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Mineração na Amazônia:

Estado, Empresas e Movimentos Sociais

www.forumcarajas.org.br

São Luís/Maranhão/Brasil
2010

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Centro dos Direitos das Populações da Região de Carajás - Fórum Carajás

Programa: Siderurgia na Amazônia- Projeto “Políticas Públicas e Sustentabilidade da Região de Carajás”.

Coordenação Executiva do Fórum Carajás:


Antonio Gomes de Morais, Edmilson Pinheiro e Jean Carlos Santos

Conselheiros: José Maria Araújo, Izabel Santos Lisboa, José Raimundo Rodrigues, Carlos Augusto Velo-
so, Maria Carmélia Costa Borges, Fábio Pierre Fontenelle Pacheco, Alberto Cantanhede Lopes, João Fon-
seca dos Santos, Raimundo José Pereira Ferreira, Josefa Andreza Alves, Maria da Graças Costa Martins,
Saulo Pastor dos Santos, Elton Carlos Araújo Alves e Diarmondes Alves Paixão.

Apoio: Misereor

Textos: Rogério Almeida, Marluze Pastor; Padre Dario Bossi, Padre Edilberto Sena, Gilvandro Santa
Brígida, Raimundo Gomes, Manoel Paiva, Airton Pereira, José Batista Afonso.

Capa: Carlos Latuff – (www.latuff2.deviantart.com)

Projeto Gráfico: Linna di Castro

Organização: Rogério Almeida (http://rogerioalmeidafuro.blogspot.com/)

Colaboração: Edmilson Pinheiro

Revisão: Cristiane Macau

Fotos: Rogério Almeida, Nils Vanderbolt, Guto, Murilo Santos, Roberto K-Zau, Gilvandro Santa Brígida,
Arquivo Fórum Carajás

Fórum Carajás
Avenida João Pessoa, Q. 09, Casa 19- Filipinho
CEP: 65040-000 São Luís/MA/Brasil
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Fone/fax: (098) 3249-9712

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MINERAÇÃO NA AMAZÔNIA:
ESTADO, EMPRESAS E
MOVIMENTOS SOCIAIS

O extrativismo tem regido a econo- o empreendedor é obrigado a atender uma série de


mia na Amazônia. O ciclo mais re- exigências. Como o Estudo de Impacto Ambiental
cente é o mineral, iniciado a partir (EIA) e o Relatório de Impacto Ambiental (Rima),
da década de 1950 do século passado, no estado do que devem ser apresentados em audiências públicas.
Amapá, quando o mesmo ainda tinha o status de ter- Sob um grave problema, a assimetria de forças entre
ritório. as parte envolvidas: grandes empreendedores versus
A exploração do manganês na Serra do Navio comunidades tradicionais.
foi ponta pé inicial. A experiência durou apenas cin- O processo é marcado por uma infinidade
co décadas. Ficou apenas o buraco, literalmente. de limites, que passa pela incorreção e manipulação
A exploração mineral no Amapá, considera- dos EIA/RIMA, não publicização das informações e
da a primeira na Amazônia, foi ativada pela empresa a cobertura da mídia marcada pela parcialidade. O
estadunidense de Daniel Ludwig, a Bethlehem Ste- que denuncia a fragilidade da democracia nacional,
el Company em sociedade com o empresário Augus- que não universaliza o acesso ao direito. E, que às
to Trajano de Azevedo Antunes, dono da Indústria e vezes, exibe as nuances autoritárias do Estado.
Comércio de Mineração S/A (ICOMI). E por falar em Estado, ele ainda é o princi-
O ciclo da mineração ganhou maiores pro- pal indutor da economia. Se no período da ditadura
porções na Amazônia a partir da região de Carajás, o Banco da Amazônia (Basa) e a Superintendência
com a presença da Vale na extração do minério de de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) confi-
ferro na década de 1980, no sudeste do Pará. E, com guraram-se com as principais instituições, nos dias
as atividades de prospecção inauguradas no regime atuais o protagonismo recai sobre o Banco Nacional
militar. de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
O processo da transição democrática des- Ladeado pelo Banco Interamericano de Desenvolvi-
cortinou outros cenários na economia, política e na mento (BID).
sociedade civil brasileira. Ainda que prepondere o A atuação da instituição tem ultrapassado a
constrangimento econômico e político em processos fronteira nacional. Advoga-se que a mesma exerce
de definição de instalação de grandes projetos, há um papel estratégico em escala continental. E às
alguns avanços no campo normativo. agências multilaterais o centro de gravidade na defi-
No entanto, tais avanços, - se podemos tra- nição de políticas de desenvolvimento para o Brasil
tar assim -, carecem de aperfeiçoamento ou uma e a América Latina. Têm-se ainda outras diferenças
refundação. Para a instalação de grandes projetos nas políticas para a Amazônia. Na ditadura impera-

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ram os pólos de produção, madeira pecuária e extra- cobre no município Canaã dos Carajás, e outros mi-
tivismo mineral. Enquanto hoje despontam os eixos nérios em São Félix do Xingu, Xinguara, Ourilândia
de integração, transporte multi-modal, comunicação do Norte e tantos outros. No município de Barcare-
e infra-estrutura. na as fábricas de produção de alumina e alumínio da
É creditado a Eliezer Batista, ex-executivo Vale passam por uma ampliação da produção, que
da Vale, a construção do mapa das riquezas naturais dialoga com o aumento da produção de energia da
na América do Sul. Batista é pai de Eike, festejado hidrelétrica de Tucuruí e a construção de outras usi-
como o novo bilionário nacional. Obra do acaso? nas hidrelétricas e mesmo termoelétrica. A energia é
Os levantamentos de Batista foram encomen- o principal insumo das empresas de eletro-intensivo,
dados pela Corporação Andina de Fomento (CAF). como as de produção de alumínio.
A CAF é um dos agentes do projeto de Integração da A construção de termoelétrica no município
Infra-estrutura Regional Sul-Americana (IIRSA). de Açailândia, oeste do Maranhão, a presença da
Do conjunto de 10 eixos de integração, qua- empresa Suzano Celulose, a construção da Ferrovia
tro se destacam, por suas riquezas naturais e pos- Norte Sul, bem como a construção da Hidrelétrica
sibilidades de conexões: o Amazonas, A Hidrovia de Estreito constituem elementos recentes que re-
Paraná-Paraguay, o Capricórnio e o Andino. O obje- configuram a paisagem física, econômica e humana
tivo central, prima em facilitar a circulação de mer- da região. Assim como em São Luís, capital do Ma-
cadorias. ranhão, os portos experimentam uma ampliação.
O eixo do Amazonas compreende os seguin- Não se sabe exatamente o que vem ocorren-
tes países: Colômbia, Peru, Equador e Brasil e visa do na região. Há informações fragmentadas compar-
criar uma rede eficiente de transportes entre a bacia tilhada nos espaços de encontros e desencontros que
amazônica e o litoral do Pacífico, com vista à expor- as redes de organizações sociais proporcionam.
tação. É nesse sentido que nasce o projeto em aglu-
No mundo do Brasil, alguns se arriscam em tinar neste livro artigos que atualizem as dinâmicas
pontuar que o Programa de Aceleração do Cresci- nos municípios de São Luís. Açailândia, Bacabeira,
mento (PAC) é uma miniatura do IIRSA. no estado do Maranhão; e no município de Barcare-
na e regiões sudeste e sudoeste, Carajás e Tapajós/
Há algo de novo o ‘front’? Xingu no Pará.

Parece que sim. O aprofundamento da pres- MINERAÇÃO NA AMAZÔNIA:


são sobre as riquezas naturais, a organização das ESTADO, EMPRESAS E MOVIMEN-
grandes empresas em consórcio, em particular para TOS SOCIAIS reúne oito trabalhos que buscam
a construção de hidrelétricas. No Maranhão, Pará e pontuar elementos que podem ser considerados
Tocantins, surgiram inúmeras frentes de extrativis- novos, e outros nem tanto assim, como a condição
mo mineral. No Pará á registros da amplificação dão colonial. Condição econômica baseado no extrati-
extrativismo que ultrapassa a celebrada mina de Ca- vismo.
rajás. Os trabalhos iluminam que empresas pres-
A oeste do estado o município de Juriti aca- sionam sobre a terra e os recursos naturais. Indicam
ba de entrar no clube dos municí pios minerários. os impactos (positivos e negativos) dos investimen-
Em Juruti a empresa estadunidense, Alcoa explora tos, as áreas e as populações afetadas, e questionam
bauxita. Matéria prima para a produção de alumínio. o papel do Estado, e as ações que as organizações de
Num processo de instalação marcado por capítulos base promovem para a ampliação de direitos.
nebulosos, que exigiu a mediação do Ministério Pú- A agrônoma Marluze Pastor recupera a ação
blico Federal (MPF). Dois ex-secretários de meio do Fórum Carajás no acompanhamento das frentes
ambiente do estando respondem a processos por de mineração na Amazônia, em particular na região
conta de atenderem a recomendações do MPF. de Carajás. O padre Dario Bossi pontua as questões
Já no sudeste a Vale inicio a exploração de que afetam o município de Açailândia, e oeste do

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Maranhão, em particular sobre o pólo de gusa, os a Rio Campi Caulim. E mesmo os projetos em an-
passivos sociais e ambientais. E as lutas e mobili- damento, como a construção de uma termoelétrica e
zações da comunidade de Pequiá. Além de explicar a Companhia de Alumina do Pará (CAP). Rogério
o nascimento da iniciativa Justiço nos Trilhos. Já o Almeida, jornalista, aborda o polêmico projeto de
advogado Guilherme Zagallo trata das emissões po- extração de bauxita no município de Juruti, no oeste
luentes dos empreendimentos da Vale na ilha de São do Pará e a construção da hidrelétrica de Estreito, no
Luís. Algo não muito tratado nos fóruns populares. município homônimo, no oeste do Maranhão.
Raimundo Gomes, Airton Pereira e José Ba- Os produtores dos artigos conhecem com
tista Afonso investigam as recentes tensões no sul e proximidade as realidades aqui tratadas. Apesar de
sudeste do Pará, em particular da Vale e as formas serem realidades ocorridas em estados diferentes es-
de resistência das comunidades tradicionais. O pa- tão enlaçadas por questões comuns, como a subordi-
dre Edilberto Sena, do município de Santarém, faz nação da terra ancestral à lógica do capital, a partir
uma leitura que ajuda a entender os novos grandes da posse privada em detrimento da coletiva.
projetos a oeste do estado, em diálogo com as ma- A obra denuncia passivos sociais e ambien-
cro-políticas. Trata-se de uma peça esclarecedora. tais, o poder das empresas e a coerção que o capital
Manoel Paiva e Gilvandro Santa Brígida, ex acaba provocando para atropelar os marcos legais.
dirigentes sindicais no município de Barcarena, es- E ainda as mobilizações das comunidades ancestrais
clarecem sobre o embate entre as grandes empresas e de assessoria. As tensões registradas, os constran-
que operam na cidade. Entre elas a Alunorte e Al- gimentos para a aprovação dos empreendimentos
bras, controladas pela Vale. Não escapam às análises evidenciam a delicada situação da democracia na-
dos autores a Imerys Rio Capim, Pará Pigmentos e cional.

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CONTRÁRIO ME DÊ LICENÇA PRA
CONTAR ESSA HISTÓRIA
Marluze Pastor, Engenheira Agrônoma, MSc
em Agroecologia é consultora do Fórum Ca-
rajás1

A liberdade é para todos nós


Não tem censura para calar nossa voz 2

A
história do Fórum Carajás, iniciada em1992, é resultado de iniciativas adotadas pela socie-
dade civil, para intervir nas políticas, nos projetos e plantas industriais causadores de danos
sociais e ambientais. Há época, Fernando Collor de Melo era presidente do Brasil, Edson
Lobão e Jader Barbalho eram governadores, respectivamente, do Maranhão e do Pará. Os conflitos de terra
nesses estados recrudesciam, entre 1985 e 1995. Neste perído foram computadas pela Comissão Pastoral
daTerra( CPT) 45 mortes no campo no Maranhão e 67 no Pará. A concentração fundiária estava no seu
patamar mais alto, conforme Índice de Gini3 , em torno de 0,85 %; os recursos naturais eram utilizados para
acelerar o processo de enriquecimento de grupos econômicos. A região e Carajás era área atrativa para
investimentos. Várias siderúrgicas( convidadas pela CVRD) já estavam instaladas: Companhia Siderúrgica

1 Este texto teve a colaboração de Edmilson Pinheiro, Secretario Executivo do Fórum Carajás.
2 Música de Zé Lopes, samba enredo da Favela do Samba em homenagem a César Teixeira.
3 Coeficiente de Gini é uma medida de desigualdade, quanto mais próximo de um maior a desigualdade

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do Pará (COSIPAR), (1988) em Marabá a Siderúr- O Fórum se estrutura enquanto rede socio-
gica Viena, (1988) e Vale do Pindaré, (1988) Açai- ambiental envolvendo sindicatos urbanos e rurais,
landia. Em Barcarena já estavam a Albrás, (1985) pesquisadores/as e organizações internacionais
Alunorte, (1978), em São Luís a ALUMAR e a ELE- de igrejas e ambientalistas, ONGs, associações de
TRONORTE, em Tucuruí. Havia também um gran- moradores, grupos de jovens, grupos de mulheres,
de número de fazendas e madeireiras. organizações de pescadores/as, de professores, se-
Nesse contexto o Grupo de Trabalho Ama- ringueiros e quebradeiras de coco entre outras ex-
zônico (GTA) e outras entidades do Maranhão e do trativistas.

Fonte: documento do Fórum Carajás

Pará, desencadearam um processo de articulação de A primeira ação foi conhecer os projetos,


grupos sociais atingidos pelas políticas e projetos. A pois era necessário possuir conhecimentos para in-
partir daí surgiu a proposta de organizar um seminá- tervir, discutir o desenvolvimento da região, saber
rio internacional sobre os grandes projetos na região, como eram as relações entre a indústria e meio am-
precedido de um conjunto de estudos para permitir biente, analisar seus impactos. Assim uma série de
uma intervenção qualificada do Movimento Social. estudos, pesquisas e treinamentos foram realizados
Esse processo foi nominado de Seminário Consulta com a participação de professores e pesquisadores
Carajás. das Universidades do Pará e do Maranhão e ligados
Naquele período eram poucas as organiza- aos movimentos sociais. A pesquisa precisava ser
ções ambientalistas na região, que se concentravam imediatamente útil, os/as pesquisadores/as partici-
no sul e sudeste do Brasil, atuavam na proteção de pavam das reuniões com informações e análises dos
ecossistemas naturais, porém havia um distancia- dados levantados. Assim, pesquisas científicas tive-
mento dessas organizações com outros movimentos, ram o propósito apoiar na discussão dos problemas
as ambientalistas ignoravam as questões sociais e as localizados, bem como na promoção da capacidade
demais organizações não incorporavam a qualida- de planejar, de tomar decisões, fortalecer o senti-
de ambiental nos discursos. Eram as ambientalistas mento de pertencimento e poder de negociação.
compostas por universitários, funcionários/as de ór- A pretensão era intervir nas políticas públi-
gãos públicos. cas e privadas, mudar o curso da história, relacionar
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justiça social com meio ambiente, mas, era preciso capacitar as organizações e as lideranças. Foram criados
grupos de estudos para a construção de um referencial teórico e alternativas para região. As organizações
foram habilitadas para participar de conselhos de gestão, comissões, acordos de negociação; foram disse-
minados conhecimentos e informações sobre os impactos na região utilizando inclusive rádios comuni-
tárias, teatro, música, artes visuais, cursos, oficinas, encontros regionais, nacionais e intencionais. Foram
elaborados livros, mapas, revistas e diversos textos (Verificar em referências bibliográficas).

As relações internacionais
O desafio era grande, foi necessário identificar e conquistar parceiros em órgãos públicos, estimular
o apoio de legislativos, promover audiências públicas. Assim as relações com as organizações internacio-
nais especialmente com organizações da Alemanha foram fundamentais para iniciar o processo de inter-
locução e reconhecimento do Fórum, por parte do setor público e privado.
Um primeiro projeto foi encaminhado a Pão para o Mundo (BROT FÜR DIE WELT- PPM)4, e
Misereor5 com a interveniência da Coordenadora Ecumênica de Serviços (CESE). Naquela oportunidade,
a Conferência Conjunta Igreja e Desenvolvimento (Gemeinsame Konferenz Entwicklung und Kirche-
GKKE, organização das igrejas alemãs, que já atuava com programa de diálogo iniciou um novo programa,
tendo como centro de atividades a Tanzânia e Brasil sobre justiça internacional e de proteção ao meio am-
biente com grupos representativos da sociedade civil da Alemanha, e, no caso do Brasil, com indústrias
siderúrgicas alemãs e entidades populares da região de Carajás. Aqui se buscou estabelecer e ampliar
relações com organizações internacionais, avançar nas relações Norte-Sul, nos acordos internacionais e
na responsabilidade global.
Além das organizações da Igreja da Alemanha o Fórum desenvolveu outras relações internacionais
com o GREEPEACE, FIAN, KOBRA, Cooperação Técnica Alemã (GTZ), IG Metal, International Rivers
Network, PARC-FASE 6.

Primeira fase da articulação, o Seminário Consulta Carajás


De 1992 até a realização da Mesa Redonda Internacional, em 1995, foram realizados encontros e
seminários, oficinas, estudos voltados para a realização de um evento que discutisse os projetos e políticas
públicas para região com o Estado, empresas, consumidores internacionais, trabalhadores das empresas,
grupos e comunidades atingidas. Vale destacar que o Projeto Ferro Carajás era o carro chefe dos projetos.

Quadro 01: Principais eventos na primeira fase do Fórum Carajás


EVENTO LOCAL DATA
Marco Inicial Marabá-Pa 07.04.92
1° Encontro Estadual São Luís-Ma 17.04.93
2° Encontro Estadual Marabá-Pa 05.04.93
1° Encontro Interestadual Marabá-Pa 14.06.93
2° Encontro Interestadual Marabá-Pa 25.10.93
Seminário Reflorestamento e Celulose Imperatriz-Ma 04 e 05.06.94
Seminário de preparação para MRI Alemanha janeiro de 1993
Seminário “Pré - Consulta” São Luís-Ma 20 a 23.06.94
3° Encontro Interestadual São Luís-Ma 17 a 19.06.94
4� Encontro Interestadual São Luís-Ma
Mesa Redonda Internacional São Luís-Ma 05.a 07.05.95
Avaliação da MRI São Luís-Ma 08.05.95
Audiência Pública no Congresso Nacional Brasília -DF novembro 1995
Audiência com MME, INCRA e MMA Brasília-DF novembro 1995
Avaliação Programa de Diálogo de GKKE Alemanha março de 1996

4 agência de cooperação da Alemanha


5 agência de desenvolvimento da Igreja Católica da Alemanha
6 O Greenpeace é uma organização global e que atua na defendesa do meio ambiente; a FIAN (“Food First Information & Action Network),
é uma organização internacional de direitos humanos que trabalha pelo direito a alimentação; a KOBRA ( Kooperation Brasilien) é uma rede
de pessoas e grupos de países de língua alemã, de solidariedade ao Brasil; a Deutsche Gesellschaft für Technische Zusammenarbeit (GTZ),
é uma empresa pública de direito privado, de cooperação internacional; o IG Metall, é sindicato de metalúrgicos da Alemanha; International
Rivers Network (IRN), é uma rede internacional de guardiões dos rios; o PARC-FASE é um grupo de Pesquisa e intercâmbio com o Japão.

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A Mesa Redonda Internacional plantação de fábrica de celulose na região tocantina,
(MRI) a exploração de madeira nativa e a expansão da
Na MRI realizada em maio de 1995 em São sojicultura. Aqui se destaca a iniciativa das organi-
Luís/MA, participaram 174 pessoas, autoridades fe- zações do Sul do Maranhão, coordenadas pela Asso-
derais e estaduais de órgãos ambientais, do planeja- ciação Camponesa (ACA) e o programa da movi-
mento, e da questão agrária; parlamentares brasilei- mento sindical coordenado pela FETAMA sobre os
ros e alemães; entidades eclesiásticas brasileiras e impactos da sojicultura;
alemães; Banco Mundial; representantes de comu- • Privatização e desemprego, esse programa
nidades indígenas; lideranças de entidades sindicais aglutinou problemáticas urbanas, tais como impac-
rurais e urbanas; organizações não governamentais
tos sociais, ambientais e econômicos causados pela
brasileiras e alemães. A MRI foi precedida por um
privatização e terceirização, mineração e siderurgia.
cuidadoso processo de organização no que concerne
A privatização de estatais, terceirização dos serviços
a logística do evento (hospedagem, transporte, re-
gimento interno do evento), como na formação dos e desemprego nas áreas de produção do alumínio
participantes do movimento social, coordenação e e ferro motivaram estudos, audiências públicas na
mediação dos trabalhos. Câmara Federal dos Deputados e Câmara dos Depu-
A Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) rea- tados do Pará. Com relação as injustiças ambientais,
giu não participando e incentivando a não participa- Fórum denunciou os danos ambientais causados
ção de empresas e de setores da Igreja Católica. pelo vazamento de óleo no rio Gapara, pela CVRD
e ,acompanhou a comunidade São Raimundo do Ga-
para em maio de 2000. Por outro lado o contínuo
Carvoeiros 7 e rápido desmatamento para a produção de carvão
A usina converte em aço, vegetal no corredor Carajás e as relações de traba-
a paisagem e em cinzas, lho nas carvoarias levou a realização de Encontro de
o coração dos homens carvoeiros e carvoeiras em 2002 e acompanhamento
O lingote é o filho aceso da categoria e dos impactos ambientais.
da usina que oculta no seu fogo
• Os caminhos do alumínio, programa que
a lógica do deserto.
trata sobre a cadeia do alumínio realizou seminá-
rios internacionais no Brasil e na Alemanha, in-
titulados “Diálogo Internacional sobre Alumínio:
Segunda fase: as cadeias de produção
A partir da avaliação da MRI o Fórum pas- Responsabilidade Global da Extração ao Consumo”
sa se identificar como Fórum Carajás e se empenha sobre impactos no setor do alumínio. O seminário
em discutir as políticas a partir de temas micro re- no Brasil foi realizado no Praia Mar Hotel, São Luis/
gionais, incentivando a incorporação de aspectos de MA, no período de 23 a 26 de março de 1999. Teve
sustentabilidade ambiental e justiça social nas lutas como objetivo a discussão, com os setores envol-
nas atividades das entidades. Elencou como prio- vidos, dos problemas causados pela exploração da
ridades para atuação as cadeias de produtos identi- bauxita, geração de energia pela usina hidrelétrica
ficadas na primeira fase como as mais impactantes: de Tucuruí e produção de alumina e alumínio, com
ferro; alumínio; madeira nativa/carvão; eucalipto/ a intenção de encontrar soluções para os problemas
celulose. Na avaliação do Fórum realizada 1997 e sócio-ambientais gerados, com a elaboração de um
1998 aponta dois eixos temáticos como unificadores projeto de desenvolvimento regional sustentável.
das diversas lutas e temas que se tornaram progra- Nesse grupo temático o destaque foi a criação sindi-
mas de trabalho:
cato de químicos de Barcarena e participação desse
• Agricultura familiar e grandes projetos,
sindicato no processo.
envolve as problemáticas rurais Os destaques nes-
• Barragens e energia. Estava proposto
se programa foi a questão do eucalipto e a im-
construção de 14 barragens no Araguaia Tocantins.
Como ação de resistência, o Fórum juntamente com
7 Versos do poema carvoeiro de Pedro Tierra outras organizações da região criaram Campanha

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Contra as Barragens do Araguaia e Tocantins atra- na Região Carajás, em dezembro, em São Luís onde
vés de reuniões, debates, levantamento e sistemati- participaram 131 pessoas, sendo 96 mulheres e qua-
zação de estudos sobre as barragens, produção de tro homens trabalhadoras/trabalhadores rurais, de
material impresso, seminários regionais, seminário 32 municípios do Maranhão e do Pará, represen-
interestadual em Imperatriz/MA e ato público em tantes do poder Executivo e legislativo Municipal,
Itaguatins/TO. representantes da MAMA, dos Conselhos Estadual
• A mulher e os grandes projetos. Esse pro- da Condição Feminina do Pará e do Rio de Janeiro,
grama “Mulher e os Grandes Projetos: impactos dos bem como representantes de órgãos financiadores
grandes projetos na vida das mulheres objetivava internacionais CESE, DFID, ELO.
• O Programa “BOCA DE FORNO”, jo-
identificar as condições de vida das mulheres frente
vens rurais, arte e o meio ambiente. O Programa in-
aos grandes projetos, com ênfase para os aspectos
cluiu parcialmente os Estados do Maranhão e Pará
da saúde, trabalho, salário e meio ambiente;bem
envolvendo diretamente 279 pessoas dos seguintes
como dar visibilidade aos trabalhos desenvolvidos
municípios: São Luís, comunidades de Taim, Rio
por essas mulheres nas empresas, nas organizações
dos Cachorros, Porto Grande, Limoeiro e Vila Ma-
e nas comunidades onde vivem; promover a cria-
ranhão; Itapecuru-mirim; Santa Rita; Morros; Presi-
ção de novas organizações de mulheres eviden-
dente Juscelino; Açailândia; Imperatriz; Cidelândia;
ciando suas atividades. O estudo sobre “Mulher e
São Pedro da Água Branca; João Lisboa; Senador
os Grandes Projetos: Diálogo sobre Gênero e Meio
La Roque; Eldorado; Marabá; Tucuruí e Parauape-
Ambiente na Região do Carajás”, realizado junto às
bas. Perfazendo um total de nove oficinas, no perío-
mulheres ao longo de oito meses nas Regiões Ecoló-
do de maio a novembro de 2000, com jovens filhos/
gicas Litoral/Baixada, Pré- Amazônia Maranhense
as de pescadores/as e agricultores/as. Nas oficinas
e Chapadas do Sul do Maranhão e Sudeste do Pará
buscou, nas expressões, artísticas fazer compreen-
participaram 237 mulheres e 10 homens em oito ofi-
der a Natureza, os impactos ambientais dos grandes
cinas realizadas nos municípios de São Luís, Impe-
projetos bem como incentivou atitudes promotoras
ratriz, Açailândia, São Raimundo das Mangabeiras,
da sustentabilidade e autolimitação. O Programa
Parauapebas, Presidente Juscelino, Presidente Mé-
incentivou os projetos Camurim I de formação de
dici, Rosário e Marabá. Após a realização de ofici-
jovens em beneficiamento de pescado em 2000, e,
nas regionais em nove municípios, foi promovido o
o Projeto Camurim II de criação agroflorestal de
Seminário Filhas da Terra, Gênero e Meio Ambiente
peixes e crustáceos, em 2001.

Quadro 2: Principais eventos na segunda fase do Fórum Carajás

Evento Local Data


Audiência Pública da CELMAR, levantamento Imperatriz-Ma 1997
cartorial das áreas compradas pela CELMAR
contestação de áreas adquiridas ilegalmente
5° Encontro Interestadual Parauapebas-Pa 07.e 08.09.96
Audiência com Banco Mundial e IBAMA Brasília-DF Dezembro 96
Seminário Internacional ”Pequeno Produtor e Balsas-Ma 09 a 01.05.97
Grandes Projetos”
Encontro “Grito de Tucuruí” Tucuruí-Pa 14.03.97
Seminário sobre os Grandes Projetos no Baixo Brejo-Ma 03.e 04.05.97
Parnaíba
Audiências com deputados federais e assessores Brasília-DF Agosto/Setembro 97
Diálogo Internacional sobre Alumínio: São Luís MA Março de 1999
Responsabilidade global da extração ao consumo
“Seminário ‘Gênero e meio ambiente” São Luís MA Dezembro de 1999
Seminário Carajás: Mineração e Desemprego Parauapebas PA 14, a 16.04. 2000
Reunião sobre grilagem no Parque do Mirador, Imperatriz MA Fevereiro de 2001
divulgação
Seminário sobre agricultura familiar AçailândiaMA Dezembro de 2001
Produção de vídeo sobre a expansão da soja em Balsas MA Maio de 2001
Vão das Salinas
Oficina alternativas de sobrevivência Escola 10 Balsas MA Junho de 2001
Sindical de Balsas
Seminário sobre meio Ambiente e Cidadania Capinzal MA Junho de 2001
Vão das Salinas
Oficina alternativas de sobrevivência Escola Balsas MA Junho de 2001
Sindical de Balsas
Seminário sobre meio Ambiente e Cidadania Capinzal MA Junho de 2001
Oficina sobre arte, cidadania e meio ambiente TaimMA Jul/dez 2001
Oficina sobre “noções de organização, projetos BarcarenaPA Março de 2001
Encontro de Trabalhadoras em Carvoarias São Luís MA Fevereiro de 2002
Oficinas durante o II Fórum Social Mundial sobre Porto Alegre Fevereiro de 2002
as cadeias de produção de soja e alumínio
Campanha em defesa da criação da reserva
extrativista das ilhas do lago de Tucuru í
Seminário outro lado da ilha: impactos no interior Taim/São Luís dezembro de 2002
da ilha de são Luís, alternativas e organização das
comunidades
Oficina a cadeia de produção da soja Belém/PA
Fórum Social Panamazônico

Estrutura organizativa Marabá/PA


Uma estrutura político-administrativa par- • Sindicato dos Trabalhadores da Indústria de
ticipativa, as tomada de decisões, desde encon- Metais Básicos (METABASE) Carajás/PA
tros estaduais e interestaduais, reuniões da coorde- • Movimento Nacional dos Pescadores (MO-
nação e grupos temáticos eram discutidas por todas NAPE)
as entidades-membro., • Movimento Interestadual de Quebradeiras de
Babaçu
Os Núcleos facilitavam a socialização das • Sindicato dos Metalúrgicos de Açailândia e
questões e a realização de atividades Imperatriz (SIMETAL)
• Núcleo de Tucuruí participam organizações • Sindicato dos Metalúrgicos do Maranhão (SI-
de Tucuruí, Novo Repartimento, Tailândia, Breu METAL)
Branco; • Sociedade Maranhense dos Direitos
• Núcleo de Marabá participam organizações Humanos
de Marabá, Parauapebas, Eldorado, Paragominas, • Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Curionópolis; Rurais de Açailândia,
• Núcleo de Imperatriz participam organizações • Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
de Imperatriz, João Lisboa, Estreito, Cidelandia; Rurais de Balsas,
• Núcleo de Açailandia participam organiza- • Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
ções de Açailandia, Buriticupu, Santa Luzia Rurais de Imperatriz/MA
• Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
A Coordenação era representada por todas as Rurais de João Lisboa,
regiões e categorias de organizações integrantes do • Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Fórum: Rurais de Novo Repartimento,
• Associação Agroecológica Tijupá • Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
• Associação de Mulheres do Bico do Papagaio/ Rurais de Parauapebas,
TO (ASMUBIP) • Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
• Associação em Áreas de Assentamento no Es- Rurais de Tucuruí
tado do Maranhão (ASSEMA)
• CÁRITAS Regional de ao Luís/MA, Intercâmbios
• Centro de Educação e Cultura do Trabalhador • Viagem de comitiva alemã para a região de
Rural (CENTRU) Imperatriz/MA extração do minério de ferro em Carajás, 17 pessoas,
• Centro de Educação, Pesquisa e Assessoria representantes dos sindicatos alemães de mineração,
Sindical e Popular (CEPASP) Marabá/PA setor químico e energético (IGBCE); do setor meta-
• Coordenadoria Ecumênica de Serviços lúrgico (IG Metall) da Confederação dos Sindicatos
(CESE) Salvador/BA Alemães (DGB), representantes da GKKE e asses-
• Cooperativa. Agroextrativista de Paraupebas/PA sores do Fórum Carajás
• FASE/MARABÁ, • Seminário envolvendo delegação alemã e
• Federação do Tocantins Araguaia (FATA) 38 dirigentes sindicais brasileiros do setor mineral

11
(CNTSM-CUT) e do setor siderúrgico (CNM-CUT), Terceira fase
em Belo Horizonte, Minas Gerais, na sede da Escola
Sindical 7 de Outubro. Participaram 10 representan- A implantação, ampliação e/ou consolidação
tes do Fórum Carajás de refinarias de petróleo, termelétricas, aciária, ex-
• Programa EXPO 2000 del proyecto‚ salud, ploração de minas de bauxita e de ouro e outros
seguridad y medio ambiente en el local de trabajo’ empreendimentos que exaurem as riquezas e poten-
Alemanha, con la participação de 30 brasileiros, cialidades locais, desterritorializa povos e comuni-
7 espanhois, 7 suecos e 15 alemãs. Participaram dades, entretanto, a oferta de empregos desmobiliza
7 sindicalistas do Fórum Carajás, em outubro de grupos e movimentos o que tornam esse momento
2000 um desafio maior.
• Conferência: “concepção de uma cadeia da Por outro lado novas organizações se incor-
poram ao Fórum bem como outros temas, destaca-se
soja sustentável nas relações Brasil/Alemanha”. Em
as organizações das regiões de cerrado, da Baixada
Loccum na Alemanha, em maio de 2001. . Partici-
Maranhense e de Barcarena no Pará, que por sua
param três representantes do Fórum Carajás
vez passaram a influenciar as prioridades. O Fórum
• Intercâmbio internacional para um desen-
passa a participar de outras organizações e/ou espa-
volvimento sustentável (Arbeits- und Studienaufen-
ços de discussão como Fórum da Amazônia Oriental,
thalte in Lateinamerika – ASA) objetiva promover Conselho Nacional de Recursos Hídricos,Conselho
troca de experiências entre organismos não gover- Estadual de Direitos Humanos , Conselho Estadual
namentais do Brasil e da Alemanha. Jovens alemães de Desenvolvimento Sustentável, Rede de Interven-
participam de algum projeto no Brasil (Fase Sul) ção em Polítcas Públicas, Rede Manguemar Brasil,
um profissional brasileiro desenvolve uma atividade Redmanglar internacional , Campanha Justiça nos
complementar na Alemanha (Fase Norte). O tema Trilhos, Fórum do Baixo Parnaiba, Rede de Tecno-
principal do intercâmbio é energias renováveis e logia Social, Fórum Estadual de Mulehres, Fórum
aprendizagem global em Alemanha e Brasil. Tema em Defesa das Populações do Cerrado Sul Mara-
priorizado para 2010 – alternativas energéticas e nhense, Associação Brasileira de Ong`s, Rede de
aprendizagem global na Alemanha e Brasil. Agroecologia do Maranhão, Associação Nacional
de Agroecologia, Rede Brasileira de Justiça Am-
biental, Fórum Brasileiro de Ong´s e Movimentos
Salve a Terra8 Sociais, Movimento Reage São Luís, Movimento
SalvaTerra.
Salva, Salvaterra
vives o teu tempo de guerra Dentre os principais programas trabalhados
não construístes armas pelo Fórum Carajás,destacamos:
plantastes cupuaçu
Expansão da sojicultura e a fronteira agrí-
Salva, Salvaterra cola. Programa de educação ambiental, monitora-
refinaria te ocupou mento e alternativas para as comunidades afetadas
o teu povo sente dor pela expansão da sojicultura, seguem os projetos :
pau d’arco cai a flor • Sonhem: Monitoramento e educação am-
biental nos Cerrados Maranhenses, projeto desen-
Salva, Salvaterra volvido em comunidades da bacia do Rio Parnaíba,
Quem salvará tua terra? no município de Loreto/MA;
O que será do teu povo? • Alternativas para o Cerrado, projeto em de-
Salva Terra, Salva Terra, Salvaterra senvolvimento pela ACA na região dos Gerais de
Balsas;
8 Versos da poesia de Zeca Pereira ou Zeca do Sindicato de Rosá-
• Ciranda Agroecológica, projeto desenvolvi-
rio sobre a comunidade Salvaterra de Rosário que foi desapropriada do no município de Mata Roma com jovens qui-
pelo governo do Maranhão para implantação de refinaria Premium lombolas;
da Petrobás

12
• Chapada Limpa: desdobramento de uma social, diversidade cultural e a proteção ambiental
proposta de conservação ambiental para o Baixo Revitalizando os Manguezais, objetiva dar
Parnaíba, em desenvolvimento na Reserva Reserva visibilidade aos ecossistemas manguezais, tornando
Extrativista Chapada Limpa, no município de Cha- os moradores/as e organizações que vivem nos en-
padinha; tornos, capazes de manejar, proteger e impedir a
• Comunidade Tradicional e a Sustentabilida- destruição dessas florestas remanescentes. Entre os
de do Extrativismo do Bacuri, projeto em desenvol- projetos destacou -se o de Comunicação e Educa-
vimento no município de Urbano Santos; ção Ambiental que tinha como finalidade elaborar
• Arte e Meio Ambiente: educação ambiental propostas e fomentar discussões sobre questões
para comunidades quilombolas, projeto em desen- ambientais com comunidades afetadas pelos grandes
volvimento no município de Mata Roma; projetos no interior no interior da Ilha de São Luís
• O Programa Territórios Livres do Baixo durante os anos 2004 e 2005. Desenvolve atualmente
Parnaíba, em desenvolvimento em toda a região do o Projeto Bequimão na região da Baixada Maranhense.
Leste Maranhense, parceria com SMDH, CCN e
FDBPM);
Rosa Negra, é um projeto do Programa Mu-
Mineração e siderurgia. O aumento das
lher e os Grandes Projetos: impactos dos grandes pro-
carvorias para abastecimento do Pólo Siderúrgico
jetos na vida das mulheres, objetiva apoiar as alterna-
Carajás, acarretou novas mudanças ambientais
tivas de renda e de organização de mulheres rurais
tornando os povos e comunidades tradicionais espe-
possibilitando a manifestações culturais reforçando
cialmente vulneráveis. A exemplo dos danos causa-
e reafirmando a identidade negra e novas relações de
dos pelas 13 empresas do Pólo Siderúrgico Carajás
gênero.
que consomem 7.314.404 ton/ano de carvão e, conse-
quentemente, 13.194.949,46 ton/ano de lenha (IBA-
MA, 2005). O Fórum acompanha e denuncia essas Barragens e Energia, o Fórum acompanha
atividades e seus danos. a implantação de barragens na bacia do Araguaia/
Participou do Movimento Reage São Luís, Tocantins e Parnaíba denunciando irregularidades e
contra a implantação de um pólo siderúrgico na Ilha produzindo materrial de apoio as comunidades atin-
de São Luís, inclusive, com oficina no Fórum Social gidas. Tem assento na Câmara Técnica de Análise de
Mundial; participa da coordenação da Campanha Projeto (CTAP) do Conselho Nacional de Recursos
Justiça nos Trilhos; coordena o Movimento Salva Hídricos (CNRH) intervindo para a melhoria dos pla-
Maranhão, de denúncia de irregularidades e mobi- nos das bacias hidrográficas das regiões hidrográficas
lização social sobre os projetos que não oferecem Bacia do Araguaia-Tocantins, Parnaíba e Nordeste
equilíbrio entre crescimento econômico, equidade Ocidental.

Quadro 3: Principais eventos na terceira fase do Fórum Carajás

Evento Local Data


Grandes Projetos; Desenvolvimento Para Quem? São Luís Maio de 2004
Seminários Impactos Mineração na Amazônia Parauapebas
Seminário discutindo a implantação do pólo São Luís/MA 2004
siderúrgico no Maranhão
Encontro de Trabalhadores da Companhia Vale do São Luís/MA 2004
Rio Doce-CVRD, promovido pela CUT e pela
Friedrich Ebert Stiftung-FES
Seminário Internacional Bioma Cerrados Balsas/MA 2004
Encontro com a Articulação Soja/Brasil e entidad es São Luís/MA 2004
do Maranhão
Oficina “Os impactos na saúde de trabalhadoras e Belém-PA 2004
trabalhadores provocados pela cadeia produtiva do
alumínio”- ADRVT, MS, FIOCRUZ e Fórum
Carajás
Encontro Maranhense de Ong´s e Movimentos Barra do Corda/MA 2006
Sociais para o Meio A mbiente e Desenvolvimento 13
Sustentável
Seminário sobre manguezais e populações Bequimão/MA 2006
do Maranhão
Oficina “Os impactos na saúde de trabalhadoras e Belém-PA 2004
trabalhadores provocados pela cadeia produtiva do
alumínio”- ADRVT, MS, FIOCRUZ e Fórum
Carajás
Encontro Maranhense de Ong´s e Movimentos Barra do Corda/MA 2006
Sociais para o Meio A mbiente e Desenvolvimento
Sustentável
Seminário sobre manguezais e populações Bequimão/MA 2006
Tradicionais
Seminário Intermunicipal: ética, meio ambiente e Pastos Bons/MA
trabalho
Debate: Agronegócio no Maranhão -Exploração, São Luís/MA 2007
miséria e destruição no campo e na cidade
Seminário: Desenvolvimento e Direitos Humanos Chapadinha/MA 2007
no Baixo Parnaíba Maranhense
Encontro Regional do Fórum em Defesa do Baixo Santa Quitéria/MA 2007
Parnaíba Maranhense
Plebiscito popular nacional pela nulidade do leilão Nacional 2007
da Companhia Vale do Rio Doce -CVRD
Campanha Justiça nos Trilhos Toda a região -
I Seminário Bacuri: do alto das chapadas ao Chapadinha /MA 2008
comercio nas cidades
I Seminário e Feira: Potencialidades Balsas/ MA 2008
Agroextrativistas do Cerrado Sul Maranhense
Seminário: Acesso dos povos da Amazônia e pan - Balsas/MA 2008
amazônia a terra e território à gestão participativa
dos recursos hídricos
Seminário: Desenvolvimento e Direitos Humanos Baixo Parnaíba 2008
no Baixo Parnaíba;
Oficinas sobre educação ambiental nas áreas de Interior da Ilha de -
manguezais de influência dos Grandes Projetos São Luís
(Alcoa e Vale) com jovens das comunidades
II Seminário Brasileiro Contra o Racismo ambiental Fortaleza/CE 2009
V Encontro de Comunidades do Baixo Parnaíba Buriti/MA 2009
Maranhense
Seminário sobre Cenários Ambientais em Bequimão/MA 2009
Bequimão/MA: Desafios e perspectivas de
sustentabilidade
Tribunal Popular: Terra, Meio Ambiente e Direitos São Luís/MA 2009
Humanos
Seminário sobre Mudanças Climáticas e Grandes Santa Rita/MA 2009
Projetos de Desenvolvimento no Maranhão
Encontro Recursos Hídricos e Barragens no Alto Parnaíba e 2009
Cerrado Sul Maranhense Tasso Fragoso/MA
II Encontro da Rede MangueMar Brasil São Luís/MA 2009
Campanha Justiça nos Trilhos no FSM 2009: Belém/PA 2009
Seminário internacional
Oficina:O conflito entre a Vale e o Meio Ambiente Belém/PA 2009
no FSM
Feira e Seminário: Potencialidades Mata Roma/MA 2010
Agroextrativistas de Mata Roma
Seminário sobre incremento das cadeias São Luís/MA 2010
produtivas do bacuri, babaçu e buriti
Seminário realidade atual das Comunidades frente São Bernardo do MA 2010
as monoculturas
Seminário “O Maranhão de volta ao Século XIX: São Luís/MA 2010
Grandes Projetos e seus Impactos
Socioambientais”
Encontro Internacional dos Atingidos pela Vale Rio de Janeiro/RJ 2010

14
Uma conclusão

paço informal, de discussão político/cultural onde


O Fórum Carajás superou o modelo tradi- foram lançados livros e CDs, no programa Boca de
cional de organização política, na abrangência Forno e no concurso “Artístico e Literário Fórum
e diversidade, congrega grupos e organizações Carajás” o Fórum buscou despertar a criatividade
populares e sindicais, entidades eclesiais nacionais artística nos/as jovens filhos/as de pescadores/as e
e parceiros internacionais. agricultores/as.
A cultura e arte vitalizam todos os processos, O Fórum é uma teia sócio-ambientalista de
caráter permanente que assume o enfrentamento
facilitando a compreensão das problemáticas e en-
de questões específicas e gerais. Proporciona um
volvendo artistas das regiões. Em a Filha da Chuva,
maior entendimento das relações regionais, urbanos
compilação de poesias que mostrava que o desen-
e rurais, integração nas diversas lutas existentes na
volvimento afeta os sentimentos, as emoções e os região e incorporação da proteção ambiental como
valores das pessoas; em Percussão em Movimento, uma dimensão relevante. Causa impacto na opinião
utilizou-se variados sons através de instrumentos e pública, Influencia organismos estatais de meio
dos próprios corpos para mostrar ao público sons ambiente, legislativos, pesquisadores e o empre-
da natureza e dos ambientes em que vivem. Em sariado,
outros espetáculos como o Recital dos Carvoeiros, o Os materiais específicos como relatórios,
Seminário “Rosa Negra” Mulheres Rurais, Danças cartilhas, vídeos, fotos e mapas são usados como
e Tambores, homenageava os atingidos e fazedoras material didático em escolas de primeiro e segundo
de cultura popular, o espaço Cumbuca de Saber, es- graus e como material de apoio a trabalhos de par-

Foto: Robero K-Zau: Mesa Redonda Internacional -MRI

15
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

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16
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17
Organizações participantes do Fórum Carajás

N.º Nome da organização Tipo de organização


01 ABIPA Axixá/TO Organização de cooperação
agrícola
02 APOIO - Balsas/MA ONG
03 Associação Agroecológica Tijupá - São Luís/MA ONG
04 Associação de Donas de Casa de Açailândia/MA Grupo de mulheres
05 Associação de Mulheres do Bico do Papagaio/TO – Grupo de mulheres rurais
ASMUBIP
06 Associação de Moradores de Boa Vista dos Pinhos/MA Associação de agricultor@s
07 Associação de Moradores de Porto Alegre/MA Associação de agricultor@s
08 Associação de Moradores da Vila Bom Jardim/MA Associação de bairro
09 Associação de Moradores da Vila Tancredo/MA Associação de bairro
10 Associação de Mulheres Trabalhadoras Rurais de Lago do Grupo de mulheres rurais
Junco/MA
11 Associação de Mulheres Extrativista de Cidelândia/MA Associação de mulheres
12 Associação dos Sindicatos Unidos do Médio Meariam/MA – Articulação de STTRs
ASUMEM
13 Associação do Trabalhadores Rurais Agroextrativista e Organização de cooperação
Pescadores Artesanais de Tucuruí/PA agrícola
14 Associação em Áreas de Assentamento no Estado do ONG rural
Maranhão - ASSEMA/MA
15 Associação Nossa Senhora do Rosário em Penalva/MA Organização de mulheres
16 Associação dos Pequenos Produtores Projeto de Assentamento Associação de agrcultor@s
Angelim
17 Caixa de Ararás - Marabá/PA Cooperativa agrícola
18 Caixa Agrícola dos Pequenos Produtores de São João do Cooperativa agrícola
Araguaia/PA
19 Cáritas Regional de São Luís/MA Entidade da Igreja Católica
20 Cáritas Diocesana de Brejo/MA Entidades da Igreja Católica
21 Central Única dos Trabalhadores do Sudeste do Pará Central Sindical
22 Central Agroambiental do Tocantins - CAT - Marabá/PA ONG
23 Centro de Educação e Cultura do Trabalhador rural - CENTRU - ONG
Imperatriz/MA
24 Centro de Educação, Pesquisa e Assessoria Sindical e Popular - ONG
CEPASP - Marabá/PA
25 Centro de Estudos e Ação Social - CEAS - Salvador/BA ONG urbana
26 Centro de Cultura Negra - São Luís/MA Movimento Negro
27 Colônia de Pescadores de Tucuruí/PA Sindicato de pescadores
28 Comissão Pastoral da Terra de Marabá/PA Entidade da Igreja católica
29 Comissão Pastoral da Terra da Palestina/PA Entidade da Igreja católica
30 Comissão Pastoral da Terra do Maranhão Entidade da Igreja católica
31 Comissão Pastoral da Terra do Bico do Papagaio/To Entidade da Igreja católica
32 Comunidade Tucumã - Índios Gavião da Montanha - Área Organização indígena
Indígena Mãe Maria- Marabá/PA
33 Conselho Indigenista Missionário - CIMI/MA Entidade indigenista da Igreja
34 Conselho Nacional dos Seringueiros - CNS - Marabá/PA Articulação de Extrativistas
35 Cooperativa Pequenos Agricultores Agroextrativistas de Cooperativa
Esperantinópolis/MA – COPPAESP
36 Cooperativa de Pequenos Agricultores Agroextrativistas de Lago Cooperativa
do Junco/MA
37 Cooperativa de Pequenos Agricultores Agroextrativistas de Lima Cooperativa
Campos/MA – COPPELC
38 Cooperativa de Pequenos Agricultores Agroextrativistas de São Cooperativa
Luís Gonzaga/Ma – COPPAES
39 Cooperativa de Pequenos Rurais de Parauapebas/PA Cooperativa
40 Cooperativa de Pequenos Produtores Agroextrativistas de Cooperativa
Imperatriz/MA – COPPAI
41 Colônia de Pescadores de Abaetetuba/PA Sindicato de pescadores
42 Coordenadoria Ecumênica de Serviços - CESE- Salvador/BA ONG ecumênica
43 Equipe de Educação Popular de Parauapebas/PA – EEPP ONG
44 Federação do Tocantins Araguaia -FATA - Marabá/PA ONG
18
45 Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Pará - FETAGRI Federação de STTTR
46 GREENPEACE ONG ambientalista
40 Cooperativa de Pequenos Produtores Agroextrativistas de Cooperativa
Imperatriz/MA – COPPAI
41 Colônia de Pescadores de Abaetetuba/PA Sindicato de pescadores
42 Coordenadoria Ecumênica de Serviços - CESE- Salvador/BA ONG ecumênica
43 Equipe de Educação Popular de Parauapebas/PA – EEPP ONG
44 Federação do Tocantins Araguaia -FATA - Marabá/PA ONG

45 Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Pará - FETAGRI Federação de STTTR


46 GREENPEACE ONG ambientalista
47 Grupo de Mulheres da Ilha - São Luís/MA Organização feminista
48 Grupo de Trabalho Amazônico Bico do Papagaio/TO - GTA – Bico Articulação de entidades
49 Grupo de Trabalho Amazônico do Babaçu/MA - GTA – Babaçu Articulação de entidades
50 Grupo de Trabalho Amazônico Nacional - GTA - Nacional Articulação de entidades
51 Grupo de Jovens de Oiteiro/MA Grupo de jovens
52 Grupo de Jovens de Rosário /MA Grupo de jovens
53 Grupo de Jovens de Cajueiro/MA Grupo de jovens
54 Grupo de Jovens de Taim /MA Grupo de jovens
55 Igreja Evangélica Luterana de Balsas/MA Igreja evangélica
56 Movimento Nacional dos Meninos e Meninas de Rua Movimento
57 Movimento dos Sem Terra de Parauapebas/PA Movimento
58 Movimento de Mulheres do Campo e da Cidade/PA Grupo de mulheres
59 Movimento de Educação de Base - MEB - Imperatriz/MA Entidade de Igreja Católica
60 Movimento de Educação de Base - MEB - Buriticupu/MA Entidade de Igreja Católica
61 Movimento de Educação de Base - MEB - Marabá/PA Entidade da Igreja Católica
62 Movimento de Mulheres do Araguaia -/PA Movimento de mulheres

63 Movimento de Mulheres do Sudeste do Pará - Marabá/PA Movimento de mulheres


64 Movimento dos Pescadores do Maranhão - MOPEMA Movimento de pescadores
65 Movimento dos Pescadores do Pará – MOPEPA Movimento pescadores
66 Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra Marabá/PA Movimento
67 Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu Movimento de mulheres rurais
68 Movimento Nacional dos Pescadores – MONAPE Movimento de pescadores
69 Pastoral da Mulher e da Criança de Buriticupu/MA Entidade de Igreja Católica
70 Paróquia de Confissão Luterana de Belém/PA Igreja Evangélica
71 Pastoral Popular de Marabá/PA Entidade da Igreja Católica
72 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Barcarena/PA STTR
73 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Buriticupu /MA STTR
74 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Fortaleza de STTR
Nogueiras/MA
75 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Açailândia/MA STTR
76 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Altamira/PA STTR
77 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Amarante/MA STTR
78 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Anapurus/MA STTR
79 Sindicato dos Trabalhadores/as Rurais de Balsas/MA STTR
80 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Brejo Grande do STTR
Araguaia /PA
81 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Breu Branco/MA STTR
82 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Carolina/MA STTR
83 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Eldorado dos STTR
Carajás/PA
84 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Esperantinópolis/Ma STTR
85 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Estreito/MA STTR
86 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Imperatriz/MA STTR
87 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Itupiranga/PA STTR
88 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Jacundá/PA STTR
89 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de João Lisboa /MA STTR
90 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Lago da Pedra/MA STTR
91 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de do Junco/MA STTR
92 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Lima Campos/MA STTR
93 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Loreto/MA STTR
94 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Magalhães de Almeida STTR
95 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Marabá/PA STTR
96 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Mata Roma/MA STTR
97 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Novo Repartimento/PA STTR
98 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Palestina/PA STTR
99 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Paragominas/PA STTR
100 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Parauapebas/PA STTR
101 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Paulo Ramos/MA STTR
102 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Pio XII /MA STTR
103 19
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Pitinga/MA STTR
104 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Poção de Pedras/MA STTR
105 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais Riachão/Ma STTR
97 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Novo Repartimento/PA STTR
98 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Palestina/PA STTR
99 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Paragominas/PA STTR
100 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Parauapebas/PA STTR
101 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Paulo Ramos/MA STTR
102 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Pio XII /MA STTR
103 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Pitinga/MA STTR
104 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Poção de Pedras/MA STTR
105 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais Riachão/Ma STTR
106 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de São Domingos de STTR
Araguaia/PA
107 Sindicato dos Trabalhadores Rurais de São João do Araguaia/PA STTR
108 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de São Luís Gonzaga/MA STTR
109 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de São Raimundo das STTR
Mangabeiras/MA
110 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Tasso Fragoso/MA STTR
111 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Tucuruí STTR
112 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Cidelândia/PA STTR
113 Sindicato dos trabalhadores/as Rurais de Presidente Médici /MA STTR
114 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Nova Colina /MA STTR
115 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Santa Rita/MA STTR
116 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de São Luís/MA STTR
117 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Rosário /MA STTR
119 Sindicato dos Urbanitários do Pará - Marabá/PA Sindicato urbano
120 Sindicato dos Comerciários de Parauapebas/PA Sindicato urbano
121 Sindicato dos Empregados em Entidades de Assistência Social e Sindicato urbano
Educacional - SENALBA - Imperatriz/MA
122 Sindicato dos Ferroviários Sindicato operário
123 Sindicato dos Fotógrafos Açailândia /MA Sindicato urbano
124 Sindicato dos Jornalistas de Imperatriz/MA Sindicato urbano
125 Sindicato dos Metalúrgicos de Açailândia e Impera triz MA Sindicato operário
126 Sindicato dos Químicos Barcarena/PA Sindicato operário
127 Sindicato dos Metalúrgicos do Maranhão Sindicato operário
128 Sindicato dos Metalúrgicos do Pará - SIMETAL Sindicato operário
129 Sindicato dos Trabalhadores /as da Saúde do Pará -SINTESP - Sindicato urbano
Marabá/PA
130 Sindicato dos Trabalhadores /as da Indústria de Metais Básicos - Sindicato operário
METABASE- Carajás/PA
131 Sindicato dos Trabalhadores /as em Educação Pública do Pará - Sindicato urbano
SINTEPP- Marabá/PA
132 Sindicato dos Trabalhadores na Indústria e construção Civil de Sindicato operário
Açailândia/MA
133 Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Alimentação do Sindicato operário
Estado do Pará - Marabá/PA
134 Sindicato dos Trabalhadores na Indústria Madeireiras de Sindicato operário
Eldorado/PA
135 Sindicato dos Trabalhadores na Indústria Madeireiras de Sindicato operário
Construção Civil de Açailândia/MA
136 Sindicato dos Trabalhadores nas Indústria Madeireiras de Sindicato operário
Movelaria de Açailândia/Ma
137 SINTRAFE - Marabá/PA Sindicato urbano
138 Sociedade Maranhense dos Direitos Humanos ONG
139 Sociedade Paraense de Direitos Humanos ONG

20
Impactos e resistências em Açailândia,
profundo interior do Maranhão

Açailândia: terra do açaí

Dário Bossi1

O
s antigos romanos costumavam dizer “nomen omen” (o destino de algo está em seu pró-
prio nome); no caso de Açailândia, cidade do açaí, o ditado foi desmentido e a identidade
do município foi rapidamente alterada em “cidade do ferro”.
Ainda pior o que aconteceu com uma de suas periferias. Piquiá era o nome que os moradores esco-
lheram, valorizando uma das árvores mais elegantes da região. Mas logo que as empresas chegaram, trans-
formaram o mesmo nome no acrônimo “Parque Industrial Químico Açailândia”!
Atrás dessa violação de identidade há uma violência simbólica sobre a vocação de um território e de
um povo. Nesse artigo tentaremos detalhar os passos dessa violência e mostrar os movimentos de resistên-
cia e organização popular.

1 Missionário Comboniano, residente no município de Açailândia, oeste do Maranhão e militante da campanha ‘Justiça nos Trilhos’- www.
justicanostrilhos.org

21
Açailândia tem pouco mais de cem mil habi- Os atores do “desenvolvimento” e suas ví-
tantes distribuídos numa área de cerca de 5.806 Km². timas
O Produto Interno Bruto (PIB) é de 1.410.298.000
R$2 . Com o preço do ferro-gusa antes da crise, ape- a. O Projeto Grande Carajás e a Estrada de Fer-
nas uma siderúrgica no município exportava por ano, ro Carajás4
produtos com valor correspondente a mais de 600
milhões de R$3 . O Programa Grande Carajás (PGC), criado
pelo Governo Federal em 1980, foi o fator que pro-
Por que a siderurgia guseira decidiu investir piciou a instalação do setor siderúrgico na região. O
nessa cidade? PGC surge como um incentivo adicional do governo
para os investimentos privados na região amazônica,
Açailândia se encontra no eixo de duas im- juntamente com o Projeto Minério de Ferro Carajás
portantes rodovias: a BR 010 Belém-Brasília e a BR (PMFC), localizado no município de Marabá (PA)5 e
222, que liga o município a São Luís. O trânsito de controlado pela companhia Vale. O projeto controla
caminhões e veículos é intenso. O município é pon- 10,6% do território nacional. O PGC foi considerado
to de passagem para várias regiões do país, como a um dos maiores programas de desenvolvimento in-
Norte e Nordeste. tegrado numa área de floresta tropical úmida.
Em Açailândia cruzam-se também duas im- A chegada da ferrovia e suas operações cres-
portantes ferrovias: os 892 Km da Estrada de Ferro centes determinaram boa parte dos investimentos
Carajás, que une Parauapebas no Pará com o porto industriais na região. Ao lado da ferrovia, no distri-
de Itaqui em São Luís; e a Ferrovia Norte-Sul, 720 to industrial de Piquiá, instalou-se um grande polo
Km de trilhos, até Palmas no Tocantins (parte ainda Petroquímico, estação de redistribuição para Mara-
está em construção). Ambas estão cedidas em con- nhão, Pará e Tocantins do combustível que chega de
cessão à mineradora Vale, que garante o escoamento navio em São Luís.
de mercadorias e recursos e lucra a partir disso. No final dos anos ‘80 instalaram-se também
A abundância de terra livre na região foi des- várias usinas siderúrgicas (atualmente 11 no Pará e
de sempre um grande atrativo para os investimentos 7 no Maranhão) . Pelo Projeto Grande Carajás, esse
no território. A bibliografia de estudos sobre a região deveria ser o primeiro passo rumo a “um complexo
indica que tudo começou no final da década de industrial metal-mecânico”, tendo como primeiro
60. Numa seqüência altamente destrutiva, que pas- estágio as indústrias sídero-metalúrgicas. Foi pre-
sou pelos ciclos da madeira nobre, das serrarias, dos visto que “os encadeamentos para frente das ativida-
pastos e gado, do carvão e do eucalipto. des siderúrgicas engendrariam a criação de um par-
que metal-mecânico, cujo porte ensejaria a criação
A região tornou-se interessante também devi- de pelo menos 44 mil empregos diretos no ano de
do à relativa riqueza de água: rios, córregos e lagoas 2010”6
hoje desfrutados também pelas empresas instaladas As promessas desse grande investimento
no local. Em razão de tudo isso, a cidade tornou-se industrial, como quase sempre acontece, nunca se
uma etapa obrigatória do dito desenvolvimento, que realizaram nessas proporções. Açailândia, segundo
infelizmente passa por ela sem deixar amadurecer maior pólo de produção siderúrgica, entre os qua-
muitos frutos no local. Minério e ferro vão e vêm,
mas o retorno econômico e o tal de ‘progresso’ para
em Açailândia somente nas mãos de poucos. 4 Relatório Social Instituto Carvão Cidadão, 2005 - http://www.car-
vaocidadao.org.br/ata/relatorio_social.htm
5 CARNEIRO, Marcelo Sampaio. Crítica social e responsabilização
empresarial. Análise das estratégias para a legitimação da produção
siderúrgica na Amazônia Oriental, Cad. CRH v.21 n.53 Salvador
2 IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Contas Nacionais, maio/ago. 2008, disponível em www.scielo.br
2006. 6 BRASIL. 1989. Secretaria de Planejamento da Presidência da Repú-
3 www.vienairon.com.br – Exportação anual de 500.000 ton de ferro blica. Programa Grande Carajás. Secretaria Executiva. Plano-diretor
gusa, com um preço antes da crise de 750 $ por tonelada. do Corredor da Estrada de Ferro Carajás. Brasília, NATRON. 536p.

22
tro localizados ao longo da EFC, no final do ano de escrita do Sindicato dos Ferroviários ao Ministério
2007 empregava no setor de transformação (princi- Publico do Estado (MPE) e à Agência Nacional de
pal mas não unicamente siderúrgico) somente 2.568 Transportes Terrestres (ANTT), a rotina da viagem
pessoas!7 Ao contrário, como veremos logo a seguir, era marcada pelo atraso. Havia queixas ainda sobre
o impacto sócio-ambiental desses novos empreendi- a postura pouco ética da companhia para com os
mentos na região foi enorme. passageiros.
A ferrovia influiu pesadamente sobre o de- Os moradores na beira dos trilhos não conse-
senvolvimento da região e determinou a construção guem conviver com o barulho provocado pelos trens.
de uma cadeia completa de extração e elaboração Um incômodo permanente. As casas mais próximas
do ferro. A cadeia é voltada para a exportação, com dos trilhos sofrem com rachaduras. Os acidentes são
agregação de valor muito baixa para o povo mara- freqüentes, com um número significativo de mortes
nhense. A economia extrativa é marcada por várias por atropelamento de pessoas e animais. Até o ins-
contradições: por exemplo, o contraste entre os va- tante não existe uma política específica da empresa
lores que diariamente passam pelos trilhos e a mi- para lidar com esse problema. Segundo Relatório de
séria de muitos barracos que há anos permanecem Sustentabilidade da própria empresa, o número de
à beira da ferrovia em condições indignas de seres acidentes de trem nos últimos anos foram 59 (2005),
humanos. 63 (2006) e 46 (2007). A vida das pessoas, pelo jeito,
No ano passado a Vale transportou cerca de é menos importante do que o transporte de minério,
100 milhões de toneladas de minério. Ao preço de que tem mais ‘peso’.
2009, uma tonelada de minério custava R$71,00. Uma análise desse tipo é confirmada também
Portanto, a cada dia Vale transporta mediamente pelo fenômeno dos “Meninos do trem”. Trata-se de
333.000 toneladas, por um valor de R$ 21,3 milhões. meninos e meninas que viajam de maneira irregular
Isto quer dizer que a cada dia passam em frente do nos trens de minério da Companhia Vale ao longo da
povo de Açailândia cerca de R$50 milhões. Conside- Estrada de Ferro Carajás. São crianças e adolescen-
rando que essa exportação é desonerada de impostos, tes que têm acesso de maneira clandestina ao trem,
por conta da Lei Kandir, pode-se imaginar os níveis viajando de Marabá ou Parauapebas até São Luís,
de lucro da grande companhia multinacional. ou vice-versa. Quando descobertos pela segurança
Vamos conhecer mais de perto os trilhos da da Companhia, são entregues ao Conselho Tutelar
Estrada de Ferro Carajás (EFC), sobre os quais des- mais próximo, cuja tarefa será de fazer o registro de
de abril de 2008 corre o maior trem do mundo: 330 ocorrência e devolvê-los (a custo da Vale) às suas
vagões, cerca de 3.500 metros de extensão e capa- famílias em seus municípios de origem.
cidade para transportar 40 mil toneladas. Quatro lo- O fenômeno tem crescido consideravelmente
comotivas para cada trem, uma frota total de 205. A a cada ano e tem complicado muito a atuação ordi-
cada dia passa uma média de 10 trens de minério. nária dos Conselhos Tutelares da região. O MPE en-
Mais dois ou três de soja; e dois ou três com outros trou com uma representação a respeito, com o título
produtos, como minério para siderúrgicas e combus- “Meninos do Trem da Vale – Situação de Risco”8 .
tível para o pólo petroquímico, etc. Os meninos do trem estão expostos a toda sorte de
Sem falar dos trens vazios que voltam de São perigos. Desde a contaminação pelo minério, até as
Luís para serem recarregados na mina. condições climáticas diversas, além da viagem sem
Ao contrário, o trem de passageiros, - uma a proteção ou orientação de um adulto responsável.
obrigação da Vale pela concessão estadual de uso “Pelos vagões do trem de ferro, quem leva a
da ferrovia - é garantido somente uma vez a cada carga são os meninos. Com uma realidade que os ex-
dois dias. No fim de 2009, antes da representação pulsa, em péssimas condições socioeconômicas, em

7 Ministério do Trabalho e Emprego/Cadastro Geral de Empregados 8 Procedimento n. 116/05 – Ministério Público do Estado do Mara-
e Desempregados. nhão

23
Estados com baixo Índice de Desenvolvimento Hu- Desde suas instalações, as guseiras da re-
mano (IDH), sem a atenção dos órgãos competentes, gião de Carajás receberam colaboração financeira
sem políticas públicas específicas para a criança e o através de recursos públicos oriundos do Fundo de
adolescente e sem acesso aos bens básicos para uma Investimentos do Nordeste (FINOR) e do Fundo de
vida digna, resta a estes meninos e meninas pegar Investimentos da Amazônia (FINAM). Uma vez
carona naquele que parece ter sido um dos motivos aprovados os projetos, seus signatários recebiam até
de tamanha desordem social. O trem de carga, que 75% do valor total indicado como necessário à im-
carrega minérios e meninos, parece anunciar através plantação do parque industrial e à aquisição de áreas
do seu apito que esta carga está pesada demais, es- destinadas ao desenvolvimento de supostos projetos
pecialmente para os meninos do trem” 9. de “manejo florestal” ou de reflorestamento10.
A perspectiva da duplicação dos trilhos, já A aprovação dos projetos exigiu só formal-
planejada e em fase de realização, assusta os mora- mente uma série de condicionantes ligadas ao licen-
dores de Açailândia e do corredor inteiro, devido à ciamento ambiental. É muito difícil conseguir junto
evidente duplicação de todos os problemas até agora à Secretaria Estadual de Meio Ambiente (SEMA) os
mencionados. documentos de licenciamento. Nossa equipe de pes-
quisa reiterou o pedido à SEMA e a visitou várias
b. As usinas siderúrgicas vezes antes de conseguir dados somente de três das
cinco siderúrgicas, recebendo inclusive três proces-
Em Açailândia encontram-se cinco empre- sos de licenciamento vencidos e não renovados.
sas siderúrgicas: Viena Siderúrgica (capital próprio, Parece claro que, pela facilidade de instala-
em operação desde 1988), Simasa e Pindaré (Gru- ção e a ausência/cumplicidade do poder público, as
po Queiróz-Galvão, 1993), Gusa Nordeste (Grupo siderúrgicas da região de Carajás acumularam enor-
Ferroeste, 1993), Fergumar (Grupo Aterpa, 1996). mes lucros ao longo dos últimos anos. No período
A tabela seguinte dá as dimensões das usinas, com entre 2000 e 2008 o volume de ferro gusa exportado
dados de 2006 (em itálico os dados de algumas side- duplicou, mas o valor dessa exportação quase decu-
rúrgicas de Marabá): plicou, passando de cerca de US$ 165 milhões em

Consumo médio
Nº de Produção média Relação
Nº de alto - anual de
Siderúrgica funcionários anual de ferro consumo/
fornos
próprios gusa (em ton) 3 produção
carvão(emm )
FERGUMAR 2 234 216.000 480.000 2,22
GUSA NORDESTE 2 218 216.000 540.000 2,50
SIMASA/ PINDARÉ 5 650 564.000 1.440.000 2,55
VIENA 5 560 480.000 900.000 1,88
FERRO GUSA CARAJÁS 2 243 400.000 1.057.000 2,64
USIMAR 2 500 180.000 360.000 2,00
Fonte: Pesquisa de Campo IOS. Elaboração: Instituto Observatório Social.

10 MONTEIRO, Maurílio de Abreu . Siderurgia na Amazônia Orien-


tal brasileira e a pressão sobre a floresta primária. In: II Encontro da
Associação Nacional de Pós Graduação e Pesquisa em Ambiente e
9 SOUZA, Emilene Leite. “De passagem”. Universidade Federal do Sociedade - ANPPAS, 2004, Indaiatuba-SP. Anais do II Encontro da
Maranhão/UFMA Imperatriz - CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS, Associação Nacional de Pós Graduação e Pesquisa em Ambiente e
SAÚDE E TECNOLOGIA/CCSST 2009 Sociedade. Indaiatuba : ANNPAS, 2004. v. 1. p. 1-19

24
2000 para US$ 1,5 bilhão em 2008. Este crescimen- nativas – corresponde a um desmatamento de pelo
to tornou-se possível pelo salto do preço médio do menos 600 m² de matas primárias.
ferro gusa exportado, que passou de US$ 99,6/ton Em 2005, por exemplo, as empresas siderúr-
para US$ 445,6/ton no mesmo período”11. gicas da região de Carajás produziram 4 milhões de
Também em tempos de crise, apesar de um toneladas de ferro-gusa12, o que corresponderia ao
discurso preocupado e resignado à solução inevitá- consumo de 240.000 hectares de mata nativa. Na-
vel da demissão dos funcionários, as siderúrgicas quele ano, conforme dados da Associação das Si-
não pararam de vender e lucrar. Carneiro e Ramalho derúrgicas de Carajás – ASICA, a percentagem de
(2009) sinalizam que, até o final de 2008, uma pe- origem do carvão vegetal era de 49,6% da mata na-
quena redução na quantidade exportada, pouco mais tiva e 50,4% de reflorestação com espécies exóti-
de 67 mil toneladas, foi mais do que compensada cas. Portanto, somente em 2005, as siderúrgicas da
pelo valor exportado, com um aumento de cerca de região de Carajás queimaram para produzir carvão
498 milhões de dólares quando comparado ao ano cerca de 120.000 hectares de mata nativa.
anterior. Vamos fazer um outro exemplo no caso do
Ainda conforme os dados de Carneiro e Ra- eucalipto. Para produzir uma tonelada de ferro gusa
malho (2009), os dados oficiais das exportações precisa de 3,8 m³ de eucalipto (ou 5,8 m³ de mata
brasileiras, demonstram de forma inequívoca que as nativa). A siderúrgica Viena atualmente produz
empresas guseiras do Pará e Maranhão finalizaram o 500.000 toneladas de ferro gusa por ano; precisaria
ano de 2008 com grandes lucros. Sem dúvida, as de- portanto, uma vez que se tornar auto suficiente com
missões podiam ser evitadas ou atrasadas, sem que seu parque de monocultura, de 54.000 hectares de
o peso da crise pesasse somente sobre as costas dos eucalipto ao ano, 1,6% da superfície do Maranhão.
mais fracos. Veja na tabela a seguir as previsões que as
Além de desempregada, a população compar- empresas fizeram em 2005 a respeito da interrupção
tilha o pesado impacto sobre o meio ambiente. É ela do corte de mata nativa (fonte: ASICA).

Área
% de carvão
adquiri da Área plantada Ano meta para ser
Siderúrgica produzido em
para plantio (em ha) auto-suficiente
carvoarias próprias
(em ha)
FERGUMAR 10.000 6.000 0% Não há previsão
GUSA NORDESTE 27.000 10.000 0% 2010
SIMASA/ PINDARÉ 56.000 17.500 20% 2012
VIENA 52.000 20.000 55% 2011
FERRO GUSA CARAJÁS 75.000 32.000 100% Já é
USIMAR 3.000 0 0% Não há previsão

quem socializa os desastres ambientais ao longo de Nos últimos anos, com a intensificação da
mais de duas décadas. Dados tabulados por Mon- fiscalização nas fazendas pelo Grupo Especial de
teiro (2004), indicam que para produção de uma Fiscalização Móvel, as empresas siderúrgicas da re-
tonelada de ferro-gusa são necessários 875 kg de gião foram acusadas pelo Ministério Público Fede-
carvão vegetal, cuja produção, por sua vez, requer a ral de se beneficiarem da escravidão para produzir o
utilização de pelo menos 2.600 kg de madeira seca, ferro gusa. Muitas delas tiveram que pagar quantias
elevadas em indenizações para os trabalhadores que
que – quando se utiliza lenha originária de matas
produzem o carvão.
Em 1999, visando adequar o trabalho desen-
11 CARNEIRO, M e RAMALHO, R. A crise econômica mundial e
seu impacto sobre as empresas de ferro-gusa: algumas informações
sobre o desempenho recente das empresas guseiras e o desemprego
no município de Açailândia. 2009. 12 Relatório Social Instituto Carvão Cidadão, 2005.

25
volvido nas carvoarias, as siderúrgicas do estado do Os estudos demonstram várias formas de po-
Maranhão firmaram um Termo de Ajustamento de luição geradas pelas usinas. As águas de resfriamen-
Conduta (TAC) junto ao Ministério Público do Tra- to, por exemplo, são bombadas do ribeirão Piquiá,
balho (MPT) e à Procuradoria Regional do Trabalho, escorrem pela superfície externa dos alto fornos e
envolvendo, também, empreiteiros e fornecedores logo voltam ao rio Piquiá aquecidas e contendo fer-
.Hoje13, percebe-se uma melhoria efetiva das condi- ro e outros solutos, passando nesse percurso pelos
ções de trabalho nas carvoarias, mesmo assim ainda quintais das casas próximas às siderúrgicas.
existem numerosas carvoarias clandestinas. Além de problemas ao meio ambiente, o pro-
Além do desmatamento e do trabalho escravo, cesso pode gerar contaminação para os moradores
há em Açailândia o grave problema da poluição, que por meio da alimentação. O excesso de ferro arma-
afeta povoados inteiros, parcialmente preexistentes zenado e não absorvido pelo organismo pode gerar
à instalação das siderúrgicas. É o caso de Piquiá de graves conseqüências para o fígado e as células car-
Baixo. Em abril de 2008 a Associação Comunitária díacas das pessoas. Pela ausência de uma rede de
de Pequiá de Baixo procurou o Centro de Defesa captação das águas fluviais internas ao pátio, toda
da Vida e dos Direitos Humanos de Açailândia (CD- a escória de ferro e carvão da produção acaba es-
VDH) e a Paróquia São João Batista. A parceria visa correndo também no mesmo riacho logo abaixo dos
enfrentar o problema da poluição provocada pelas empreendimentos.
siderúrgicas no distrito industrial. A escória vitrificada não é devidamente tra-
A Associação Comunitária há tempo buscava tada, mas descartada no ambiente, podendo gerar
denunciar a situação, batendo sem sucesso à porta intoxicação de plantas, animais e pessoas. O vento
de diferentes instituições. A aliança dos moradores levanta a poeira e o “pó de balão”. O pó é uma sobra
de Piquiá de Baixo com o CDVDH e a Paróquia São da produção amontoada em cúmulos ao lado das ca-
João permitiu coordenar melhor as ações, partindo sas. O próprio britador que reduz a sobra em partícu-
da oportunidade de um primeiro processo instituído la do fino levanta muita poeira, que cai em cima das
contra uma das siderúrgicas: a Gusa Nordeste. casas. No fim de 2009, uma das cinco siderúrgicas
De fato, em novembro de 2005, 21 famílias encontrou uma maneira de evitar esses depósitos.
moradoras de Piquiá de Baixo ( mais próximas fi- Outro aspecto relevante: nenhuma das cha-
sicamente à empresa) denunciaram por danos a po- minés dos 14 alto fornos das siderúrgicas possui
luição produzida pela a siderúrgica Gusa Nordeste, filtro de manga. À fumaça acrescenta-se partícula
exigindo indenização. Depois de quase quatro anos, do fino de carvão que se levanta em grandes nuvens
apesar da pressão e do apoio popular, repetidas ve- pretas toda vez que a combustão não é regular e pre-
zes solidário à causa daquelas famílias, os procedi- cisa “desentupir” o forno.
mentos legais ainda não se concluíram. Recentemente a Gusa Nordeste instalou uma
Com o objetivo de verificar a existência de termelétrica alimentada pelas próprias emissões de
relação entre os casos denunciados pelas famílias14 seus fornos. Isso lhe garante a produção de energia
com as atividades da empresa, a juíza da segunda elétrica para uso interno e, posteriormente, a possi-
vara da Comarca de Açailândia encomendou uma bilidade de obter recurso com a venda de créditos de
perícia ambiental nas dependências da empresa e carbono. Apesar disso, o sistema não consegue con-
nas residências das famílias . Esse estudo somou-se ter todas as emissões das chaminés dos alto fornos, e
a um outro, encomendado pelo CDVDH, a respeito o povo continua tendo sua dívida de oxigênio.
da poluição hídrica pelas siderúrgicas15. Em setembro de 2001, mais um acidente ter-
rível humilhou e fez violência sobre o povo. Acon-
teceu com Gilcivaldo, 7 anos, em busca de alguns
pedaços de carvão para esquentar a comida em seu
13 Relatório Social Instituto Carvão Cidadão, 2005.
14 Relatório de Perícia Ambiental apresentado à Segunda Vara Judi-
barraco. Avançou demais no monte de ‘munha’, uma
cial da Comarca de Açailândia, dr. Ulisses Brigatto Albino, Impera- escória incandescente depositada pelos caminhões
triz 2007. Perícia realizada dia 05 de Dezembro de 2006. das siderúrgicas, numa área livre e não protegida, ao
15 Estudo preliminar da situação ambiental da população de Piquiá,
eng. Mariana de la Fuente Gómez, Açailândia 2007. lado do povoado.

26
A munha esfria-se em superfície, mas se cessárias aproximadamente 450 mil toneladas/ano
mantém muito quente logo abaixo. O amontoado de de ferro gusa em estado líquido, transportado por
escória amoleceu e as pernas do adolescente acaba- caminhões especiais que saem da Gusa Nordeste e
ram se queimando até a bacia. Depois de 20 dias das outras siderúrgicas de Açailândia. Para a produ-
de agonia, Gilcivaldo faleceu. Acidentes desse tipo ção do aço precisará esquentar ulteriormente o ferro
aconteceram também com outras pessoas e animais gusa. O processo acontecerá inteiramente (ao dizer
que acabaram se queimando e prejudicando a pele e dos empresários) pela queima de oxigênio líquido,
às vezes parte das pernas. material muito caro que deverá vir do sul do País.
Por causa de toda essa injustiça, o povo de Para o esfriamento do processo de produção,
Piquiá de Baixo vive revoltado e luta há anos por serão necessários 200 m³ de água por hora. O Rela-
direitos e moradia. Quase todos os moradores estão tório de Impacto Ambiental (RIMA) da aciaria ga-
de acordo em sair do lugar. Negociam com as usinas rante que toda essa água será mantida em constante
e o poder público o deslocamento do povoado para circulação interna e bombada através de poços ar-
uma nova região. A mediação é do Ministério Pú- tesianos. A construção da usina deve durar três anos
blico e a assessoria do CDVDH e da Paróquia São e a estimativa de geração de emprego gira em torno
João Batista. de 1.000 postos. Existe a promessa de geração de
Sobre a situação ainda ambígua das siderúr- mais 1.000 empregos entre diretos e indiretos, no
gicas na região de Carajás, Monteiro (2004:1) dis- ápice da produção.
para que: Os movimentos populares acolhem com sa-
tisfação a aciaria, pois ela traz o tão esperado iní-
Em que pese a produção siderúrgica ainda hoje cio da verticalização da produção no contexto local,
estar presente no discurso de diversos e amplos permitindo a valorização do trabalho maranhense e
segmentos sociais como elemento de moderni- dos recursos de nosso subsolo.
zação regional, ela cumpre um papel distinto,
Porém existem inúmeras dúvidas e inquietu-
conquanto amplia a pressão sobre a mata pri-
des. Uma das maiores recai sobre os investimentos
mária, caotiza diversos espaços urbanos; refor-
ça segmentos sociais que articulam a sua lógica
para a construção desse novo empreendimento. O
produtiva à exploração predatória dos recursos Banco do Nordeste irá financiar 300 milhões de re-
naturais, como os madeireiros, ou com grupos ais somente na primeira fase. Por que, perguntam os
sociais para os quais a grande propriedade fun- movimentos numa carta aberta à cidade - tão grande
diária é fonte de poder social, como os fazendei- investimento sem ter resolvido ainda os graves pro-
ros; amplia as tensões no campo e os conflitos blemas de poluição e impacto que o resto das ativi-
fundiários; e intensifica os esquemas de submis- dades está gerando há vinte anos?
são da força de trabalho à baixa remuneração e a Mais uma vez a lógica do lucro incondicional
condições de trabalho insalubres.
parece prevalecer acima de qualquer outro direito.

c. A aciaria – um capítulo recente d. Os fornos de Califórnia
Em maio de 2008 o Estado do Maranhão e Ao lado do assentamento Califórnia, com
a Gusa nordeste de Açailândia assinaram um pro- mais de 1.800 moradores assentados há 13 anos, ins-
tocolo de intenções para a instalação de uma acia- talou-se em 2005 o empreendimento da Ferro Gusa
ria na cidade. O novo empreendimento prospecta a Carajás (FGC). A empresa controlada pela Vale se
produção de 500.000 toneladas anuais de tarugo de dedica à produção de carvão vegetal destinado a ali-
aço (Billet), que tem tanto uso industrial doméstico mentar a siderúrgica da Vale em Marabá. O empre-
como para exportação. O Billet é o semi acabado endimento é conhecido como Unidade de Produção
utilizado como matéria-prima para a laminação de de Redutor (UPR2), que é o carvão para siderurgia.
aços longos (vergalhões, fio máquina, perfis, barras A Licença de Instalação foi emitida pelo Pro-
mecânicas etc.). cesso nº. 2334/03, prevendo um pátio de carboni-
Para produzir a capacidade total, serão ne- zação composto por 64 fornos retangulares e uma

27
estimativa de produzir 94 ton/
dia de redutor (carvão vegetal) .
Na realidade, foram construídos
72 fornos retangulares e 7 for-
nos de tamanho menor (fornos a
meia laranja), ocupando ao todo
uma área de 1.185m². Cada forno
retangular tem capacidade para
102m³ de madeira enfornada, ou
83m³ de carvão cada.
Cada queimador de gás é
planejado por oito fornos, portan-
to deveriam ter sido implementa-
dos 9 queimadores de gases. Na
realidade, atualmente existem
somente 2 queimadores. O pri-
meiro começou a funcionar em
novembro de 2008, o segundo
em fevereiro de 2009. Atualmen-
te, ambos estão quebrados e não
funcionam.
Pode-se concluir, então,
que de 2005 até 2009 os mora-
dores do assentamento Califórnia
respiraram a fumaça emitida por
todos os fornos em funcionamen-
to. Recentemente, a FGC fechou
metade dos fornos para diminuir
as emissões. Ao dizer da empre-
sa, isso foi devido à preocupação
pela poluição. Sabe-se porém
que a escolha deve-se à redução
de produção de ferro gusa em de-
forme o Relatório de Controle recebeu um relatório oficial sobre
corrência da crise mundial. Atu-
Ambiental, para a avaliação da a poluição do ar; só chegaram al-
almente funcionam só 4 das 11
qualidade do ar deveria ser mo- guns relatórios por e-mail. A pró-
unidades que alimentavam a si-
nitorado o parâmetro ‘partículas pria Secretaria Estadual de Meio
derúrgica da Vale em Marabá. A
totais em suspensão’ (PTS). Para Ambiente não quis levar até o fim
perspectiva em médio prazo para
isso, deveria ser instalado um a ação contra a FGC. Apenas no-
a FGC de Marabá é queimar car-
equipamento do tipo Hi-Vol a ju- tificou a firma novamente em ou-
vão mineral da África.
sante da área do empreendimento, tubro de 2008, mas nunca recebeu
A medição da qualidade
com relação à direção predomi- resposta a essa notificação, nem
do ar nem sempre foi efetiva. No
nante dos ventos. assumiu nenhuma providência
Plano de Gestão da Qualidade, o
Também nesse caso, foi so- por isso.
artigo previa a execução de um
mente em 2008 que dois medido- Há exemplos em profusão.
programa de avaliação da quali-
res foram instalados. Até outubro Os assentados entregaram um lau-
dade do ar e de acompanhamento
do mesmo ano, a SEMA nunca do médico à SEMA dando conta
da operação do queimador. Con-

28
de vários problemas respiratórios, agosto a fábrica paulista Suzano caia sobre Açailândia. Uma terra
de pele e de vista em função da Celulose estará consolidando o marcada por uma distorcida visão
fumaça dos fornos, especialmente seu programa de retirada compul- de desenvolvimento.
para com idosos, bebês e crian- sória de comunidades tradicionais
ças. da região dos cocais e do Tocan- As respostas organizadas
No decorrer dos três anos tins. (…) O complexo de planta- do povo
de difícil convivência com a ção do eucalipto envolve, só na
carvoaria, a comunidade de Ca- região dos cocais, 21 cidades e Apesar dos conflitos, ou
lifórnia por diversas vezes enca- atinge centenas de povoados, co- talvez exatamente em função
minhou denúncias ao Instituto munidades tradicionais: quilom- deles, o povo de Açailândia, as
Brasileiro dos Recursos Naturais bolas e agricultores familiares, comunidades e movimentos não
Renováveis (IBAMA), ao Minis- atingindo principalmente seu desanimam e tentam se organizar.
tério Público Estadual e Federal, modo de viver, produzir e repro- Um primeiro sinal disso é a re-
à Vigilância Ambiental, às Secre- duzir-se socialmente.” . sistência teimosa dos moradores
tarias Municipais de Saúde e de A própria empresa utilizou de Piquiá de Baixo e de Califór-
Meio Ambiente. Representantes a expressão “bota-fora” em seu
nia. Humildes e iniciantes na luta,
do assentamento estiveram várias termo de referencia (Projeto SPC
mas corajosos e até agora muito
vezes em audiências com repre- 1008). Um dos principais motivos
unidos.
sentantes destes órgãos cobrando que leva a Suzano a instalar-se no
A própria arte se coloca a
providencias, chegando inclusive Maranhão é o grande volume de
serviço dessa resistência e tenta
a convidar estes para duas assem- água necessário para atender às
moldar junto ao povo um sonho
bléias no assentamento. Ninguém demandas de produção de celulo-
concreto de libertação. Os jovens
da representação pública compa- se. O medo dos moradores da re-
do grupo Juventudes pela Paz (Ju-
receu. gião é o que vai acontecer de suas
paz) montaram uma peça a partir
O povo de Califórnia é reservas de água e da esperança
conhecido pelo histórico de luta. das histórias e dos contos dos mo-
cada vez mais fraca de refloresta-
Em março de 2008 os assentados, radores de Piquiá . Ver-se repre-
mento com espécies nativas.
com o apoio do MST, promove- sentados no corpo e nas vozes de
As florestas vendidas à Su-
ram um ato político de ocupação outros redobra as energias e espe-
zano eram anteriormente da Vale.
simbólica da fazenda Monte Líba- ranças dos lutadores daquele bair-
Somam 84.500 hectares de terra,
no e de interrupção temporária da ro, e multiplica na consciência de
sendo 34.500 hectares plantados
BR 010. O ato tornou-se notícia outros uma luta que deve ser de
com eucaliptos. A implantação
nacional e facilitou a mobilização todos e todas.
de mais esta indústria de celulose
dos órgãos públicos e da fiscali- Um outro eixo de denúncia
tem como objetivo elevar a capa-
zação da área. Infelizmente, ainda e proposta articulada de alternati-
cidade de produção de celulose e
hoje em muitos casos o povo con- vas é a campanha “Justiça nos Tri-
papel, das atuais 4,3 milhões de
segue se fazer escutar pelo gover- lhos”, que tem em Açailândia uma
toneladas por ano até 7,2 milhões
no somente engrossando a voz. de suas bases e pontos de divulga-
de toneladas.
ção. A campanha visa desmasca-
Os investimentos da Suza-
e. A Suzano e o deser- rar a violência da companhia Vale
no podem chegar a US$ 700 mi-
to verde e seus impactos sócio-ambientais.
lhões entre 2008 e 2015 na forma-
Além disso, propõe mecanismos
No meio de todos esses ção florestal no Maranhão . São
concretos de repartição do lucro
conflitos sócio-ambientais, o que Luiz do Paraitinga (SP), Nazária
ao longo dos trilhos e articula as
os movimentos temiam se fez (PI), Santa Quitéria (MA), Euná-
vítimas da multinacional em nível
concreto: a Suzano chegou. A em- polis (BA): a lista de municípios
de Brasil e exterior. Nasceu no
presa logo alcançou certa fama na e territórios em conflito com a Su-
final de 2007 sob a coordenação
região. “No período de 05 a 31 de zano é grande. Inquieta imaginar
de Missionários Combonianos,
que talvez mais esse desafio re-

29
Fórum Carajás, Sociedade Maranhense de Direitos anos e junta lideranças populares do município.,
Humanos, Fórum Reage São Luís, Cáritas Mara- onde a construção da cidadania, do controle social e
nhão, Sindicato dos Ferroviários e CUT. A campa- de todos os mecanismos de participação acontecem
nha alcançou em breve tempo os atingidos pela Vale de forma interativa, mediante a pesquisa coletiva e
em MA, MG, PA, RJ, Peru, Argentina, Chile, Equa- a troca de saberes. Será desse curso e a partir dessa
dor, Moçambique e Canadá . rede que Açailândia terá novos conselheiros de di-
Ainda em Açailândia, em tempos de crise e reito, mais preparados/as e fortalecidos pelas alian-
desemprego, uma aliança entre movimentos sociais ças transversais que deverão se tecer nos próximos
permitiu a criação do “Movimento Popular em fa- meses.
vor da Justiça e da Dignidade Humana”. Trata-se de “Que desenvolvimento é esse?” - pergun-
uma rede de entidades, associações de moradores, tava o povo de Piquiá de Baixo com seus cartazes
sindicatos, comunidades cristãs em busca de enca- na manifestação em frente ao Fórum da Comarca
minhamentos locais para minimizar o impacto da de Açailândia. É a pergunta que ressoa ao longo de
crise e buscar alternativas e enriquecimentos para todo esse texto: qual é o mundo que sonhamos e que
o modelo produtivo de Açailândia, marcado pela gostaríamos de entregar para nossos filhos? E os
fragilidade e pouca diversificação. Esse movimento moradores, filhos primogênitos desse jovem muni-
organizou em maio de 2009 um grande seminário cípio de somente 26 anos, que mundo receberam no
sobre crise e desemprego. Um marco importante no começo da cidade? O que sobrou de tanta riqueza
município para provocar uma reflexão comum sobre natural? Em que direção queremos trilhar o tal de
temas tão delicados. ‘progresso’?
Último sinal de esperança e de organização Voltará o município a ser a “cidade do açaí”,
popular é a Rede de Cidadania. Ela existe há dois à sombra dos saudosos piquiás?

foto: Nils Vanderbolt

30
Referências
CARNEIRO, M e RAMALHO, R. A crise econô-
IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de mica mundial e seu impacto sobre as empresas de
Contas Nacionais, 2006 ferro-gusa: algumas informações sobre o desempe-
www.vienairon.com.br – Exportação anual de nho recente das empresas guseiras e o desemprego
no município de Açailândia. 2009.
500.000 ton de ferro gusa, com um preço antes da
crise de 750 $ por tonelada
Relatório Social Instituto Carvão Cidadão, 2005
Relatório de Perícia Ambiental apresentado à Se-
Relatório Social Instituto Carvão Cidadão, 2005 gunda Vara Judicial da Comarca de Açailândia, dr.
- http://www.carvaocidadao.org.br/ata/relatorio_so- Ulisses Brigatto Albino, Imperatriz 2007. Perícia re-
cial.htm alizada dia 05 de Dezembro de 2006

CARNEIRO, Marcelo Sampaio Crítica social e res- Estudo preliminar da situação ambiental da popu-
ponsabilização empresarial. Análise das estratégias lação de Piquiá, eng. Mariana de la Fuente Gómez,
para a legitimação da produção siderúrgica na Açailândia 2007
Amazônia Oriental, Cad. CRH v.21 n.53 Salvador
maio/ago. 2008, disponível em www.scielo.br Trabalho sim, Poluição não! - Carta aberta à cidade
de Açailândia e às autoridades sobre a nova aciaria
BRASIL. 1989. Secretaria de Planejamento da Pre- em construção no Piquiá - Paróquia São João Ba-
tista, Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Hu-
sidência da República. Programa Grande Carajás.
manos, Sindicato dos Metalúrgicos, Associação dos
Secretaria Executiva. Plano-diretor do Corredor da
Moradores de Piquiá, Centro Comunitário Frei Tito,
Estrada de Ferro Carajás. Brasília, NATRON. 536p
Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais,
Sintrasema, Sindimotaa, Associação Rádio Comu-
Ministério do Trabalho e Emprego/Cadastro Geral nitária Açailândia
de Empregados e Desempregados.
Parecer Técnico da Superintendência de Fiscaliza-
Procedimento n. 116/05 – Ministério Público do es- ção, Licenciamento e Defesa dos Recursos Naturais
tado do Maranhão da Secretaria Estadual de Meio Ambiente do Mara-
nhão - Antônio Cesar Carneiro de Souza e Cláudia
SOUZA, Emilene Leite. “De passagem”. Univer- Cristina Ewerton Dominice, abril de 2008
sidade Federal do Maranhão/UFMA Imperatriz
- CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS, SAÚDE E CARNEIRO, Denilton - Povos, comunidades tra-
TECNOLOGIA/CCSST 2009 dicionais, políticas étnicas e desenvolvimento sus-
tentável. http://www.ecodebate.com.br/2009/08/15/
fabrica-de-celulose-promovera-bota-fora-nas-regio-
MONTEIRO, Maurílio de Abreu . Siderurgia na
es-dos-cocais-e-tocantins-no-maranhao-artigo-de-
Amazônia Oriental brasileira e a pressão sobre a
denilton-santos-carneiro/. Capturado no dia 15 de
floresta primária. In: II Encontro da Associação agosto de 2009.
Nacional de Pós Graduação e Pesquisa em Am-
biente e Sociedade - ANPPAS, 2004, Indaiatuba-SP. Peça teatral “E ao pó voltaremos” - direção Xico
Anais do II Encontro da Associação Nacional de Pós Cruz – Açailândia 2009
Graduação e Pesquisa em Ambiente e Sociedade.
Indaiatuba : ANNPAS, 2004. v. 1. p. 1-19

31
Itupanema em meio ao projeto
Albras – Alunorte:
1
Gilvandro Ferreira Santa Brígida

A
literatura sobre os grandes projetos na Amazônia sinaliza sobre os passivos sociais e ambien-
tais. Os mais comuns são a pressão sobre os recursos naturais, o deslocamento de populações
consideradas tradicionais, o inchaço das cidades, a elevação do preço da terra e de aluguéis.
Assim o foi a experiência na comunidade conhecida como Itupanema, no município de Barcarena,
norte do Pará. O município abriga as principais indústrias da cadeia produtiva do alumínio do Brasil. O pre-
sente artigo tenta fazer o registro sobre o processo da presença das empresas Albrás e Alunorte, vinculadas
a Vale e a desagregação social e ambiental em Itupanema, numa peleja marcada pela desigualdade entre as
partes envolvidas.
O trabalho coletivo na terra é uma prática social desenvolvida secularmente pelos agricultores/ribei-
rinhos e extrativistas da Amazônia. Entre as particularidades tem-se a distribuição de tarefas por gêneros
ou por faixa etária. A reprodução das práticas é produto de socialização no meio familiar. A relação de
colaboração permite que os grupos familiares enfrentem as adversidades.
As famílias praticam a agricultura de subsistência, na qual o agricultor procura assegurar para sua

1 Sou bacharel e licenciado pleno em Ciências Sociais, com ênfase em Sociologia. UFPA.

32
família o alimento necessário. E só depois comercia- a pauperização imposta aos antigos moradores do
liza o que sobrou. Esse processo de comércio era re- espaço onde a fábrica se instalou.
alizado de vez em quando através da “marretagem ”.2 O problema da desapropriação volta à cena
O processo de urbanização no município co- nos anos 1990, com a instalação das empresas do
aduna-se com a chegada do projeto ALBRAS/ALU- projeto Caulim – Pará Pigmentos S/A e Rio Capim
NORTE, na década de 1980. As empresas integram Caulim S/A, também vinculada ao grupo Vale. Em
o portfólio da Vale. As radicais transformações con- 1993, a Companhia de Desenvolvimento Industrial
sistiram na expulsão de grupos familiares de seus do Pará (CDI) desapropriou famílias que moravam
sítios, na desagregação das famílias camponesas, na localidade de Ponta da Montanha. Os moradores
onde a terra perde a condição de fornecedor de meio do local, situado em frente ao rio Pará, foram trans-
de subsistência, para transformar-se em mercadoria. feridos para a área do Curuperé, situada nos limites
Tudo começou antes. Lá nos anos 1970. A da Vila do Co3nde. A comunidade da Montanha ce-
pressão sobre a terra e as riquezas vegetais e mine- deu lugar para a construção do terminal portuário de
rais, através dos grandes projetos, agrava os emba- exportação do caulim.
tes sociais e a agressão ao meio ambiente na região Esta ocupação causou profundas transforma-
amazônica. ções na estrutura produtiva, e no modo de vida da
Os grandes projetos constituem-se em prin- população residente nas áreas atingidas. E princi-
cipal instrumento da política desenvolvimentista palmente quando estas mudanças não cessaram por
concebida pelo governo militar de 1964. Tal política completo, pois a cada dia surgem novos desafios.
ressalta o potencial dos recursos naturais da região, Entre eles como as “comunidades” atingidas devem
em particular as riquezas minerais e a hidrográfica. criar novas estratégias de organização e de sobrevi-
Aos olhos dos estrategistas, a Amazônia não passava vência, diante da força do capital que se implanta na
de vazio demográfico. Indígenas, ribeirinhos, qui- Amazônia, em particular em Bacarena.
lombolas e tantas outras variações do campesinato Barcarena registra novas tensões entre mora-
local nunca existiam na cabeça dos militares. dores tradicionais e empresas do grande capital em
Os problemas ocasionados por esse mode- fase de instalação no município, como a refinaria
lo de desenvolvimento só serão medidos nos anos chamada Companhia de Alumina do Pará (CAP)4.
posteriores, a partir do deslocamento das famílias de O projeto adota um processo de expulsão mais so-
suas terras e convívio com questões até então total- fisticado e cruel do que há trinta anos. A instalação
mente desconhecidas. da CAP tem derrubado casas dos moradores locais.
Assim ficam impedidos de voltar. A expulsão dos
A luta pela terra: grandes corporações moradores assemelha-se a um regime de exceção.
versos comunidades tradicionais Há resistências, ainda que débeis. Mas, o
isolamento e as técnicas de terror promovidas pela
Nos anos 1980 instala-se em Barcarena o empresa acabam por fazer com que os moradores
complexo de alumínio ALBRAS/ ALUNORTE, deixem suas casas em troca de indenizações mise-
parte do programa grande Carajás, provocando a ráveis, que não garantem a compra de outro imóvel
desapropriação de aproximadamente quinhentas fa- com as mesmas características do anterior. O que
mílias. O modelo de projeto instalado em Barcarena assusta neste modelo é que tudo é feito com a coni-
não internaliza riqueza no local. Assim explicam os vência do estado, ou seja, institucionalizado. Como
tratados das academias. resultado deste modelo tem-se a pauperização cres-
A Associação dos Desapropriados de Barca- cente do trabalhador rural, embora havendo algumas
rena nasce anos mais tarde. Emerge pela necessi- exceções.
dade de fazer frente ao processo de expansão e de
desenvolvimento econômico das empresas e contra
3 Considerada conglomerado urbano de Barcarena, onde outras famí-
lias de antigos posseiros já habitavam.
4 O projeto é um consórcio da Vale (80%) com a empresa norueguesa
Norsk Hidro (20%) e deve produzir 1,9 milhão de tonelada/ano na
2 O processo consistia na mobilização de moradores para otimizar o primeira fase e 7,4 toneladas no apogeu da produção. U$$2,2 bilhões
transporte de mercadorias até Belém. devem ser investidos. A previsão é a produção se inicie em 2011.

33
O Município de Barcarena rindo das ocupações mais recentes, que surgiram em
função do projeto ALBRAS – ALUNORTE, como:
30 km separam o município de Barcarena de Laranjal, bairro Pioneiro bairro Novo e Romeu Tei-
Belém, em linha reta. Na verdade, encontra-se sepa- xeira (CHAGAS, 2002). Entretanto, não se pode
rado de Belém pelo rio Pará e pela ilha das Onças, deixar de frisar que a expansão de Vila de Itupane-
sem os quais poderia ser visualizado a partir de Be- ma, deu-se em função da implantação do projeto Al-
lém. O município está estruturado para efeito admi- brás e Alunorte.
nistrativo com a seguinte configuração geopolítica: A Vila de Itupanema tinha seus mais antigos
Barcarena, sede e Distrito de Murucupi – (Vila dos registros de moradores vinculados à Freguesia de
Cabanos, Vila do Conde, Vila de São Francisco, Vila Beja, ou São Miguel de Beja, não se sabe ao certo.
de Itupanema, Vila Nova e Vila do Laranjal). Segundo os moradores mais antigos a deno-
Segundo ROCQUE (1994), reza a tradição, minação “Itupanema” deriva do nome de uma praia,
que o nome “Barcarena” se originou do fato de ter cuja enseada chamava-se Panema. Na frente dessa
existido, naquela localidade, quando ainda era uma praia havia uma grande quantidade de pedras, que
Missão Gibirié, uma barca muito grande denomina- os índios e os moradores chamavam de “Itu” (que
da Arena. Apesar da deterioração da barca, as pes- em Tupi Guarani significa grande).
soas continuavam chamando aquela área de “Bar- Na época os pescadores e todos os navegan-
caarena”; simplificando, então, para a denominação tes que seguiam rumo a Belém, paravam na praia de
“Barcarena”. Esta denominação foi usada para bati- Panema, usando-a como abrigo, a fim de se protege-
zar o local que ainda existia em uma enseada pedre- rem dos temporais e marés fortes, além de reduzir o
gosa, coberta por uma grande casa chamada “Casa tempo e agilizar viagem. Os navegantes acostuma-
das Canoas”, do lado esquerdo da Matriz. ram-se a dizer: “vamos parar aqui na praia de Itu-
Sua elevação à categoria de “Vila” aconteceu panema”, a partir daí denominou-se a vila surgida
mediante a promulgação da Lei Estadual nº 94, de posteriormente, revela Odineide Valente,líder co-
10 de maio de 1897, ocorrendo sua instalação em 02 munitária.
de janeiro de 1898, conforme determinado no De- A origem de Itupanema, em si, não seria re-
creto nº 513, de 13 de dezembro de 1897. Somente levante, não fosse à insistência do mito de origem, a
em 1956 foi reconhecida sua composição territorial, demonstrar a existência de uma tradição, que tem o
formada por dois distritos: Barcarena (sede) e Muru- papel de legitimadora de direito a terra, em oposição
cupi, permanecendo esta configuração territorial até aos invasores recém-chegados.
os dias de hoje. A partir da década de 80 a população da Vila
de Itupanema cresceu, pois, à vila original foram
VILA DE ITUPANEMA E A ORGANIZA- agregados dois outros núcleos: Vila Nova e Vila
ÇÃO SOCIAL TRADICIONAL União. A primeira criada para abrigar as pessoas
que residiam nas terras onde foram instaladas as
A Vila de Itupanema está situada na região empresas Albrás e Alunorte. E posteriormente por
noroeste do município de Barcarena, à margem di- trabalhadores atraídos pelo projeto e, embora não
reita do rio Pará. A Vila corresponde a um peque- conseguindo se inserir neste, permaneceram nas
no núcleo urbano, servindo de área residencial de proximidades das fábricas.
população ocupada em atividades agrícolas, pesca O bairro de Vila Nova surgiu em 1982, quan-
e pequeno comércio. Uma pequena parcela destes do a ALBRAS reservou uma grande área para trans-
moradores trabalha nas empresas prestadoras de ser- ferir a população que residia nos sítios onde estão
viços para a ALBRAS – Alumínio Brasileiro S/A, e localizadas as instalações das fábricas e a zona por-
a ALUNORTE – Alumina do norte do Brasil entre tuária. Assim como a área do núcleo urbano, onde
outras. foram construídas as casas para os trabalhadores da
Itupanema constitui uma antiga ocupação, Albrás e Alunorte. A partir daí o bairro vem tendo
como a sede de Barcarena e a Vila do Conde. Dife- um crescimento totalmente desordenado, sem ne-

34
nhum planejamento por parte do poder público. O E constituem-se em bolsões de reserva de mão-de-
Centro Comunitário de Vila Nova ficou com a res- obra barata e disponível para qualquer serviço pou-
ponsabilidade de organizar o loteamento das pesso- co qualificado.
as que chegavam ao lugar. BECKER, B. (1991) destaca o papel des-
O bairro da Vila União é o mais extenso e o ta população flutuante, no sentido de viabilizar as
mais densamente ocupado. Na mesma proporção es- grandes obras, os grandes projetos. Entretanto, há
tão os problemas, em virtude do seu acelerado cres- outro lado da questão a ser ressaltada. Esta popu-
cimento, não há saneamento básico e infra-estrutura lação, que é atraída para área deste tipo, promove,
urbana. Este bairro se tornou uma grande área de também, um problema de natureza social pelo fato
ocupação, que foi muito combatida pelas empresas de não ser assimilada, em sua maior parte, nestes
Albrás e a Companhia de Desenvolvimento de Bar- empreendimentos. Na medida, também, em que as
carena (Codebar), que tentou de todas as maneiras atividades econômicas praticadas tradicionalmen-
evitar a ocupação, usando inclusive a força policial. te nesta área (extrativismo vegetal, pesca, pequena
Vários líderes comunitários foram presos durante a agricultura) estão em crise, não podendo absorver
ocupação, mas as empresas não conseguiram evitar outras pessoas.
o assentamento. O que vemos hoje na Vila União é o Boa parte dos moradores mais antigos de
retrato do descaso de uma administração avessa aos Vila de Itupanema possuía sítios nas áreas ocupadas
interesses da população. pela ALBRAS e pela ALUNORTE. A CODEBAR e
A Vila de Itupanema, durante muito tempo, a Companhia de Desenvolvimento Industrial (CDI)
teve um povoamento muito lento, constituindo-se, desapropriaram os terrenos localizados à beira do
portanto, em um pequeno vilarejo de sitiantes rurais. rio Pará. Nestes sítios eles trabalhavam nas roças,
Na década de 80, seu crescimento era ainda relativa- nas quais plantavam mandioca, milho, arroz, feijão,
mente baixo. O aumento da população, assim como melancia, amendoim, como também pescavam, ca-
a expansão territorial acontece a partir do início da çavam e coletavam muitas frutas. Entre elas: pupu-
década de 90. Momento em que a vila recebe muitas nha, bacuri, uxi, cupuaçu, biriba, piquiá, entre ou-
pessoas excluídas do Projeto ALBRAS, e também tros, e ainda extraíam carvão.
trabalhadores oriundos da construção da Alunorte, Estes moradores se referem com muito pe-
que ajudam a fundar inúmeras áreas periféricas em sar a estas perdas, pois não perderam simplesmente
Itupanema. seus sítios, mas, como dizem na região, formas de
Após o assentamento das pessoas interessa- sobrevivência. Pois de lá tinham como adquirir ali-
das, e com pouco tempo novas ocupações voltaram mentos básicos importantes, sem estas alternativas,
a acontecer. Foram impulsionadas pela migração de passaram a comprar estes produtos ou consumi-los
mineiros, maranhenses, gaúchos, entre outros. Para em menor quantidade, e até deixar de consumir os
os antigos moradores de Itupanema é clara a aversão de menor importância na dieta alimentar. Tem-se as-
aos trabalhadores oriundos de outros estados, trata- sim mais uma questão, a segurança alimentar.
dos como “os de fora”. Eles são responsabilizados Os moradores destas áreas ocupadas pela AL-
pelos problemas provocados no lugar após a implan- BRAS – ALUNORTE moveram uma ação na justi-
tação das Empresas. Entre eles: roubo, prostituição, ça através da Associação em Defesa de Barcarena
formação de gangues, e.t.c, assemelhando-se à situ- (ADEBAR) exigindo indenizações pelos seus sítios,
ação relatada por Norbert Elias (op. cit.). já que apenas uma parte da população recebeu inde-
Os movimentos migratórios em Itupanema nização. Esta ação se estende há quase trinta anos,
refletem, como em toda a Amazônia, o que ocorre sem resultado favorável para os moradores.
no seu espaço, como reflexo do processo de ocupa- Segundo alguns dos antigos moradores, após
ção territorial e de mobilização da força de trabalho. a instalação da ALBRAS e da ALUNORTE; ocor-
Esta força de trabalho muitas vezes sem a qualifi- reu uma diminuição significativa na quantidade e
cação exigida para trabalhar diretamente nas em- tamanho dos peixes, que costumavam pescar nos
presas, acaba ficando em áreas próximas ao projeto. “pesqueiros” (locais onde os peixes se concentra-

35
vam), e que também, são encontrados, com freqüên- para o desenvolvimento da região, que deve ser re-
cia, peixes mortos na orla, mais próximo ao terreno movido em nome do progresso.
daquelas empresas. Hoje na Vila de Itupanema o passado é repre-
Entre os anos de 2003 a 2008 aconteceram sentado pela igreja católica que esta localizada na
vários acidentes ambientais nas praias de Itupane- Praça Matriz, a escola Presidente Dutra que data de
ma, com o registro da mortandade de peixes. Fato 1950 e o cemitério da cidade. Fora isso, tudo mu-
registrado nos jornais de grande circulação do Esta- dou, o lugar calmo e bucólico está presente apenas
do, e também através de informações do Sindicato na memória dos antigos moradores.
dos Químicos de Barcarena. A entidade representa A realidade de Itupanema é apresentada de
os trabalhadores da Alunorte, empresa responsável forma mais crua pelos filhos dos agricultores, que no
por algumas das contaminações. momento das desapropriações eram crianças. Hoje,
O processo de redefinição do território no adultos, não encontram terra suficiente para plantar.
município de Barcarena tem inúmeras implicações, Por isso não podem ser agricultores, nem tão pouco
a exemplo do que ocorreu para a construção do nú- pescadores, já que a pesca ficou inviável com a cria-
cleo urbano ou Vila dos Cabanos. A expulsão das ção do Porto da Vila do Conde e as contaminações
populações tradicionais para a implantação do pro- ambientais ocorridas no rio Pará. Por outro lado,
cesso industrial inviabilizou a agricultura familiar. também não tiveram a oportunidade de estudar para
A pequena dimensão dos lotes na Vila Nova, local adquirir uma profissão. A geração de jovens de hoje
de reassentamento dos moradores, onde atualmen- não possui, a princípio, as condições adequadas para
te se encontra a área do projeto Albrás/Alunorte é pleitear um emprego na região. Restou para estas
revelador sobre assunto. As áreas foram entregues duas gerações o direito de assistir ao crescimento es-
totalmente desmatadas, sem as plantas e árvores fru- pantoso das empresas ALBRAS/ALUNORTE e per-
tíferas da região e o solo impróprio para o plantio. ceber o quanto o sonho de trabalhar ficou distante.
Atualmente apenas uma pequena parcela da Durante estes longos anos de projeto não foi
população de Itupanema se dedica às atividades apresentado qualquer projeto de inclusão para os
agrícolas, embora morando na área urbana. Exercem jovens de Itupanema. Percebemos o crescimento
um misto de atividades, pelo que pode ser observa- da violência, prostituição infantil, o alcoolismo e
do, trabalhando em pequenas roças e também prati- a mendicância no município, são problemas tipica-
cando atividade de natureza urbana, como pequenas mente urbanos.
vendas, e fazendo “bicos” diversos como estratégia Do outro lado, as empresas da Vale apresen-
de sobrevivência. Isso mostra o quanto é importante tam os melhores índices de crescimento econômico
o apego a terra. Mesmo com todas as intervenções de sua história, principalmente as apresentadas nes-
praticadas, a pequena agricultura, embora de forma te artigo. Hoje as empresas da área de alumínio são
restrita ainda resiste. as “meninas de ouro” da Vale, mas as comunidades,
A pesca artesanal também é considerada uma em nenhum momento são lembradas. As empresas
atividade fundamental para a sobrevivência da po- esquecem a divida social, que em três décadas de
pulação local. Existem poucos pescadores, em torno projeto em solo Barcarenense se amplifica. Ao lon-
de trinta famílias que resistem nesta atividade. Como go dos anos de exploração de Alumínio e Alumina
já citado, a quantidade de peixe sofreu redução em na região, o que tem ficado é o rejeito enterrado na
função das contaminações e o constante trânsito de terra que alimentava os filhos e filhas de Itupanema.
navios que trazem e levam matéria prima para as Memória e Desencantamento
empresas. A história oral pode fornecer elementos difí-
Na visão capitalista trazida junto com as em- ceis de serem encontrados em documentos ou livros.
presas, vida rural é parte do passado, e por isso há Pode fornecer informações novas, bem como a cha-
uma necessidade urgente em urbanizar Barcarena. A ve explicativa de fatos. Apesar dos depoimentos que
população local, no planejamento dos grandes pro- envolvem a memória, se constituírem em história
jetos, aparece como um entrave, como um obstáculo construída a posteriori, contém marcos temporais

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pessoais e coletivos que permitem contar a história para ti. Foi ai que eles foram na casa do Dr. Cé-
de outra maneira. Nos relatos, encontramos certa sar...
idealização do passado e uma construção dramáti- Gilvandro -. César Bentes?
ca do passado mais recente, no entanto, trabalhar os Eurico - Sim, eu fui também. Olha, viram os pés de
depoimentos relacionalmente (BOURDIEU, 1989) planta, os seis fornos, duas tarefas de roça, uma casa
permite evitar a naturalização dos depoimentos. de farinha e a casa. Ele disse : vamos pagar só o
Memória de Itupanema - a linha da história forno, com a casa da farinha e as roças. O sítio com
através do olhar de um pescador as casas fica pra depois. Vamos dar 20.000. Eu disse:
O depoimento do pescador aposentado Euri- não, 60. Aí fiquei com 60. Fiquei com dinheiro.
co, que mora na região desde 1928, ajuda a elucidar Eles primeiro davam cheque. Aí peguei os 60, 20 e
o processo de redefinição da realidade de Itupanema. depois 40. Aí não pagaram. Fui chamado em Barca-
O pescador rememora que em 1940 o número de rena. Não veio o da casa, só o do forno com a roça
famílias era pequeno, a iluminação garantida através e a casa de farinha. Tem um dinheiro para a gente lá.
Mas nunca mais veio.
do querosene, as casas cobertas de palha e o lazer vi-
nha de bandas do vizinho município de Abaetetuba. Gilvandro - Vocês entraram na justiça?
Aqui o pescado era farto, não tinha bandida- Eurico - Foi, o advogado que botou, mas está lá em
gem. Cada um tinha a sua roça, seu forno de farinha, Brasília... O padre está no meio, também.
lembra Eurico. Conforme o pescador, o quadro co- Gilvandro - Qual padre?
meçou a ser alterado a partir da década de 1950. E Eurico - Eu me esqueço o nome do padre. Acho
se agravou com a instalação das empresas da Vale. que é o padre Primo.
Sobre a redução do peixe pondera que: “a Alunorte Gilvandro - Na época ele estava aqui em Itupane-
despeja aquele licor dela, essa soda cáustica, morre ma?
muito peixe. Morreu muito. Hoje tem gente aqui Eurico - É, na época ele estava aqui.
que passa até fome. Tem apenas alguns pés de man- Gilvandro - A igreja tinha terra, também?
ga”. As transformações se aceleram em 1985, subli- Eurico - Ele estava a favor da gente.
nha o pescador. Gilvandro - Ah, ele ajudou.
Além do processo de reconfiguração do ter- Gilvandro - Como foi essa organização de vocês
ritório da região, Eurico salienta o papel coercitivopara entrar na justiça contra a Albras?
da empresa. Segundo Eurico, a Albras tem mandado Eurico - Eles vieram de Belém, o meu concunhado
até prender quem entra em áreas controladas pela tinha também um terreno, deu cincoenta, encheu o
empresa e proibir a produção de carvão: centro paroquial lá de Barcarena. Eles falaram isso
custa muito a justiça talvez uns três ou quatro anos,
Gilvandro - Por que as empresas da Vale proibiram já tem mais de 20 anos e nada. Este dinheiro esta lá
de fazer carvão? em Brasília.
Eurico - Por que é tudo dela isso aí. Enganaram o Gilvandro - Quantas família na sua época foram
pessoal que está até para Brasília. São 580 famílias desapropriada?
que estão na justiça O dinheiro está lá nós já demos Eurico - Quinhentas e oitenta, agora já botaram oi-
50 e mais 50 para o advogado, já está correndo há tocentas, novecentas, mais é mentira é somente qui-
mais de dez anos. E nada foi resolvido. Teve gen- nhentas e oitenta famílias.
te que pegou 20 cruzeiros de indenização, o que dá Gilvandro - Quinhentas e oitenta famílias foram de-
isso? sapropriadas aqui em Itupanema?
Gilvandro - Mas o que foi esses 20 cruzeiros? Para Eurico - Praticamente sem nada, pois deram uma
que? besteirazinha, compraram terreno ai na vila nova
Eurico - para pagar a casa e o terreno. Nós lá em onde estão morando, outros estão lá pro c.d.i, lá pra
cima trabalhávamos com o japonês, Tako Yamada. colônia.
Ele disse: olha eu não quero. Eu dou 800. O terreno Gilvandro - A Vila nova eram pessoas que mora-
é grande, Mede 100 por 200 metros que eu vejo vam lá no núcleo urbano?

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Eurico - Não eram do Murucupi, do centro que cha- Eurico - Ah, é muito difícil com a Alunorte. Disse,
mavam assim. olha pra Alunorte e a Albrás dez ou quinze barcos
Gilvandro - A onde é a Albras e a Alunorte hoje? com redes é o mesmo que dar um doce pra uma
Eurico - Não na Albrás e Alunorte era o pessoal do criança. Não é nada.
Conde, era muita gente do Conde todinho era a tur- - eu vou lhe explicar logo aqui na Albrás e na Alu-
ma que morava aqui pra trás. norte, uma barcada desses com alumínio, paga tudo
Gilvandro - Onde foram desapropriadas as terras? e ainda sobra. Dá muito resultado isso.
Eurico – Foi. Gilvandro - Quem falou foi o Funcionário da Alu-
Gilvandro - E ai formou a vila nova? norte?
Eurico - Formou a vila nova, e aqui pra trás foi a Code- Eurico - Sim, ele disse vamos ver como é. Ficaram
bar que desapropriou. Depois invadiram. de vir e não vieram mais.
Gilvandro - O Jardim cabano era terras de vocês? Gilvandro - Essa reunião foi com os pescadores?
Eurico - É todinho invadido. Eurico - Foi só com os pescadores.
Gilvandro - Eram terras dos moradores? Gilvandro - Existe colônia dos pescadores em Itu-
Eurico - Pra cá os Valentes, pra lá era de outros mo- panema?
radores. Eurico - Não, tem em Barcarena sede tinha um ra-
Gilvandro - Itupanema basicamente era da família paz aqui. Mas, só fazia cadastrar os pescadores.
Valente, ou tinham outras famílias? Gilvandro - Quem é o presidente da comunidade?
Eurico - Aqui atrás tinha a família Valente, ali em Eurico - Era o seu Morais e o Pancho. Agora eles
baixo os Cruz. Não era muita gente. Era bem dizer estão fora porque vai ter eleição que é pra ver quem
mais ou menos uns quinzes, uns quinze, com os fi- é fica de novo.
lhos era mais. Gilvandro - Existe outro centro comunitário?
Gilvandro - Não se faz mais farinha, carvão, não se Eurico - Tem o outro centro da Vila Nova.
tem mais terra? Gilvandro - E como é a relação de Itupanema com
Eurico - Tem, mas eles tomaram. os moradores de Vila Nova? Como é que vocês se
Gilvandro - Tem terra, mas não é mais dos mora- entendem?
dores? Eurico - Isso aí é tudo Itupanema. Lá só botaram o
Eurico - Ficaram com as terras. Nós tivemos duas apelido de Vila Nova, mas é tudo Itupanema. Tem
audiências. Uma lá na câmara que foi o pessoal da uma igreja lá. Uma festa do livramento acontece em
Alunorte, deixa estar por ali falou e tal. Ai do Muru- maio. A nossa é em setembro, Nossa Senhora das
cupí ganharam. Estão ganhando 15 cestas básicas. Dores é a padroeira.
Gilvandro - Da época da contaminação? Gilvandro - E a Vila União?
Eurico - São agora os daqui de fora não, veio o pes- Eurico - Vila União é pra trás da invasão
soal da Alunorte ai. Veio pessoal da ação social, as Gilvandro - Invasão?
duas secretárias. A Michelle, que é a presidente fi- Eurico - É invasão. O Moraes falou se ganhasse a
cou de vir mais não veio, pois vinha o presidente da eleição, ele ia fazer um troço muito bacana. Ele me
colônia. disse: olhe seu Eurico eu vou fazer minha prestação
Gilvandro - Mais pra falar com os pescadores? de conta aqui então eu falei: vamos ver se ele vai
Eurico - É... que elas ainda disseram: cesta básica fazer mesmo. Entra prefeito sai prefeito aqui não faz
era bom. Amanhã a gente vem aqui pra conversar. nadinha. O Laurival Cunha só botou água.
Eu disse não, é o seguinte: por que isso aí, vai ser Gilvandro - As Empresas desenvolvem algum tra-
todo o tempo, vai chegar um tempo de a gente pisar balho na comunidade?
na praia e encher o pé todo de piche. Vai ter mais Eurico - Se fez alguma coisa foi a Albrás.
fábrica aqui, já estão fazendo outra pra bando de Gilvandro - O que ela fez?
Conde de novo. Eurico - Há... isso aqui, né?
Gilvandro - Como é a situação dos pescadores Gilvandro - Bloquete?
hoje? Eurico - Bloquete. Ajeitou a praça. Em Vila Nova

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fez uma, como é que chama essa coisa de bater reram, outros já trabalham em outro serviço.
bola? Gilvandro - Trabalham onde?
Gilvandro - Quadra. Eurico - Fazem bico por aí e vão vivendo a vida.
Eurico - E a Igreja lá que eles ajudaram a forrar o Gilvandro - Bico?
telhado ficou bonito. Nós não temos ajuda de nada, Eurico - Trabalho de carpinteiro e pedreiro. Não
o prefeito não ajuda em nada. tem emprego pra eles.
Gilvandro - O senhor passou toda estas mudanças. Gilvandro - Mudaram de profissão para poder so-
Depois que vieram as empresas, a vida aqui do povo breviver?
de Itupenema, como ficou? Eurico - É, agora os quinze que tem aí tem que ser
Eurico - Em parte piorou. O pessoal daqui não tem da pesca mesmo.
trabalho. Quando aparece ele pedem dois, três anos Gilvandro - Eles continuam pescando?
de experiência. Daqui não tem quatro pessoas na Al- Eurico - Sim.
brás. Gilvandro - Eles possuem barco?
Gilvandro - Aqui de Itupanema? Eurico - Não. Só canoa pequena.
Eurico - Da Vila Nova parece que tem dois. Daqui Gilvandro - Canoa pequena?
agora não tem nenhum. Eurico - Arranjam normalmente da bóia. Então,
Gilvandro - Tem muito jovem aqui na idade de tra- esse da Alunorte disse: Olha o barco servia pra vo-
balhar? cês. Era bom o barco porque daria pra pegar peixe
Eurico - Tem. O que não tem é emprego. mar afora.
Gilvandro - Não tem emprego? Gilvandro - Pra poder pegar peixe maior, seu Euri-
Eurico - Se você vai numa firma atrás de emprego, co, tem que ter um barco maior?
eles mandam para o Serviço Nacional de Emprego Eurico - Um barco pelo menos para duas toneladas.
(SINE). Lá eles distribuem senhas. E mandam voltar Gilvandro - Para poder ir mais fora?
no outro dia. Lá no SINE eles distribuem sopa para Eurico - Sim, para poder ir lá pra baixo.
as pessoas desempregadas. Tem gente que vai só pra Gilvandro - Porque tem que ir mais fora?
beber aquela sopa e volta. Eurico - Porque não tem peixe aqui na beira?
Gilvandro - Há muito desemprego aqui em Itupa- Gilvandro - Não tem mais peixe?
nema? Eurico - É Pra baixo mesmo, daqui mais duas horas
Eurico - Muito desemprego. Principalmente o pes- de viagem. Lá pra baixo. Pra gente topar com peixe.
soal que mora na beirada que vive da pesca. O pre- Aqui perto não tem mais. Tem besteira de peixe.
feito podia nos ajudar. Gilvandro - Antes do projeto Albrás/ Alunorte dava
Gilvandro - Como seu Eurico? muito peixe aqui em Itupanema?
Eurico - Assim, com uma cesta básica para as famí- Eurico - Dava muito... deixa eu ver... Faz trinta
lias. Eu não. Eu e a minha mulher já estamos apo- anos. Foi na década de 70. Tinha dia de 18 geleiras
sentados pela pesca. Hoje tem gente passando fome na boca do arrozal. Enchia duas, três, quatro e ia
aqui. embora.
Gilvandro - Quantos pescadores existem ainda aqui Gilvandro - Pra onde seu Eurico?
em Itupanema? Eurico - Tudo pra Belém. Gente de lá do Pacoval.
Eurico - Quinze. Gente de Soure, Vigia, Icoaraci, Mosqueiro, Marudá
Gilvandro - Quinze pescadores ou quinze famí- e até de Bragança. Tudo pescava nesta área. Tinha
lias? muito peixe aqui.
Eurico - Só quinze pessoas. Gilvandro - Qual o peixe que dava?
Gilvandro - Só quinze que pescam, e os outros? Eurico - Piramutaba. Muita Piramutaba. Dava Piraí,
Eurico - Temos pouco pescador aqui. peixe pra 80, quilos 60. E começou tudo.
Gilvandro - Mais antigamente tinha muito pesca- Gilvandro - Começou o que?
dor? Eurico - As Empresas... Sumiu o peixe, de uma hora
Eurico - Tinha um bocado de pescador. Uns já mor- pra outra. Sumiu pouquinho, a Piaba não veio mais.

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Gilvandro - Dava muita Piaba? Eurico - Não deu certo. Não fizeram a caixa d’agua.
Gilvandro - O senhor que em sua Itupanema pre- Só as tubulações. Enganaram a gente.
senciou fartura depois viu também o sumiço dos Gilvandro - Tem água em Itupanema?
peixes. O que o senhor acha que poderia resolver Eurico - Tem, tem bastante água. Lá é da Compa-
este problema aqui dos pescadores e suas famílias? nhia de Saneamento do Pará (Cosanpa).
Senhor falou que as empresas vão permanecer em Gilvandro - Quer dizer que lá já foi a prefeitura que
Barcarena? fez no caso e não dá água?
Eurico - Sim daí pra frente não vai diminuir mais não. Eurico - Não. É da Cosanpa. Vem direto pra lá
Gilvandro - O que o senhor acha que pode resolver Gilvandro - Funciona o abastecimento?
a vida desses trabalhadores que estão aí sofrendo Eurico - Agora aqui é de poço. Nós pagamos
por conta da falta do peixe? R$5,00 para o presidente da comunidade. Agora lá
Eurico - Uma coisa eu disse no dia da reunião que na Vila Nova eles pagam R$7,50 no correio para a
fizeram com a Alunorte. O barco era bom. E depois Cosanpa.
do barco era fazer um cadastro dos quinze pesca- Gilvandro - E os jovens hoje, o senhor tem filhos?
dores para receber um salário mínimo pra ajudar as Eurico - Os meus filhos já têm famílias.
famílias. Gilvandro - Como é que você vê os jovens aqui em
Gilvandro - Melhoraria a vida deles? Itupanema sem essa oferta de emprego?
Eurico - É. Cadastrava os quinze pescadores que Eurico - Já tem muito molecote. Olha outra coisa
tem aí pra pegar aquele salário mínimo todo mês, se que vou dizer os meninos daqui com dez, doze anos
não os barcos. tinham seus fornos, seu carvão, eles pescavam, fa-
Gilvandro - O senhor acha que os barcos poderiam ziam roças e ajudavam muito os pais. Depois que
ser comprados pelas empresas? Albrás veio. Veio maranhense, piauiense, vem de
Eurico - Sim, porque isso cada vez mais vai ficar tudo e a maconha veio no meio. Muitos desses é da
pior. maconha.
Gilvandro - O senhor costuma conversar com os Gilvandro - Muita droga?
outros pescadores ? Eurico - Gangue no meio. São poucas as famílias
Eurico - Sim. que tem filhos legais. Alguns estudam, quando tem
Gilvandro - Tem acontecido contaminação aqui? uma folga metem um pererê.
Eurico - Teve umas duas vezes no tempo do inver- Gilvandro - O que o senhor acha que seria necessá-
no. Ali tem uma “baciona” , que tem o licor. Vem a rio para melhorar a vida desses jovens?
bauxita bota soda caustica e aí vasa pro rio. Mata o Eurico – Olha, eles botaram karatê pra luta. Tinham
peixe. É tui, é piabinha, doradinha, pescada, arraia que botar era uma oficina
tudo. Deu até na televisão. Gilvandro - Oficina?
Gilvandro - Ocorreram outras contaminações? Eurico - Uma oficina para aprender negócio de mó-
Eurico - A primeira vez foi uma balsa que foi pro veis. Uma escola pra aprender mecânica. Essas coi-
fundo. Não sei quantos litros de óleo que derramou sas assim seria muito bom.
no rio. Apareceu também na televisão. Eles deram Gilvandro - Profissionalizante?
quatrocentos e poucos mil. A presidente da comuni- Eurico - Seria bom para os meninos. Eles pegavam
dade foi esperta. Ela disse o seguinte: nós estamos gosto e iam trabalhar.
precisando de água em Itupanema. Eles deram em Gilvandro - Nunca aconteceu nem um curso profis-
serviço. sionalizante aqui?
Gilvandro - Não indenizaram os pescadores? Eurico - Nada. Um tempo que apareceu para ele-
Eurico - Esse dinheiro era pra dar ao menos 1000 tricista e encanador. Alguns jovens daqui fizeram e
para cada um, e ficasse com o resto. Eles fizeram o pegaram emprego. O menino, o filho do meu com-
serviço na Vila Nova que não prestou. padre Vanildo é eletricista. O Elizeu é eletricista.
Gilvandro - Eles fizeram a caixa d’água e não deu Ainda tem mais quatro ou cinco eletricistas e alguns
certo? encanadores. Os cursos deviam acontecer sempre.

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Gilvandro - Essas pessoas de fora são mais ou me- Eurico - Para Vila Nova, não só as pessoas que tava
nos de qual estado? daí mesmo. O de lá de onde era Alunorte/Albrás fo-
Eurico - Piauí, Maranhão, Parnaíba e Rio Grande ram tudo para Bacuri, Colônia Nova, CDI, Massara-
do Norte. pó, e agora criam peixes. Ta bom lá pra eles. Falei
Gilvandro - E como vocês se relacionam com as com uma comadre... Ah compadre, graças a Deus.
pessoas de fora? A Rio Capim. Para subir em cima do terreno deles
Eurico - Agente se dá. Conversa com eles. São ba- pagaram 40 mil, e ainda deram um lugar para eles.
canas. O pessoal tem cooperativa para lá: maracujá. Agora
Gilvandro - O senhor falou em sítios, como eram peixe. Vão fazer gaiola para criar peixe.
esses sítios? Gilvandro - Aqui em Itupanema, Sr. Eurico, tinha
Eurico - Sítio é quando tem Açaizeiro, Mangueira, condição de fazer esse trabalho, tipo cooperativa?
Abacabeira. Eurico - Aqui não adianta mais.
Gilvandro - Mas era vocês que plantavam mesmo? Gilvandro – Por quê?
Eurico - Agente tinha sítios plantados. A Albrás to- Eurico - Terra ta tudo tomado. Olha, aqui para baixo
mou conta de tudo. tem. Mais ou menos 4 km. Daqui até no Caripi a
Gilvandro - Vocês vendiam pra quem? Albrás não deixa tirar nem uma vara. Não tem nin-
Eurico - Vendia pro marreteiro, que levava pra Be- guém aí. Nem um morador.
lém. Gilvandro - Mas porque, o que ela alega?
Gilvandro - E dava algum dinheiro? Eurico - Porque é dela.
Eurico - Dava. Deus o livre. Esse que veio aqui ago- Gilvandro - Mas ela faz algum trabalho?
ra o compadre Bené dava era duas viagem por sema- Eurico - Meio Ambiente. Não pode derrubar. Não
na. Ele ia cheio de pupunha, uxi, abacate, cupuaçu. pode morar. Lugar até pra lá que já é CODEBAR a
Itupanema era o 1° produtor de cupuaçu daqui. pessoa pode até entrar, fazer uma casinha. Mas aqui
Gilvandro - Era mesmo? não. Deus me livre. E o pescador que fez lá uma
Eurico - Era sim, laranja dava muito, acabou tudo. casa, pescava camarão. Há muitos anos lá. Chegou
Eu me sinto meio triste. Tanta gente passando fome a Albrás. Tira sua casa daí, que não pode. Deram
aí. Não tem nada. Era muito farto aqui o que estra- dinheiro para ele, comprou telha para ele e tábua.
gou foi isso aí. Fez a casinha dele. Ele vendeu, foi embora. Aí um
Gilvandro - As empresas? rapazinho fez uma puxada na praia. Foram lá. Quei-
Eurico - É lá no Conde tá tudo seco. O menino dis- maram a barraca dele. E ele era pescador.
se: a minha mãe vem morar pra cá, o vento joga pra Gilvandro - Mas quem queimou a barraca dele?
lá todinho a fumaça das empresas. Os açaizeiros tão Eurico - O pessoal da Albrás
todo vermelho na beirada. Olha não era tão calor Gilvandro - Que ano foi isso?
agora é mais calor que de antigamente porque a po- Eurico - Está fazendo uns cinco anos.
luição sobe se pega com o sol e dispara muito calor. Gilvandro - E era pescador aqui de Itupanema?
Gilvandro - O senhor se sente muito triste por Eurico - Filho da Ilha. Mas casou com uma mulher
tudo? daqui, que a mulher ficou até aí. Não pode. Quando
Eurico - É porque tem gente que não tinha nenhum chegou uns dias aí estava queimada a casa. Era uma
ganho e ia pra fora pegar um peixe. Dez quilos de pena. Era uma puxada de palha.
pescada eu pegava de linha de mão. Se eu botasse a O depoimento de “Seu” Eurico é de grande
rede era de vinte quilos. Agora pega um quilo, dois riqueza e mostra como os moradores de Itupanema
é triste mesmo. Não tem fruta pra vender. Tem que vivenciaram o processo de desapropriação, implan-
comprar a farinha. Tem que comprar o carvão. tação e operação das fábricas. Alguns dos muitos
Gilvandro - O sr. estava falando sr. Eurico das pes- pontos levantados são dignos de nota e serão co-
soas que foram remanejadas do Conde e das pesso- mentados a seguir.
as que moravam aqui.Eles vieram pra cá, para Vila A memória permite a reconstrução de paisa-
Nova? gens perdidas. “Seu” Eurico descreve vividamente

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as árvores, os botecos, os lampiões, as casas de pa- da poluição. Essa é apropriada e descrita segundo
lha e a banda que alegrava as festas. Talvez não haja uma lógica nativa baseada nas relações com a natu-
qualquer imagem desta paisagem, mas a descrição reza, mas também é o instrumento de reivindicação.
de “Seu” Eurico permite a reconstrução da paisa- A ideia da compensação dos danos perpassa as rela-
gem. ções com a empresa. A poluição coloca a empresa
Nota-se o interlocutor trabalha como é fre- em dívida, por isso podem ser cobrados desde os
quente encontrarmos nos depoimentos de pessoas barcos ao salário mínimo, à infraestrutura urbana ou
que vivenciaram grandes perturbações, uma cons- o reparo da igreja.
trução feita de oposições, marcada pela temporali- Por outro lado, a empresa manipula as obras,
dade de um evento: a chegada das Fábricas. Assim, disputando espaço de poder com a Prefeitura do
antes, a natureza distribuía copiosamente seus frutos Município. A implantação das indústrias de alumina
e o peixe abundava nos rios. Um passado que, por e alumínio não atendeu a expectativa de desenvol-
melhor que tenha sido, é vivido de forma idealizada. vimento da grande maioria da população de Barca-
Por outro lado, o depois fica imerso na tragédia e é rena. Pois esses projetos fizeram uma opção por um
marcado pela falta, pelo bem limitado, pela fome. modelo fundamentado nos princípios capitalistas e
A fome parece ser a categoria crítica definidora do privilegiaram alguns grupos econômicos, em detri-
antes e do depois. mento da agricultura familiar tradicionalmente utili-
Outra categoria associada ao depois é o “en- zado na região.
gano”. As empresas enganam, enquanto que o antes Estes agricultores receberam pouco apoio,
era marcado pela confiança e pela solidariedade. O uma vez que nenhuma política foi criada para mini-
evento das desapropriações - que mais foram expro- mizar os impactos provocados pelo modelo de pro-
priações ou expulsões - é o marco temporal central e dução trazido para o município, constatando que a
o seu promotor lembrado por muitos pelo nome. agricultura familiar sempre ocupou um lugar secun-
A construção mais reveladora se dá em torno dário na sociedade brasileira (Wanderley, 1996).

42
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lém, UFPA, 2002. TUAN, Yu- Fu, Topofilia: um estudo da percepção,
atitudes e valores do meio-ambiente. Tradução Lí-
__________ (Org). O cerco está se fechando: O Im- via de Oliveira. São Paulo, Difel, 1980.

43
Energia limpa na ponta e desgraça na
fonte, resultado de mega hidrelétricas na
Amazônia

PE. Edilberto Sena1

O consumismo capitalista, tanto nacional com internacional, olha a Amazônia com olhos de cifrão,
eldorado, lucro, mesmo que para isso aconteça o saque, a destruição e os impactos sociais e ambientais.
Como o alarme mundial, por causa do aquecimento climático, se intensificou nos últimos 20 anos: o sis-
tema fantasiou o chamado desenvolvimento sustentável para continuar o saque do eldorado amazônico. A
partir do ano 2.000 o saque se intensificou, mineradoras, agro negócio, madeireiras, fazendas de gado e
também mais recente, as obras do tal Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC.

1 Rádio Rural de Santarém e Frente em defesa da Amazônia, setembro de 2009.

44
Como entender o PAC do Banco Inter americano de Desen- balhando no programa de cinco
governo federal, num momento volvimento, o BID. Tal plano tem hidrelétricas no Tapajós/Jaman-
histórico em que se discute os o objetivo de interligar os países xim há mais de 10 anos, silen-
efeitos das mudança climáticas da América do Sul desde o oce- ciosamente e sem dialogar com
no planeta e a Amazônia é um dos ano Atlântico ao Pacífico, atra- as populações ribeirinhas e da re-
pontos chaves para esse controle? vés de corredores de circulação gião do Baixo Amazonas que será
Será ele o prosseguimento do an- de transportes de produtos ainda toda impactada pelas obras fara-
terior “Avança Brasil” do gover- abundantes neste continente e an- ônicas. Apenas nos dois últimos
no FHC? E se for, o que parece, siosamente procurados pelos paí- anos, alguns grupos do movimen-
o que estará por trás desses pro- ses do G-8 e os emergentes que to popular organizado descobri-
gramas megalomaníacos, mesmo estão crescendo, apesar da crise ram que a coisa era urgente para o
quando se fala em defesa da Ama- econômica mundial. Ministério das Minas e Energia e
zônia, controle do desmatamento É neste contexto que se a Eletronorte. Os estudos já esta-
e coisas parecidas? deve compreender os grandes vam bem adiantados e nunca eles
Como não há transparência projetos do PAC. Entre outros, chamaram a sociedade regional
da parte das autoridades federais, cinco hidrelétricas só na bacia do e menos ainda os moradores, os
é preciso se buscar causas que rio Tapajós, num total de cerca indígenas e os responsáveis pelas
são camufladas por presentinhos de 15 mil mega wattz de energia, áreas de conservação que serão
amansadores da população regio- que o presidente da república cos- atingidas pelas barragens.
nal. Daí, o PAC reserva alguns tuma alardear que é abundância Segundo dados da Eletro-
milhões de reais para saneamento de energia limpa. Grupos da so- norte o cronograma está assim
básico aqui e ali, alguns milhões ciedade civil organizada em San- montado: o estudo de viabilidade
para alguns programas ambientais tarém, Itaituba, entre os índios já foi feito, agora chega o pedido
aqui e por ali, tudo para as popu- mundurucus e até em coordena- de licença para o EIA RIMA, se
lações se iludirem que o PAC veio ções de unidades de conservação possível ainda antes do fim deste
para melhorar a vida dos nativos. no entorno da bacia to rio Tapajós ano. Em 2.012 deve ser dada a li-
Santarém, por exemplo, tem pre- se perguntam – mas energia limpa cença de operação, depois de fala-
vistos R$ 75 milhões do PAC para e abundante para quem? Indaga- ciosas audiências públicas, como
saneamento básico da cidade. do quatro meses atrás em Brasília foram as de Belo Monte dias atrás.
Porém, do total previsto por um interlocutor da Amazô- E assim por diante, de forma que
(504 bilhões de reais) para ser nia, o ministro do meio ambiente, se não houver entraves, até o ano
gasto em cinco anos, até 2012, Carlos Minc desviou a resposta e 2.018 as primeiras turbinas esta-
dois terços serão gastos em gran- só disse que era para o desenvol- rão gerando 6.000 megawatts em
des projetos tais como, rodovias, vimento da Amazônia. O interlo- São Luiz do Tapajós.
hidrovias, ferrovias, hidrelétricas cutor riu ironicamente do minis- Em recente encontro em
e telecomunicações. Então, os tro que se fazia de bobo, porque Itaituba (21/08) a convite do Con-
recursos do PAC na maior parte, sabia que a resposta honesta seria selho Consultivo do Parque Na-
não são para beneficiar as popu- – para atender às empreiteiras que cional da Amazônia, estiveram
lações em si, mas o crescimento controlam os contratos de cons- em confronto duas exposições,
econômico. E todas essas obras trução de barragens no Brasil in- com visões opostas de Amazô-
estão previstas num outro plano teiro e, principalmente atender nia e de desenvolvimento. Três
maior e mais abrangente de cres- à fome de eletricidade intensiva técnicos da Eletronorte (dois de
cimento econômico, o IIRSA (In- das grandes empresas minerado- Brasília e um de Manaus) compa-
tegração Inter regional Sul Ame- ras que estão e vão se instalar na receram para expor o cronograma
ricano), criado já no ano 2.000 região, especialmente no oeste do e as vantagens das construções
entre os presidentes dos países da Pará. de cinco hidrelétricas na bacia do
América do Sul, sob inspiração do A Eletronorte já vem tra- Tapajós. Logo após, apresentei

45
um contraponto àquela exposição já as questões políticas das obras nizou uma exposição a ser feita
que chamei de propaganda para só o governo podia responder. num confronto com pessoal da
“inglês ver”. Eles mostraram as Como ele costuma dizer, Eletronorte em sessão especial na
vantagens das hidrelétricas para o “nunca antes neste país...” um Câmara de Vereadores em Santa-
crescimento econômico “do Bra- presidente decidiu enfiar goela rém, em outubro.
sil” (Alcoa, Rio Tinto, Vale, Cai- abaixo, dez mega hidrelétricas na Na primeira semana de no-
ma e demais empresas explorado- Amazônia, sem respeitar os mo- vembro, membros da FDA estarão
ras de minérios na Amazônia). radores da região. Estes são en- na missão Cururu, entre os índios
Mostraram eles um docu- traves ao crescimento, indígenas, Mundurucus em três dias de en-
mentário bem feito, ilustrativo de ribeirinhos, quilombolas, ONGs e contro. A organização dos frades
como as hidrelétricas no Tapajós Ministério Público Federal. Para e freiras franciscanos, que estão
serão modelo mais moderno, com ele o que interessa é o PAC a ser-
há cem anos na missão entre os
mínimos impactos ambientais e viço do grande Plano IIRSA. Os
Mundurucus, está organizando os
sociais. Oito ou dez minutos de entraves que possam aparecer
encontros com lideranças indíge-
propaganda que me fez lembrar a devem ser afastados com lei, ou
nas para refletir sobre os danos e
estratégia de Goebels e Hitler na novas normas.
invasões que as cinco hidrelétri-
Alemanha nazista (uma mentira No momento atual, um
cas farão nas terras e costumes
repetida muitas vezes parece ver- movimento está iniciando em de-
deles.
dade...). Depois descobrimos que fesa dos rios Tapajós e Jamanxin.
Assim alguns movimentos
o próprio presidente Luiz Inácio Três encontros já aconteceram em
determinou que todas as embai- populares estão sensibilizando as
Itaituba e um em São Luiz do Ta-
xadas brasileiras tivessem uma pajós, desde novembro de 2008. comunidades, cidades e povos so-
cópia do filmete para mostrar a Três seminários fora promovidos bre a gravidade dos projetos hidre-
todos os visitantes e contatos, em pelo movimento BR.163 susten- létricos promovidos pelo governo
línguas diferentes. tável em aliança com o Movimen- “Brasil de Todos” contra a Ama-
Isto é, o presidente parece to popular Frente em Defesa da zônia e seus povos. Infelizmente
estar preocupado com as lutas que Amazônia (FDA), de Santarém. O ainda é pequena a participação
a sociedade civil está assumindo mais recente encontro foi promo- popular. Mesmo organizações de
em Belo Monte, Jirau, Santo An- vido pelo Conselho Consultivo do moradores, sindicatos, professo-
tonio e Tapajós. Surpreendente- Parque nacional da Amazônia. res continuam indiferentes, como
mente, os três técnicos não contes- Em Santarém foram reali- se os projetos hidrelétricos, como
taram minhas argumentações que zados dois seminários, organiza- os outros grandes projetos não os
mostravam a desgraça para os ha- dos pela Diocese de Santarém em atingissem. Outros raciocinam
bitantes da região, caso as hidre- aliança com a Frente em defesa como se aqueles viessem trazer
létricas venham a ser construídas. da Amazônia. Encontros já foram empregos e desenvolvimento.
Apenas, em certo momento um realizados na cidade de Aveiro, Mas a luta continua como conti-
disse que eles são técnicos e só nas comunidades Tauaraí e Pinhel, nua em Porto Velho e no Xingu.
respondiam a questões técnicas, no baixo Tapajós. A FDA orga- Tapajós viverá.

46
Geração de energia na Amazônia-
caso de Estreito em questão1

Rogério Almeida2

O presidente Lula inaugurou no dia 04 de outubro de 2008 a segunda casa de força da hidrelétrica de
Tucuruí, no sudeste do Pará. A UHE de Tucuruí é a maior hidrelétrica genuinamente nacional e foi erguida
no rio Tocantins há 24 anos para alimentar com energia subsidiada empresas de produção de alumínio no
Pará, Albrás e Alunorte, do grupo Vale e a Alumar, no Maranhão, da estadunidense Alcoa. 75% da produção
de energia de Tucuruí vão para a exportação e o estado possui uma das tarifas domésticas mais caras do país.
O derradeiro reajuste foi de 16%.

1 Reportagem publicada originalmente no blogue FURO em novembro de 2008 e reproduzida no site do www.forumcarajas.org.br, que apoio
o trabalho.
2 Colaborador da rede Fórum Carajás, mestre em Planejamento do Desenvolvimento pelo Núcleo de Altos Estudos da Amazônia (NAEA/
UFPA).

47
A segunda casa tem potên- tituto Brasileiro de Geografia e O custo da obra é estimado
cia instalada de 4,1 mil megawatts. Estatística (IBGE). Ainda confor- em 2.5 bilhões de reais para que
Junto com a primeira casa de for- me o IBGE, até 2001 a população Estreito gere 1.087 MW de ener-
ça a potência instalada de Tucuruí total do município era calculada gia. Os barramentos no rio devem
vai ser de 8,3 mil megawatts. O em torno de 22.930, bem antes do ultrapassar a casa das 50 unidades
maior empreendimento do setor início da obra, fevereiro de 2007. entre grandes e Pequenas Centrais
de energia encontra-se em cons- O município de Estreito Hidrelétricas (PCH’s). As PC’s
trução no mesmo rio, na fronteira encontra-se numa região repleta produzem no máximo 3 mil kw.
do estado Maranhão com o To- em implantação de grandes proje- Ambientalistas que tratam sobre
cantins, no município de Estreito. tos púbicos e privados. A cidade barragens advertem que caso se
A construção de hidrelétri- dista 100 km do pólo de soja con- sacramente o planejamento esta-
cas na Amazônia integra um por- siderado um dos mais importantes tal, o rio Tocantins deve se trans-
tfólio de projetos baseados no uso do país, na cidade de Balsas, sul formar num grande lago, onde os
intensivo dos recursos naturais da do Maranhão e tem como vizinha impactos ambientais e cumulati-
região. O modelo de desenvol- Aguiarnopólis, cidade do norte do vos são imensuráveis.
vimento tem na concentração da Tocantins e fica mais de 500 km A radical alteração do ciclo
terra, renda e do poder político da capital do estado, São Luís. Os de reprodução dos peixes, des-
e econômico seus pilares e ativa economistas tratam o modelo eco- truição da mata ciliar e inundação
tensões entre populações conside- nômico de enclave, traduzindo, de florestas nativas que abrigam
radas tradicionais e grandes cor- não dinamiza a economia local. animais silvestres são alguns dos
poração do capital mundial. Além do pólo de soja, im- impactos pontuados. Empreendi-
No caso de Estreito, tais pactam o município a implanta- mentos de grande porte tendem a
projetos tensionam com comuni- ção da ferrovia Norte-Sul, a am- atrair grandes contingentes de mi-
dades indígenas Krahô, Apinajé, pliação da BR-010 e a construção grantes. 5.500 operários da cons-
no estado do Tocantins, e Gavião do maior projeto hidrelétrico do trução civil estão no canteiro de
e Krikati no Maranhão. Na fron- país, a hidrelétrica de Estreito, no obras atualmente. Cabe interro-
teira há ainda pescadores, extrati- rio Tocantins. Não muito distante gar: para onde essa população irá
vistas e camponeses, ladeados por dali, no município de Açailândia, após a conclusão da obra, prevista
reservas como a Serra das Mesas um pólo de gusa dinamiza uma para 2010?
do lado maranhense e um sítio de cadeia de destruição ambiental e Estreito e Carolina no Es-
árvores fossilizadas no Tocantins. de trabalho escravo para a produ- tado do Maranhão, e Aguiarnópo-
A hidrelétrica de Estreito prestes ção do carvão vegetal. lis, Babaçulândia, Barra do Ouro,
a completar o segundo ano em Darcinópolis, Filadélfia, Goiatins,
fevereiro de 2009, avança sobre O grotão e o planeta Itapiratins, Palmeirante, Palmei-
o rio. ras do Tocantins e Tupiratins se-
O empreendimento da rão os municípios afetados direta-
Estreito em questão – um UHE de Estreito pluga o grotão mente pela obra.
mapa de enclaves marcado por inúmeras chacinas As cidades abaladas pelo
de camponeses ao resto do mun- empreendimento tendem a ter os
A BR-010 corta o muni- do através da geração de energia. preços da terra, do aluguel e venda
cípio de Estreito, oeste do Mara- O empreendimento pertence ao de imóveis inflacionados. As pe-
nhão. A cidade há três anos tinha Consorcio Ceste, que aglutina as riferias proliferam ladeadas pela
uma população estimada em 10 grandes corporações do quilate marginalidade, aumento de con-
mil habitantes localizados na sede da Camargo Corrêa (4.44%), AL- sumo de álcool e a criminalidade.
de um total de 26.490, conforme COA (25.49%), Vale (30%) e a Até três anos atrás no município
os dados do ano de 2007 do Ins- belga Suez-Tractebel (40.07%). de Estreito não se via mendigos

48
nas ruas. Um passeio na rodovi- Minaçu e Cavalcante. suem dinheiro para pagar a ener-
ária local indica a alteração dessa Por conta da indiferen- gia da bomba de irrigação, revela
realidade. ça dos diretores da Tractebel em Rixen.
Carros das empresas sina- relação às populações atingidas Um grupo de 42 famílias
lizados com uma bandeira verme- a CPT mobilizou a visita de um na época vivia debaixo da lona
lha com um xis, homens fardados grupo de representantes de ONGs preta na periferia de Minaçu. Os
de variadas indumentárias que belgas. Os militantes internacio- belgas denunciaram que eles fica-
indicam a variedade de empresas nais puderam conhecer o cotidiano ram sem comida, sem água potá-
que atuam no canteiro de obras da das famílias que foram expulsas vel e sem emprego. A “moradia”
barragem, ônibus que os carregam de suas terras, e os desdobramen- ficava a 500 metros de uma área
agora fazem parte da paisagem na tos do lago que surgiu depois da de mineração de amianto, em um
cidade. O trabalho é terceirizado. construção da barragem. terreno que a própria prefeitura
A hidrelétrica de Estreito Rixen no artigo explicita cedeu.
encontra-se em croquis dos plane- que a indenização proposta aos Em outro local de visita
jadores de velha data. Localiza-se atingidos pela barragem ficou no da equipe as terras férteis vira-
na bacia Araguaia-Tocantins, con- patamar de R$ 5.300,00. O mili- ram brejos por conta da proxi-
siderada a maior em potencial de tante da CPT adverte que muitos midade com o lago da barragem.
geração de energia hidroelétrica não aceitaram esse valor consi- Tornou-se impossível produzir os
do Brasil. Tal modelo de empre- derado uma “mixaria”. No Mi- alimentos para sustento da famí-
endimento ratifica uma economia nistério Público de Brasília e em lia. O cheiro de fermentação e os
baseada no uso intensivo dos re- Goiânia um documento enumera mosquitos completavam o quadro
cursos naturais, ou seja, extrativa. 804 famílias cadastradas como crítico.
O hoje ministro das Minas atingidas.
Desenvolvimento para
e Energia, Edson Lobão, reco- O reassentamento é uma
quem?
nhecido pelos serviços prestado das questões mais delicada no
à ditadura, integrante do ninho processo de implantação de hi-
O Banco Nacional de De-
da família Sarney, ainda quando drelétricas. Em geral não se con-
senvolvimento Econômico e So-
senador foi um dos mais fervoro- segue reproduzir as mesmas con-
cial (BNDES) é o principal agen-
sos defensores da implantação da dições de reprodução de vida das
te financiador da obra, ou seja, a
hidrelétrica de Estreito. Dono de origens dos trabalhadores rurais.
sociedade financia um modelo de
meios de comunicação na região Esse tem sido um questionamento
desenvolvimento arcaico. Não se-
Tocantina, cedeu os veículos que constante, e a construção de La-
ria mais prudente o Estado induzir
controla para que alardeassem as jeado e Serra da Mesa, erguidas
um modelo de desenvolvimento
“benesses” da instalação do em- no estado do Tocantins ratificam
contrário, em setores intensivos
preendimento. a tese sobre a questão.
em tecnologia, por exemplo?
A equipe de belgas visi-
Artigo no jornal Le Mon-
A Tractebel em Goiás tou uma área de 26 famílias reas-
de Diplomatique Brasil, edição
sentadas pela empresa Tractebel.
de outubro de 2008, do profes-
Bento Rixen, da Comissão Apesar de boa casa e uma parce-
sor João Roberto Lopes Pinto, da
Pastoral da Terra (CPT) de Goi- la de 20 ha, eles não estão bem.
Pontifícia Universidade Católica
ás em artigo publicado em 2003, Entrevistados reclamam que só é
(PUC/RJ), baseado em relatórios
numa publicação do Fórum Cara- possível produzir em um hecta-
do próprio BNDES, indica que tal
jás, “Escritos sobre a água” alerta re. Posto ter de manter a reserva
opção de desenvolvimento inten-
sobre os passivos sociais e am- ambiental e a impossibilidade de
siva no uso dos recursos naturais,
bientais provocados pela empre- plantar sobre os morros. Segundo
induz a um crescimento menor de
sa na construção da hidrelétrica a família, a plantação tem de ser
renda e da produtividade, onde
de Cana Brava, nos município de irrigada, entretanto, eles não pos-

49
prevalecem a ocupação informal, barragens como a de Estreito os nunca chegou a retornar após ter
precária e de baixa qualificação. estudos organizados pela Comis- ficado adulto. O nosso guia pe-
Gozam da gentileza do Estado são Mundial de Barragens (Banco rambulou pelos garimpos do su-
o setor da mineração, celulose e Mundial, construtores, atingidos deste do Pará nos município de
etanol. por barragens, pesquisadores) Xinguara, Rio Maria, Redenção e
Tal modelo de desenvol- verificaram-se: São Félix do Xingu.
vimento induzido pelo Estado a) Alagamento e saliniza- Mamão, Pedra Rica, Ca-
tende a fortalecer ainda mais as ção afetam um quinto das terras muru são alguns dos garimpos em
desigualdades existentes no país. irrigadas no mundo, incluindo que Francisco passou. Num deles
Nesse sentido um conjunto de terras irrigadas por grandes bar- ganhou um pouco de dinheiro com
organizações sociais e políticas ragens e apresentam graves im- o ouro encontrado. Fala que não
organizaram a frente “Platafor- pactos de longo prazo, muitas guardou muito da sorte que teve
ma BNDES,” explica o artigo do vezes permanentes, sobre a terra, na década de 1980. “Dinheiro de
professor Pinto. A frente deseja a agricultura e a subsistência da garimpo parece que é amaldiçoa-
pressionar o governo para que população; do. Nunca durou muito”, reflete o
reoriente a política do BNDES b) as grandes barragens moto-taxista. Francisco informa
em favor de um desenvolvimento provocam impactos cumulativos que passou no maior garimpo a
que busque a superação das desi- sobre a água, inundações naturais céu aberto do mundo, o de Serra
gualdades e promova os direitos e a composição de espécies quan- Pelada, mas não ficou por lá.
sociais. do várias barragens são implanta- Ele lembra de pessoa que
Pinto reflete que a Plata-das em um só rio (caso da bacia “bamburou“ (achou muito ouro)
forma argumenta que se faz ne- Araguaia-Tocanstins); c) as gran- até 300 quilos de ouro. Teve for-
cessário, entre outros pontos, a) des barragens provocam destrui- tuna em fazendas de gado e casas,
fortalecer a economia de base ção da floresta e locais selvagens, como o caso de um garimpeiro
camponesa e familiar, que garan- o desaparecimento de espécies e que mora em Estreito conhecido
te produção para o mercado in- a destruição das áreas de captação como Índio. O afortunado é do
terno; b) descentralizar o créditoà montante devido à inundação da município de Codó. Quando ele
e que fomente a diversificação área do reservatório; pegou o dinheiro comprou uma
produtiva e a inovação técnica; c) d) as grandes barragens penca de carros e invadiu a cida-
incentivar a participação pública provocam o deslocamento de 40 de natal exibindo o “sucesso” em
a 80 milhões de pessoas em todo
em obras de infra-estrutura social, terras paraense, conta Francisco.
como uma política de saneamento o mundo; muitas das pessoas des- Nas idas e vindas de Fran-
básico. locadas não são reconhecidas (ou cisco ao Pará em busca de riqueza
cadastradas) como tal e, portanto, perdeu dois irmãos. A perda mais
Comissão Mundial de não são reassentadas ou indenizadas. trágica foi a do caçula. Francisco
Barragens Adverte lembra que o irmão tinha apenas
Histórias de garimpeiros 16 anos, e que era muito generoso
Entre os anos de 1997 a com as pessoas ao redor. Mas, a
2000 uma comissão realizou es- Na região as histórias de realidade do garimpo não permite
tudos sobre a construção de bar- venturas e desventuras sobre a tal atitude.
ragens em todo o mundo. Tucuruí busca de riqueza fácil em garim- Após achar uma peque-
foi o caso selecionado na América pos no Pará é generosa. Francis- na porção de ouro foi tocaiado e
Latina. A construção de barragens co foi o moto-taxista que serviu morto por parceiros de farra em
do Brasil é responsável por 40% como guia na ensolarada Estreito. bebidas e cabarés. Um outro ir-
do valor da dívida externa. En- Ele soma uns 40 anos e é filho de mão não tem notícia faz mais de
tre os impactos da construção de migrantes do Ceará, estado que 15 anos. Francisco acredita que

50
ele mora em Redenção, sudeste padecer de panes quando esquen- impedir que a passagem dos ribei-
do Pará. ta. O jeito é parar e apreciar a pai- rinhos quando usam dinamite na
sagem. obra. Segundo ele, as explosões
A busca pelas fotos No portinho algumas em- são comuns no raiar do dia e no
Falo a Francisco do inte- barcações. Uma barraca comercia- apagar da tarde.
resse em fazer fotos da obra da liza bebidas. Moradores se diver-
UHE de Estreito. Ele sugere que tem no rio e tomam umas pingas. Há luz nos grotões?
alugue uma canoa. Somente ela As casas são humildes. Destoam
pode levar você até o local onde do gigantismo da obra vizinha. A A instalação da hidrelétri-
a construção começou. Numa via- arquitetura de compensado e co- ca de Estreito coleciona inúmeros
gem até um portinho tenho sorte, bertura de palha socorre os mora- capítulos. Os relatórios de impac-
deparo-me com José Antônio por dores nos dias de chuva. Antônio tos sócio-ambientais amplamente
volta das 11h da manhã de um dia limpa a merda dos porcos da ca- criticados, as ações nos Minis-
noa e iniciamos a viagem. Ainda térios Públicos do Maranhão e
escaldante. Antônio entre outras
de onde saímos é possível avistar Estreito, mobilizações do Movi-
atividades é pescador, feirante e
o local. mento dos Atingidos por Barra-
dono de sítio.
Dragas, barcos de vigilân- gens (MAB), apoiados pelo MST,
Passou toda a manhã numa
cia, numa paisagem onde é possí- atentado à bala de um gerente de
exaustiva viagem, onde foi buscar
vel se avistar babaçuais e outros operações contra militantes con-
a esposa e uns porcos para criar
tipos de vegetação antecipam a trários a instalação da barragem,
no sítio que tem na periferia do
nossa chegada. A passagem de greve de operários do canteiro de
município de Estreito. Acusando obras por conta da péssima quali-
uma embarcação veloz conhecida
cansaço resistiu em pegar a em- dade da comida e assédio moral
como voadeira forma banzeiros e
preitada de uma viagem que du- de um gerente, que acabou sendo
faz a nossa canoa sacudir no meio
rou mais de uma hora ida e volta espancado pelos operários.
do Tocantins. Antônio sugere cui-
no caudaloso Tocantins até o can- O progresso, geração de
dado.
teiro da obra. A viagem ganha em O pescador avisa que os emprego e desenvolvimento são
emoção posto o motor da canoa vigilantes do barco ficam ali para os argumentos dos alinhados na

51
defesa do projeto. Qualquer voz Estado e o da empresa. São ofer- obra que ajudou a erguer.
tados ainda em parcerias com o
que destoe de tal perspectiva é tra- Carvalho lembra que o di-
tada como ressonância de forças Serviço Nacional de Aprendiza- nheiro que ganhou não conseguiu
externas que não desejam o pro- gem Industrial (SENAI), cursos comprar nem metro de terra de-
gresso do país. É comum a ojerizade panificação e costura. pois. “Com a terra a gente comia
a movimentos sociais e manifes- Não raro os boletins inun- todos os dias, ganhava um dinhei-
tações de xenofobia a análises e dam suas páginas com depoimen- rinho e podia trabalhar a família
ONG´s internacionais que fazem tos de famílias que já foram desa- por muito tempo. Dinheiro não é
oposição ao modelo do empreen- propriadas pelo Consórcio. Tudo tudo na vida”, arremata o senhor.
dimento. é flor nesse jardim? Uma série de Ele alerta que a média de inde-
Isso foi verificado desdereportagens de Beatriz Camargo, nização tem sido de 30 mil reais.
o processo de audiências públi- pública no site Repórter Brasil, Ele teme pelos idosos. “Tenho um
cas. A força da “grana” coopta deno mês de julho indicam que não. colega que mora só. Vai ser desa-
Sobre a especulação imobiliária,
clérigos a políticos, passa pelo in- brigado. Tem uns 80 anos. O que
centivo a criação de associações a série indica que houve pressão ele vai fazer aqui na cidade?”, in-
de fachada, como o caso da As- por parte de pessoas de empresas terroga o sindicalista.
sociação de Atingidos pela Barra-terceirizadas na compra de imó-
gem, entre outras. As audiências veis, com vistas a serem desa-
Construção civil - sindi-
que seriam um espaço de debate propriados com um melhor preço
cato em construção
possuem ares de congresso de pelo consórcio.
“partido único”, isso na capital ou A não inclusão dos povos
Delfino Araújo é o presi-
interior. indígenas como setores que po-
dente do recém criado Sindicato
. dem ser afetados pela constru-
da Construção Civil de Estreito,
A propaganda é a alma ção é um outro ponto. O certo é
que tem 140 sócios como funda-
do negócio? que desde o começo do processo
dores. Ele explica que o registro
há uma série de temas nublados.
para a criação do sindicato foi
Os boletins do Ceste ce- Enquanto isso as obras avançam
publicado no Diário Oficial em
lebram uma série de ações junto sobre o rio, sobre as histórias das
fevereiro deste ano. O sindicato
aos mais diversos segmentos da populações locais, a reconfigurar
ainda está em fase de construção,
sociedade. Um posto de atendi- uma região prenhe em conflitos
é o que se conclui após a conversa
mento ao migrante localizado na na disputa pele terra e os recursos
com o dirigente.
pequena rodoviária indica para naturais nela existentes.
Araújo ainda não sabe
que as pessoas façam ficha no
quantificar quantas empresas es-
Sistema Nacional de Emprego Sindicato dos Trabalha-
(SINE), sempre com filas enor- dores Rurais (STR) tão no canteiro de obras da hidre-
mes. Escritórios do consórcio se létrica e nem o número preciso de
espraiam em cidades estratégicas operários. Ele informa que já so-
Raimundo Carvalho, co-
nos dois estados. licitou os dados para o setor res-
nhecido como Cabeça Branca,
ponsável.
dirigente sindical rural de Estrei-
Os jornais do consórcio to, explica que no começo todo Sobre a paralisação de
celebram ainda cursos que pas- mundo achava que a barragem ia 11 dias dos operários no mês de
sam pela “inclusão digital” com a ser boa. Aos poucos o povo vai julho, Araújo relata que as con-
Colônia de Pescadores- Z-35, que aprendendo que não é bem assim. dições precárias de trabalho e a
se manifestou contra o acampa- Carvalho foi operário na constru- ração foram os motivadores. O di-
mento do MAB, doação de ambu- ção da barragem de Boa Esperan- rigente alerta que o sindicato ne-
lância, doação de computadores a ça, no rio Parnaíba, no estado do cessita tomar pé dos dados, para
unidades de saúde. O que traduz Piauí na década de 1960, e tam- que possa garantir uma interven-
uma confusão sobre o papel do bém um atingido pela própria ção qualificada.

52
Grandes Projetos Na Amazônia:
Mineração em Juruti e a Produção de
Energia1
Rogério Henrique Almeida

1.500 pessoas ocuparam no dia 28 de janeiro de 2009 uma área de operação da empresa estaduniden-
se Alcoa, no município de Juruti, oeste do Pará. No local é explorada uma mina de bauxita, matéria-prima
para a produção de alumina que é em seguida transformada em alumínio.
O empreendimento fica na bacia do Amazonas. Um bilhão de reais deve ser aplicado para produzir

1 Trabalho publicado no site www.plataformabndes.org.br em fevereiro de 2009

53
quatro milhões de toneladas do ção de Impacto Ambiental apre- ram seus lotes atravessados pela
minério. Desse total de investi- sentada, em 1999, pela empresa ferrovia, que receberam por inde-
mento a sociedade brasileira vai Engevix Engenharia S. A., que nização R$ 0,24/metro quadrado,
entrar com 500 milhões através atestava de modo fraudulento a por força de um acordo entre o
do Banco Nacional de Desenvol- viabilidade ambiental da explora- sindicato e a empresa, enquanto
vimento Econômico e Social (BN- ção do potencial hidroelétrico no reivindicavam R$ 3,00. O porto
DES) a juros módicos. rio Pelotas, afluente do rio Uru- está colado à cidade sede do mu-
A companhia é uma das guai, informa nota do MAB. nicípio de Juruti, de onde várias
maiores mineradoras do mundo No caso do Pará, os mili- famílias estruturadas social e eco-
e opera em 32 países nos quatro tantes denunciam os danos aos re- nomicamente no bairro Terra Pre-
continentes. No Maranhão man- cursos hídricos, redução do pesca- ta foram expulsas.
tém uma empresa de produção do, impedimento do direito de ir e Gerdeonor Pereira, diri-
de lingotes de alumínio, Alumar, vir dos ribeirinhos, diminuição da gente no Projeto de Assentamento
desde a década de 1980, em so- coleta da castanha do Brasil, andi- Extrativista (PAE) Juruti Velho,
ciedade com a BHP Billiton e que roba e outras fontes de proteína e informa que 80% do minério es-
deverá incrementar a produção recursos da flora usados para fins tão no PAE. O militante informa
de 368 mil para 420 mil tonela- medicinais. que pelo menos 50 mil hectares
das. Por isso o interesse na mina O projeto representa tam- de floresta devem ser derrubados.
de Juruti, que também vai eman- bém um risco de morte aos traba- “O projeto trouxe para a
cipar a Alcoa do fornecimento da lhadores, por conta da construção cidade umas 15 mil pessoas. O
Mineração Rio do Norte, da Vale, da ferrovia que escoará o minério. município não tem estrutura para
que extrai a bauxita no município Eles explicam que não há túneis cuidar desse povo com moradia,
de Oriximiná, na mesma região. ou desvios nos trechos que cor- saúde e escola. Hoje a empresa
Além das frentes de mineração o tam os projetos de assentamento já iniciou as demissões porque
baixo Amazonas tem em pauta a impactados pela obra. as construções estão em fase de
construção de hidrelétricas no rio Durante a ocupação, a tro- conclusão. Para onde esse povo
Tapajós e é impactado pela mono- pa de choque da Polícia Militar foi vai”, interroga Pereira? Há infor-
cultura de grãos e pelo porto da acionada. Os policiais usaram gás mes que por conta de migração o
Cargill. de pimenta e bombas de gás lacri- município passou por dois surtos
Além de negócios no Ma- mogêneo contra os manifestantes. de hepatite. A fase de construção
ranhão e agora no Pará, a Alcoa Crianças e mulheres foram atingi- é considerada onde a prefeitura
também é acionista majoritária das. Afinal, quem é o inimigo? mais fatura com arrecadação do
do consórcio Baesa, responsável Documento sistematizado Imposto Sobre Serviço (ISS). A
pela usina hidrelétrica de Barra por Raimundo Gomes da Cruz estimativa é de um milhão por
Grande, localizada na região Sul Neto, sociólogo que visitou as mês desde 2006.
do país. Junto com o grupo Vo- comunidades atingidas, escla- A presença da empresa
torantim, a Alcoa foi denuncia- rece que a mina está localizada também incrementou o mercado
da pela violação das Diretrizes numa área de floresta densa, nas de prostituição, drogas, especula-
para Empresas Multinacionais cabeceiras do lago Juriti Grande, ção imobiliária e ocupações.
da Organização para Cooperação caracterizada por três platôs. A Os passivos socioambien-
e Desenvolvimento Econômico ferrovia atravessa dois projetos tais já experimentados nas 60
(OCDE). de assentamento de agricultores, comunidades onde vivem cerca
A Alcoa e o grupo Voto- criados pelo Instituto Nacional de de quatro mil famílias num total
rantim foram denunciados pelo Colonização e Reforma Agrária aproximado de nove mil pessoas
Movimento de Atingidos de Bar- (INCRA). foram omitidos nos estudos de
ragens (MAB) no ano de 2005. As Um deles é o Socó, com impactos ambientais, realizados
empresas aproveitaram a Avalia- 420 famílias, das quais 43 tive- pela empresa CNEC Engenharia

54
e apresentado pela Alcoa para ob- pela suspensão. até esta fase;
ter a licença. Assim a Alcoa, como a 6 - na AID existem espé-
A CNEC é a mesma em- Cargil que produz grãos no mu- cies vegetais (castanheiras, pau-
presa que realizou os estudos nicípio vizinho de Santarém, que cravo, pau rosa) protegidas pela
para a construção da hidrelétrica ergueu um porto ao arrepio da lei, legislação ambiental;
de Estreito, onde a Alcoa é sócia finaliza a construção de rodovia, 7 - na AID existem os ecos-
da Vale, da Suez Energy, da BHP ferrovia, porto e tanques de con- sistemas de várzeas.
Billiton e da Camargo Correa. tenção de rejeitos para a extração Negociações - Após a mo-
A hidrelétrica de Estreito do minério. bilização da população atingida
está sendo erguida no rio Tocan- O MPF e o MPE consi- pelo grande projeto de minera-
tins, fronteira do Maranhão com deram que o Instituto Brasileiro ção que deve durar entre 80 a 100
o estado do Tocantins e é conside- dos Recursos Renováveis e do anos, uma rodada de negociação
rado o maior empreendimento do Meio Ambiente (IBAMA) deve- foi realizada entre 9 a 11 de feve-
setor no Brasil. No caso de Estrei- ria licenciar o projeto Juruti e não reiro, no município pólo da região,
to, entre as omissões consta que a Secretaria de Meio Ambiente, Santarém.
as áreas indígenas nos dois esta- como ocorreu: Os elementos que Além dos atingidos pelo
dos, Krahô, Apinajé, no estado do demonstram a necessidade de que projeto, participaram dos deba-
Tocantins, e Gavião e Krikati no o licenciamento se dê no âmbito tes o representante da Alcoa na
Maranhão não serão afetadas pela federal são: América Latina, Franklin Feder,
obra. Informação que foi contes- 1 - a área na qual estão lo- os Ministérios Públicos, Prefei-
tada pelas comunidades indígenas calizadas as minas de bauxita per- tura de Juruti e representantes
e pelos defensores dos direitos tence à União, tendo sido objeto do Governo do Estado. A rodada
humanos. de arrecadação administrativa e, teve várias divisões. Dia de de-
As omissões nos relatórios hoje, encontra-se em processo de bate com todos os envolvidos na
que indicam os impactos ambien- regularização fundiária, tendente questão, dia dedicado ao debate
tais da exploração da bauxita do a permitir a fixação dos clientes entre os atingidos e a empresa e
Pará estão entre as motivações da da reforma agrária; uma rodada de negociação encer-
ação movida na justiça pelos Mi- 2 - todas as atividades para ra com a participação de Walmir
nistérios Públicos Federal e Es- a obtenção da bauxita (escavações Ortega, então Secretário de Meio
tadual (MP) desde 2005. Nestes e deposição de rejeitos nas cavas) Ambiente do Pará, informa Perei-
termos, a Alcoa funciona na ile- ocorrerão sobre o aquífero Alter- ra.
galidade em terras do Pará, posto do-Chão, importante reserva de Reivindicações – A Asso-
as contestações dos MP sobre o água doce que atravessa dois es- ciação das Comunidades de Juruti
processo de licenciamento da ex- tados (Pará e Amazonas); Velho exige entre outras coisas,
ploração de bauxita. 3 - o porto está localizado a participação de 1,5 % nos lu-
O não cumprimento da às margens do rio Amazonas, rio cros da empresa, investimentos
recomendação dos MP também internacional, sem que tal impac- em educação, saúde e moradia
resvala no governo do estado do to tenha sido nem mesmo correta- e a definição de uma agenda de
Pará. Gabriel Guerreiro, deputa- mente mensurado ou nem sequer compromisso. Gerdeonor Pereira
do estadual (PV) e Walmir Orte- estudado; esclarece que a primeira reivindi-
ga, ambos ex-secretários do meio 4 - todo o Projeto Juruti cação já foi atendida.
ambiente, respondem por impro- está contido na bacia hidrográfi- Tal tipo de empreendimen-
bidade administrativa. O primeiro ca do Amazonas, sob jurisdição to na Amazônia coloca em lados
pela aprovação da licença de ope- federal; opostos grandes corporações com
ração da Alcoa e o segundo pela 5 - há o registro de 73 ocor- staff de capacidade internacional
manutenção, contrariando a reco- rências de sítios arqueológicos na de negociação e populações con-
mendação dos MP, que decidiram Área de Influência Direta (AID), sideradas tradicionais. Tanto no

55
caso do Pará como na fronteira particular para fazerem coro pró- nenhum veículo informou que a
do Maranhão com o Tocantins, a empreendimento nas audiências mesma opera de forma ilegal. O
empresa apresenta um discurso públicas onde são apresentados os destaque conferido recaiu sobre
de redenção da pobreza através estudos de impactos ambientais. a nota da empresa sobre os possí-
do grande empreendimento, que A empresa também não veis prejuízos.
Tanto no caso da usina de
deve ser seguido como se fosse se descuida em “convencer” os
Estreito, como no caso da explo-
um mantra da prosperidade. meios de comunicação locais da
ração mineral em Juruti, o fato foi
A cooptação de políticos e sua nobre causa. É raro algum ve- verificado. Qualquer questiona-
agentes que representem algum ículo de comunicação dar visibi- mento que soe a ambientalismo é
tipo de liderança consta como lidade sobre as mazelas dos gran- logo satanizado. E os portadores
agenda da ação da empresa, em des projetos. No caso da Alcoa de inquietações sobre os impactos

56
socioambientais tratados como agentes que defen- Do conjunto de 10 eixos de integração, qua-
dem o “atraso” do lugar. tro se destacam, por suas riquezas naturais e pos-
O processo de licenciamento das obras e sibilidades de conexões: o Amazonas, o Hidrovia
as populações tradicionais locais são classificados
Paraná-Paraguay, o Capricórnio e o Andino. O obje-
como os grandes entraves pelos empreendedores. tivo central prima em facilitar a circulação de mer-
Os mesmos podem ter em breve as suas demandas cadorias.
aceitas no que tange ao processo de licenciamento O eixo do Amazonas compreende os seguin-
de obras na Amazônia. Ao menos, se depender do tes países: Colômbia, Peru, Equador e Brasil e visa
esforço de Mangabeira Unger, que deseja azeitar o
criar uma rede eficiente de transportes entre a bacia
já delicado processo.
amazônica e o litoral do Pacífico, com vista à expor-
O desenvolvimento e o progresso formam a
tação.
dorsal do discurso de defesa dos grandes empreen-
dimentos, que segundo as empresas, vai fazer ger- Nesse sentido o BNDES exerce protagonis-
mo continental, financiando obras de integração
minar como se fosse leite e mel, o emprego e a fortu-
além de nossas fronteiras. Outro ator importante no
na nos rincões. Numa clara linha de desinformação
sobre a lógica que conforma tais empreendimentoslonga metragem de extração das riquezas do conti-
nente é o Banco Interamericano de Desenvolvimen-
nas periferias do planeta, o enclave. Ou seja, o saque
dos recursos naturais. to (BID).
No mundo do Brasil, alguns se arriscam em
Mineração na Amazônia e os eixos de inte- pontuar que o Programa de Aceleração do Cresci-
gração do continente mento (PAC) é uma miniatura do IIRSA.

O extrativismo tem regido a economia na Antes do fim


Amazônia. O ciclo mais recente é o mineral, inicia-
do a partir da década de 1950, no estado do Amapá, No dia 16 de setembro de 2009 o Pará viveu
quando o mesmo ainda tinha o status de território. um dia histórico. Em Belém o aparato policial foi
A exploração do manganês na Serra do Navio usado contra populares numa audiência pública so-
foi o pontapé inicial, e que em apenas cinco décadas
bre o projeto da hidrelétrica de Belo Monte. Já no
se exauriu, restando apenas o buraco, literalmente.
município de Juruti a governadora Ana Júlia Carepa
A exploração mineral no Amapá, considerada a pri-
(PT) cortava a fita do projeto de mineração de bau-
meira na Amazônia, foi protagonizada pela empresa
xita da Alcoa. Além de cortar a fita a governadora
estadunidense de Daniel Ludwig, a Bethlehem Steel
plantou uma árvore. Uma exacerbação do marke-
Company em sociedade com o empresário Augusto
ting.
Trajano de Azevedo Antunes, dono da Indústria e
Comércio de Mineração S. A. (ICOMI). Os dois projetos estão localizados na mesma
O ciclo da mineração ganhou maiores pro- região, sudoeste do estado. Numa foto de um diário
porções na Amazônia a partir da região de Carajás local a governadora aparece amparada pelo repre-
com a presença da Vale na extração do minério de sentante da Alcoa na América Latina, Franklin Feder.
ferro na década de 1980, no Pará. Ainda na mesma foto destaque para o ministro das
É creditado a Eliezer Batista, ex-executivo Minas e Energia, Edson Lobão, uma figura íntima
da Vale, a construção do mapa das riquezas naturais do senador José Sarney. Desde o regime de exceção.
na América do Sul. Batista é pai de Eike, festejado Essa tal de governabilidade...
como o novo bilionário nacional. Obra do acaso? Os Mais irônico, o Instituto de Pesquisa Aplica-
levantamentos de Batista foram encomendados pela da (IPEA), acabava de apresentar relatório onde in-
Corporação Andina de Fomento (CAF). A CAF é dica que a produção de alumínio é um desastre para
um dos agentes do projeto de Integração da Infraes- região amazônica.
trutura Regional Sul-Americana (IIRSA).

57
Grandes projetos no município
de Barcarena: conflitos sociais e
ambientais

Manoel Maria de Morais Paiva1

Me nome é Manoel Paiva. Sou engenheiro ambiental e ex - presidente do Sindicato dos Químicos
de Barcarena. Atualmente coordeno a Organização Não Governamental (ONG) Ecologia Sócio Ambiental
da Amazônia (Ecosaam), com sede em Barcarena/Pará. E acumulo a direção da CTB e estou presidente do
diretório municipal PC do B.
Resido em Barcarena desde 25 de Setembro de 1985. Faz 25 anos que convivo com o projeto
Albras e Alunorte. Entre 1985 a 1995 fui funcionário da Albras, trabalhando como operador de manuseio,
forno e ponte rolante, até julho de 1995.
Em Agosto de 1995 passei a trabalhar como funcionários da Alunorte. Em 2001 foi eleito presi-
dente do Sindicato dos Químicos, que representa os trabalhadores da planta química da Alunorte. Fiquei
liberado até 2007, quando perdemos a eleição pra chapa que a Empresa Alunorte montou.
Em todos esses anos o que menos se viu em todas as ações das empresas em Barcarena, foi justiça.
Desde a implantação do pólo Industrial de Barcarena o capital tem atropelado as comunidades, trabalha-
dores e o meio ambientes. O poder do recurso financeiro tem preponderado. O passivo social e ambiental

1 presidente do Sindicato dos Químicos de Barcarena, engenheiro ambiental. mmmpaiva@yahoo.com.br (91) 37544965 / 88713621}

58
que ficará pra Amazônia, no ter- Os protagonistas das nossas dores aquáticos.
mino desse ciclo será incalculá- nunca aparecem em cena. Não queremos dizer com
vel. Hoje são centenas de homens A saúde do trabalhador é isso que vamos envelopar a Ama-
e mulheres mutilados em todos os delicada. Há um montante signi- zônia. Mas, não podemos mais
sentidos, em decorrência dos ata- ficativo de operários reclamando aceitar sermos meros exportado-
ques aos seus direitos. seus direitos. E outros que não res de matérias primas para países
Temos capital suficiente têm a mesma iniciativa. Por con- desenvolvidos. Ditos do primeiro
para articular um grande debate ta da estratégia do calar. A regra mundo, à custa do sofrimento do
sobre a situação de cada comuni- consiste em empregar filhos, fi- nosso povo.
dade afetada pelos grandes pro- lhas ou parentes dos ex – fun- O saque aos nossos re-
jetos. Sejam eles da Vale, Alcoa, cionários para que os mesmos fi- cursos tem se repetido desde os
MMX ou CCM. Necessitamos quem presos no cordão umbilical tempos coloniais. Desde o desco-
apresentar propostas que possam da fábrica. Por conta do medo do brimento, até os dias de hoje. Os
garantir a permanência de famí- desemprego agonizam calados. ciclos econômicos saqueiam nos-
lias tradicionais em seu habitat. Dores que eles dividem somente sas riquezas e não deixam para
E as suas terras, suas raízes, suas com as famílias. nosso povo reflexos positivos.
culturas, sua identidade e meio A demissão é um fantas- Foi assim com ciclo com do pau
ambiente. ma constante. O futuro para as Brasil, borracha, ouro e pedras
Os passivos sociais e am- empresas quem faz é o próprio preciosas. E agora entramos na
bientais se repetem a cada projeto. trabalhador, quando deposita seu era dos minérios primários. Os
O que acresce são a crueldade e INSS, descontado em seu contra mesmos são tratados aqui para se-
a injustiça. Podemos citar como – cheque todo mês. Pois todo tra- rem exportados, sem o perigo de
exemplos os ribeirinhos do rio balhador que chega a essa condi- contaminação pela geração de re-
Murucupi. Os mesmos tiveram de ção de aposentadoria é um peso a jeitos perigosos. Até que tentaram
deixar suas casas, por não pode- menos para as empresas, que não sangrar o coração da Amazônia
rem mais usar o rio em decorrên- garantem absolutamente nada com a Estrada de Ferro Madeira
cia da contaminação da água. O aos trabalhadores por mais que Mamoré. A natureza não permitiu.
rio foi a garantia por muitos anos os trinta e não sei quantos anos Onde estão os primeiros
da segurança alimentar e fonte de para a aposentadoria tenham si- habitantes das comunidades que
renda de milhares de ribeirinhos, dos trabalhados somente naquela existiam próximo ao projeto Al-
pescadores, camaroeiros. Era co- empresa. Deveria haver leis que bras /Alunorte? Deveriam no mí-
mum em tempos de abastança a garantissem pelo menos plano de nimo ter um endereço que servis-
presença de turistas que encosta- saúde vitalício para trabalhadores se como referência para o resgate
vam nas tabernas para beber uma que prestaram serviços por cinco, de sua cultura. Famílias inteiras
pinga, cerveja ou comer um tira dez ou vinte anos para grandes foram esfaceladas para dar espa-
gosto. empresas. ço para a construção das grandes
A matemática dos grandes Pois ao se aposentar o tra- fabricas de alumina, alumínio e
socializa a miséria e os desastres balhador gasta metade do seu ren- caulim.
sociais e ambientais. A máxima dimento com medicação, princi- O povo do Pará tem fama
de geração de emprego desapare- palmente na cultura do nosso país de ser um povo hospitaleiro, ale-
ce quando se faz um paralelo com que quanto mais velho mais caro. gre, falante e de fácil relaciona-
os desempregados indiretamente. A Amazônia, em espe- mento. Mas, o que percebemos
E as pessoas que não tiveram a cial o Estado do Pará, se destaca hoje no semblante das pessoas
oportunidade de conhecer a fortu- pela exuberância de suas riquezas, que foram remanejadas das suas
na dos rios. Os grandes projetos minérios, rios, floresta e biodiver- comunidades não é o das referen-
na Amazônia têm deslocado co- sidades. Tudo dentro de um equi- cias acima. A atitude hoje é des-
munidades centenárias, subtrain- líbrio que garante a sustentabili- confiança, revolta, sentimento de
do chances de ao menos reclamar. dade dos ecossistemas terrestres e terem sido enganadas e desprezadas.

59
Gilvandro, Damasceno e Manoel Paiva durante lançamento do livro Alumínio na Amazônia em Belém(PA) - foto: arquivo Fórum Carajás

O projeto não trouxe a elas tes do MST. A questão é mais para a implantação dos grandes
nenhuma perspectivas de melho- complexa e envolve os gover- projetos não conseguem assimi-
ria de vida. Como as empresas ha- nos federal, estadual e municipal. lar, nem aceitar as ofertas feitas
viam propagado. Em particular os Além de políticas públicas que pelos grupos de interessados pelo
responsáveis pelas mentiras que possam garantir a distribuição de projeto. Há registros de pessoas
convenceram os moradores tra- terras e incentivo à produção da ganhando muito bem pra fazer a
dicionais a saírem de suas terras. agricultura familiar. menor oferta possível às famílias.
Terras que passaram centenas de É preciso levar em con- Muitas delas quase sempre des-
anos sem ter um dono. O direi- ta que cada comunidade vive de providas de informações das reais
to da propriedade privada se so- acordo com suas disponibilidades intenções acabam ficando entre-
brepôs a posse ancestral da terra. e facilidades. Portanto não podem gue a própria sorte.
Com os s grandes projetos apare- ser avaliadas e deslocadas para O estado que deveria dis-
ceram donos de todo que é lado: qualquer lugar. É necessário res- ponibilizar profissionais capacita-
União, Estado, Município e até as peitar cada atividade lucrativa de dos para fazer as primeiras abor-
próprias empresas que estão che- sustento das famílias. Por exem- dagem, e servir como o mediador
gando e as aqui instaladas. plo: pescador em área propicia não o faz. A perspectiva nos im-
Essa questão da terra não a pesca e agricultores em áreas postos que o projeto poderá gerar,
é muito diferente dos conflitos agricultáveis. Para evitar que haja acaba deixando de lado as comu-
agrários. Esses que a mídia ten- conflitos no repasse das ativida- nidades a serem remanejadas.
ta reproduzir de forma distorcida, des as novas gerações. Em tal contexto as comu-
quando “satanizam” os integran- Muitos dos remanejados nidades tornam-se alvo fácil para

60
ante a pressão das grandes empre- Um exemplo. A gestão as manifestações contrárias a im-
sas. Quando existe resistência de passada do Sindicato dos Quími- plantação da usina termoelétrica,
uma ou outra família, as empresas cos exigiu das empresas a cons- e a não permissão para aceitar o
usam de estratégias. Cooptam as trução das casas para os operários. lixo do município de Abaetetuba.
pessoas mais esclarecidas, como Tudo acertado no acordo coletivo Dois projetos que não jus-
se essas fossem funcionárias das que obriga a empresa a construir tificam seu licenciamento. Se le-
empresas. Os empreendedores fo- casas aos trabalhadores. Por conta varmos em conta as discussões
mentam visitas a outras empresas, disso a Caixa Econômica exigiu sobre aquecimento global, onde o
geralmente em outros estados. O um projeto social, que foi decidi- Brasil apresentou em Copenhagen,
objetivo é que elas possam ser as do entre empresa e construtora. A na Dinamarca sua contribuição
futuras formadoras de opinião e escolha foi troca de lajotas e a cor para diminuição do aquecimento
defendam os interesses das em- de pintura. Tentamos descobrir do planeta, usar carvão mineral é
presas. qual foi o projeto apresentado a remar na contra maré. Maior con-
Após o convencimento é Caixa Econômica Federal, porém tribuinte para emissão de gases do
comum as empresas enviarem as até o final de nossa gestão não nos efeito estufa.
comunidades de interesse delas foi informado. É assim que fun- Além da pressão sobre as
olheiros (as). A missão consiste ciona. terras das populações originárias,
em realizarem levantamento das Os próximos anos se de- as contaminações ambientais têm
debilidades das políticas publicas, senham como de grandes confli- sido denunciadas constantemente.
e necessárias ao atendimento das tos. Pois estão em processo de Sinalizo isso como avanço da so-
ciedade civil organizada local. Os
pessoas. A partir desse diagnósti- licenciamento dois grandes pro-
crimes ambientais são aos órgãos
co passam a fazer um grande ma- jetos: o da termoelétrica e o da
competentes. Tem sido freqüente
rketing para vender a imagem de Companhia de Alumina do Pará
acidentes nos locais de operações
uma empresa cidadã. Geralmente (CAP). Todos dois ainda sobre
das grandes empresas. Algumas
criam cooperativas para reciclar conflitos não resolvidos. Alguns
vezes por conta da perda de con-
lixo, criação de animais, confec- moradores chegam até a acusar
trole do processo das empresas.
ção de uniformes, fabricação de o Governo Estadual de receber
Outras vezes por conta do descaso
papel reciclado, produção de brin- dinheiro da Vale, e ainda não ter
com a segurança, o que podemos
quedos com restos de madeiras repassados aos moradores que
qualificar como consciente.
das fábricas e outros. As iniciati- precisam deixar a área. A termoe-
Não podemos ver a Ama-
vas sobrevivem até atenderem os létrica a carvão mineral, esta com zônia como uma alternativa para
interesses das empresas. o Estudo de Impacto Ambien- geração de artefatos primária de
As empresas nunca per- tal (EIA) e Relatório de Impacto interesse do capital internacional.
mitem que as próprias comunida- Ambiental (RIMA), questionado Acima de qualquer especulação
des toquem o projeto. As iniciati- pelo ministério publico. Mas que financeira precisamos saber se o
vas são na verdade uma exigência pela prepotência da Vale já existe projeto será bom também para
dos agentes financiadores, como até peças da estrutura da usina em nossa terra, nossa água, nossa
Banco Nacional do Desenvolvi- depósitos de Vila do Conde. gente. Saber se realmente have-
mento Econômico e Social (Bn- Na década de 70, eles rá retorno em forma geração de
des), Caixa Econômica Federal, faziam da maneira deles, hoje ou emprego e renda, com respeito às
Banco da Amazônia (Basa) e a discutem com a sociedade ou não comunidades tradicionais, ribei-
Superintendência de Desenvolvi- fazem. Pois o povo não perdeu rinhos, pescadores, agricultores,
mento da Amazônia (Sudam). E oportunidade de buscar conheci- caçadores, operários. E princi-
outros agentes que condicionam a mento para jogar um papel impor- palmente para preservação das
liberação do financiamento para a tante nas decisões de seus desti- espécies entre elas o homem e a
efetivação de um projeto social. nos. Prova recente disso foram mulher.

61
A EXPLORAÇÃO MINERÁRIA E
SUAS CONSEQÜÊNCIAS NA
AMAZÔNIA BRASILEIRA 1
Airton dos Reis Pereira [1]
José Batista Gonçalves Afonso [2]
Raimundo Gomes Cruz Neto [3]

1 – Introdução

Hoje, o que mais se ouve é que as grandes empresas são meios essenciais ao desenvolvimento eco-
nômico e tecnológico do país. Na propaganda e nos discursos oficiais de governantes e de políticos influen-
tes elas são apresentadas como símbolo do desenvolvimento, do progresso e da geração de empregos. E
por estarem atreladas a mercados bem mais amplos que os regionais e por serem estratégicas no marketing
internacional, não por acaso, recebem gigantescos investimentos do Estado.
Na Amazônia brasileira, grandes empresas do ramo da mineração são beneficiadas com infra-estru-

1 Trabalho publicado originalmente no Relatório Sobre Violência da Comissão Pastoral da Terra (CPT), 2009.

62
tura (estradas, ferrovias, hidrovias, cristal, nas margens dos rios Ara- a exploração de bauxita, man-
portos, energia, etc.) financiadas guaia, Tocantins, Tapajós, Xingu ganês, caulim e ouro; “Oeste do
com dinheiro público, créditos e Madeira e em vários de seus Pará” com a extração da bauxita
subsidiados, isenção de impostos, afluentes. Há casos de “ciclos” pela Aluminium Limited of Ca-
etc. Controlam a “coisa pública”, de extração aurífera, embora nadá (Alcan) e a Mineração Rio
os principais meios de comuni- de forma isolada e fragmentada do Norte (MRN); “Carajás”, com
cação e extensos territórios, onde ainda no período colonial como, a exploração de ferro, manganês,
exercem gestão autônoma crian- por exemplo, no Amapá e Mato cobre, níquel e ouro por diversas
do enclaves que causam impactos Grosso. Mas a partir do final da empresas, entre elas a Compa-
sobre a organização social regio- década de 1950 e início dos anos nhia Vale do Rio Doce, a Vale, e
nal e o meio ambiente. Para essas 1960 tornou-se uma prática quase “Paragominas” com a retirada de
empresas, a Amazônia assume que intensiva como, por exemplo, bauxita e caulim pela Vale e Pará
um alto valor estratégico, pois ao com a descoberta da província Pigmentos S/A.
controlar recursos e o espaço re- aurífera do médio rio Tapajós e É visível que a Amazônia
gional, fortalecem sua hegemonia. de cassiterita, em Rondônia e em tem um peso significativo na ativi-
O crescimento da produ- São Felix do Xingu (PA). dade de extração e transformação
ção industrial nos últimos anos e o Na década de 1980, as ati- mineral realizada em território
conseqüente aumento do valor dos vidades auríferas se intensifica- brasileiro, considerando a ocor-
principais minérios no mercado ram nos estados do Pará, Roraima rência na região de diversos mi-
internacional tem provocado uma e Rondônia. No Pará os garimpos nerais que influenciam na balança
corrida cada vez mais acelerada de ouro em Serra Pelada, Cumaru comercial do país, sendo o Pará o
do capital internacional sobre as e nos arredores de Itaituba e Jaca- segundo maior Estado exportador
reservas minerais existentes. Na reacanga atraíram milhares de ga- de minérios [6]. Em 2008, a ex-
Amazônia esse processo é extre- rimpeiros de quase todas as partes tração do nióbio colocou o Brasil
mamente visível. São dezenas de do Brasil [4]. em 1º lugar no ranking internacio-
projetos de exploração minerária A exploração mineral de nal, em 2º com a extração do ferro,
em funcionamento e tantos outros forma empresarial teve início em manganês e alumínio (bauxita), e
em fase de instalação, resultado meados da década de 1940 com em 5º com o caulim e o estanho.
de uma política nacional vergo- a extração de manganês pela em- O estado do Amazonas participa
nhosa e entreguista que coloca o presa Indústria e Comércio de Mi- com 12% do nióbio extraído no
país na condição de mero forne- nérios S/A (ICOMI), no Amapá. Brasil, e com 60% do estanho. Já
cedor de matéria-prima e de sub- Em 1947 essa empresa assinou o minério de ferro de Carajás, no
serviência aos interesses do capi- contrato de concessão para explo- sudeste paraense, ocupa o 2º lugar
tal internacional. São projetos que ração mineral e em 1953, assinou na extração nacional, colocando o
evidenciam poucas possibilidades o contrato de concessão para a Pará atrás apenas de Minas Gerais
de incremento à economia local atividade portuária e ferroviária, [7].
e têm trazido sérios prejuízos às considerado o marco zero da ex- A tendência para 2009, de-
comunidades de camponeses e ao ploração mineral na Amazônia pendendo das condições da crise
meio ambiente. [5]. na economia mundial, é de que
Atualmente, embora se haja um crescimento significativo
2 - Exploração mineral: possa constatar que a exploração na extração da bauxita, cobre, ní-
da garimpagem à atividade em- minerária esteja espalhada por quel, fosfato e ferro, considerando
presarial toda a Amazônia, é possível con- a entrada em operação das minas
A exploração minerária na siderar que essa prática seja mais de cobre e níquel, da Vale, em Ca-
Amazônia brasileira não é algo re- intensa e de efeitos trágicos às co- rajás, a mina de bauxita da Alcoa,
cente, muitos foram os garimpos munidades camponesas em qua- em Juruti, e o salto da extração
de extração de ouro, diamante e tro grandes pólos: “Amapá” com de ferro de Carajás de 96 milhões

63
de toneladas em 2008, para 126 rem em quatro principais regiões: de, necessidade e conseqüências
milhões de toneladas, em 2009. no Oeste, envolvendo os municí- desses empreendimentos.
Há de se considerar ainda que na pios de Oriximiná, Juruti, Monte O que se percebe é que o
Amazônia, enquanto a extração Alegre, Alenquer e Óbidos; no impacto da mineração é localiza-
mineral responde por 25% do Nordeste, compreendendo os do, desestruturante e ao mesmo
total das exportações, a transfor- municípios de Paragominas, São tempo estruturante, ao modo que
mação (ferro gusa, alumina e alu- Domingos do Capim e Barcare- interessa às empresas. Desestru-
mínio) responde por 21%. [8]. É na; no sudeste destaque para os tura as comunidades locais (urba-
importante ressaltar ainda que o municípios de Marabá, Cuirionó- nas ou rurais), além de provocar a
extrativismo mineral representou polis, Parauapebas e Canaã dos migração de milhares de pessoas.
59,2% dos 8 bilhões de dólares Carajás; e no Sul, os municípios Diversas são aquelas que chegam
produzidos pela indústria mineral de Xinguara, Ourilândia do Nor- de outras regiões do país acredi-
do estado do Pará. te, Tucumã, São Félix do Xingu, tando que as atividades dessas
Tratando-se de reservas Rio Maria, Floresta do Araguaia, empresas vão melhorar as suas
conhecidas, o Brasil ocupa o ter- Santa Maria das Barreiras e Con- vidas. É visível o aumento, sem
ceiro lugar no ranking mundial ceição do Araguaia. controle, da população no entor-
em Bauxita, com depósitos con- no dos projetos mineralógicos.
centrados em três distritos princi- 3 – As conseqüências Não só os núcleos urbanos próxi-
pais: Trombetas (médio Amazo- mos dessas áreas passam por rápi-
nas), Almeirim (baixo Amazonas) A extração e transforma- das e indesejáveis transformações
e Paragominas-Tiracambú (plata- ção mineral na Amazônia efetiva- com o crescimento populacional,
forma Bragantina). Já os depósi- da pelas principais empresas do como também surgem outros
tos de caulim estão distribuídos ramo: a Companhia Vale, a Anglo aglomerados urbanos. O emprego
em três principais distritos: Ma- American, a ALCOA, a Albrás, a esperado não aparece. Para sobre-
naus (médio Amazonas), Almei- Aluminum Limited of Canadá, a viver muitos são aqueles que se
rim (baixo Amazonas) e Capim Alunorte, Rio Tinto, a Mineração enveredam nos trabalhos tempo-
(plataforma Bragantina). O ouro Rio do Norte, Companhia Brasi- rários e informais. Assim, grande
e cassiterita estão distribuídos pe- leira de Alumínio (CBA), Imerys é o contingente de trabalhadores e
las mais diversas áreas da região Rio Capim Caulim S/A, Caulim trabalhadoras itinerantes, de vida
amazônica. Serra Pelada, no su- da Amazônia S/A (CADAM/ marcada pela provisoriedade e
deste do Pará, por exemplo, ain- Vale), ICOMI, Pará Pigmentos S/A mobilidade, e de mão-de-obra po-
da representa grande potencial (PPSA/Vale), X trata e Caraíba livalente que lutam cotidianamen-
aurífero, fato que causa entreve- Metais, com o apoio e incentivo te pela sobrevivência. Os efeitos
ros entre a Vale e cooperativas dos governos estaduais e federal até então incontroláveis, nessas
de garimpeiros, no município de vem se dando de forma espolia- regiões, têm sido a elevação do
Curionópolis. As jazidas de ferro tória e predatória, desterritoriali- índice de violência com destaque
em Carajás, com seus 18 bilhões zando populações tradicionais e para os homicídios, comércio de
de toneladas de minério, corres- degradando o meio ambiente. É drogas, prostituição e acidentes
pondem à maior concentração de notória a poluição do ar, do solo e de trânsito [10].
alto teor já localizada no planeta, das bacias hídricas, além do des- A própria Vale encaminhou
distribuídas em quatro setores florestamento, destruição de habi- uma pesquisa nesses municípios e
principais: Serra Norte, Serra Sul, tat natural, de animais silvestres e constatou que entre 2000 e 2005
Serra Leste e Serra de São Félix de sítios arqueológicos [9]. São o crescimento populacional foi
ou Serra Arqueada. projetos dirigidos de fora para de 22,9% e a projeção de cresci-
Vale considerar que a pes- dentro da região, sem que os ama- mento do ano de 2005 para o ano
quisa, extração e transformação zônidas tenham a oportunidade de de 2010 será de 92,9%. No ano
mineral no estado do Pará ocor- discutir e opinar sobre a viabilida- de 2000 essa área contava com

64
334.386 habitantes, em 2005, com Como exemplo dos danos cau- Por outro lado, o impacto
423.361. Na projeção para o ano sados a esses povos, no sudeste da mineração é estruturante ao
de 2010, se forem desenvolvidos do Pará, os índios Gaviões tive- modo que interessa às empresas.
todos os investimentos previstos, ram as suas terras atravessadas Elas se aproveitam da conivência
segundo esta pesquisa, essa área pela rodovia BR-222, pela linha e submissão do Estado, das pre-
contará com 817.268 habitantes [11]. de transmissão de energia elétri- cárias condições em que vive a
Os migrantes que ali che- ca de alta tensão da Eletronorte, maioria da população dos muni-
gam diariamente, sem alternativa, que sai de Tucuruí rumo ao nor- cípios onde elas se instalam, para
se aventuram na formação de no- deste brasileiro, e pela Estrada através da manipulação da consci-
vos bairros (ocupações) compos- de Ferro Carajás. Agora se vêem ência das pessoas, com o discurso
tos por casas, às vezes precárias, na iminência de ter parte do seu da chegada do desenvolvimento e
sem água encanada e sem esgoto território inundada pela hidrelé- do progresso, criar um ambiente
sanitário. São, em sua maioria, trica de Marabá, no rio Tocantins. favorável para sua implantação e
trabalhadores pobres, analfabe- Os Xikrins do Cateté estão sendo domínio. Desse modo, os gover-
tos ou de baixa escolaridade, sem ameaçados pela Vale a partir da nantes municipais, governadores
profissão definida. execução dos projetos Salobo, de dos estados e não raros deputados
Os povos indígenas es- extração de cobre, no município e políticos influentes assumem o
tão sendo cercados, não somen- de Marabá, e pelo projeto de ex- discurso e a defesa dessas empre-
te pelos latifúndios e exploração tração de níquel na Serra do Puma, sas além de lhes possibilitar infra-
madeireira, mas também pela ex- em Ourilândia do Norte. Além de estrutura, colaboração financeira
ploração mineral. O próximo alvo impactar diretamente sobre esses e isenções tributárias, com vistas
do setor minerário é conseguir a povos que ali habitam, são sérios a fornecer-lhes condições com-
liberação da mineração em ter- os riscos de degradação ambien- petitivas e asseguratórias ao bom
ras indígenas, que ocupam hoje tal com alterações significativas à funcionamento dos seus empreen-
22% do território amazônico. [12] biodiversidade. dimentos.

65
Uma das situações emble- de Barcarena (PA), têm causado dos do Projeto de Assentamento
máticas que até hoje tem gerado enormes prejuízos às comunida- Cinturão Verde, município de
conseqüências negativas ao meio des locais com o carreamento de Marabá. Os serviços de prospec-
ambiente e à população local é a poluentes compostos com dióxido ção efetivados pela empresa têm
exploração do manganês, em Ma- de alumino e soda cáustica para contaminado nascentes de águas
capá, no estado do Amapá. De- os cursos d’água. A Pará Pigmen- e danificado estradas e cercas de
pois da retirada de quase todo o tos S/A (PPSA) é outra empresa arame dos camponeses. A Mine-
minério, crateras de até 170 me- que tem causado sérios danos am- ração Buritirama S/A, instalada
tros de profundidade ficaram a bientais às comunidades no norte dentro desse mesmo assentamen-
céu aberto. Enormes também são do estado do Pará. O beneficia- to vem contaminando as águas dos
os estoques de rejeitos. “Calcula- mento de caulim, no município de igarapés Bandeira e Grotão com a
se, que em Santana, estão estoca- Ipixuna tem contaminado cursos exploração do manganês. Traba-
das cerca de 70.000 toneladas de d’água afetando tragicamente as lhadores têm reclamado que no
rejeito provenientes do processo comunidades ribeirinhas. A Vale período chuvoso os rejeitos pro-
de pelotização e que apresenta tem trazido sérios prejuízos às venientes da lavagem do minério
um percentual de arsênio supe- comunidades de quilombolas de têm alcançado os cursos d’água,
rior ao encontrado no minério in Jambuaçú e outras comunidades impossibilitando o seu uso.
natura. A Fundação Evandro Cha- dos municípios de Acará e Mojú Em 2003, a mineradora
gas (Belém), depois de inúmeros com a construção de 180 quilô- Canico do Brasil, da Specific In-
exames laboratoriais, recomenda metros de mineroduto (transporte ternational Scientific Cooperation
a imediata retirada desses rejei- de bauxita) e linhas de transmis- Activities (INCO), empresa cana-
tos para que não se tenha risco de são de energia elétrica. Não só a dense, proprietária dos direitos
contaminação de qualquer natu- produção agrícola foi prejudicada, minerários do projeto de extração
reza às pessoas ou comunidades mas vilas e povoados foram im- de níquel nas serras do Onça e do
próximas a estes locais”. [13] pactados diretamente pelos em- Puma, no município de Ourilân-
Em Oriximiná (PA), a Mi- preendimentos. dia do Norte, sul do Pará, expul-
neração Rio Norte (MRN) que Casos notórios são tam- sou 82 famílias através de compra
explora as reservas de bauxita bém aqueles causados pela Vale ilegal dos lotes nos projetos de
nesse município, provocou de- no sudeste do Pará. A explora- assentamentos Campos Altos e
gradação do meio ambiente com ção do ouro no igarapé Bahia es- Tucumã, danificou reservas flo-
os rejeitos da mineração a partir palhou substâncias químicas na restais, contaminou os igarapés
da emissão de partículas sólidas e região por conta do uso de soda e desestruturou a comunidade
material estéril, como argila, bau- cáustica e cianeto para a separa- com os serviços de pesquisas. Em
xita fina e areia. O maior desastre ção do minério da rocha primária. 2006, a Vale adquiriu o controle
foi causado no lago do Batata. As Não muito distante, a empresa do projeto e continuou causando
populações locais, formadas em construiu uma barragem de con- danos ambientais, econômicos e
sua maioria por camponeses e ri- tenção no igarapé Gelado para o sociais, inviabilizando a vida de
beirinhos foram alijadas de seus barramento de rejeitos oriundos centenas de famílias assentadas
direitos sobre as áreas de casta- da exploração do minério de ferro que ainda resistem nos referidos
nhais que ficam ao norte da Flo- na Serra de Carajás. Em 1992 esta assentamentos. Agora essa em-
resta Nacional de Sacará-Taquera, barragem transbordou e inundou presa pleiteia a expulsão de mais
onde a mineradora está situada. áreas de camponeses da região 93 famílias assentadas. A direção
Já a Alumínio Brasil S/A (AL- causando sérios prejuízos econô- nacional do Instituto de Coloniza-
BRAS) e a Alumina Norte Brasil micos e ambientais. Desde então ção e Reforma Agrária (INCRA)
S/A (ALUNORTE), grandes pro- são ameaçados por outras inunda- tem sido totalmente conivente
dutoras nacionais de alumina e ções. Recentemente esta empresa com os desmandos da empresa e
alumínio instaladas no município tem causado danos aos assenta- omisso no que diz respeito aos di-

66
reitos dos trabalhadores rurais. energia elétrica da Vale para que usada pela Vale, que dá acesso à
As empresas de mineração a empresa concordasse em nego- área de mineração da Serra Onça,
na Amazônia são beneficiadas ciar as compensações pelos danos onde a empresa iniciou trabalhos
pela Lei Complementar nº 87, de ambientais, sociais e econômicos para a extração de níquel. Os
1996, também conhecida como causados em seu território com a trabalhadores só deixaram o lo-
Lei Kandir. Como elas exportam construção de um mineroduto que cal depois que representantes da
produtos considerados matérias- leva bauxita de Paragominas para Companhia se dispuseram a dis-
primas são isentas de pagar Im- Barcarena. cutir com a comunidade os pro-
postos sobre Circulação de Mer- Na região de Carajás, em blemas sociais e ambientais cau-
cadorias (ICMS). Os valores dos junho 2003, os índios Xicrin com sados por ela.
royalties ou da Contribuição Fi- flechas e bordunas ocuparam as No final de janeiro de 2009,
nanceira pela Exploração de Re- instalações do Projeto Sossego, em Juruti, oeste do Pará, trabalha-
cursos Minerais (CFEM) repassa- da Vale, em Canaã dos Carajás, no dores atingidos pela extração e
do pelas empresas aos municípios sul do Pará. Eles exigiam a cons- transformação de bauxita pela mi-
são extremamente baixos. Eles trução de uma estrada até a aldeia, neradora ALCOA iniciaram ferre-
variam entre 1 e 3% do fatura- escola e casas. Haviam-se com- nha luta pelos seus direitos. Uma
mento líquido. Como os cálculos pletado dez anos de promessas manifestação que começou com
são feitos pelas próprias empresas não cumpridas da empresa às al- 800 trabalhadores, terminou com
mineradoras, a União, o Estado e deias Cateté e Djudjecô [15]. Em 2.500. A manifestação que durou
os municípios são lesados. O mu- outubro de 2006, os Xicrin ocupa- uma semana, resultou numa ne-
nicípio de Parauapebas (PA), após ram por mais de três dias a mina gociação entre os trabalhadores
uma auditoria, identificou que foi de ferro de Carajás na tentativa de e o representante da empresa en-
lesado pela Vale em mais de 700 obrigar a Vale a negociar valores volvendo órgãos estaduais e os
milhões, como a Vale não se pro- referentes a direitos dos índios, ministérios públicos estadual e
põe pagar, a reclamação está na em decorrência dos impactos so- federal.
justiça [14]. fridos pelo projeto Ferro Carajás. Se por um lado é possível
No final de 2007 e início de 2008, perceber que os amazônidas e os
4 – Resistências povos indígenas e trabalhadores movimentos sociais vêm toman-
rurais ligados ao Movimento dos do consciência dos impactos dos
Em quase todas as regiões Trabalhadores Rurais Sem Terra projetos de mineração, por outro,
onde se desenvolvem trabalhos (MST) e à Via Campesina fize- lideranças e suas organizações so-
de extração e de transformação ram várias manifestações com frem com o processo crescente de
mineral pelas grandes empresas ocupações dos trilhos da Estrada difamação, ameaças e criminali-
do ramo, com apoio quase que in- de Ferro de Carajás administrada zação, orquestrado pelas minera-
condicional do Estado, os movi- pela Vale. Essas ações culmina- doras, grupos políticos ligados a
mentos sociais têm demonstrado ram com a criação do Movimento elas, os meios de comunicação e o
alguma reação. Os camponeses, dos Trabalhadores na Mineração poder judiciário. Devido a Prela-
sobretudo, têm implementado, (garimpeiros) e o lançamento de zia do Xingu, através do seu bispo
embora que em âmbito local, di- um manifesto intitulado Manifes- Dom Erwin Klauter, ter se colo-
versas ações contrárias a esta ló- to da Mobilização dos Campone- cado em defesa das comunidades
gica perversa do capital. ses de Marabá. indígenas e contra a construção
Na região Guajarina, pro- Em setembro de 2008, no da hidrelétrica de Belo Monte, no
ximidades de Belém, as comuni- município de Ourilândia do Norte, Rio Xingu, o religioso vem sen-
dades quilombolas do Jambuaçu, mais de 200 trabalhadores rurais do vítima de uma campanha de
no ano de 2006, após muitos dias dos Projetos de Assentamento difamação movida pelos meios
de mobilização e protesto, derru- Tucumã e Campos Altos, interdi- de comunicação ligados à Vale e
baram uma torre de transmissão de taram, por três dias, uma estrada tem sido ameaçado de morte ten-

67
do, inclusive, que andar protegido por esta razão, deveriam ser con- corporações todo seu aparato jurí-
por policiais militares. denados. dico e policial, para facilitar a im-
No Sudeste do Pará, o plantação dos empreendimentos
advogado da CPT, José Batista 5 – Considerações Finais e seu funcionamento ao mesmo
Gonçalves Afonso, que atua na tempo que reprime e repreende os
defesa dos trabalhadores e lide- As características do ca- movimentos sociais que venham
ranças indiciadas ou processadas pitalismo são as mesmas em a se opor a esta lógica.
qualquer parte do mundo: con- É necessário e urgente fa-
em decorrência de conflitos com
centração dos meios de produ- zer com que os bens naturais da
a Vale, foi vítima de uma conde-
ção; desenvolvimento das forças Amazônia sejam colocados à dis-
nação pela Justiça Federal de Ma-
produtivas; exploração da força posição de seus povos e não para
rabá, em junho de 2008. Ele foi
de trabalho; acumulação da mais- aumentar os lucros das grandes
condenado a uma pena de 2 anos valia por poucos; e geração de po- empresas. Os minérios, ao contrá-
e 5 meses de prisão sem direito à breza e miséria para a maioria.
pena alternativa. Acredita-se que rio do que vem acontecendo até o
Na Amazônia, a expansão momento, devem gerar benefícios
a pesada condenação imposta da exploração mineral, como foi para as populações locais e dimi-
pelo juiz foi em razão da atuação demonstrada, nada mais é do que nuir as desigualdades e a pobreza.
do advogado em defesa dos traba- a expansão do próprio capitalis- Não é justo e nem lícito que as
lhadores e contra os interesses da mo destruidor e perverso, que ex- empresas com direta participação
Companhia. Nessa mesma região, propria e explora intensivamente do Estado continuem causando
em setembro de 2008, uma lide- a terra, as águas, as florestas e a sérios prejuízos às comunidades
rança do MST e duas lideranças força dos trabalhadores. camponesas e ao meio ambiente.
do Movimento dos Trabalhado- São projetos baseados no Não interessa para a so-
res na Mineração (garimpeiros) extrativismo, de curta duração, ciedade amazônica a extração e
foram condenadas pelo mesmo que não agregam riquezas para as transformação mineral, na forma
juiz ao pagamento de uma multa localidades, mas desestruturam re- de saque como está sendo feita,
de 5 milhões e 200 mil reais por lações de trabalho, comunidades com a geração de crateras que ja-
elas terem participado de mobili- e desterritorializam pessoas num mais possam ser recuperadas. Não
zações que resultaram na interdi- processo de estruturação de uma interessa os rejeitos tóxicos, as
ção da Estrada de Ferro Carajás. sociedade do caos: aglomerados matas devastadas, o solo e águas
Contrariando o que diz a própria populacionais com alto índice de poluídas. Pelo contrário, torna-se
Lei, o juiz atribui às três pessoas desemprego, criminalidade, com um desafio a desconstrução do
uma condenação que, teria que péssimas condições de habitação, atual modelo imposto pelo capi-
ser aplicada a cada uma das qui- saneamento básico e educação. tal e a construção de um modelo
nhentas pessoas que participaram O Estado, entreguista e ar- sustentável e racional de aprovei-
da interdição. A explicação do recadador de migalhas na defesa tamento dos recursos minerais na
juiz é que eles eram lideranças e, do capital, coloca à disposição das Amazônia.

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6 – Bibliografia

CRUZ NETO, Raimundo Gomes da. Impacto so- 21 [5] Fórum Paraense de Desenvolvimento. 50
cioambiental da mineração na região de Carajás, anos de mineração na Amazônia. Belém: Cejup,
Marabá: CEPASP, 2008 (Fotocópia). 2003.

CVRD e Diagonal. Diagnostico Integrado em So- 22 [6] A situação dos minérios mais extraídos na
cioeconomia para os empreendimentos da CVRD. Amazônia é esta: em primeiro lugar, o ferro, que em
2008, respondeu por 35,2% do total nacional. Em
2006.
segundo lugar, a alumina (bauxita) com 17,6%, em
terceiro, o alumínio com 15,1% e em quarto, o cobre
CORREIO DO TOCANTINS, Marabá, 10 a
com 11,3%. O manganês da Mina do Azul, em Cara-
12/01/2009.
jás, e da Buritirama, em Marabá, contribuíram com
mais de 50% da extração nacional, dos 2,4 milhões
INSTITUTO BRASILEIRO DE MINERAÇÃO
de toneladas extraídas em 2008. O estado do Pará
(IBRAM). Informações e Análises da Economia
Mineral Brasileira, 3ª edição, IBRAM, 2008. é ainda responsável por 100% da extração nacional
do caulim, 85% da bauxita, 60% do cobre e 10% do
__________. Indústria da Mineração, IBRAM, Ano ouro (Companhia Vale do Rio Doce. Relatório de
III, nº. 20, 2008. Produção, 2008).

FÓRUM PARAENSE DE DESENVOLVIMENTO. 23 [7]O município de Parauapebas, no sudeste pa-


50 Anos de Mineração na Amazônia, Belém: Cejup, raen
2003. se, participou com 35,8% (minério de ferro), Bar-
carena com 33,3% (alumina e alumínio), Canaã dos
O LIBERAL, Belém, 13/06/03. Carajás com 10% (cobre), Marabá com 7,1% (ferro
gusa e manganês), Oriximiná com 6,3% (bauxita),
SANTOS, Breno Augusto dos. Recursos Minerais contribuindo significativamente para o crescimento
da Amazônia, 2002.
do Produto Interno Bruto (PIB) estadual. O muni-
cípio de Belém participou com 28,21%, para o PIB
SCHMINK, Marianne and WOOD, Charles H.
do estado, em segundo lugar, Barcarena com 8,03%,
Contested Frontiers in Amazonia. New York: Co-
lumbia University Press, 1992. Parauapebas com 6,72%, Marabá com 5,91%, Ana-
nindeua com 5,56%, Canaã dos Carajás com 1,58%
_______________________________________ e Oriximiná com 1,42%.

17 [1] Historiador e Agente da Comissão Pastoral 24 [8] Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM).
da Terra, em Marabá. Informações e Análises da Economia Mineral Bra-
sileira, 3ª edição, IBRAM, 2008.
18 [2] Advogado e Agente da Comissão Pastoral da
Terra, em Marabá. 25 [9] O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e
dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) já la-
18 [3] Sociólogo e Agrônomo do Centro de Educa- vrou 56 autos de infração contra a Vale, desde que
ção, Pesquisa e Assessoria Sindical e Popular. foi privatizada, o que resultou em 37 milhões de re-
ais em multas não pagas.
20 [4]Marianne Schmink and Charles H. Wood Con-
tested Frontiers in Amazonia. New York: Columbia 26 [10] Os registros mostram que na área de influên-
University Press, 1992. cia da Vale, no sudeste paraense (municípios de Ma-

69
rabá, Parauapebas, Canaã dos Carajás, Eldorado dos dade em território indígena.
Carajás, Curionópolis, Ourilândia do Norte e Tucu-
mã), as mortes por causas violentas aumentaram em 29 [13] (Fórum Paraense de Desenvolvimento. 50
23% de 2007 para 2008, considerando os corpos que Anos de Mineração na Amazônia, Belém: Cejup,
passaram pelo Instituto Médico Legal (IML) de Ma- 2003).
rabá. No ano de 2008, os municípios de Marabá e
30 [14] Em 1997, do faturamento de mais de 2 bi-
Parauapebas foram os que mais registraram mortes
lhões de dólares das empresas com a movimentação
por assassinato. Marabá saltou de 187 assassinatos, da bauxita extraída, em Oriximiná, e da produção
em 2007, para 266, em 2008, e Parauapebas, saltou de alumínio, em Barcarena, somente 30 milhões de
de 62, em 2007, para 94, em 2008 [10]. dólares foram recolhidos aos cofres públicos, o que
representa apenas 1,5% do faturamento. Em 2008, o
27 [11] CVRD e Diagonal Urbana Consultoria. recolhimento de 700 milhões de reais representou
Diagnóstico Integrado em Socioeconomia para os somente 1,44% do faturamento. Significa que nem
empreendimentos da CVRD. 2006. os 2%, como manda a Lei que determina o valor da
CFEM, para o caso da bauxita, está sendo cumpri-
28 [12] Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto do.
de Lei 1610/96 com o objetivo de regulamentar o
art. 231 da Constituição Federal que impede a ativi- 31 [15] O LIBERAL, Belém, 13/06/03.

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