiplina Physioliges, sopbes, sopbisiés, e mesmo se se detém em certos propésitos de Plasto,’ mytholigas, narrador de fabulas, de historias de mulheres idosas, & como se dizer que aos olhos da filosofia consttuida, estabelecida e insttucionalizada pela fundasio das escolas, como a Academia e o Liceu, onde se ensina a tornarse fildsofo, 0 sibio Tales, a0 dar impulso as pesquisas dos milésios, nem por isso ultrapassou a soleira da nova morada. Potém, por mais resoluta que seja esta afirmagao da diferenca, ela ndo exclut a consciéncia da iliaglo. Aristoteles, ao falar dos “antigos” pensadores, daqueles de “outrora’, dos {quais ela recusa o “materialismo", observa que Tales € conside- rado, comm toda justiga, 0 "“iniciador desse tlpo de flosotia" 3 Patho, Of, 00 ed 4 aristels, Marsa, 983520, 7 Hestagdes no vocabolirio que os designa,incertezas dos srandesfil6sofos gregos cissicos a seu respeito: 0 estaruto dos milésios nao deixa de causar problemas. E precio situ-los no quadro da cultura grega arcaica, a fim de avaiarexatamente a Sua conteibuigao origens da flo- sofa, Tratase de uma civilzacao fundamentalmente oral. Nea, a educagio caracterizase nao pela leitura de textos esertos, mas pela transmiseio dos cantos posticos, com acompanha- mento musical, de geragio em geracio, Assim é armazenadbo, nas vastas composigbes€picas, 0 conjunto do saber, a8 narati- ‘as lendisas que funcionam como memoria coltiva e enciclo- éilia de conhecimentos comuns. f nesses cantos que se en- Contra consignad tudo 0 que um grego deve saber acerca do hhomem e do seu passado — as fayanhas dos herbs de outror, acerca dos deuses, das suas famfias, das suas genealogias acerca do mundo, da sua figura e das suas origens. A esse respeito, a obra dos milésios representa bem uma radical ino- vagdo. Nem cantores, nem poetas, nem naradores, eles se ex- primem em prosa,em texts escritos que nao visam desentolar, na linha da tradigi, 0 fio de uma arava, mas expor uma teoria explicativa, concernente a certs fenémenos natura €2 onganizagao do cosmo. Do oral 20 escrito, do canto poétco 3 rosa, da narragio } explicasio, a mudanga de registro Corresponde a um ipo de investigag ineiramente novo; 00 pelo objeto que designa a natureza,pliyjs:aovo pela forma de Pensamento que ai se manifesta e que é totalmente postivo. Por cero, 08 mitos antigos, em especial a Teogonia de Hesiod, narravam também o modo pelo qual 6 mundo havia emergido do eaos, como se diferenciaram as suas diversas pr tes, como se constitu € estabeleceu 6 conjunto da sua arqui- tetra, Mas 0 procesto de génese, nessasnumatvas, revestese da forma de um quadro geneal6gico; ele se desenroiaseguindo a orem de fiiaglo entre os deuses, no rimo dos sucessves nascimentos, dos casamentos, das ineigas, misturando e opon- do os seresdivinos de geragbes diferentes. A deusa Gaia CTer- ra) engendra sozinha Ourands(Cév) e Péntos (Onda salgada) acastlada a Ousands, que ela acaba de crit, 2 luz 08 Tis, 478 primeiros mestres do céu, revoltados contra 0 seu pai e cujos filhos, os Olimpicos, vao, por sua vez, combater e detrubar, a fim de confiar ao mais jovem deles, Zeus, a incumbéncia de se impor no cosmo, como soberano novo, uma ordem enfim de- Finiva, Entre os milésios, nada subsiste dessa imagistica dramatica, 0 seu desaparecimento marca o advento de um outro modo de inteligibilidade. Fornecer a rizio de um fendmeno no pode ‘mais consistir em nomeat o seu pai ea sua mie, em estabelecer 4 sua fico. Se as realidades naturais apresentam uma order regular ndo pode ser porque, um belo dia, o deus soberano, 20 fim dos seus combates, impés-se as outras divindades como ‘um monarea que reparte em seu reino os encargos, as fungdes, ‘os dominios, Para ser inteligfvel, a ordem deve ser pensada como uma lei imanente & natureza e presidindo, desde a or gem, A sua ordenacio. O mixo narrava a génese do mundo ao cantar a gléria do principe cujo reino fundamenta e mantém ‘uma ordem hierirquica entre forgas sagradas. Os milésios bus- cam, por dettés do fluxo Aparente das coisas, os principios petmanentes sobre os quals repousa o justo equilibrio dos di- versos elementos de que € composto o universo. Mesmo se les conservam certos termes fundamentais dos velhos mitos, ‘como o de um estado primordial de indistingao a partir do qual se desenvolve o tfundo, mesmo que eles continuem a afirmat, com Tales, que “tudo esti pen de deuses", os milésios nao deisam nenhum ser sobrenatural intervir em seus esquemas explicativos, Com eles, em sua positividade, a natuteza invadin todo 0 campo do real; nada existe, nada se produziu e nunca se produziré que nao encontre na phys, tal como podemos bservi-la a cada dia, seu fundamento e sua razio. Ea forga da [pbyisis,em sua permanéncia e na diversidade de suas manifes- tagdes, que toma o lugar dos antiges deuses; pelo poder de vida e principio de ordem que encobre, ela propria assume todos os caracteres do divino. Constituigio de um campo de pesquisa em que a natureza 6 apreendida em termos a um s6 tempo positivos, gerais © abstratos:a gua, oar, 0 ndo-limitado (apeiron), o terremoto, 0 479 relimpago, 0 eclipse, etc. Noto de uma ordem césmica que repousa no na forga de um deus soberano, em sia basileia, seul poder real, mas numa let de Justiea (Die) inserita na natu reza, numa regra de reparticao (oém0s) que implica uma order igualitiria para todos os elementos constitutivos de mundo, de tal maneira que ninguém possa domninar os outros e sobre eles levar vantagem, Orientagio geométrica na medida em que se wwata no de retragar uma ineiga narrativa em seu curso suces- sivo, mas de propor uma theorva, de conferit ao mundo a sua figura, sto €, de Fazer ver" como as coisas se passa a0 projeti- las em um quadro espacial. Estes ts tragos que marcam 0 ca ‘iter inovador da fsica milésia nao surgiram no sécalo VI como Co advento milagroso de uma Razio estranha & historia. Ao con- Uiirio, aparecem intimamente ligados 2s transformagBes que as sociedlades gregas conheceram em todos os nivels © que, apés © desmoronamento dos reinos micénicos, conduairam-nas 20 advento da cidade-Estado, a polis. Deve-se sublinhar a esse respeito as afinidades entre um homem como Tales ¢ 0 33 ‘contemporiineo de Arends, o poets legislador Solon. Ambos fguram entre os Sete Sabios que encarnam, aos olhos dos gre 205, a primeira espécie de sophia que surgima entre os homens: sabedoria toda penetrada de reflexio moral e de preocupagées politicas. Eta sabedoria tend a define os fundamentos de wma nova ordem humana que substiuira por uma lei eserita, pabli- cc, comum, igual para todos, o poder absoluto do monarca ot as presrogativas de uma pequena minoria. Assim, de Sélon a Cilistenes, a cidade adquire, no decorrer do século VI, a forma ‘de um cosmo circular, centrado na fgora, a praca publica onde, semelhante 2 todos os outros, cada cidadao, obedecendo ¢ ‘comandando alernadamente, devera ocupar e ceder todas as pposigdes simétricas que compéem o espaco civico, seguindo sucessivamente a ordem do tempo. Esta é a imagem de um mundo social regulamentado pela isonomia, a jgualdade em relagio a let, que encontramos, em Anaximandro, projetada 90 tuniverso fisico. As antigas tegonias estavam integradas aos mitos de soberania enraizades nos siuais de realeza. © novo ‘modelo co mundo que os fisicos de Mileto elaboram, em sua 480 positividade, sua concepedo cle uma ordem igualitiria, seu qua- dro geométrico, € solidirio das formas institucionais e das es- truturas mentais préprias da pois *Admirar-se, declara o Séerates do Teetto, a filosofia nao fem outra-origem.”* Admirar-se diz-se thaumazein, e este ter- zo, pelo fato de testemunhar a derrocada que a investigacio dlos milésios efetua com relaglo ao mito, estabelece-os no mes- ‘mo ponto em que se origina a fllosofia, No mito, thauma é “0 maravilhoso’; 0 efeito de assombro que ele provoca ¢ 0 sinal dda presenca nele do sobrenatural. Para os milésios, a estranhe- za de um fenémeno, em ver de impor o sentimento do divino, ppropve-no ao espirito em forma de problema. O insOlito 46 fascina mais, ele mobiliza a inteligencia. De silenciosa venera- (fo, a admiracdo faz-se questionamento, interrogacao. Quando © thduma, no final da investigacio, foi reintegrado na normali- dade da natureza, do maravilhoso 6 sesta a engenhosidade da solupao proposta, Essa mudanca de attuce ocasiona toda uma série de consequéncias. Para atingir 0 seu objetivo, um discur- so explicativo deve ser exposto, no somente enunciado sob uma forma e nos termos que permitem compreendé-lo bem, ‘mas ainda entregue a uma publicidade inter, colocado aos olhos de todos, do mesmo modo que a redacio das leis, na cidade, torna-se um ber comum para cada cidadao, distibui- do com igualdade. Despojada do secreto, a theoria do fisico transforma-se assim no objeto de um debate; ela se prepara para justificarse;set-Ihe- necessiro prestar contas do que afir- ‘ma, prestarse 2 erica € & controvérsia. As regras do jogo pal tico — a livre discussio, 0 debate contraditério, © confronto clas argumentacdes contririas — impoem-se desde entao como regras do jogo intelectual. Ao lado da revelago religiosa que, sa forma do mistério, permanece 0 apanigio de um circulo restito de iniciados, ao lado também da profusto de crengas comuns de que todo o mundo participa sem que ninguém se 5 Plat, Teo 155 he. Anstles, Meafse, 962 615: ola. adm ‘acto que levos of primis pensadores is eqpeclagtes fossa 481 interrogue a seu respeito, define-se ¢ afirma-se uma nova no- so ca verdade: verdade aberta, acessvel a todos e que funda menta em sua propria forga demonstrativa os seus critérios de validade, Fntretanto, 0 caminho assim liberado pelos milésios de- semboca em um outro horizonte diferente dos seus. Depois dlles, em ruptura com eles, instaurar-se-i um modo de refle- xo cujas exigéncias e ambigées também vio além da sua en presi, Chamado para comparecer no tribal do fégas da 230

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