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PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL NO CEARÁ


SECRETARIA DA 9ª VARA
VARA PLANTONISTA

Comunicação de Prisão em flagrante referente ao IPL n.º 1517/2007 e


Pedido de relaxamento de prisão recebidos em regime de plantão.

PROCEDIMENTO CRIMINAL DIVERSO


INQUERITO N.º 1517/2007
INDICIADA: MARIA

DECISÃO

Trata-se de pedido de relaxamento de prisão em


flagrante, movido pela Defensoria Pública da União em favor da mulher
de nome MARIA, sobre a qual não se tem maiores dados para
qualificação, presa em flagrante delito em razão da suposta prática do
ilícito previsto no art. 163, inciso III do Código Penal, que prevê pena de
detenção de no mínimo de 06 meses e no máximo de 03 anos, e multa.

Narra o auto de prisão em flagrante que, no dia 31 de


outubro de 2007, após denúncia de populares, uma viatura da Guarda
Municipal dirigiu-se ao prédio do DNOCs, 2ª DR, na rua dos Tabajaras,
n.º 11, flagrando uma mulher que, segundo informações, teria
danificado torneira de uma fonte localizada na área frontal daquele
prédio para tomar banho. A referida mulher, identificando-se apenas
como MARIA e afirmando ser moradora de rua, não possuía quaisquer
documentos e tendo oferecido resistência no momento da abordagem
dos policiais da Guarda, foi algemada e encaminhada à
Superintendência Regional da Policia Federal, onde até então encontra-
se recolhida.

A Defensoria Pública, em contundente exordial, pontua


pela ilegalidade da prisão em flagrante, ante a ausência de delito se

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considerada for a insignificância do dano patrimonial. Postula assim o
relaxamento da prisão de MARIA, com a expedição de alvará de soltura.

Eis um breve relatório, passo a decidir.

Em primeiro lugar, a fundamentação utilizada pela


autoridade policial para não arbitrar a fiança, ou seja, a ausência de
residência fixa, por ser a acusada moradora de rua, não me parece
correta, à luz do princípio da dignidade da pessoa humana.
No caso, o fato de ela ser moradora de rua e, portanto,
não ter residência fixa não é motivo suficiente para negar-lhe o direito à
liberdade, já que ela está nessa condição, não por vontade própria, mas
em razão de o Poder Público não lhe permitir gozar dos mais básicos
direitos para uma vida digna, como por exemplo o direito à moradia.
Além disso, mesmo que se dissesse que a Senhora
Maria, por não ter residência fixa, não teria direito à liberdade, ainda
assim ela deveria ser solta, pois não há justificativa para a instauração
de inquérito policial.
Analisando os fatos narrados na comunicação de prisão
em flagrante, bem como da argumentação trazida na peça formulada
pela Defensoria Pública, é inegável que razão assiste ao defensor
público. Submeter a todo um procedimento criminal uma pessoa,
inegavelmente desassistido pelo Poder Público e totalmente desprovido
de condições mínimas de higiene e saúde, simplesmente pelo dano
causado a uma torneira plástica de um órgão como o DNOCS, foge a
qualquer parâmetro do razoável, ainda mais se considerarmos que
MARIA, a moradora de rua em questão, somente assim procedeu com o
intuito de tomar um simples banho. Dessa forma, a conduta de MARIA é
totalmente atípica, uma vez que o bem jurídico ora violado (patrimônio
publico) o foi de maneira tão insignificante que não justificaria assim a
prisão em flagrante procedida pela autoridade policial, nem sequer a
instauração de inquérito para apuração de fato.

A Constituição Federal garante ao Magistrado a


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possibilidade de conceder a ordem de habeas corpus, de oficio, ante a
ilegalidade de prisão, conforme se observa nos incisos transcritos a
seguir:

“Art. 5º. (...)


LXVII – conceder-se-á hábeas corpus sempre que
alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofre violência ou coação em
sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder.”

Além disso, indiscutível a consagração do principio da


insignificância à jurisprudência pátria, referendada em inúmeras
decisões do Supremo Tribunal Federal, dentre as quais faço menção a
colacionada pela Defensoria Pública em sua peça, que destaca muito
bem a atipicidade do “crime de bagatela”, em face da insignificância
jurídica do ato, em clara aplicação do referido principio.

Assim, pelos argumentos acima expostos, entendo por ilegal a prisão


em flagrante realizada pela Autoridade Policial, CONCEDENDO ORDEM DE HABEAS
CORPUS no sentido de que se proceda ao trancamento do inquérito policial n.º
1517/2007, e consequentemente que seja expedido alvará de soltura para a imediata
liberação da requerente qualificada como MARIA, presa e indiciada no referido IPL.
Oficie-se.

Oportunamente, vista ao representante do Ministério


Público Federal. Expedientes necessários e urgentes.

Fortaleza, 1 de novembro de 2007.

GEORGE MARMELSTEIN LIMA


Juiz Federal Plantonista.

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