O documento discute as representações sociais e como elas são formadas. Apresenta o exemplo da AIDS na década de 1980 e como representações morais e biológicas foram construídas em torno da doença na ausência de informações científicas. Também descreve como as representações sociais orientam a percepção da realidade e a interação social.
Descrição original:
FICHAMENTO. as Representações Sociais. JODELET, D.
Título original
FICHAMENTO. as Representações Sociais. JODELET, D.
O documento discute as representações sociais e como elas são formadas. Apresenta o exemplo da AIDS na década de 1980 e como representações morais e biológicas foram construídas em torno da doença na ausência de informações científicas. Também descreve como as representações sociais orientam a percepção da realidade e a interação social.
O documento discute as representações sociais e como elas são formadas. Apresenta o exemplo da AIDS na década de 1980 e como representações morais e biológicas foram construídas em torno da doença na ausência de informações científicas. Também descreve como as representações sociais orientam a percepção da realidade e a interação social.
Sempre h necessidade de estarmos informados sobre o
mundo nossa volta. Alm de nos ajustar a ele, precisamos saber como nos comportar, domin-lo fsica ou intelectualmente, identificar e resolver os problemas que se apresentam: por isso que criamos representaes. Frente a esse mundo de objetos, pessoas, acontecimentos ou ideias, no somos (apenas) automatismos, nem estamos isolados num vazio social: partilhamos esse mundo com os outros, que nos servem de apoio, s vezes de forma convergente, outras pelo conflito, para compreend-lo, admir-lo ou enfrenta-lo. Eis por que as representaes so sociais e to importantes na vida cotidiana [...]. (p. 17).
Com as representaes sociais, tratamos de fenmenos
observveis diretamente ou reconstrudos por um trabalho cientfico. [...] Em torno deles constituiu-se um domnio de pesquisa dotado de instrumentos conceituais e metodolgicos prprios, que interessa a vrias disciplinas [...]. Este captulo esboa um quadro deste domnio e das questes tratadas sobre essas realidades mentais, cuja evidncia nos sensvel cotidianamente. (p. 18).
[...] a observao das representaes sociais algo natural
em mltiplas ocasies. Elas circulam nos discursos, so trazidas pelas palavras e veiculadas em mensagens e imagens miditicas, cristalizadas em condutas e em organizaes materiais e especiais (p. 18-19).
REPRESENTAES SOCIAIS NO TRABALHO
Este exemplo se refere aos fenmenos que acompanharam, no incio
dos anos 80, o aparecimento da Aids primeira doena cujas histrias mdica e social se desenvolveram juntas. A mdia e as pessoas se apoderaram deste mal desconhecido e estranho cuja proximidade ainda no tinha sido revelada. A ausncia de referencias mdicas favoreceu uma qualificao social da doena [...]. Antes que a pesquisa biolgica trouxesse alguns esclarecimentos sobre a natureza da Aids, as pessoas elaboraram teorias apropriadas nos dados de que dispunham, relativos a portadores (drogados, homoflicos, homossexuais, receptores de transfuses) e aos vetores do mal (sangue, esperma). O que se sabia sobre a transmisso da doena e de suas vtimas favoreceu, em particular, a ecloso de duas concepes: uma de tipo moral e social, outra de tipo biolgico, com a influencia evidente de cada uma delas sobre os comportamentos, nas relaes ntimas ou para com as pessoas afetadas pela doena. (p. 18-19). Esta viso moral faz da doena um estigma social que pode provocar ostracismo e rejeio e, da parte daqueles que so assim estigmatizados ou excludos, submisso ou revolta. (p. 19).
Desde o incio, um outro aspecto da Aids acertou o pblico em cheio
sua transmisso pelo sangue e esperma, dando lugar a uma viso biolgica muito mais inquietante: o contgio poderia ocorrer tambm por meio de outros lquidos corporais alm do esperma, particularmente a saliva e o suor. Assim, reavivam-se crenas antigas, cujo vigor pude constatar a propsito da representao da doena mental (Jodelet, 1989). Estas crenas, onde se encontram vestgios da teoria dos humores, relacionam o contgio pelos lquidos do corpo sua osmose com sangue e esperma. (p. 19).
Detenhamo-nos um instante neste exemplo histrico, que
teve alguns dados modificados graas luta contra os riscos de excluso de pessoas infectadas pelo HIV e os riscos de contgio, bem como pela mobilizao da solidariedade coletiva, aes empreendidas por campanhas de informao e pela mdia. O que ocorreu? Um acontecimento surge no horizonte social, que no se pode mostrar indiferente: mobiliza medo, ateno e uma atividade cognitiva para compreend-lo, domin-lo e dele se defender. A falta de informao e incerteza da cincia favorecem o surgimento de representaes que vo circular de boca em boca ou pular de um veculo de comunicao a outro. (p. 20).
Elaborados com o que se apresenta, estas representaes se
inscrevem nos quadros de pensamento preexistentes e enveredam por uma moral social faa-se ou no o amlgama entre perigos fsico e moral. A liberdade do sexo seguro se ope s virtudes da tradio e encontra a um novo cavalo de batalha, sustentado pela autoridade religiosa. Valores e modelos sociais carregam de contedos diferentes a palavra Aids, a doena e suas vtimas. Representaes biolgicas correspondentes a saberes enterrados na memria social ressurgem, por causa de seu valor simblico, s vezes orquestrado com fins polticos e sociais. (p. 20).
Assim, duas representaes uma moral e outra biolgica so
construdas para acolher um elemento novo [...]. Apiam-se em valores variveis segundo os grupos sociais de onde tiram suas significaes e em saberes anteriores, reavivados por uma situao social particular: e notaremos que so processos centrais na elaborao representativa. Esto ligadas tanto a sistemas de pensamento mais amplo, ideolgicos ou culturais, a um estado dos conhecimentos cientficos, quanto condio social e esfera da experincia privada e afetiva dos indivduos (p. 21). [...] as representaes expressam aqueles (indivduos ou grupos) que as forjam e do uma definio especfica ao objetivo por elas representado. Estas definies partilhadas pelos membros de um mesmo grupo constroem uma viso consensual da realidade para esse grupo. Esta viso, que pode entrar em conflito com a de outros grupos, um guia para as aes e trocas cotidianas trata-se das funes e da dinmica sociais das representaes (p. 21).
ABORDAGENS DA NOO DE REPRESENTAO SOCIAL
[...] Em sua riqueza como fenmeno, descobrimos diversos
elementos (alguns, s vezes, estudados de modo isolado): informativos, cognitivos, ideolgicos, normativos, crenas, valores, atitudes, opinies, imagens etc. Contudo, estes elementos so organizados sempre sob a aparncia de um saber que diz algo sobre o estado da realidade. esta totalidade significante que, em relao com a ao, encontra- se no centro da investigao cientfica, a qual atribui como tarefa descrev-la, analisa-la, explica-la em suas dimenses, formas, processos e funcionamento. Durkheim (1895) foi o primeiro a identificar tais objetos como produes mentais sociais, extrados de um estudo sobre a ideao coletiva. Moscovici (1965) renovou a anlise insistindo sobre a especificidade dos fenmenos representativos nas sociedades contemporneas, caracterizadas por: intensidade e fluidez das trocas e comunicaes; desenvolvimento da cincia; pluralidade e mobilidade sociais. (p. 21-22).
Nosso exemplo permite tambm a aproximao de uma
primeira caracterizao da representao social, sobre a qual a comunidade cientfica est de acordo: uma forma de conhecimento, socialmente elaborada e partilhada, com um objetivo prtico, e que contribui para a construo de uma realidade comum a um conjunto social [...].
Geralmente, reconhece-se que as representaes sociais
enquanto sistemas de interpretao que regem nossa relao com o mundo e com os outros orientam e organizam as condutas e as comunicaes sociais. Da mesma forma, elas intervm em processos variados, tais como a difuso e a assimilao dos conhecimentos, o desenvolvimento individual e coletivo, a definio das identidades pessoais e sociais, a expresso dos grupos e as transformaes sociais.
Como fenmenos cognitivos, envolvem a pertena social dos
indivduos com as implicaes afetivas e normativas, com as interiorizaes de experincias, prticas, modelos de conduta e pensamento, socialmente inculcados ou transmitidos pela comunicao social, que a ela esto ligadas. [...]. Desse ponto de vista, as representaes sociais so abordadas concomitantemente como produto e processo de uma atividade de apropriao da realidade exterior ao pensamento e de elaborao psicolgica e social dessa realidade . Isto quer dizer que nos interessamos por uma modalidade de pensamento, sob seu aspecto constituinte os processos e constitudo os produtos ou contedos. Modalidades de pensamento cuja especificidade vem de seu carter social. (p. 22).
De fato, representar ou se representar corresponde a um ato de
pensamento pelo qual um sujeito se reporta a um objeto. Este pode ser tanto uma pessoa, quanto uma coisa, um acontecimento material, psquico ou social, um fenmeno natural, uma ideia, uma teoria etc.; pode ser tanto real quanto imaginrio ou mtico, mas sempre necessrio. No h representao sem objeto. Quanto ao ato de pensamento pelo qual se estabelece a relao entre sujeito e objeto, ele possui caractersticas especficas em relao a outras atividades mentais (perceptiva, conceitual, mnemnica etc.). Por outro lado, a representao mental como pictrica, a teatral ou poltica apresenta esse objeto, o substitui, toma seu lugar, torna-o presente quando ele est distante ou ausente. assim o representante mental do objeto que ela restitui simbolicamente. Alm disso, o contedo concreto do ato de pensamento, a representao mental traz a marca do sujeito e de sua atividade. Este ltimo aspecto remete s caractersticas de construo, criatividade e autonomia da representao, que comportam uma parte de reconstruo, de interpretao do objeto e de expresso do sujeito. (p. 22-23).
Estas caractersticas gerais do fato de representao explicam os
focos das pesquisas que tratam das representaes sociais: considerao da particularidade dos objetos; dupla concentrao sobre contedos e sobre processos; ateno dinmica social suscetvel de infletir a atividade representativa e seu produto. (p. 23).
VITALIDADE, TRANSVERSALIDADE E COMPLEXIDADE
A vitalidade: eis uma noo doravante consagrada nas Cincias
Humanas por um uso que, j uma dcada, tende a se generalizar, mas que, desde Durkheim, tem sido constante. Rapidamente cada em desuso, a noo de representao social, aps ter sido relanada na Psicologia Social por Moscovici, ainda teve de passar por um perodo de latncia, antes de mobilizar uma vasta corrente de pesquisa [...]. (p. 23).
Tal conquista se explica pela supresso de obstculos de tipo
epistemolgico que impediram desdobramento da noo. [...] seu desenvolvimento teve de enfrentar, dentre outros, um duplo aprisionamento. Primeiramente, em Psicologia, por causa do domnio do modelo behaviorista, que negava qualquer validade considerao dos fenmenos mentais e de sua especificidade. Em seguida, nas Cincias Sociais, em virtude do domnio de um modelo marxista, cuja concepo mecanicista das relaes entre infra e superestrutura negava qualquer legitimidade a este campo de estudo, tido como povoado de puros reflexos ou suspeito de idealismo. [...] (p. 24).
[...] Desde 1961, algumas propriedades so atribudas
representao social por Moscovici, com quem convergem, por outro lado, a Sociologia do Conhecimento elaborada no quadro do interacionismo simblico [...], a Etnometodologia e a a Fenomenologia, que relacionam a realidade social a uma construo consensual, estabelecida na interao e na comunicao (p. 25).
Situada na interface do psicolgico e do social, esta noo interessa a
todas as Cincias Humanas: encontrada em Sociologia, Antropologia e Histria, estudada em suas relaes com a ideologia, os sistemas simblicos e as atitudes sociais refletidas pelas mentalidades. (p. 25).
Portanto, a noo de representao social apresenta, como os
fenmenos que ela permite abordar, uma verta complexidade em sua definio e em seu tratamento. Sua posio mista na encruzilhada de uma srie de conceitos sociolgicos e de conceitos psicolgicos (Moscovici, 1976, p. 39) implica sua relao com processos de dinmica social e psquica e com a elaborao de um sistema terico tambm complexo. Por um lado, deve-se levar em considerao o funcionamento cognitivo e o do aparelho psquico, e, por outro, o funcionamento do sistema social, dos grupos e das interaes, na medida em que afetam a gnese, a estrutura e a evoluo das representaes que so afetadas por sua interveno. [...] Mas preciso dizer: as representaes sociais devem ser estudadas articulando-se elementos afetivos, mentais e sociais e integrando ao lado da cognio, da linguagem e da comunicao a considerao das relaes sociais que afetam as representaes e a realidade material, social e ideativa sobre a qual elas tm de intervir. (p. 26).
O ESPAO DE ESTUDO DAS REPRESENTAES SOCIAIS
Se acompanharmos o histrico do campo de pesquisa, teremos de
nos voltar relao da representao com a cincia e a sociedade. De fato, quando Moscovici retomou o conceito de Durkheim, no foi apenas numa perspectiva crtica, que tinha, alis uma inteno construtiva: dar a Psicologia Social objetos e instrumentos conceituais que permitissem um conhecimento cumulativo, em contato direto com as verdadeiras questes colocadas pela vida social. (p. 28). Assim, aproximando-nos de um postulado fundamental no estudo das representaes sociais: o da inter-relao, da correspondncia, entre as formas de organizao e de comunicao sociais e as modalidades do pensamento social, considerado sob o ngulo de suas categorias, de suas operaes e de sua lgica . Sua primeira formulao foi feita por Durkheim, que insistia no isomorfismo entre representaes e instituies: as categorias, que servem classificao das coisas, so solidrias s formas de agrupamento social; as relaes entre classes o so face quelas que organizam a sociedade. (p. 29).
SOBRE O PAPEL DA COMUNICAO
[...] a comunicao desempenha um papel fundamental nas
trocas e interaes que concorrem para a criao de um universo consensual. [...] remete a fenmenos de influncia e de pertena sociais decisivos na elaborao dos sistemas intelectuais e de suas formas (p. 29-30).
[...] a comunicao social, sob seus aspectos interindividuais,
institucionais e miditicos, aparece como condio de possibilidade e de determinao das representaes e do pensamento sociais. (p. 30).
De todas as atividades humanas, a fabricao dos fatos a mais
intensamente social; foi essa evidncia que permitiu recentemente sociologia das cincias desenvolver-se. O destino de um enunciado est, literalmente, nas mos de uma multido: cada um pode esquec-lo, contradiz-lo, traduzi-lo, modifica-lo, transform- lo em artefato, escarnecer dele, introduzi-lo num outro contexto a ttulo de premissa, ou, em alguns casos, verifica- lo, comprov-lo e passa-lo tal qual a outra pessoa, que, por sua vez, o passar adiante. A expresso um fato no define a essncia de certos enunciados, mas alguns percursos pela multido (Latour, 1983). (p. 30-31).
Existem igualmente causas emocionais na fabricao dos
fatos. Dessa forma, a comunicao serve de vlvula para liberar os sentimentos disfricos suscitados por situaes coletivas ansigenas ou mal toleradas.[...] O medo e a rejeio da alteridade, entre outros, suscitam trocas que do corpo a informaes ou acontecimentos fictcios. Assim, criam- se verdadeiras lendas urbanas (Brunvand, 1981), cujos temas apresentam uma notvel estabilidade no tempo e no espao (Campion-Vincenti, 1989). A atuao do imaginrio coletivo na comunicao tambm ilustrada pelo discurso sobre a insegurana [...]. Os relatos que as vtimas de agresso (roubos, ataques etc.) fazem do que lhes aconteceu seguem ao p da letra um mesmo roteiro, retomado coletivamente, e permitem situar-se numa mesma categoria vitimada, forma de uma nova solidariedade social. Encontramos fenmenos semelhantes em relao Aids. (p. 31).
Destes exemplos, sobressai a importncia primordial da
comunicao nos fenmenos representativos. Primeiro, ela o vetor de transmisso da linguagem, portadora em si mesma de representaes. Em seguida, ela incide sobre os aspectos estruturais e formais do pensamento social, medida que engaja processos de interao social, influncia, consenso ou dissenso e polmica. [...] ela contribui para forjar representaes que, apoiadas numa enrgica social, so pertinentes para a vida prtica e afetiva dos grupos. Enrgica e pertinncia sociais explicam, juntamente com o poder performtico das palavras e dos discursos, a fora com a qual as representaes instauram verses da realidade, comuns e partilhadas (p. 32).
O SOCIAL: DA PARTILHA VIDA COLETIVA
[...] pode-se dizer que se partilha uma mesma ideia ou representao,
como se partilha um mesmo destino? No me parece, pois a representao supe um processo de adeso e participao que a aproxima a crena. Como observa Veyne a propsito das mentalidades, as conotaes sociais do conhecimento no se prendem tanto sua distribuio entre vrios indivduos, e sim questo de que o pensamento de cada um deles , de diversas maneiras, marcado pelo fato de os outros pensarem da mesma forma sobre algo (1974, p. 74). [...] Alm do mais, a interiorizao do outro favorece a edificao de castelos de cartas (onde cada indivduo uma carta) que desmoronam um belo dia, porque o apoio de uns sobre os outros desabou (Veyne, idem, p. 80). (p. 32).
Certamente, h representaes que cabem em ns como uma luva ou
que atravessam os indivduos: as impostas pela ideologia dominante ou as que esto ligadas a uma condio definida no seio da estrutura social. Mas, mesmo nestes casos, a partilha implica numa dinmica social que explica a especificidade das representaes. o que vm desenvolvendo as pesquisas que relacionam o carter social da representao insero social dos indivduos. O lugar, a posio social que eles ocupam ou as funes que assumem determinam os contedos representacionais e sua organizao, por meio da relao ideolgica que mantm com o mundo social, as normas institucionais e os modelos ideolgicos aos quais obedecem. (p. 33-34).
[...] Partilhar uma ideia ou uma linguagem tambm afirmar
um vnculo social e uma identidade. [...] A partilha serve afirmao simblica de uma unidade e de uma pertena. A adeso coletiva contribui para o estabelecimento e o esforo do vnculo social. Ora, como observa Douglas (1986), nas Cincias Sociais prendemo-nos pouco ao papel da cognio na formao do vnculo social (p. 19). Acrescenta que se leva pouco em considerao o que se sabe muito bem: Os grupos tm influncia sobre o pensamento de seus membros e desenvolvem at mesmo estilos de pensamentos distintivos (p. 21).
[...] a capacidade de extenso das representaes permite
captar, ao nvel dos atributos intelectuais de uma coletividades, a expresso de sua particularidade. (p. 34).
ESTADOS E PROCESSOS REPRESENTACIONAIS
O estudo do fenmeno cognitivo se faz a partir dos contedos
representativos, tomados de diferentes suportes: linguagem, discurso, documentos, prticas, dispositivos materiais, sem prejulgar, no caso de alguns autores, a existncia correspondente de eventos intra-individuais ou de hipstases coletivas (esprito, conscincia de grupo). [...] A abordagem social das representaes trata de uma matria concreta, diretamente observvel, mesmo que a organizao latente de seus elementos tenha sido objeto de reconstruo por parte do pesquisador. (p. 37).
[...] para explicar a emergncia das estruturas, preciso se reportar
aos processos que presidem a gnese das representaes (p. 38).
[...] O processo decomposto em trs fases: construo seletiva,
esquematizao estruturante e naturalizao. As duas primeiras, sobretudo, manifestam, como tivemos a oportunidade de observar, o efeito da comunicao e das presses, ligadas pertena social dos sujeitos, sobre a escolha e a organizao dos elementos constitutivos da representao. (p. 38).
Contedos e estrutura so infletidos por um outro processo, a
ancoragem, que intervm ao longo do processo de formao das representaes, assegurando sua incorporao ao social. Por um lado, a ancoragem enraza a representao e seu objeto numa rede de significaes que permite situ-los em relao aos valores sociais e dar-lhes coerncia. Entretanto, nesse nvel, a ancoragem desempenha um papel decisivo, essencialmente no que se refere realizao de sua inscrio num sistema de acolhimento nocional, um j pensado. Por um trabalho da memria, o pensamento constituinte apoia-se sobre o pensamento constitudo para enquadrar a novidade a esquemas antigos, ao j conhecido. Por outro lado, a ancoragem serve para a instrumentalizao do saber, conferindo-lhe um valor funcional para a interpretao e a gesto do ambiente. Assim, d continuidade objetivao. A naturalizao das noes lhes d valor de realidades concretas, diretamente legveis e utilizveis na ao sobre o mundo e os outros. De outro lado, a estrutura imagtica da representao se torna guia de leitura e, por generalizao funcional, teoria de referncia para compreender a realidade. (p. 38-39).
No h ideia sem imagens: mais precisamente, ideia e
imagem no designam dois elementos um social e outro individual de nossos estados de conscincia, mas dois pontos de vista de onde a sociedade pode examinar os objetos, ao mesmo tempo em que os situa no conjunto de suas noes, ou em sua vida e sua histria (Halbwachs, 1925, p. 281).
CONCLUSO
nessa perspectiva que se desenvolvem as pesquisas sobre as
representaes sociais. Cada uma contribui com uma pedra para a construo de uma cincia psicolgica e social do conhecimento. [...] A julgar pelo domnio que acabamos de sobrevoar, parece necessrio aprofundar a reflexo a partir de territrios autnomos, abordando, cada um sua maneira, a interface do psicolgico e do social (p. 41).
O que vemos atualmente? Um espao de pesquisa que se vem
ampliando h vinte anos, com: uma multiplicao dos objetos de representao tomados como temas de pesquisa; abordagens metodolgicas que se vo diversificando e fazem um recorte de setores de estudo especficos; problemticas que visam a delimitar melhor certos aspectos dos fenmenos representativos; a emergncia de teorias parciais que explicam estados e processos definidos; paradigmas que se propem elucidar, sob certos ngulos, a dinmica representacional (p. 41).
Tudo isso d a impresso de um universo em expanso no
qual se estruturam galxias de saber. Ao contrrio do paradigma informtico, que recobre todo o esforo cientfico sob a capa de uma mesma frma, o modelo das representaes sociais impulsiona a diversidade e a inveno, traz o desafio da complexidade. (p. 41).