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ail DA PERFEICAO MORAL 1. As virtudes e os vicios. - 2. Paixdes. - 3. O egoismo. - 4. Caracteres do homem de bem. - 5. Conhecimento de si mesmo. As virtudes e os vicios 893. Qual a mais meritéria de todas as virtudes? “Toda virtude tem seu mérito préprio, porque todas indicam progresso na senda do bem. Hé virtudes sempre que ha resisténcia voluntéria ao arrastamento dos maus pendores. A sublimidade da virtude, porém, esté no sacrificio do interesse pessoal, pelo bem do proximo, sem pensamento oculto. A mais meritéria € a que assenta na mais desinteressada caridade.”” 894. Hé pessoas que fazem 0 bem espontaneamente, sem que precisem vencer quaisquer sentimentos que thes sejam opostos. Terao tanto mérito, quanto as que se véem na contingéncia de lutar contra a natureza que Ihes é prépria e a vencem? “S6 ndo tém que lutar aqueles em quem jé ha progresso realizado. Esses lutaram outrora e triunfaram, Por isso é que os bons sentimentos nenhum esforgo Ihes custam e suas ages thes parecem simplissimas. O bem se Ihes tornou um habito. Devidas Ihes sio as honras que se costumam tributar a velhos guerreiros que conquistaram seus altos postos, 412 PARTE 3* - CAPITULO XII “Como ainda estais longe da perfeigdo, tais exemplos vos espantam pelo contraste com 0 que tendes a vista e tanto mais os admirais, quanto mais raros sio. Ficai sabendo, porém, que, nos mundos mais adiantados do que 0 vosso, constitui a regra 0 que entre v6 representa a excego. Em todos os pontos desses mundos, 0 sentimento do bem é espontineo, porque somente bons Espiritos os habitam. L4, uma s6 intengo maligna seria monstruosa excecio. Eis por que neles os homens so ditosos. © mesmo se dard na Terra, quando a Humanidade se houver transformado, quando compreender e praticar a caridade nna sua verdadeira acepeao. 895. Postos de lado os defeitos ¢ os vicios acerca dos quais ninguém se pode equivocar, qual o sinal mais caracteristico da imperfei¢do? “O interesse pessoal. Freqiientemente, as qualidades morais so como, num objeto de cobre, a douradura que nao resiste a pedra de toque. Pode um homem possuir qualidades reais, que levem 0 mundo a considerd-lo homem de bem. Mas, essas qualidades, conquanto assinalem um progresso, nem sempre suportam certas provas ¢ as vezes basta que se fira a corda do interesse pessoal para que o fundo fique a descoberto. O verdadeiro desinteresse & coisa ainda tio rara na Terra que, quando se patenteia todos o admiram como se fora um fenémeno. “O apego as coisas materiais constitui sinal notério de inferioridade, porque, quanto mais se aferrar aos bens deste mundo, tanto menos compreende o homem o seu destino. Pelo desinteresse, ao contrario, demonstra que encara de um ponto mais elevado o futuro.” 896. Ha pessoas desinteressadas, mas sem discernimento, que prodigalizam seus haveres sem utilidade real, por thes néo saberem dar emprego criterioso. Tém algum merecimento essas pessoas? “Tém o do desinteresse, porém ndo o do bem que poderiam fazer. O desinteresse & uma virtude, mas a prodigalidade irrefletida constitui sempre, pelo menos, 413 DA PERFEICAO MORAL falta de juizo. A riqueza, assim como no é dada a uns para ser aferrolhada num cofte forte, também nao o ¢ a outros para ser dispersada ao vento, Representa um depésito de que uns & outros terdo de prestar contas, porque terdo de responder por todo o bem que podiam fazer no fizeram, por todas as lagrimas que podiam ter estancado com o dinheiro que deram aos que dele nao precisavam.” 897. Merecerd reprovacao aquele que faz o bem, sem visar a qualquer recompensa na Terra, mas esperando que the seja levado em conta na outra vida e que ld venha a ser melhor a sua situacdo? E essa preocupacao lhe prejudicard 0 progresso? “O bem deve ser feito caritativamente, isto é, com desinteresse, a) - Contudo, todos alimentam o desejo muito natural de progredir, para forrar-se @ penosa condigao desta vida. Os préprios Espiritos nos ensinam a praticar 0 bem com esse objetivo. Serd, entdo, wn mal pensarmos que, praticando 0 bem, podemos esperar coisa methor do que temos na Terra? “Nao, certamente; mas aquele que faz. o bem, sem idéia preconcebida, pelo sé prazer de ser agradavel a Deus e ao seu préximo que sofie, jd se acha num certo grau de progresso, que Ihe permitiré alcangar a felicidade muito mais depressa do que seu irmo que, mais positivo, faz 0 bem por célculo ¢ nao impelido pelo ardor natural do seu coragao.” (894) b) - Nao haverdé aqui uma distincdo a estabelecer-se entre o bem que podemos fazer ao nosso préximo e 0 cuidado que pomos em corrigir-nos dos nossos defeitos? Concebemos que seja pouco meritério fazermos o bem com a idéia de que nos seja levado em conta na outra vida; mas serd igualmente indicio de inferioridade emendarmo-nos, vencermos as nossas paixdes, corrigirmos 0 nosso caréter, com o propésito de nos aproximarmos dos bons Espiritos e de nos elevarmos? 414 PARTE 3* - CAPITULO XII jo, no. Quando dizemos - fazer 0 bem, queremos significar - ser caridoso, Procede como egoista todo aquele que calcula o que Ihe possa cada uma de suas boas ages render na vida futura, tanto quanto na vida terrena, Nenhum egoismo, porém, hd em querer © homem melhorar-se, para se aproximar de Deus, pois que & o fim para o qual devem todos tender.” 898. Sendo a vida corpérea apenas uma estada temporéria neste mundo e devendo 0 futuro constituir objeto da nossa principal preocupacdo, serd til nos esforcemos por adquirir conhecimentos cientificos que sé digam respeito ds coisas e as necessidades materiais? “Sem divida, Primeiramente, isso vos pde em condigdes de auxiliar os vossos depois, 0 vosso Espirito subir mais depressa, se jé houver progredido em inteligéncia. Nos intervalos das encarnagées, aprendereis numa hora o que na Terra vos exigiria anos de aprendizado. Nenhum conhecimento & initil; todos mais ou menos contribuem para o progresso, porque o Espirito, para ser perfeito, tem que saber tudo, ¢ porque, cumprindo que © progresso se efetue em todos os sentidos, todas as idéias adquiridas ajudam 0 desenvolvimento do Espirito.” 899. Qual 0 mais culpado de dois homens ricos que empregam exclusivamente em gozos pessoais suas riquezas, tendo um nascido na opuléncia e desconhecido sempre a necessidade, devendo 0 outro ao seu trabalho os bens que possui? “Aquele que conheceu os sofrimentos, porque sabe o que é softer. A dor, a que nenhum alivio procura dar, ele a conhece; porém, como freqiientemente sucede, jé dela se nao lembra.” 900. Aquele que incessantemente acumula haveres, sem fazer 0 bem a quem quer que seja, acharé desculpa, que vatha, na circunstdncia de acumular com o fito de maior soma legar aos seus herdeiros? “£ um compromisso com a consciéneia mé.” 41s DA PERFEICAO MORAL 901. Figuremos dois avarentos, um dos quais nega a si mesmo 0 necessdrio ¢ morre de miséria sobre o seu tesouro, ao passo que 0 segundo sé 0 ¢ para os outros, mostrando- se prédigo para consigo mesmo; enquanto recua ante o mais ligeiro sacrificio para prestar um servigo ou fazer qualquer coisa til, nunca julga demasiado 0 que dependa para satisfazer aos seus gastos ou ds suas paixdes. Peca-se-the um obséquio e estaré sempre em dificuldade para fazé-lo; imagine, porém, realizar uma fantasia e teré sempre o bastante para isso. Qual 0 mais culpado e qual 0 que se acharé em pior situagdo no mundo dos Espiritos? “O que goza, porque & mais egoista do que avarento, O outro jar castigo.” peu parte do seu 902. Serd reprovavel que cobicemos a riqueza, quando nos anime o desejo de fazer o bem? “Tal sentimento 6, no ha divvida, louvavel, quando puro. Mas, sera sempre bastante desinteressado esse desejo? Nao ocultaré nenhum intuito de ordem pessoal? Nao seri de fazer © bem a si mesmo, em primeiro lugar, que cogita aquele, em quem tal desejo se manifesta?” 903. Incorre em culpa o homem, por estudar os defeitos alheios? “Incorrerd em grande culpa, se o fizer para os criticar e divulgar, porque serd faltar com a caridade. Se o fizer, para tirar dai proveito, para evité-los, tal estudo poderd ser-the de alguma utilidade. Importa, porém, no esquecer que a indulgéncia para com os defeitos de outrem é uma das virtudes contidas na caridade. Antes de censurardes as imperfeigdes dos outros, vede se de vés no poderio dizer 0 mesmo. Tratai, pois, de possuir as qualidades opostas aos defeitos que criticais no vosso semelhante, Esse 0 meio de vos tornardes superiores a ele. Se Ihe censurais a ser avaro, sede generosos; se o ser orgulhoso, sede humildes ¢ modestos; se o ser éspero, sede 416 PARTE 3* - CAPITULO XII brandos; se 0 proceder com pequenez, sede grandes em todas as vossas agdes. Numa palavra, fazei por maneira que se nio vos possam aplicar estas palavras de Jesus: Vé 0 argueiro no olho do seu vizinho ¢ ndo vé a trave no seu proprio.” 904. Incorrerd em culpa aquele que sonda as chagas da sociedade e as expe em piiblico? “Depende do sentiment que © mova. Se o escritor apenas visa produzir escindalo, no faz mais do que proporcionar a si mesmo um gozo pessoal, apresentando quadros que constituem antes mau do que bom exemplo. © Espirito aprecia isso, mas pode vir a ser punido por essa espécie de prazer que encontra em revelar o mal.” a) - Como, em tal caso, julgar da pureza das intengées e da sinceridade do eseritor? “Nem sempre ha nisso utilidade, Se ele escrever boas coisas, aproveitai-as. Se proceder mal, é uma questio de consciéncia que the diz respeito, exclusivamente. Demais, se 0 escritor tem empenho em provar a sua sinceridade, apdie o que disser nos exemplos que dé.” 905. Alguns autores hao publicado belissimas obras de grande moral, que auxiliam © progresso da Humanidade, das quais, porém, nenhum proveito tiraram eles, Ser-lhes-é levado em conta, como Espiritos, 0 bem a que suas obras hajam dado lugar? “A moral sem as agdes é 0 mesmo que a semente sem o trabalho. De que vos serve a semente, se no a fazeis dar frutos que vos alimentem? Grave é a culpa desses homens, porque dispunham de inteligéncia para compreender. Nao praticando as maximas que ofereciam aos outros, renunciaram a colher-Ihes os frutos.” 906. Serd passivel de censura 0 homem, por ter consciéncia do bem que faz e por confessé-lo a si mesmo? “Pois que pode ter consciéneia do mal que pratica, do bem igualmente deve t@-la, a fim de saber se andou aly DA PERFEICAO MORAL bem ou mal. Pesando todos os seus atos na balanga da lei de Deus ¢, sobretudo, na lei de justiga, amor e caridade, € que poderé dizer a si mesmo se suas obras so boas ou mas, que as poderd aprovar ou desaprovar. Nao se The pode, portanto, censurar que reconhega haver triunfado dos maus pendores e que se sinta satisfeito, desde que de tal ndo se envaidega, porque ento cairia noutra falta.” (919) Paixdes 907. Serd substancialmente mau o principio origindrio das paixdes, embora esteja na Natureza? io; a paixio esti no excess de que se acresceu a vontade, visto que o principio que Ihe da origem foi posto no homem para o bem, tanto que as paixdes podem levé-lo & realizagdo de grandes coisas. O abuso que delas se faz que causa o mal.” 908. Como se poderd determinar o limite onde as paixdes deixam de ser boas para se tornarem mds? “As paixdes sio como um corcel, que s6 tem utilidade quando governado e que se tora perigoso desde que passe a governar. Uma paixio se toma perigosa a partir do momento em que deixais de poder governé-la e que di em resultado um prejuizo qualquer para vés mesmos, ou para outrem.” As paixdes so alavancas que decuplicam as forgas do homem e 0 auxiliam na dos designios da Providéncia, Mas, se, em vez de as dirigir, deixa que elas dirijam, cai o homem nos excessos e a prépria forga que, manejada pelas suas mis, poderia produzir o bem, contra ele se volta e 0 esmaga. Todas as paixdes tém seu prinefpio num sentimento, ou numa necessidade natural. © principio das paixdes no é, assim, um mal, pois que assenta numa das condigdes providenciais da nossa existéncia. A paixdo propriamente dita & a exageragio de uma necessidade ou de um sentimento, Est no excesso e niio na causa e este excesso se torna um mal, quando tem como conseqiiéncia um mal qualquer. 418 PARTE 3* - CAPITULO XII Toda paixdo que aproxima o homem da natureza animal afasta-o da natureza espiritual. Todo sentimento que eleva o homem acima da natureza animal denota predominancia do espirito sobre a matéria ¢ 0 aproxima da perfeigao. 909. Poderia sempre o homem, pelos seus esforcos, vencer as suas mas inclinagdes? “Sim, ¢, freqiientemente, fazendo esforgos muito insignificantes. O que Ihe falta é a vontade. Ah! Quao poucos dentre vés fazem esforgos!” 910. Pode 0 homem achar nos Espiritos eficaz assisténcia para triunfar de suas paixdes? “Se o pedir a Deus e ao seu bom génio, com sinceridade, os bons Espiritos the virdo certamente em auxilio, porquanto é essa a miso deles.” (459) 911. Nao haveré paixdes tao vivas e irresistiveis, que a vontade seja impotente para domind-las? “H& muitas pessoas que dizem: Quero, mas a vontade s6 Ihes esté nos labios Querem, porém muito satisfeitas ficam que nao seja como “querem”. Quando o homem eré que nao pode vencer as suas paixdes, é que seu Espirito se compraz nelas, em conseqiiéncia da sua inferioridade, Compreende a sua natureza espiritual aquele que as procura reprimir. Vencé-las é, para ele, uma vitéria do Espirito sobre a matéria.” 912. Qual 0 meio mais eficiente de combater-se 0 predominio da natureza corpérea? “Praticar a abnegagao.”” © egoismo 913. Dentre os vicios, qual 0 que se pode considerar radical? “Temo-lo dito muitas vezes: 0 egoismo. Dat deriva todo mal. Estudai todos os vicios € vereis que no fundo 419 DA PERFEICAO MORAL de todos ha egoismo. Por mais que thes deis combate, nao chegareis a extirpd-los, enquanto no atacardes o mal pela raiz, enquanto nao lhe houverdes destruido a causa, Tendam, pois, todos os esforgos para esse efeito, porquanto ai é que esti a verdadeira chaga da sociedade. Quem quiser, desde esta vida, ir aproximando-se da perfeigdo moral, deve expurgar 0 seu coragdo de todo sentimento de egoismo, visto ser o egofsmo incompativel com a justica, 0 amor e a caridade. Ele neutraliza todas as outras qualidades.” 914, Fundando-se 0 egoismo no sentimento do interesse pessoal, bem dificil parece extirpd-lo inteiramente do coracdo humano. Chegar-se-d a consegui-lo? “A medida que os homens se instruem acerca das coisas espirituais, menos valor dio s, necessirio é que se reformem as instituigdes humanas que 0 entretém e excitam, Isso depende da educagao.” 915. Por ser inerente & espécie humana, 0 egoismo no constituird sempre um obstaculo ao reinado do bem absoluto na Terra? “BE exato que no egoismo tendes 0 vosso maior mal, porém ele se prende a inferioridade dos Espiritos encamados na Tera e nao 4 Humanidade mesma. Ora, depurando-se por encamagdes sucessivas, os Espititos se despojam do egoismo, como de suas outras impurezas. Ndo existird na Terra nenhum homem isento de egoismo e praticante da caridade? HA muito mais homens assim do que supondes. Apenas, nio os conhecei porque a virtude foge A viva claridade do dia, Desde que haja um, por que no havers de7? Havendo dez, por que no havera mil ¢ assim por diante? 916. Longe de diminuir, 0 egoismo cresce com a civilizagdo, que, até, parece, 0 excita e mantém. Como poderé a causa destruir 0 efeito? “Quanto maior € 0 mal, mais hediondo se toma. Era preciso que 0 egoismo produzisse muito mal, para que 420 PARTE 3* - CAPITULO XII compreensivel se fizesse a necessidade de extirpé-lo. Os homens, quando se houverem despojado do egoismo que os domina, viverio como irmios, sem se fazerem mal algum, auxiliando-se reciprocamente, impelidos pelo sentimento miituo da solidariedade, Entao, 0 forte sera o amparo e no o opressor do fraco e nio mais serdo vistos homens a quem falte 0 indispensdvel, porque todos praticardo a lei de justica. Esse o reinado do bem, que os Espiritos estdo incumbidos de preparar.” (784) 917. Qual 0 meio de destruir-se 0 egoismo? “De todas as imperfeigdes humanas, 0 egofsmo & a mais dificil de desenraizar-se porque deriva da influéneia da matéria, influéncia de que o homem, ainda muito proximo de sua origem, niio pode libertar-se e para cujo entretenimento tudo concorre: suas leis, sua organizagao social, sua educagdo, O egoismo se enfraquecera 4 proporgdo que a vida moral for predominante sobre a vida material e, sobretudo, com a compreensio, que o Espiritismo vos faculta, do vosso estado futuro, real e ndo desfigurado por ficgdes alegéricas. Quando, bem compreendido, se houver identificado com os costumes ¢ as crengas, o Espiritismo transformard os habitos, os usos, as relagdes sociais. © egoismo assenta na importincia da personalidade, Ora, 0 Espiritismo, bem compreendido, repito, mostra as coisas de tao alto que © sentimento da personalidade desaparece, de certo modo, diante da imensidade. Destruindo essa importincia, ou, pelo menos, reduzindo-a as suas legitimas proporgdes, ele necessariamente combate o egoismo. “O choque, que o homem experimenta, do egofsmo os outros & o que muitas vezes faz egoista, por sentir a necessidade de colocar-se na defensiva. Notando que os outros pensam em si préprios e nao nele, ei-lo levado a ocupar-se consigo, mais do que com os ‘outros. Sirva de base as instituigdes sociais, as relagdes legais de povo a povo e de homem a homem o principio da caridade e da fraternidade ¢ cada um pensard menos na sua pessoa, assim veja que outros nela pensam, Todos experimen- 421 DA PERFEICAO MORAL taro a influéneia moralizadora do exemplo e do contacto. Em face do atual extravasamento de egoismo, grande virtude & verdadeiramente necessaria, para que alguém renuncie & sua personalidade em proveito dos outros, que, de ordindrio, absolutamente The ndo agradecem. Principalmente para os que possuem essa virtude, é que 0 reino dos céus se acha aberto. A esses, sobretudo, & que esta reservada a felicidade dos eleitos, pois em verdade vos digo que, no dia da justiga, sera posto de lado e sofrerd pelo abandono, em que se ha de ver, todo aquele que em si somente houver pensado.” (785) FENELON Louvaveis esforgos indubitavelmente se empregam para fazer que a Humanidade progrida. Os bons sentimentos so animados, estimulados e honrados mais do que em qualquer outra época. Entretanto, 0 egoismo, verme roedor, continua a ser a chaga social, E um mal real, que se alastra por todo 0 mundo e do qual cada homem é mais ou menos vitima, Cumpre, pois, combaté-lo, como se combate uma enfermidade epidémica, Para isso, deve-se proceder como procedem os médicos: ir 4 origem do mal. Procurem-se em todas as partes do organismo social, da familia aos povos, da choupana ao palicio, todas as caus: todas as influéncias que, ostensiva ou ocultamente, excitam, alimentam ¢ desenvolvem o sentimento do egoismo. Conhecidas as causas, 0 remédio se apresentara por si mesmo. Sé restaré entdo destrui-las, sendo totalmente, de uma s6 vez, ao menos parcialmente, e 0 veneno pouco a pouco sera eliminado. Poder ser longa a cura, porque numerosas so as causas, mas no é impossivel. Contudo, ela s6 se obterd se mal for atacado em sua raiz, isto €, pela educagdo, no por essa educagdo que tende a fazer homens instruidos, mas pela que tende a fazer homens de bem. A educagio, convenientemente entendida, constitui a chave do progresso moral. Quando se conhecer a arte de manejar os caracteres, como se conhece a de manejar as inteligéncias, conseguir-se-4 corrigi-los, do mesmo modo que se aprumam plantas novas. Essa arte, porém, exige muito tato, muita experiéncia e profunda observagao. E. grave erro pensar-se que, para exereé-la com proveito baste 0 conhecimento da Ciéncia. Quem acompanhar, assim 0 filho do rico, como o do pobre, desde o instante 422 PARTE 3* - CAPITULO XII do nascimento, o observar todas as influéncias perniciosas que sobre eles atuam, em conseqiiéncia da fraqueza, da incéria e da ignorancia dos que os dirigem, observando igualmente com quanta freqiiéncia falham os meios empregados para moralizd-los, no poderd espantar-se de encontrar pelo mundo tantas esquisitices. Faga-se com o moral o que se faz com a inteligéncia e ver-se-4 que, se hd naturezas refratarias, muito maior do que se julga é 0 mimero das que apenas reclamam boa cultura, para produzir bons frutos. (872) © homem deseja ser feliz e natural o sentimento que dé origem a esse desejo. Por sso & que trabalha incessantemente para melhorar a sua posi¢do na Terra, que pesquisa as causas de seus males, para remedié-los. Quando compreender bem que no egoismo reside ‘uma dessas causas, a que gera o orgulho, a ambicdo, a cupidez, a inveja, 0 ddio, o citime, que a cada momento 0 magoam, a que perturba todas as relagdes sociais, provoca as dissensdes, aniquila a confianga, a que o obriga a se manter constantemente na defensiva contra o seu vizinho, enfim a que do amigo faz. inimigo, ele compreendera também que esse vicio € incompativel com a sua felicidade e, podemos mesmo acrescentar, com a sua propria seguranca, E quanto mais haja softido por efeito desse vicio, mais sentiré a necessidade de combaté-lo, como se combatem a peste, os animais nocivos ¢ todos os outros flagelos. © seu préprio interesse a isso o induzird. (784) © egoismo é a fonte de todos os vicios, como a catidade 0 & de todas as virtudes. Destruir um e desenvolver a outra, tal deve ser 0 alvo de todos os esforgos do homem, se quiser assegurar a sua felicidade neste mundo, tanto quanto no futuro. Caracteres do homem de bem 918. Por que indicios se pode reconhecer em um homem o progresso real que the elevaré o Espirito na hierarquia espirita? “O espirito prova a sua elevagio, quando todos os atos de sua vida corporal representam a pritica da lei de Deus ¢ quando antecipadamente compreende a vida espiritual.” 423 DA PERFEICAO MORAL Verdadeiramente, homem de bem é o que pratica a lei de justiga, amor e caridade, na sua maior pureza. Se interrogar a propria consciéncia sobre os atos que praticou, perguntard se nao transgrediu essa lei, se ndo fez o mal, se fez todo o bem que podia, se ninguém tem motivos para dele se queixar, enfim se fez aos outros o que desejara que Ihe fizessem Possuido do sentimento de caridade e de amor ao préximo, faz 0 bem pelo bem, sem contar com qualquer retribuigao, e sacrifica seus interesses & justiga. E bondoso, humanitirio ¢ benevolente para com todos, porque vé irmaos em todos. os homens, sem distingo de ragas, nem de crengas. Se Deus lhe outorgou 0 poder e a riqueza, considera essas coisas como UM DEPOSITO, de que the cumpre usar para o bem. Delas niio se envaidece, por saber que Deus, que Ihas deu, também Ihas pode retirar. Se sob a sua dependéncia a ordem social colocou outros homens, trata-os com bondade e complacéncia, porque sdo seus iguais perante Deus. Usa da sua autoridade para Ihes levantar o moral e nao para os esmagar com seu orgulho. E indulgente para com as fraquezas alheias, porque sabe que também precisa da indulgéncia dos outros e se lembra destas palavras do Cristo: Atire a primeira pedra aquele que estiver sem pecado. Nio é vingativo. A exemplo de Jesus, perdoa as ofensas, para s6 se lembrar dos (08, pois nao ignora quecomo houver perdoado, assim perdoado Ihe seré Respeita, enfim, em seus semelhantes, todos os direitos que as leis da Natureza Ihes concedem, como quer que os mesmos direitos Ihe sejam respeitados. Conhecimento de si mesmo 919. Qual 0 meio pritico mais eficaz que tem 0 homem de se methorar nesta vida e de resistir @ atragao do mal? “Um sabio da antigitidade vo-lo disseConhece-te a ti mesma” a) - Conhecemos toda a sabedoria desta maxima, porém a dificuldade esté precisamente em cada um conhecer-se a si mesmo. Qual o meio de consegui-lo? 424 PARTE 3* - CAPITULO XII “Fazei o que eu fazia, quando vivi na Terra: ao fim do dia, interrogava a minha consciéncia, passava revista ao que fizera e perguntava a mim mesmo se nfo faltara a algum dever, se ninguém tivera motivo para de mim se queixar. Foi assim que cheguei a me conhecer ea ver o que em mim precisava de reforma, Aquele que, todas as noites, evocasse todas as agdes que praticara durante o dia e inquirisse de si mesmo o bem ou 0 mal que houvera feito, rogando a Deus e ao seu anjo de guarda que o esclarecessem, grande forca adquiriria para se aperfeigoar, porque, crede-me, Deus 0 assistiria, Dirigi, pois, a vis ‘mesmos perguntas, interrogai-vos sobre o que tendes feito € com que objetivo procedestes em tal ou tal circunstincia, sobre se fizestes alguma coisa que, feita por outrem, censurarieis, sobre se obrastes alguma ago que ndo ousarieis confessar. Perguntai ainda mais: “Se aprouvesse a Deus chamar-me neste momento, teria que temer o olhar de alguém, a0 entrar de novo no mundo dos Espiritos, onde nada pode ser ocultado?” “Fxaminai o que pudestes ter obrado contra Deus, depois contra o vosso préximo e, finalmente, contra vés mesmos. As respostas vos dardo, ou 0 descanso para a vossa consciéncia, ou a indicagao de um mal que precise ser curado, “O conhecimento de si mesmo &, portanto, a chave do progresso individual. Mas, direis, como hé de alguém julgar-se a si mesmo? Nao esta af a ilusto do amor-préprio para atenuar as faltas © torné-las desculpaveis? O avarento se considera apenas econdmico ¢ previdente; o orgulhosos julga que em si sé ha dignidade. Isto ¢ muito real, mas tendes um meio de verificagdo que ndo pode iludir-vos. Quando estiverdes indecisos sobre 0 valor de uma de vossas agdes, inquiri como a qualificarieis, se praticada por outra pessoa. Se a censurais noutrem, ndo na poderia ter por legitima quando fordes o seu autor, pois que Deus no usa de duas medidas na aplicagdo de Sua justiga. Procurai também saber 0 que dela pensam os vossos semelhantes ¢ no desprezeis a opinido dos vossos inimigos, porquanto esses nenhum interesse tm 425 DA PERFEICAO MORAL em mascarar a verdade e Deus muitas vezes 0s coloca a0 vosso lado como um espelho, a fim de que sejais advertidos com mais franqueza do que o faria um amigo. Perscrute, conseguintemente, a sua consciéneia aquele que se sinta possuido do desejo sério de melhorar-se, a fim de extirpar de si os maus pendores, como do seu jardim arranca as ervas daninhas; dé balango no seu dia moral para, a exemplo do comerciante, avaliar suas perdas € seus lucros e eu Vos asseguro que a conta destes serd mais avultada que a daquelas. Se puder dizer que foi bom o seu dia, poder dormir em paz e aguardar sem receio o despertar na outra vida “Formulai, pois, de vés para convosco, questies nitidas e precisas e no temais multiplicé-las. Justo é que se gastem alguns minutos para conquistar uma felicidade eterna. Nio trabalhais todos os dias com o fito de juntar haveres que vos garantam repouso na velhice? Nao constitui esse repouso o objeto de todos os vossos desejos, o fim que vos faz suportar fadigas e privagdes temporirias? Pois bem! Que esse descanso de alguns dias, turbado sempre pelas enfermidades do corpo, em comparagio com 0 que espera o homem de bem? Nao valeré este outro a pena de alguns esforgos? Sei haver muitos que dizem ser positive o presente e incero o futuro. Ora, esta exatamente a idéia que estamos encarregados de eliminar do vosso intimo, visto desejarmos fazer que compreendais esse futuro, de modo a nao restar nenhuma davida em vossa alma. Por isso foi que primeiro chamamos a vossa tengo por meio de fenémenos capazes de ferir-vos os sentidos e que agora vos damos instrugdes, que cada um de vés se acha encarregado de espalhar. Com este objetivo € que ditamosO Livro dos Espiritos. SANTO AGOSTINHO. Muitas faltas que cometemos nos passam despercebidas. Se, efetivamente, seguindo © conselho de Santo Agostinho, interrogissemos mais amitide a nossa consciéncia, veriamos quantas vezes falimos sem que 0 suspeitemos, unicamente por ndo perscrutarmos a natureza e 0 mével dos nossos atos 426 PARTE 3* - CAPITULO XII A forma interrogativa tem alguma coisa de mais preciso do que qualquer méxima, que muitas vezes deixamos de aplicar a nés mesmos. Aquela exige respostas categoricas, por um sim ou no, que ndo abrem lugar para qualquer alternativa © que so outros tantos argumentos pessoais. E, pela soma que derem as respostas, poderemos computar a soma de bem ou de mal que existe em nés.

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