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1 NUANÇAS CRÍTICAS QUANTO A ESTRUTURA TEXTUAL

O texto de Leornado Brandelli, “Considerações acerca do direito ao nome numa


perspectiva constitucional do principio da dignidade da pessoa humana” que está em
análise, possui vários aspectos importantes como a forma de linguagem culta, que é
observada ao longo do texto, com a utilização da gramática normativa.

Por ser um texto didático, objetivo e de fácil entendimento, o autor conseguiu


alcançar a comunicação com o seu público alvo que são os acadêmicos e os
profissionais do direito o que permitiu que o autor tenha credibilidade e a
legitimidade no seu discurso.

Assim, no estudo de Brandelli, pode-se verificar várias nuances do jogo discurso que
são importante para que o autor exponha a sua intencionalidade e ao final tenha
conseguido alcançar os seus objetivos, que nada mais é que apresentar as suas
idéias de modo a envolver o receptor e estabelecer um diálogo. Vale ressaltar que ,
para que isso ocorra, é necessário ter elementos para uma boa comunicação.

Dessa forma, será analisada a subjetividade e a intertextualidade, que são


encontradas no estudo.

O texto em analise é subjetivo. Benveniste (apud ANDRADE, 2010, p. 137) define


subjetividade como “[...] a capacidade de se propor como sujeito de seu próprio
discurso, construindo imagens discursivas que podem revelar com maior ou menor
intensidade suas intenções.

Deste modo um dos traços do homem é ser subjetivo, desta forma, é puro engano
confiar que alguém possa produzir um texto, dizer algo ou dar uma opinião sem
revelar sua subjetividade. Por isso que “[...] em toda e qualquer circunstância, o ser
humano sempre é subjetivo [...]” (Andrade e Gabriel, 2005, p.96).

Em suma, a subjetividade é aptidão de se insinuar como sujeito do seu próprio texto


ou discurso, construindo imagens que podem ser em maior ou menor grau de
intensidade na suas intenções.

Ainda tratando de subjetividade, Andrade e Gabriel (2005, p.96) classificam duas


formas de subjetividade, a primeira forma é a marcada e a segunda forma é a não-
marcada.
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A primeira ocorre quando o sujeito do texto assume e se manifesta deliberadamente


no discurso como autor, em primeira pessoa e também deixa marcas explícitas na
estrutura superficial do texto.

Deste modo, essas marcas no texto trazem uma concepção de idéias, valores e
moral, como um posicionamento extremo de quem enuncia quanto os fatos que
estão no texto para ser discutidos.

Logo, no texto em análise, o autor usa de forma explicita como sujeito no texto a
subjetividade marcada, em virtude de expressar o seu posicionamento quanto a
decisão do tribunal. Isso pode ser verificado na passagem do texto logo abaixo.

“Em que pese devotarmos o maximo respeito à decisão do Tribunal de


Justiça do Rio de Janeiro, parece-nos que o caso Silverinha, quanto
analisado sob o prisma constitucional, sob a ótica do principio máximo da
dignidade da pessoa humana, merece ter outra sorte.” (2005, p.194), (grifo
nosso)

Neste caso o autor usou o verbo “devotarmos” na primeira pessoa do plural, com
efeito para o TU-interpretante de explicitar o seu posicionamento, isto é, de dizer
diretamente qual é a sua opinião. Dessa forma, Brandelli, encontra-se em uma
posição não neutra e também longe da imparcialidade. Logo, pode-se concluir que
um dos seus objetivos é persuadir o leitor a ter uma visão critica semelhante a sua,
em relação à decisão do tribunal.

Em outro parágrafo o autor também usa o verbo na primeira pessoa do plural.

“Em que pese o mais profundo respeito ao Tribunal de Justiça do Estado do


Rio de janeiro, ousamos discordar da decisão prolatada no acórdão em
comenta, uma ver que a alteração do nome civil da pessoa natural, por
confrontar dois valores jurídicos – o da imutabilidade do nome, e o direito
personalíssimo de ter um nome que não dificulte o desenvolvimento do seu
portador como pessoa –, deve sempre ser vislumbrada sob o enfoque do
principio da dignidade da pessoa humana” (2005, p 197), (grifo nosso)

O escritor, novamente, usa a subjetividade marcada, em que ultiliza o verbo na


primeira pessoa do plural, “ousamos”. Destarte, ele deixa explícito para o TU-
interpretante a sua parcialidade e seu posicionamento quanto o caso.

A segunda, está extremamente presente no texto e caracteriza-se por manifestar


suas idéias de uma forma mais contida, mais velada, em formas de estruturas
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impessoais. Andrade e Gabriel (2005, p.97) explicam que “[...] o sujeito não é o
centralizador absoluto da subjetividade, deslocando seu foco para duas outras
perspectivas no discurso – ou assumirá outras formas de paradigmas da pessoa ou
desempenhará outros papéis discursivos.”

Na estrutura da subjetividade não-marcada usa-se advérbio, locuções, adjetivos e


estruturas modais que indicam algumas escolhas realizadas pelo próprio ser que se
enuncia. (Valdeciliana, 2010 p.138)

Brandelli, em dois momentos, deixa transparecer a sua subjetividade, mas desta vez
ele não permite que seus pensamentos fiquem explícitos. Podemos observar, essa
subjetividade não-marcada no seguinte trecho:

“Embora da mais alta importância jurídica e social, esta característica da


imutabilidade do nome não é absoluta e deve ser bem entendida, porquanto
aceita exceções, sejam elas decorrentes da lei, sejam decorrentes da
própria interpretação dos princípios que regem o direito ao nome, como
sendo este um dos direito da personalidade” (2005, p. 195)

No exemplo o autor manifesta a sua intenção claramente quando diz, “Embora da


mais alta importância jurídica”. Apesar de parecer impessoal, faz parte da
subjetividade do autor, tentar convencer o leitor da relevância do princípio
constitucional da imutabilidade relativa, que está presente tem em nosso
ordenamento jurídico. Desse modo, ele consegue emitir a sua opinião, de forma
velada.

Em outra passagem, o autor também deixa transparecer de forma mais tímida a


subjetividade.

“A alteração do nome civil da pessoa natural, seja para incluir nome de


família, seja para suprimir nome de família, seja para alterar prenome, etc.,
será sempre possível, desde que haja motivação bastante para isso, sendo
vital, na analise da motivação, atentar sempre para o principio da dignidade
da pessoa.” (2005, p.198)

Neste momento o autor também deixa transparece a sua opinião quanto ao caso,
“será sempre possível”. Nesta passagem, Brandelli, coloca para o TU-interpretante a
sua opinião quanto à possibilidade de haver alteração do nome e deixa clara a sua
opinião sobre os possíveis casos.
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Além disso, ao se posicionar desta forma, o estudioso influencia o leitor no sentido


de que o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, não visou uma justa motivação de
mudança de nome no caso do Silverinha. Portanto, ele coloca a sua subjetividade
para quem vai ler o texto e deixa clara a sua visão quanto ao caso, entretanto realiza
isso de forma a não transparecer.

Com relação à intertextualidade, Andrade (2010, p.111) diz que “[...] um texto não
existe solitário, ao contrario, ele é fruto de outros discursos que compõem o universo
em que está, ou melhor, ele dialoga com outros textos.”

Por isso, é muito comum, quando escrevermos, citar outros textos que já estudamos
ou conhecemos, com a intenção de respaldar, dar mais credibilidade a nossas
idéias.

Como resultado, uma vez que produzimos tal argumentação estamos simplesmente
fazendo uma retomada de idéias que vimos antes em outros autores. Portanto,
quando nós pronunciamos, estamos citando uma variedade de textos, que, de certa
forma, mantém um dialogo com outros textos.

O conhecimento de uma obra, pode manifestar-se de forma implícita, quando o texto


“[...] surge por meio do senso comum ou de alguma idéia incorporada ao discurso
sem haver referencia a fonte” (Andrade e Gabriel, 2005, p.95). Assim, também pode
haver uma manifestação de forma explicita, quando há referencias, retirada de
idéias e partes de outros textos, por isso a apresentação pode ser literal ou
parafraseada.

No texto, o autor, Leornado Brandelli, usou do recurso da intertextualidade para


fazer um embasamento legal ao seu raciocínio, citando outros acórdãos.

“Citou-se, para amparar a decisão, o Acórdão prolatado no RESP


439636/SP, Recurso Especial 2002/0064690/4, em 15 de outubro de 2002,
pela Quarta turma, tendo por relator o Ministro Barros Monteiro, cuja ementa
é a seguinte: “REGISTO CIVIL. NOME. ALTERÇÃO PRETENDIDA
MEDIANTE SUPRESSÃO DOS PATRONÍMICOS. INVIABILIDADE. Após o
decurso do primeiro ano da maioridade, só se admitem modificações do
nome em caráter excepcional e mediante comprovação de justo motivo,
circunstancias não configuradas no caso. Recurso especial não conhecido”
(2005, p.199)
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De acordo com a citação acima, o EU–enunciador, quer transmitir ao TU–


interpretante, de forma explícita, que os desembargadores do tribunal usaram como
base outro acórdão feito por eles em outra ocasião semelhante e que não seria
possível o deferimento da mudança do sobrenome Silverinha para Dionizio porque
anteriormente também houve o indeferido da ação. Além disso, o autor quer dar
mais respaldo e credibilidade ao texto dele, conduzindo de forma coerente o seu
raciocínio quanto ao caso.

Em outra passagem, Brandelli também usa intertextualidade em seu artigo, desta


vez ele usa o recurso para dar significado ao principio da dignidade da pessoa
humana.

“Nesse diapasão, fala-se o princípio da dignidade da pessoa humana,


previsto constitucionalmente em solo pátrio, a informar o valor da pessoa
como titular da sua própria esfera de personalidade, significando que “a
pessoa humana não é redutível, nem mesmo por ficção jurídica, apenas à
sua esfera patrimonial, possuindo dimensão existencial valorada
juridicamente à medida que a pessoa, considerada em si e em (por) sua
humanidade, constitui o ‘valor fonte’ que anima e justifica a própria
existência de um ordenamento jurídico”.(2005, 196)

Nessa passagem, o estudioso, usa a intertextualidade direta para dar mais respaldo
e credibilidade ao seu artigo, para o TU-interpretante. Além disso, deixar claro que o
conceito tem um respaldo maior por ser palavras de outro jurista.

Cabe ressaltar que a quantidade de citação que o autor fez não foi exagerado.
Ademais a obra em análise, de Brandelli, possui citações de forma equilibrada e
essas sempre estão acompanhadas de uma análise do que foi dito.

A exploração das citações também está bem feitas, há um raciocínio lógico, uma
seqüência e um estudo bem aprofundado quanto ao tema. Além disso, Brandelli
explorou a base legal, citando algumas leis e jurisprudência, e também alguns
doutrinadores que detém credibilidade e legitimidade para falar do assunto.

Porém a formatação não é de acordo com as normas da Associação Brasileira de


Normas Técnicas, há citações diretas com menos de três linhas, neste caso, pode
ficar no corpo do texto sem o recuo, mas o autor também fez citações diretas com
mais de três linhas sem fazer o recuo.
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Porém, apesar do texto possuir esses pequenos erros, isso nada compromete com a
compreensão, que o receptor terá da obra ao lê-la. Logo, podo-se concluir que
Brandelli consegui emitir as suas idéias, estabelecendo uma comunicação com o
TU.

2. APLICAÇÃO

O nome, esse elemento presente no ordenamento jurídico brasileiro, possui uma


importância grande, pois é essencial e obrigatório para todo o indivíduo e, por isso,
que se encontra como um direito de personalidade, uma vez que tem a função de
identificar a pessoa em todos os âmbitos sociais. Portanto, além de ser carregado de
simbologia, o nome, traz consigo direitos e também deveres para todos que o
possui.

Assim, de acordo com a temática, Maria Helena Diniz (2010, p. 209) nos explica
que o nome individualiza a pessoa na sociedade e permite reconhecê-lo, inclusive
no meio familiar e, por esse motivo, que ele é protegido juridicamente.

Além disso, uma característica de grande significado, para depois compreender os


dispositivos que regulamentam o nome, é que ele sempre é composto pelo prenome
e sobrenome. O primeiro pode ser simples ou composto, como João, Maria, Carlos,
Thiago, Luis Gustavo, Maria Eduarda, etc. desde que não exponha a pessoa ao
ridículo, neste caso, o oficial de registro poderá se recusar a registrar o recém
nascido.

O segundo, o sobrenome, é o que identifica a procedência da pessoa, aponta a sua


filiação, sendo, por isso, imutável. Pode ser incluso o nome da família paterna ou
materna, e ainda sim, de ambos.

Ademais, esse elemento tem a característica de ser também inalienável e


imprescritível. Esses dois aspectos significam respectivamente que o nome não
pode ser vendido ou dado a alguém como se fosse uma propriedade que o indivíduo
porta e que também não pode envelhecer com o tempo, isto é, não é possível perdê-
lo pelo não-uso.
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Entretanto, a principal característica do nome é a sua imutabilidade. Esse princípio é


instituído, com o intuito de proibir a alteração tanto do prenome quanto do
sobrenome. Dessa forma, ninguém pode mudá-lo por causa da sua vontade ou
interesse, a todo o momento, pois é necessário que haja uma proteção a todos os
cidadãos que o tem, uma vez que não se pode existir sem possuí-lo.

Diante do que foi exposto acima, é que a ação da família Silveirinha, no qual
pretendeu realizar a supressão desse patronímico, teve a decisão negada, pelos
juízes e desembargadores. Nesse caso, as crianças, filhos de Rodrigo Silveirinha
Correa, sofriam constrangimento devido ao ato ilícito que o seu pai cometeu na
Secretaria da Fazenda do Rio de Janeiro e que foi imensamente divulgado por todos
os meios de comunicação. Dessa forma, com a intenção de fazer cessar todos os
transtornos sofridos pelos seus filhos, foi pleiteado a alteração, com a substituição
do sobrenome paterno pelo materno.

Todavia o Tribunal Superior do Rio de Janeiro, não acatou a decisão, pois levou-se
em consideração o princípio da imutabilidade que, segundo eles, não poderia ser
violado, além dos dispositivos 56 a 58 da Lei de Registro Público (Lei 6.015/73).

Contudo, é pacificado, que há situações que essa inalterabilidade do nome pode ser
flexibilizada, como expõe Farias e Rosenvald (2009, p. 218):

“A regra da imutabilidade relativa, é em linha de princípio alterável, tão


somente, em situações excepcionais, previstas expressamente em lei, ou
por força de situações outras, igualmente excepcionais, reconhecidas por
decisão judicial.”

Dessa forma pode-se observar que os componentes, que proferiram essa decisão,
não levaram em conta que esse princípio, dependendo da situação, não precisa ser
aplicado de forma tão rígida, como foi realizado no caso em discussão.

Vale destacar ainda, que os artigos supracitados, também abarcam a possibilidade


da mudança de nome, conforme pode-se contatar primeiramente no dispositivo 56
no qual diz que o interessado no primeiro ano após ter atingido a maioridade civil,
poderá pessoalmente ou por procurador, alterar o nome, desde que não prejudique
os de família. Além disso, também deverá ser ouvido o Ministério Público que irá se
manifestar sobre o pedido.
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Assim, esse artigo, estabeleceu uma possibilidade da pessoa alterar o nome. Apesar
de está descrito, que somente pode ocorrer no prazo decadencial, a jurisprudência e
a doutrina, assevera que esse artigo pode ser aplicado a pessoas que se encontram
em situações excepcionais e que essa mudança pode ser realizada de forma
imotivada, como afirma Pamplona Filho e Gagliano (2009, p. 123) “[...] para o
exercício desse direito postetativo (alteração do nome no primeiro ano após a
maioridade civil), não exige realmente a lei uma motivação peculiar para a
pretensão.”

Ainda na mesma lei, no art. 58, diz que o prenome será definitivo a não ser que se
possua justa motivação. Destarte, essa norma também permite a alteração de uma
parte do nome.

Por tais razões, é possível verificar que o caso das crianças que possuem o
patronímico Silverinha, pode ser solucionado por meio da interpretação do princípio
da imutabilidade relativizado e também pelas exceções que os artigos da Lei
6.015/73 apresenta. Sobre esse assunto Andrade Neto (2005, p.116) relata que:

“A tendência pela flexibilização destas regras refletem uma mudança


paradigmática: se até então, o nome orbitava em torno da família, servindo
este portanto num contexto de proteção daquela figura tradicional,
inamovível e inviolável em seu cerco ao patrimônio, agora em torno da
pessoa, como centro valorativo, orbitam a família e, a reboque, o nome,
acompanhando, não a sua situação familiar formal, mas as alterações que
sobre a pessoa e sua configuração ocorrem.”

Logo, pode se concluir que os direitos e os princípios encontrados no âmbito jurídico


gravitam em torno da pessoa, o que permite compreender, como conseqüência, que
o nome é um aspecto que integra a personalidade humana e não de outrem. Além
de projetar a sua dignidade humana em todos os meios que a pessoa vive.

Por esses motivos é que foi possível verificar, em um caso semelhante ao da família
Silverinha, a decisão a favor do pedido de supressão do patronímico realizado por
Kayena Coletti Lazzarin. Essa sentença ocorreu na Apelação Cível n. 2007.036594-
5, de Chapecó, Santa Catarina que teve como o Desembargador Monteiro Rocha
relator e julgador dessa ação de alteração do sobrenome.

No processo, Kayena Coletti Lazzarin alegou que desde o seu nascimento, seu pai,
Sr. Cláudio Afonso Lazzarin, nunca teve uma relação sócio-afetivo com ela, embora
tenha tentado por diversas vezes ter uma aproximação paternal.
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Relata ainda, que ela está grávida, e que o pai de seu filho não irá assumir a
paternidade, deste modo, é obrigada a registrar o nome de seu filho com o
patronímico de seu pai, Lazzarin, o que não deseja.

Na audiência e com a presença do Ministério Público e ouvidos seus genitores e


testemunhas, o juiz de primeira instância julgou procedente a mudança do nome, no
entanto, a promotoria opinou improcedente, recorrendo à segunda instância.

No voto do Desembargador Monteiro Rocha, ele também julgou procedente o pedido


da Kayena Coletti Lazzarin,a fim da requerente se chamar Kayena Coletti. Em sua
argumentação o Desembargador, diz que a lei de registro público autoriza a
mudança desde que haja um motivo para isso.

Dessa forma, o juiz considerou o argumento da apelante, não com base na proteção
da instituição familiar, mas nos reais motivos que levou Kayene a pedir a alteração
do seu sobrenome. Não obstante, o Tribunal de Curitiba também considerou os seus
argumentos válidos e que esta não havia outra intenção, como interesse de lesão à
terceiros ou de realizar a mudança por um mero capricho.

Convém lembrar também, que a dignidade humana, nos dois casos a serem
analisados devem ser considerados. Em consonância com essa temática Sarlet
(apud, FACHIN E PIANOVSKI, 2008, p.102) conceitua que:

“O princípio da dignidade humana é uma qualidade intrínseca e distintiva de


cada ser humano o que faz dele merecedor do mesmo respeito por parte do
Estado e da comunidade. Deste modo garantido a ele direito e deveres
fundamentais que asseguram um mínimo de respeito e de uma vida
saudável.”

Logo, é imperioso ressaltar que na sentença de Kayene, observou-se esse princípio


haja vista, que no momento de proferir a decisão, tanto o juiz quanto o
desembargador, considerou que o abandonou afetivo que a requerente relatou,
possuem um caráter degradante, pois o abandono afetivo fere diretamente com a
sua dignidade humana. Desse modo, também poderia, no caso da família Silverinha,
aplicar uma analogia com o relatado anteriormente, pois as crianças igualmente
sofrem constrangimentos físicos, psíquicos e emocionais por causa de atos não
cometidos por elas, mas pelos seus genitores demonstra a violação da vida digna.

Assim, parece que não é conveniente deixar um princípio constitucional e inovador


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de lado e seguir a letra da lei sem ao menos tentar entender todo o contexto que o
caso concreto apresenta.

Deve-se ressaltar também que o juiz, representante do Estado, quando acionado,


deve ter sempre em mente antes de proferir a decisão, que a Constituição está
localizada acima de todas as outras normas e princípios e por tal motivo deve ser
um item orientador de todas as sentenças.

De acordo com a estudiosa Dias (apud, FARIAS E ROSENVALD, 2009, p.224)


explica que:

“[...] o direito à identidade tem assento constitucional, pois está inserido na


sua norma de maior relevância, que proclama o princípio do respeito à
dignidade humana, motivo pelo qual nenhuma justificativa é cabível para
negar a mudança, não se fazendo necessária sequer a alteração de
dispositivos legais para chancelar a pretensão.”

Portanto o nome é um instituto, que por ser carregado de significados tanto para
pessoa que a porta quanto para todos os outros indivíduos da comunidade, deve
possuir respeito e consideração, pois as suas regras e princípios estão garantidos
na Carta Magna brasileira. Não resta dúvida, que essa relevância, faz-se ainda
maior, quando o ser humano está em desenvolvimento, como é o caso dos filhos de
Rodrigo Silveirinha Correa. Para a criança e o adolescente, o nome, além de
distinguir perante toda a sociedade, demonstra a família que pertence e por esse
motivo que carregar um patronímico que traz consigo transtornos e problemas, que
muitas vezes não é nem consigo ser mensurar por eles, faz-se tornar um destruidor
dignidade humana, o que torna a pretensão dessa família mais que legítima.

Sobre essa situação, é possível verificar também, no Código Civil, o artigo 12, que
trata dos direitos personalíssimos no qual pode-se exigir, por via judicial, que cesse
a ameaça ou lesão, ao direito da pessoa.

Ainda podemos verificar no mesmo código os artigos 17 a 19 que faz referencia a


outra proteção ao nome, quando não é autorizado o uso do nome para constranger
o seu titular nem para obter vantagens ilícitas. De acordo com esses artigos, a
pessoa tem o direito de defendê-lo quando sentir que seu nome o expõe ao
desprezo público.

Além disso, no Estatuto da Criança e do Adolescente existe uma previsão


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semelhante a proteção ao nome. No artigo 15, diz que todo menor de idade têm o
direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoa humana em processo de
desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na
Constituição e nas leis.

De acordo com esse artigo, a situação das crianças com o patronímico paterno
constrangedor, tem os seus direitos assegurados também, o que oferece, desta
forma, mais respaldo para a pretensão tanto de Kayene quanto dos membros da
família Silverinha.

Em suma, nos dois casos, o direito de personalidade e o direito à dignidade humana,


além do princípio da imutabilidade relativa abarcam por completo todos os desejos
de se fazer cessar os constrangimentos proporcionado pelo patronímico paterno,
visto que a Constituição tem como orientação inovadora, o respeito ao ser humano,
em primeiro lugar, além de ter outros dispositivos, que também asseguram uma
decisão favorável a mudança de nome. Assim, pode-se concluir que todo o
ordenamento jurídico conspira a favor de uma sentença diferente do que foi
proferida pelo Tribunal fluminense.
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3 REFERÊNCIAS

ANDRADE, Valdeciliana da Silva Ramos e GABRIEL, Valéria Cristina Barbosa. Os


meandros discursivos do texto jurídico: da Leitura à Produção. Vitória: Mimeo,
2005

ANDRADE, Valdeciliana da Silva Ramos. Linguagem jurídica: Um estudo do


discurso forense: Vitória, 2010.

ANDRADE NETO, Carlos Gonçalves de. Direito ao nome e mutabilidade do


patronímico. Revista da Faculdade de Direito de Caruaru. Caruaru, n1, v.36,
p.109-121. Jan/Dez 2005

BRANDELLI, Leonardo. Considerações acerca do direito ao nome numa perspectiva


constitucional do princípio da dignidade da pessoa humana ( Comentários ao
Acórdão exarado na Apelação Cível n 2003.001.12476, do TJRJ). Revista
Trimestral de Direito Civil.Rio de Janeiro, vol.22, p.193-202, abr/jun. 2005

Diniz, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: 1. Teoria Geral do Direito
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FACHIN, Luiz Edson; PIANOVSKI, Carlos Eduardo. A dignidade da pessoa humana


no direito contemporâneo: uma contribuição à crítica da raiz dogmática do
neopositivismo constitucionalista. RTCD. Vol.35. p.101-119. Jul/Set 2008.

FARIAS, Cristiano Chaves e ROSENVALD, Nelson. Direito Civil: Teoria Geral. 8ed.
Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009.

FERREIRA, Luiz Antonio Miguel; GALINDO, Bruna Castelane. Do sobrenome do


padrasto e da madrasta. Considerações a respeito da lei 11.924/2009. Revista
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WELTER, Belmiro Pedro. Os Nomes de Ser Humano: Uma Formação Contínua da


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