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PARA PENSAR O DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL ‘MARCEL BURSZTYN (ORGANIZADOR) "ARMANDO MENDES IGNACY SACHS CRISTOVAM BUARQUE LADISLAU DOWBOR RONALDO CONDE AGUIAR BERTHA BECKER PEDRO LEITAO IBAMA — Instituto Brasileiro de Meio Ambiente ¢ Recursos Naturais Renovitveis ENAP — Fundagio Escola Nacional de Administragio Puitlica editora brasiliense com by AUN IM Nenhuma parte desta publicapto pode ser gravada, ‘armazenada em sistemas eletrOnicos, fotocopiada, reproduzida por meios mecdinicos ou outros quaisquer sem autorizagto prévia do editor. ISBN: 85-11-14090-5 Primeira ediao, 1993 Revisto: Ana Maria Mendes Barbosa Capa: Quatro Design / Valéria Torres Esta publicagio conta com o apoio do PNMA — Programa Nacional do Meio Ambiente. As opinides emitidas pelos autores sao de sua exclusiva responsabilidade e ndo representam vontos de vista oficiais do IBAMA ow da ENAP Au. Mamuts de Sto Vicente, 1771 (01739-903 - Sao Paulo - SP Fone (O11) 825-0122 « Fax 67-3024 IMPRESSO NO BRASIL Apresentagao Duas ciencias to proximas em seus objetivos, mas que se distan- laram notavelmente: economla ¢ ecologta ‘A primeica caiu na armadilha do antropacentrismo, passando a Considerar a Navurezi como mero meio de produglo, como instru mento gerador de riquezss;a segunda enveredou pelo descaminho do biocentrismo, esquecende que o Homem precisa de producio para sobreviver e que, como qualquer animal, preda recussos da Naureza ‘crise ambiental atualc, mais particularmente, a dficuldade de se teverter 0 impasse gerado pelo confito entre desenvolvimento & ‘meio ambiente reflete a distancia que separa as ldgicas em prética nas dduas ciencias gemeas | product do enneei de dowenvotnimente sustentinel repre. ‘senta, por un) lado, uma alentadora centauiva de reconcile a busca do bem-estar presente com a sequranga de condigbes de vida satsfa- {6rias no futuro, Por outro lado, hd uma preocupante tendénciaa que se tome mais uma panaotia slvacionista, que itude 0s alarmados¢ inibe 1 alarmisias, sem necessarlamente resolver os problemas que gers am o alarme, A presente obra foi organizada no sentido de conttibuir para 0 ‘debate sobre os caminhos a serem seguidos na busca do progresso bu man. Nao 9¢ wata de proposta de valldagio de um conceito, mas es- senclalmente de apontar elementos que possam ser norteadores do cenfrentamento do impasse atual, através de estratégias que levem em " PARA PENSAR © DESENVOLVIMENTO SUSTENTAYEL, conta 4 dimensio clentifica, as polfticas pablicas eo conhecimento de alguns grandes temas, Tais elementos s40 essenciais no apenas as decisdes relaivas 2 gest20 ambiental, num sentido ecol6gleo, mas tam: bem a concepcio de novas ¢ mais accrtadas estratégias de gestao dos recursos disponiveis a0 desenvolvimento econdmico. © difema desse final de século, ¢ de mifénio, rflete, na verdade, ‘0 umpasse de racionalidade a que chegou aventura do desenvoles. ‘A grande indagacao que vem polarizando debates recentes diz res peito a0 que deve ser priorizade: 2 busea illmitada do bemestar mate: al (0 TER), ou a preocupacio com a durabilidade das diferentes for mas de vida (o SER). Os cientists discutem exaustivamente, mas na vida teal as decisdes econdmicas parecem ainda nfo ter equacionado ‘esse dilema satisfatoriamente, Isto 80 deve ocorrer na medida em que 1 oposigdo SER TER seja transformada em agregacio: SER e TER, ‘Adela de organizar esta coletanea surgiu como resultado Ge vi "los cursos organizados conjuntamente pelo IBAMA ~ Instituto Brie sileito de Meio Ambiente e Recursos Naturals Renoviveis —, através ddo Programa de Capacitagio de Recursos Humanos em Gestio Am- Dien, e pela ENAP — Escola Nacional de Administragao Publica Voltados para a formagio de quadros essenciais a formulagio € ‘a implemencacao de uma poltica de meio ambiente que leve em con: sidera¢do 0s imperativos da preservagio da qualidade ambiental, sem perder de vista 0 elemento humano, esses cursos provocaram impor. tantes debates. Ficou patente a importancia de se produzir elementos de reflexio que servissem ndo apenas iqueles profissionals atuantes dlicetamente em meio ambiente, mas também a todos que procuram entender 0 complexo debate sobre os impasses do desenvolvimentis. ‘mo €.0 desafto do desenvolvimento sustentrel MB, Sumario Apresentagio primeira parte [REPENSAR O PENSAMENTO Breve itineritio dos ecossistemas & ecopoesia ‘Acmando Dias Mendes Estratéglas de transicao para o século XX Tgnacy Sachs. © pensamento em um mundo Terceiro Mundo Cristovam Buarque segunda parte PENSAR 0 ESTADO Estado e melo ambiente no Brasil Marcel Bursztyn Descentralizagio e meio ambiente Tadislav Dowbor. 83 103 terceira pare INCLU OCC CTLVDUN PRORERMAG Primeira Parte a REPENSAR O PENSAMENTO Breve itinerdrio dos ecossistemas 4 ecopoesia:' Achegas para o seu tracado ARMANDO DIAS MENDES Principlo 24 — A paz, 0 desenvolvimento e protesao ambiental S10 interdependentes ¢ indivisve's Carta da Terra 0s piores males que ameagam © nosso planeta sio a ignorancia € a opressio, ¢ nio 4 ciencia, 2 tecnologia a industria, pelo de Heidelberg” A Conferéncia do Rio consagrou a entrada dos Estados mais po- derasos em uma nova guerra mundial: a do meio ambiente. (..) NO ‘centro das preocupagoes, 1 questio da “governabildade da Terra” Jean-Paul Déleage! 10 presente texto basa, ampllando a edesenvolvendo a, nas a0 ‘as ilizas pelo suror no panel “A questo amblcnal eos enfoques dip Save" anabrtra doce sobre go able ENAP-= sc Nace de Auminstragdo Publica, Bra set/1992) Alem dco, reomacaprofenda ideas emia expos, etclpalmchte, em tes Otros abalnos concesi ta emesis a Pax sirasonica, MENDESII99\, Boos da Bo:92, MES. Des9p2a.e Aca ambiental edesencalcimento ou 0 habla! 0 baba, MENDES/I991b. 2 UNCED 5: Llanpt de Hederbors x PERTONSKI, Eth, “1 tosophies dela nate”, Ecblogie Palligued2_ p50, {U DELEAGE, Jean Pal, Reo Heilderg Maastricht, in Ecologie Poi rene tor des pt 2 PARA PENSAR O DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL A nossa tee € de que os novos tipas as novss dimensbes do agi eclamam soma dca de prevtsao e da responsabilidade que Ines sea CO- rensurivel € que € to nova como 0 sio as eventuslidades que deve en frentar. Hans Jonas’ (© ambiente (othas) € apropriado pelo homem como fonte € ob- jete de conhecimenta, como material de consteugio do Universo ¢ como locus de vida ou habitat, Os cendrlos assim decompostos sio, ‘esquematicamente, 6 ambiente natural, o construido ¢ 0 ocupado — obviamente, superpostos. Por iso interagem, interpenetram-se. Para feito de andlise, entretanto, podem ser expostos como constituindo ‘meio ecol6gico, o modo ccondimico 6 mundo ecumenico. Em re ‘sumo, o homem trabalha-os, trabalha com ¢ trabalha nos trés olkos: olkoslogos, cikosnomos ¢ otkosmene Resta ver como se articulam, harmonizam ou repelem. De leitor a cultor aca ecologia, enquanto ciéncla, o homem ¢ instrufdo pelo am biente natural —a propria natureza constinuindo-se 0 objeto perquit: do pelo homem. Trata-se de aprender a natureza, além de aprender ‘com natureza, 0 Jogos cientifico aprendido no meio circundante re sulta na decifracdo de suas regularidades, das rlagbes que as definem, € portanto das leis que o conformam. A ecologia € um aprendizado. (© ecoogo € o aprendiz da natuceza; logo: 0 seu leitor, E, por exten: sto, 0 seu descobridor. ‘Coma economia, enquanto arte, a natureza & destruida pelo ho- ‘mem — a Cidade do Homem sendo um projeto cxecutado com re cursos adquitidos na natureza ambiente. Culda-se agora, nao mais de aprender in natura, aprender com cla € nela, mas de apreendé-ia, 0 ‘nomos sockal nel projetado resulta na operacio destinada a transfor ‘Qu092, pI. A expresso "governabildade da Terra” deve'se, porem, 18 acy Sachs, conforme revelacz0 do prOprio Deleage, no seu Bilan de Ro — “entétion avec Jean Chesnais op. ct... 9). Porta ado, 0 tent de Dela fe, urado acima, epercute resposta de Chesneaux na entevista refer, SHJONASTIOOE, p38 6. Assumindo 4 eoncepei0 ¢ = teeminologla de TEILHARD DE CHAR DINII955, pp. 25-30, ‘BOS BCOSSISTEMAS A ECOPOESTA B 1a, usélae anal consumi-la com vistas # algo que se forma por sobre ‘ambiente original. O ecdnomo ¢ 0 usuario doambiente. O seu feito. E, de algum modo, com maior ou menor intengio, o seu modelador. 'Na ecomenia,’ enquanto vida, enfim, © homem € o sujeito do ambiente terminal, construido por ele proprio —e por ele novamen: te inquirido, e zepetidamente requerido. © que se visa no € apenas aptenkler ou apreender © ambiente, mas compreendé-Io — tanto no sentido de uma compreensio maior, como no de uma compreenszo ‘melhor. © mene! existencial tem 2 ver com a esperanga € 2 busca de lum ambiente natural/cultural — “natu-cultural” — (co)ordenado em funcao de um projeto maior, metaeconOmico e metecolégico — me- tafisco. Um projeto em permanente reforma. © ecomeno? € 0 regen- te ou cegedor do ambiente natu-cultural, © seu restor.E, pela via da invengio, o seu principal construtor. Mesmo assim nao basta. & preciso dar um novo passo, mais ouse do, Para ainda além do que se situa além da ecologia ¢ da economia, situa-se 2 meuecomenia. Dela, a ecologia e a economia tomnaram-se adjctos. © homem, consciente, além de aprender, aprender ¢ com preender 0 ambiente, volta surpreender-se com ele —nele se mara villa, F assim alcang2, além do mero saber (a ciéncia ambiental), 2 52- Dedoris (a consciéncia ambiental) e até 0 sabor (para além da compe téncia, a apeténcia ambiental) 7.0 termo “ecumenia impasse x0 autor em dois dos seus textos ante Flores, citados acima, por converRincla com os consagrados terms ecoogta ‘economia. Apetfigaa-o agora par ecomonta, com 0© nao mass com , pot ppermiu meihor conjugageo com os outos voeibulos otuncos ca mesa at Bees otkos (v- noes 9} O ator manifesta a esperanes de tormar tals caro © Seu signified no presence texto, etd convencido de que ease € um neolo samo que velo pad fear. por exoressa luo par 0 dual nao existe sindnimo eonheciso. 0 vocdbulo ecdmeno € ulizido geralmente para significa "a fra ha bitsvel ou babitada da Terra, 0. ainda, “0 gera”, “o universal, como cons {3 dos dictondsos, Preferimosarimar nos expliceeio de OLIVEIRAII992, por parecer a mals consencanc com os hindatentes ds rellexto integrad sobre (06 tes ofkos, aqui assumida Com fundadasrazbes. 9, Mais um neologismo, em paraelo com os substantives “ecdlogo! € “economo”, vilizcios em parigraos anteriores do texto. Da mesma forms {que se evo al falar em "ecologist" e "economista™ nfo caberia aut flat fem “ecumenista. Esses designatvos portam acepgoes distintas, embora peo ims, das que preferimos aqui ullzar, por mouwvos que a leurs atenta dd ‘alo fazgulicienterent laa. pari de ecumena,a pessoa ques Ie ced 2 deveriachamar-e.. "ectimeno” —- termo que f ganhou significado pré- po, inconfundivel.Apelourte, por so, x par de ecommenia (0837), fata 3 adspragio "ecdmeno" “ PARA PENSAR © DESENVOLYIMENTO SUSTENTAVEL, ‘Chegamos, desse modo, 2 ecosofa"" # ento que o homem (te)ve € (e}faz 0 ambiente, por sobre 0 aprendizado que nele cutsou, (0 uso que dele fruiu, 2 regéncla que the imprimiv, podendo 20 fim ‘¢20 cabo deter se para veneri1o— pois o ambiente recuperado é uma cextensio da Criag2o, 0 ecésofo € 0 cultor do ambiente — porque € capaz de cultivé-lo em todas 2s suas potencialidades (enquanto agri Gultor, silvicutor, avicultor, escultor.). porque & capaz, também, de cultuslo na justa medida, Pela contengio com que o abords, ‘converte-se no seu protetor Penetramos, em suma, no terreno diifano da ecopotesis,"" ou ‘ecopoesia. O ser humano aleanea ser um ecopocta — descobre-se um ser ecopoetico. Natu-cultura Esta interpretagio comega, pois trabalnando com 0 conceito de ambiente natura, mas transitainevitavelmente para 0 ambiente ho: mia. ecologia, ela mesma, enquanto ciéncia, deixou de stuarse ro campo estrto da biologa, para aranchar-se também nos campos 4a psicologla da anuopotogi, ca Sociologia, da economi, da pol ca, da ética" 0 habitat do Romem de hi muito deixou de set 0 pu ro cenirio naucal, para ser um cendro cada vez mas ariel, O eet ‘meno resulta ser, 20 fim de conta, um interespaco onde coexistem, convivem, intercambiam-se« ecviam se mutuamenteanaturaea cul wun ‘O ambiente ecuménico, a um tempo naturalidade c humanidade, € objeto da nova cizncia e de novas praticas ecologicas, as mais total. antes de todas. Holisticas.E estamos falando tanto dos varios ecGime- ‘nos espalhados na superficie da Terra, quanto da pépria humanidade como um todo. £ ficil depreender, a partir dessa constatacio, que © 10, GUATTARI/1990 fo tavez um dos primeitos a insinuar a surgimento de uma cera eosofia, com base no que ele chama "oe 8s rewiatos ecOlog ‘cos: o meio ambiente (natura) propriamente dito, 26 relagbes socials € 2 suD- Jedvidade humana ‘Ecopotestssiguficateralmente “eitura de uma casa" 00 “de um a biente", "de um bani” Para maiore expleagdcs de sua orgem, desde HAY. NES, Robert, LOVELOCK, James € ALLABY, Michael, . MENDES/19923, n002& |, Mulupicam.se a8 asocsagbese pubicagces dedicadas 3" ecolopa po- lca Numa dela (Bcologle Poltique/1991) MARTINEZ ALLIER fa urna in ‘cursio exploratra eexteemamente provocativa nesses NOvOS CAMPOS 3o CO. sahecimento, em gestagio. V.tambem COSTANZNI991 OS FCOSSISTEMAS & ECOPOESIA 6 ‘ectimeno incorpora, 2 um tempo, 2 obra da evolucZo natural €a da (esjevolugio social. & seu produto. Na verdade, 0 ecdimeno é sem- Pre um produto inacabado, in fier’. £ um construro, Um processo, © processo civilizatério, ‘A esse processo € que, contemporaneamente, se convencionou, ‘com maior ou menor propriedade, chamar desenvolvimento, Mas 20 longo da historia 0s trés componentes do desenvolvimento — 0 eco- legico, 0 econdmica ¢ 0 ecuménico — nao tém comparecido com pe- 508 equivalentes, no cultivo das civilizagdes. O processo de desenvol- vimento, sobserudo na sociedade industrial, neotécnica,* afeta a nae tureza. Depreda-a. Consome:2. Se a queremos conservat. devemos re- rnunclar As pretensbes de desenvolvimento — desse desenvolvimento ‘ou pelo menos apequendslas. Os efeitos finais de qualquer dessas auludes epercutem na configurago dos ectimenos. F que, tal como nosacostumamos a vere fazer 0 desenvolvimen. to, © seu motor € 0 crescimento econdmico. a sua motivaglo & 2 salisfagio de demandas humanas de cardter material. A essa luz (assim ‘nos ensina a corzemte central do pensimento econdmico), a ter, Ou natureza, € apenas um fator de produgio, juntamente com o capital © trabalho. Ou, mais precisamente, € um condlicionante externo dos sistemas de producio. A ecologia ¢ uma externalidade da economia. Na pratica, a natureza como um todo ¢ olfiada ¢ manuseada co- ‘mo um depésio, uma despensa ou aimoxarifado do qual o homem pode reira, ad aorerntim, os seus alimentos, € 0s processos produt vos podem extrar sus matérias-primas, e aquele e estes haurem suas fontes de energia. Fal-se em cecursos natura, Trabalha se com a no- (lo de doragio ou estoque de recursos natura. Assim, a ecologia abas- {ece a economia, O ambiente criado, as necessidades do construido. 05 dois sao os andatmes e Us materials de consirug9 Uo babu do hhomem, © somat6rio dos fatores ecoldgicos e econdmicos resulta no fato ecuménico, esse modo, 20 interfere na natureza, © processo civilizatrio {ransiorma-a, Ao mesmo tempo transforma o proprio homem. Eis que este, originalmente também um ser natural, pel via das suas relagdes com o meio ambiente € com o outro, © seu Semelhante,transimuda-se ‘num ser cultural. As suas necessidades também se modifiam. Ha pauta 1. Segudo a visto de LEWIS MUMFORD, reygatada por GOHA (Ecolo- se Poltiguel1992). Para Mumford a civilacio neotéenica € a esslizasio in ‘str moderna, antecedha pela eviiaagaopaleotéenicae, na fase mal re ‘moa da vida do-homem, pels eotlcrica, 6 PARA PENSAR © DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL das requisigdes daquilo que a ecologia ¢ a economia podem Ihe pro- porcionar jf n2o reflete apenas os cuidados com a preservagio de sua vida animal, puramente biol6gica. Tem a ver, crescentemente, com a satisfaglo de aspiragbes € desejos criados, “necessidacdes” cultiva ‘das — culturaise cultuais. Mais ¢ mais, io clas a expressio da insia de respostas 2 inquietedes de distintas indoles, nos planos mental, intelectual, moral, espiicual, Uma procura para além do ter, a do ser —2 ao ver. & ainda a Dusca do mais, mas € 20 mesmo tempo a Dusca da verdade, do belo, do bom € do justo. A emergéncia do cidético, do estético, do ético, Sem fim — sem fins Tudo isso, & claro, deve expressarse em bens ¢ servigos. Nao & 86 a natureza que € modificada para responder a cssas novas deman- das, mas também a economia. F essa mutagdo € que a faz crescere, por via de consequéncia, “desenvolverse". 0 desenvolvimento eco- ‘nOmico sucumbe, entio, a propria armadilha e torna-se um processo Intermindvel, sem fim — mas também sem fins, ou pelo menos sem fins préprios, na medida em que as necessiades fundamentals j fo ram sacladus. As outras sio insaciéveis." F que o proprio conceito de necessidades se alarga. As do homem contemporiinco, €evidente, n20, slo redutivels as do Pubecantropus erectus. & quanto mals 0 homem se afasta do seu ancestral, mais deixa de ser um ser puramente natural — mais se assume como ser moral. A partir desse ponto interferem inguietagdes éticas. Inerferem também inquietagbes priticas. A eco- nomia descobre, 20 cabo de tudo, que 0 armazém natural est sujeito 4 finitudes, Recutsos no renoviveis, por definigfo, esgotam-se, E 0s renoviiveis, no minimo, tornam-se menos acessiveis, mesmo num con- texto regldo pela cliusula coeteris partbus, Pols precisam de invest: rmentos adicionais em terra, capital e trabalho — ademas, de compe- ‘éncia. Dependem de novos desenvolvimentos em cléncia ¢ tecnolo: £12, Assim, os fatores ecoligicos sio chamados a integrat of fazeres ‘econdmicos. As externalidades Sio internalizadas, A nolo de escas sez, presente desde as primérdios da cléncia econdmica, (ora-se pn 14, O autor abordow 2 problemdtica de Os fos do desenvolvimento e 0 desenvolvimento sem fam ea eabalha antigo (MENDEST\9A?) Para diferentes fnfoques ecassiicaczo das nccessdades bisias, notadamente as soci, (ambem MENDESI981 ‘gente, E os bens tradicionalmente reputades “livres”, como a gua ‘em muitos lugares ¢ 0 ar em todos, tendem a desaparecer como tas. onvertem-se, também eles, em bens econdmicos. Passam 2 cer um prego, a compor um mercado. E nessa nova condicio constrangem ‘© constringem o crescimento da economia Apar disso, eresce a consciéncia de que 2 natureza funciona, no 6 como despensa ot almoxarfado, mas como quarto de despej, I {a de lixo ¢ esgoto, para onde sio jogados os detttos, dejetos ree tos, tanto 0s da producio como os do consumo. Os refugos do sist ‘ma econémico ¢ 08 da sociedade ecuménica, Numa escala que, #20 +2 € incompativel com a capacidade da natureza para absorver, rec! ‘lar € wansformar esse tixo. F assim tas efluentes agridem e compro: metem os recursos ecol6gicos, inabilitando-os quer para 0s usos eco- nOmicos, quer para os ecumeénicos.™ Os exsumos ecuménicos afetam, destruindo os ou descaracterizando-os, as insumos ecoldgicas. Os con ‘Sumos inclusrias € sociais nao podem mais contar com eles. ‘A reunido desses condiclonamentos fzz pensar que o desenvolv' ‘mento atual pode estar se aproximando de seu fim histérico."* Cot trarlando a apridio que Ihe € imputada de processo infindvel, pode ro dispor mais, dentro de algum tempo, dos meios necessrios para smanter 0 mesmo rumo @ 0 mesmo ritmo, Dever submeter-se, quer sabe, 2 amputagSes quantitativas, reduzindo 0s seus indicadores de desempenho e crescimento a metas mais modestas. E passat por mu: agbes qualitativas, modificando as suas ambigOes em favor de aspira ($oes mais humnildes, Para n4o se fina, talvez tenba que continat se A.um rempo, o processo seré obrigado a encolher 0 ritmo de acumu: laglo e a escolher uma nova emulagio. Essa nova dtica dependera de uma nova ética. Para nto ser escatoldgico, precisara ser teleol6gico. ‘2 privada para 0 da res publica. As ameacas que o estilo de desenvolvimento agonizante currega ‘consigo, em relacao 20 ambiente criado, transbordam portaato para ‘© ambiente consizufdo. A ecologia esté em perigo, mas ndo esti soz ‘ha, Juntamente com ela, também estd em perigo a economia, que dela depende. E, por via de conseqbéncia, a ecomenia — vale dizer: civ lizagao, as possibilidades de prosseuimento do progresso civilizaté 15, Essa questa foi tatadarecentemente em CAVALCANTIA9S2. 16. Aqulé inevitvellembraro famovo “Reitério Meader ou do CU BE DE ROMA/972, Limits fo Growth. &, ainda, 0 brado de alert de BROWNIIO" 18 PARA FENSAR O DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL to, do processo mesmo de desenvolvimento, Este, no qual fantas es pecancas foram depositadas, no promoveu integralmente o homem. Nao chegou 2 libertar “o homem todo € todos os homens’"” de con: dgdes subumanas de miséras, caxéncias, opressoes, Nao suprimi pi -vacées € pentirias da face da Terra. Nem impediu a contraface escan- dalosa das pletoras que desequilibram o ectimenio planetério. Ao con- trdrio, consagra e convive com cciimenos orientatls pela economia © ectimenos orlentadoe pela ecologia, "Desenvalvidos" © “cubde- senvolvides". Nao honeou a promessa de abundancia para todos, jus- tiga para com todos, « paz entre todos. Parece, em suma, que 0 pro- cesso civilzatrio, sem ter verdadeiramente cumprido 0s seu fins, atin- _aiv os seus confins, batew nos seus limites externos einternos. £2 pe pia Cidade do Homem que esti 2 perigo. Do trato ao contrato Devesse concluir que o que esta em causa de juiza é sim, 0 tate do meio ambiente, na sua expressio mais original (leis-se: a Criagao ‘ou natureza, considerada em si mesma). Mas € também o extrato eco. 1némico, obtido a partir dos ambientes natural ¢ artifical, para satistax ‘glo das demandas humanas (entendi-se: a produgio € 0 consumo so- iais), A mesma ameaca pesa sobre 0 proprio contrato social (isto é 2 Givlizaglo, envolvendo as elagbes do homem consigo mestno e com a5 coisas que 0 cercam, as herdadas © as acrescidas), Sto estas percepgdes, ainda ndo suflcientemente infundidas nas uncntes © CoLage> das persons, ten lis cntte 49 sociedad, ‘que esto por tris do atual debate mundial sobre meio ambiente ¢ de- senvolvimento, Nao mais meio ambiente ou desenvolvimento, Assim foi na Rio-§2, e nfo poderia ser de modo diferente. As duas apostas lever, afinal, concertarse, nio apenas consertarse, numa proposta anticulada, harmonica, ambivalente. Ouse conseguir inventar um for- mato de desenvolvimento com preservacio do meio ambiente, ou ji nig haverd meio ambiente nem desenvolvimento. Meio ambiente & desenvolvimento toenaram se nogoes € agdes xipofagss. ‘© desafio € politico, além de Ser clentifico € técnica, © nove f ‘urino de desenvolvimento no mais poder restringir-se a economia, ras deverd incorporar a ecologia. E ha de destinat-se a ccomenia Co” mo um todo. Os Seus novos balizamentos precisam ser assentados. E 17. Gom inspracio em Paulo VI, na encicica Populum Progresso, BOS ECOSSISTEMAS A ECOPORSTA » {sso tem a ver com 4s contingéncias a que estdsujeito: 0 grau de sua esejabilidade ética, a acetacio da sua responsabilidade social, con- dicdo de sua reprodutbilidade econdmica e, por fim, a garantia de sua sustentabilidade ecologica "8 Neste ponto & que comeca 2 aprofunclar. se 0 conhecimento da possibilidade de um desenvolvimento verda deiramente sustentavel — ov, em vez disso, 0 reconhecimento de que © desenvolvimento sustentivel, o almejad, seria na tealidade um ‘Mas, enquanto desafio de cléncia tecnologia, a tesstura de um novo tipo de desenvolvimento, a0 mesmo tempo capaz de sustenta (do econdmica, ecologica e éuca, viol e violenta os paradigmas do Feaucronismo cienutico em vogs. Nao cape, por nanureza e cimensio, ‘nos esteitos limites desta ou daquela disciplina do conhecimemto, ou ‘mesmo no de alguma das provincias clentificas,isoladamente consi- deradas. &nitidamente um desafio teansdisciplinar — até difamos, 0 desafio transdisciplina, [Na verdade, como se comeca a reconhecer, embora a contragos {o, ndo basta tratar de forma competente aspecios especiticos da rea- lidade natural, por um lado, e da realidade ambiental soci, por ou. tro, € promover a posterior! um casamento de conveniéncia, para se construir uma ciéncia e uma politica de meio ambiente e desenvolv ‘mento, integradas, A ciéncia ambiental, assim caracterizada, inexora- vvelmente compartiha dos dois grandes territ6rios das ciencias fsicas ce naturals e das ciéncias humans e socks, mas por interac40, n40 por justaposiga0. Nao pode escolher entre o método daquelas e o destas. Precisa Inventar 0 seu prOprlo, Do mesmo modo a pritica ambiental ‘ao interessa apenas a individuos isolados, grupos, fragmentos da so- Cledade. Interessa a todos, coletivamente. As geragdes atuais © 3 fu tras. f uma questio de ordem publica, in(ter)pessoal, in(ter)espacial, Jn(gettemporal. No pode submeter-se 3s leis de mercaclo — a essa tica, impoe-se tomné-la “fora da lei", privilegiada. Por que, logo se dics Além disso, tornou-se um desafio transnacional. Excede fronte’- a5 polticas, alm de fromteias cientificas. A contaminagao da atmos- 18. As discussdes sobre 0 conceito,o alance ¢ 2 exeqilblidade do de- senvolvimentosustentvel desencadearsm-se pare da Conferencta de Est.

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