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O Trabalhador-Estudante no Ensino Superior:

suas Representações e Expectativas em Relação


ao Mercado de Trabalho e ao Ensino

Pesquisadores: Ana Shirley de França Moraes (coordenadora), Renato


Ferreira Carr e Lúcia Helena Martins Gouvêa
Instituição: Universidade Estácio de Sá (UNESA) Fonte Financiadora.
UNES A/Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação

O problema: contextualização

O modelo econômico adota- lização, conduziu à intervenção das


do, a partir de 1964, cujo período "metrópoles" não só no plano
militar de governo foi um marco em econômico, mas, da mesma forma,
termos de trajetória político-econô- nos planos político, social e educa-
mica, trouxe a definitiva inserção da cional. E claro que para suprir as exi-
economia brasileira ao controle do gências do novo mercado que se
capital internacional (Skidmore, criava, o sistema de ensino deveria
adaptar-se, reformar-se, à luz das no-
1982). Tal modelo pregava a moder-
vas exigências de qualificação pro-
nização, assegurando a expansão de
fissional, a fim de se adequar às no-
mercados, porém aumentando a vas perspectivas ocupacionais, em
distância em todos os níveis entre os função da crescente oferta de traba-
centros criadores de tecnologia e lho criado (Romanelli, 1989).
ciência e os países consumidores, Com o enfraquecimento do
como era o caso brasileiro. Este antigo modelo de ascensão da classe
processo imperialista, marcado pela média (Cunha, 1977) e a crescente
ação do capital estrangeiro, em sua oferta de trabalho criada pelo novo
lógica de acumulação e centra- modelo econômico, a classe média
passou a acreditar que as hierarquias majoração da remuneração dos tra-
ocupacionais das empresas eram a balhadores e sua ascensão social e
única forma através da qual pode- profissional.
riam manter ou conseguir status. E notório que a cada dia o
Assim, a procura de trabalho cresceu mercado de trabalho vem exigindo
significativamente, o que caracte- mais tempo de escolarização aos
rizava a oferta, mas não o emprego, seus postulantes, onde o título se
pois entre ambos havia a exigência torna indispensável no momento da
da qualificação. Por isso, a educação competição por determinadas fun-
passou a ser vista como um caminho ções, mesmo que não garanta
para que as classes médias conquis- status, estabilidade e salário com-
tassem postos e as empresas supris- patível (Frigotto, 1989). Isto pos-
sem seus quadros. to, todos sabem: trabalhar é neces-
Nesse clima vem à cena a sário, mas estudar, também. Mes-
visão da educação sob o ponto de mo sabendo-se que o título não ga-
vista econômico. Cabe revelar que rante um emprego, pelo menos co-
a Teoria do Capital Humano loca apto o indivíduo a disputar,
(Schultz, 1973), uma teoria do de- com alguma chance, um lugar no
senvolvimento, constituiu-se, no mercado de trabalho, ou a ascen-
Brasil, nesse momento, em verda- der profissionalmente, através dos
deira "Teoria da Educação", geran- planos de carreira das empresas.
do a crença de que o investimento Hoje, empiricamente, o que
em educação garantiria o aumen- se vê é uma quantidade significativa
to do desenvolvimento cognitivo de indivíduos, homens e mulheres,
e a competência técnica dos indi- jovens e adultos, que se dividem di-
víduos. Como conseqüência, im- ariamente entre as funções de traba-
plantou-se o "otimismo pedagógi- lhador e estudante, concomitante-
co" na sociedade, acreditando-se mente, fazendo parte de seu cotidi-
que o maior nível de escolaridade ano o acúmulo de responsabilidades
possibilitaria o aumento da capa- e a exigência de tempo de dedica-
cidade de produção individual: a ção à educação e ao trabalho.
Para que o trabalhador pos- de aluno que cresce, dia a dia, en-
sa estudar, necessita de um tipo de quanto expressão da demanda por
escola que permita a conciliação do vagas no 3o grau: o trabalhador-es-
trabalho com o estudo, oferecen- tudante no ensino superior.
do horário compatível, boa locali- A proposta do Projeto de
zação em relação ao emprego e à Pesquisa Trabalhador-Estudante
moradia, maior oferta de vagas e surge da observação direta docen-
qualidade de ensino, entre outros te, resultado da convivência diária
fatores. Assim, pelo que se perce- na sala de aula, com alunos na Uni-
be na realidade do ensino superior
versidade Estácio de Sá, no Rio de
brasileiro, principalmente nos
Janeiro. Com base nesta observa-
grandes centros urbanos, é cada
ção, verifica-se que os cursos de
vez maior o número de trabalha-
dores da classe média que procu- graduação noturnos, principalmente
ram escolas superiores noturnas os de ciências sociais aplicadas e
(Sposito, 1989), geralmente parti- humanas, são constituídos majori-
culares, vinculadas à formação tariamente por trabalhadores. Em
para o mercado, em função dessa função disso, percebe-se a investi-
necessidade. gação sobre o trabalhador-estudan-
Há, inegavelmente, nessas te no ensino superior como neces-
instituições de 3 o grau, universitá- sária, pois, através do conhecimen-
rias ou não, alguns atrativos, pois, to de suas representações e expec-
mesmo cobrando mensalidades, re- tativas quanto ao mercado em que
cebem todos os anos um número atua e ao ensino que recebe, poder-
cada vez maior desse tipo de dis- se-á efetuar mudanças que resultem
cente que, muitas vezes, por falta em maior qualidade na formação do
de opção pela escola pública (Buffa, trabalhador, visto que se deve ele-
1979), não tem outra alternativa, ger o mundo do trabalho como pon-
mas não desiste de prosseguir na to de partida para se pensar a edu-
escalada educacional. Dessa forma, cação do trabalhador (Kuenzer,
cabe conhecer essa nova categoria 1988).
Amostragem e instrumentos nos, vem representando significati-
va "clientela" dos cursos noturnos
A observação direta docen- de graduação. Tal proposição se en-
te realizada cotidianamente não dei- caminha para um estudo de caso
xa dúvida quanto à nova categoria institucional particular, mas que
de alunos adultos que vem se cons- apresenta semelhança discente com
tituindo, com o passar do tempo, outras escolas superiores, vinculadas
na maior expressão da demanda ao à formação para o mercado de tra-
ensino de 3o grau. O trabalhador- balho, como primeira vocação;
estudante no ensino superior — o pode-se, por conseguinte, generali-
aluno que trabalha durante o dia e, zar os resultados obtidos ao final.
à noite, procura a universidade, a O estudo será realizado num
fim de completar a educação escola- enfoque fenomenológico, utilizan-
rizada, tão exigida no mercado de do-se, inicialmente, levantamento
trabalho — torna-se o objeto de bibliográfico consistente, a fim de
estudo na investigação proposta, sustentar teoricamente a pesquisa
sendo a Universidade Estácio de Sá de campo exploratório-descritiva
(UNESA), no Rio de Janeiro, o (Lakatos, Marconi, 1991), quanto
locus da pesquisa, mais propriamen- à coleta de dados, que será realiza-
te os seus vários cursos oferecidos da com os alunos-alvo do estudo
no horário noturno, principalmente — os trabalhadores.
os da área de ciências sociais apli-
cadas e humanas.
A escolha da UNESA justi- O universo e a seleção de sujeitos
fica-se pelo fato de que foi nessa ins- (amostragem)
tituição, a partir do relacionamento
acadêmico docente-discente, no ato Como o universo de alunos
de ensino-aprendizagem, que se deu é muito amplo (ao todo são 7.694
o reconhecimento dessa nova cate- estudantes matriculados nos 15 cur-
goria de estudantes que, fundamen- sos noturnos, voltados para a área
talmente nos grandes centros urba- em questão), o método adotado para
a coleta de dados, (realizada através CUNHA, Luiz Antônio. Educação
de dois instrumentos de pesquisa, e desenvolvimento social no
questionário e entrevista), obedeceu Brasil. Rio de Janeiro: Fran-
à seguinte criação de amostragem: cisco Alves, 1977.
— Foram escolhidos rando-
micamente três cursos de gradua- FRIGOTTO, Gaudêncio. A produ-
tividade da escola improduti-
ção noturnos, na área de ciências
va. São Paulo: Cortez, 1989.
sociais aplicadas e humanas: Admi-
nistração de Empresas, Direito e KUENZER, Acácia. Pedagogia da
Ciências Econômicas. fábrica, as relações de produ-
— Nesses três cursos esco- ção e a educação do trabalha-
lhidos aleatoriamente, foram sorte- dor. SãoPaulo: Cortez, 1988.
ados quatro períodos, a serem alvo
de estudo, e a disciplina com maior LAKATOS, Eva Maria, MARCONI,
número de alunos matriculados em M. de Andrade. Fundamentos
cada período delineou a população- de metodologia científica. São
alvo desta investigação. Paulo: Atlas, 1991.
A investigação encontra-se na
fase de pesquisa de campo, já tendo ROMANELLI, Otaiza de Oliveira.
História da educação no Bra-
sido realizada a revisão da literatura
sil. Petrópolis: Vozes, 1989.
sobre o tema. Assim, espera-se que,
no seu final, este trabalho contribua SCHULTZ, Theodor W. O capital
significativamente para a área Educa- humano. Rio de Janeiro: Zahar,
ção e Trabalho e, principalmente, para 1973.SKIDMORE, Thomas.
o trabalhador-estudante brasileiro. Brasil de Getúlio a Castelo. Rio
de Janeiro: Paz e Terra, 1982.
Referências bibliográficas
SPOSITO, Marilia Pontes (Coord.). O
BUFFA, Ester. Ideologias em conflito. trabalhador estudante, um perfil
escola pública e escola privada. São do aluno do curso superior no-
Paulo: Cortez e Moraes, 1979. turno. SãoPaulo: Loyola, 1989.

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