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Antropologia e hist6éria em Marshall Sahlins: “Introdug&o” e “Conclusao” de Historical Metaphors and Mythical Realities’ TRADUGAO DE FRAYA FREHSE* INTRODUCAO: HISTORIA E TEORIA ESTRUTURAL Sincronia/Diacronia e Langue/Parole A antropologia estrutural fundou-se numa oposi¢ao binaria que mais tarde se tornaria sua marca registrada: a oposi¢ao radical em relagéo a historia. De maneira similar, o es- truturalismo, trabalhando a partir do modelo saussureano da lingua como objeto cientifico, pri to, ea sincronia, em lugar da diacronia, Se- guindo uma via paralela aquela da distingao saussureana entre a lingua (la langue) ea fala (la parole), a analise estrutural parece excluir também a aio individual e a pratica tempo- ral, exceto quando estas representam a proje- Ao ou “execugio” do sistema em questdo (Bourdieu, 1977). Argumentarei aqui, sobre Jegiou o sistema em detrimento do even- 1, Os dois textos que seguem sio, respectivamente, radu ses do inglés do primeiro e do iltimo capitulo do livro de Marshall Sablins, Historical Metaphors and Mythical Realities, Structure in the Early History of the Sandwich Islands Kingdom, 2a ed., ASAO Special Pu- blications 1, Ann Arbor: The University of Michigan Press, 1986 (1a ed.: 1981). Ambas as tradugdes foram. feitas com a autorizasio expressa do autor. Todos os direitos reservados. Agradego 20 Prof. Marcio Ferreira da Silva, do Departamento de Antropologia da USP, por revisar a tradugio de algumas nogdes de Lingisti- cca que aparecem no texto original. Mestre e Doutoranda em Antropologia Social pela USP, bolsista FAPESP e pesquisadora do Niileo de Antro- pologia Urbana (NAU) da USP. tudo por meio de demonstracdes concretas, que esses escriipulos todos nao so de fato necessirios: € possivel determinar estruturas na historia ~ ¢ vice-versa. Para Saussure (1966; or. fr: 1915), 0 des- comprometimento da estrutura em relacio & historia € um requisito fundamental, ja que a lingua s6 pode ser sistematicamente analisa- da se assumida como auténoma, referencial- mente arbitriria e tida como um fenémeno colctivo. A nog&o saussureana de “sistema”, com efeito, assemelha-se & categoria kantiana de “comunidade”. Esta se funda no juzo tem- poralmente discreto de um todo dotado de varias partes compreendidas como mutuamen- te determinantes, ou seja, “como coordena- das, nao subordinadas umas as outras, sendo assim determinantes umas das outrass € isso nao apenas numa direcao — como numa série =, mas, sim, reciprocamente ~ como num agregado. Quando se fixa um membro do todo, todos os outros sao excluidos, assim reciprocamente” (Kant, 1965:117). Qualquer elemento dado dessa comunidade, isto é, qual- quer um dos objetos distinguiveis numa pai- sagem, define-se como tal pelas relagdes que nutre com os outros: € compreendido como valor diferencial ou posicional, condicionado pela presenga dos outros elementos. E, assim, haja vista que as partes se constituem por re- laces reciprocas, contempordneas, 0 tempo € climinado da inteligibilidade. 136 | TRADUGAO DE FRAYA FREHSE Saussure argumenta que é isso que ocorre com a lingua. O valor conceitual do signo é fixado por meio das suas relagdes com outros nos coexistentes. Por meio dos contrastes entre o signo € os outros do ambiente (sistémi- co) envolvente, sedimenta-se o seu sentido ou valor conceitual préprio. O valor de “verde” seria determinado pela presenea, ao lado des- te, de “azul” e vice-versa. Se, como vale para muitas linguas naturais, no houvesse “azul”, “verde” possuiria uma extensio conceitual ¢ referencial maior. Conseqiientemente, a lin- gua s6 poderia ser analisada como estrutura se assumida como um estado, estando os seus elementos dispostos na ordem temporal da si- multaneidade. Além disso, seria tao inditil procurar o sis- tema na hist6ria quanto introduzir a historia no sistema. Evocando a independéncia das mudangas sonoras em relagao aos valores dos signos, os argumentos de Saussure vio no sentido da classica distingao entre contetidos fisicos ¢ relagdes formais. Contetidos (sons) alteram-se independentemente das relagdes (que determinam valores). Sob essa perspecti- va — atualmente mais bem definida como “dualidade de padronizagéo” (“duality of patterning”) da linguagem ~, as mudangas fonéticas no seriam mais do que acasos de cardter fisico, contrastando com os processos mentais sistemdticos, que se dariam ao nivel das relages entre os signos. Encaradas sob 0 Angulo privilegiado da estrutura saussureana, as mudangas fonéticas, emergentes no discur- s0, so “eventos independentes”, acidentais. Tém a ver simplesmente com seqiiéncias de sons, sem relagdo com os valores significati- vos das suas respectivas unidades lexicais ¢ gramaticais. Os valores, por sua vez, depen- dem de relagdes concorrentes entre os termos da linguagem, sem referéncia aos seus con- tetidos fonéticos (contanto que exista contras- te suficiente no som, de maneira a garantir a diferenciagao de significados). Alteragdes no som, portanto, ou esto inclufdas na gramati- ca das relagdes ou se expandem de maneira analégica (isto é, com base em principios sist@micos), com a condig&io de que nao haja “vineulo interno” ou relagao suficiente entre a mudanga no som ¢ os efeitos lingtiisticos que dai resultariam. Advém dessa reflexao 0 fatidico argumento que seria incorporado pela antropologia estrutural: sob a perspectiva de um sistema de signos, as mudangas as quais ele é submeti sistema consiste no modo como esses mate- riais histéricos interrelacionam-se num deter- minado momento ou estado da lingua. Mas, se esta lingua € de fato sistematica e passivel de ser analisada, os seus signos tam- bém tém de ser arbitrarios. Nos termos de Saussure, a lingua é um sistema significativo jo parecerdo fortuitas. O tnico em e para sit os seus signos sao determinados como valores apenas por suas relagdes reci- procas com outros signos, estando desprovi- dos de qualquer conexao com os objetos aos quais possam se referit: Se o signo tivesse al- guma conexo necessdria ou inerente com 0 seu referente, o seu valor nao resultaria ex- clusivamente de relagdes com outros signos. Ea nogio de lingua como estrutura auténo- ‘ma estaria comprometida. Perder-se-ia a coe- réncia ou sistematicidade, haja vista que cer- tos valores seriam externamente impostos ¢ persistiriam no tempo independentemente das relagdes contemporaneas no interior da lin- gua. Entretanto, ao mesmo tempo o lingtiista suico acreditava que, pelo menos em certos tipos de pratica social, os signos assumiriam sim relagées ~ mesmo que apenas as necess4- rias com 0s seus referentes. Isso aconteceria na economia, por exemplo. Q valor de “ter ra” como categoria econdmica dependeria em certa medida da produtividade inerente da terra. Porém, nesses termos, 0 valor nao seria uma fungdo diferencial em ou de um sistema Gadernos de campo +n. 9 + 2004 AnrkoroLocia &wisrOR!A et Manswats sanuins | 137 de signos; “terra”, aqui, possuiria, antes, um contetido ou significado conceitual que sub- sistiria. Poderiamos, assim, ter historia, ou seja, valor num modo temporal, mas isso a cexpensa do sistema. Estrutura versus Praxis no Tempo Historico Saussure anteviu 0 advento de uma miologia” geral que se preocupasse com 0 se- papel dos signos na vida social. A seu ver, contudo, valores em dominios como a econo- mia — ja que “de alguma forma enraizados nas coisas” — nao poderiam ser tratados como puramente semiéticos, portanto como susceti veis do mesmo tipo de anillise que a lingua. E isso mesmo que, aos olhos do lingiiista, os ele- mentos constituintes desses dominios culturais. parecessem ser de fato valores semiéticos. Um dilema semelhante coloca-se para uma semio- logia geral, um estruturalismo cultural, pela distingZo entre lingua e fala. A fala também apresenta o signo sob a forma de um objeto “heterogéneo”, sujeito a deliberagdes outras que apenas as meras relagGes entre os signos. Afinal, a expresso da lingua na fala é noto- riamente imperfeita e infinitamente varidvel, condicionada que é por todos os tipos de aci- dente biografico do falante. Isso significa, uma ver. mais, que a determinagio do discurso transcende bastante as relagées entre os ter- mos de um sistema lingiiistico, abrangendo fatos de natureza diferente: sociol6gica, psi coldgica, até fisiolégica. Advém dai a neces- sidade, para Saussure, de considerar a lingua em sua dimensio coletiva, para além de suas implementacées individuais no interior do dis- curso. Apenas na comunidade de falantes ela existiria como um sistema semidtico perteito. Entretanto, considere-se o que, dessa for- ma, fica excluido de uma andlise que seja es trutural cum significativa. A Histéria faz-se a0 nivel da fala. Nesta, os signos estéo dis- tradugao postos em relacées variadas e contingentes de acordo com os propésitos instrumentais das pessoas ~ propésitos, Iégico, socialmente constituidos, mesmo que passiveis de serem individualmente variaveis. Os signos, portan- to, assumem valores funcionais e implicativos num projeto de aco; nao meramente as de- terminagées métuas de um estado sincrénico. Esto sujeitos a andlises a recombinagées das quais emergem formas e significados im- previstos (metéforas, por exemplo). E, sobre~ tudo: na fala as pessoas colocam os signos em relagdes indexicais com os objetos dos scus projetos, j4 que esses objetos constituem o contexto percebido para a fala como ativida- de social. Tal contexto é de fato um contexto significado [a signified context}: os significa- dos dos seus objetos podem ser até pressupos- tos pelo ato de discursos porém, por outro lado, o mundo pode nao se conformar aos pressupostos segundo os quais algumas pes- soas dele falam, No evento, o discurso insere 60s signos em “novos” contextos de uso, im- pondo contradigdes que, em contrapartida, tém de ser incorporadas pelo sistema. © va- lor constitui-se efetivamente no interior de um sistema de signos, mas as pessoas utilizam e experienciam os signos tal como fazem com os nomes das coisas. Conseqiientemente, elas condicionam e potencialmente reformulam os valores conceituais gerais das relagdes ¢ ter- ‘mos lingiiisticos tendo por referéncia o mun- do. © encontro com a palavra é, em si, uma avaliacao e reavaliacao potencial de signos. Se a andlise estrutural/semiética deve ser incorporada pela antropologia geral tendo por base a sua adequagao ao estudo da “lingua”, ento nao se perdem apenas a histéria ¢ a mudanga, mas também a pritica ~ ago hu- mana no mundo. A luz desse aspecto, possi- velmente alguns pensem que o que se perde é a propria razao de ser da antropologia, temor este que por si s6 justificaria uma rejeicao 138 | TeaDUcho DE meavaeRanse imediata ao estruturalismo. Porém, € possivel que os sacrificios demandados pela anilise estrutural — a hist6ria, 0 evento, a ago, 0 mundo ~ nao sejam de fato necessadrios. Desde Saussure, a lingiiistica estrutural tem paulati- namente se esforcado para superar a oposigao. entre histéria e sistema, pelo menos em certos aspectos. Jakobson (1961:16-23, 202-220) ar- gumenta que mesmo as mudangas sonoras s40 sistematicas, uma vez que incorporadas por um “sistema fonémico”, e que a anélise des- tas mudangas requer uma continua oscilagao entre sincronia e diacronia, A antropologia, por sua vez, comecou a aprender que o valor de qualquer categoria cultural ~ “terra”, por exemplo — é, com efeito, arbitrario, ja que constituido com base em distingdes basicas entre signos que, em relagao aos objetos, nun- ca sio as tinicas possiveis. Mesmo uma antro- pologia ecolégica reconheceria que ¢a ordem cultural em questo que faz de uma extensio particular de terra uma “fonte produtiva” se la de fato o for. Assim, a economia consegue encontrar espaco no interior da semiologia geral imaginada por Saussure ~ a0 mesmo tempo em que impée cldusulas restritivas aos pré-requisitos implicitos a essa inclusao. Apesar de tudo isso, originalmente o es- truturalismo foi incorporado pela antropolo- gia geral mantendo intactas as suas limita- ges te6ricas. A hist6ria deveria ser mantida A disténcia, a fim de nao colocar em risco 0 “sistema”. A ago entrava em cena apenas ‘como operacionalizagio de uma ordem ja es- tabelecida, “reproducio estereotipica” ["‘ste- reotypic reproduction” (como prefere Go- delicr) das categorias culturais existentes. Essa apropriagio nao historica da ago apoiava- se ainda no sélide argumento de que as cir- cunstincias 36 tém existéncia na ~ ou efeito sobre a ~ cultura quando interpretadas. E a interpretacao &, afinal, classificagao no inte- rior de uma dada categoria. “Nao basta di- zer”, conta-nos o filésofo, “que se é conscien- te de algos é-se também consciente de algo como sendo algo” (Percy, 1958:638; os grifos siio meus). A percepgao torna-se um fato da consciéncia humana - ou ao menos da comu- nicagao social ~ quando embutida num con- ceito do qual o individuo que percebe nfo é 0 autor. O conceito é motivado na cultura tal tuida. O fato de o Capito Cook ter atracado em 17 de janeiro de 1779 na Baia de Kealakekua, no Havai, no foi encarado pelos havaianos como o que “de fato” era. “Agora os nossos ossos viverao”, eles teriam dito, “nosso aumakua [espirito ancestral] vol- tou” (Kamakau, 1961:98). Mesmo que se co- loque em questo esta tradigao, registros de como cons! contemporaneos nao deixam diividas de que foi assim que os havaianos receberam ritual- mente o famoso navegador. O evento, assim, adentra a cultura como exemplo de uma cate- goria recebida, como simbolo terreno [worldly token] de um tipo pressuposto. Aparentemen- te adviria dai que a teoria per ra ¢ historia é plus ¢a change. Nos capitulos seguintes argumentarei que é melhor inverter esta teoria; ou, adotando 0 ditado de Jean Pouillon, “plus c'est la méme chose, plus ca change” (Pouillon, 1977). Ain- da décadas mais tarde, a vitoria da morte do Capito Cook'na Bafa Kealakekua permane- cia uma extraordindria fonte de legitimacao para os reis havaianos. Por meio da apropria- ‘a0 dos ossos de Cook, 0 mana do préprio reino havaiano tornou-se britanico. Muito tem- po depois de os ingleses terem perdido a sua santidade, os deuses havaianos ainda man nham a sua anglicidade. Outro efeito foi fa- zet com que, em relac&o aos negécios havaia- nos, os britdnicos passassem a ter uma influén- cia politica completamente desproporcional 4 sua presenga efetiva nos mares do Havai. No que diz respeito ao abastecimento vital e a0 mercado de sindalo, os ingleses foram rapi- “ cadernos de campo +n. 9 + 2001 ANTROFOLOGIA E HETORIA EM MARSHALL saMuins | 139 damente substituidos pelos americanos. Assim, a divindade de Cook nao foi sequitur do po- der que ele de fato exercia. O mais importan- te era que os havaianos tinham-no matado. Assim, se o estruturalismo parece incapaz de dar uma explicacao teérica para a mudan- ga hist6rica, tampouco as teorias utilitérias correntes — independentemente se sao ecolé- gicas ou histérico-materialistas ~ oferecem uma alternativa adequada. Estas teorias pré- ticas da cultura fornecem-nos uma histéria pau- tada nos modelos da fisica. Os simbolos sao sintomas diretos ou mistificados da verdadei- ra forca das coisas. A cultura pode até estipu- lar as condigdes do processo histérico, mas é dissolvida e reformulada na pratica material, de modo que a historia se transforma na rea- lizagao, sob a forma de sociedade, dos recur- sos efetivos que as pessoas poem em jogo. Como bem se sabe, © pensamento social alemao de Dilthey a Weber criticou essa fisi ca historica. De fato, o conceito americano de cultura (e de estruturalismo moderno) deve bastante ao romantismo alemio, pela media go de Boas, Benedict ¢ outros. Talvez esses ganhos de compreensao possam ser agora re- passados histria. O que a antropologia pode oferecer, nesse sentido, é a idéia de que a eficacia histérica de pessoas, objetos ¢ even- tos — como no exemplo dos britanicos no Havai — emerge do seu valor cultural. Outro termo para este valor é “significagio”, posi- do contrastiva no interior de um esquema de relagdes, € a categoria, por sua dupla conota- a0 - “significado” e “importancia” -, sinte- tiza de maneira feliz a teoria histérica, Tal- vez seja pretensioso demais reivindicar que 0 famoso ditado de Maitland tenha de ser in- yertido: que a historia sera antropolugia, ou nao sera nada. Meu objetivo, neste ensaio, é mais modesto. Cabe apenas mostrar de algu- ma forma que a hist6ria é organizada por es- truturas de significagao. tradugéo Até certo grau essa tarefa nao é dificil, uma vez que a concepcao estruturalista disponivel de plus ga change... é bastante historica. Ela enfatiza que o passado estd sempre conosco. Sob a perspectiva estruturalista, nada é mais simples do que a descoberta de que as catego- rias culturais tém continuidade como modos de interpretacao e de ago: as celebradas “es- truturas da longue durée” (Braudel, 1958). Darei inicio a discussio sobre o reino havaia- no por meio desse tipo de reflexdo. Porém, apenas para lancar as bases de um projeto mais ambicioso. O grande desafio para uma antropologia histérica é nao apenas saber como 05 eventos sao ordenados pela cultura, mas como, nesse processo, a cultura é reorde- nada. Como a reprodugao de uma estrutura torna-se a sua transformacao? CoNCLUSAO: ESTRUTURA NA HISTORIA Basicamente, a idéia é muito simples. As pessoas agem em relag&o as circunsténcias de acordo com os seus préprios pressupostos cul- turais, as categorias socialmente dadas de pessoas ¢ de coisas. Como dizia Durkheim, 0 universo s6 existe para as pessoas tal como elas o pensam, Por outro lado, 0 universo nao necessita existir da maneira como elas 0 pen- sam. Nem a reagio do “outro generalizado” do discurso humano ~ também dotado de um ponto de vista cultural préprio, dele ou dela — corresponde as suposicdes implicitas as inten- ees e concepgdes de cada um. Em geral, en- to, as circunstancias terrenas da agéo huma- na no esto inevitavelmente fadadas a con- formar-se as categorias por meio das quais certas pessoas percebem essas mesmas cit- cunstancias. No evento as circunstancias nao se conformam, as categorias recebidas sio potencialmente reavaliadas na pratica, rede- finidas funcionalmente. De acordo com o lu- gar que a categoria recebida ocupa no inte- 140 | TRADUGKO DE FRAYA FREESE rior do sistema cultural tal como constituido, ¢ em dependéncia dos interesses afetados, 0 proprio sistema é mais ou menos alterado. No extremo, 0 que comegou como reprodugao, termina como transformagao. “Reprodugao” voga nos dias de hoje, sobretudo para substi- tuir ou especificar 0 lugar teérico da nogio de “fungi” Porém, élegitimo perguntar se e tea possibilidade de um sistema continuar sem se alterar, ou 0 contrario: se é possivel a alte- ragao sem continuidade, Mesmo os processos aparentemente extremos de cultura-na-hist6- ria que estivemos discutindo, reprodugio ¢ transformacao, ser que eles so verdadeira- tornou-se um termo em mente ~ isto é, fenomenicamente ~ distintos? Sabemos que eles so claramente separaveis, em termos analiticos, Por um lado, contextos de ago pratica so apropriados por toda uma sabedoria convencional, por conceitos j4 da- dos de atores, coisas ¢ suas relagdes. Assim, Cook era, do ponto de vista havaiano, o deus Lono que voltava. E isso certamente foi repro- dugdo, Por outro lado, a especificidade das circunstancias praticas, as relagGes diferenciais das pessoas com elas, mas também o conjunto de arranjos particulares resultantes (estrutura da conjuntura) sedimentam novos valores fun- cionais nas antigas categorias. Esses novos valores provavelmente sao apropriados no in- terior da estrutura cultural, j4 que foi pela 16- gica do tabu que os havaianos incorporaram violagGes a esses mesmos tabus. Mas a estru- tura é, nto, transformada. A incorporagio cultural do evento & ao mesmo tempo, con- servadora ¢ inovadora. E possivel elaborar um bom argumento heracliteano em favor da inseparabilidade de continuidade e diferenga (Wagner, 1975). De qualquer modo, toda transformagao estrutural envolve uma repro- dugao estrutural, se nao, também, o contrario. Argumento ainda que efeitos como trans- eis de formagio e reproducdo sao disting maneira privilegiada em situagdes de contato cultural, apesar de os processos envolvidos nao serem de forma alguma exclusivos dessas si- tuagdes. Porque aqui, no embate entre enten- dimentos e interesses culturais, tanto a mu- danga quanto a resisténcia a mudanga so elas mesmas assuntos histéricos. As pessoas estio- se criticando umas as outras. Além disso, as suas diferentes interpretagdes sobre os mesmos eventos também se criticam umas as outras e, assim, permitem-nos chegar a uma compreen- sio mais adequada da relatividade cultural do evento e das respostas a ele. Ainda assim, todos esses processos ocorrem de uma mesma maneira geral no interior de qualquer socie- dade, independentemente da existéncia de di- ferencas culturais radicais. A condigao funda- mental para tanto é que atores dotados de conceitos e projetos parcialmente distintos re- lacionem suas ages entre si —e com um mun- do que pode provar ser refratdrio ao entendi- mento de todos os atores envolvidos. Interesse e Valor Mas ha mais, no nosso esquema, do que 08 ressentimentos do outro ou do mundo. Qualquer compreensio da histéria como sig- nificado precisa reconhecer 0 papel distintivo do signo na a¢4®, em oposigao a sua posigao na estrutura. A agéio, dizemos, é intencional: norteia-se pelos propésitos do sujeito agente, pelo viver social dele ou dela no mundo. En- gajados assim em projetos de vida, os signos por meio dos quais as pessoas agem sao leva- dos a relagdes referenciais com os objetos das ages dessas pessoas, dotando as res conceituais de significados contextuais os valo- particulares. De novo na ago, os signos es- Go sujeitos a arranjos e rearranjos contingen- ciais, relagdes instrumentais que também afe- tam potencialmente os seus valores semanti- cos. Todas essas inflexdes de significado de- ‘cadernos de campo + n. 9 + 2001 pendem do modo como 0 ator experiencia o signo enquanto interesse: 0 lugar do signo num esquema ordenado de meios e fins. A palavra “interesse” deriva de uma ex- pressdo verbal impessoal latina que significa “faz uma diferenca”. O interesse em algo é a diferenga que esse algo faz para alguém. E uma etimologia feliz, j4 que paralela a de! nigo saussureana do valor conceitual do sig- no, Este seria determinado como conceito por sua relagao diferencial com outros signos no interior do esquema simbélico coletivo. Por outro lado, o signo representaria um interesse diferencial para variados sujeitos, de acordo com o lugar que ocupa nos esquemas de vida especificos desses individuos. “Interesse” ¢ “sentido” (ou “significado” so dois lados da mesma moeda, o signo, relacionada respect vamente com pessoas com outros signos. Entretanto, 0 meu interesse em algo nao é a mesma coisa que o sentido deste algo. A célebre discussiio de Saussure sobre 0 valor lingiiistico ajuda a explicar esse aspec- to, por moldar-se numa analogia com o valor econdmico. Segundo o lingiiista, para deter- minar 0 valor de uma moeda de cinco francos € necessario saber que se pode trocé-la por objetos dissemelhantes ~ um tanto de pao ou um tanto de leite-, mas, também, que se pode comparé-la contrastivamente com outras uni- dades do sistema monetario~ um franco, dez francos e coisas do tipo. Essas relagdes cons- tituem a significagao de cinco francos na so- ciedade, No entanto, esse sentido social geral € abstrato nao corresponde ao valor que a moeda de cinco francos tem para mim. A meus olhos, ela figura como interesse particu- lar ou valor instrumental, e se eu a trocar por leite ou por pao, se a der a alguém ou depo- sité-la no banco, tudo isso depende das cir- cunstdncias em que me encontro ¢ dos meus objetivos particulares. J4 que implementado pelo sujeito histérico, o valor convencional tradugao do signo adquire um valor intencional, e 0 sentido conceitual, uma referéncia acionavel. Nao estou afirmando de forma alguma que o interesse deriva do “individuo”, em con- traposicao ao “social”. O interesse é um fato social, e o individuo é um ser social. O fato ‘0 para de- terminado individuo. Da mesma forma, 0 individuo ~ precisamente pela capacidade dele ou dela de ser social - vive uma situagao ¢ uma experiéncia diferentes daquelas viven- ciadas por qualquer outra pessoa. O que est em questo aqui é a diferenca entre o empre- go do signo pelo sujeito ¢ a sua constituigao na sociedade. O signo, como interesse, nem mesmo se apresenta a consciéncia nos termos em que se constitui socialmente como senti- do. Comprar filé mignon ao invés de ham- biirguer para o jantar, a fim de celebrar uma ocasiaio importante ou entreter um héspede ilustre, parece algo absolutamente correto € apropriado para 0 povo (americano). O inte- rresse que esses individuos tém pelo bife como valor socialmente instrumental, a experién- seria social mesmo que fosse ti cia subjetiva do bife, pertence a uma ordem que se diferencia do proceso que constitui o bife como significado diferencial ou posicional no sistema total dos alimentos. E légico que © valor intencional deriva do convencional - e, também, vice versa, na histéria -, mas o valor convencional é uma relac&o intersub- jetiva de signos, diferente, em termos de qua- lidade e de modo de existéncia, da experién- cia pessoal. Podemos dizer que, como vivido e agido, © fato simbélico é um “simbolo” [“token”] fenoménico cujo “tipo” [“type”] é seu modo de existéncia na cultura-tal-como-constituida. Entretanto, na cultura-tal-como-constituida, 0 signo possui um sentido abstrato: ele apenas significa - em virtude de todas as relagées possiveis com outros signos, de todas as suas possiveis ocorréncias; € “livre de estimulos” 142 | -taabucto De ava mRENSE — desvinculado de qualquer referente terreno particular, Mas as pessoas vivem tanto no mundo quanto por meio de signos, ou melhor: elas vivem no mundo por meio de signos, ¢ na ago elas indexam o sentido conceitual por referéncia aos objetos percebidos nas suas existéncias. Na ingénua e evidentemente uni- versal experiéncia humana, os signos sao os nomes das coisas “Ié fora”. O que estou ten- tando dizer de uma maneira por demais ex- travagante foi colocado de modo mais sim- ples por um indio que relatava as suas expe- riéncias com o governo canadense em Otta- wa: “Um indio comum nunca pode ver 0 ‘g0- verno’. Mandam-no de uma repartigio a ou- tra, de um funcionario a outro, e cada um estes as vezes reivindica a ser 0 ‘patrdio’. Mas © governo real nunca é visto, pois se mantém oculto” (citado, com propésitos diferentes, mas afins, por Lévi-Strauss, 1966:239s). A Transformacao dos Valores Conceituais Assim, os signos, em agao e em meio a capacidade que possuem de serem interesses, podem adquirir novos valores conceituais, contanto que dispostos em novas relagdes com: 1) os objetos no interior do processo re- ferencial e 2) outros signos no interior do pro- cesso instrumental. A referéncia tica entre a polissemia conceitual do signo sua conexiio indexical com um contexto espe~ cifico, Notoriamente, os signos possuem miil- tiplos significados como valores conceituais, mas na pratica humana eles vao ao encontro a determinadas representagdes, contribuindo para alguma selecio ou inflexao do sentido conceptual. E, uma vez que o mundo “objeti- yo" ao qual esses signos se aplicam possui as suas proprias caracteristicas e dinamica re- fratarias, os signos ~ e, por extensfo, as pes- uma dialé. soas que por meio deles vivem - podem ser categorialmente reavaliados. Enfatizo a palavra “reavaliado” porque a determinagio referencial do signo nao é - como um empiricismo ingénuo poderia supor — simples expresso da natureza “verdadei- ra” das coisas. A referéncia é sempre uma re~ feréncia simbélica. Afinal, o mundo € expe- rienciado como algo jé segmentado por prin- cipios relativos de significacao; e, ainda que a experiéncia prove ser contraditéria em rela- cdo aos pressupostos categéricos das pessoas, 0 processo de redefinig4o continua motivado conforme a légica das categorias culturais dessas mesmas pessoas. O valor inovador per- ‘manece uma relacao entre signos, nao poden- do ser determinado diretamente a partir das propriedades “objetivas” dos referentes. Se os havaianos decidiram que os britanicos nao poderiam ser deuses, dado o fato de os mari- nheiros terem insistido em comer com as mu- Iheres, o resultado disso nao foi simplesmente sequitur do fato empirico da comensalidade. Ele foi produto, antes, de uma elaborada 16- gica de tabu ¢ de determinagdes césmicas so- bre o significado de homens e mulheres. Nada no ato de comer com alguém evidencia que vocé nao é verdadeiramente um deus. O fato de os oficiais e navegadores europeus terem comido com os homens havaianos nao exer- ceu o mesmo efeito sobre o seu status — 0s homens havaiatios sempre comem na presen- a dos deuses. Todas as teorias da “c6pia” das relacdes entre significados e coisas podem, assim, set postas de lado. Mas, a principio, permanece valido que o referenciamento indexical dos signos no decurso da ago pode influenciar os valores conceituais destes. O fato de os chefes havaianos, obedecendo ao seu interesse de apoderar-se do comércio, terem empregado 0 conceito de tabu de maneira ad hoc e conve- niente para eles, a0 menos tornou um dos usos possiveis do conceito mais evidente do que tradicionalmente até ento. A agao reordenou cadernos de campo +n. 9 + 2001 ANTROPOLOGIA E HISTORIA EM MARSHALL saMNS | 143 © campo semantico do “tabu”. Com efeito, a auséncia de uma finalidade ritual definida, lado a lado com a presenga de um interesse material (culturalmente) determinado, altera- ram 0 significado do tabu em favor de um sentido dominante de interdicao legal, nos ter- mos de um direito de propriedade. No Havai, hoje, uma placa com os dizeres “KAPU” (“en- trada proibida”), afixada numa cerca, oculta uma sangao levemente diferente daquela apli- cada pelos deuses. O mesmo exemplo pode ilustrar o efeito que os rearranjos instrumentais dos signos exercem sobre o decurso da agéo humana. Na estrutura ou cultura-tal-como-constituida, os signos encontram-se em estado de determina- 40 miitua. Definem-se como “coordenados, nao subordinados uns aos outros; € isso nao apenas numa diregao ~ como numa série -, mas, sim, reciprocamente ~ como num agre- gado”. O Deus Pai é entendido em relagdo ao Deus Filho, vice-vers uma dada forma simbélica depende da co-pre- senga de outras. Mas a ago desdobra-se num. processo temporal. E aqui o valor de qual- quer signo dado, como valor instrumental para um dado sujeito, depende precisamente da subordinacao de um signo a outro “apenas numa direcao”. Na ago, a légica das rela- gdcs cntrc os signos reside precisamente na sua orientacdo: seqiiencial e conseqiientemen- te, como meios e fins dos propésitos das pes- soas. As pessoas, além disso, esto constante- mente colocando os signos em relagées vai das e contingentes. Posso usar a minha moe- da de cinco francos para comprar um bem qualquer, para dé-la de presente a um parente ou oferecé-la como propina a um funcionario piiblico. A moeda pode servir-me também para pagar uma divida ou fazer um desejo, jogan- do-a num pogo. Por boas e tradicionais ra- 2es, e, com 0 objetivo de acumular bens no comércio, os chefes havaianos usaram o po- a significagao de tradugéo der do tabu de maneira coerente e imprevista. ‘Ao fazer isso, eles deslocaram funcionalmen- teas relagdes recebidas do conceito para fora do sobrenatural e do ritual, em direco ao material ¢ ao politico. Essa ago desencadeou novas relagdes posicionais entre as categorias do sistema, ou seja, um novo conjunto de de- limitag6es reciprocas entre os elementos —em suma: um estado estrutural diferente. Ainda uma vez mais, ndo ha necessidade de cairmos num utilitarismo ingénuo, Sabe- mos que as relagdes dos chefes com os bens de comércio desenvolveram-se com base num es- quema de significado afim, polinésio. A sua racionalidade econémica nao era nem eterna, nem particularmente “econémica” nos termos europeus. Além disso, a historia havaiana mostra que a ocorréncia ou extensio de efei- tos estruturais, ligados a uma reavaliagao sub- jetiva dos signos, esta condicionada por vi- rios fatores, implicitos A cultura-tal-como-cons- tituida: as improvisagdes passiveis de serem motivadas logicamente, por exemplo, por ana- logia, metafora ou quaisquer outros tropos; a liberdade institucional para improvisar; o lu- gar do ator no interior de uma hierarquia so- cial que da peso estrutural a sua agao, acarre~ tando mais ou menos conseqiiéncias para os outros atores, O exemplo dos chefes havaianos cc dos tabus também mostra, cm comparagio com os efeitos das transgressdes dos popula- res, que uma posicao privilegiada na cultura- tal-como-constituida pode ampliar as conse- giiéncias da aco de um individuo. De qual- quer forma, a ago comega e acaba na estru- tura: comega nos projetos das pessoas como seres sociais para finalizar na absorgao dos efeitos dentro de um pratico-inerte [practico- inert] cultural. Entretanto, no interim, as cate- gorias podem ser funcionalmente deslocadas; 8 seus respectivos valores posicionais, altera- dos. Conseqiientemente, uma nova ordem es- trutural esta, por definigao, em cena. 144. | TRADUGAO DE FRAVA FREHSE A pessoa ~ agao no mundo -, a reavalia- cao do signo na pratica eo retorno a estrutu- ra: isso tudo ainda cheira demais a solipcismo, como se tudo recaisse sobre o individuo isola- do, como se se tratasse de um argumento eco- némico retirado de Robinson Crusoe. Tam- pouco é suficiente definir que esse individuo no é alheio ao universo, que ele € por exce- léncia um sujeito social. Precisamos ainda le- var em conta as relagées da prépria pratica, a “estrutura da conjuntura”. Tenho enfatiza- do que ha um desenvolvimento sui generis das relagdes culturais nesse nivel: uma operacio- nalizagio das categorias de seres ¢ coisas norteada pelos interesses ¢ ajustada aos con- textos. Vimos que esses “desacordos de funcio- namento” [“working disagreements” ] — para tomar de empréstimo uma frase que os Bohan- nan usam num contexto andlogo ~ podem acarretar um certo arranjo para intengdes ¢ interpretagées conflitantes, mesmo que as te- ages significativas assim estabelecidas con- flitem com as relagGes ja estabelecidas. O sa- ctificio havaiano aos deuses transformou-se em troca comercial com os europeus. Mas os homens havaianos participaram da troca numa posigo diferente das mulheres, o mes- ‘mo valendo para os chefes em relagio ao povo em geral, os sacerdotes em relaco aos chefes isso para no mencionar os porcos em rela- do aos cachorros, as batatas em relagio a0 inhame, ow a ilha de Oahu em relagio a de Maui. Nessa estrutura da pratica, entio, as préoprias relacdes so colocadas em xeque, € no apenas essa ou aquela categoria cultural. ‘A integraco diferencial de homens e mulhe- res, ou de chefes e populares, ao poder euro- peu afetou as percepcdes e condutas de uns em relagio aos outros. Eis 0 que, enfatizo, torna a transformagao verdadeiramente radi- cal: algo mais do que uma simples alteraco de contetidos ou uma permutagao dos valores, permanecendo o sistema, de resto, inalterado. A dialética da hist6ria, ento, € completa mente estrutural, Impulsionado pelas descon- formidades entre valores convencionais e va- lores intencionais, entre significados intersub- jetivos e interesses subjetivos, entre sentido simbélico ¢ referéncia simbélica, 0 processo histérico desdobra-se num movimento cont nuo e recfproco entre a pratica da estrutura ¢ a estrutura da pratica. BIBLIOGRAFIA CITADA BOURDIEU, Pierre. Outline of a Theory of Practice. Trad. Richard Nice. 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