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Prestes na festa do seu antversdrio: rompido com o PCB, vat organtzar um novo partido MEMORIAS “Rompi com o PCB” E Prestes, falando de seus 60 anos de militdncia politica Por ter sido visto, ouvido ¢ fotografado na festa de seu 84° ani- versirio, comemorado no iltimo dia 3, num’ modesto clube do subtirbio carioca, 0s. leitores do livro de memérias de Luis Carlos Prestes poderio ter a impressio de que ele € lima personagem eontemporanea Ele é, com efeito, e das mais importan- tes; mas é, também, uma personagem da. historia, iltimo’ sobrevivente da geragio de’ militares que iniciou, em 1922, uma frenética agitagdo na’ vida politica do pais, inconformados com Seus vicios, seu atraso, sua estagnagao, Sio muitos os atores, vivos ou mortos, da cena politica brasileira que desfilam nas quase trezentas pi- ginas do depoimento, um livro que tomou o titulo Prestes: Lutas e Autocriticas. E. um precioso trabalho preparado pelos jornalistas Denis de Moraes e Francisco Viana, a_ser langado na proxima semana pela Edi- tora Vozes. Foram 22 horas de gra- vagies, efitre maio e dezembro de 1981, © exsecretério-geral do PCB, que concordou em falar sobre anos de militancia politica, dez_ dos quais na prisio, catorze no ex Tio ¢ mais de vinte na clandestinidade. 28 Foram oito meses de trabalho nos quais Viana e Moraes fizeram exten- sa pesquisa complementar sobre a vida de. Prestes, pouco daquela cort mistério e siléncio que perturba a an: se acerca de seu papel na histéria”, conforme observou o jurista Raymun- do Faoro, prefaciador do livro do qual ISTOE apresenta alguns trechos. “Eu era um homem ainda pouco lido e com uma vontade enorme de construir um Estado justo, pondo fim as velhas oligarquias. O problema é que nao sabia como conseguir isso, A Coluna foi algo importantissimo para mim. Conheci a miséria por onde passei. Vi homens passando fome outros sem roupas e muitos sem nenhum remédio para suas doencas Vi homens ajoelhados no chio esburacando o solo com facas d cozinha sem cabo. Pegavam nas |: minas das facas, ou seja, estavam mais atrasados do que 0s indios. E esse quadro terrivel — seguramente nunca poderei esquecer do que vi e senti — me convenceu de que nao seria a simples substituigo de Ber- nardes por outro que resolveria os nossos problemas, Quando comega- mos a perceber isso, decidimos ter- minar a marcha da Coluna (...) “A partir de julho de 1929, Vargas foi ganhando pouco a pouco os tenen- tes, Muita gente afirma que eu recusei © comando militar da revolugo. Acon- teceu justamente o contrario: eu fiquei sozinho, um comandante sem exército, Ninguém queria ouvir falar numa revolugdo que mudasse profundamente 4 realidade brasileira “S6 se pensava em apoiar Gettilio por causa da prometida anistia, Eu até acredito que, se o Washington Luis tivesse anistiado os militares da Coluna, nao teria havido “revolugio’, nem ele teria caido ( Cinco de marco, 1936. Estava ter- minada uma das maiores operacdes repressivas da histéria da_policia Durante quarenta dias, sob um temporal inclemente, centenas de homens vasculharam, casa por casa, os bairros do Méier e do Cachambi, cagando 0 homem mais procurado TATOR 13/1198? carioca. do pais: Luis Carlos Prestes, lider do levante comunista de 1935. ‘Na madrugada do dia $ de margo, poucas ruas faltavam ser vasculha- das, A rua Hondrio, entre Méier Cachambi, era_uma delas. Os poli- ciais ja desconfiavam que Prestes ali se escondia. “A ordem era me matar. Mas, quando 0s policiais invadiram a casa, minha companheira me abragou, colocando o corpo dela entre eles e eu, me salvando a vida. Vendo que atirariam numa mulher, 0s policiais hesitaram e resolveram me capturar vivo ( ‘A prisdo nao estava nos planos de Prestes(...) Todas as avaliagdes davam conta de que Getilio estava no fim: conspirava-se nos quartéis, 0 movimento popular erescia e o presi- dente parecia cada vez mais isolado: “Este foi o primeiro erro. J4 em 33 0 pais tinha superado a crise econmi- ca, que se iniciou em 29 ¢ atingiu o seu auge em 32. Em 35 Getiilio tinha a situagdo sob seu controle e nao era ‘mais to impopular quanto se imagi- nava. Além disso, o levante foi feito sem preparagio. Resultado: ficou restrita aos quart¢is sem contar com (© apoio das massas. Na verdade, as informagdes que tinhamos eram fal- sas. O Miranda (secretério-geral do PCB) mentia, Ele dizia: ‘Temos gran- de influéncia nas Forgas Armadas no Rio’. Nao era tanta assim (...) Bem, a questo militar era apenas uma das mentiras contadas por Miranda. Havia outras. Ele dizia que o Partido tinha grande influéneia no movimen- to operirio(...) Era um elemento fantasioso, Depois & que eu vim a des- cobrir que ele era um nacionalista, um patrioteiro, um pequeno-burgués que pensava ser a revolucao uma coi- sa facil (...) Houve erros, 0 movi- mento fracassou. Mas foi um movi- mento honesto, patridtico(...) Eu até hoje ndo renego 35. Miranda — este, sim, 0 maior responsivel pelo levante — 0 renegou: foi preso € pas- sou a colaborar com a policia (...)” “Eu fui preso e levado para a Poli- cia Especial. Era uma situagdo muito vexatoria, Eu ficava isolado por uma grade de ferro, o maior prazer do comandante da Policia Especial, Euzébio Queiroz Filho, era trazer um visitante ali para me ver preso. Apesar disso, eu tinha 0 apoio de quase a me- tade ‘dos soldados: eles me ajudavam. A linica coisa que eles podiam fazer por mim era trazer os jornais. E eles tra ziam. Nunca passei mais do que trés ‘ou quatro dias sem ler os jornais (. ..) “De quinze em quinze dias, 0 Queiroz passava em revista a cela ¢ TSTNE 13/1/1982 ficava perplexo: nao tinha sequer cora- gem de perguntar onde eu conseguia tanto jornal (..) Houve dias em que até pensei em fugir. Os guardas dormiam. $6 nio fugi porque sabia que havia guardas ao redor do quartel da Policia Especial, Tentar a fuga era suicidio, ¢ eu nfo queria suicidar-me, Preferi suportar o isolamento, que so comegou a ser relaxado em julho de 1937 (..) “Pessoalmente eu ndo fui tortura do. A minha tortura foi toda psicold- gica, Mas ndo sofri maus-tratos como centenas de outros com- panheiros(...) Da minha cela eu ouvia os gritos...) Protestei contra as condigdes da minha prisio ¢ de Berger (codinome de Arthur Ernst Ewert). Ele estava em situagdo muito i Getilio: contra mudangas pior que a minha. Quando os presos politicos foram soltos, em 1945, a irmi dele veio da Alemanha Democratica, para buscé-lo, mas ele nfo se recuperou mais. Viria a morrer no principio da década de SO num hospital psiquidtrico, sem sequer reconhecer as pessoas.” eee a “O levante de 35 deixara cicatrizes profundas (...) Um dos saldos mais negativos foi 0 justigamento da mulher de Miranda, secretério-geral de 1935, Ela saiu da cadeia e comegou a visitar os companheiros para contar 0 que estava acontecendo. Nao tinha nenhuma ligago com a pol- cia, Era apenas uma inocente util. Pes- soa de precaria forma¢ao politica, qua- se ignorante, ndo notou que estava sen- do seguida. E, em toda casa que ia, luma pessoa era presa. Foi entdo jus- ticada. A pessoa que a matou, anos depois, suicidouse, atormentada pela constatagdo de que cometera um cri- me, no um ato de justigamento (..)” A primeira personalidade que Prestes encontrou ao sair da cadeia foi o brigadeiro Eduardo Gomes, seu colega de turma na Escola Militar ¢ agora candidato 4 sucessio de Var- gas: “Foi um encontro_ muito constrangedor. La estavam Gomes Juarez TAvora, numa situago bas- tante dificil. Eles tinham apoiado o Estado Novo e tiveram promogées durante todo o periodo. O_briga- deiro, agora, estava contra Getiilio, Eu tinha sido perseguido 0 periodo inteiro, Sofri muito (. ..) Mas, apesar de tudo isso, eu estava numa posigio completamente diferente da deles, que, de uma hora para outra, tinham virado democratas € so pensavam em golpe. Eu disse a Eduardo Gomes: ‘Minha posicio & pela Constituinte’. claro que 0 Partido apoio Getiilio, mas nunca fizemos acordo com ele, Eramos aliados técitos. Nao © hostilizvamos, Juarez compreen- deu logo que, da maneira com que eu expunha os fatos, eles estavam politi- camente derrotados, porque s6 pen- savam em golpe. E retirou-se com uma desculpa qualquer. O brigadeiro continuou conversando e, a certa altura, afirmou: ‘Nao. pode haver eleigdes livres com Getulio’. Eu dis- cordei. E disse: ‘Como nao pode? Ha liberdade de expressio, de organi- zaco dos partidos, nfo ha censura. Mas vamos admitir que ¢ verdade: no pode haver eleigdes livres com Getilio, O que nés vamos fazer para tiri-lo do poder?’ Sé havia uma alter nativa: 0 golpe. Era o que eu queria que ele falasse e foi o que, em linhas gerais, ele sugeriu. De Cordeiro de Farias a José Américo, todos s6 viraram democrats por influéncia dos Estados Unidos, depois que o Brasil enviou tropas para a Europa. Allis, José Américo entrou para a histéria com aquela entrevista contra 0 Estado Novo, que nada mais foi do que pretexto para que os reacio- nirios da UDN dessem o golpe (..)” Prestes interrompeu subitamente a reuniio da Executiva e chamou o seu chefe de aparelho, Giocondo Dias. Ordenou: “Vamos mudar tudo, que ele sabe de tudo, Um camarada que fala assim do socialismo ¢ da Unido Soviética ¢ um traidor”. O camarada sob suspeigdo era 29 préprio chefe da delegacio do PCB a0 XX Congreso do PCUS, realiza- do. em Moscou, Arruda Cimara: “Arruda voltou da Unitio Soviética completamente mudado, Antes do relatério, como secretério da Comis- sio de Organizagdo, apresentava-se como representante de Stalin e Pres- tes, Era um poder triplice muito sério: Arruda, Stalin e Prestes. SO que 0 arrudismo era a violéncia maior. Eu s6 fui saber como ele agia anos mais tarde. Trabalhavamos jun- tos: ele na tarefa de organizacdo e eu no encaminhamento dos problemas politicos. Minha atividade era inten- sa. De maneira que eu nao percebia como ele tratava as pessoas. Comigo era diferente: nao usava a brutalida- de, nem era violento. Mas o relacio- namento do Arruda com os militan- tes e, principalmente, com os intelec- tuais era 0 pior possi- . vel. Ele intervinha, 2 ditava ordens. No livro de Jorge Ama- do sobre 0 Estado Novo, Subterrdneos da Liberdade, ele queria cortar_ ‘muita coisa. Jorge nao acei- tou, Graciliano escre~ yeu um livro com erfti- cas 4 Unido Soviética, criticas construtivas. Nada de anti-sovietis- mo. Arruda nio acei- tou também (..) Ele era 100% sovietico (..) Pois bem, ele mudou da noite para o dia (..) Quando notei a mudanca, vivi a fase mais dificil da. minha vida. Jamais tinha pas- sado por situago tio dificil (..) 0 congresso se realizou entre janeiro e fevereiro de 1956, mas Arruda ficou na Europa, foi a China e s6 voltou ao Bra- sil em julho. Uma postura inadmissivel (.).Nés aqui ficamos acompanhando 0 noticidrio da imprensa sem saber se era provocagao ou se era verdade, enquan- to Arruda passeava (..) “Como ele demorou a chegar, os intelectuais passaram por cima’ da diregéo © comecaram a discutir 0 relatério Kruschev na Tribuna Popular, jornal didrio do Partido, e na Classe Operdria, jornal mensal. Foi uma discussdo andrquica. Havia eriti- cas _justas ao mandonismo, a orien- tago do Partido, mas se criticava também a Unido Soviética, E comecaram a surgir posicdes de direita dentro do Partido. Quando Arruda chegou, conseguiu ganhar 0 Agildo Barata ‘para as posigdes de direita. Tudo indica que ele prome- 30 Amado: censurado pelo... teu a Agildo, uma figura de proa, me substituir(...) No dia em que o ‘Aruda chegou, a Comissio Executiva tragou uma ordem do dia para a reu- nifo do CC, mas na tltima hora mudaram tudo fizeram uma ordem do dia genérica. No dia da reunio, levaram grande nimero de intelectuais, € o Arruda fez um informe semelhante a0 que tinha feito a mim. Esperava que © atacado pelo CC fosse eu. Ocorre 0 contririo. Marighella e Amazonas che- garam a chorar (..) “A crise do Partido foi coisa muito éria. Os companheiros da Comissio Executiva no queriam fazer autocri- tica. Tinham medo de enfrentar as bases do Partido, principalmente o Arruda, Amazonas e Grabois, que eram mandonistas muito ativos. Eu assumi a organizagéo do debate autocritico e resolvi sair da clandesti- nidade. Descobri que estava sendo enganado. Nao havia razdes para a clandestinidade rigorosa a que era submetido. Eu, 0 secretério-geral, nao podia ter contato com ninguém. Eles podiam. Era uma falta de democracia total (...) A conseqiéncia mais grave de toda essa briga aconte- ceu em abril de 1957, numa reunido do CC, a qual eu nao pude compare- cer por determinagio da Comissao Executiva, embora estivesse na semilegalidade. Exigi que a reuniio fosse gravada. A gravacio foi feita € isto. me permitiu desmascarar a falsa posi¢do que Agildo Barata tomou. Era uma posicZo totalmente reformista. Renegou até o movimento de 35, do qual ele tinha sido um dos mais desta- cados dirigentes. Foi expulso (...)” “O V_ Congresso, realizado em setembro de 1960, viveu realmente a ...PCB, como Graciliano euforia do liberalismo vigente na época (...) Para tentar obter 0 re- gistro eleitoral, 0 V Congresso apro- vou a mudanga do nome do Par- tido Comunista do Brasil para Part. do Comunista Brasileiro (...) Se para efeito externo a mudanca tinha efeitos, politicos promissores, interna- mente 'o grupo dissidente reagiu com violéncia: denunciou a nova posi¢do como liquidacionista, Estava assim deflagrado 0 processo de cisio que cul- minaria com a expulsio do grupo que viria a formar 0 PC do B, entre fins de 1961 principio de 1962 (..) “Eu tive varios contatos com Jan- go. Nao lembro qual foi o primeiro. iiltimo foi nas vésperas do comicio de 13 de marco, na Central. Ele me disse que vinte generais estavam do lado dele. Até queria apresentar-me alguns esses generais. Fi quei preocupado. E fiz uma indagagio com meus botdes: 0 que sera isso? Eu co- nhecia bem os gene- rais brasileiros e sabia das. posi¢des antico- munistas da_maioria deles (...) Logo de- pois veio o golpe. “Antes do dia 13 de margo, conversei com Jango © pergun- tei por que ele manti- nha Justino Alves Bas- tos no comando do IV Exército, no Recife, € por que Kruel esta- va em Sao Paulo. Os dois eram reaciond- ros, Jango sabia, mas fazia um jogo. Era um’ homem muito intelgente politca- mente (...) Naquela poca, eu estive ‘com todos os politicos importantes, me- nos Janio ¢ Brizola, € posso afirmar: Jan- go € 0 que melhor compreendia 0 que estava_acontecendo, chegando inclusive a compreender 0 papel que a Unio So- vitica desempenhava (...) “Eu tenho responsabilidade politi- ca no golpe de 64, mas nio tenho responsabilidade pessoal. O golpe teve causas objetivas. Nao foram nos- sos erros que o determinaram. Nos- sos erros podem sim. té-lo facilita- do(...) Na noite de 31 de margo eu percebi que a classe operdria estava isolada. E ia ser derrotada da forma mais desmoralizante possivel: sem luta(...) E percebi que quem assu- misse a responsabilidade de levar a classe operdria 4 luta armada cometeria um crime. Determinar a resisténcia seria 0 massacre, Por isso, no dia 1° de ‘enced taeda abril, a instrugdo que eu dei, a respon sabilidade que eu assumi, foi de recuar todas as frentes (..)” “Quinze a vinte dias antes do gol- pe, Jango mandou entregar-me uma cépia do Projeto Brasil, através de Darcy Ribeiro, seu chefe da Casa Civil. Nao queria apresentar 0 proje- to sem 0 nosso apoio. Levei o assun- to A Comissfio Executiva, que 0 apro- vou, mas considerou que ainda era pouco. Marighella e Mario Alves estavam nessa posicio esquerdista, Me chamavam de janguista, Entre- guei 0 projeto de volta ao Darcy e ele ficou muito satisfeito. Alids, todas as vezes que eu falava com Darey fica- va chocado: ele tinha posigdes esquer- distas. Darcy sempre criticava a nossa orientagiio, Nos opusemos ao levante dos sargentos em Brasilia ¢ no partici- pamos da organizagdo da reunitio dos sargentos. no Automével Clube. “Aquela reunido fora decisiva para 0 golpe (...) © maior responsivel por aquela reunido foi Darcy Ribeiro, que Juarez: convite ao golpe tinha posigdes esquerdistas aceitas por Jango. A verdade sobre 64, enfim, nio & outra: nfo. nos preparamos como seria necessirio (..)” Prestes avalia assim a cisdo em 1967; “Marighella, Jover Telles, Mario Alves, Jacob Gorender ¢ Apol6nio de Carvalho, todos tinham posigdes esquerdistas, Eles procura- vam orientar o Partido na diregdo de suas idéias, Quem rompeu com o Partido foram eles, ¢ nao nds que rompemos com eles. Foram eles que comegaram 0 trabalho fracionista. O primeiro a ser expulso foi Jover Telles, um operirio. mineiro((. ..) Expulso Jover Telles, Marighella pas- sou a fazer exigéncias cada vez maiores, principalmente a mim ¢ a0 camarada Dias, que era o secretario de Organizagio(...) Depois que Mario Alves, Gorender, Marighella, Apolnio ¢ Jover Telles sairam, eu perdi o contato com eles. Sabia que estavam preparando a luta armada, mas nio tinha ilusdes: assaltos a ban- cos, seqiiestros de avides, de embai- xadores, nada disso resolveria nada. $6 contribuiria. para aumentar a repressio e dar armas & reacio. E, duvida alguma, contribuiu (.. i com o Partido. E niio me arrependo (...) Penso que ha muitos comunistas que pensam como eu e estiio-se organizando. E. gente que esté- se onganizando para enfrentar as teses direitistas do Comité Central (..)” A~o longo do sex. depoimento, eminentemente politico, Prestes deixou escapulir um pouco da his- t6ria de sua vida privada. Entre suas reflexdes sobre guerras e guerrilhas, criticas e autocriticas, pode-se colher suas impressdes sobre seu mundo pessoal, que inclui, também, 0 amor, os filhos © a mulher. Prestes casou-se pela primeira ver com Olga Benario, militante comunista alema, entregue aos nazistas pela ditadura do Estado Novo. Com Olga, Prestes teve apenas uma filha, Anita, que nas- eu num campo de concentragio na Alemanha. E pai adotivo dos dois filhos da sua companheira: | Pedro e Paulo. “Quando o velho fala, todo mundo. treme” (dona Maria, sobre Prestes). Com Maria, seu segundo casamento, teve sete filhos: Anténio Joao, Rosa, Ermelinda, Luis Carlos, Mariana, Zdia (homenagem a uma guerrilheira russa que os nazistas enforcaram) ¢ Yuri (ho- menagem ao astronauta soviético Yuri Gagarin), A excegio de Ani- ta ¢ Rosa, que € viva de Jodo Massena (dirigente do PC incluido na lista dos desaparecidos politi- £08), todos os outros filhos de Prestes vivem em Moscou, “Fui feliz com as mulheres” “Bles querem vir para o Brasil, que € o lugar deles, mas aqui encontram muitas dificuldades. Ani- ta, por exemplo, do. consegue emprego de jeito nenhum, embora seid engenheira quimiea, formada pela universidade do Brasil. A Ermelinda & casada com um bra- sileiro que estuda fisica em Moscou, © ndo pode voltar por enquanto. O Luis Carlos std. casado com uma sovidtica € s6 ni volta para o Brasil porque aqui nao tem emprego. O Antonio Jodo esté terminando um curso de engenharia mecinica, tam- bém em Moscou, Se dependesse de mim, todos eles jé estariam aqui” “Bra uma casa de sala e dois quar- tos, onde nds viviamos sem despertar suspeitas, Alids, este foi um periodo muito. intenso da minha vida. com Olga. Viviamos juntos como eu nun- ca vivi com ninguém, Quarenta dias, um vendo 0 outro a todo momento,” (Sobre a casa onde se escondew apis 0 levante de 1935.) “Sou um homem de temperamen- to exaltado, que sabe reagir quando necessirio. “Eu ndo quero ter uma congestiio cerebral ¢ ficar paralitico, eu prefiro morrer a ficar paralitico “Eu preciso dizer que sempre fui mui- to feliz com as mulheres. Tive duas: Olga ¢ Maria, Me dei muito bem com elas. “Hi uma coisa de que eu. me ‘orgulho muito: todos os meus filhos So comunistas. Eu tive muita sorte, Ha muitos pais comunistas que no \ém esa sorte, porque ideologia niio se transmite por hereditariedade, “Eu sou acusado de ser) um homem que ndo tem amigos. Um homem sem amigos. Em 30 eu tam- hém fiquei solado, Perdi todos os meus amigos. Um a um. Jé estou | habituado. er pessoa que me queira faver justiga ha de’ compreender que, ‘na minha idade, inieiar uma uta da cenvergadura da que estou travando 6 pode set por uma questo de conscién- cia politica, de eater pessoal ee ‘compromissos. com a ope! brasileira internacional, “Estou com 83 anos. Fu: muito perseguido, combatido e estou reco- megando’ praticamente tudo, de novo, Mas, se tivesse dé recomegar, eu recomegaria tudo de novo, per- correria 0 mesmo caminho, $6 gos- taria de mudar um pequeno detalhe da minha histéria:’ gostaria de ja conhecer 0 comunismo em 24 ,.: “Eu tido tenho, nem jamais tive, a ilusio de chegar ao poder. Em 24, no tinha essa ilusio. Em 22, talvez tivesse, Nés, tenentes, pensivamos ‘que chegariamos ao poder. Nao che- games. “Meus witimas anos de vida eu dedicarei a onganizar 0 Partido Revolucionirio.” IATAR 1a¢1(19R2 31

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