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BIoLoGiA DA CONSERVAGAO: Esséncras Carlos Frederico Duarte Rocha Helena Godoy Bergallo Monique Van Sluys Maria Alice Santos Alves 2006 120 Biologia da Conservagio: Esséneias aumentar a ineidéncia de {uracé 6 © (33) provocar o derretimento da calota polar. resultando em aumentos no nivel do mar. Como conseqiiéneia, haverdé mudancas no funcionamento de varios ecossistemas com uma perda potencial de biodiversidade em varios deles (destruigao de recifes de coral ¢ mangues. expansao ou retragio de ecossistemas € mudancas no regime de reproducao de animais ¢ plantas) (IPCC, 2002, Tabela 1). Alteragées como estas também poderio trazer mudangas consideraveis na produgio de alimento no mundo. Estima se que 0s paises mais pobres serio as mais afetados, especialmente os africanos, por serem estes os menos preparados para enfrentar tais mudangas (IPCC, 2001) Tabela } Impactos negativos da mudanga climética global sobre a biodiversidade do planeta.” Fator bioldgico Evidéncias de impacto } ‘Alteragio do periodo de reprodugio e tempo de crescimento de i invertebrados de clima fri ntecipagio ou rerarcamento no | | inicio de ciclos reprodutivos de sapos (Inglaterra), passaros | | Reprocugao e (Europa, América do Norte e Latina); pena de sincronisme | crescimento entre o petiodo reprodutivo de passaros cla espécie Parus major e | abuuulducia dle presas, forage prccoce em algumas plantas (Europa); colapso reprodutivo (reducio na produgao de ) ‘Antecipagao (América do Norte) ou retardamento (Europa) do inicio de perfoxlos de migracio de passatos ¢ insetos; alteragdes abservadlas também na Africa e Austral _ ‘Ampliagdo da distribuigao geografica de espécies de insetos (por | exemplo, borboletas, libélulas ¢ gafanhotos), incluindo areas de | Distribuicdo geografiea | altitude elevada (Europa e América do Norte); o mesmo para | | sazon flores ¢ frutos de espécies de Arvowws Amaviinica Migragao passaros (Costa Rica); redugio da distribuigio de recifes de coral ¢ mangues, ‘Aumentos de taxas de infecgao de plantas hospedeirass | | Doengas ‘ p nna populagio de vetores como malitia ou dengue. Extingao local ow definitiva pats espécies com distribuigito restrita (endémicas) € esperada, embora nao se tenha registro seguro de que tal fate tenlia ocorrido em fungao das mudangas do clima. Por outro lado, estudo recente demonstra uma resposta| adaprativa no aquerimentn global, isto é, fixada geneticamente, em uma espécie animal (Canada) Santos *TPOC. 2002 (para uma lista completa consulte Burns, 2001). ** Nepstad ec al. (2002). Extingio © adapeagio Neste censrio futuro de clima alterado. 0 Brasil, que é detentor de uma megadiversidade, torna-se um pais-chave na avaliacao dos impactos da mudanga ms Biodiversidade ¢ Mudanga C 11 do clima para biodiversidade global. De maneira geral, os potenciais impactos da mudanca climatica para a biodiversidade brasileira ficam no ambito de eventos que afetam a regiao costeira devido ao aumento do nivel do mar e suas florestas tropicais, em particular a Amazénica, que pode passar por freqiientes perfodos de seca prolongada. Os estudos sobre o assunto, contudo, ainda so raros. Por exemplo, entre 0s 2.500 estudos (abrangendo 500 taxa) que avaliaram os impactos das mudangas do clima sobre a diversidade de espécies (IPC 2002), a maioria foi realizada cm zonas temperadas ou em dreas de altitude elevada, Uma pequena fracao foi executada nas regides tropicais e uma minoria na América Latina. A magnitude da ameaga imposta pelas mudangas do clima sobre a biodiversidade brasileira 6, portanto, praticamente desconhecida, Estudos recentes, no entanto, dao idéia da dimensio desta ameaga. Alguns deles, especialmente os desenvolvidos na Amazonia, sao relatados e discutidos. 20 longo deste capitulo. Ainda, discute-se como 0 fendmeno das mudangas do cima impé © para as agées ¢ estratégias de conservagio ¢ protecio da biodiversidade brasileira. e uma nova condi 0 clima e a floresta amaz6nica Avaliar as alteragdes na biodiversidade em fungao da mudanga climé atual requer a identificagao de varios outros fatores que interagem entre siem diferentes escalas de tempo (décadas ¢ anos) ¢ espaco (regional ¢ global), A ‘Amazénia & um exemplo tipico desta complexidade de interagées. Na escala da bacia, a floresta exerce importante papel na manutencao do clima da regiao (Nobre et al., 1991; Salati & Nobre, 1991). Ela é capaz de bombear para atmosfera cerca de 7 trilhi gua (Moutinho & Nepstad, 2000) Via evapotranspiracdo (evaporagio + transpiragao), fornecendo assim o vapor necessariv para uuanter v Clima da regido dmido © chuvoso. Quase a metade da chuva que cai sobre a floresta provém da evapotranspiragao (Nobre et al., 1991), Alem disso, a conversio de 4gua em vapor esfria v ar, fazendo com que a vegetacio florestal funcione como verdadeiros condicionadores de ar gigantes Alguns modelos prevéem que sem a floresta as chuvas da regio seriam reduzidas na ordem de 20% a 30% (Nobre et al., 1991) € a temperatura média sofreria aumentos de 3 a 5°C (Lean & Warrilow, 1989; Nobre et al., 1991; Shukla et al. 1990). Levando-se em conta a média de desmatamento na AmazOnia brasileira (aproximadamente 1,8 milhdes de hectares por ano, INPE, 2001), ¢ possivel que em um futuro préximo tenhamos alteracoes significativas do clima regional (Nobre et al., 1991; Henderson-Sellers et al., 1993) 's de toneladas de A.ameaga av cima amazénico, contudo, tem um agravante. Ela no provém somente da perda de sua cobertura florestal via desmatamento. A exploracao desordenada de madetra € uv [ogy florestal cstao entre os vildes, reduzindo a capacidade da floresta em abastecer com agua a atmosfera, Estima-se que entre 1 e 1,5 milhao de hectares de florestas sav explorados por ano na Amazonia (Nepstad et al, 1994, Asner et al., 2005). Durante a exploragio, para cada arvore de valor comercial que € retirada, outras 20 ao redor so danificadas (Uhl & Vieira, 1989), resultando em aumento de mortalidade e, conseqtientemente, na redugio da Area foliar disponivel para que a evapotranspiracao ocorra. Uma vez exploradas, estas florestas ficam suscetiveis a0 fogo (Nepstad et al., 1999a, b). Esta relacdo entre desmatamento, exploragio madeireira ¢ fogo acaba por estabelecer um ciclo vicinso que pode levar a paisagem amazénica a se tornar altamente inflamavel (Nepstad ct al., 2001). Este ciclo se inicia com a derrubada a floresta c/ou a exploragio madeireira que diminuem a quantidade total de gua liberada para a atmosfera pela vegetagio, provocando reducdes de precipitacao. Com a precipitasio diminuida, hé condigses para a propagacio dos incéndios florestais, os quais pfovocam a morte de varias 4rvores. O aumento da mortalidade de Arvores, por sua vez, resulta na diminuigio adicional da Area foliar dispontvel para evapotranspitagio, contribuindo ainda mais para a reducio de chuvas (Nepstad et al, 2001, Figura 1). Ha também o efcito negativo da fumaca sobre a chuva, recentemente demonstrado (Rosenfeld, 1999). A fumaca produzida pelas queimadas em Areas j& desmatadas (campos agricolas ¢ pastagens) e pelos incéndios Mlorestais interfere na formacao de gotas de chuva que nao ganham tamanho suficiente para precipitarem por gravidade, Quando isso ocorte, a producso de chuva depende de mecanismos que acontecem em altitudes elevadas e que nao so comuns quando o ar esta limpo (Figura 1) O desmatamento, a exploragao madeireira ¢ 0 fogo florestal sao fatores que resultam de atividades humanas locais, que produzem pré-condicao para que uma alteragdo regional do clima se ponha em andamento. Contudo, ov efeitus negativos desses fatores sobre o clima amazénico podem ser potencializados em conseqiiéncia do aquecimento global, ameagando ainda mais a biodiversidade 9 aconteca € 0 El Nifo, o fendmeno mento superficial das 4guas do Pacifico da regio. © fator-chave para que i climatico que ocorre a partir do aque na altura da costa do Peru e que produz fortes estiagens em varias partes do mundo, incluindo a regiao amazénica. Estudos recentes sugerem que com 0 agravamento do efeito estufa, 0 El Nino tem se tornado mais freqiente ¢ intenso (renberth & Hoar, 1997; Timmermann et a, 1999). O indicador direto deste fendmeno tem sido o aumento dos incéndios florestai: Amazonia, implicando perdas importantes para a biodiversidade regional (Holdsworth & Uhl, 1997; Nepstad et al, 1999a, b; Cochrane & Schulze, 1999) s e das queimadas na ee ee __ (~ Exploragéo > (cesmataento madeireira ~~ ~~ Floresta inflamavel 4— ( Queimadas a 4 | — Fogo Ce Con) Reducdo da evapotranspiragao, ~ +t t —___ > EINifio Mudanga climatica Figura 1 Relagies entre diferentes usos da terra (exploragao madeireira € desmatamento) na Amaz6nia brasileira, fogo florestal ¢ clima (El Niito). As setas indicam a seqiténcia dos eventos € as clipses em cinza, os pontos de perda direta da biodiversidade em ecossistemas tlorestais. Com 0 agravamento do aquecimento global, estas perdas podem se intensificar no futuro devido a sontinuidade dos ciclos demonsteadoe na figura. A continuidade de fog Morestal pode levar, a longo pravo, A “savanizacio” da Amazénia. As Ginicas fontes de recuperagio da biodiversidade ficam por ‘ont da sucessio Hlorestal aps 0 desmatamento e a exploragao da madeira Um exemplo do efeito do El Nito sobre a inflamabilidade da paisagem amazonica pode ser obtido analisando-se os anos de 1997 ¢ 1998. Durante esse periodo foi registrado 0 El Nifio mais intenso do século. A seca foi tao severa que, em dezembro de 1998, 30% das florestas amazénicas estavam sob risco de incéndio (Nepstad et al., 1999a, b). O risco, neste caso, foi calculado avaliando, sea quantidade de agua armazenada no solo até LO metros em funcao da precipitacdo recebida pelas diferentes regiées da Amazonia (Nepstad et al., no prelo), Nesse mesmo ano, 13 milhdes de hectares de floresta em pé queimaram no Estado de Roraima (Kirchhoff & Escada, 1998). Sem que 0s governos e 2 midia se dessem conta, outros 25 milhdes de hectares de florestas foram atingidos pelo fogo no sul do Para e no norte de Mato Grosso (Diaz et al., 2002). A maior parte das florestas atingidas pelo fogo em 1998 foi aquela explorada pela inddistria madeireira em fungdo da extragio ndo planejada, Embora de magnitude desconhecida, a redugao da biodiversidade da Amazonia sob um regime de mudanga climatica global pode ser maior e adicional aquela promovida pelo desmatamento ¢ a exploragao madeireira, Com 0 aquecimento global agravando os eventos de El Nifto, a previsao climética para a Amazonia sera de secas prolongadas, resultando em potenciais perdas de biodiversidade em fungSo de dois fatores principais: (1) aumento na incidéncia dos incéndivs flurestais ¢ (2) alteragdes no funcionamento da floresta (ciclos biogeoquimicos). O primeiro fator depende nao somente das condigdes de umidade da floresta, mas também da fragmentagao da paisagem e da presenga de fontes de ignigao (Alencar ¢t al., no prelo). Fontes de ignigao nao faltam, Na Amazonia, os incéndios florestais geralmente se iniciam acidentalmente, quando 6 fogo de queimadas na agricultura e pastagens foge ao controle. Cerea de 50% dos incéndios na regiao so de prigem acidental (Nepstad et al., 1999a, b). Uma paisagem composta por pequenos fragmentos de florestas primarias ou secundarias rodeados de grandes areas abertas (inflamaveis) pode propiciar grandes incéndios com perdas elevadas de biodiversidade. J4 numa paisagem dominada por florestas primérias, esta perda pode ser reduzida, pois estas funcionam muitas vezes como grandes “aceiros”. interrompendo a propagacéo do fogo (Nepstad et al., 1999a, b). A combinagao de paisagens fragmentadas, abundancia de fontes de ignigéo (queimadas agricolas) e acorréncia de El Nifos intensos e freqiientes representa, portanto, uma das grandes ameacas biodiversidade da Amazonia nu futuro. A biodiversidade e o clima futuro da Amazénia Entender a acio do fogo sobre as florestas tropicais é 0 primeiro passo para tentar reduzir a perda de biodiversidade amaz6nica no futuro. Quando 0 fogo penetra na floresta ainda intacta (livre de ocorréncia de fogo ¢ exploragao madeireira), as chamas se propagam lentamente € atingem poucos centimetros de altura, dando a sensacio de que sao inofensivos. E 0 chamado “fogo de chao” (Nepstad ct al, 1999a, b). Contudo, um fogo com essas earacterfsticas, embora insuficiente para causar danos aos animais em geral, é capaz de eliminar praticamente todas as mudas, Liowws, cip6s ¢ arvores jovens da floresta (Nepstad ct al, 1999a, b). Mesmo as Arvores adultas sofrem danos consideraveis. Por possuirem troncos recobertos por casca de reduzida espessura, a maioria das Arvores nao suporta o calor € muitas morrem apés alguns meses. O indice de mortalidade nestes casos pode chegar a 454% (Holdsworth & Uhl, 1997; Cochrane & Schulze, 1999; Cochrane et al., 1999). Se o fogo € recorrente, isto &, atinge uma floresta anteriormente queimada, a mortalidade pode aumentar Biodiversidade ¢ Mudanga Climaticn 125 consideravelmente ou mesmo chegar a indices préximos a 95%, como observado em outros estudos em reas tropicais (Moutinho, nao publicado; Woods, 1989). Parte da perda imposta pelo fogo a diversidade de espécies de plantas da Amazonia € resultado da queima de florestas secundarias que crescem sobre pastos ou campos agricolas abandonados. Cerca de 20 milhdes de hectares na Amazonia estao cobertos com florestas secundarias em diferentes idades de recuperagio florestal (Walker & Homma, 1996; Serrio & Toledo, 1990). Essas florestas sccundarias sio importantes para a reposi¢ao de parte das espécies animais ¢ vegetais de florestas primérias da regido (Vieira et al., 1996; Gascon & Moutinho, 1998; Nepstad et al., 1996a), mas, por condigao, sao muito vulneraveis ao fogo (Uhl & Kauffman, 1990; Cochrane & Schulze, 1999). Bastam alguns dias sem chuva para que estas se tornem inflamaveis (Nepstad ct al,, 2001). Anualmente, centenas de hect: terrompendo 0 processo de recuperagio florestal. Apesar de grande parte das espécies de arvores de floresta secundaria rebrotar apés a passagem do fogo (Kauffman, 1991), esta se perde apés incéndios seguidos, que geralmente atingem este tipo de vegetacio (Nepstad et al., 19994, b) Em relacio & diversidade animal, os impactos negativos dos incéndios florestais sao potencialmente grandes, mas raramente estudados. As popula de jabutis ¢ outros animais que se movimentam lentamente, incluindo muitos da fauna que vive na serrapilheira, sofrem, potencialmente, redugoes pela agao do fogo, como acontece em outros ecossistemas nao tropicais (Friend, 1993). A morte de Arvores frutiferas provocada pelo fogo também pode levar & falta de alimentos para os mamiferos frugivoros, produzindo redugécs em suas popula goes (M. Mattos, K. Carvalheiro, D. Nepstad, nao publicados,). Contudo, estudos recentes indicam que a fauna de vertebrados, por exemplo, pode suportar consideravelmente a destruigio que o fogo florestal promove (O. Carvalho Jr., nao publicado). ros pegam fogo, i Embora 0 aumento da ocorréncia dos incéndios florestais na Amazonia em funcao da mudanga do clima local e global imponha perdas futuras 2 biodiversidade regional, outros prejufzus 4 fauna c flora, independentes da ocorréncia de fogo, sao esperados. Sem um regime de chuva adequado, varias mudangas no funcionamento da floresta poderiam imprimir impactos negativos sobre a biodiversidade. Uma parte considervel (30%) da floresta amaz6nica tem alta tolerdncia A seca e permanece sempre verde e imune ao fogo, mesmo durante aestacao de seca, gracas A presenga de raizes profundas que bombeiam Agua do solo profundo (aproximadamente 20 m) (Nepstad et al., 1994). Esta tolerancia, contudo, tem limite. Se a estiagem for muito prolongada, 0 solo profundo também fica seco, impedindo que as raizes se abastegam de agua. Este estado 10 de total esea 0, especialmente nas dreas onde o lengol fredtico ¢ profundo, ¢ pode sez de Agua no solo tem sido comum durante os anos levar a alteragées no comportamento da floresta. Um dos exemplos de tais alteragdes em fungao das secas prolongadas é o colapso da produgao de flores € frutos das Arvores, como o estudado por Viana & Nepstad (ndo publicado). Esses autores registraram que, ao longo dos tiltimos 15 anos (1984-2000), a porcentagem de Arvores (35 espécies) produzindo flores e frutos em uma Area de 400 ha declinou em 60%, Em 1985, 35% das arvores produziam frutos, Em sugerem que tal fendmeno especialmente a partir 1999, esse ntimero no passava de 15%. Os autor deva estar ligado aos eventos de El Nios intenso: daquele ocorrido em 1991/92. Resultados similares tém sido encontrados em um estudo experimental de exclusao de chuva, 0 qual simula estiagens prolongadas (Nepstad et al., 2002; Moutinho et a, submetido) como aquelas que esto sendo esperadas para o futuro, caso os eventos de El Niitos sejam mais freqiientes (Trenberth & Hoar, 1997). Este estudo esta sendo desenvolvido na Floresta Nacional do Tapajés (FLONA Tapajés, 2.897°S, 54.952°W, Nepstad et al., 2002). Cerca de 6.000 paingis plasticos (3 x 1 m) excluem a chuva de um hectare de floresta, reduzindo em 50% a precipitagao anual (ca. 2.000 mm). Os resultados obtidos nesta parcela so comparados com aqueles da parcela ao lado, na qual a exclusdo no foi realizada (parcela controle). Até 0 momento, os efeitos da exclusio de chuva na FLONA Tapajés confirmam, por exemplo, uma redugao significativa na producao de flores de arvores (Nepstad et al., 2002), que poderia ocorrer com secas longas provocadas pelo El Niiio, confirmando o que tem sido sugerido por estudos de longa duragio em florestas tropicais (Daniel Nesptad. comunicacao pessoal; Wright et al., 1999; Curran et al, 1999). Com uma as mudangas na ade menor de frutos € posstvel que ocorram dri quan dinamica de populagio das sementes, mas também pelos impactos ncgativos sobre as populagdes de frugivoros da floresta, os quais sao responsaveis pela dispersao ¢ germinagao de sementes na floresta (90% das espécies de Arvores amazOnicas sao Zoocdricas; Gentry, 1982). rvores, néo somente pela menor quantidade de nimais A redugio no crescimento das drvores também é outra conseqiténcia direta da falta de agua © tein implicagdes importantes para o aquecimento global (Nepstad et al, 2002). A taxa de produgao primaria (ANPP) pode ser estimada pela soma do incremento do caule € a produg dois anos seguidos de secas intensas, redugdes de até 20% (Nepstad et al., 2002) do de serrapilheira © pode softer, aps O maior impacto direto de um clima mais seco sobre a biodiversidade da de Amazonia fica por conta, no entanto, da redugio da expectativa de Arvores ja estabelecidas. No experimento de exclusio de chuva desenvolvido na FLONA Tapajés, a seca artificial vem produzindo aumentos signi mortalidade de drvores. Apos dois perfodos de exclusao (2000-2001), a mortalidade de drvores (diameto entre 10-30 em) na parcela coberta com os paingis subiu de 2% para 5%, enquanto na parcela controle a taxa ficou por volta de 2% (Tohver et al., 2002) ativos na Biodiversidade e Mudanga Climatica... 127 O risco de “savanizagao” Apesar das perdas diretas impostas 4 biodiversidade amaz6nica por uma possivel mudanga do clima regional e global, o prejuizo maior podera vir a longo prazo. A substituigio de florestas perenifélias de dossel fechado por uma vegetagao com caracteristicas de savana (capoeiras e pastos abandonados), somada & exploragio madeireira e 3 ocorréncia de El Nifios mais freqiientes intensos, pode produzir uma paisagem onde o fogo é um elemento-chave, dirigindo a dinamica dos ecossistemas florestais. Neste cenario, as florestas que svaziadas de Arvores, com o dossel sofrerem incéndios periddicos podem ficar mais aberto, permitindo que a luz solar alcance 0 chao. Esta condicao tornaria a vegetacio mais inflamavel ¢ suscetivel a novos incéndios e propicia a invasio de gramineas, o que poderia aumentar bastante a quantidade de combustivel fino proximo ao chao da floresta, impedindo o estabelecimento e o crescimento de mudas de Arvores. A floresta perenifélia densa e totalmente sombreada internamente daria lugar a uma floresta empobrecida, povoada por algumas espécies de Arvores resistentes ao fogo e com o chao coberto por gramfneas, plantas invasoras ¢ arbustos herbdceos e lenhosos (Cochrane & Schultze, 1999; Nepstad et al., 1999a, b). A “savanizagio” em larga escala na Amaz6nia é 0 mais inquictante cfcito ccolégico advindo da combinagao do uso da terra e incéndios florestais na regio ¢ da mudanga climatica global. Sob um clima mais seco, a substituicdo de florestas ricas em espécies por uma vegetacdo debilitada € espécies, vazia de animais nativos ¢ de reduzida biomassa (pastagens, princi- palmente), como vem acontecendo atualmente, seria incapaz de manter o atual padrao de precipitagao regional obtido através da evapotranspiragao, resultando em uma vegetacao mais proxima ao cerrado. A ligacao entre a floresta amazénica ¢ 0 clima regional ¢ global é bastante estreita (Fearnside, 1995). Com o aquecimento do planeta, as florestas da regio deverao responder de diferentes formas, a maioria delas negativamente (aumento de mortalidade, inflamabilidade, requerimento maior por agua, etc.; Fearnside, 1995), como citado neste trabalho. Assim, se a dindmica de derrubada e queima da floresta nao for interrompida, a contribuigao da regiéo para o aquecimento global sera cada vez maior. Uma vez que os incéndios florestais rasteiros matam quantidades substanciais de biomassa florestal, a qual € posteriormente decomposta, 0 fluxo de carbono para a atmosfera podera ser bastante elevado. Fstima-se que anualmente 200 milhdes de toneladas de carbono sio lancadas ao ar através do desmatamento (Fearnside, 1995; Houghton, 2000). Este valor poderia ser o dobro se computassemos 0 carbono liberado pelos incéndios florestais (Mendonca et al., 2004). Com mais carbono na atmosfera, maior sera a freqiténcia com que v El Niu (Tienberth & Hoar, 1997) ocorrera ¢, portanto, mais severas serdo as secas na Amaz6nia (Nepstad et al., 1999a, b)

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