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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO


TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SAO PAULO
ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRATICA
REGISTRADO(A) SOB N°

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de


Agravo de Instrumento n° 994.09.276290-6, da Comarca
de São Paulo, em que é agravante URSULA CORRAL sendo
agravado COOPERATIVA HABITACIONAL HABITACORP.

ACORDAM, em I a Câmara de Direito Privado do


Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte
decisão: "DERAM PROVIMENTO AO RECURSO. V. U.", de
conformidade com o voto do Relator, que integra este
acórdão.

O julgamento teve a participação dos


Desembargadores ELLIOT AKEL (Presidente) e DE SANTI
RIBEIRO.

São Paulo, 02 de março de 2010.

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RUI CASCALDI
RELATOR
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

VOTO N°: 16110


A6RV.N°: 689.694-4/6-00
COMARCA: SÃO PAULO
AGTE. : URSULA CORRAL
AGDO. : COOPERATIVA HABITACIONAL HABITACORP

•EXECUÇÃO POR TÍTULO JUDICIAL - Desconsideração da personalidade


jurídica - Cooperativa habitacional executada que confessa ter "cedido"
a integralidade do empreendimento imobiliário para terceira empresa,
construtora - Situação de insolvência daí decorrente que autoriza a
desconsideração da personalidade jurídica, nos termos do art. 28,
"caput" e § 5o, do CDC, para alcançar o patrimônio dos diretores da
cooperativa, sob pena de inviabilizar a restituição dos valores à
exeqüente, cooperada desistente - Recurso provido.*

Trata-se de agravo de instrumento interposto


contra decisão que, em execução por título judicial (acordo
homologado em "ação ordinária de rescisão contratual de
promessa de compra e venda de unidade condominial e
restituição de quantias pagas"), indeferiu o requerimento
feito pela exeqüente, ora agravante, de desconsideração da
personalidade jurídica da cooperativa habitacional
executada.
Recorre, a autora exeqüente, sustentando, em
síntese, o cabimento da desconsideração da personalidade
jurídica da cooperativa habitacional executada, nos termos
do art. 28, § 5 o , do CDC, eis que patente a insolvência da
mesma, diante das frustradas tentativas de localização de
bens e valores e do fato dela própria ter confessado não
ter qualquer patrimônio ou faturamento, em decorrência da
transferência de todo o empreendimento a terceira empresa,
de nome "Construtora TS Ltda".
Não houve resposta, apesar de ensejada a
oportunidade.

É o relatório.

Em 30.10.1997, a autora exeqüente firmou o


"Termo de Adesão" de fls. 25/31, por meio do qual associou-
se â cooperativa ré, executada, com a finalidade de
adquirir um apartamento no empreendimento denominado

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"Residencial NovaMoóca", com previsão de entrega para março


de 2001.
Em maio de 2005, contudo, ainda não havia
sido finalizada a construção do imóvel, motivo pelo qual,
em 18.01.2006, resolveu a autora ingressar com a "ação
ordinária de rescisão contratual de promessa de compra e
venda de unidade condominial e restituição de quantias
pagas", pleiteando a devolução dos R$ 51.171,60 já pagos,
cerca de 85% do preço total do apartamento.
A fase de conhecimento foi encerrada por
meio da transação homologada em 25.07.2006, nos termos da
sentença assim proferida:

"Vistos. Homologo o acordo a que chegaram as partes,


para que produza seus jurídicos e legais efeitos.
Nestes termos a ré pagará à autora a quantia
pleiteada em 84 parcelas mensais iguais no valor de
R$ 442,00 cada uma, iniciando-se a 1" parcelas no
prazo de 60 dias a contar da intimação deste r.
despacho, mediante depósito bancário na conta
corrente de titularidade da autora, que será
fornecida nos autos, em cartório. O não pagamento de
uma das parcelas ensejará vencimento antecipado da
dívida e multa de 20% sobre o débito sobre a parcela
em atraso. Julgo, assim, EXTINTO o feito, nos termos
do art. 269, III, do Código de Processo Civil. As
partes arcarão cada qual com metade das custas e
honorários de seus patronos. Pric." (fls. 109).

A cooperativa ré, porém, pagou apenas oito


parcelas do acordo, dando ensejo à instauração da fase
executiva, conforme decisão de fls. 119, proferida em
04.04.2008.
Nenhum centavo, todavia, foi localizado para
bloqueio por meio do BacenJud, vindo a cooperativa
executada, por meio da petição protocolada em 28.11.2008
(fls. 134/136) , a afirmar que não possui qualquer
patrimônio nem faturamento, pois todo o empreendimento
teria sido transferido para a "Construtora TS Ltda", sendo
esta, portanto, a responsável por eventual devolução dos
valores aos cooperados desistentes:

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n
A Cooperativa vem informar que não tem faturamento
mensal, visto que a CONSTRUTORA TS LTDA assumiu a
construção dos edifícios e seus apartamentos prontos
e em construção.
A Cooperativa adquiriu os apartamentos da
CONSTRUTORA TS LTDA, inscrita no CNPJ n"
63.067.102/0001-44, estabelecida atualmente na Rua
Cunha n° 111, Io andar, Vila Mariana, São Paulo/SP.
Posteriormente em razão da inadimplência dos
cooperados, a Construtora TS Ltda assumiu a
construção dos edifícios e seus apartamentos,
assumindo também a entrega dos apartamentos
negociados pela Cooperativa, assim como as obras já
executadas e por conseqüência absorvendo os créditos
dos cooperados que contribuíram para execução destas
benfeitorias e assim sendo, obrigando-se a devolver
os valores recebidos para os cooperados desistentes"
(fls. 135).

Assim, diante de tais alegações da executada


e da ausência de ativos financeiros, veio a exeqüente, em
27.03.2009 (petição de fls. 254/256), a requerer a
desconsideração da personalidade jurídica da cooperativa,
providência que foi indeferida pela decisão ora agravada.
Feito esse breve relato, tem-se que o
recurso merece provimento.
Consoante entendimento majoritário da
jurisprudência, o CDC é, sim, aplicável às cooperativas
habitacionais como a executada, as quais não são formadas
pelos princípios corporativos, funcionando como meros
consórcios para a aquisição de imóveis. Nesse sentido:

"Pessoa jurídica. Desconsideração. Art. 50 do Código


Civil. Admissibilidade quando provada a insolvência,
o abuso, a confusão patrimonial e o prejuízo a
terceiros pela inexistência de bens ou ativos
financeiros penhoráveis. Abrandamento do princípio
da despersonalização. Jurisprudência deste TJSP e do
STJ. Cooperativa que não tem a natureza jurídica das
tradicionais, não passando de forma encontrada para
a comercialização de imóveis em construção,
incidindo, por isso, o Código de Defesa do

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Consumidor e o Código Civil. Recurso provido para


deferir a desconsideração." (Agravo n° 670.560-4/1,
4 a Câmara de Direito Privado - TJ/SP, Rei. Maia da
Cunha, j. 03.09.09) .

Cabível, nestes termos, a aplicação do art,


28 do CDC:

"Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a


personalidade jurídica da sociedade quando, em
detrimento do consumidor, houver abuso de direito,
excesso de poder, infração da lei, fato ou ato
ilícito ou violação dos estatutos ou contrato
social. A desconsideração também será efetivada
quando houver falência, estado de insolvência,
encerramento ou inatividade da pessoa jurídica
provocados por má administração.
§ I o (Vetado; .
§ 2o As sociedades integrantes dos grupos
societários e as sociedades controladas, são
subsidiariamente responsáveis pelas obrigações
decorrentes deste código.
§ 3o As sociedades consorciadas são solidariamente
responsáveis pelas obrigações decorrentes deste
código.
§ 4o As sociedades coligadas só responderão por
culpa.
§ 5o Também poderá ser desconsiderada a pessoa
jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma
forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos
causados aos consumidores." (grifamos).

No caso, o fato de a própria cooperativa


executada confessar que repassou para terceira empresa
todos os ativos que lhe foram confiados pelos cooperados,
caindo, por isso, em situação de insolvência, sem se
preocupar minimamente com a restituição devida aos
desistentes, configura falta grave por parte dos
administradores, permitindo a desconsideração da

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personalidade jurídica, com base no art. 28, ncaput" e §


5 o , acima transcrito.
Neste sentido, outrossim, os seguintes
julgados tirados de casos análogos:

"RESTITUIÇÃO DE PARCELAS - (Execução de Título


Judicial) - Desconsideração da personalidade
jurídica da cooperativa executada - Admissibilidade
Indícios de insolvência da devedora - Penhora
infrutífera - Inviável o prosseguimento da execução
em face da cooperativa - Pretensão do agravante de
que a execução recaia em face dos administradores da
cooperativa - Cabimento - Indícios de dilapidação do
patrimônio e administração irregular da cooperativa
- Intenção fraudulenta caracterizada - Medida que
encontra amparo na regra do art. 50 do Código Civil
e também artigo 28, § 5o, do CDC - Precedentes
(inclusive desta Câmara) - Decisão reformada
Recurso provido." (Agravo n° 654.976-4/2-00, 8a
Câmara de Direito Privado - TJ/SP, Rei. SALLES
ROSSI, j. 21.10.09).

"APELAÇÃO - Ação Civil Publica - Cooperativa


Habitacional - Encerramento de Atividades
Empreendimento não Realizado - Aplicação das normas
do CDC - Responsabilidade Objetiva e Solidária -
Desconsideração da Personalidade Jurídica
Possibilidade - Encerradas as atividades da
Cooperativa sem que esta tenha deixado bens
suficientes para restituição dos valores pagos pelos
cooperados, possível a constrição dos bens dos
administradores por conta do acolhimento da teoria
da desconsideração da personalidade jurídica Recurso
Improvido - Decisão Mantida" (Apelação n" 555.692-
a
4/4-00, 3 Câmara de Direito Privado - TJ/SP, Rei.
EGIDIO GIACOIA, j. 21.10.08).

Apenas os membros da diretoria, entretanto,


deverão ser sujeitos à execução, mais especificamente os
Diretores-Presidentes "Vandemário Inocêncio de Melo" e
"Henir Rodrigues de Oliveira"; a Diretora-Administrativa
"Dilma Barbosa"; e a Diretora-Financeira "Jucileide de

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Jesus Siqueira" (cf. fls. 103 e 147), não havendo subsídio


para presumir que os membros do conselho-fiscal ou demais
associados tenham cometido atos que autorizassem sua
responsabilização.
Por fim, anota-se que ainda que a
cooperativa executada tenha "cedido" a integralidade do
empreendimento à terceira empresa "Construtora TS Ltda" (o
que não está inteiramente claro pela documentação
existente), não pode opor tal fato à exeqüente, que, ao que
se infere dos autos, não foi previamente consultada sobre
tal operação, incidindo no caso o que dispõe o art. 42 do
CPC, segundo o qual "A alienação da coisa ou do direito
litigioso, a titulo particular, por ato entre vivos, não
altera a legitimidade das partes". Somente à exeqüente,
convencida da ocorrência da cessão, compete a iniciativa de
eventualmente requerer que a execução se estenda â suposta
sucessora "Construtora TS Ltda".
Diante do exposto, DÁ-SE PROVIMENTO ao
recurso, para deferir a desconsideração da personalidade
jurídica da cooperativa executada, determinando sejam
incluídos no pólo passivo da execução os Diretores-
Presidentes "Vandemário Inocêncio de Melo" e "Henir
Rodrigues de Oliveira"; a Diretora-Administrativa "Dilma
Barbosa"; e a Diretora-Financeira "Jucileide de Jesus
Siqueira" (cf. fls. 103 e 147) .

RUI CASCALDI
Relator

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