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‘Se a Econom € 0 motor da Histéi, esta & 0 motor do Diteko. Nao se pode compreender 0 Dieta senio hstorcaments, o que demansia Importincis deste liro da ptofessora deFLAVIALAGES DECASTRO.” ‘Alexandre Freitas Csmara “Nao pode inerpretr coretamente ale de seu tempo quem nie conhece oprocesso cevoluvo dens sitemajuttico. "Nessa ina, a obra de FLAVIA LAGES DE CASTRO ¢ um guia seguro paca conhecer a nossa evoluto. que, se ahistétia,porss6,jséa demonstra de um quadroeveutva aleiura deste fir, escito com inwlgar ddfies e completa, permite una ampla compreensio xs lwansformagoes que marearam a cidncs jurda, desde tempos remotes até peiodos mas comtemparineos” Cristiano Chaves de Farias "estado de ums pesquisa competentee aprofundsds, escrito de forma simples, 0 livode FLAVALAGES DECASTRO cunprea ungzohejndlspensivel deoferecer20esudoso ‘€20profissianal do Dicetooconhecimento acerca dahistvia queesténabasedetudo aqua que © Direto 6. Com iso, esutos0se profissionastém diane des a oportunidade de entender ‘mefior a sua feramenta de abla e tua no dina em eoneigbes bastante seis, 56 porissoolurojialeserlido” GeraldoPrado do Direito e Brasil 5a edigao OS © OOOO OOOO OOOOHOHOHSCEHHHHHHHOE Lumen} Joao ‘Conseso Boron ‘Alexandre Fae Cimara ‘Amiton Buono de Carvaiho (orar Robert Btoncout (ona Faces Ctistiano Chavos de Favs Carlos Bavaria Adan dapines hia Donizt Poual tiacan Chole Fly Nadeimeato Fito Franioc da Asse. Toes Gustave Sénéchal de Gothodo 4. Loon! Lopes de Olas Uteia Antinio Choon Jusae Monee! Messes Pessina Darooe vena Villa Sota olson Resonate Paulo de Bessa Antunes Paulo Range leado sine Gomes Faas Salada Carvalho Vitor Goma Brummond ‘Tata Mamotaa Sota Jonge (Centro =n d Asai, 10 Loft ep seoit.ana Cate ‘na cn) 25912109 roe z202 3040 ac en Amin Da Deva Tce Rl do Jana ‘tl @ny em asin 3150500 ‘nee (1) S806 020 / 50-772 SOLS quad, 402 boeoB ja 35 {Cee venas sta han Sa Doin DE ‘na nnzas ses ' b furis| Brora wwwwlumenjuris.com.br Eorrones Jodo de Almeida Tule da Siva Almeida, CConezue Consura ‘Atwaro Maite a Costa Antonie Cvs Martine Somes ‘gusto Zimmermann ‘ute Wander Baton Bhda Sogn Flivie Lagos de Castro via Aver Marine (ies Catan unter Dalla Bernat de Pino Jojo Thestonio Mendes da Almeida J ‘out Fornanda de Carre Farias 1 Fran Mesos Marella iotola (rae Gana Ten Kauss Raft Baneto Sepia Demero Haman as Ge tesa 800i ‘muan aarti Tan et reabe 909 Cue 4770235, mon anne isrande dat ih apa « Goa Fo Sy aia pnt santo ‘nivten aavenennazaee0 FLAvia Laaes pe CASTRO ‘Mostro om Histéria Social HistTOrIA DO DIREITO GERAL E BRASIL 58 edicao Eprrora Lumen Junis Rio de Janeiro 2007 Copyright © 2007 by Flavia Lages de Castro Produgdo Editorial Livraria o Eaitora Lumon Juris Leda. ALIVRARIA B EDITORA LUMEN JURIS LTDA. no se responsabiliaa pelas opiniGes emiticas nesta obra. E proibida a reprodugéo total ou parcial, por qualquer tnedo ou processo, inlusive quanto As cazacteristicas grilicas e/ou editorias. A violagSo de dlroitos autorais consttel erime (Gédigo Ponal, art. 184 e $8, ¢ Lei n® 10.099, tie 19/07/2003), sujeitando-se & busca e apreenséo @ indenizagoes diversas (Lei ne 9.610/90) ‘Todos os direitos desta edigao reservados a Livraria e Editora Lumen Juris Ltda. Impresso no Brasil Printod in Brazil Para minha mae. © © © © OY OO OOOO OOOOH OHHKEEHHHHSBIVE Sumario INTRODUCAO: HISTORIA E HISTORIA DO DIREITO 1. Historia ns Dir@ito wren Historia do Direito Objetivos do Estudo de Histéria do Direito. Esto Livro CAPITULO I: 0 DIREITO DOS POVOS SEM ESCRITA 1, Caracteristicas Gerais dos Direitos dos Povos Agratos. 2, Fontes dos Direitos dos Povos Agrates. 3, Tansmissio das Regras. CAPITULO II: AS PRIMETRAS LEIS ESCRITAS E © CODIGO DE HAMMURABL 1. O Crosconte Fértil © as Primeiras Leis Esoritas 2. Algumas Consideragdes Sobre as Leis Anteriores a Hammu- abi. i ssn 3. A BabilOnia de Hammurabi... 4, Sociedade e Economia da Babilénia Hammurabiana 4.1, Questées Acerca dos Escravos 5, Alguns Pontos do Cédigo de Hammurabi. CAPITULO I: DIREITO HEBRAICO 1. Introdugio i 2. A Sociedade e a Vida Economica... 3. ALei Mosaica. sttninnnnn 4, A Formagio do Direito Hebraico — da Legislagtio Mosaica 0s Dias de Hoje. 5. Algumas Leis do Deuteronémio.. CAPITULO IV: 0 CODIGO DE MANU 1. Introdugio... 2. Contuxt Historice u 2 13 16 16 ”7 27 28 29 31 32 43 43 3. Sociedade 4 Religiao 5. Alguns Pontos do Cédigo de Manu CAPITULO V: GRECIA 1. Introdugao 2. Espatta ven 2.1, Sociedade 2.2. Economia... 2.3. Politica... 2.4. Cultura e Ideologia 3, Atenas... 8.1. Drécon 3.2, S6ION vernon 3.2.1. Economia 3.2.2. Sociedade. 3.2.3. Politica CAPITULO VE: ROMA E 0 DIREITO ROMANO 1. Introdugdo 2, Histéria de Roma: Divisdo Politiea ...on 2.1. A Realeza e suas Instituigbes Politicas, 2.2. A Repiiblica e suas Instituigses Politicas 2.3, O Império ¢ suas Instituig6es Politicas 2.4, As Mudangas em Roma Apés as Conquistas.. 3, O Direito Romano. 3,1, Dofinigdes o Caracteristicas 8.2, Poriodizagao do Direito Romano. 3.2.1, Periodo Arcaico .. 3.2.2, Periodo Classico 3.2.3, Periodo Pés-Clissico 3.3. Fontes do Direito Romano 3.3.1, Costume. 3.3.2. Leis ¢ Plebiscitos 3.3.3, Edito dos Magistrados 3.3.4, Jurisconsult0s w.nsesn 3.3.8, Sonatus-Consultos, 3.3.6. Constituigdes Imperiais 2.4, Divisio do Direito Romano. 3.4.1. Divisio Baseada na Origem. 44 46 a7 7 8 9 79 82 83 83 83 84 84 as a5 36 86 87 Ba 89 80 a 92 92 3.4.2, Divisdo Baseada na Aplicabilidade... 93 3.4.3. Divisio Baseada no Sujeito, 93 3.8. Capacidade Juridica de Gozo. 93 38.1. Status Libertatis.. 94 3.5.2, Status Civitatis 95 35.3, Status Familiae 96 354, Causas Restritivas da Capacidade Juridica de Goro... 7 8.6. Direito de Familia ., 7 3.6.1. O Patrio Poder 88 3.6.2. O Casamento.. 99 3.63. 0 Divarcio 103 3.6.4. 0 Dote 104 3.6.5. A Adogio 104 3.7, Tutola e Curatela, 105 3.7.1. Tutola.. 105 3.7.2, Curatela. 106 3.8, Sucessae, 3.8.1. Heranga. 3.8.2, Testamento.. 8.9. Posse © Propriedade, 109 3.10. Delitos . 110 3.10.1. Causatidada: a2. 3,102. Imputabilidade. 2 3.10.3. Extingao da Punibilidade ug 3.10.4. Co-Dolingiéncia 13 3.10.5. Retroatividade da Lei Penal... 14 3.10.6. Alguns Delitos 114 3.11. O Estudo do Direito © os Advogados em Roma, us CaPiTULO Vit A EUROPA MEDIEVAL Introdugao 9 2. Sistema Foudal.... 120 2.1, Caracteristicas.. 120 2.2. Contrato Foudo-Vassalico 122 2.2.1. Os Efeitos do Contrato Feudo-Vassalico 123 2.2.2. © Fim do Contrate Feudo-Vassilico.. 124 2.2.3. Os Direitos de Uso © Propriedade no Contrato Foudlo-Vassalico 125 2.9, As Relagdes Feudo-Vassiilicas @ 8 Justiga 126, OOOO OOOO OO OCHO HOOOHOOHESHHEHEHHUOE 3. Os Diroitos da Idade Média 127 3.1. Direito Germanico. 127 3.1.1, O Reino Vandalo 129 31.2. O Reino Ostrogode, 130 3.1.3. O Reino Visigodo....-. so 130 3.1.4, O Reino dos Burgiindlios 131 3.1.5, O Reino dos Francos... fenmnsemnnnsenne TST 3.2. 0 Direito Canénico 132 3.3. 0 Direito Romano... vw 135 Bh AERC GEO raincoats AQT 138, CAPITULO VIM: 0 ISLA 1. Introdugao . nnn 14S 2. O Ambiente do Surgimento do Isla. 148 3, A Pundagdo do Islamism... M47 4, O Diteito dos Mugulmanog v.sonneron roma, 160 5. 0 Alcordo. ieaatniemiemneasaes 164 5.1, Alguns Pontos do Alcorao... . 154 ‘CAPITULO IX: O DIREITO INGLES 1. Introdugao. 181 2. Direito Inglés — A Histéria @ a Formacao do Statute Law... 182 3. A Divisdo do Direito Ingles... 198 CAPITULO X: DA MONARQUIA ABSOLUTA AO ILUMINISMO 1. © Absolutismo Mondrquico site 199 200 1.1. A Franga de Luis XIV. “ 2, O Siuminismo © as Criticas ao Estado Absolutista, 205 3. Cesare Beccaria senenntnnnnnnnnnnsinnes 210 3.1. As ldélas de Cesare Becca 212 4, Outros Pensadores — Criminalistas do Iuminismo.rcinons 222 CAPITULO Xt: AS REVOLUGOES - ESTADOS UNIDOS E FRANGA No siCULO XVII 1. A Independéncia dos EUA. 2258, LA Introd aga en 225 11.2. 0 Inioio do Processo de Independéncia e a Declaracao de Direitos do Bom Povo da Virginia .. 230 1.3. A Declaragao de Independéneia ..... . 235, 1.4, A Constituicdo Norte-Ameri¢ana .rwu 1.5. A Equity e a Common Law nos Estados Unitios 2. A Rovolucao Francesa, 2.1, Introdugao... 2a 2.2. Conjuntura Politico Econdmica Pré-Revolucionaria.... 245 2. A Assombléia Constituinto © a Deelaragso dos Ditoitos | do Homem e do Cidado, . 2.4, A Declaracao dos Direitos da Mulher ¢ da Cidada 2.8, As Constituigoes Rovolucionérias, 2.6. Era Napolednica ¢ 0 Cédigo Civil. CAPITULO XII: AS LEIS PORTUGUESAS 1, Os Primeiros Habitantes ¢ a Romanizagao ..rnesmnuneunine 267 2, Os Mugulmanos na Peninsula sve 269 3. O Nascimento de Portugal... i winnie 270 4, A Era das Ordenagées... 2n 4.1, As Ordenacées Afonsinas ai Rites 808 4.2. As Ordenagées Manuelinas see 277 4.3. As Ordenagées Filipinas... on 281 5. 0 Porfodo Pombalino. ae sssenscins 201 6. As Constituigées Portuguesas.. 293 CAPITULO XM: BRASIL COLONIA 1. Sem Fé, sem Lef, sem Rei 297 2. Os Tratados Antes do Brasil @ Limites de Terras.... 00 3. © Antigo Sistema Colonial e os Puimeitos Documentos Juri- dicos na Colénia...... 302 4. 0 Municipio, « Gaverno Geral e a Montage doum Apara to Juridico na Caténia 304 5. 0 Ditoito sob o Dominio Holandés no Nordeste Brasileito... 311 6. A Legisiagao Bspecifica da Regido das Mina3.wcnueees 314 CAPITULO XIV: BRASIL REINO 1. Introdugae.., 2. A Corte Portuguesa no Brasil oa Suborainagio & lnglatorra 2.1, A Chegada da Corte e a Abertura dos Portos, 2.2. A Liberagho de Manufaturas.. 2.3. A Reorganizagio do Estado Portugu trega do Mercado Brasileiro, no Brasil e a 2.4, A Justiga no Periodo Joanino 2.5. A Blevagao do Brasil & Condigao de Reino Unido. CAPITULO XV: BRASIL IMPERIO 1. A Independéncia do Brasil e a Constituinte de 1823... 2. A Constituigdo Outorgada de 1824.. 2.1. Aiguns Pontos da Constituigao do 1824... © Gédigo Criminal de 1830 4. 0 Cédigo de Proceso Criminal de 1832 ¢ 0 Ato Adicional do 1834. . 4.1. O Cadigo de Processo Criminal. 4.2. O Ato Adicional 43, Outras Leis do Period Imperial. Nascimento da Tradigo Juridica Brasileira. 6. A Escravidao e a Lei: Condigdes e Abolicao .. 6.1. As Leis Abolicionistas G.1.1. A Lei Eusébio de Queiroz 6.1.2. A Lei do Ventre Livre. 6.1.3. A Lei dos Sexagenatios. 6.1.4. A Loi Aurea... CAPITULO CVE: REPURLICA VELHA 1. A Proclamagao da Ropiblica e a Constituicao de 1891 1.1. Alguns Pontos da Constituigao de 1891 1.11, A Repiblica Federativa dos Estados Unidos do Brasil. 1.1.2, 0 Poder Executivo.. 1.1.8, O Poder Judiciatio. 114. O Poder Legislative. 1.15, 0 Sistema Eleitoral... 1116. As Novidades da Constituigao de 1891 . 2, © Cédigo Penal do 1890. : 2.1, Alguns Pontos do Gédigo Penal de 1890. 3, O Cédigo Civil de 1916... . CAP{TULO XVI: ERA VARGAS - 1930 A 1946 1. A Revolugao de 1930 e o Governo Provisério..... 11. A Organizagio das Cortes de Apelagio do Distito Fo- io da Ordem dos Advogados Brasileiros eral ¢ a Cri 1.2. 0 Cédigo Eleitoral de 1932 333 341 345 354 355 37 381 332 384 385 385 387 394 397 398 402 405, 407 ais as 416 416 420 422 424 427 428 434 . 439 442 443 2. A Constituigao de 1994 . 2.1, Caracteristicas Gerais do Estado Brasileiro... 2.2. A Competéncia para a Elaboragao de lesisingao i 2.3. Municfpios . i 2.4, Poder Executivo Federal... 2.8. Poder Legislativo Federal. 2.6, Poder Judiciario, 2.7. Consellios Técnicos 2.8, O Voto ¢ o Sistema Eleitoral 2.9. Garantias Individuais 2.10. Trabalho, 2.11. A “Justica" do Trabalho. 2.12. Nacionalismo 2.18, Educagao..., 2.14, Assisténcia do Estado ¢ Casamento. 2.15. A Mudanga da Capital 3. A Constituigao de 1937 e a Ditadura Estadonovista 3.1, Antecodentes .. 3.2. A Constituigao de 197 3.2.1. A Justificativa da Constituigao 3.2.2, Uma Constituicao de Ditadura: Todo Poder a0 Bxocutive Podoralinnnrn 3.2.3. 0 Consetho da Economia Nacional... 3.2.4. 0 Poder Judiciatio.. 3.2.5, Voto ueninly 3.2.6. Os "Direitos © Garantias Individuais" 9.2.7. Educacdo e Familia.. A Policia, a Justiga @ Outras Instituigoes da Eva Var. G8 oe i aii 4. © Movimento Operirio: Da Década de 20 2 CLT. CAPITULO XVII: BRASIL - DE 1946 A DITADURA MIITAR 1. O Fim do Estado Novo e a Constituigéo de 1946 1.1. A Constituigao de 1946 .. : 1.1.1. O Poder Executivo.. 1.1.2. O Poder Legisiativo... 1.1.3. 0 Podior Judiciao. 444 446 407 449 450 482 455 457 458 459 467 408 469 469 476 arr . an 492 483 . 404 434 408 490 - 481 492 496 505 508 806 508 510 © OO OY OOOOH OHOOEH OHHH HHHOSCHHESHOE 1.1.4, Ministério Pablico.... 1.15, Estados e Municipios..... LLG. Os Diroitos . 2. A Ditadura Militar. 2.1, Antecodentes ... : 2.2.0 Ato Institucional (0 n" 1) 2.3. O Ato Institucional na 2 . 2.4. 0 Ato Institueional ne 3 25, 0 Ato institucional n2 4 @ a Constituigao de 1967 2.6. O Ato Institucional ne 5.. 2:7, Outras Leis do Regime Wilitar e a Emenda Constitucio- nal ne 1 de 1969. CAPITULO XX - A REDEMOCRATIZAGAO E A CONSTITUICAO DE 1988 1. 0 Fim do Rogie Milita 2. AConstituinte de 1987. 3. Caracteristicas Gerais da Constituigao de 1908. Referéneias Bibliogriificas 516 817 519 523 523 528 504 543 544 550 587 561 562 cd 865 Prefacio Foi com grande prazer que recebemos 0 convite da Professora Flavia Lages para prefaciar seu livro Hist6ria do Direito ~ Geral e Brasil. Sabemos que sua escola nao foi, como poderia parecer a priori, por sermos historiadoras nem por nosso conhecimento do Direito Romano. ‘Temos certeza de que a amizade nasceu entre nis no Mestrado em His: teria da USS quando fomos professoras, e sua Orientadora foi responsai- vel pela gontiloza de Flavia. Naquola ocasifo a autora iniciava sua ca- minhada na dificil “arte de escrever", quando defendeu com brilhantis- ‘mo sua Dissertagao de Mestrado e redigiu seu srimeiro trabalho como historiadora, Nossa alegria foi enorme ao vé-la continuar sew caminho, escrevendo este livro, onde procura defender verdades incontestes, nem sempre compreendidas pela comunidade académica. Referimo- nos a importincia que muitas vezes néo 6 concedida ao conhecimento histérico por especialistas do algumas aroas das Ciéncias Sociais, Flavia, ao conseguir desenvolver de forma sintética assunto tao abrangente ¢ complexo, mostrou sua inclinagio para Pesquisa Giontifica, revelando que a defesa de sua Dissertagao nfo foi somente uma exigancia para concluséo do Curso de Mestrado em Histéria Social A Historia do Dizeito & condigdo sine qua non para que os futuros advogades possam melhor conhecer as estrutucas, as conjunturas & 0 contexto que levaram os legisladores a elaborarem as normas do Direito. ‘Aleitura de sua obra é importante nao sé para os estudantes que desejam conhecer a histéria do Direito, mas também para os profissio- nhais @ 0 piiblico em geral Aeescrita do livro de Flavia nao se reduz. a uma narrativa historico- linear, “fragmentada em migalhas". £ um trabalho que incentiva 0 leitor & pesquisa e & reflexio critica Sou estilo é objetivo, dospojado, ologante ¢ de agradiivel leitura, embora sua narrativa pouco convencional reflita sua personalidade, ‘sua formagio ¢ um profundo conhecimento da Metodologia Cientifica, No decorrer da leitura de seu Texto, sente-se sua constante preocupagdo em realizar ensaios reflexives acorca do Dircito dos diferentes povos, inclusive especificamente a trajetérla brasileira no campo de sua anilise. Seu livro constitui um amplo painel sobre 0 Direito de diferentes Civilizagdes, compreendidas sob 0 ponto do vista politico, econémico e cultural. Em decorréncia deste fat, podemos consideré-lo ao mesmo tempo analitico, sintético e polémico. Nao é por apresentar uma visio de conjunto sobre a histéria do Direito que deve ser considerado generico ou apenas como um simples Manual. Embora este tipo de abordagem possa conduzir a gene- ralizag6es, isto no aconteco com Flavia porque seu Texto nie porde de vista a reflexao, Seu mérito repousa justamente na contundéncia com que a autora procura a reflexio ¢ nao no fato de revisar ocorréncias, passadas. O livro da autora trata de forma sintética de aspectos importantes da evolugdo juridica, mas no o faz de forma linear ¢ cronolégica porque analisa, critica e interpreta os fatos. Nele a historia do Direito 6 vista em um viés pouco explorado em obras similares porque contém informagao, reflexao e fundamentagao. Como especialista om Histéria Romana, dentre tantos pontos que consideramos fundamentais, e absolutamonte indispensaveis, analisa~ dos por Flivia Lages e que podem ser considerados polémicos, comen- taromos especificamonto aquolos que se referem ao Direito Romano. ‘A autora, ao afirmar a grande importancia do Direito Romano na atualidade para os advogados e juristas, é profundamente pertinente, Nao é possivel que se ignore o lagado do Dircito Romano para 0 pensamento juridico acidental nem sua importancia para o Direito Civil ‘em seu ordenamento juridico. A Lei das Doze Tabuas também nao foi esquocida pola autora. Como deixar de lembrar a Lot que assinalou a passagem do direito oral para o direite egerito, a primeira campilagao do Direito Romano que serviria de base ao Dircito Publico de Roma até a época do Imperador Juliano? . (© simples fato de admitir a iqualdade de todos os cidadaos romanos perante a Li e a soberania do pove faz da Lei da Doze Tabuas um documento de grande relovincia para conhecimento da historia do Direito. 0 Corpus Turis Civilis, codificagio do Direito, feita na época de Jus- tiniano, tove influéncia significativa nos Cédigos Modernos e permitiu © conhecimento das obras dos grandes jurisconsultos romanos. E dificit avaliarmos o valor de nosso débito intelectual para com Roma no que se rofere ao legado do Direito Romano, pois os romanos fundaram, desenvolveram e sistematizaram a jurisprudénci mundo, ‘Todas estas premissas lembradas por Flavia corroboram para dofesa de sua propositura a necessidade do estudo do Diteito Romano. Gostariamos de continuar analisando toda a Sintese elaborada pela autora, mas certamente nao torminarlamos a redagio deste Profacio. Néo podemos, porém, finalizar esta Introdugéo sem deixar de enfatizar um dos pontos mais relovantes do trabalho de Flavia Lagos. A autora conseguiu redigir uma obra geral sobre a Historia do Dircito bayoacla em uma pesquisa profunda ¢ acurada de Fontes Primarias, 0 que torna a leitura do seu Texto indispensavel para todos os estudiosos do Diroito, Convidamos 0 leitor a percorrer a Historia do Direito - Geral e Brasil de Flavia Lages e a oliar com admiragéo o excelente trabalho empreendido pela javem e talentosa historiadora. Marilda Corréa Ciribelti Doutora om Histéria pola US? Pos-doutora em Histéeia Social pela UFRJ OCP OKHEEBREEOAADGARRARERRD ARM ROOS.S © OOOO OY HO OCOHOHOOHHOHHOHTHHHOHHHHOOEG INTRODUGAO HISTORIA E HISTORIA DO DIREITO © que 6 Histéria? O que Mistéria do Diteito? Quais pontos His t6ria e Diteito tom em comum? Qual o objetivo do estudo de Histéria do, Direito? Ao responder a estas porguntas, ostaromos mais aptos a compreender de fato a Histéria do Direito dos Povos e das Culturas que estudaremos a seguir. Esta necessidade do conhecimento do objeto antes de uma ani lise de seus pontos é a base para a compreensio global do objeto de estudo de qualquer ciéncia, 1. Historia ‘Quando se pensa em Histéria a palavra “passado" logo nos vern a mente. O passado seria histéria? Todo 0 passado? Tudo no passaco? Uma bela frase pode iniciar nosso raciocinio: “A histéria 6 a meméria da humanidade, mas nao 6 suficiemte recordar para ser historiador."! Sem ativida, 0 tempo é a cimensio do trabalho do historiador, mas analisemos: — 6 possivel “hist6ria das baleias"? ~ ndo parece menos estranho “historia da caga as baleias"? A “histéria das baleias" nfo 6 possivel porque as baleias néo transformam, ndo se transformam... A transformaggo 6 a esséncia da Histéria © somente o ser humano pode executar tal tarefa. Por isso a “Histéria da caga as baloias” parece soar menos estranho aos nossos ouvidos. Quem caga é 0 homem, ¢ esta atitude (que hoje em dia é um tanto estiipida) mudou no tempo. IRAROE 0 PALMADE apud CHAUNU, Piers A hstéria come eifnla socal Ro de “anon: Zaha, 1976, p. 22 ‘livia tages do Casto Pode-se, entao, chegar 4 primeira conclusdo acerca da Histéria: seu objeto é 0 homem, isto 6, 0 estuco da Histéria concentra-se no Ser ‘Humano e a sucessdo temporal de seus atos.? Ser Humano estudando o ser humano, qual o objetivo? Par que isto nos ¢ tao caro? Por que € téo importante mesmo para pessoas ‘comuns? Paul Veyne apresenta dois motivos: “Primeiramenta, o fato de pertencermos a um grupo nacional, familiar... pode fazer com que Passado desse grupo tenlia um atrative parti cular para nés; a segunda razao é a cutiosidade, seja anedética ou acompanhada de uma exi- géncia da inteligibilidade."? 2, Direito, A palavra “Direito", bem como ele proprio no sentide amplo da Cigncia do Direito, vem dos Romanos antigos e 6 a soma da palavra DIS (muito) + RECTUM (roto, justo, certo), ou soja, Direito em sua origem significa o que é muito justo, o que tem justica, Entende-se, em sentido comum, o Direito como sendo 0 conjunto Ge normas para a aplicagao da justiga o a minimizagéo de conflitos de uma dada sociodade.4 Estas normas, astas regras, esta sociedade nao 580 possiveis sem o Homem, porque 6 o Ser Humano quer faz 0 Direito e & para ele que o Direito é feito. Esta dependéneia do fator humano ¢ exteriorizada por Vicente Réo da seguinte maneira: “0 dizeito pressupée, necessatiamente, a exis téncia daquole ser e daquela atividade. Tanto va- le dizer que pressupie a cooxisténcia social, que 6 o proprio homem."5 J LOGE, Mave ttre Andel Sits: Europa Abia, {19-— 1 CAR. Bf Que Peale sama Poe Tors, 1976 BESSELAAR. WO. Inoue ss sre treo, et ie Poa Horne 170. . 2 VIE ut me ne ney ac Pazar Unter orci 0p eee et cre © mor dtinighe do Doo, mas. bo euiont para ee Saline que pasate acomprocnsio de Hin do Dots, Bra mG Ute ea it dos erator 0 Sto fa 190. ia 464, Bros: ‘Mitra do Diseto Gora Brasil, © Jurisconsulto romano Ulpiano nos da uma ligéo do que é 0 Diteito, indicando os tipos de direito e definindo-os. Vale a pena en- cerrar esta definigdo com a ligdo, dodicada aos estudantes de Diteito, deste mestre da Antiguidacie: “Os que se vio dedicar a0 estudlo do Dircito dovem comegar por saber donde vem a palavra ‘ius’. Na verdade, provem de “iustitia’: pois (se- tomando uma elegante dotinigdo de Celso) o dieito € a arte do bom e do ealiitativo. § 1. Pelo que ha quem nos chame de sacerdotes..Na ver, dade, cultivamos a justica e, uilizando o conheci- ‘mento do bom e do eqilitative, separamos o justo do injusto, distinguimos 6 leita do iicito...§ 2. Ha duas partes neste estudo: 0 direito piblico, que diz. respeito ao estado das coisas de Roma; e 0 rivado, relativo a utilidade os particulares, pois certas utilidades sdo piiblicas e autras, privadas, O direito publico consiste (nas normas relativas) as coisas sagradas, aos sacordotes @ magistra- dos. O direito privado é tripattide: &, de fato, coli- Gide de preceitos naturais, ou das gentes, ou eivis."6 Histéria do Direito Ja foi possivel perceber que Histéria ¢ Direito tim algo em comum: © Homem. Assim, partindo do Ser Humano, 6 necessario salientar al- ‘guns pontos primordiais, © Homem ¢ naturalmente produtor de Cultura, Nao somente aqui- Jo que chamam comumente de cultura, como saber sobre autores elas UULPIANO, Digesta de Justiniano. Liber Primus. 1: DE IUSTITA RT URL, “hu operam daturl pees noseo oportet undo nomen luis docandat, Eat autem a iosiia appcocenn ‘nam (ut oleganter Gelsus defnt) ius est ars on! ot ous $8, Cujus mete qs fos sncerdotes appolet, Justtiam nanque cellimas, et hon! ot dere! etiam writen, serum ab fnfgue eeparantcs, lceum ab cium discurentes. 2: Hujus stall does sunt positiones:publicum jus est, quod ac statu rl romane spsint privatans ec Zero wltsem: sunt ein gunna psu dam prin: abc in sacrs, in sacordetibus, in magistrate consist Prvatun fox poston oe ‘collect eeunin ext ox naturabias pranooptibus aut gentry ae Gvibes © © 6 OW OU OOOOH OOOO OHO OHHH KHHOHHHHSHE Fivia Lagos do Castro sicos, vinhos caros e literatos, mas a Cultura ne sentido correto da palavra, Entende-se por Cultura “o processo pelo qual 0 homom acumula as experiéncias que vai sendo capaz de realizar, disceme entre elas, fixa as de ofeito favordvel e, como resultado da agio exercida, converte em idéias as imagens e lembrangas (..)."7 Isto 6, tudo 0 que o homem produz faz parte da cultura do homem. A.cultura 6 tomporal, histérica. Ela depende do momento em que determinado individuo ou comunidade esto vivendo para ter as caracteristicas que a definem. Assim como afirma 0 velho professor Bloch baseando-se em um ditada dirabe: “O Homem se parece mais com seu tempo que com seus pais.’ Pode-se conclulr, portanto, que, sendo o Direito uma produgao humaria, ele também 6 cultura e é produto do tempo histérico no qual a sociddade que o produziu ou produz esta insorida. Plagiando o ditado érabe, poderiamos afirmar que o direito se parece com a necessidade histérica da sociedade que o produziu; é, portanto, uma produgao cultural e um reflexo das exigéncias desta sociedace Conforme as belas palavras de Jayme de Altavila: “Os direitos dos povos esquivalom pracisamente a0 seu tempo @ se explicam no espaco de sua gestagio, Absurdos, dogmiticos, licides eli boraie - foram, todavia, of angoies, as conaistae © os baluartes de milhdes de sores que, para eles, levantariam as mios, em gesto do siiplica ou de enternecide reconhocimonte, 4, Objetivos do Estudo de Histéria do Direito A Histéria do Diroito 6 primordial para o estudante de Direito na me- dida em que o auxilia na comproonsdo das conoxdes quo oxistem entre 7) PINTO, V.pud ARANHA, M1. do A. Martins, MH. PFlosofando:introdugae &fesotia ‘So Paulo: Moderna, 198, 8 BLOCH, Marc. Op. ct, p. 36 5) ALTAVILA, Jaymo de. Origem do direit dos povos. 7 cd Sto Yau: leone, 1989, . 16. Hatin do Ditto Geral «Bras asociedade, suas caracteristicas, ¢ o diroito que produziu, "treinando-o" ara uma melhor visualizagio © entendimento do préprio direito. A Histéria om si tem muito deste objetivo; ola é, nas palavras de Collingwood, para "autoconhecimento” nao somente pessoal ou social, mas também no oxercicio de tarefas profissionais, “Conhecer-se a si mesmo significa saber o que se pode fazer. E como ninguém sabe 0 que pode antes de tentar, a Gniea indicagio para aquilo que ‘ohomem pode fazer 6 aquilo que jé fez, O valor da histéria esta entdo om ensinar-nos o que e homem, tem foito e, deste, modo, 0 que o homem é."10 Portanto, o valor do estudo da Histéria do Direito no esta em ensinar-nos nao somente o que o dicito tem “feito”, mas o que o direito 6. Tendo isto em mente, podemos avangar neste estudo, buscando ‘compreonder nfo somente as reqras de pavos que viveram no passado, ‘mas sua ligagio com a sociedade que a produziu para assim, e somente assim, entender 0 “nosso” Dircito. 5. Este Livro O Principal objetivo deste livro é dar ao leitor um espectto geral cla Historia do Diseito a partir da compreensao da sociedade que envolvex a elaboragao das leis. Tomando por pressuposto lécico que nio sao as lois que formam uma sociedade, mas que estas, histiricas em si, so feitas a partir do que uma sociedade pensa ou deseja de si. Para que isto pudesse ser feito, dada a abrangéncia do tema, fo- tam escolhidos cronologicamente alguns povos ¢ respectivas levis Jagdes que pudessem contribuir para a compreensao da ligagéo entre 0 ovo e suas leis e/ou para o entendimento da legislagée brasileira e sua histéria, ‘Tomando por base fontes secundarias de historia © Diteito, bem como fontes primarias relativas As leis propriamente ditas, analisamos Pormenorizadamente, sempre que possivel, a conexiio sociolegal exis. tente. 30 COLLINGWOOD, NG. A idéla de histéra Lisboa: Prosenga, 1972p. 17 ‘idviaLages de Castro. Assim podemos pensar de fato em uma Histéria do Direito. Nao com um olhar descritivo sobre leis do passado que parecem ter surgido do nada, mas a partir do cardter, intengao e nogées de morale objetivos dos povos que acharam por bem escrever suas normas. CAPITULO I O DIREITO DOS POVOS SEM ESCRITA Embora algumas vezes as pessoas confundam Direito e Lei escri ‘a, se partirmos do pressuposto de que um conjunto de regras‘ou nor- ‘mas que regulamontam uma sociedade pode ser chamado (ainda que humildemente} de direito, todas as comunidades humanas que existem 0u existiram no mundo — indiferentemente de quaisquer caracteristicas que tenham ~ produziram ou produzem seu "Direito”. 6 podemos estudar Histéria e, portanto, Histéria do Direito a par- tir do advento da escrita (que varia no tempo de povo para povo), antes disso chamamos do Pré-histéria, A Pré-histéria do direito é um longo caminho de evolugao juridica gue povos percorreram e, apesar de podermos supor que foi uma es- trada bastante rica, temos a dificuldade, pola falta da escrita, de ter acesso a ela. Esta riqueza pode ser comprovada pelo fato de as sociedatles a0 se utilizarom pela primeira vez da escrita (e do direito escrito) ja texem instituigées que dependem muito de conceitos juridicos, como casa- mento, poder paternal ou maternal, propriedade, contratos (ainda que verbais), hierarquia no poder piblica ete. As origens do Direito situam-se na formagio das sociedades ¢ isto Tenionta a épocas muito anteriores & eserita e o que se mostra mais interessante neste estuclo ospecificamente é que, dependendo do povo de que tratamos, esta “época” ainda é hoje. Povos sem escrita ou agrafos (a= negagao + grafos~ escrita) nao tém um tempo determinado. Podom ser og homens da caverna de 3.000 4.6, ou os indios brasileiros até a chegada de Cabral, ou até mesmo as tribos da floresta Amazénica que ainda hoje nao entraram em contato com o homem branco, . Dianto desta multiplicidade de povos e tempos podemos somente comentar algumas earacteristicas gerais destes grupos. Em geral, nao tém grande desenvolvimento tecnolégico @ somente uma minoria des- tes tem agricultura. Séo, em sua maior parte, cagadores-coletores € co- mo tais seminémades ou némades. Os povos agrafos que possuem © OOOO OO OOOOH OHOOCHEHHOHHHEOEETSEUVOE livia tagee do Cost agricultura séo sedentarios e todos eles, sem excegdo, baseiam seu dia adia em uma religiosidade profunda. Pela quantidade destes direitos e a diversiciade destes buscamos onto, como introdugao ao estude de Histéria do Diteita, apontar ca racteristicas ¢ fontes do dircito comuns que auxiliam na compreensao de um todo tio distinto. 1. Caracteristicas Gerais dos Dirt 10s dos Povos Agrafos!t \_ Sio Abstratos: como sao direitos nao escritos, a possibilidade de abstragao fica limitada. As regras devem ser decoradas e passadas de pessoa para pessoa da forma mais clara possivel. Y Sao Numerosos: cada comunidade tem seu préprio costume @ vive isolada no espago e, muitas vezes, no tempo. Os raros con: tatos entre grupos vizinhos (que porventura vivem no mesmo tempo e dividem o mesmo espago) tém como objetivo a guerra V_Siio Relativamente Diversificados: Esta distincia (no tempo e no ‘espago) faz com que cada comunidade produza mais disse- melhangas do que semelhangas em seus direitos, Sao Impregnados de Religiosidade: como a maior parte dos fendmenos sao explicados, por estes povos, através da roligidio, a regra juridica nao foge a este contexto. Na maior parte das vvoz05 a distingdo entre rogra religiosa e regra juridica torna-se impossivel, Sao Diroitos em Nascimento: a diferenca entre 0 quo 6 juridico © © que nao & muito dificil, Esta diotingéo s6 ze torna possivel quando 0 direito passa do comportamento inconsciente (deri- vvado de puro reflexo) 20 comportamento conscionte, fruto do roflexio. TT Werte ponto segulremos de pero es apuntamentos de CILISSEN, J. Tntrodugio histér- cea ao digelto, 2 od. Lisboa: CalousteGulbokan, 1986, p. 3135, isteia do Dieta oral Basi 2, Fontes dos Direitos dos Povos Agrafos Entendemos como “fontes de direito” tudo aquilo que é utilizado ‘como base ou “inspiracdo" para a feitura de regras ou codigos. Os povos agrafos basicamente utilizam os Costumes como fonte de suas normas, ou seja, o que é tradicional no viver e conviver de sua Comunidade torna-se reara a ser soguida.1? Entretanto, o costume nao é a tinica fonte do direito destes povos. Nos grupos sociais onde se pode distinguir pessoas que detém algum tipo de poder estes impdem regras de comportamento, dando ordens que acalbam tendo carater geral e permanente. © precedente também é utilizado como fonte. As pessoas que julgam (chefes ou anciéos) tendem a, voluntiria ou involuntariamente, aplicar solugées ja utilizadas anteriormente. 3, Transmissio das Regras Muitos grupos utilizam 0 procodimonto de, em intervalos regu- ares de tempo, terem suas regras enunciadas a todos pelo chefe (ou chefes) ou anciaos. Outras formas so os Provérbios e Adagios quo de-+ sempenham papel decisivo na tarefa de fazer conhecer as normas da comunidade. 720 correo malo: ou menor ga fn det Duo Us vanes tenlsiamente qv nope asco sn sociedade, por mais gow sua mocal como CAPITULO II AS PRIMEIRAS LEIS ESCRITAS E © CODIGO DE HAMMURABI 1, 0 Grescente Fértil e as Primeiras Leis Escritas Ha um lugar no mundo onde quase tude que consideramos “civi- lizado” nasceu: o Crescente Férti, onde hojo esta o Iraque, uma parte Go Tra e parte de sous vizinhos, Este lugar tem este nome por causa da fettilidade que os rios Tigre e Eufrates dao a uma regio que é se- melhante a uma lua crescente de cabega para baixo. Nesta regido o homem primeio dividiu as horas, os minutos © os segundos em sessenta, fez tijolos ¢ erigiu grandes construgées com eles, criou (para a felicidade dos olhos e da alma) a jardinagem, inven- tou o Estado e 0 Governo, fez as primeiras escolas, inventou a cerveja, Mas, a mais grandiosa invengao dessa gente da Mesopotamia foi Passar para uma superficie simbolos que expressavam idéias; a iss0 chamamos de escrita.19 0 tipo de escrita que inventaram foi a cunei- forme. Nao se pode estranhar, portanto, que tenham sido estas pessoas 4s primeiras a terem leis escritas. Tem-se noticia de um chefe da cidade. Ge Lagas de nome Urukagina, no terceiro milénio antes de Cristo, ser apresentado pelos textos de época como um grande legistador e eformacor, Bouzon informa, contudo, que as inscrigées de Urukagina no transmitem leis ou normas legais, mas medidas sociais adotadas ata coibir abusos e cortigir injustigas vigentes.15 © como de leis mais antigo que se conhece & 0 de UrNammu (undador da terceira dinastia de Ur, 2111-2094 a.C.) do qual chegou até 12” Mesopetimla (= entce os) foi o nome dado pales gregos i regito onto 0 a Tigre states, 34 “Cuneiform sistema de escita, sem dvida o mais antigo coshcido,ocueltoeme (do Jatim euncus, “euio”e Meme, fxm, fo. iaventado pelos sumetlanos seguremeete hoc do 0 4 mulénio, O texmo cuneiforme earactriza o aspeeto anguloso den canteen ea, ‘reszos em agia Gmida ou. raramente, em pedra(~)” AZEVEDO, A.C. oA Diciondoy se nome, terms « concitoshistrleo, Rio do Janae: Nova onieia 1680.4 fa 15 BOUZON, 8.0 Cbaigo de Hammurab. 6 ed. Petrépois: Vos, 1008, yaa OOOOH OOO HOH OOHEEE UHHH HHHHHHHHVES Flivia tages de Casto nés somente dois fragmentos de um tablote de argila. Em 1948 outras leis foram identificadas também na mesma regio; sao as leis de Eshunna, No final de 1901 ¢ inicio de 1902 d.C. uma expedigio arquoolégica francesa encontrou uma estela (ou pedira) de diorito negro de 2,25 mde altura contendo um conjunto de leis com 282 artigos, postos de ma- neira organizada, ao qual chamamos hoje de Cédigo de Hammurabi por ter sido feita a mando do Rei Hammurabi, que reinou na Babildnia entre 1792 @ 1750 a.C.16 2, Algumas Consideracées Sobre as Leis Anteriores a Hammurabi Antes de tratarmos especificamente do Cédigo de Hammurabi ¢ interessante que nos detenhamos, ainda que rapidamente, nas ca- racteristicas gorais das leis escritas anteriores a Hammurabi. ‘Tanto Ur-Nammu quanto Eshunna foram rois de Cidades Estado no Crescente Fértil e dao nome as primeiras leis escritas que conhe- ccomos; a influéneia que Ur-Nammu (rei sumeriano) exerceu sobre as lois do Eshunna sio to grandes quanto a que estas duas logislagées provocaram no Cédigo de Hammurabi. A questo da justica, aids, era importantissima jé para os sumerianos, desta forma explica Kramer: Joie a justiga eram conceitos fundamentais da antiga Suméria, que impregnavam a vida social e feconomica sumenana tanto na teona como na prética. No decurso do século passado (séc. XIX .C.}, 06 arquaélogos rovelaram, a luz do dia, mi- Thares de tabuinhas de argila representando toda espécie de documentos de orciem juridica: con- tratos, atos, testamentos, notas promissérias, 1e- cibos, acérdaos dos tribunais. Entre os sumérios, © estudante mais adiantado consagrava uma grande parte de seu tempo ao estudo das leis € exercitava-se regularmente na pritica de uma terminologia altamente especializada, bem como 16 A podia ou Estela) pode ser vista hoje om dia no Museu do Lowe, om Pais na transcrigio dos cédigos logais ¢ dos julga- ‘mentos que tinham formado jurisprudéncia.""7 O direito privado sumeriano reconhecia alguma independancia em relagao ao marido. O divércio era realizado através de decisao juciicial © poderia favorecer a qualquer dos cdnjuges, © tepiidio cla mulher acarretava uma indenizagao pecuniiiria e somente era permitido pelos motivos indicados pela lei. O adultério era um delito, porém sem conseqiiéncias se havia 0 perdao do marido. O filho que renegasse seit Pai poderia ou ter a mao cortada ou ser vendide como escravo. A esposa era responsivel pelas dividas do marido. As leis penais dos sumerianos muitas vezes substituiam o Prin- cipio da Pena de Talido (que sera oxplicado a seguir) por multas ou por indenizagées legais. 3. A Babilénia de Hammurabi Embora a Babilénia mais famosa seja a do rei Nabucodonosor (séc. V a.C.) por causa da participagao deste na Histéria dos Hebreus contada na Biblia, a Histéria da Babildnia remonta 0 segundo milénio da era pré-Crista, quando um grupo némade (arcadiano) fixou-se em ‘uma localidade chamada Babila ou Bab lim (Babilénia ou Babel — porta, de deus), as margens do rio Eufrates, O xeque deste grupo arcadiano, Sumuabum (1894-1881 a.C.), co- ‘megou a expansio territorial da babilénia, mas foi seu sucessor, Suits la’el (1890-1845 a.C.), cma, com vitdriae euceosivas sobre os viaiulius, consolidou a independiéncia da cidade. Os eis posteriores incomporaram a cultura suméria e somaram-na & cultura arcédica; entretanto, em termos de expanséo territorial somente em 1792 a.C. com a ascensio ao poder de Hammurabi a Babi- nia cresceu em poder. Este rei, com imonsa habilidace em politica de aliangas, mais que dobrou o territério que seu pai havia deixado, © rel Hammurabi construiu um grande império que abrangia os territérios dominados anteriormente pela dinastia de Agadé — do mar Imferior @ do Elam até a Siria e 0 litoral do Mediterraneo. Ele assumitt ‘5 titulos de rei de Sumer, roi de Acad, rei das Quatro Regides, rei do TW ERAMER apud GIORDANE, M,C. Histérin dn anti ‘ozs, 2001p, 138 iguidade orlenta. 11, ed, Poedpais: livia Lages do Castro Universo e, 0 mais interessante: “Pai de Amusru” (Amurru significa Ocidente), Hammurabi nao foi apenas um grande conquistador e um ex- celente estrategista; foi, antes de mais nada, um eximio administrador. Conforme afirma Emanuel Bouzon: "Seus trabalhos de regulagem do curso do Bufrates © a construgio conservagao de canais, para a irrigagdo e para navegagao incrementaram enormemente a produgao agricola ¢ 0 comércio. Em sua politica externa Hammurabi preocupou- se, sempre, em reconstruir as cidades vencidas ‘em reedificar ¢ ornamentar ricamente os templos dos douses locals (..)."¥8 a am (0 poder judlicifrio, na Caldéia anterior a0 roinae do de Hammurabi, era exercido nos templos pelos sacerdotes em nome dos deuses. Na Babilénia, desde 0 inicio da I dinastia, comegaram a ser or ganizados, & imitagao do que ja existia em Sumner, tribunals civis depondentes diretamente do so- berano. Hammurabi conferiu & justiga teal supre- macia sobre a justiga sacerdotal; deu-Ihe unifor- Te BOUZON, &. op. ci, p20. 4 stra do Dieta Gora Basi midiade de organizagio e regulamentou cuidado- Samente o processamento das ages, compreen- dendo nessa regulamentagéo a propositura, © recebimento ou nao pelo juz, a instragio com- Pletada pelo depoimento de testemunhas o diigéncias “in loco" e, fnalmente, a sontenga. Foi estabelecida entao uma organizagio judiiéria ue inclula até 0 ministério pitblico © um diveito processual,"!9 Apés a morte de Hammurabi a dinastia manteve-se por aproxi- ‘madamente 150 anos, mas em 1594 os Hititas invadiram e incendiaram 4 Babilénia, abandonando-a em seguida, A queda da dinastia de Hammurabi fez asconder 05 Cassitas que iniciaram um novo periode da Historia da Babilénia, 4. Sociedade e Economia da Babilénia Hammurabiana A Sociedade da Babilénia da época de Hammurabi 6 dividida, conforme indica 0 préprio cédligo, em trés camadas sociais: V Os “awitum”: 6 homem livre, com todos os direitos de ‘cidadao, Este é 0 maior grupo da sociedade hammurabiana ¢ comprocn. Gia tanto ricos quanto pobres desde que fossem livres, Y Os “muskénum’: séo uma camada que ainda suscita muita Giivida por parte dos estudiosos, Parecem ter side uma camada intermediria entre os awilum e os escravos, formada por fun, cionatios piblicas, com direitos e deveres especificos, Os escravos: exam a minoria da populagdo, geralmente prisio- neiros de guerras,29 A economia era basicamonte agricola e u iaior parte cas terras era de propriedade do Palacio, ou seja, co governo, Mas havia comércio © este era bastante forte, principalmonte o externa conforme mostra o 419, GIORDANL Mt. . Histéria da Antiqued pct p. 166 2 OCéige de Haman dw nme de wana fa um para eacravos e ameum para escavas 1s © OOOO OY UO WHEW EEUU OOOOH HOHOHHOHSEE Fllvia tages de Cast préprie Cédigo que afirma existirem inclusive banqueitos que finan- ciavam as expedicoes. © pequeno comércio varejista estava nas maos de mulheres, as “taborneiras" que vendiam ndo somente bebidas, mas também géneros de primeira necessidade. O vefculo de pagamento, que hoje denominamos moeda, era a cevada ou a prata, Assim nos indica 0 Cédigo de Hammurabi: “Se uma tabemeira nao aceitou cevada como prego da cerveja, (mas) aceitou prata em peso grande ou diminuiu o equivalente de cerveja em. relagio a0 curso da covada, comprovario (i550) contra a taberneira e a langardo na dgua."2 4.1, Questées Acerca dos Escravos A medida que utilizaremos amplamenta, principalmente na An- tiguidade, a nogio de escravidao, faz-se necessario empenhar-nos em entender 0 que significa a Instituigdo Escravidéo, Isto faremos levando em conta a Escravidao como wm todo, néo somente na Babilénia, que & © toma deste Capitulo. Definir escravidao ndo é somente considerar que todo aquele que trabalha sem nada receber ¢ escravo: muitos de nés serfamos, até mes mo 05 honrados voluntirios que oxistiram e existem no munca, cole cados nesta posigéo, que nao é vordadeira no caso deles, Escravo é propriedade, bem aliendvel, ou seja, algo que pode ser comprado, vendido, alugado, dado, eliminado... Escravo é, portanto, coisa. Na Antiquidade nao era condigdo imperiosa ser de outra raga para tomar-se escravo. De fato, a escravidao originava-se de guerras —quan- do 0 individuo era, apés a derrota de seu grupo, pego pelos vencedo res ~j de dividas ~ quando 0 individuo penhorava o préprio corpo ou de ‘um membro da familia, como garantia de pagamento ¢ nao 0 fazia ~ ou por nascimento. Assim define o Diciondrio de Nomes, Termos e Conceitos Histéricos: “Institui¢ao secular earacterlzada pela situagio do individuo juridicamente considerado um obje- 6 “Hiscria do Ditto Geral Bras 10, do qual outra pessoa pode disper liveemente exercendo direitos de propriedade. A eseravidio ‘conheceu extraordinaria difusaa no munilo anti- 90, originando-se, de modo geral, da querra ~ ce leiro inesqotivel -, das dividas © da heredita- Hledlade (.,)."22 Ofilésofo grego Aristételes explica a eseraviclao desta forma: A produgéo precisa de instrumentos dos quais uns so inanimads ¢ outros, animados. Todos os wrabalhadores sao instrumentos animados neces- sitios, porque of instrumentos inanimados no 80 movem espontaneamente (as langadeiras nao tecom panos por si préprias). O escravo, instm- mento vivo como toco trabalhador, constitu: ademals “uma propricdade viva’. A nogao de pro- riedade implica a de sujeigao a alguém fora dela (08 5, Alguns Pontos do Cédigo de Hammurabi a) A Pena de Taliao © Principio da Pena ou Lei de Talido 6 um dos mais utilizados por todos os povos antigos. £ apontado por alguns como sondo a primeira forma que as sociedades encontraram para estabelecor as penas para seus dolitos, Este principio, que é exemplificado na Biblia coma frase “olho por otho, dente por dente, nao é uma tel, mas uma idéia quo indica que a ena para o delito é equivalente ao dano causado nesto. Assim send, ninguém softe “pena de taligo", mas, baseado neste principio, soft como pena o mesmo sofrimento que impée ao cometer o crime. 22 RISVEDO, Antonio Cates do Amatal,Diionésio de nomes, termos ¢ conesitos his tirion. Rio do Janeio: Nova ranteita, 1990. 187, 29. ARISTOTELES spud GORENDER Jacob. 0 ‘teraviema rolonia. 839 Gute: Ate, 1860, ” Flivia tages de Caso 0 Cédigo de Hammurabi utiliza muito este principio no tocante a danos fisicos, chegando a aplicé-lo radicalmente mesmo quando, para conseguir a equivaléneia, penaliza outras pessoas que nao o eulpado, "Se um awilum destruiu o olho de um outro awilum, destruirdo seu olho."24 “Se um construtor edificou uma casa para um awilum, mas nf reforgou seu trabalho, ¢ a casa, ‘que construi, caiu e causou a morte do dono da ‘casa, esse construtor sera morto."25 "Se causou a morte do filho do dono da casa, matardo o filo desse construtor."26 0 Principio da Pena de Talido néo contava quando os danos fisicos oram aplicados a escravos A medida que estes podem ser definidos como bens alienaveis; o dano contra um bem deve ter ressarcimento material. ) Falso Testemunho © falso testemunho ¢ tratado com severidade pelos povos antigos porque provas materiais eram mais dificois; assim sendo, contavam ~ ha maior parte des processos ~ somente com testemunhas. 0 Cédigo separa uma causa de morte de uma causa que envolve pagamento, nesta titima 0 énus do falso testemunho é o pagamento da pena do processo. Em outros casos a sang para falso testemunho ¢ a Pena de Morte. “se um awilum apresentou-se em um proceso com testemunho falso e nao pode comprovar 0 ‘que disse: se ease procosso é um proceso capi tal, esse awilum sara morto."27 wm 5136 25 52 26 $230. 10 istria do Dieta Garale Brasil “Se a aresoniou com um tosemune (azo om causa) do covada ou prata: ee cartegar a penn desse processo.” 28 me c) Roubo e Receptagao © Cédigo Hammurabiano penaliza tanto 0 que roubou ou furtou quanto 0 que recebeu a mercadoria roubada, “Se um awilum cometeu um assalto @ foi preso: esse awilum sera morto."29 “Se um awilum roubou um bem de propriedade de um deus ou do paldcio: esse awilam sera ‘morto; ¢ aquele que recebeu de sua milo 0 objeto roubado sera morto."30 d) Estupro __O estupro sem pena alguma para a vitima era previsto neste cédigo somente para "vicgons casadas" (como na legislagio mosaica), ou seja, mulheres que, embora tenham o contrato de easamento fir. mado, ainda nao coabitavam com os maridos. #¢ um awilum amarrou a esposa de um (outro) awrilum, que (ainda) néo conhecou um homem ¢ mora na casa de seu pai, dormiu em seu seio, ¢ 6 Surpreanderam, esse awilum sord morto, mas a mulher seré libertada."31 ¢) Familia © sistema familiar da Babildnia Hammurabiana era patriarcal ¢ 0 casamento, monogamico, embora fosse admitido o concubinato, Esta aparente diserepancia era resolvida pelo fato de uma concubina jamais 90% a 22 30 §00. at bam. 19 COO OOO OO HEHEHE OHHH OEEHHEHHOHHEHEUHOG ‘via Lagos do Casto ter 0 “status” ou os mesmos direitos de esposa. O casamento legitimo era somente valido se houvesse contrato: “So um vellum tomou uma esposa e nao redigiu © seu contrato, essa mulher nao 6 esposa."S2 Havia também a possibilidade de casamentos entre as camadas sociais e 0 cédigo nfo somente admitia isto como regulamentava a heranga dos filhos nascidos deste tipo de casamento: “Se um escravo do paldcio ou um eseravo de um muskénum tomou por esposa a filha de um awilum ¢ ela Ihe gerou filhos, © dono do escravo no poderd relvindiear para a escravidao os filhos da filha de um awilum."3 Ocasamento era no que chamamos hoje bens" ragime de comunhao de depois que a mulher entrou na casa de um awilum, recaiu sobre eles uma divida, ambos dovordo pagar ao mercador."3 1 Escravos Havia duas maniras basicas de tomar-se escravo nao somente na Babilénia, mas também na Antiguidade como um todo. Como prisionelro de guerra ou por no conseguir pagar dividas e assim ter que entregar-se a si mesmo, a esposa ou aos filhos, mas Hammurabi (assim como os Hebrous posteriormente) vai limitar o tempo desta escravidao por divida. "Se uma divida pesa sobre um awilum e ele vendeu sua esposa, seu filho ou sua filha ou os ‘entregou em sorvigo pela divida, durante és anos trabalhario na casa de sou comprador ou mo MBS, striae Dieta Geral Basi daquele que os tém em sujeigéo, no quarto ano ser concedida sua libertagio." 35 ‘Uma escrava, tomada como concubina por seu senhor ou dada por ‘sua senhora ao marido, tinha uma sitagio bastante interessante se dosse a este filhos que ele reconhecesse, Ela nao mais poceria ser vendida conforme atesta 0 artigo 146 do referide Cédigo, 4g) Divorcio © marido podia repudiar a mulher nos casos de recusa ou negligéncia em “seus deveres de esposa e dona-de-casa’ Qualquer dos dois conjuges podia repudiar o outro por ma con: duta, mas neste caso a muller para repudiar homem deveria ter uma conduta ilibada, "Se uma mulher tomou aversio a seu esposo © disse-Ihe: "Th nao teris relagées comigo’, seu caso sor’ examinado om sou distrite, Se cla se ‘guarda ¢ ndo tem falta e seu marido é um saidor © a despreza muito, essa mulher nio tem culpa, ola tomard seu dote e ird para casa de seu pai."36 h) Adultério Somente a mulher cometia crime de adultério, o homem era, no méximo, etimplice. Desta forma, se um homem saisse com uma mulher asada, ola seria acusada de adultério ¢ ele de ctimplice de adultério ¢ 0 a mulher fosse solteira, nao comprometida, nao havia crime nem cumplicidade, mesmo porque este é um povo que admite concubinato, ‘Quando pegos, os adiilteros pagavam com a vida, entretanto Cédigo prevé o perdao do marido: “Se a esposa de um awilum for surpreendida dormindo com um outro homem, eles os amarrario @ os langario n'gua, Se © esposo a livia Lages de Gast doixar viver sua esposa, o rel também doixard viver seu servo."97 1) Adagio Esta sociedade foi bastante humana no tocante & adogéo, veja: = Se uma crianga fosse adotada logo apés seu nascimento, nao poderia mais ser reclamada, = Se a crianca fosse adotada para aprender um oficio e 0 ensi- amento estivesse sendo feito, ola nao poderia ser reclamada Caso este ensino nao estivesse sendo feito, o adotado deveria voltar a casa paterna — Se acrianga, ao ser adotada, jd tivesse mais idade e reclamasse por seus pais, tinha que ser devolvida = Em outros casos, so 0 adotado renegasse sua adogio, seria severamente punico, — Soo casal, apés adotar, tivesse filhos ¢ desejasse romper 0 con- trato de adogdo, 0 adetado teria direito a uma parte do patri- ménio deles a titulo de indenizagao.39 j) Horanga No caso da divisdo da heranga, a sociedade hammurabiana n30 previa a primogenitura, ou soja, os bens néo ficavam somente com 0 fio mais velho, entrotanto este poderia, na hora da partilia, ser © primeiro a escolher sua parte. A tendéncia era sempre dividir em partes iguais indiferentemente de quem era a mae da crianga, bastava oreconhecimento do pai. go a primeira esposa de um awilum The gerou hos ¢ a sua eserava lhe gerou filhes, (se) 0 Pai durante a sua vida, disse aos filhos que a escrava the gerou: 'Vés sois meus filhos' e os contou com cs filhos da primeira osposa, depois que 0 pai Gnorrer, os filhos da primeira esposa ¢ os flhos da (scrava dividitao em partes iguais os bens da casa ‘atria do Diroito Gora Brast paterna, mas 0 herdeiro, filho da primeira esposa, escolherd entre as partes e tomaré para si."39 Estavam excluidas da heranga as filhas j casadas, pois estas ja haviam recebido o dote. As filhas solteiras, quando casassem, recebe- riam sou dote das maos dos irméos.40 Mas os filhos, mesmo reconhecides, ou frutos de casamento, podiam ser deserdados, mas para isto deveria haver um exame por parte dlos juizes, “Se um awilum resolveu deserdar sou filho © disse aos juizes: ‘Eu quero deserdar mov illo’, o5 juizes examinardo a questéo. Se o filho néo come- teu falta suficientemente grave para exclui-lo da horanga, 0 pai ndo poderd deserdar sou filo." 1) Proceso As leis babilOnicas desta época permitem e prevéem a mistura do sagrado e do profano no julgamento, embora a justiga loiga tenha tido maior importéncia que a sacerdotal a época de Hammurabi. Um juiz ppodia ser um leigo, um sacerdote e até forgas da natureza como neste caso onde quem "julga” 6 0 rio: “Se um awilum langou contra um (outro) awitum (uma acusagdo de) feltigaria, mas ndo pode comprovar: aquele contra quem foi langada (a acusagio de) feitigaria iré a0 rio e mergulharé no rio, Se o tio purificar aquole awilum e ele sai ile- 0: aquele que langou sobre ele (a acusagao de) feitigaria sera morto e © que mergulhou no rio tomara para si a casa de sou acusador."42 0 juiz leige nao poderia, contudo, alterar seu julgamento apés 0 encerramonto do processo: 2B 6mm, 40 §51830% a1 166. a $02, 2 COR OPER ORPROFORDARARA RA AR AARNet OW OOOO OOOO HEHEHE HOECHOHTOOHHEHHHHGE livia Lages de Castro. “Se um juiz fez um julgamento, tomou uma de- cisdo, fez exarar um documento selado e depois alterou 0 seu julgamento: comprovarao contra esse juiz a alteragao do julgamento que fez; ele agaré, entao, doze vezes a quantia reclamada nesse processo e, na assembléia, ficlo-ée levan- tarse do seu ono de juiz. Ele ndo voltaré a Ssentar-se com os juizos em um processo."*2 }) Trabalho © Cédigo de Hammurabi aborda leis sobre trabalho. Ele, por exemplo, prevé e pune 0 erro médico:t4 "Se um médico fez em um awilum uma operagio dificil com um escapelo de bronze © causou a morte do awilum ou abriu o nakkaptum de um awilum com um escapelo de bronze e destruiu o otho do awitum, eles cortaréo a sua mio."45 Ao mesmo tempo este Cédigo 6 0 primeira que conhecomos indicar ndo somente 0 pagamento que um médico deve ter, mas tam- ‘bém 0 pagamento de iniimeros profissionais como lavradores, pastores, tijoleiros, alfaiates, carpinteiros ete.49 m) “Defesa do Consumidor" ‘Na Babilénia de Hammurabi havia leis que protegiam os cidadaos do mau prestador de sorvigos, pelo menos em alguns casos (pode-se atestar esta idéia jé no pardgrafo 108 - o que trata da tabemeira — citado anteriormente): e405, 414 S00 ero médieo oi cometite em wm ercravo.oreeercimenta 6 mati, 45 s210 446, _Tmbora muitas partes destos parégiafostenham sido apagadas polo tempo, podemos confers esta lista de“honeririos"e pagamontos nos parSgrafos 215 a 247, 287,261,271. anew, Py 7 m3 40 5205 Histécia do Diroo Geral e Brot “Se um podieio contruiu uma casa para um ayrilum @ nio exeeutou © trabalho adequada: mente e o muro ameaga cait, egse pedreiro deverd roforgar o muro as suas custas."*7 ‘So um barqueiro calafetou um barco para um avillum @ no exeeutou 0 set: trabalho com cui dado e naquele mesmo ano esse barco ademou ou sofrou avaria, 0 barqueir desmontard esse barco, roforgi-lo-A com seus proprios recursos, & centregara 0 barco reforgado a0 proprietirio do barco."18 Ea CAPITULO III DIREITO HEBRAICO 1 Introdugao Os Hebieus sie um povo de origem semita que vivia na Meso- potémia (entre os rios Tigre e Eufrates no Cresconte Fértil) no final do segundo milénio a.C. Por esta época iniciaram um deslocamento que terminou por volta do século XVIII a.C, na regido da Palestina, ‘A Palestina pode ser dividida em varias regides: uma de planicio costeira ao longo do Mediterranoo, uma de picos elevades no eantro, © outra, 0 curioso vale do Jordao, que fica quase totalmente abaixo do nivel do mar, A terra dos Hebreus tem, portanto, 0 mar Mediterraneo de um lado, o desezto de outro e, 0 mais importante, a qualidade de ter sido 0 local de passagem entro a Africa 0 a Asia, isto 6, 0 Bgito oa Mesopo- ‘tamia, Os Hebreus, como a maioria dos povos da regido, eram agri- cultores ~ pastores. Viviam do pastoreio de ovelhas e, principalmento, cabras, do plantio de uvas, trigo, e outros produtos. Mas havia neste ovo um diferencial que na Antiguidade era tinico: evam Monoteistas (mono = um, théos = deus). Esta caracteristica marca toda a historia esse povo, bem como toda ¢ qualquer produgao cultural que tenham realizado. A Historia destas pessoas pode ser acompanhada pela Biblia, mais especificamente pelo Antigo Testamento, que retine a Tora (ou a Lei), os Profetas e os Escritos. O Novo Testamento inclui a historia (e 05 ensinamentos) de parte dos Hebreus que acreditaram que Jesus é 0 Mesias que 0 Antigo previa. Eles acreditavam em um 56 Deus, que por vontade prépria havia se revelado a um Patriarca, Abraao, 0, a partir deste momento, iniciow um relacionamento entre Ele ¢ os que chamava de “Povo Escolhido”. Este era seu diferencial, os tnicos da face da terra com um Deus, iniciando a historia do monoteismo que hoje é dominante no mundo.43 2 livia tages de Casto. Este relacionamento é de tal modo intrincado que nfo se pode compreender este povo, sem vislumbrar a interferéncia de Deus em ‘suas vidas. Para eles, Deus escolhia os lideres, Deus escolhia o lugar onde ficariam, Deus dava fartura ou nao, Deus, dependendo de seu ‘merecimento, dava a vitéria ou a derrota na guerra, Nao é de estranhar, portanto, que para este pove a lei tenba sido inspirada por Deus ¢ ir contra ela soria 0 equivalente a ir contra Deus, Entio, o leigo e o divino interagam de tal modo que pecade ¢ crime 50 confundem, 0 direito é imutivel, somente Deus pode modificd-lo. Os Tabinos (chefes religiosos) podem até interpreti-lo para adapti-lo A evolugo social, entretanto nunca podem modificé-lo. 2. A Sociedade ¢ a Vida Econémica Os hebreus, a principio, se dividiam em tribos de acorda com os némeros de filhos de Jac6 (12); estas tribos se subdividiam em familias & toda a organizacdo politica e social girava em tomo deste status quo. Das doze tribos, onze cuidavam, basicamente, da agricultura e do pastoreio, a décima segunda no tinha terras, era a tribo dos levitas, que tinham fungOes sacerdotais (ou melhor dizendo, de auxiliares dos, sacerdotes que descendiam de Aardo). Havia também outras duas camadas sociais: a dos escravos e dos estrangeiros. Os primelros podiam sar distintos entre os escravos hebreus (provavelmente tomados como escravas pelo ndo-pagamento de uma divida) e estrangeiros. Ambos tinham tantos direitos que mii- tos autores confessam hesitar em chamé-los de escravos, pois, embora ‘tenham as principais caracteristicas, eram cercacos de muitas con- sideragées, inclusive direitos. “A ambos assistiam certos direitos assegurados, quer pela prépria legislagéo mosaica quer pelo costume. Assim, por exemplo, entre os direitos do escravo estrangeiro salvaguardades pela twadigdo judaica, podemos cnumerar: casar-se com uma escrava, possuir bens, converter-se a0 judaismo, receber liberdade, em determinadas circunstancias."®9 30 GIORDAM, M,C. Histéria da antiguldade orienta, 11, ed, PetsSpo: Vores, 200 9.238 istria do Direito Grate Bast Os estrangeiros, livres néo gozavam do mesmo direito dos he brous. Dois tipos de estrangeiros eram distintos: os que tinham alguma ligagdo com alguma tribo de Israel e, portanto, desfrutavam de alguns direitos, ¢ os que nao tinham quaisquer ligagdes ndo tendo direito algum. Apés os quarenta anos no deserto, depois de se libertarem da escravidao no Egito, ao chegarem a Terra Prometida, os Israelitas pas- saram de somente pastores (como eram antes, pelo seu nomadismo) a agricultores-pastores. Entretanto, se por sécvlos estas atividades agro- pastoris foram 0 corne da economia desta sociedade, a indiistria tami- bém conheceu um certo desenvolvimento, principalmente aquela que utilizava o cobre como matéria-prima. O comércio atingiu seu auge no periodo de Davi e Salomio & sempre fol presente na vida deste povo, visto que a regio que habitam uma verdadeira encruzilhada nas rotas da Mesopotdmmia, Egito, Mar ‘Vermolho ¢ do deserto. 3. A Lei Mosaica Por volta de 1800 a.G. fortes secas obrigaram os Hobreus a sairem da Palestina em diregio a0 Egito. Nesta época um povo, chamado Hicsos, tentava conquistar as planicies do Nilo; ndo se sabe se os He- brous enfrentaram ou se aliaram aos hicsos; sabemos, entretanto, qe em 1580 a.C., depois da expulsao destes, os Hebreus passaram a ser persequidos no Egito, pasando a pagar pesados impostes e cheganclo até mesmo a escravidao.5t ‘Moisés lideraria este povo, aproximadamente em 1250.C., de vol ta & Palestina, em um episédio chamado éxoco, ou fuga. Conta a Biblia que Moisés teria sido criado por uma princesa egipcia que o hat encontrado em uma cesta boiando no rio que, apés chegar & idade adulta, teria tomado consciéncia de suas raizes hebraicas e, depois cle um exilio, teria voltado ao Egito para liderar a libertagio dos Hebreus. Amtes de chegarom a Palestina, segundo a Biblia, os Hebreus teriam passado quarenta anos no deserto e ai teriam forjado, sob a lideranga de Moisés, toda a base de sua civilizagao, inclusive suas leis, ‘HA Biblia conta a hiss da a para 0 Egito a pati da histrin de José que teria sklo vendido pelos seus izmies como escrava indo parae n9 Egito w chopandlo alto fun landsio do foro ft Gen. Capitlos do 950) 2 FRivia tages de Castro Acreditam alguns que a Tora (que contém a lei dos Hebreus) foi criada pelo préprio Moisés e, embora este dado esteja um tanto desa- cxeditado hoje em dia, continuamos denominando a legislagio de ‘Mosaica", mesmo porque, provavelmente, foi apés a saida do Egito que este povo comegou a estruturar as bases de seu dircito. Avbase moral da Logislacao Mosaica pode ser encontrada nos Dez Mandamentos, que teriam sido escrites “pessoalmente" por Deus no Monte Sinai, como forma de Alianga entre Ele e o Povo Escolhido, ‘A Tord, também chamada Pentateuco, ¢ formada pelos cinco primeiros livros da Biblia: o Génesis, o éxodo, o Levitico, o Nimeros wo Deuteronémio, Em toda a ‘ford encontramos leis; entretanto, ha no Ultimo livo uma reuniéo maior de leis, repetindo inclusive alguns preceitos vistos nos outros livros, mesmo porque é esta a intencao do Deuteronémio, que significa “segunda lei” “Ia simplicidade} se reflete poderosamente na tei ‘mosaica, cuja virtude principal reside no fato de ter transformado num verdadoiro cédigo as normas nio escritas da primitiva sociedade de ndmades."52 ‘A maioria dos autores afirma nao ser a lei de Moisés uma legis- lagio que distinga entre dixeito sacro e profano, apontado-a como um direito religioso, Tsto é fato; entretanto, apenas definir este direito des- ta forma simplifica uma visdo que pode ser ampliada e pode auxiliar-nos na compreensio desta sociedlacle e sua relagao com a lei e a religido. Se analisarmos 0 povo hebrou, poderemos constatar, como ja afi mado anteriormente, que é um povo que traz em tudo 0 fator religioso e isto se da, principalmente, porque sua teligigo, e a esséncia desta, 0 monoteismo, foi durante muitos séculos exclusividade do povo israe- lita, Desta forma, ao se tentar definir os hebreus, passaremos, obrigato- riamente e primeiramente, pola quostio religiosa, ‘Assim a religiao nao é somente uma das caracteristicas dos israe- litas, mas pode ser indicada como "a" caracteristica, aquela que da ali- corce @ é 0 ponto de convergéncia de toda uma sociedade, Tanto foi as- sim que, praticamente, todas as vezes que este povo descuidou-se da religido, problemas sociais e politicos aconteceram. Eles, obviamente, explicavam tais “coineidéncias” como uma vinganga ou desaprovagao S2_RAO.Op-eit.p. 173 » Hlstria do Dueko Gaal e Beast da divindade; entretanto, qualquer que fosse a caracteristica primor- Gial de um povo, se fosse desdenhada, desunitia a sociedade trans- formando-a em alve fécil para problemas internos ou extemnos, 4. A Formacao do Direito Hebraico ~ da Legislagao Mosaica aos dias de hoje A tradigdo indica Moisés como autor do Pontateuco, portanto autor do Deutoronémio, das chamaclas Leis Mosaicas. Esta obra devera ter entdo a idado de seu criador e deve ser datada no século Xill a.C. Mas 0s anos dle $86 a.C. e os seguintes foram primordiais também para 8 formagao de uma legislagdo “extra mosaica” Em $86 .C., apés um cerco que durou mais de um ano, o reida Ba- bilénia, Nabucodonosor, conquistou o roino dos hebreus ¢ estes foram levados - em nimero pequeno, mas significative, visto que repre- ‘sentavam a elite social e religiosa da nagao — para a Babilé; escravos. Este cativeiro foi o ponto de partida para a formagao de um direito hobraico novo, oral, visto que ao entrarem em contato com diversas culturas diferentes e fortes (notadamente persas, gregos € romanos) os hebreus senticam @ necessidade de alirmar sua cultura, a mesmo tempo que procuraram adaptécla dentro dos parémetios das influén- Clas que estavam recebondo. Este proceso, iniciado na Babilénia, somonte iria terminar 900 anos mais tarde. “A lei oral (Torah Cheb’al Pé) atuava ao lado da esctita, isto é, mosaica (Tora Chebilthtav). Esta Continuou a ser considerada, séculos afora, a lei Suprema, infalivel, sacrossanta, Prevalecia sem- re (mesmo depois da codificagao da lei oral) em qualquer conflito que se verificasse entre as das, A lei oral, formada polo Sofrim (escritores). An- hei Haknesset Hagdolah (os homens da Grande Assembiéia) e Tanaim (sabios), teve sempre um cardter subsidtério,"53 53 WAO,W.Op cit, p. 174 CHORE MRR FERRARA RAR 888888 OW OOOH OOOO OOOOH OOUEUHHEKOHSHHHHOOE ‘Yivia Lagos do Castro A primeira codificagio do direito oral foi chamada de Michné (epetigéo) ¢ foi feita pelo tiltimo dos Tanaim em 192 d.C. Esta codifica- ‘¢d0 se divide em seis partes, nas quais a primeira, a terceira 6 a quarta constituem, segundo poderiamos comparar hoje, © corpo de Direito Civil. A primeira trata de leis rurais 6 propriedads imobiliatia, a terceira ccupa-se do diteito matrimonial ¢ do civércio, a quarta trata de obrigagdes civis, usura, danos A propriedade, sucesso, organizagso dos tribunais, proceso ete. Para guardar a fidelidade a Legislacdo Mosaica no uso da codifica- Gio nova, os séculos seguintes produziram discussées, interpretacées @ aprofundamentos do texto da Michna que deram origem is Guemaras que juntamente com a Michné e a prépria Toré contituem o Talmud (que significa estudo), que 6 0 verdadeiro corpo da Logislagio Hebraica Entretanto, com a elaboragio do Talmud, niio se encerrow a histéria do direito judaico; ela continuou durante todos os séeulos subse- qiientes, apesar de os judeus estarem dispersos pela mundo. Hoje, apés oestabelecimento do Estado de Israel, o Perlamento Israelita, chamado Knesset, 6 0 poder legisiative na concepeao moderna do termo. 5, Algumas Leis do Deuteronémio a) Justiga A Legislagao Hebraica ¢ bastante rigorosa na questio da justica, prevendo, inclusive, a obrigatoriedade da imparcialidade no julga- mento: “Ao mesmo tempo, ordenei a vossos juizes: ‘Ouvi- tois vossos itmios para fazordes justiga entre umn hhomem e seu imo, ou o estrangeizo que mora com elo. Nao fagais acepeao de pessoa no julga- mento: ouwvireis de igual modo 0 pequeno e 0 grande (..)."5 Para a operacionalizacdo da justica fica estabelecide que cada cidade tord, obrigatoriamente, que contar com jufzes e que estes nao ‘SA Beterondnio 1,107, Hilla de Jerusalém, Si Paulo: Paina, 1985, (le nosso) 2 poderio corromper-se. A Legislagio Mosaica explica esta aversio ao ‘suborno mostrando a légica incompatibilidade entre o que ¢ justo © a cormupgi. “Estabolecerds juizes e escribas em cada uma das cidades que fahweh teu Deus vai dar para as tuas tribos, Eles julgardo 0 povo com sentengas justas. Nao perverteris 0 direito, ndo fare acepgio de pessoas no julgamento e nem aceita- és suborno, pois o suborno cega os olhos dos sibios e falseia a causa dos justes."55 b) Processo A questo da justica, ou melhor, de nao cometer injusticas, é muito cara aos Hebreus, mesmo porque ter 0 “sangue de um justo nas maos™ 6 um pecado gravissimo para eles. Neste sentido, este povo se difere um pouco de outros, jé que, praticamente, néo admite julgamento sem investigagao ou julgamonto por forgas naturais ou deuses. No exemplo a seguir parte-se da possibilidade do cometimento de lum crime considerado extremamente grave, 0 de uma cidade adorar a outros deuses e é prevista uma punigéo pesada, mas nao sem antes ficar provado através de acurada investigacéo. “Caso ougas dizer que, numa das cidades que Jaweh teu Deus te dari para ai morar, homens, vagabundos, procedentes do teu meio, seduziran 05 habitantes de tua cidade, dizendo: ‘Vamos servir a outros deuses', que ndo conhiecestes, cle- verdis investigar, fazendo uma pesquisa ¢ inter: rogando euidadosamente, Casa seja verdude, se 0 fato for constatado, se esta abominagao foi pra. ‘ticada em teu meio, deverds entao passat a fio de espada os habitantes daquela cidade." 2) Pena de Tali & a Biblia que primoiro descreve o Prin {embora 0 uso fosse mais antigo): da Pona de Talido ‘BH Dew ig, wo. 85 Deut 1a 418 fe nosso} Contre tambn Devt. 17,25 livia tages de Casto ue teu olho no tenha piedade. Vida por vida, olho por olho, dente por dente, mao por mao, pé por pé."s7 Entretanto, embora este principio fosse utilizado entre os Ho- breus, 0 era de maneira mais amona que entre outros povos porque outros principios limitavam sua aplicagao, como veremos a seguir. 4) Individualidade das Penas “Os pale néio serio mortos no lugar dos filhos, nem os filhos em lugar dos pais. Cada um sera fexecutado por seu proprio crime.”6° Este principio que individualiza as penas minimiza a agéo do Principio da Pena de Talido entre os Hebreus, fazendo com que aplica~ ges da Pena de Tali como no caso visto no capitulo anterior em ‘Hammurabi - que o filho do construtor morre por causa da casa que 0 ‘pai fez, e que ao cair matou o fill do dono da casa ~ nao seja possivel. Depois dos Hebreus (e um pouco os romanos), praticamente sé no século XVIII d.C. vamos encontrar de novo a aplicagio de tao valoroso @ légico principio. e) Lapidagao Lapidagdo é o nome que se di a pena mais comum do Antigo ‘Testamento. E a morte por apedrejamento, Para os israelitas morreriam desta forma os idélatras (Deut. 17, 5-7), 08 feiticeiros (Lev. 20, 27), os fihos rebeldes (Deut. 21, 18-21) ¢ as adiilteras. 1) Cidades de Reftigio ‘A preocupagio desta legislacio com a justiga chega ae ponto de prever @ obrigar 0 estabelecimento de cidades de rofiigio (ou asilo), ‘onde pessoas com problemas poderiam se refugiar para que fosse feita fa justica com calma e nao no calor de fortes emogoes. F Dow toa 8 Deut 25,16. o Mitris do Diceeo Geral Beast, “Quando Tahweh tou Deus houver eliminado as ‘hagées (..), ¢ a8 conquistares o estiveres moran- do em suas cidades ¢ casas, sopararis trés cida- dos no meio da terra cuja posse Iahweh teu Deus te dora, Estabelecerds o caminho, mediras as distincias e dividiris em tés partes o tertitério (isto para que nola se retugie o homicida, A utilidade destas cidades pode ser melhor compreendida em conjunto com o préximo ponto, 9) Homicidio Involuntario e Homicidio Eta lopstago prov, como de resto todas as outa, 0 hom @. na Antiguidade, o Peincpio da Pona de Talizo era wtileede cons basena penalizagdodesto dato, Bntetant, os Hebweus do ernatom, a penalizagio de quo cometns homisilo "sem querer Nae ae done wellzarotermo “culposo" para um povo quo nfo coneebia nughigdecin, inperca ou impradéncia como causes de omisiioe ve daney “Este é 0 caso do homicida que poder se refugiar 14 para se manter vivo: aquele que matar seu pré- ximo involuntariamente, sem té-lo odiado antes (por exomplo: alguém vai com seu préximo cortar Jenha; impelindo com forga omachado para cortar @ drvare, 0 ferro escapa do cabo, atinge 0 compa- nheitoe o mata): ele poder entio se refugiar nt ‘ma daquelas cidades, ficando com a vida salva; ara cue 0 vingador do sangue, enfurecido, nao persiga 6 homicida e o alcance, porque o caminho 6 longo ~ tirando-ne a vida’ sem motivo sufi. lente, pois antes nao era inimigo do outro. "60 “Contudo, se alguém 6 inimigo de seu préxime & Uke arma uma cilada, levantando-se e forindo-o mortalmente, ¢ a seguir se refugia mma daque- las cidades, os ancidos da sua cidade enviario 5 Daw 19,19, 50 Deut. 19,46 35 RHAKRSBKOD EAHA KDR DOK ARKH ADHERE KOKA © WOW OHH OOO MEO OTHE EHH KHHOHSHHHHOHE livia Lages do Casto pessoas para tird-lo e entregit-lo ao vingador de ‘sangue, para que soja morto."61 h) Testemunhas A prova testemunhal era primordial na Antiguidade o os Hebreus tém um preceite legal que até hoje pode ser visto, inclusive em nossa legistagao: “Uma tinica tastemunha nao & suficionte contra alguém, em qualquer caso de iniquidade ou de pecado que haja cometido. A causa seri esta- belecida pelo depoimento pessoal de duas ou trés testemunhas."62 Com tamanha importancia dada a prova testemunhal, as penas para falso testemunho cram pesadas geralmente, sendo que, na Legis lagio Mosaica, a pena para falso testemunho 6 equivalente & pena que © acusado teria se fosse condenado (Principio da Pena de Taliao) “Quando uma falsa testemunha se levantar con- tra alguém (...) as duas partes em litigio se apre- f sentardo diante de Iahweh, diante dos sacerdo- tes @ dos juizes que estiverem em fungio na- queles dias. Os juizes investigario cuidado- samente, Se a testemunha for uma testemunha alsa, @ Uver caluntade sou irae, entao vos a tratareis conforme ela prépria maquinaya tratar © ‘sou préximo,"03 i) Matrimonio 1 interessante notar que nao ha em hebraico uma palavra que seja sinOnimo de matriméni ‘Testamento falta 0 conceito que hoje temos. Este nao era de dircito religioso ou civil, mas era um assunto puramente particular entre duas familias.6t Br Dowie, 1.12. 52 Devt. 19,16, 83 Deut. 19, 16-19. ote-se que a questo da investigagio érloreada [4 RORN, A Van Don, Dicionérioenclclopédica da Biba. Ptzonalie: Vores, 1072, p. 968 Mitéia co Dieito Gora raid 5) Adultério Embora nesta sociedade como na de Hammurabi o peso maior do crime de adultério esteja sobre a mulher casada, hi um certo puritanis- mo neste povo que leva 0 peso do crime também paza © homiem, “Se umhomem for pago em flagrante deitado com, uma nulher casada, ambos serdo mortos, © ho- ‘mem que se deitou com a mulher e a muilher."®5 ¥) Divércio Todos os poves da Antiguidade prevéem divércio, Este sé co- ‘megou a ser proibido a partir do cristianismo. Na Legislagio Mosaica, entretanto, somente os homers podem divorciar-se, as mulheres nao cabe a iniciativa, Mesmo assim teria que haver algo "vergonhoso” (0 que pode ser interpretado do varias manairas) na esposa para que 0 esposo pudesse repudié-ta, “Quando um homem tiver tomado uma mulher & consumado © matriménio, mas este logo depois no encontra mais graca a seus olhos, porque vit. nela algo de inconveniente, ele lhe escroverd entéo uma ata de divércio @ a entregaré, dei- xando-a sair de sua casa em liberdiade,"6S }) Couvubsinato No deuterondmio 0 concubinato 6 considerado como algo normal (somente o Levitico ~ 18, 1853 ~ ordenava que as duas — esposa e coli cubina ~ ndo fossem irmis) “Se alguém tiver duas mulheres (..), ¢ ambas Ihe tiverem dado filhos (,,)."67 Dow 2,22 6 Deut 26,1 {67 Dowt 22, 1, ‘tdviaLages de Casto ‘istSta lo Dito Goro Basi 1m) Estupro: virilidade © 0 dir tence,"69 de primogenitura Ihe per. (© estupro sem pena para a vitima é previsto nesta legislagao, om- bora somente em um caso especifico: o de a mulher ter sido violentada ‘em um lugar onde poderia ter gritado sem que ninguém a ouvisse. ©) Defloragao caso aplica-se & mulher virgem nio comprometida, “Se houver uma jovem virgem prometida a um homem, e um homem a encontra na cidade @ se deita con cla, trarei ambos 4 porta ca cidade © 0s ‘apedrejareis até que motram: a jovem por nao ter gritado por socorro na cidade ¢ 0 homem por ter abusado da mulher de seu proximo. (..) Contudo, 5¢ 0 homem encontrou a jovem prometida no ‘campo, violentou-a ¢ deitow-se com ela, morrera somente @ homem que se doitou com ela; nada farés A jovem, porque ela nao tem pecado que ‘merega a morte. (..) Ele a encontrou no campo, & fa jovem prometida pode ter gritado, sem que houvesse quem a salvasse."6 P) Escravos “Se um homem encontra uma jovem virgpm que no esti prometida, e a agarra e se deita com ela © € pego em flagrante, 0 homem que se deitou com ela dari ao pai da jovem cingiienta ciclos de prata (570 gr. de prata aproximadamentel, @ ala ficard sondo sua mulher, uma vez que abusou dela. Ele nao podera mandé-la ombora durante toda a sua vida." Em Israel, os prisioneiros de querra néo israelitas eram vendidos como escravos (Deut. 21, 10) ou podiam ser comprados em Tiro, Gaza n) Heranga e Primogenitura (0u Ago; 0 trafico de escravos estava, principalmente, nas maos dos Fenicios. Era proibida a compra de escravos israclitas por israelitas, ‘embora um israelita pudesse vender a si mesmo (provavelmente para pagainento de divida) como escravo, A lel indicava que esta escraviciao nao poderia ser eterna: © primogénito era beneficindo em dotrimento dos outros filhos (homens, j que mulheres tinham direito apenas ao doto). Este bene- ficio era garantide mesmo que o primogénito tivesse como mae uma das mulheres do pai que este “ndo gostasse”. 68 Deut. 22, 23-27. Nao era provist Pectatnene eatupiodn nucle uote iad “Se alguém tiver duas mulheres, amando wma e nao gostando da outra, ¢ ambas Ihe tiverem dado filhos, se o primogénito for da mulher da qual ele nao gosta, este homem, quando for repartir a hheranga entre seus filhos, ndo poderd tratar 0 filho da mulher que ele ama como se fosse mais, velho, om dotrimento do filho da mulher que ete ndo gosta, mas que é 0 verdadeiro primogénito, Reconhecera como primogénito o filho da ruler dda qual ele no gosta, dando-Ihe porgao dupla de tudo quante possuir, pois ole é a primicia da sua to nent tipo de coago fisica ou moral para justia © “Quando um dos tous irmios, hebreu ou hebréia, for vendido a ti, ele te servird por seis anos. No sétimo ano tu 0 deixaris ir em liberdade, nio 0 despegas de mios vazias: carrega-lne 0 ombro com presentes do produto do tex rebanho, da tua ira @ do teu lagar."71 Esta indicagdo de que o escravo deveria receber algo ao deixar a casa do senhor pode parecer, para alguns, como uma forma de pa- gamento, pelos seis anos de servigos prestados, mas nao 0 é. Escravo 2.184, 70 Deut. 22, 26.20 Th out. 15, 12:16 2 MDD ERRK OE AOeKRMEE OER ED Oe eee eae AARP RRR livia Lagos de Casto 1 Este estabelecimento de uma ajuda para o recém ex-escravo parece ser uma forma de possibilitar que a lei seja de fato cumprida, visto que, sem isso, 0 escravo, sem ter para onde ir e como sobreviver, deixaria se escravizar pelo resto da vida. Alias, esta é uma opgao do “Mas se ete fescravo} diz: no quero doixar-te, 22 ele te ama e & tua casa, e est bem contigo, tomarés entdo uma sovela e the furaris a orelha contra a porta, ¢ ele ficard sendo tou servo para sempre, O mesmo faris com tua serva,"72 4) Caridade: Entre os hebreus a caridade prevista em lei, mesmo porque trata-se de um povo que se pauta e tem sua identificagao enquanto sociedade na questio religiosa, Juando houver um pobre em teu meio, que seja ‘um 36 dos teus irmaos numa sé de tas cidades (..) ndo endurecerds teu coragéo, nem fecharis a milo para com este teu irmao pobse; pelo contré- tio: abre-Ihe a mao, emprestando o que lhe falta, na medida da sua necessidade,"73 1) Governo Geralmente, quando se trata de uma teligido revelada, ou seja, quando a prépria divindade se mostra para os fidis por livre vontade, a interferéncia da divindade no dia-a-dia de povo é muito grande. Neste caso, o dos Hebreus, quem instiuul 0 governo é Deus: por- tanto, 0 rei néo pode sentir-se muito acima dos demais mortais. “Quando tiveres entraclo na terra que lahweh teu. Deus te daré, tomado posse dela e nela habitares, e disseres: ‘Queto estahelacer sobre mim um roi, como todas as nagdes que me rodeiam’, deverds 7 Deut. 18, 16-17, 73 Deut. 16.7.8 ” istria do Diteto Geral e Brasil estabelecer sobre ti um rei que tenha sido es- colhide por Tahweh teu Deus; 6 um dos teus irmaos que estabelecerds como rei sobre ti. Nao poderds nomear um estrangeizo que nao soja teu irmao.""4 De fato, os reis de Israel costumavam, segundo a tradigio biblica, ser escolhidos por Profetas a mando, sequndo a crenca israelita, de Deus. Assim foi com o primoiro rei, Saul, consagrado pelo profeta Samuel, segundo Ihe ordenara Deus, assim foi com Davi que, embora nem parente de Saul fosse, foi escolhido; mesmo no easo de Salomio, ste nao era o primogénito de Davi e foi rei sucedendo 0 pai.” 5) Fraude Comercial e Juros A Legislagao hobraica proibe a utilizagao de pesos e medidas diversos, bem como o empréstimo a juros entre israelitas, “Nao teris na bolsa dois tipos de peso: um pesado ¢ outro leve, Nao terds em tua casa dois tipos de medida: uma grande e outra pequena."!6 “Nao emprestes a teu irmao com juros, quer se trate de empréstimo de dinheiro, quer de viveres ou de qualquer outra coisa sobie a qual & co: tume exigit um juro. Poderds fazer um emprésti- ‘m1 com juros ao estrangeiro; contude, empres tards sem juros ao tou irmio (..)."7? 1) Fauna e Flora HA uma preocupago que poderiamos chamar de um tanto pre servacionista em algumas leis do deuterondmio: “Quando tiveres que sitiar uma cidade durante muito tempo antes de atacé-la ¢ tomi-ta, no de- TA Deut 97, was, 35 CCTot Samual et ett Ros, 7 Deut 28, 13:4 7H Dow 29, 20-2 livia Lages de Castro ves abater suas drvores a golpes de machado; ali ‘mentar-te-ds dela, sem corti-las (..)."79 ‘Se pelo caminho encontras um ninho de pas- saros ~ numa drvore ou no chao - com filhotes ou ovos ea mie sobre os filhotes ou sobre os ovos, nio tomaris a mie que esta sobre os filhotes: doves primeiro doixar a mao partir om liberdade, dopois pegaris os filhotes, para que tudo corra bem a ti e prolongues os teus dias."79 CAPITULO IV O CODIGO DE ANU 1. Introdugao Entender 0 Cédigo de Manu somente lendo-o é uma tarefa impos- sivel, mesmo para 0 mais sdbio dos ocicontais. Este Cédigo, mais niti- damente ¢ mais profundamente que qualquer outro da Antiguidade, arte inexordvel da constituigao historica, social e, principalmente, religiosa deste povo, Portanto, entender 0 Cédigo de Manu é, antes de mais nada, bus- car a compreensio desta sociedade ~ e sua estrutura -e de sua re- ligido. 2. Contexto Histérico As condigdes geogrdficas da india ~ um relativo isolamente - ‘marcaram muito sua formagao na Antiguidade. Contrariamente ao Egi- toe a Mesopotamia, a india é caracterizada pela sua diversidade e pela complexidade das suas condicéos naturais.#9 A india fica na Asia Meridional e tem duas zonas principais: o Sul eo Norte, O Sul ocupa e Peninsula do Decao; a segunda zona encontra- 50 no continente. Esta regiao esta isolada, por um lado, pelo Himalaia (a mais alta cadeia de montanhas do mundo) e, por outro, pelos mares, dificultando ‘muito a comunicagdo com outros povos. Por volta de 2.600 a.C., os dravidianos ja dominavam técnicas de cultivo na Peninsula Indiana, inclusive a do arroz que posteriormente se difundiu por toda a Asia. No segundo milénio antes de Cristo, vindos do interior do conti- nente, os arianos invadiram o norte @ tomaram a peninsula. Eles jd {80 DIAKOW.V. KOVALEV 5, (ir) Historia da Antighidade~ A sociedad pusitiva do Ose. te. Lisboa: Estampa. 1976, p. 317s a RRCHR EOE RHAAME HEAR ARR ADAR RA RARER OW OOOOH OOOO OOOH OOOKEOKOOHHHOHHCHOHE dominavam 0 ferro e eram bons guerreiros, principalmente excelontos cavaleiros. Da soma da civilizagio dravidiana e dos invasotes arianos nascou a civilizagao hindu, que possuiu caracteristicas que se perpetuam até hoje na sociedade indiana, 3. Sociedade A sociedade Hindu & dividida em Castas e, mesmo hoje ~ depois da influéncia de outros povos, outras religiées - nas regides once 0 hinduismo permanece a estrutura de castas persiste inalterada. ' O sistema de castas nao admite mudangas (20 menos em vida); © nascimento determina a casta que o individuo pertencera por toda a sua existéncia, Portanto, nascer em uma casta significa crescer nela, casarse com alguém desta mosma casta, ter filhos somente desta ensta e morrer pertencendo a ela. A mistura de castas ¢ vista como algo hediondo, nao passivel sequer de qualquer consideragao, mesmo porate, pata os Hindus, esta divisao fol feita na eriagao do mundo, quando dos membros superiores do deus Prahma sairam as castas superiores, e dos membros inferiores a castas inferiores.81 ‘As castas eram quatro e quem nao pertencia a nenhuma delas exa considerado “resto”: Y Brémanes: a casta superior, considerada a mais pura fisica ¢, principalmente, espiritualmente. Tinham fungoos como administradores, médicos, lideres espirituais etc, Aos Brimanes, ora dovida obediéncia, indiferentemente da condigéo de tal Bramane. “Art. 793. Insteuldo ou ignorante, um Brdmane & uma divindade poderosa, do mesmo modo que o fogo consagrado ou nao consagrado ¢ uma poderosa divindade." {1 Parailustar esta aftrmagio, podemos lr no Céigo do Manu, Art 98%: °0 tha qu wm Brdmane engendra por huiria so unindo a uma mulher de classe sei, ainda que ‘Gorando da vida, & como um eadsver: os peg ¢chamado talaver vio, “Histdta do iro Geral e Brasit Keatryas: eram a casta dos quorreiro Varsyas: a casta dos comerciantes, interessante ressaltar que esta divisio por castas nio depondia de riqueza. Os brimanes ‘ram muito ricos, mas um varsya também poderla sé-10, mas, mesmo assim, era considerada inferior aos ksatryas, que por sua voz eram inforioros aos brdmanos. | \ Sudras: a casta inferior 82 Eram a mio-de-obra da india (pedrei- 105, agricultores, empregados em geral). Estavam em condigao servil, ou seja, embora nao fossem escravos, estavam obrigados a trabalhar para as outras castas, principalmente a dos bré- manes. ae “Art, 410, Mas, que ole [o brdmano] obrigue um Suda, comprado ou nao, a cumprit as fungoes servis; porque ele foi criade para 0 servico de Bramane pelo ser existente por si mesmo." “ant. 411. Um Sudra, ainda que liberto por seu senhor, nio ¢ livie do estado dle servidio; porque este estado, Ihe senda natural. quem poderia dele isentd-to?” 0 “resto” era chamado Chandalas ou patias, que nao eram consi. derados casta; na pratica, nao eram considerados nem gente. Eram Clasificados como os mais impuros, cabendo a eles as tarefas também consideradas demasiado impuras para que um membro de uma casta as exeoutasse, Eles cram 03 sapateiros, 02 limpe-fossas, os curtidores etc. Ou seja, exerciam fungdes que lidavam com restos humanos ou de animais, . Os reis, em geral, saiam da casta dos Ksatryas, isto porque eram, antes de mais nada, chefes guerreiros. Entretanto, os bramanes podiam mais que o rei, como provam estes artigos do cédigo: rt. 36, Quando um homem vem dizer com ver- dado: ‘esse tesouro me pertence’ e quando ele prova 0 que alega, © tesouro tendo sido achado, Priva tages de Castro quer por esse homem quer por outro, o rei deve ter dele a sexta ou a duodécima parte, segunda a qualidade desse homem.” “Art. 37. Quando o Brimane instruide vem a des- eobrir um tesouro outrora enterrado, ele pode tomé-lo integralmente, porque ele é senhor de tudo que existe.” “Art. 38, Mas, quando 0 rei acha um tesouro anti: ‘gamente depositade na verra e que nao tem dono, que ele dé a metade dele aos Bramanes ¢ deixe entrar a outra metade em seu tesouro.” 4. Religiio Para os Hindus (antes das intluéncias budistas e, posterioment cristas) a religido era o Vedismo, que vor do Voda, que significa “a soma de todo conhecimento”. & a religido que antecede o Bramanismo que dominon a {ndia posteriormente © que sobrovive ato hoje juntamente com as religides “importadas” © Vedismo apéia-se na crenga na reencamagio e, através desta, os Hindus puderam basear e firmar sua estnitura social © sua legis. lego. Para elos 0 reencarnar em uma situagéo bea ou ruim na préxima vida dependia intimamente de ser bom ou néo na vida presente. Esta idéia permeia tudo dos hindus da india antiga - da socicdade & religido, da economia & divisio por castas Como afirmado anteriormente, esta divisio ndo possibilitava mistura nem a mudanga de uma casta para outa, Este deslocamonto fentie castas 26 era possivel ao individio com @ sua morte © con sequnte reencamnagao, Se uma pessoa fosse boa durante sua vida, poderia vir em uma casta melhor em sa proxima encacnagao: se fosse raim, vitia em wna casta inferior, sta certeza dava a forma da sociedade um molde que nic po- Goria cor facilmonto rompido, visto ave, se wim individ estava om tuma situagao precéria por ser de uma casta inferior, isto se devia exclu sivamente & responsabilidad dele préprio e de sua condita na vida antocior; da mesma maneira no havia como se rebelar contra as atcia do Diseta Gora Brash pessoas das castas superiores, 4 medida que estas fizeram efetiva- mente por merecer em suas vidas passadas. Além da divisao social, 0 préprio Cédigo de Manu apoiava-se nesta creaga, Ser bom ou ruim implicava diretamente respeitar ou nao © Cédigo: “Art. 750, Uma obediéncia coga as ordens dos Brémanos versados no conhecimento dos Livros Santos, donos do casa © afamados pela sua virtude, é 0 principal dever do um Sudra ¢ ele da felicidade depois da morte. “Art. 751. Um Sudra, puro de espirito e de corpo, submetido as vontades das classes superiores, doce em sua linguagem, isento de arroganeiae se ligando principalmente aos Brémanes, obtém um nascimento mais elevado.* 5. Alguns Pontos do Cédigo de Manu a) Testemunhas A questao das testemunhas para este cédigo 6 tratada com o mais intenso cuidado, Uma testemunha nao pode, de maneira alguma, ficar calada, pois iste considerado equivalente a um falso teste. munho. “Art. 13. E preciso ou ndo vir ao Tribunal ou falar segundo a verdade: o homem quo nada diz, ou profere uma mentira, 6 igualmente culpado,’ As testemunhas devem ser admiticlas dentio de parimetros muito ostreitos: “Art 49. Devem-se escolher como testemunhas, Para as causas, em todas as classes, homens Gignos de confianga, conhecendo todos os seus deveres, isentos de cobiga, ¢ rejeitar aquetes cujo carater é 0 oposto a isso. ” anon ea BAG A DOB BEAHE ES RGA MO KOS wR RS OW © OW OO OOOOH OOOO OEE OOHHHOHHOHSHE livia tages de Cast Entretanto, a rejeigao a testemunhas nfo ficava restrita a homens cujo “carter fosse duvidoso". Uma série de tipos de pessoas, de Profissionais, de individuos com certas condigées emocionais, também nao podia testemunhar: “Art. 50. Nao se devem admitir nem aqueles que ‘um interesse pecuniério domina, nem amigos, nem criados, nem inimigos, nem homens cuja ma- {6 seja conhecida, nem doentes, nem homens culpados de um crime." “Art. 61. Nao se pode tomar para testemunha nem © rei, nam um artista de baixa classe, como um cozinheiro, nom um ator, nem um habil teélogo, nem um estudante, nem um ascético afastado de todas as relagées mundanas." t. §2, Nem um homem inteiramente depen- dente, nem um homem mal afamado, nem o que exerce um oficio cruel, nem o que se entrega a ocupagdes proibidas, nem um velho, nom uma crianga, nem um homem #6, nem um hontem ertencente a uma classe misturada, nem aquele culos érgaos estio enfraquecidos.’ “Art, 53. Nom um infeliz desanimado pelo pesar, nem um ébrio, nem um louco, nem um sofendo fome ou sede, nem fatigado em exeessa, nem n que esta apaixonado de amar, ou em eélera, ox uum lado." Algumas pessoas podiam ser tomadas come testemunhas, apesar do nao sorom considoradas ideais e somente paderem ser usadas em casos excepcionais e em condigées predoterminadas. rt. 54, Mulhores devem prestar testemunho para mulheres; Dvija da mesma classe para Dvijas, Sudras honestos para pessoas da classe servil; homens pertencentes fis classes mist radas para 03 que nasceram nessas classes, Mas, se s0 trata do um {ato acontecido nos aposentos interiores ou em uma foresta, on de “0 istéva do Dieto Geral Brasil um assassinato, aquele, quem quer que seje, que vin 0 fato, deve dar testemunho entre as duas ppartos,"22 “Art. 85, Em tais cireunstaneias, na falta de tes temunhas convenientes, pode-se receber 0 depoimento de wna mulher, ou do uma criang: deum ancido, de um discipulo, de um parente, de ‘uma escrava ou de um eriado." No caso de testemunhas mulheres, conforme visto acima, ora somente aceito se o testemunho fosse dado a outra mulher, entretanto mesmo assim elas eram consideradas inconvenientes por sua “inconstancia’, “Art. 62. O testemunho isolado de wm hemem, isento de cobica é admissivel em certos casos; enquanto que o de um grande nimero de mulheres, ainda que honestas, ndo 0 6 (por causa da inconstancia do espirito delas) como nao. 6 0 dos homens que cometeram crimes.” ‘Mesmo ao se colocar na posicdo de testemunha, a separagio ¢ a hierarquizagio das castas estavam presentes: “Art. 97. Que o juiz faga jurar um Bramane por sa veracidade; um Ksatriya, por seus cavalos, sous elefantes ou suas armas; um Vaisya, por sas vacas, sou trigo, seu ouro; win Sudra, por todos os E, dependendo do caso, a testemunha poderia ter que passar por ‘uma prova: “Art, 98, Ou entdo, segunde a gravidade do caso, que ele faga tomar 0 fogo com a mio aquele que ele quer experimentar ou que ele mande mergit Ihé-to na Agua ow the faga tocar separadamente a Dojo: "Moscidod ‘tivia tages do Casto cabega de cada um de seus filhos ¢ de sua mulher." “Art, 99, Aquele a quem a chama nao queima, a quom a Agua nao faz sobrenadar, a0 qual nao sobrevém desgraga prontamente, deve ser con- ‘siderado como veridico em seu juramento.” b) Falso Testemunho 0 falso testemunho 6 tratado por este cédigo de maneita bastante dura e as penas podem ser om vida ou no pés-vida: “Art. 67. Aquele que presta um testemunho falso ‘cai nos Iagos de Verma, sem poder opor ne~ nhuma resisténcia, durante cem transmigragées: dove-se, por conseguinte, dizer 36 a verdade.” “At, 74. Au motadas do tormentos reservaclas a0 assassino de um Brimane, ao homem que mata ‘uma mulher ou uma erianga, ao quo faz mal a0 ‘set amigo @ ao que paga com o mal o bem, sao igualmente destinadas A testemunha que da depoimento falzo." “Att, 78, Nu e calvo, sofrendo fome e sede, priva- do da vida, aquole que tiver prestado falso teste munho, serd reduzide 2 mendigar sua subsis- téncia, com uma xicara quebrada, na casa de seu ¢) Casamento istéta do Dieta Gora rai Vaisya, de um Ksatriya ou de um Brémane, quando se trata de uma falta comatida num momento de alucinagao e ndo de um crime premeditado, como roubo, arrombamento, ¢ preciso dizer uma ‘mentira; e, nesse caso, 6 preferivel verdade.” Nesta sociedade muitas criancas ja nasciam “prometidas em mento” e, especificamente no caso da mulher, esta nao era uma escollia pessoal, até mesmo porque, na maior parte das vezes, elas casavam-se ainda muito criangas, segundo indiea 9 Cédigo de Manu: ) Divorcio “Art, 605. Ea um mancebo distinto, de exterior agradavel ¢ da mesma classe, que um pai deve dar sua filha em casamento, segundo a lei, ‘ombora ela nao tenha chegado ainda a idade de ito anos em que a devam casar.” “Art, 611. Um homem de trinta anos deve desposar uma rapariga de doze que the agrade; ‘um de vinte © quatro, uma de oito; se ele acabou antes seu noivado, para que 0 cumprimento de ‘sous doveres de dono da casa nao seja retardado, que ele s9 case logo.’ Este Cédigo adimitia divércio, embora néo deixe claro que nao deve ser feito sem motives que aquela sociedade considerava importantes, B a separagao somente poderia ocorrer caso a deficiéacia fosse da esposa, ou soja, era o marido quem decidia a separagao. inimigo." “Art, 79, Com a cabeca para baixo sera precipi- | tado nos abismos mais tenebrosos do inferno, © eelerado que, interrogado em um inquérito judicial, der um depoimento falso, | “Art, 494. Durante um ano intelro, que o marido suporta a aversao de sua mulher, mas, depois de ‘um ano, se ela continua a edi-lo, quo ele tome o que ela possui em particular, Ihe dé somente © que subsistir e vestirse, ¢ deixe de habitar com la." Entrctanto, a montira diante do juiz, caso tenia sido engendrada para salvar a vida de quem cometeu um ¢rime em “um momento alucinagdo", é aceita e recomendada: “Art. 496. Mas, aquela que tem aversio por um " jas as vezes que a declaragio da ver- in pose on ‘marido insensato ou culpado de grandes crimes, dade poderia causar a morte de um Sudra,dewm © © © OOO OO COO OO ECH OOO EO HOHOHHHHHHHSE ‘livia Lager do Castro ou eunuco ou impotento, ow atormentado de elefantiase ou de concusedo pulmonar, néio seri abandonada nem ser privada de seu bem, “Art. 497. Uma mulher dada aos licoree inebrian tes, tendo maus costumes, sempre em contra digéo com sou marido, atacada de uma moléstia incurdvel, como a lepra, ou de um génio mau © dissipa seu hem, deve ser substituida por outra mulher: | ‘Defeitos” de fertilidade (incluindo ai o caso de 6 ter filhas mu- Iheres) ¢ de mortalidade infantil também poderiam ocasionar a soparagio:% "Art, 498, Uma mulher estéril deve ser substituida no oitavo ano; aquola cujos filhos tim morrido, no décimo; aquela que s6 poe no mundo filhas, no undécimo; aquela que fala com azedume, ime: diatamente.’ A mulher considerada virtuosa, mesmo que doente, ndo poderia ser rejeitada, somente com seu consentimento: “Art, 499, Mas, aquela que, embora doente, é boa © de costumes virtuosos, ndo pode ser substi tuida por outra, sendo por seu consentimento e nao deve jamais ser tratada com desprezo.” ' e) Mutheres Pelos pontos abordados anteriormente jé foi possivel perceber que a situagao da mulher neste cédigo 6 de subordinago, E, nao obstante varios cédigos antigos e modernos colocarem a mulher nesta mesma posigio, 0 Gédigo de Manu deixa explicito a situaglo juridiea da parte feminina da populagao: {Hic i dia a citncia comprovou que 6 da contibuigtageastica do homem ave se di. Adetinigdo do sexo da cianga, as antigamente, asim como em alguns povos, mesma hoje em dis, esta ora considerada uma responsabilidad da mulher. Esta situagdo imposta juridicamente d hindus carregavam acerca da propensao feminina ao mal: ‘Muti do Diteto Geral e Bras “Art. 419. Dia e noite, as mulheres devem ser mantidas num estado de dependéncia por seus protetores; e mesmo quando elas tém demasiada inclinagdo por prazeres inocentes e legitimos, devem ser submetidas por aqueles de quem dependem & sua autoridade.” “Art, 420, Uma mulher esti sob a guarda de sew ‘Pai, durante a infancia, sob a quarda de seu ma- rido durante a juventude, sob a guarda de sous filhos em sua velhice; ela néo deve jamais se ‘conduzir & sua vontade.” corre da certeza que os “Art. 422, Deve-se sobrotude cuidar ¢ garantis as ‘mulheres das mas inclinagdes, mesmo as mais fracas; se as mulheres nao fossem vigiadas, elas fariam a desgraga de suas familias.” Desta forma a mulher nao tinha direito a proprisdade: “Art. O11. Os presentes que ela receben, depois do seu casamento, da familia de seu marido ou de sua prépria familia, ou os que seu marido thes fo2 por amizade, devem pertencer depois de sua mor- te a seus filios, mesmo em vida de seu esposo.” Mesmo as fungdes didrias da mulher estavam explicitadas no cédigo. Contraditoriamente entre as fungbes de mae, dona-de-casa etc., estava a obrigagao de cuidar da renda da familia "Art. 428, Que o marido designe para fungi a sua mulher a receita das rendas ¢ despesa, a puri- lucagao dos objetos e do corpo, o eumprimento de. seu dever, a preparacao do alimento e a con. servagdo dos utensilios do lar.” “Att, 444, Dar A luz fillios, erié-los quando eles tém vindo ao mundo, ocupar-se todos os dias dos ‘via Uages de Casto homem a condigao de pai e, assim, sanava sua antepassados. vida espiritual com os "Ant. 623. No momento de nascer @ mais velho, ‘antes mesmo que a crianga tenha recebido os sacramentos, um homem se toma pai @ paga sua divida para com seus antepassados; o filho mais velho deve ter tudo.” Este beneficio ao primogénito era somente para as trés primeiras castas, visto que os Sudras tinham que repartir a heranga de maneira igual, “Art. 873. £ orcenado a um Sudra desposar uma mulher de sua classe e nao outra; todos os fithos, ‘que nazcom dela devem ter partos iguais, mesmo quando haja uma centena de filhos.” © Cédigo indica também como devem ficar os casos de heranga nos quais nao haja herdeiros descendentes. “Att, 693. Se um filho morre sem filhos @ sem mur her, o pai ou a mae deve herdar de sua fortuna; a mie sendo morta, que a mae do pai ou a avé patemna tomem og bens na falta de irmios e de sobrintios." i) Adogdo e Outros Meios Legais de Continuagao da Linhagem Como se pode atestar pelo indicado no ponto anterior, ter filhos, ter herdeiros do sexo masculine era de suma importincia nesta sociedade e diante dos parimetros religiosos que este povo seguia. Desta forma, quando nao era possivel conceber filhos homens, 0 Cédigo permitia algumas maneiras de consegui-o. ‘Uma dolas era o acordo com uma filha, que propunha que o primeito filho dela seria considerado filho de seu pai ‘art, 843, Aquele que nao tem filo macho pode encarregar sua filha de maneira seguinte de Ihe riar um filho dizendo: que o filho macho que ela so isccia do Dieato Goralo Brosit, user no mundo seja meu e cumpra em minha hhonra a ceriménia finebre.” A impossibilidade de ter filhos também poderia ser remediada de uma forma bastante interessante. Com a anuéncia do marido ¢ algu- mas condigdes especiais (inclusive o uso de manteiga liquida), 0 cunhado (ou outro parente do marido) poderia tomar as vezes de roprodutor. “Att. 478, O irmao mais velho, que conhece car- nalmente a mulher do cou imo mogo ¢ o irmao ‘mogo ade seu mais velho irmio, so degradados, ‘ainda que tenha sido a isso convidados pelo marido ou por parentes, a menos que 0 ca: samento soja estéril.” “Art. 476. Quando nao se tem filhos, a progenitura que se desoja pode sor obtida pela uniao da esposa, convenientemente autorizada, com um irmio ou com um outro patente.” “Art. 477. Regado de manteiga liquida e guar- dando siléncio, que o parente enearregado dese oficio, se aproximando durante a noite de uma viva ou de uma mulher som filhos, engondre um 86 filho, mas nunea wm segundo.” “Art. 479. © objeto dessa comissio, uma vez obtida segundo a lei, que as duas pessoas, 0 imo e a cunhada, se comportem, uma para a outra, como pai e nora. “Art. 480. Mas, um irméo, quer o mais velho, quer © mais mogo, que encarregado de cumprie esse dever nao observa a regra preserita, e 56 pensa fem satisfazer seus desejos, sera degradado nos dois casos, se ¢ 0 mais velho, como tendo maculado6 leite de sua nora; se 60 novo, ode seu pat espiritual.” ‘Mas a adogao simples também era admitida © © OO Ow OO OOOO OHO OOO EOOOHHHHHHHHHEE oy i) Juros ‘livia Lages do Casto “Art. 685, Quando um homem toma para filo um rapaz da mesma classe que ele, que conhece a vantagem da observarao das coriménias fine. bres e 0 mal resultante de sua omiseao, e dotado de todas as qualidades estimadas em um filho, este filho é chamado filho activo." 0 Cédigo de Manu logisla sobre juros inclusive impondo diferon- {gas entre a possibilidade de cobranga para as diferentes castas. "Art. 140. Que ele recoba dois por conte de iuro, or més (porém nunca mais) de um Bedmane, trés, de um Ksatriya, quatro de um Vaisya e cinco de ‘um Sudlra, segundo a ordem direta das classes.” Impée também limites nos juros que podem ser cobrados depen- dendo da circunstncia, k) Contratos “Art, 149, 0 jura de uma soma emprestada, rece ida de uma s6 vez, endo por més ou por dia, ne dove ultrapassar o duplo da divida, isto é, nie ove subir além do capital que se reembulst 10 mesmo tempo; ¢ para gros, fruta, la ou crina, animais de carga, emprostados para sere pagos em objetos do mesmo valor, 0 jure deve ser n0 maximo bastante elevado para quintuplicar a divide.” Os contratos neste cédigo sao vedados a pessoas que consideram sem a capacidade para tal. “Art. 161. Todo contrato feito por uma pessoa {ria ou louca ou doomte, on intelramente depen- dente, por um menor, por um volho ot por uma pessoa que ndo tem autorizacdo, é de nenhum efolto.” Mista eDieeta Goro rast 1) Limites de Propriedade Em uma sociedade tao numerosa em termos populacionais, a questo de terras era sempre uma preocupagio. Entao, este conjuunto de leis indica como deve acontecer a docicdo sobre contendas envolvendo a questao de terras. xt, 242, Quando se levanta uma contestagao sobre limites entre duas aldoias, que o rei escollia os meses de maio e junbo para determinar os, limites, sendo entio mais féceis de distinguir, porque © ardor do sol tem dessecado inteira- mento a erva." Para delimitago de limites de propriedade havia um ritual que deveria ser seguido. ‘m) Fraude “Art, 253, Que esses homens, pondo terra sobre suas cabegas, conduzinde grinaldac de foros vermelhas, ¢ vestimentas vermelhas, depois de hhaverom jurado pela tecompensa futura de suas, boas ages, fixem exatamente o limite.” ‘Muitas lois antigas no abordam a questo da fraude, ou apenas 0 fazem som prever sangao alguma. O Cédigo de Manu prové este delito e prevé multa para ele, “Art, 397, Aquele que frauda os direitos, que ven: de ov compra em hora indevida ou que di falsa avaliagdo de suas mercadorias, deve sofier uma multa de oito vezes 0 valor dos objetos." 1) Fraude Quanto ai Casta a que Pertence Como dito anteriormonte, a rigidez das castas néo permitia nenhuma nogdo de igualdade, mesmo que fisica, Desta forma, estar ao lado de um membro de uma casta superior poderia ser muito doloroso para um individuo de uma casta inferior que se atrevesse a tal coisa: 6 Fiiva Lages de Castro “Art, 279, Um homem de baixa classe que resolve tomar lugar ao lado de um de classe mais elevada deve ser marcade debaixo do quadtil e banido ou, fentéo, deve ordenar 0 rei que Ihe fagam um talho sobre as nédegas.” 0) Injirias, No tocante A injiiia, sua definigao pode ser muito ampla no Cédi: go de Manu. Pode tratar-se de somente palavras injuriosas ou até mes: ‘mo de um individuo fazer necessidades vitais sobre outro, Desta forma, no caso deste Cédigo podemos definir injiria como qualquer ofensa ‘que nao fere fisicamente 0 outro. ‘As penas e multas variam também de acordo com a posigao tanto do ofendido quanto do ofensor, bem como da gravidade da ofensa. “Aat. 264. Um Ksatriya, por ter injuriado um Bra mane, merece uma multa de cem panas; um Vaisya, uma multa de cento e cinglenta ou dui- zontos, win Sudra, uma pena corporal.” “Art. 266, Um Brimane gerd sujeito A mutta de cinglenta panas, por ter ultrajado um homom da classe militar; de vinte e cinco, por um homem de classe comercial; de doze, por um Suda.” “Art, 266, Por ter injuriado um homem da mesma classe que ele, um Dvija sera condenado a doze panas de multa; por juizos infamantes, a pena ent ‘geral deve ser dobrad: ‘As penas podem também ser fisicas. “ant, 267. Um homem da ttima classe que insulta ‘um Dvija por invectivas afrontosas merece ter a lingua cortada; porque ele foi produzido pela porte inferior de Brama.” Detar “Nasco das vezoe" Auavis da prin de ios nication, ojovr conta 2 a eee voce fitual, ingtescava emma nova vida, congulstando sua persona Tau Ghintualplona, passava a sor chamado de du, naside novaments a | | | i ituia do Diseto Gera Bratt “Att, 268. So ele os dosigna por seus nomes ¢ por suas classes de uma manoira ultrajante, um estilete de ferro, de dez dedos de comprimento, sera enterrado fervendo em sua boca, “Art. 269. Que o roi Ihe faga derramar éleo fer- vendo na boca ¢ na oretha se ele tiver a imprue déncia de dar conselhos aos brimanes relativa- mente ao seu dover.” E extremamente violentas no caso do ofendido ser um brimane e © ofensor um individuo de uma casta mais baixa: “Art. 279, Se ele encara com insoléncia sobre um Brimane, que o rei lhe faga mutilar os dois labios; so ole urina sobre um Brimane, a uretra: se ele larga um peide na prosonga deste, 0 anus." ) Ofensas Fisicas ‘As vlunsas fisicas sequem o Principio da Yena de ‘Ialiao de forma ‘muito préxima e, as vezes, extrapolam-no na medida que consideram nao somente que o culpade deve ser ferido a mesma forma que feriu, ‘mas também deve ter mutilado o érgdo usacio para ferir 0 outzo, indife- rentemente do tipo de ferimenta que causou: “Att. 276. De qualquer mombro que se sieva um homem de baixe nascimento para forie wm superior, esse membro deve ser mutilado, “Art. 277. Se ele levantou a mio ou um bastio sobre 0 superior, deve tor a mio cortada; se em. ‘um movimento de eélera Ihe deu um pontapé, que seu pé soja cortado.” "Art, 280. Se ele o pega pelos cabelos, pelos pés, pela barba, pelo pescogo, ou pelos testiculos, que o rei the faga cortar as duas mios sem hesitar.” 0 CROP RRO MRO AAR RAR 29499989890899995 © © © © OO OO OO OY ECO OOO EOC OHHHHHHHHHSHSE Flivia tagee do Cart ) Furto e Roubo © Codigo explicita a diferonga entre os dois delites: "Art. 229. A agio de tizar uma coisa com violéncia, vista do proprietério, é um roubo; em sua auséncia é furto, do mesmo modo que © que se nega ter recebido.' 1) Homicfdio e Autodefesa No Cédigo de Manu ha a possibilidade de nao haver pena, nem culpa, no caso de homicidio em legitima defesa. Mesmo que a vitima seja um Bramane: “Art. 347. Um homem dove matar, som hesitagiio, a quem se atire sobre ele para assassini-lo, so no tem nenhum meio de escapar, quando, ‘mesmo, fosse seu direito, ou uma crianga ou um ancifo; ou ainda um Brémane muito versado na Escritura Santa “Art, 948, Matar um homem que faz uma tentativa de assassinato em piblico ou em particular nie faz ninguém culpado de assassinato: é 0 furor nas presas do furor." CAPITULO V GRECIA 1. Introdugao Grécia nio indica um nome de um pais ou do uma unidade politica nha Antiguidade. Antes de tudo, por suas condigdes geogrificas e eco- nomicas, Grésia na Antiguidade significava uma regio. Nas palavras de Rostovtzott "A organizagao politica da Grécia era ditada pe- las condigdes qeouriificas ¢ econémicas. A natu- roza a dividira em pequenas untdades econd- micas e era incapaz de criar grandes sistemas politicos. (..) Cada vale era independent (..). AS melhores regides do pais, especialmente seus {SGrtois vales, estéo abertas para o mar e vedadas a terra (..). Bles esto mais em contato com 02 vvizinhos separados pelo mar do que com os que a terra aproxima,."85 Quando 26 fala em Crécia, pode-se, também, falar até ourty pouto de uma unidade cultural, com deuses, dialetos @ alguns habitos em comum, Portento, compreender esta “no unidade" que era a Grécia significa buscar a compreensio do que seja uma Cidade Estado, A cidade nao tinha o significado que hoje tem; cidade “era a asso- ciagio religiosa e politica das familias e das tribos”.8? Bra na cidade que 0 coragio @ a vida se centravam e 0 territério era somente um apéndice. O Estado ateniense, por exemplo, compreendia todos os individuos lives que viviam em Atenas e mais todos aqueles que viviam nos territérios da Atica ~ regio a que pertencia Atenas. 85 ROSTOVIZEFE, Me, Histéria da Grécla 2. ed Rio do Janeiro: Guanabara, 1986, p. 635, 87 COULANGES, FA eidad Comum a todas as Cidades-Estado gregas era a crenga ~ inde- pendente dos regimes politicos a que se submetiam — ce que na Cida- de Estado: "Governavam, nao os homens, mas as leis. A logitimidade da ‘tei consuetudinaria’ ~ némos (tei) ou patrios politéia (constituigao ancestral) para os gregos (...) ~ decortia da antiguidade veneravel ‘que Ihe ora atribuida em forma histérica, ou, com maior froqiiéncia, miticamente."®9 Nos séculos VIII e Vil a.C., as cidades gregas conheceram um grande desenvolvimento urbano. Esto ndo se dou de forma igual, mas explicava-se pelo grande crescimento populacional do periodo somado a uma tetomada do progresso tecnolégico, artesanal e comercial Este progresso gerou a queda das monarquias ¢ 0 inicio de turbuléncias sociais que acabaram por produzir legislagoes ¢ famosos legisladores. Entre oles podemos citar: Zaleuco de Locros, Carondas de Catania, Licurgo de Esparta, Drdcon ¢ Sélon de Atenas. Destes, so- ‘mente os dois tiltimos tém comprovada existéncia histérica.®° Sao numorosas as Cidades-Estado gregas, sio numerosos seus legisladores e, em momentos histéricos diferentes, elas sobressairam- se individualmente, Entretanto, duas cidades epresentam-se como as mais intrigantes no tocante ao Direito: Esparta e Atenas. Destas duas, a partir dos séculos VIII ¢ VII a.C., ocuparemo-nos de forma mais atenta. 2. Esparta Esta fotuma das primeirasGidades-Estaco a sucirna Gréca, on dacano seule IX eG por nvasore dois oa margens do ro Euotas a Plant de Laconia, © nome da cidade dora de uma planta da rei : A partir do século VII a.C. Esparta inicia um processo que vai cuiminar em tm quase total relreamento de qualquer pe de ovo- sanae Bie proceso éindieado pelos poSprics Rabiantes de Esparta {89 CARDOSO, S.A cidade extado antiga. So Paulo: Aen, 985,512. 90. PELIT Ptfistdrn Antiga. Sto Paulo Dituséo Buropeia do Livro, 1968, ps, 66 Histvia do Divito Gora e Brasil como sendo obra de um legislador, ndo necessariamente histérico, Licurgo, “A evolugdo foi completamente dotida, e toda a energia da raga consagrou-se manutengio des- tas instituigoes arcaicas que, enrijecendo-se ainda mais, acabaram por esclerosar-se. Embora 08 Antigos tenham todos afirmado e admitido sem discussio que as leis (..) eram dovidas a sabedoria do legislador Licurgo, to ilustre quan- to desconhecido, pensa-se atualmente que esta atribuigdo de patrono servia para disfargar a obra de poderosas familias, desejosas de perpetuar 0 estado de coisas que mais lhe dava proveito: 2.1. Sociedade Esparta apresentava trds camadas socials: V Os £spartiatas: eram os détios, querreiros que recebiam educa- do militar especial. Os Periecos: exam os aqueus, tinbam Lous condighes materiais de vida, mas nenhum dizeito politico, Vs Hiilotas: eram escravos de propriedade do Estado, nao ti- nham protegao da lei e sua condigao humana era uma das mais insuportaveis de todo o mundo antigo. Embora possamos, a primeira vista, subentender que os espartia- tas estariam com uma situagdo de tal forma privilegiada nesta socie- Gade que a vida deles era tranqilila, o formato extremamente mili- tarista da sociedade e da ideologia deste Estado fazia com que, nio 31 tide, p88 52 “Poriodicamente 0s mals vigorosos dente el _ les oom argassinados. Os exportance mals ‘rudenies e inteligentes exam mands come agentos secretes do govern, apatccor, o ono eram senes esperados © matando o¢ fleas indeseaveis sem ulgatmenta, A Posigao ds fulotasndo era rum: seu tribute de produdo aot sevs enkates cua este ‘esto dofinida endo ora oneraaa(.)" ROSTOVFZEPE Md. Op. ce 9S ARERR RROARRAOAARA RAR AR A RAR ASR en © © OO OO O66 OOO OE OOOO OOOOH HOHHHEBEESS FliviaLages de Cast obstante nao precisassom calojar suas méos pela sobrevivéncia didria em um arado, seu cotidiano nao era, de nenhuma maneira, serono, entéo quo a sociedate adquire sous tagos ofintives:hilotas, servos do Estado, e periecos, som dieitos politicos, so dominados polos fespartanos de raga pura, poco namerosos desc © comeco (10.000 guezeeios),aliviados do qual- quer preccupagée material, que se consagram desde os sete até os sessenta anos 20 treina- mento militar, esam-se patriticamente [aos| 30. mas dormem no quartel até o8 40, pagandlo com esta servidao militar a grandeza de sezem oF rothores infantes do mundo e a auistera alegria 9 dover eumprio."99 Para uma melhor compraensio do papel do espartiata na mentalidade militarista deste estado, convém descrever sua edueagao, que, mesmo hoje, é indicada como um adjetivo, significando rigidez extrema: a educagdo espartana.% Desde a primeira inf€ncia, 0 espartiata era educado para viver para o Estado. Um bebé, se julgaclo saudavel por uma comissao espe cial de ancidos, ostava imedistamente sob superviséo piblica. As eriangas que nao eram aprovadas por este julgamento eram enjeitadas pelo governo © acabavam morrendo ou sendo acolhidas por algum hilota de bom coragao. Até 0s sete anos a crianga recobia cuidados de sua mae e de amas, especiais do governo. Aos sete os meninos eram afastados de suas familias e ingressavam em um grupo militar comandado por wm jovem espartiata, onde marchavam, faziam muita gindstica © aprendiam alguma coisa de miisica e leitura. Dos doze aos dezessete anos, estes meninos deviam ir para © campo, onde deveriam sustentar-se somente com seu proprio esforgo. 1 Estes garotos comiam alimentos preparados por eles mesmos suas camas nada mais oram que uma forragem de pallia que cles proprios recolhiam nas margens do rio Eurotas. Constantemente participavam de competigées militares e de gindstica. 35 PETA op. cl, p. 08s. 94 CL ROSTOVIZEFE M, Op. ot 0.95, Cy istrin do Direlto Geral Brat Com 0 intuito de desenvolver a independéncia destes meninos, eles eram incentivados a toubar, principalmente alimentos. Entretento, se mal-sucedido, o garoto era surrado impiedosamente, O detalhe era que a surra ndo era dada por ele ter rouhada, mas por ter sido pogo. ‘Aos dezessete anos 0 rapaz passava pela Kriptia, que consistia em esconder-se pelo campo, munido de punhais e noite degolar quantos: ‘escravos conseguisse apanhar. Quem passasse por esta prova tornava- se adulto e recebia um lote de terra, ia viver entdo no quartel, rece- endo uma refeigio por dia ao cair da tarde. Os espartiatas nao podiam casar-se até os trinta anos; poderiam apenas coabitar. A partir desta idade podiam participar da Assem- bléia, se casar e deixar o cabelo crescer. Aos sessenta, aposentavam- se do exército e podiam tomar parte do Conselho de Anciaos. ‘As meninas recobiam, praticamente, 0 mnesmo treinamento fisico dos meninos, para que pudessem ser boas maes de espartiatas. Blas tinham mais liberdade que as mulheres de outras Cidades-Estado da Antiguidade. Podiam recober heranga e podiam enriquecer com 0 co- meércio, atividade vedada totalmente aos homens. 2.2, Reonomia A economia de Esparta também transformou-se a partir do século VII a.C. Surgiu uma vasta propriedade estatal no lugar das antigas propriedades coletivas. Esta grande propriedade era dividida, prova- velmente, em 8,000 a 9.000 lotes, chamados cleros, Distribuidas entre os quorreiros dérios, as terras néo podiem ser cedidas ou vendidas. O Estado detinha a posse legal ¢ o cidadao (es Partiata), 0 usufruto. Para o trabalho nestas terras o Estado emprestava seis escravos por lote, jé que estes eram, também, propriedade dole. Os periecos se dedicavam a agricultura e, mais esparsamente, & triayau de pequenos animats, ao artesanato, a mineragao de terr0 @ 10 comércio. Bles tinham a propriedade de suas terras, mas estas cram sempre as da periferia, nao necessariamente as melhores, Era, mesmo na economia, uma cidade diferente e, embora de- monstrado de maneira um tanto romantica, mostra-nos Xenofonte as ‘bases econémicas “anti-enriquecimento” atribuidas a Liewrge: “Eis ainda as regras pelas quais Licurgo opés Esparta aos outros gregos. Nas outras cidades, sabe-se, todos se esforcam por ganhar tanto o livia tages de Caso dinheiro quanto possivel. Um trabalha a terra, 0 outro anna um navio, um outro pratica o grande coméroio, outros ainda vivem dos oficios arto: sanais. Mas Esparta proibiu aos homens livres 0 dedicarem-se a uma atividade lucrativa e pres- crevew-lhes néo ter por dignas deles sendo as actividades pelas quais as cidacies se constituem © pormanecem livres. E, com efeito, por que se procuraria a riquoza om um pais onde o legislador fixou avé a contribuigdo de cada um dos produtos necessiirios & vida e a repartigao igualitaria, a fim de impedir a aspirago & riqueza o as doguras a que ela conduz? Também nao é para ter bons ‘mantos que é necessario enriquecer; é a beleza do corpo, nfo a sumptuosidade das roupas, que é sett ornamento, Também nao procisam amontoar dinheiro para despender em largueza com sous comensais, pois o legislador dou melhor renome a0 eslorgo fisico que se realiza pata ajudar os companheiros do que as despesas efectuadas com eles; mostrou que as primeiras sao 0 acto da alma; as segundas, da riqueza. Eis ainda como ele impedin que enriquocessem injustamente. Primeicamente instituin uma moeda tal que dez minas néo poderiam penetrar numa casa sem 0 conhecimente dos senhores e dos domésticos (pelo seu grande tamanho e peso): uma tal so- ma teria a necessidade de um grande espago ¢ de uma carroga para transportar. Para mais, 0 ouro © a prata ado objeto de buscas ose se des- cobre algum em qualquer tado, o seu possuidor & castigado, Por que se esforgaria, pois, al- guém para ganhar dinheiro onde a sua posse atranja mais aborrecimento que © scu uso 98 prazeres? De KENOFONTE opud AUSTIN, Michelet af, Reonomia e sociedade na Grécia antiga Lisboa: 70, 1966. p63 isda do Diet Geral e ras 2.3. Politica Apés o século em questo, a politica espartana também se tornou ‘extremamiente conservadora. O poder passou a ser monopolizade exclusivamente pela Geriisia, ou Conselho de Ancigos, esta era com- posta por vinte e oito Gerontes ~ cidadaos acima dos sessenta anos ~ que tinham cargo vitalicio © eram escolhidos por aclamagio na As sembléia (composta exclusivamente por espartiatas), que era somente um érgao consultivo, visto que decidia por aplauso. A Gertisia escolhia ~ sob a ovagao da Assembléia ~ 0 poder exe- cutivo: os Eforos, cinco magistrados com mandate de um ano que ti- nham por fungao cuidar da educagio das criangas espartiatas (que era dever do Estado}, fiscalizar a vida piblica e julgar os processes civis. 2.4, Cultura e Ideologia Claramente, pelo acima exposto, fica claro que Esparta, do século VUI ao século IV a.C., tinha uma caracteristica cultural marcante absoluta: o militarismo levado as iiltimas conseqiténcias, A este militarismo somava-se um esforgo contundente e eficaz - como prova a sua histéria ~ de manutengao do seu modo de vida, do status quo. Eles foram plenamonte vitoriosos neste campo, gerando por séculos a sociedade provavelmente mais imével da histéria, Para explicar esta imobilidade 6 necessdrio entender trés caracte- Histicas dos espartanos largamente incentivadas polo Estado: a xeno- fobia, a xenelasia e 0 laconismo A xenofobia é a aversao, desconfianca, temor ou antipatia por pessoas estranhas ou por tudo que venha de outro lugar, Desta forma os espartanos de antemao rejeitavam quaisquer idéias ou influéncias estrangeiras. Xenelasia ¢ 0 banimento ou impedimento de estadia de estran- geiros. Assim, os espartanos ndo entravam em contato com idéias estranhas ao seu meio. © Laconismo existe quando se fala somente 0 minimo neces- sario e, mesmo assim, utilizando-se do menor nimezo de palavras possivel. Esta ¢ a caracteristica que mais proporcionalmente pode causar um refreamento nas mudangas de uma sociedade, visto quo, se levado ao extreme, diminui, inclusive, a atividade intelectual ¢ criativa, OO © OO © © OOOO OE GOOCH OHOHHHHHEBVHEHE ‘livia Lages de Carto 3. Atenas Atenas localiza-so na Poninsula da Atica ¢ estende-se pelo mar na diregio leste. Ela é separada do resto da Grécia por montanhas muito altas, porém de facil acesso. Sua situacdo googrifica protegou-a das invasdes, principalmente de Dérios, ¢ facititow-lhe a vicla politica & me- dida que: "(..) Nessa regio as condigdes eram favorivols & unigo de considerdvel territério em tore de um centro politico. Ela forma uma sé unidade geogré- fica da qual a safda mais conveniente para o mar 6 formada pelos dois portos ce Atenas (..)."% No século VIII aC. a economia de Atenas era, ainda, basicamente, rural. Entretanto, as atividades artesanais e comerciais ja creaciam ¢ ultrapassavam os limites da regiao. Com 0 desenvolvimento comercial, os georgoi ~ agricultores que possuiam terras pouco férteis junto as montanhas ~ se viram, cada vez ‘ais, em situagao dificil, porque, com a importagi de eereais ¢ algu- mas crises chmaticas, @ concorréncia os aniquilava, gerando um endividamento com os eupdtridas ~ que, além de monopolizar 0 poser, monopolizavam também as melhores terras, possuindo-as em latifin- dios cultivados por rendeiros ou escravos. Este endividamento gerava nao somente a perda de terras, mas também, caso houvesse a penhora do préprie corpo, a ascraviddo por divida, Para piorar.a situagao, outros que ngo tomavam-se eseravos iam para as cidades engrossar a camada dos desvalidos. Os eupatridas monopolizavam o poder, tanto quando ainda existia um rei (chamado Basileu) quanto quando posteriormente eles pas- saram a governar sozinhos, formando uma Oligarcria.9” Com 0 passar do tempo, esta situacio de empobrecimento dos georgoi aumentou e somou-se a insatisfagéo de comerciantes @ arte- 36 ROSTOVIZEPE a. Op ci. . 99. 87 Oligargias “Tomo quo na Gréia amiga, designsvs govern dona minora orto ‘rites Go). Os govemesligrauioe (lig Peauane arp enlcteriesane pla prosngs do eonealnor pics restos timades em ner, eacthas por nn posigio seca." AZEVEDO, A.C. do Anoeal Diconério de nomer, termor e conceit: Districs, Rio de Janeie: Nous Frontera, 1990, 9.208, m ‘atin do Diteita Geral Beat sos que se tornavam cada vez mais ricos ¢ Jesejavam participar da vida politica. A oligarquia estava entao entre dois problemas: novos ricos dese- josos de participar do governo que Ihes era vedado e pobres, exigindo © fim da escravidéo por divida © a repartigio das grandes proprie- dades, Os insatisfeitos formaram o Partido Popular ¢ 0 governo oligar- ‘quico ficou do outro lado, com o Partido Aristecritico. ‘A.ctise era grave porque a aristocracia néo tinha mais 0 monopélio de armas. Com a introdugao de armas mais baratas, os pobres pude- ram armnar-se também, patticipar do exército e, porque nao, exigit ta bém maior participagao politica ‘No meio desta luta entre os dois partidos, um aristocrata, cle nome Clon (em 623 a.C.), tentou tomar ~ sem sucesso ~ 0 poder forga e, como a resposta do Partido Popular foi imediata, a oligarquia se viu obrigada a Ihes oferecer, para acalmé-los, reformas, 1. Drdcon Suigiram os legisladores - os primeitos a redigirem as leis em Atenas, 0 primeiro (em 621 a.C.) de nome Drécon, 6 famoso até hoje pela severidade de suas leis, tanto que, mesmo nos dias auuais, a pala: vra “draconian” significa nos diciondrios: “referente a ou 0 severo & duro cédigo de leis a ele [Drdcon] atribuido. Que ou o que é excessiva- ‘mente rigoroso ou dristico."99 Esta severidade pode ser compreendida pelo fate de Dracon ser um eupatrida, © como tal elo: "Conservava todos os sontimentos da sua casta e cra instruido no direito religioso. Nao parece ter feito outra coisa mais do que passar a escrito os, antigos costumes, sem aada alterar. Sua primeira Ii é esta: ‘devemos honrar os denses @ os herdis oferecer-Ines sacrificios anuais, sem nos afastar- ‘mos dos ritos seguidos polos antepassados'."29 "98 HOUAISS, Antonio. Dieionsxio Houaiss da Lingua Portuguesa. Wo clo Joncito: Objetva, am, 29 COULANGES, Fo IA dade antiga, Sio Pale: Fen iva Lages de Castro Em nao tendo criado nenhuma novidade, Dricon reproduziu 0 aireito antigo, ditado por uma religide implacdvel que via em todo erro uma ofensa as divindades e em toda ofensa as divindades um crime odioso. Assim, quase todos os crimes eram passiveis de pena de morte. 3.2, Sélon Embora as Ieis de Dricon tenham reconhecido uma existéncia legal aos cidadaos ¢ indicado 0 caminho da responsabiliéade indivi dual, ole nao atingiu - e, provavelmente, nem era sua intengao ~ 0 problema econdmico-social e, conseqiientomente, o problema politico. Dosta forma, ao cabo de pouces anos, o Partido Popular voltou a exigir reformas. Em 594 a. {oi indicado um nove legislador, de nome Séion. Este tinha a vantagem de ser aristocrata de nascimento e comerciante de profissio. Era como comerciente que Sélon pensava ¢ foi assim que legislou. Podle-se afirmar que as leis de Sélon correspondem a uma grande revolugao social. A eunomia ~ igualdade de todos perante a loi ~ esta presente em todos os artigos que ele escraveu; assim, néo hd distingio entre eupatridas ¢ ndo-cupatridas, “A reforma de Sélon atingiu toda a estrutura do Estado Ateniense, no que diz respeito & economia, sociedade e politica, 3.2.1, Economia ‘Som diivida, a legislagao de Sélon preparou Atenas para ser uma poténcia econémico-comercial, Em todos os sentidos ele indicava um incentive ao desenvolvimento comercial e industrial que fariam de ‘Atenas a principal e mais poderosa Cidade-Estado da regio. ‘Como forma de ajudar a producao intema e, conseqtientemente, 0 comércio, Sdlon incentivou a ida de artesdos estrangeiros para Atenas. Desta forma a produgao tornava-se local, © que nao somente barateavit © custo dos produtos, como também a médio @ longo prazos poderia fazer da cidade uma exportadora. ‘Para melhorar o simplificar as transagées comorciais, o Jegislador dotou Atenas de um padrao monetario fixo e incentivou a exploragao Ge minas de prata, Desta manoira, Atenas teria uma melhor € maior Girculagdo monetatia, Ainda no intuite de simplificar o comércio, Sélon instituiu um sistema de pesos © medidas Unico. istxia do Direta Geral rast 3.2.2, Sociedade Para minimizar os efeitos da crise politica, Séloa concedeu anistia goral, estando perdoades de crimes politicos todos que tivessem come- tido um, Neste mesmo sentido ele suavizou a legislagao draconiana, buscando apaziguar os 4nimos exaltados da cidade. Ele limitou o direito de heranga dos primogénitos, que anterior- mente eram herdeiros universais. # importante salientar que, embora todos os filhos apés Sélon recebessom heranga, somente os filhos e nunea as filhas tinham este direito. Se houvesse somente uma mulher comio herdeira, ainda assim esta nio receberia nada, um parente prdximo seria 0 herdeiro.19 Sélon introduziu também 0 testamento na legislagao ateniense, sendo a mulher sempre impossibilitada de testar. Para atingir objetiva o dofinitivamente o problema principal que gerava a revolta do povo, o legislador decretou a selsachtdia que consistia na suspenséo dos marcos de hipoteca, na devolugéo das terras aos antigos proprietarios @, principalmente, na proibicdo da escravidao por dividas om Atenas, 3.2.3. Politica Sélon pensava através da economia e nao poderia ser diferente quando fez leis relativas ao comando do Estado ateniense. No comando ofetivo ficariam aqueles com mais riquezas e, abaixo deles, com menos poder e sucessivamente, os que tivessem menos dinheiro. 100 GOULANGES. F Op ct, p25 6 a rT PT Te TP ae Pe ee CO OOO OOO OOOO OOK OOOKOCOHKEOHHCHOHHE,S CAPITULO VI ROMA E O DIREITO ROMANO 1. Introdugao A Histéria de Roma é a historia de todos nés... Histérla que per passa todo o ocidente @ nos faz oriundos dos mesmos pais... Latinos, antes de tudo. Isto com todos os defeitos e qualidades que possam sor atribuidos a latinidade. Isto com todas as formas dos seres humanos, iguais a nés, que conquistaram 0 mundo inteiro de entio, O que ha de mais interessante na Histéria de Roma na atua- lidade é que ela 6 tao desconhecida quanto mal interpretada. Hé mni- tos que pensam que os romanos eram apenas broncos violentos com, ansia de conquistas © hé muitos que nem sequer sabem que em nos- sa “genética cultural” ha tanta romanidade que nem podemos enumerar, Somos romanos até quando falamos, nossa lingua é filha do latim, somos romanos na nossa nocio urbana, somos romanos em nossa lite. ratura, somos romanos mesmo quando temos uma nocéo de patri tismo. Somos romanos politica ¢ administrativamente. Mas, principal- ‘mente, somos romanos quando falamos em Direito, quando fundamos nossa sociedade em um Estado de Direito. Direito este sistematizado pelos romanos antigas, A Historia deste povo pode até passar despercebida para a maioria dos mortais, mesmo para nés, latinos. Mas é imperdoavel que estudantes de Direito, advogados ¢ até mesmo os auto-intitulados ju- vistas da atualidade considerem Roma como mera curiosidade de erudigao, ou simplesmente nio a considerem, Tomando as palavras de Von Ihering: °A importancia do Direito Romano para 9 mundo atual nao consiste sé em ter sido, por um ‘momento, a fonte ou origem do diteito: esse valor {i 96 passagelto. Sua autoridade reside na pro funda revolugao interna, na transformagao com plota que causou om tode nosso pensamento tbvia tags de Castro juridico, @ em ter chegado a ser, como 0 Ctistianismo, um elemento da Givilizagao Mo: doma,"100 Em um sentido mais objetivo, a importancia do estudo do Direito Romano faz-se dbvia quando comparamos o Diteito Romano com nosso Direito Civil. Nada menos que oitenta por cento dos artigos de nos: 0 Cédigo foram confeccionados baseando-so direta ou indiretamente ‘as fontes juridicas romanas.102 ‘Ao iniciarmos este capitulo sobre Roma, 6 necessario salientar algumas caracteristicas basicas deste povo. A primeira e mais visivel ¢ © fato de que quando tratamos de Roma tudo é superlativo, enorme. Roma conquistou teda a volta do Mediterrfineo ° no sem razdo chamava este mar de mare nostrum (nosso mar). Roma conquistou a Europa praticamente toda ~ tendo como fronteira a parte norte da Gra- Bretanha ¢ a Alemania. Roma, a cidade, chegou a ter mais de um milhao de habitantes por volta do séculoT.C. A segunda caracteristica é que os romanos tinham uma visa bastante altiva de si mesmos, consideravam-se destinados a serem ca- ‘put mundi, a cabeca do mundo. Sua vaidade se traduzia em buscarem entrar para a histria da cidade, tornarem-se eternos através da historia. Iniciaremos 0 estudo do Direito Romano polo aspecto da evolu politica & medida que utilizaremos conceitos e nomes que somente poderao ser entendides apés uma ambivntagao preliminar. Esta so- mente se da através de um estudo, ainda que superficial, das Insti- tuigdes Politicas dos diferontos momentos da Histéria de Roma, ‘A historia da urbs se divide om Realoza (da fundagao de Roma até 510 a.C.), Repiiblica (de 510 aC. até 0 ano de 27 a.C.) e Império (de 27 aC. at amorte de Justiniano em 566 d.C.). Este aitimo pode ainda ser subdividido entre Alto (de 27 a.C. até 284 4.C.) e Baixo Império (de 284 Tor VOW IEIIUNG opud GIORDAN, Mario Cutis, Histéria de Homa, Ptrdpolis: Voses, 1908, p25 102 TOHO, AbetowdoS. da 6. Curso de drelto amano, Rid J co: Alvaro Pato, 1981. i | | | i i i i ‘atria do Ditto Geral e Bras LG. até @ morte de Justiniano}; esta subdivisdo baseia-se no abso- lutismo do imperador, que cra menor no primeico ¢ incondicional no segundo, 2.1. A Resleza e suas Instituigses Politicas A fundagio de Roma, com os miticos gémeos Romulo e Remo, datada de 753 a.C. Nos séculos seguintes, Rema, como as outras Cida des-Estado da regio, era governada par um rei, A realoza em Roma era vitalicia, porém eletiva e, principalmente, néo hereditaria, As assombléias, chamadas Comicios Curiatos, escolhiam o rei cujo nome havia sido proposto pelo Senado e investiam- no no Imperium ~ poder total que abrangia os Ambites civil, milita religioso ¢ judiciario. Este soberano ora o juiz supremo, néo havendo apelagéo contra suas sontencas, Senatus vem da palavra senis, que quer dizer ancilio. No final da realeza 0 senado era composto por trezentos membros, que eram con- selleiros do rei. Durante este periodo, © Senado nao tinha poder, aconselhava quando solicitado, mas o rei nao era obrigado a seguir seus consolhios. Ja 0s Comicios Curiatos eram rouniées de todos os homens considerados como “povo”, ou soja, os patricios e os clientes, ficando de fora os plebeus ¢ os escravos, iblica e Suas Instituigdes Politicas Quando da fundacio da Repiblica (Res + Publicae = coisa do Povo), os romanos decidiramn pulverizar 0 poder executive para as maos de muitos, com mandatos curtos, um ano, na maior parte dos casos, assim evitande que alguém pudesse ter um poder exacerbado nas Somente 0 Senado permanecia vitalicio, entretanto sua funcao primordial durante este periodo foi a de cuidar de questées externas. Contudo, devico & temporariedade do mandate dos cargos executives da politica republicana frente a vitaliciedade do senado, este acabava Possuindo uma autoridade permanente, tornando-se © centro do. Go- Estes que detinham o poder executive em Roma Republicana exam chamades Magistrados ¢ cada qual tinha sua fungao especiti- ETT TT TTT CLIT TTT LT LECT CLerrrerrere © © © 6 © OH OOOH OOOOH OOOH OHKOHSCHHOHHES 2.102 Eles eram divididos entre os Magistrades Ordinirios ¢ 03 Ex traordinéries. Os Ordindrios ~ que mais nos interessam neste estuido ~ (Consules, Pretores, Edis, Questores) oram permanentes e erain cleitos anualmente. Os Extraordinérios, como os cansores, eram temporarios e somente eram escolhidos quando havia necessidade. Os candidatos a determinada magistratura tinham que obedece: @ determinadas condigées. Primeiramente, deveriam ser cidadaos plo. os (optimo jure) e, dependendo do cargo almejaco, ja terem exercido outras atividades piblicas do cursus honorum. © Cursus Honorum, ou caminho de Honra, era uma escala de ear ‘G05 que deviam ser alcangados sucessivamente, a saber: primeiro de. via-se alcangar a questura e depois a edilidade, a pretura e 0 con- sulado." No século 1 a.C. ficou cstabelecida uma idade minima para desempenho de cada uma destas magistraturas: 31 anos para ¢ questura, 37 anos para a edilidade, 40 anos para a pretura e 43 anos para o consulado, Y Cénsules Eram sempre em nimero de dois. Com poderes equivalentes (principio da colegialidade). Eles comandavam 0 exército, presidiam ¢ senado e os Comicios, representavam a cidacle em ceriménias teligio- ‘sas © em quest6es administrativas oles eram os superintendentes dos fancionatios. Era costume os cénsules repartirem entre si os poderes, cada qual reservando para si uma esfera de agdo ou exercendo as esferas alternadamente. No caso do comando na batalha, oles aiternavam-se a cada dia na chefia suprema do exército e, se houvesse mais de um palco de operagées, cles se distribuiam por acordo ou sorteio. lava magistrado hoje em aia tom apenas uma conetagio de membre o juietaia, endo que na maria das vezes #utdizida, quase oxclusvamente, para juizes. Este termo @ em Roma utlizado do forma muito mals abrangente 6 nie lsivamonte para aqueles que cuidam da jutiga, mesmo porque, (azse neceseseio lembar divisio do Estado em 3 poderes é moderna. 101 No inci do séeulo Ma G 9 cursus honorum fl requladoe sevisado por Sila ficou eom ‘8 soquanetn apresontade 0 Hitéia do Diseto Gera Beast ¥ Protores So 05 magistrados mais importantes para nosso estude porque sua atuacio era relativa A Justiga, Eram dois tipos: o Pretor Urbano, que cuidava de questées envol- vendo apenas romanos na cidade, ¢ 0 Pretor Poregrino, que cuidava de ‘questées de justica no campo e aquelas envolvendo estranceiros. # importante salientar que nao la, hoje om dia, equivaléneia pos: sivel, quando se trata das fungées do Pretor, Este cuidava da adminis- tragao da Justiga, mas nao era juiz. Tratava da primeira fase do proces- 50 entre particillares, verificando as alegagées das partes fixando o: limites da disputa judicial. Feito isto, o Protor rematia o caso a um Juiz particular para que este julgasse o caso. A partir da Lei Aebutia (séc. II a.C.), que modificou 0 proceso, os pretores tiveram aumentado mais ainda seus poderes discricionérios, visto que, a partir de entao, eles podiam fixar os limites da contenda e dar instrugdes ao juiz particular em como este deveria proceder. V Edis Os edis tinham fungio de cuidar fisicamente da cidade, ou seja, culdavam das provisdes da cidade, velavam pela seguranga publica ¢ pelo tréfego urbano, vigiavam aumentos abusivos de precos ¢ a exati- dao dos pesos e medidas do mercado, cuidavam da conservagao de edificios ¢ monumentos piiblicos, da pavimentago da cidade, orga- nizavam e promoviam os famosos jogos pitblicos, Y Questores Durante a Repiblica estes magistradoe cuidavam, principalmen- te, das questdes da fazenda, Custodiavam o tesouro piblico, cobravam 05 deveriores e os denunciavam a justiga, seguiam gonerais e gover- nadores como tesoureiros, Y Censores Embora nao fizesse parte do Cursus Honorum, era um cargo cobi- ado como um dos mais respeitados da Reptiblica 0, goralmente, s6 era scupado por cidadaos respeitadissimos e que ja tivessem ocupado 0 cargo de Consul, a livia Lager do Cast Eram eleitos de cinco em cinco anos, em mimero de dois, mas cada um sé permanecia no cargo por, no maximo, dezoito meses, Os censores eram responsavels pelo Censo (recenseamento) que eta realizado de cinco em cinco anos. “Por turno de tribes, os cidadaos se apresenta- vam, com sous bens inéveis diante da reparticao dos censores (villa publica), instalada no Campo de Marte, para fazerem a declaracio (fassio) do estado civil, relagées de servigo e riqueza, porante os censores, os notiveis das tribos & foutras pessoas do confianga, As mulheres, os [ilhos e clientes eram representados pelo chefe da familia, Comissérias do censo eram enviados 203 exércitos que se encontravam em campanha."105 ‘Também e, principalmente, eles eram responsaveis pelo Regimen ‘Morum, o policiamento dos costumes. Eles podiam devassar a vida de ‘um individuo, e maus exemplos, luxos, fllosofias néo condizentes com (© que era considerade romano, eram denunciados por eles nas As- sembléias Publicas. Caso um acusado pelo censor tivesse sua culpa comprovada, poderia inclusive perder por algum tempo seus direitos politicos. 2.3. O Império e Suas instituigoes Politicas Durante o Império a figura principal do governo romano era, obvia- mente, o Imperador. Este nome Imperator significava que o princeps (primeiro homem de Roma) possuia o imperium em todos os aspectos: o civil, o militar e o judiclario. Neste periodo as magistraturas republicanas subsistem, mas nao tém mais a forge ¢ importéncia anterior. O Consulade, por exemplo, continua existindo até Justiniano, entretanto é um cargo apenas honotifico. (0 Senado continua existindo, entretanto com cada dia atribyuigoes mais limitadas. Por outro lado, teve sua competéncia ampliada nos terrenos legislative, eleitoral © judicial, j4 que podia, conforme a TOE TEOGH apud GIORDAN, Mao Curtis, Hiss de Roma, Poipolie Vosse, 1960p. 9, Haein do Dieta Geral e Beasit, vontade dos senadores, conhecer, qualquer .delite, principalmente atentado contra o Estado ou a pessoa do Imperador. 2.4. As Mudangas om Roma Apés as Conquistas Como visto, dividimos tradicionatmente a Histéria Romana em ttés partes, todas elas polticas. Vale a pena destacar, principalmionte para um entendimento panoramico mais eficaz da Histéria daste povo, cue ha também wma outra forma de dividirmos o camainho dos romanos. E preciso apenas que pensemos que Homa eomegou como uma pequena cidade do Lacio e tomou-se a capital de Mundo Conhecio. Era uma cidade de agricultoras que se tomazam os donos co mundo: ‘A conclusdo é clara, os romanos, antes das grandes conquis- tas, eram muito mais tradicionais que os romanos de depois destas: estes exam mais cosmopolitas, mais voltados para o mundo e abertos a mudangas 3. 0 Direito Romano 3.1. Definigao e Caractoristicas © Direito Romano é uma criagao tipica deste povo, o que eles cria- ram nos deu a possibilidade de hoje estarmos habitando paises que se intitulam “Estados de Direito”. Como um todo o Ditoito Romano é 0 conjunto de normas vigentes em Roma da Fundagdo (século Vil aC.) até Justiniano no século VI 4.C. Para os romanos a definigao de Direito passava por seus man- damentos, que sao: “viver honestamente, nao lesar ninguém e dar aca- da um 0 que é seu" (iuris praecepta sunt hace: honete vivere, alterum non ladere, suum cuique tribuere).108 Este direito (oi fruto de séculos de trabalho e bom senso, antes de tudo. O pragmatismo romano encontrou no Direito um centro ines- gotavel para desenvolver-se dentro dos pardimotros que eles mesmos consideravam como essenciai: “Um simples olhar a win manual de Diteite Roma- no revela-nos seu espitito: protegdo do individuo, OH Biposto 1.1.10 ® © © © © 6 OOH OO OHO OOOOH OCOHOCHOHOUCHOHHHOE ‘Mowia Lagas ae Gastro Podemos identificar trés periodos ou fases de evolugao do Direito Romano. Estas fases so distintas entre si e cada uma tem caracte- risticas préprias. Esta divisio, de certa forma didatica, ajuda-nos a compreender panoramicamente © Direito Romano, Sao estes os trés periodos: 0 Periodo Arcaico (ou Pré-Classico), 0 Perfodo Classico © o Periodo Pés-Classico 3.2.1. Periodo Arcaico Este Perfodo vai da Fundagdo de Roma, no século VIII a.C., até o século I a.C. Neste, o Dircito caracteriza-se pelo formalismo, pela igidez, pela ritualidade. Mesmo porque o Estado Romano somente depois de algum tempo tomou-se mais presente no dia-a-dia da cidade. “O Estado tinha fungdes limitadas a questées essenciais para sua sobrevivéncia: guerra, punt a0 dos delitos mais graves e, naturalmente, a observéineia das regras religiosas."108 A familia era 0 centro de tudo, mesmo do Direito. Os cidadaos romanos eram vistos como membros de uma unidade familiar antes mesmo do que como individuos. Mesmo a seguranga dos cidadios dependia muito mais do grupo a que pertenciam do que de Estado.109 © mais importante marco deste periodo 6 a Lei das XII Tabuas, feita em 451 © 450 aC. como resposta a uma das revoltas da Plebe Romana.ti© Esta legislagao foi uma codificagao de regras costumelras 107 GIORDAM Op cit, p. 255, 108 MARKY, Thomas. Curso elomentar de diraito romano, 8. od. S40 Palo: Saraiva, 1995, be. 209. idem, p08. 110 A plebo romana tatou durante sécules por iqualdado cil poi com oF Paticios ‘bteve vtérias importantes como a Lot dae XI Tabuae, ae Leia Sonia ~ mo sho BV, quo praia eecravilo por aluias, o Mbunate ea Plo, ent cateas. i I | , mesmo ontrando rapidamente em desuso, foi chamada durante toda 2 Histéria de Roma como a fonte de todo dircito (fons omnis publici privatique iucis). “Esse direito primitive, intimamente ligado as regras religiosas, fixado e promulgado pela ublicagao das XII Tabuas, ja representava umn vango na sua época, mas com o passar do tempo fe pola mudanga de condigées tomou-se anti do, superado © impeditivo de ulterior progresso. (-) Mesmo assim, @ tradicionalismo dos romanos foz com que esse direito arcaico nunca fosse considerado como revogado: 6 préprio Justiniano, 10 séculos depois, fala dele com rospeito."111 3.2.2. Periodo Classico Este poriodo, do século II a.C. até o século III d.C., foie auge do Direito Romano e, mais especificamente, foi o auge do desenvolvimento do Direito Romano. © Poder do Estado foi centralizado e dois persona- gens ~ pretores e jurisconsultos -, adquirindo maior poder de modificar as rogras existentes, puderam revolucionar constantemente o Direito Jurisconsultes e Pretores © suas atividades serdo vistas mais pro- fundamente quando tratarmos das Fontes do Direito Romano. 3.2.8. Pesiodo Pés-Clissico Neste periodo, do século III até o século VIA.C., 0 Direito Romano nio teve grandes inovagées, vivia-se do legado da fase durea; entretanto, para acompanhar as novas situagées, o Direito vulgarizou- s0 e sentiu-se a necessidade de fixar-se definitivamonte as regras por meio de ume codificagtio que a principio era muito mal vista pelos romanos.1" Houve algumas tentativas, neste periodo de codificagio do Direito vigente, porém estas eram feitas de forma restzita. Como exemplos po- demos indicar o Codex Gregorianus, o Codex Hermogenianus, 0 Codex Tit MARY, T Gp. 0, p. 06 182, Depo da Loi daz 2 Tabu, do séewo V aC. nenbum aac ft emprocndtia pelos fomianos por nao consideracem una codiieagae nesta ‘seis Lages de Corto ‘Theodosianus. Somente apés a queda do Império no Ocidente, Justinia- no, Imperador do Oriente, conseguiu empreender tal feito A Codificagao Justinianéia, chamada de Corpus luris Civils, ¢ considerada conclusiva, mesmo porque praticamente todos os cédigos modemos trazem a marca desta obra.1¥3 O Corpus luris Civilis ¢ com- posto por quatro obras: 0 Codex, 0 Digasto (chamado também de Pandectas), as Institutas e as Novelas. © Codex foi complotado em 529 @ reine a colegio completa das Constituigées Imperiais (veromos sou significado a seguir), o Digesto (de 530) 6 a selegao das obras dos Jurisconsultos, as Institutas sao um manttal de Direito para estudantes @ as Novelas sao a publicagao das leis do proprio Justiniano. 8.8, Fontes do Direito Romano © Direito Romano, até por sua extensao no que diz respeito a0 tempo que existiu ¢ foi trabalhado, tem muitas fontes. Algumas sio gerais, independentes de época, outras so mais especificas a um periodo da Histéria de Roma. 3.3.1. Costume ‘A forma mais esponténea e mais antiga de constituigae do direito 6 0 Costume. Os romanos chamavam-no de consuetudo e, mais fre qiientemente, de mores. Este nao pode ser entendido apenas como fon- 19 especifica do Direito, mas, entre os romanos, pode ser visto, tamb como adjetives obrigatérios ao bom romano. Neste sentido, muitos pontos do Mos Maiorum podem ser vistos hia Histéria do Direito Romano até mesmo come itens de degradagao ox exaltacdo de um individuo em julgamento. “Os Romanos: tinham como suporte fundamental fe modelo do seu viver comum a tradigio, no FEF Gaur hte cists to name dado eaeaco do Justia por Disa Gots Sehmansisaooev oe ee A re a aa harmanisi orem utes pac sae aes sen rn a Tinian Cibo ea wae do uta 80028 Sa oe pat ¢ vow ois Chamadas do arpaares Mistrial Diteto Geral e Urasit, sentido de observancia dos costumes dos ante- Passados, mos maiorum."118 A titulo de exemplo, podemos citar a Fides, muito usada no Direito que tem como sentido 0 cumprimento de um juramento que compro- ‘mete ambas as partes na observancia de um pacto. A fides, qualidade imprescindivel do bom romano, existe no Direito, no minimo, desde a Lei das XII Tabuas. A Pietas era o item do Mores Maiorum que justificava 0 poder do Pater familias, visto que ela se define como um sentimento de obriga- G80 para com aqueles a quem o homem esta ligado seja pelo sangue, seja pela politica, saja através do dever para com os deuses, a patria e a fami, 16 Gravitas era uma das qualidades mais utilizadas para a defesa de um individuo no tribunal, Era usada no sentido de indicar que um homem era sério, componetrado. Foi neste sentido que Cicero wtilizou © tormo para defender Plincio e, posteriormente, para defender um cidadao chamado Murena, acusado por Cato, o Censor, de ser "dan- garino” e, portanto, ofender os bons costumes.117 Outras qualidades que podemos apontar sao a Dignitas ~ que ¢ ielacionada com dignidade e com o exercicio de cargos piiblicas, a Honor -, oconhecimento piblico de mérito, e a Gloria ~ usada na Defe- a de Sestio, como 36 sendo possive! a homens de bem porque somente estes podem alcangar tal reconhecimento. 3.3.2. Leis e Plebiscitos Para o Direito Romano a palavra Lox tem significado mais amplo do que se tem modernamente, Para eles a Jex indica uma deliberagao de vontade com efeitos obrigatérios. Desta forma fala-se para uma cléusula de um contrato em Leges Privatae (leis privadas); para referit- 2 20 estatuto de uma cidade os romanos falavam em Lex Colegii o, para deliberagoes dos érgaos do Estado (com o mesmo sentido moder- no), 08 romanos aplicavam 0 termo Lex Publica.119 115. PEREINA, Masia Holona da Rocha, Estados de Histéria da Cultura Clissicn. Lisboa: CGalouste Glbekian, 19-1, 35. HG tide, p. 329 ss. 117 Ibidem: . 342-38. 7 © © © OO OY OOOH OOOOH HOOECOCEHHOHHSHSHHHE Flivia tages de Castro No periocio republicano ha duas espécies de leis depencendo de condo se origina: a Lex Rogata e a Lex Data. A Lex Data era a lei pro- veniente do senacio ou de algum magistrado. As Leges Rogatae eram as leis votadas polos cidadaos romanos (Populus romanus) reunidos em Comicios e exam propostas pelos max Gistrados e somente entravam em vigor apés a ratificacao pelo Senacto. Caso esta aprovagio fosse feita somente polos Plebous (parte da Sociedade romana) nos Plebiscitos eram validas, a principio somente Para os préprios plebous, porém apés a lei Horténsia de 286 a.C. as decisdes do Plebiscito tinham forga de lei para a sociedade como um todo. 3.3.3, Edito dos Magistrados Conforme visto no subcapitulo referente as Instituigdes Politicas, havia um cargo na Repiiblica que era responsavel diretamente pela Justiga: os Pretores. Estes, ao iniciar sen mandato, publicavam os dicta para tomar publica a maneita pela qual administrariam a justiga durante seu ano.119 “Da etimologia da palavra (¢ - dicere) se deve Goduzir que, em sua crigem, tais comumicagoes feram orais: mas 0 edito era transcrito a tinta em tabuas pintadas de branco (donde 0 nome de album) com letras pretas e cabegalhes vermelhos (rubricae) © afixado no forum, onde pudesse facitmente (de plano) ser lido."120 Com os Editos os Pretores acabavam criando novas normas © estas acabavam por estratificar-se, visto que os Pretores que entravam utilizavam-se largamente das experidncias hem-sucedidas dos Editos dos Pretores anteriores. Estes Editos eram chamados Edictum Tralacium © oram diferenciados dos Editos que continham inovagoes Propostas pelo Pretor, chamados dictum Repentinum, tex Coralia do 67 a. estabeleceu que os Potores nfo potiom afastaece de seus ceaitos durante 0 mandate. 120 CONNEIA, A. SCIACIA, G, Manual de to-. eto romano. Rio do Junot: Livios Cadoanos, os Mintria do Dieta Geral e Bras (0 resultado dessas experiéncias fo! um corpo estratificade de regras, aceitas @ copiadas pelos pretores que se sucediam, e que, finalmente, por volta de 130 a.C., foram codificadas pelo Jutic- ta Salvio Juliano, por orem do Imperador Adriano.""21 Este direito pretoriano, chamado Jus Honorarium, nunca foi equiparado zo Jus Civile, mesmo porque a regra pela qual o preter no podia criar direito, embora nao usada na pritica, sempre esteve em: igor (praetor jus facere non potost). Desta forma um intoressante con- tra-senso esteve sempre presente no Direito Romano ~ principalmente no periodo Ciassico: o lus Honorarium sempre foi considerado diferente ©, até mesmo, inferior a0 Jus Civile, mesmo quando, na pratica, o substitui.%22 3.3.4, Jurisconsultes No principio da Histéria romana, somente os sacerclotes conhe- ciam as normas juridicas e somente eles as interpretavam, A partir do fim do século IV aC. esse monopélio sacerdotal passou a nao mais existir e peritos leigos apareceram, eram os Jurisconsultos. Os Jurisconsultes, principalmente no periodo Clissico do Direito Romano, foram personagens da mais profunda importincia para o desenvolvimento do Ditelto. Sua principal caracteristica e qualidade era 0 estudo profundo e sistematico e, conseqiientemente, o respeito advindo desta sabedoria, “les eram considerados como pertencentes a uma aristocracia intelectual, distingao essa dovida aos sous dotes de inteligénciae avs seus conhecimentos técnicos."123 A atividade destes homens, também chamados Prudentes, consistia em indicar as formas dos atos processuals aos magistrados ¢ 4s partes (eles ndo atuavam em juizo); esta indicagéo tinha o nome de T21 MARIY,T Op. et. p.7 122 Jur honoririam lr, quod ob honoré prastors winerat. “Cham Porque emna oo ca masta aa MARY Gp oi w 8 iro honerdtlo on) do preter” (Pompém, Diy 122.10), ‘livia Lagos de Casio agero. Eles também auxiliavam na elaboragao e escrita de instrumen- 10s juridicos, que, ent vista do formalieme exigido, aecessitava de par- ticular competéncia, isto era chamado cavere, Era ainda da parte do Ju- rigeonsulto a obrigagao do respondere, que consistia em emitit pare- cores juridicos sobre questées a pedido de particulares @ magistrados. Até polo menos o fim da Repiiblica, a atividade dos Jurisconsultos do era utilizada como fonte do direito, sinha apenas valor para 0 caso especifico apresentado a ele, Entretanto, a partir do século I a.C., com Augusto, seus pareceres passaram a ter forca de lei, mesmo porque os Jurisconsultes passaram a responder ex autoritate principis, on soja com a mesma autoridade do Principe. A jurisprudéncia passou entao, como fonte do direito, a ser um dos elementos mais importantes para © desenvolvimento profundo pelo qual o Direito Romano passou. Nas palavras de um grande Juris- consulto romano: “Turis prudentia est divinaram atque humanarun rerum notitia, justi atque initisti scientia risprudéncia € © conhecimento das instituigdes, divinas e humanas, a cigneia do justo e do injusto."124 & interessante salientar que, apesar da forga destes homens, este ‘nao era um meio objetivo de enriquecimento, pois a atividade de Juris- consulto era exercida gratuitamente, em nome da fama, da vaidade e do destaque social. Para alguns juristas era mesmo até uma forma de arte, O Jurisconsulte Celso definiu 0 ser Jurista: "Seire loges non est verba earum tenere, sed vim ac potestatem.” ~ Ser juriscousulto nao & conihecer as palavras da lei, mas seu espirito e poder. 125 3.8.5. Senatus-Consultos Senatus-consultos eram doliboragdes do sanado mediante pro- posta dos magistrados; estas somente passam a ser fonte de lei apés 0 Principado (século I a.C.), portanto, somente apés este periods, os xr considerados fonte do diroito. senatus-consultos podem s THE piano, ig. 11.102 125 Colso, Dig. 127. i i { { I | ‘icria do Dutt Geral o Brasil, No periodo anterior, isto é, durante a Repiblica, 0 Senade nao le- gislava, entretanto indiretamente inluenciava o Direito, & medida que aconselhava os magistrados para que estes seguissem determinadas resctigées na aciministragio da justiga, Quando, no império, os Imperadores passaram a centralizar mais fortomente o poder, os senatus-consultos passaram a ser somente um formalismo que era desejado pelo Imperador quando este queria fazer valer uma decisdo que era impopular, para, desta forma, livrar-se do nus politico. 3.3.6. Constituigdes Imperiais A partir do segundo século depois de Cristo ~ depois da Impe- rador Adriano ~ as decisdes dos Imperadores passaram a ser fontes do Direito. Paulatinamente, durante o Império, conforme o poder centra- lizava-se cada vez mais, 0 Imperador passou a substituir as outras fon- tes do Direito, para culminar como a Gnica fonte. As providéncias legislativas do Imperador eram chamadas constitutiones (ou placita) e podiam ser na forma de: edicta, mandata, decreta ou rescripta, V_Eidicta: deliberagées dé ordem geral, Caso néo sejam revogadas polos seus sucessores, a edista tem duragao incofinida, YV Mandata: instragées dadas pelo imperador aos fancionarios imperiais e aos governadores de provincia, na qualidade de cho- fe supremo. Seu caréter é, portanto, administrativo, oxorcondo algumas vezes influéncia sobre o direito privad. YV_Decrota: sao decisdes do Imperador proferidas em um proceso no exercicio de supremo poder jurisdicional que oste possuia Gurisdictio). O Peincops decidia em primeira instincia ou om ‘grati de apelagao, Os decretos eram aplicados e estendios polos juristas a casos semethantes 128 V_ Rescripta: séo respostas soliitadas ao Imperador a respeito de casos juridicos a ele submetidos pelos magistrados ou por particulares 125: jasisar imporsisconsideravam igitiva a préntin vontade do Imporedot: “Oued priniptplicut, toys mabec vigrom = O que agrada a0 pring tom fouga Ge el {Uipian, Dig. 1.2.1, prof). © thle Peacope igminwa prime hemem de Rome, o Peer re te eee ee ee eee OOOO OOOOH OOOOH OHOHHOHHCHHHHHHVHHHES Fivia tages de Costco 3.4, Divisio do Direito Romano Os romanos considoravam varias divisdes de seu direito; pa tanto baseavam-se na Historia, na origem da norma, na aplicagao ou no sujeito a quem era destinada a norma, A principal diferenca ontie of Direitos (ius) era entre 0 lus Cilvile e o Jus Gentium, ‘lus Civile: também conhecido como jus quiritium, é o direite préprio do cidadao romano e exclusiva deste, lus Gencium: é 0 direito universal, aplicavel a todos os homens livres, inclusive os estrangeiros. Para o Jurista Gaio e para Ul piano era um direito baseado na raz30 natural (naturalls ratio).1®7 lus Gentium est, quo gentes humanae untuntur (Direite das gemtes é 0 que a razdo natural estabelecau entre os homens).128 3.4.1. Divisdo Baseada na Origem Baseando-se na fonte do Direito, os romanos difereneiavam 0 Jus Civile, 0 lus Honorarium e 0 lus Excraordinariam. Jus Civile: era o Direito tradicional que provinha do costume, das "leis, dos plebiscitos e, na época imperial, dos senatus consultos @ das Constituicdes Imperisis, V_ Jus Honorarium: era 0 Direito elaborado ¢ introduzide pelos pretores, Jus Extraordinarium: ora derivado da atividade jurisdicional do Imperader na época do Império. © Imperador e seus fancioné- rios, tomando conhcimento das controvérsias (cognitio) de forma diferente da ordem natural dos juizos (extra ordinem), originaram todo um conjanta de normas,129 127, Bra considerado como tondo sido consiido pelo lus Natura (Diseito Notweal). Este sori natural @ no ma cringe arbitra do hemem. “Consideracse naturals © «e decorte das qualidades fisicas des homens ow das eoisi,eomwo tamém © due correspond @ uma ordem norma do intocesseaInumanos ¢ po nse mesmo, nie Cage Iustiieagdos" (CORRETA, Alexandta; SCIACIA, Gaetano, Op ety. 19). $28 Upiana, Digest, 1.4.14 120, CORREIA, Alewandee: SCIACIA, Gaetano, Op cit, p18. oa | | | “Mlxéts do Dioito Gora Bri 3.4.2, Divisio Baseada na Aplicabitidade Esta distingao se faz baseada em de que forma as regras poclem ou nfo ser aplicadas. Distingue-se, entfo, entre lus Cogens e lus Dispo- sitivum, lus Cogens: 6 a rogra absoluta, Sua aplicagso nao depende da vontade das partes interessadas. # 0 caso do Direito Piiblico: “tus publicum privatorum pactis mutari non potest" (0 direito pitblico nao pode ser alterado por acordo entre particulares). 150 Jus Dispositivum: este Direito admitia a expressao da vontade dos particulares, as regras podiam ser modificadas ou postas de lado de acorclo com 0 desejo das partes. 3.4.3, Diviedo Basoada no Sujeito Dependendo da regra, se esta era aplicével a todos ou somente a alguns, os romanos distiguiam o Ius Commune do lus Singulare. Vlas Commune: & 0 conjunto de regras que regem de modo geral uma série de casos nocmais, fa rogra que opde-se a excegao. us Singulare: sao as regras que valem somente para uma ca- togoria de pessoas, grupos ou situagdes especifcas. 1 in. portante salientar que o fis Singulare nf 6 uina Geterminagas particular, vilida somente a uma pessoa. Esta situagao era chamada no Dizeito Romano de Privilegium ¢ nao tina o peso do tus Singular, 3.5. Capacidade Juridica de Gozo Capacidade juridica de gozo — chamada tamhém de ca- pacidade de direito ~ é @ aptidao do individuo para ser sujeito de Gireitos e obrigagées. Hoje em dia, na maioria dos paises do mun- do, todos tém capacidade de dirsito, mas em Roma nao era da mesma forma. Havia uma série de precondigées para que © homem tivesse capacidade juridica de gozo. Para ter completa capacidade de direito era necessario que a pessoa fosse livre (status libertatis), tivesse 0 Digesio 2.14.99, iva Lages de Gastro cidadania romana (status civitatis) ¢ fosse independente do pa poder de alguém (status familiae) 3.8.1, Status Libertatis Para ter capacidade Juridica o individuo tinha que ser livre, Escra- vos néo tinham direitos, nem privados nem piiblicos, exam apenas objeto de relagées juridicas. individuo podia ou nascer escravo ou tornar-se escravo. Neste liltimo caso a pessoa tornava-se escrava por aprisionamento em gucr ra, por disposicées penais ou, até a Lei Licinia Sextia (século IV a.C.), poderia tornar-so escrava pelo ndo-pagamento de uma divida. Polo Jus Civile antigo eram muitos os crimes pelos quais o indi- viduo poderia pagar com a escravidao como por exemplo se 0 cidadao néo aceitasse o recrutamento ou fugisse da obrigagao do censo. Nascia escravo o filo de oscrava; a situagao do pai nao era levada em conta, Segundo 0 Direito clissico, nascia escravo o fillio cuja mae fosse escrava na ocasiio do parto, mas, na épeca pés-classica, partin- do do principio de que o nascituro era considerado nascido, o filho nas- coria livre caso a mae houvesse sido livre em qualquer momento da gestagao, Escravos oram coisa (res) e, como tal, no possuiam personalida- de, estando sujeitos ao poder de seu senhor (dominica potestas); este podar, em sentido juridico, tinha carter absoluto, “Podemos comparar a dominica potestas a0 di- reito de propriodade em sou triplice aspecto de jus fruendi (direito de perceher 03 frutos 0 05 produtos da coisa ~ 0 fhe da muller escrava cra Jum produto), de ius utendi (direito de utilizar-se dda coisa) e de ius abutendi (diroito de dispar ou nao dispor, de alienar etc.)."131 © escravo ndo podia contrair matriménio legitimo e todos os bens adquiridos por ele pertenciam, a principio, ao senhor ("quodeumque per servum adquiritur id domino adquiritur” — tudo o que adquiriu pelo ‘escravo é do dono).%3? Entretanto, eta costume entre os romanos, prin TST GIOADAMI, 1, C. lstéeta de Homa...Op. cit, p-107. 132. Gato, Int 1. 52 i i | | cipalmente para escravos urbanos, permitir ao escravo ter um pe- culium, ou seja, ter a posse de alguns bons pelos quais poderiam desenvolver algum comércio ou servigo.129 Da mesma forma que uma pessoa poderia tomar-se escrava, ola também poderia deixar de sé-lo através da manumissao (manumissio ou datio libertatis). Esta era bastante comum em Roma, nao 6 porque com @ possibilidade da liberdade 0 escravo produzia mais, mas também porque a vaidade romana gostava muito de cortejos fanebres acompanhados pelos escravos manumitidos pelo defunto, A principio, eram apenas tds as {érmulas juridicas de libertago de um escravo: © censu (0 escravo era inscrito, com a permissio do dono, no registro censitario do censor), a vindicta (proceso judicial no qual se discutia a liberdade do escravo), testamento (0 escravo era lbertado em testamento, esta forma ja era reconhecicla na Lei das XI Tabuas). © pretor reconhecia outras formas de libertagio: a feita perante testemunhas (manumissio inter amicos), fazendo-se sentar 0 escravo & mesa (per mesa), por escrito (per epistulam) ou mosmo somente colocando o chapéu na cabega do escravo (per pileum). © escravo libertado, chamado liberto, nio tinha os mesmos direitos das pessoas que nunca estiveram na condigéo de escravos (estes cram chamados de ingénuos), seus direitos politicos eram limitados 0, ne campo do ditcito privado, 0 liberto encontrava-se na dependéncia do ex-dono, “Ingenui sunt, qui liberi nati sunt; libortini qui ex justa servitute manummissi sunt, ~ Sao ingénuos os que nasceram livres, libertos os que foram submetides a uma escravidio legal e, depois, alfortiados."194 3.5.2. Status Civieatis A cidadania romana era condigéo imprescindivel para a capa- cidade juridica plena. Os nao-cidadaos (nascer em Roma néo era garantia de cidadania) e os estrangeitos podiam ter propriedade, fazer testamento, por exemplo, mas pelas regras de sua cidade de origem, 155. Bra o caso de alguns escravos instruldos que eram profossores 134 Galo, Inst. 1.4.05. OO OOOOH OY OOOH OOH OOOHEHHHHOHHHHHHHEE livia Lages do Castro Somente os inimigos vencidos (peregrini dediticii) cujo direito ¢ inde- pendéncia nao tivessam sido reconhecidos pelos romanos estariam privados do uso de sou direito de origom. Era cidaddo aquele que nascia de casamento valido pelo ius civile, ou se a mae fosse de familia cidada. Podiam tomar-se cidadios os individuos ou poves que recebossem a cidadania por lei ou por vontade do imperador. A cidadania podia ser perdida através da Capitis Deminutio, que era a diminuiggo ou perda dos direito de cidadao. “Civili ratione capitis deminutio morti coaequatur” ~ no Direto Civil, a perda dla cidadania se ‘equipara a morte.1°5 3.8.3. Status Femiliae ‘Hoje em dia, a situacio do sujeito perante a fan de valor no que diz respeito a sua capacidade de direito; em Roma, era de suma importdncia esta posiglo, pois 0 status familiae determinava a capacidade. “Bete principio caracteristico leva-nos ao tempo em que as relagées juridicas intercorriam, nao entre individuos, mas entre grupos familiares (gentes) e portanto se referiam inteiramente a0 chefe de cada familia. "135 Para uma completa capacidade juridica de gozo era preciso que © individuo fesse independente do patrio poder (patria potestas) Dentro da organizagio familiar romana eram distintos dois tipos de pessoas: os sui juris ~ totalmente independentes, sem um pater~ familias - @ os alieni Juris ~ pessoas sujeitas ao poder de um pater familias. A independéncia do patrio poder nao tinha, necessariamente, relagtio com idade ou com o fato de se ter paternidade. Um recém-nas- cido, por exemplo, se nao tivesse ascedente masculino, era indepen- dente do pétrio poder. Em outro extremo, um ancido, com o pai ainda vivo e que nunea tivesse sido emancipado, era alien iuris, OS Gale nse 3,155, 136. CORREIA, Alowande; SCIACIA, Gaetano. Op. cit. p48. itia do Direto Geral ¢ Brash 0s alien juris nfo eram totalmente incapazes juridicamente. No que diz respeite aos direitos pablicos, tinham plena capacidade, po: diam votar e ser votados para as magistraturas (jus sulragii ¢ 1us Ho: norum), podiam participar do exército, No tocante aos direitos priva- dos, podiam casar-se (ius conubii), desde que obtivessem 0 consen- jmento de seu pater familias. No campo patrimonial, tudo o que o alien juris adquitia o fazia para o pator familias, ao contrario das obrigago2s assumidas pelo alien juris, pelas quais 0 pater familias somente respondia em casos ex- copcionais. O incividuo podia sair da condigtio de alien juris caso perdesse seu ascendente masculino direto por morte ou fosse emancipado. Poderia também, sondo sui juris, tornar-se alien juris por adogéo. 3.8.4, Causas Restritivas da Capacidade Juridica de Gozo Como visto anteriormente, a capacidade de direito nao era uma garantia vitalicia. Poderia ser perdida ou obtida, A perda poderia ser capitis deminutio maxima no caso de porda total da cidadania e, portanto, de todos os direitos, quando um individuo 10} cravo, por exemplo; poderia ser também captio deminutio media, quando 0 sujeito era desterrado e tornava-se um peregrinus, um sem-patria; e, por fim, poderia ser captio deminutio minima, no caso da possoa mudar sou status familiar por emancipagao, ad-rogagao ou adogao. ‘Todos os casos considerados nos pontos acima sao exclusives do sexo masculino, visto que a mulher néo era pe:mitida plena capacida- de, Elas nao tinham direitos pitblicos e sofriam restrigbes no Ambito do direito privado também. Como veremos mais adiante, elas nfo tinham direito ac patrio poder, nem & tutela @ tampouco podiam participar de tos solenes na qualidade de testemunhas. £ A capacidade juridica poderia ser restiita também por pena- idadles impostas em conseqiiéncia de atos ilcitos ou por questées religiosas que causavam impediments nos campos matrimoniais, testamentarios e hereditariedade, 3.6, Diteito de Familia O sentido de familia em Roma deve ser visto na sua multiplicidade no tempo ¢ no ensejo em que a palavra é utilizada, Em Direito Romano, livia Lages de Castro Hstéia do Dieito Geral o trast 4 palavra famitia pode ser aplicada tanto as coisas quanto as plena capacidade juridica de gozo, toda e qualquer coisa adquirida 0 pessoas.197 era para 9 pater familias. Por outro lado, se o alien iuris cometesse Aplicada as coisas, tem o sentido de indicar © conjunto de um algum delito, o pater familias poderia ressarcir 0 dano ou entrogar o atriménio, como, por exemplo, na expresso dimidium familiae, que filho para ser penalizada, : significa “metade do patriménio”, ou na expressio familia nistica, que indica 03 escravos rurais. Aplicada somente as pessoas ou a soma de essoas © coisas, familia significa, para os romanos, todos e tudo sob 0 oder do pater familias, A familia, relativamente a pessoas, pressupée parentesco e este, em Roma, poderia ter dois sentidos, um estritamente juridico, chamado agnatio, outro basicamente biolégico (ascendéncia comur), a cogna- tio. © parentesco juridico onglobava todos sob o poder de um mesmo ater familias, portanto este sé era transmitido pela linha paterna, pois somente homens poderiam ser pater familias. Por isso a agnatio era A principal fonte do péteio poder era © nascimento do flho om casamento tegitimo, “In potestata nostra sunt liber nostri, ques ox Justis nupelisprocreavimus" ~ Sob o nosso poder estao novos hikes, rocriados em um matrimdnio legitimo.138 A fllacgo legitima ong bresumida se o parto acontecesse, no minimo, canto’ eitenta dias da data om que o matrimonio fosso contra dias apés a dissolugdo do mesmo, : Enuretanto, oreconiecimento da criariga nascida ern casamentos lutidicamente reconhocidos depencia do pai, embota som este men, ‘hocimento patemo a patornidade pudesse ser definda juridicamnte ido ou, no maximo, trezentos ‘chamada também de cognatio viils, : através de uma agao especial..Os filhes fora do casamonto ¢ nao Durante a evelucao do Direito Romano, estes dois sentidos de paw; reconhecidos nao estavam sob 0 piitrio poder. * rentesco foram colocados, muitas vezas, em contraposigéo, 0 que garou Outra forma de aquisigéo do patrio poder éra°a adogio ‘que juridicamente a prevaléncia cada vez mais acentuada do principio do: comentaremos especificamente adiante. . Parentesco consangilineo em detrimento da agnagao, © patrio poder poderia ser extinto pela morte do pater famil morte alien iuris, a perda de cidadania ou liberdade do. pater famil 5 (0 que era edquiparado & morte), a adogao por outré do alien iuris, «ewan, ipagao do tho allen juris ou 6 easamento cum mani a filha, 3.6.1. O Patrio Poder A Histéria do Direito Romano muito tem a ver com 0 Paitrio Poder (patria potescas) exclusive do pater familias. Como uma balanga, quan- to maior era o poder do pater familias, menor era o poder do Estado e, | . conforme o tempo passou, esta balanga tendeu a dar a vitéria ao | © casamento, em uma sociedade que ge baseia to fortemento ~ Estado em detrimento do pater familias mesmo em sentido juridico,~ na familia é da mais-profanda importan Durante praticamente toda a Histéria do Direito Romano, 0 poder cia. Por isso, nas Novelas de Justiniano lomos: ‘nihil in rebus morcellum do pater familias exa absoluto, de vida e morte sobre todos sob sua perinde vencrandum est atque matrinionium” - Nada é tao veiorivel chefia. Sous filhos recém-nascidos podiam, por sua vontade, ser zhas instituiges humanas como o mateimnio:130 z deixados para morrer, ou, em qualquer idade, ser venciclos Justae Nuptiae ou Justum Matrimonitun eram teriaos usados para © poder do pater familias englobava varios pode: definir o casamento legitimo, juridicamente reconhecide pelo fus civil, potostas ~ sobre o3 filhos, a manus - sobre a esposa, a dominica potos Fara que 0 casamento fosse legitimo, era necessério o-contibio, que tas~ sobre os escravos o 0 mancipium - sobre pessoas liveas alien iuris pela detinigdo de Uipiano: que passaram de tum pater familias a outro pola venda, por exemple. 0 pitrio poder implicava, om termos patrimoniais, 0 direito amplo do pater familias. Como as pessoas sujeitas ao poder dele nio tinham 3.6.2. 0 Casamenta es: a patria ' i “Conubium est uxori iure ducendade facultas, Conubiuin habent cives romani cum civibus Td Taste, 1, 9, oe sem lamuls, que dative a eacears 129. Novella, 140, praefations, jamoste a palaa familia tem o 8 COCO OOOH CHOKCHUHHHHHHHEE eee uueueue livia tages de Castro Fomanis: cum latinis autem aut pregrini ita, si ‘concessim sit, Cum servis nullum est conubium"— Coniibio é a faculdacte de casar-se legalmente. Os cidados romanos tém contihic com os cidadéos romanos, com os latinos e os estrangeiros, quan- do lies foi permitide. Nao hé coniibio entre ‘escravos.140 Os romanos distinguiam duas espécies de casamento: 0 casa- mento cum manu e © casamento sine manu. No casamento cum manu ‘a mulher saia da dependéncia do seu préprio pater familias para entrar na dependéncia do marido ¢ do pater familias da familia do marido. Para que esta transferéncia ocorresse, era suposto um ato chamaca conventio in manu ou aquisigao da manus, do poder do marido sobre a mulher, Havia trés formas de a manus ser estabelecida: com a confarreatio (formalidade de cunho religioso muito utilizada na antiguidade da Histéria romana), a coomptio (venda formal da noiva ao noivo pelo Pater familias desta) e 0 usus (era baseado no principio de poder absoluto por posse prolongada e se dava quando 0 casal convivia maritalmente po: mais de um ano. O poder da manus, entrotanto, poclia Set evitado se a mulher se ausentasse de casa por trés noites saguidas Gurante 0 curso do ano). © casamento sine manu foi o que prevaleceu na Roma apés as Conquistas territoriais. Ele néo oferecia a possibilidade de sujeigao da mulher ao marido e esta podia continuar sob o poder de seu préprio Pater familias, conservando, portanto, os direitos sucessdrios de sus familia de origem, mas era mais condizente com o que se pensava acerca do que era 0 matriménio. © Historiador Pierre Grimal nos di ‘uma explicagao para tal ocorréncia: “A eriagio de um casamento sem manus, tao importante na evolugio dos costumes romanas, & atribulda pela tradigao aos decénvirus que em ‘meados do seculo V a.C, redigiram as leis das XU Tabuas; talvez seja até mais antiga, tenda os decénvirus se limitado a inctuir em seu cédigo um ‘estado de fato. Muito provavolmente esse regime HO iano, négutane 6, 54 100 ‘Mitéela do Dino Geral Brash {oj estabelecido para responder a sitmagées pri ticas que dificultavam a manutengio da auto: dade marital em todo o seu rigor. Ae que parece autorizagao para realizar casamentes legitimos centre patricios e plebeus, oficialmente concedida pela Lex Canuileja om 445 a.C., tem relagao com 0 abrandamento do vello matriménio patriareal, do imaginar que o pai de uma jovem patticia se Tecusasse a transmitir sua autoridade ao marido plebeu que ela pudesse ser Ievada a esposar, & que nao era seu igual, polo menos aos olhes dos douses,"141 Para os romanos o matriménio era, antes de tudo, um ato consen. sual de continua convivéneia. Era um fato (ree facti) e nao wma res juri (um estado de diveito). Neste sentido os juristas romanos afirmavam: “Coitus matrimonium non facit, sed maritalis aifectio.”~ Nao é a cépula om si, mas o afeto ma. ital que constitui o matriménio, 2 “Matrimoniuin inter invitos non contrahitur." — Nao se contiai mattimdnio entre quem nao cet consenso,143 Esta nogio de consentimento, no inicio da histéria romana , pos- teriormente, para o que diz respeito ao primeiro casamento da moga, era bastante limitado para ola. Conforme a Digesta de Justiniano indica: “A moca que nfo se ope explicitamente & von- tade do pai é considerada concorde. $6 sc permite que uma jovem tenha opinido diferente daquela que de seu pai quando este esrollse pars Set noivo um homem indigno ow portador de alguma tara," M41. GROMAL, 7 0 amor em Roma. Sio Po: Mating Fates, 199%, p. hs 142 Uipiano, Dig. 241.218, W43.Geteo Dig 22,2 22, MA Digesto apud GHIMAL, P Op. ci. p.1 uivia Lagos de Cast0 ‘A questo que vale a pona levantar é como uma menina poderia obter informagées sobre seu noivo ou como teria forgas para desatiar o pai, mesmo seu noivo sendo um contuinaz apreciador de contatos moralimente discutiveis? (O casamento era permitido para rapazes a partir dos quatorze anos @ para mogas a partir do doze, mas 0 noivado poderia ocorrer antes dosta idade e no raramente, no caso das meninas, havia a consumagéo pela coabitagao com 0 noive, mesmo antes do casamento. “para designar a jovem que em fungao da idade nao podia ser considerada legalmente casada ‘mas fisicamente j4 eva esposa, os juristas tsam pperiftases coma in domum deducta, ‘aquela que foi conduzida & casa’, ou Joce nuptae, ‘aquela que tem posigao e fungto de esposa."245 ‘A justificativa para tal ago, que nés hoje considerariamos pedofilia e condenarlamos com veeméncia, nao ¢ menos nobsre que ‘ato, Plutarco, escrevendo sobre a vida de Numa, afirma que seu hersi & louvavel por ter autorizado os romanos a asposarem meninas de doze anos ou até menos porque assim, ele afirma, a “noiva traz a maior pureza posisivel no compe e no cardter” ¢, desta maneira, as mulheres ficariam moldadas aos seus esposos. 146 Havia uma série de impedimentos para o casamento ontre as quais podemos listar: a loucura, a consangiiinidade (em linha reta sem restrig6es e na linha colateral até o terceiro grau), 0 parentesco adotivo, a diferenga de “camadas sociais" (libertos e ingénuos ou qualquer unt com uma mulher “infame”, por exemplo), condigao de soldado em campanha, ser tutor e pupila, o fato de ja ser casado (a). ‘0 iiltimo impedimento apontado impée juridicamente a monoga- ‘mia para © casamento romano, mas, de fato, esta monogamia era rela- tiva, visto quo nao era rara a presenga de concubinas dentro de casa ¢ S adultério ora somente mal visto ¢ criminose para a esposa. Nas pala- ‘ras do Consor Catao: “Se surpreendesses sua mulher em adultério, pocerias maté-la som julgamento e impunemen- “GAIREAL, # Op itp. 95, 1M. dbider, passim. isin do Dito Gatate Brash te; mas se cometesses adultério (..) ela nao ‘usaria tocay-to nem com a ponta de dedo, e alids no teria tal diteito."147 3.6.3. 0 Divércio O casamento na Histéria de Roma jamais foi indissolivel. Mesmo porque, se um povo considera que 0 matriménio basela-se no con- sentimento, ainda que relativo, a indissolubilidade deste é inimaginé- vel. Somente na época dos Imperadores cristéos foram introduzidas limitagSes ao divércio, mas sem nunca aboli-lo, Ja 0 Direito Romano arcaico previa o divércio. Ele era praticado através de formas solenes: a diffarreatio © a remantipatio. No casa- mento sine manu, essa dissolugio era ainda mais facil. Podia ocorrer através do divortium comuni consensu se houvesse acordo entre as partes, ou por repudium, no caso de vontade unilateral. No inicio da Historia romana o divércio somente podia ocorrer por vontade do marido, mesmo assim se ole convocasse o ‘Tribunal Familiar @, portanto, tivesse algo contra a esposa. Esta por sua vez somente descasava-se no caso de perda da cidadania do esposo; ¢ importante notar que néo era, neste caso, divércio, mas, sim, dissolugio do casamento. Com o passar do tempo as justificativas dadas ao Tribunal Familiar eram cada vez mais tolas e passou a sor possivel o divércio sem qual- quer motivo, O casamento sine manu dew 4s mulheres a mesma possi- bilidade, © historiador Carcopino, muitas vezes um tanto moralista, lamenta a possibilidade de miltiplos divorcios entre os romanos, indicando que muitas vezes eles eram ocasionados por interesse. Na época de Cicero, 0 divércio pelo con- sentimento dos cénjuges ou pela vontade de um 56 tomou-se moda corrente das relagdes familiares, J velho, Sila casou-se pela quinta vez com uma jovem divorciada, Valéria, meta irma do orador Horténsio. Duas vezes vitivo (...) Pompeu divorciou-se duas vozes, antes da primeira © depois da segunda: de Antistia, cuja mae havia padido para obter 0 favor do pretor, do qual Te” EATAO spud GAEMAL, # Op. cle. p17 103 — RA 4444494440444 9~- © © OOOH OOOO OOOOH OOOESCOHHHOHEHOHHHHHE iva Lagee de Castro dopendia a posse de sua imensa fortuna paterna, ‘mas cujas amizades ameacavam projudiear Ihe a arreira politica; e de Micia, cuja conduta deixara ‘a desejar durante a longa auséncia do mario em campanhas além-mar. Viéwo de Cornélia, César repudiou Pompéia a quem esposara apés a more de Cina, pela simples razdo de que, ombora inocente, a mulher de César nio deveria ser sus- eita. O virtuoso Catdo, 0 jovem, soparou-se de Marcia © néo se envergonhou de esposi-la nova mente quando a fortuna que ela possua somo 50 ade Horténsio, com quem Marcia entromentes ccasara-se @ co qual era vita (..)."148 3.6.4. 0 Dote ODote é uma instituigiio que até poucos séculos atris era primo: dial para a realizagao de um casamento.™9 Ele pode ser definido como © conjunto de bens que a noiva, por si mesma ou através de outros, traz Para o marido para custentar 0 énus do matriménio. Estes bens so dados ao marido para que este os administre e, conforme o Direito Romano evoluiu, quando da dissolugao do casamen. to aste deveria ser devolvide, ‘Sao modos de constituigao do dote a dotis datio (efetiva entrega de bens ao mario), a dotis dictio (promessa de entrega), a dotis pre- missio (consta de uma stipulatio, em virtude da qual o constituinte d> ote se obriga a transeferir os bens posteriormente, substituiu a otis dictio). 3.6.8. A Adogao A adogao em Roma era corriqueira e bastante aceita pela socie- dade; alias, esta era considerada uma forma de imitar a natureza no tocante & procriagdo. “Adoptio est legitimus actus, naturam imitans, qui liberos nobis quaerimus." — A adogio 6 um ato legal, que imita a natu- reza, com 0 qual podemos adotar filhos como seus.150 4 CARCOPINO, J. Roma no apogeu! do Impérlo, Sho Paul: Ci. das Letias/Citeto do ‘ier, 1990, p. 121 149 Emaigumas sociedados atts dote sina & pressupasto pata 6 easamento. 380 Insta 1s 1 10% ‘Histéta da Dieto Geral Bratt Para a adogao em Roma havia duas formas: a adrogatio e a adoptio. A adrogatio era a adogéio de um pater familias por outro (le vando, obviamente, todos 05 seus dependentes e seu patriménio), @ adoptio era a adogao de um individuo sui juris. Para a adocao nao havia limite de idade, mas exigia-se que 0 adotante fosse mais velho que o adotado. “Adoptio naturam imitatur et pro monstro est, ut maior sit filius quam pater" ~ A adogao imita a natureza: seria monstruoso que 0 filho fosse mais velho que o pai.'51 As mulheres era proibido adotar a néo ser quando perdiam seus r6prios fillos e obtinham permissao especial para isso: *Feminae adoptare non possunt, quia nec natu: rales liberes in sua potestate habent: sed ex indul géntia principis in solatium iberorum amissorum, ossunt." — As mulheres nfo podem adotar, poi tampouco tém sob seu poder os filhos naturais: todavia, por indulgéncia do principe e para con- soto dos fithos perdidos, o podem,%52 3.7, Twtela e Curatela Tanto a tutela quanto a curatela tém por finalidade dar meios para que uma pessoa sem condigses de fa26-lo sozinha possa ter os seus bens cuidados. Desta forma, podomos afirmar que ambas tém relagio com 0 problema de capacidade para a pritica de atos juridicos.159 A tutela existia pela incapacidade por idade ot sexo ¢ visava proteger os interesses da familia. A curatola visava cuidar de interes. ‘ses patrimoniais em casos excepcionais de incapacidade como loucura, prodigalidade ete. 3.7.1. Tatela Podiam ficar sob tutela os impiberes ¢ as mulheres su juris. 0 tutor podia ser um parente agnaticio proximo (tutela legitima), ou ser nomeado por testamento (tutela testamentiiria) ou ainda ser nomeacio pelo pretor (tutor dativus). Uma mulher no poderia ser tutora a nao ser em casos excepeionais 361 Mma 3,13, 4 382 Inatita 111! 30 1ST MARIE. Op. eit p. 108,

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