Amar | Memria Viva de Carlos Drummond de Andrade 2/26/14, 8:19 PM
ALGUMA POESIA AMAR
Que pode uma criatura seno, entre criaturas, amar? amar e esquecer, amar e malamar, amar, desamar, amar? sempre, e at de olhos vidrados, amar?
Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotao universal, seno rodar tambm, e amar? amar o que o mar traz praia, e o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha, sal, ou preciso de amor, ou simples nsia?
Amar solenemente as palmas do deserto,
o que entrega ou adorao expectante, e amar o inspito, o spero, um vaso sem flor, um cho de ferro, e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.
Este o nosso destino: amor sem conta,
distribudo pelas coisas prfidas ou nulas, doao ilimitada a uma completa ingratido, e na concha vazia do amor a procura medrosa, paciente, de mais e mais amor.
Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa
amar a gua implcita, e o beijo tcito, e a sede infinita.
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