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Tania Quintaneiro Maria Ligia de Oliveira Barbosa Marcia Gardénia Monteiro de Oliveira Um Toque de Classicos MARX, DURKHEIM e WEBER 22 EDICAO REVISTA E AMPLIADA 17 REIMPRESSAO Belo Horizonte Editora UFMG 2003 Copyright © 1995 by Tania Quintaneico, Maris Ligla de Oliveira Barbosa © Miivcia Gardénia Monteiro de Olivelss 1999» 1 reimpres 2000 - 32 reimpre 2001 - is reimpressto Ped, rev. aap 12 reimpressio de 2 ed. rev, smph Rowe livre ou parte dele ao pode ser zeprouzide por qualquer mieics sent avtorizagho ceserita do dior. EDITORAGAO DE TEXTO: Ans Marla de Morses REVISAO DE TESTO & NORMAEIZACAO: Olga M. A. Sousa PROJETO GRAFICO: Gloria Campos ~ danga CAPA: Ready Made Multimidia © Comunicagio, revista por Cassio Ribeiro PRODUCAO GRAFICA: Warren M, Santos FORMATAGAG: Cassio Kibeleo REVISAO DE PROVAS: Barbas Christiane Ferrelea Sil Batora UPMG Av. Antdnio Carlos, 6627 ‘Ala direita da Biblioteca Central - térreo - Campus Pampulha 31270-901 Belo Horizome/Mei Teli: (31) 3499-4059» Pax: (31) 34994768 wuivediior.ufingbe - edioniéufng.br SIDADE FEDERAT, DE MINAS GERAIS rORA: Ana Liicia Almeida Gaztola REITOR: Marcos Horite Viana fe Eildene Soares de Cruz unr k v CONSELHO EDITORIAL Tanudaes AniGnie Luis Pinko Ribeira, Beatie Resende Danivs, Carlos Ani®nio Lake Brsaddo, Helin Maris Morgel Stang, Lala Otivio Fagundes Amal, Mara das Geagas Seats 1ebara, Maris Helena Damasceao ¢ Silva Megale, Romeu Cardoso Guincses, Wander Melo Miranda (Presiclente) Suplenten Castano Machado Gontiio, Denise Ribeiro Sues, Leonanla Basel Casious, Lucas José Rreias dos Santos, Maria Aparecida dow Santos Paiva, Suri Nonew Viet, Newton Bignosto de Sura, Reinakle Mariano Mare, Ricardo Castanhuira Minenta Hgueined gm Quintanciro, Tania Um toque de clissices: Mare, Durkheim e Weber / Tania Quintaneiro, Moria Ligia de Oliveira Barbosa, Mircia Gaedénia de Olfweica. ~ 2. ed. rev. ap, - Stale Horizonte: Edsions UPMG, 200%. 159 p.- CAprencler) ISBN: 85-7042-317-3 1 Sociologia - Teoria 2. Sociologia - Historia J. Thule 1, Rarbosa, Maria Light de Oliveira HL Oliveira, Mancig Monteina de, 1V, cht S600 ualogacJo na publicagio: Divisie de Planejamento e Divulguglo da Biblioteca Universitaria ~ UPMG p el er a 8 IN TRODUC AO |A reflex sobre as origens € a natureza da vida social € quase the antiga quanto a propria humanidade, mas a Sociologia, como um campo delimitado do saber cientifico, s6 emerge em meados do século 19 na Europa, Para melbor entender esse processo, é mister referiese a0 quadro day inudangas econdmicas, politicas ¢ sociais ocorridas principaimente 4 partir do século 16 € 33 correntes de pensimento que estabeleceram os alicerces da modernidade evropéia — o racionalismo, © empirismo go iluminismo." A marca ds Europa medema foi, sent dvida, a instabi- fidudle, expressa ea forma de crises nos diversos fimbitos da vida materia], cultural # moral, Foi no cere dessas dramaticas turbuléncias que nasceu 9 Sociologia enquanto um modo de interpretacao chamado a explicar @ “esos” are certg panto assustador em «ue # sociedade parecia haver-se tomado Dassemos a considerar, brevemente, algumas das dimensdes sociais © jatelectuais envolvidas nessa trajetOria MUDANCAS RESULTANTES DA INDUSTRIALIZACAO ‘As grandes transformagoes sociais mio costumam acontecer de ma neira sdbita, sendo quase imperceptiveis part aqueles que nelas estio Smorses, Mesmo os sistemas filosGficos € cientificos inovadores entre Jacam-se 2 tal ponfo com o$ que 0s antecedem que & diffell pensar em teimos de rupturas radicais, Ainda assim, comecara a despontar desde @ Renascenga 2 consciéncia de que uma linha distiniva separtva os novos tempos do que veio a se chamar Medievo# Mudangas na organizacae politica e juridiea, nos modos de produzit ¢ de comerctar exerciam use ieituc efelto multiplicador € geravam confitos ideolégicos & politicos de monte. © avanco do capitalismo como modo de produgho dominante na ceropa ocidental foi desestruturando, com velocidade ¢ profendidade variadas, tanto os fundamentos da vida material como as crengas © os religiosos, juridicos e filoséficos em que se sustentava prinefpios mora 10 © antigo sistema. Profundos cémbios na estrutura de classes € na ossatura do Estzdo foram ocorendo em muitas das sociedades européias. A din mica do desenvolvimento capitalista e as novas forgas sociais por ele engendradas provocaram © enfraquecimento ou desaparccimento, mais ou menos ripide, dos estamentos tradicionais — aristocracia e campesi- nato — e das instituigoes feudis: servidao, propriedade comunal, orga aagdes corporitivas artesanais e comerciais. A partir da seguada metade do século 18, com a primeira revolugio industrial e 0 nascimento do proletariado, cresceram as pressdes por uma maior participagio politica, € a urbanizacdo intensificou-se, recriando uma paisagem social muito distints «la que antes existia, Os céus dos grandes centros industeiais comegaram a cobrir-se da fumaca despejada pelas chaminés de fibricas que sé moltiplicavam em ritmo aceferado, aproveitando @ considerivel oferta de bragos proporcionada pela gradual deteriorago da propriedade comunal, De fato, esta andga instituighe européia vinha sendo aos poucos usurpada pelos grandes proprietirios ¢ arrenclatitios de teas, com base nas leis ¢ nas armas. A capitalizagio ¢ modernizagio da agricul. tura provocaram o éxodo de milhares de familias que, expulsas de seu habitat ancestral, vagavam & procura de trabalho. As Cdades, receptoras desses fluxos continuos, foram crescendo acelerada e desordenacamente. Cendtio de feitas periédicas, elas recebiam pequenos produtores locais ¢ mercadores estrangeiros e, sob o manto de sua intensa atividade, atber- gavam uma populugio de mendigos, desocupados, ladrdes, saltimbancos, piratas de rios e de cais, traficantes @ aventureiros em busca de todo tipa de oportunidades. A cidade acenava 2 todos com a possibilidade de maior liberdade, protepio, ocupaglo e melhores ganhos, embora para muitos tis promessas no chegassers a cumprit-se, No carregado ambiente urbano, a pobreza, o alcoolismo, 08 nascimentos Hegitimos, 2 violéncia e a promiscuidade tomavam-se notivels ¢ atingiam os membros mais frigeis do novo sistema, particularmente os que ficivam fora da cobertura das leis € instituigdes sociais, Aaglomeracio, conpigada a outros fatores como as condigdes sani- varias, tinhs outras conseqiiéncias deletérias sobre a populag3o urbana, especialmente sobre os mais miserivels. A fome, a falta de esgotos ¢ de Agua corrente nas cass, 0 Hix acumulado © as precarias regras de higiene conitibviam pare a proliferacko de doencas ¢ a intensificaglo de epidemias que elevavam as taxas de mortalidade da populagio em geral, e dos pobres, das criancas e parturientes em particular! A gente decente bankava-se somente por order médica o banho diirio era coisa de nobres ¢ libertinos) € “muitos nao tinham iiéia se o Sabo era ou no comestivel”* Foi somente no limiar do sécuto 18, com as revolugdes industrial © agricola na Inglaterra, que uma selativa abundincia de alimentos juntamente com outros Eatores ligados @ methorias na higiene promoveram ima sensivel reducao clas taxas de mortalidace ¢ um correspondente aumento da populacko. Av quedas tor da int po ine sal en ale te ua an fre op im de es pe Ee pe ah far id a re he ne i of cr lic « ci abruptas, uma constante na puuta demogrifica dos periodos anteriores, tormaram-se menos freqiientes, Entre 1800-1850, 0 crescimento populacional da Europa foi de 43%. Alguns pafses ultrapassaram os 50%. Na Frunga, ne inicio do século 19, a expectativa média de vida subit 2 38 anos, e 7% da populagio ji chegavam aos 60 anos, embora 44% nao passassem dos 20. As condigdes de trabalho que caracterizam o inicio da revolugao industrial ersm assustadoras para os padrOes atuais ¢ podem ser respon- sabilizadas pela baixa expeetativa de vide dos operitios que labutavam em turnos didrios de 12 a 16 horas, ampliados para aé 18 horas quando a iluminagao a gis torou-se dispontvel. Fol em 1833, ¢ somente nas fabricas réxteis da Inglaterra, que criangas entre 9 ¢ 13 anos foram proibicks de trabalhar em jomadas de mais de 9 horas, € as que tinham entre 13 © 16 anos por mais de 12 horas, sendo o tuo da noite reservado para que freqhentassem a escola.> © salitio dos aprendizes era em geral a metade do que se pagava aos operfirios, © das mulheres 2 quatta parte, ¢ 0 das criancas... jf se pode imaginar. Aiém das doengas devidas to ambiente insalubre, da alimentagio deficiente, da falta de aquecimento apropriado, da disciplina nas falaricas das muitas que reduziam ainda mais seus ganhos, os wabalhadores estavam expostos a freqlientes acidentes provocados pelo maquinario pesado que mutilava ¢ matava, Muitas revoltas tiveram como alvo as proprias maquinas, destruidas pelos operirios eafurecicos, como no cha- mado movimento ludista. A luta por melhores condigdes de trabalho, na Europa como na América, foi iscua, ¢ novos direitos foram sendo aos poucos conquisiados ¢ acrescentaclos & legislagie social ¢ trabathista em diversos paises, Mudancas também ocorteram, em distintos graus, na instituicte tamiliar, tanto no que se refere ao status de seus membros segundo sexo € idade, como 4 natureza das relagdes pessoais e juridicas entre eles. Em questdes tais como o controle de proptiedades por parte das mulheres, & relativa auronomia dos fillkos, a aboligio do direito de primogenitura houve avancos significativos, dependendo da dindmica interna das socie- dades. Menos visiveis, mas igualmente profundos foram os desenvolvimentos no universo das relacoes afetivas, Nas camadas altas e médias das comu- nidades medievais, onde nome e fortuna cram o bindmio que marcava os destinos de homens ¢ mulheres, a escolha de parceiros dependia de critérios estamentais ou refietia interesses politicos ov econdmicos fami liares. Com o advento da modernidade, certas instituigdes comecaram a se consolidur ¢ a adquirir importéncia -~ entre elas 0 amor romintico, @ casamento por escolha métua, a estrotura nuclear da familia, 0 reconhe- cimento da infancia e mesmo da adolescéncia enquanto {ases peculiares da vida, A presenca de uma nova sensibilidade € de atitudes, comporta- nientos ¢ valores distinigs — como os mimos que passam a ser dedicados ee ee ne as criancas, até entio vistas como adultos em miniatura — s6 se tora conspicua quando se atenta para o longo prazo €, meso assim, as priticas anteriores mio deixam de ter vigéncia. De fato, provociria escindalo nos dias de hoje a indiferenga com que freqientemente os pais walavam as i ' ctiangus até que elas ultrapassassem o limite de idade que permitia ter ' esperanga em sua sobrevivéncia.” Como na est6ria de Joao ¢ Maria, nao era incomum que fossem abandonadas por fimilias que nao tinham meios de ‘ crif-las. O infanticidio era secretamente praticado e moralmente admitido, : Um sentimento de familia mais proximo do que existe nos dias de hoje | deve-se também ao aparecimento, nas casas burguesas da Ingiaterm, dos espagos privados, chtramente diferenciados do lugar do trabaiho, embora o proletiriado urban demorasse ainda aleangar esse beneficio.® Entre outtas coisas, # industrializegio também modificou profunda- menie a percepcao do tempo entre as populagdes européixs, ajustadas a 1 sitmos natursis em obediéncki a costumes milenares. Isso se explica porque ‘ quanto menos os povos dependem da tenologia para levar adiante suas ‘ atividades produtivas, mais o tempo social € regulado pelos fenémenos da ‘ mature7it — as estagdes, as marés, a noite € o dia, o clima, A revolugio “ industrial obriga a um registro mais preciso do tempo na vida social, O ' empresério passe a comprar horas de trabalho © a exigit seu cumpri- mento. Os tabalhadores perdem © controle do ritmo produtive que impde uma disciplina até entio desconhecida.” Uma nova moralidade a sustenta desde os pélpitos até que os operirios, organizados em associagées, comegam a rebelar-se contra as exigéncias excessivas, O esforgo para entender as causas © 05 proviveis desenvolvimentos das novas relagbes sotiais motivou a reflexio que veio a cristelizar-se na Sociologia ANTECEDENTES INTELECTUAIS DA SOCIOLOGIA : Pelo menos até o século 18, a maioria dos campos de conhecimento, hoje enquadrados sob 0 r6tulo de ciéncias, ¢ra ainda, como na Antigthidade Classica, parte integral dos grandes sistemas filosGficos..A constituicao de saberes auténomos, organizados em disciplinas especificas, como a Bio- logia ou @ propria Sociologia, envolvers, de uma forma ou de outta, a Progressiva redefinigto das quesides Gltimas colocadas teadicionalmente pela reflextio filosGfica, como a Bherdade © a raz%0. Consideraremos brevemente algumas id¢ias cujo impacto foi marcante para a configura das primeiras teorias sociais modernas. Concomitantemente aos processos de ordem socioecondmica, mudangas culturais contribuirio para suplantar a concepcio orginica, id cominante na Antigiiidade ¢ ao periodo medieval, substituindo-a por conrentes de pensamento de base individualista."” A Reforma protestante, iniciuda no sécula 16, foi um momento importante nessa trajetdria. Ao contestur a autoridade da Igecja como instingia oidma na interpretacho clos textos sigradas & na absolvico dos pecados, a Reforma colocou sobre © fiel essa responsebiliade ¢, instituindo o fivre exame, fez ds consciéneia individual © principal nexo com a divindade, O espirito Secular impregnou distintas esferas da atividade humana. Generslizou-se os poucos a conviegie de que o destino dos homens também depende ide suas agdes, Criticas & echucagao tradicional nas universidades catoticas levacum 2 substituigia do estudo da Teotogia pelo da Matema Quimica. A crenga de que a razlo & cxpar de capiar a dinamica vo mundo material ¢ de que a lei natural, inserita no coragao dos homens, pode ser descoberta espontineamente vai ganhando forga, cleteriorando, 205 poucos, fs velhos principios de autoridade — entre os quais os mantidos pela Igrejt teatélica, Sobre ess base, torna-se mais ficil compreender a emergéncia do empirismo, do ricionalismo cartesiano" @ © avango das ciéncias experi jmentais que, no seu Conjunto, caructerizario a ext moderna. ‘Akém do inspacto. das mudangas provocadas pela Revolucio Industria, utribui-se & Revolugto Brancess, alentada pelo movimento de idéias da Hes tracio, um extriordindtio impulso para que o modo socioldgico de investigar ¢ interpretar a realidade social se comasse possivel.7 A confianga na raza ¢ na capacklade de © conhecimento levar a humanidade a um patamar mais ato de progresso, regeneranda o mundo através da con” quista da natureza ¢ promovendo @ felicidade aqui_na terra, tomnouse puncleira e simbolo do movimento de critica cultural que marca o Setecentor, © Século das Iarzes — a Tuminismo.” E esse movimento de idéias — que canga sew porto culminante com 2 Revolugio Francesa € 0 nove quate sociopolitieo por eka configurado — que terd um impacto decisive na formacio da Sociologia € na definigio de seu principal focor o conflito entre o legado da tradigio e as forces da modemnidade, 4 idéis de liberdacle passou, entio, 2 conotar emancipacto do indivéduo da autoridacle social € teligiosa, conguista de direitos, e autonomis frente ds instituicdes. A bur quesia europtia ihustrada acreditava que a ago ractonal trasia ordem 20 thunde, sendo a desordem um mero resultado da ignorancia. Educados, fo seres husmanos seviam bons ¢ iguais. Embora status da mulher cont- nunsse a ser inferior, comegava-se timidamente a pensar, € mesmo a pro mover, em algumas esferas, 2 iguaklade civil entre os sexos." A idéia de que o progresso era uma lei inevitével que governava ax sociedade: consolida-se e vem 2 manifestar toca 1 sua forga no pensamento social do séctilo 19, atuando diretamente sobre 0s primeisos tedricos da Socio Jogia. Na busca de explicagSes sobie a origem, 2 naturezs ¢ os possiveis amos que romariam as sociedades em vias de transformago, temas tals Va 4 como libercade, moral, leis, diteito, obrigacSes, autoridade e desigualdade samham destaque e vem a fazer paite também do elenco de questoes que a Sociologia se coloca, Charles Louis de Secondat, Baro de la Bréde e de Montesquieu: conhecide como Montesquieu (1689-1755), foi um filésofo politic de grande impacto sobre as ciéncias sociais, tendo langado mo do conheci- mento histérico e empirico para fundar seus argumentos, distanciando-se, assim, do raciocinio hipotético-dedutivo caracteristico dos contratualistas Gracas ao saber adquirido por meio de suas viagens ¢ leituras, inovou ae Propor a assungio de um ponio de vista comparative no estudo das socie~ dades ¢ suas instituigdes, cenclo analisado mo apenas 2 trajetria dos povos de tradigao crist’-ocidental mas também sociedades orientais, como a tured ¢ a persa, Talvex, sua contribuige tedrica mais importante refintse & sua concepgao de leis como “relagdes necessiirias que derivam da natu reza das coisas”. Cabe ag intefecto humano descobridas, E na medida em que a lei em geral um principio de razao, ceve-se procurar que as leis positivas, isto é, as leis politicas ¢ civis, atendendo as panticularidades do clima, da geografia, da raga ¢ dos costumes de cada povo, sejam harmé nicas com essa ordem maior. Este é 0 espirito das leis. Mas as leis que govemam os homens nig sio sempre obedecidas por estes, sujeitos i paixdes, a ignoriacia ¢ ao exo. Por isso, © mundo inteligente bem gevernado como 0 fisico. Sob esse ponto de vista, a liberdade & eatendicla como *o direito de fazer tudo quanto as leis permitem; e, se um Cidadio pudesse fazer o que elas protbem, nao teria mais libesdade porque 8 outros terium idéntico poder’. Em sintese, a caracierizigao da esfera social como um campo diferenciado ¢ a procura das leis que regem sen movimento representim o legado mais imporente de Montesquieu & formacae do pensamento sociologico. Partindo da concepgio de um estado de natureza onde nio exist tiam desigualdades, ¢ tampouco moralidade, 0 genebrino Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), ao mesmo tempo que prolonga a tradigao contratua- Jista Uo Seiscentos, modifica o contetido eo sentido do chamado *pacto social” 0 qual, ao fazes surgir 0 poder da fei, legitimou a desigualdade, a injusta distribuicao da propriedade e da tiqueza, € também a submissia, a violencia, os roubos, a usurpacto e todo tipo de abusos, © estado civil, além de ser um artificio, um ato de associago ao qual a vontade individual se submete, é o resultado de um processo historico. E é, precisamente, nessa visio evolucionista e na critica do proceso civilizatério onde haverd de buscar-se a heranga mais duradoura que o genebrina legou A Sociologia No estado primitive, o homem €, segundo ele, “um ser livre, cujo coracio estéi em paz. eo corpo com satide”. Com a formacio da sociedade ¢ das leis © 0 surgimento de governantes, os seres humanos perdem a liberdade @ os direitos naturais. Eles passam # fazer parte cle um rebanho chamado socie- dade onde reina uma uniformidade desprezivel e enganosa. A vica civil e 9 dependéncia mtituas ctiam entre eles lacos de servidlto. “ 4 ™ | Embont nese estado (o ser humans) se prive de mbitas vantagens que fui a natureza, gana outras de tguat mionta: suas faculdades se exercem © se cesenvolver, surts idéias se alangamy, seus sentiments se enobrecem, tod 4 suit ala se eleva a tal pont que, se o8 abuses dasia nowa condigto ato 9 degeadassem freqdentemente 4 uma condicio infesdor Aguela de cade salu, cleveria, sem cesar, hendizer 0 Insidte feliz que dela 6 asrancou pars sempre ¢ fez, de um animal estipide © limitado, um ser tateligente © wen hosner.” Entre os beneficios alcangados, 0 habito de viver juntos criou nos seres humanos sentimentos doces como o amor conjugal & paterno, nao havendo, no inicio, diferengas entre o modo de viver dos dois sexos. O jugo auto-imposto — a fonte dos males — deveuse so aumento de comodidades, que acabaram por se tornar indispensdveis. Assim, © homen, de fives e independente que ances ea, devide a ume mnultidie de novas necessidades, passou x estar sujetto, por assim dizer, « toda « nature7a e, sobrewds. a seus semelhantes dos quais, um certo seatide, se ‘oma eserava, mesmo quancly se toons senhor: Fico, tem necessidade de seus servigas; pobre, precisa de seu Socorro. Esses males constituem 0 efeito da propriedade privada, cujo esta- helecimento € 9 primeiro progresso da desigualdade. Numa frase moito conhecida, cle afirma que *o verdadeiro fundador da sociedade” foi aquele que primelro cercou um terreno e lembrou-se de dizer: “isto € meu", tendo encontrado “pessoas suficientemente simples para acredita-lo”. © género humano ficou, enti, submetide ao trabalho, & servidao ¢ & miséria, susgiram preconceitos “contratios 4 razio, & felicidade © a vie tude" ©, por fim, © despotismo. Assim, “por mais que se admire « sociedacie humana, no serd menos verdudeiro que cla necessariamente leva os homens a se odiarem entre si a medida que seus interesses se. crazam, a aparentemente se prestarem servigos e realmente a Se causarem todos os males imaginaveis’.*” No coragte de todo homem civilizado esta 9 desejo de ser o rei do universo, diz Roussedtu, © movimento iJuminista depositava uma imensa fé na capacidade de a humanicade utilizer-se da razlo © assim progredit. Advogar que, utili- andlo-se

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