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* Mestranda em Sociologia pela USP, pesquisadora;jinior do Instituto de Est dos Econémicos Sociais ¢ Politicos ADESP) "E preciso lembrar que as interpretagSes, ‘para os dois autores, bem como suas cconcepgdes de poder e de discurso de- correm de varias pesquisas concretas, no sio posturas teéricas construfdas a priori, Tanto um quanto o outro se re- ccusam a elaborar teorias que expliquem toda a Sociedade e historia. Av contririo, circunserevem suas conclusdes e inter ‘retagBes aos objetos analisados. Sobre a auséacia de uma teoria do poder em Foucault ver: MACHADO, Roberto- “A Genealogia do Poder” In MACHA- DO, Roberto. Cidncla e Saber: a trajet ria da arqueologia de Foucault. RJ, Graal, 1982, p 194. S EFEITOS DOS DISCURSOS: SABER E PODER PARA MICHEL FOUCAULT E PIERRE BOURDIEU Ana Paula Cavalcanti Simioni* Iyrropucao ‘A comparagio das posturas metodolégicas de Pierre Bourdieu e Michel Foucault é tarefa trabalhosa e extensa. Assim, foi preciso circunscrever um problema comum ao conjunto de seus escritos e, para tanto, elegen-se os propésitos desses autores no que se refere aos seus projetos de pesquisa. Tais projetos, ainda que de diferentes modos, se referem & uma nova concepgao de poder, subjacente a ambas as abordagens, ¢ uma postura original em relagio ao tratamento dos discursos. Mais do que isso, a relagdo entre 0 exercicio dos poderes ¢ a positividade dos discur- sos (saberes) 6 0 solo comum em que ambos ancoram suas anéli- ses de fenémenos hist6ricos e sociais concretos.' Plural; Sociologia, USP, 8, Paulo, 6: 103-117, 1.semm, 1999) 103 Neste artigo pretende-se tragar as divergéncias e con- vergéncias dos projetos de cada um dos autores supra-referidos, mais especificamente naquilo que denominam por genealogia, ou seja, a busca pela génese das estruturas mentais, sociais ¢ hist6ri- cas, Apés isso ter sido feito esboga-se uma reflexio sobre as ino- vagdes que esses tipos de abordagens sugerem com referéncia a0 tratamento dos discursos. A CONTEMPORANEIDADE DE FOUCAULT E BOURDIEU Embora separados por uma geracdo intelectual’, tanto Foucault quanto Bourdieu podem ser considerados autores con- temporfineos, filhos das transformagSes do mundo do pés-guerra € herdeiros dos impavtos de Maio de 68, momento em que, como diz Foucault, apareceu a coneretude’ do poder. Para Michel Fou- cault foram as lutas de bases € as lutas estudantis que colocaram ‘em xeque 0 postulado de que 0 poder era aquilo que se exercia pelo Estado. Tal movimento tornou visivel que o exerefcio do poder nfo apenas uma atividade estatal e, portanto, macro, mas que se faz de diversas formas, em diversos locais, realizando-se nas microestruturas. Esse tipo de abordagem os incita a uma mudanga em referéncia as andlises tradicionais do poder: em primeiro lugar o poder nao é posse, e sim exercicio constante, que se realiza de varias maneiras ¢ em locais distintos; nae pode, assim, ser um atributo exclusivo do Estado. O legado marxista vé nas lutas de classes a origem da desigualdade e do poder e no Estado 0 locus em que esse poder se concentra, bastando portanto a tomada do poder por uma nova classe para que se transforme e modifique a Sociedade. Contra tal tipo de abordagem os herdeiros de Maio de 68 contrapoem uma nova concepgao do poder em que ele é visto como relagio, exer cicio e algo que est presente, de forma disseminada, em toda a sociedade, No caso de Foucault a concepgao de poder menciona- da se eviden Os efeitos dos discursos: saber e poder para Michel Foucault ¢ Pierre Bourdieu ‘Ana Paula Cavalcanti Simoni Ver Bourdiew, sre - Coivas Dita - SP, Brasiliense, 1990. p.16, Em entrevista 0 autor se inclu na tadigdo estruturalista {de Althusser e Foucault mas se separa deles, dizendo que fos um de seus alunos fe que rejeitou a crtica que fazem do hu ‘manismo, 0 que the pareceu aim mods: mo desta geragio. FOUCAULT, Michel - Ui diatogo sobre el Poder ~ Buenos Aites, Alianza Edito rial, 1990. p. 153 104 Plural; Sociologia, USP, S. Paulo, 6: 103-117, Lsem, 1999) (Os efeitos dos discursos: suber e poder para Michel Foucault e Pierre Bourdieu ‘Ana Paula Cavaleanti Simioni Bourdieu como algo presente nos campos sociais como reco- nhecimento, ‘Mas a contemporaneidade cronolégica de ambos nao os leva a uma reflexdio comum apenas sobre a questio do poder. O mesmo acontecimento, Maio de 68, demonstrou que nas universi- dades, nas escolas, nos liceus, enfim, em todas as instituigdes con- sagradas ao ensino e ao saber (até aqui no singular) havia poder, dominagao, sujeigao. Ou seja, o saber, compreendido como algo verdadeiro e superior até entdo, nao era neutro e nem um antido- to as relagdes de dominagao. Também ele estava imerso nas ma- Ihas do poder, exercia uma sujeigao dos individuos. Tal constatagdo os leva, novamente, a rupturas comuns, dessa vez com o postulado da Verdade, ou melhor, do saber cien- tifico como 0 tinico verdadeiro, Segundo Foucault e Bourdieu, 0 discurso da ciéncia hierarquiza, impde sua maneira de saber como superior a todas as demais e, dessa maneira, exerce uma domi- nagio no Ambito dos enunciados ao definir quais so os verda- deiros e os falsos, os superiores e os inferiores. Se a atividade cientifica, por si $6, ja exerce o poder, seus efeitos so ainda mais sérios. Os discursos cientificos servem para normatizar a sociedade, definir quem é € quem nao é normal (como fazem a psicologia e a sociologia), quem faz e quem ndo faz arte (como determina a estética), isto para citar alguns exemplos. Esse tipo de contestagiio os leva a se desfazerem da nogaio de que os di Cursos cientificos sao os portadores de uma racionalidade neutra, objetiva e isenta, que se opde A escuridao, ao velamento e ignordn- cia dos poderes. Os pronunciamentos da ciéncia si saberes que servem ao poder na medida em que fazem circular verdades que hierarquizam e normatizam a sociedade, através dos ditos e escritos do corpo de especialistas que realizam as enunciagdes cientificas. Para Foucault e Bourdieu, os enunciados articulados nao pairam nos céus, a Verdade nao esté nas alturas. Os discursos € seus efeitos séio, para ambos, historicamente e socialmente inseri- tos; 0 que equivale a dizer que a Verdade enquanto tal nao existe, a0 contrério, existem verdades construidas no tecido da historia. Plural; Sociologia, USP, 8, Paulo, 6: 103-117, Lem, 1999 vos possivel, assim, se fazer uma hist6ria da verdade ou das lutas pela definigao do que é verdadeiro. O sujeito de conhecimento enquan- to portador da Verdade sobre o mundo, seguindo este raciocinio, nao existe, Ele € antes uma invengao hist6rica e, como tal, seu dis- curso esta limitado por elementos que Ihe sio exteriores‘. ‘A concubinagem entre saberes (discursos) ¢ poderes, por um lado, e a concepgdo de poder enquanto relagio, por outro, sio 08 dois principais alicerces ¢ resultados das empresas geneal6gi- cas realizadas por um e por outro autor. Até aqui procurou-se delinear, em suas grandes linhas, os marcos de convergéncia das propostas de pesquisa de Foucault e Bourdieu, agora faz-se neces- sério um exame atento as especificidades da andlise geneal6gica em cada um dos casos; o detalhe, nestes casos, encerra uma vasta gama de divergéncias que serdo tratadas a seguir. O PROJETO GENEALOGICO DE MICHEL FOUCAULT Por que projeto genealégico e nao simplesmente genealo- gia? Por projeto entende-se a dimensio consciente, proposital de uma empreitada, ou seja, o que se pretende aqui é estabelecer quais os objetivos das pesquisas de M. Foucault e nao propria- mente 0 que foi por elas atingido (que pressuporia uma andilise exaustiva de “Vigiar e Punir” e da “Historia da Sexualidade 1”, principais obras de sua fase genealégica). Em “Genealogia e Poder” o autor esclarece quais seriam as finalidades tiltimas das pesquisas geneal6gicas:1) eliminar a tirania dos discursos englobantes; 2) ativar os saberes locais, ilegt timos; 3) empreender uma andlise histérica das condigées politi- cas de possibilidade dos discursos e 4) analisar os efeitos do poder’, Esses quatro objetivos sao inextricavelmente vinculados mas foram momentaneamente separados para fins de andlise. Valeria entao indagar o que significa cada uma destas formulagdes , para tanto, é preciso compreender as chamadas “precaugdes metodolégicas” estabelecidas por Foucault em “Vigiar e Puni Os efeitos dos discursos: saber ¢ poder para Michel Foucault e Pierre Bourdieu ‘Ana Paula Cavalcanti Simioni ‘As aficinages acima foram elaboradas a partir da leitura de; FERRY, Luc & RENAUT, Alain ~“O tipo ideal dos six ties filosofantes” In —. Pensamento 68. ensaio sobre 0 anti-humanismo conten pordneo, Sio Paulo, Ed. Ensaio, 1988. Ver pp. 26-38. FOUCAULT, Michel ~ A Microfisiew do Poder Rio de Janeiro, Fd, Graal, 1989 ad, org. sel. Roberto Machado} MACHADO, Robeno, op. cit p. 188 06 Phural; Sociologia, USP, S. Paulo, 6: 103-117, 1sem. 1999) saber ¢ poder para Michel Foucault e Pierre Bourdieu ‘Ana Paula Cavalcanti Simioni sta é a mancira pela qual Foucault se refere aos intelectuais em “Un dialogo sobre el poder” In FOUCAULT, Michel Un Dialog Sobre et Poder. Alianza Ea {orial, 1990, 9. Nesta entrevista 0 autor firma que os intelectuais formam parte do sistema de poder, sio agentes da feonscigncia e dos discursos que forma, este sistema, Daf decorre que a teor no ¢ teoria pura, € antes prtica, exerci io do poder de estabelecer verdad. [to ¢ fil precisar quais sfo os agentes pronunciadores dos discursos. ao meu ver una difculdade ainda nao solucionad, Plural; Sociologia, USP, 8. Paulo, 6: 103-117, Ise Nesse texto diz Foucault que os tiltimos anos tém trazido tona uma irrupgdio de novos saberes, uma produgio intelectual auténoma nao centrada nas instituigdes tradicionais (liceus, uni- versidades, centros de pesquisa etc.), vista sempre como ilegitima pelos “agentes da consciéncia ¢ do discurso™. A genealogia, se- gundo o autor, nasceu da jungdo de um saber erudito € da meméria dos combates (denominagdo que 0 autor imputa ao saber desquali- ficado pelas instncias legitimas), ou seja, teve como pressuposto © mesmo objetivo que pretende atingir: 0 fim do monopélio da Verdade absoluta da ciéncia globalizante (referéncia direta & maneira de fazer ciéncia que se desenvolve desde o século XIX, como por exemplo 0 marxismo). O primeiro aspecto das precaucdes metodol6gicas deixa transparecer que 0 projeto sub-repticio € 0 de reativar os varios saberes antes vistos como ilegitimos ou desqualificados pelos cientistas, ou seja, recolocar os varios discursos formulados — e excluidos — ao longo da histéria, no Ambito da propria histéria Assim, para se tragar a histéria das prises nao se recorrerd ape- nas aos discursos elaborados pelos juristas durante os séculos XVI, XVIII e XIX, a genealogia nao busca “o que de fato acon- teceu” tio-somente no discurso competente. E preciso buscar a historia nos discursos dos médicos, das nascentes humanidades, nos quartéis, nas escolas, nas fabricas etc.” O que significa, primeiramente, romper com 0 monopélio de verdade das instituigdes cientfficas, que passam a ser as res- ponsdveis pelas formulages de discursos dentre outros discursos, saberes entre outros saberes, sem hierarquia. Em segundo lugar, restituir & hist6ria os discursos antes vistos como incompetentes e, portanto, relegados ao siléncio. E contra o efeito de poder que a centralizagiio da verdade garante que se insurja 0 projeto genealé- gico de Foucault. Como ele proprio afirma: .) Trata-se de ativar saberes locais, descontinuos, des- qualificados, ndo legitimados, contra a instdncia tebrica unitéria que pretenderia deputé-los, hierarquizd-los, ordend-los em nome 999 07 de um conhecimento verdadeiro, em nome dos direitos de uma ciéncia detida por alguns. As genealogias ndo sao, portanto, retornos positivos a uma forma de ciéncia mais atenta ou mais Trata-se da insurreigao dos saberes exata, mas anticiéncias. (. ndo tanto contra os contetidos, os métodos ¢ os conceitos de wna ciéncia, mas de uma insurreigao dos saberes antes de tudo contra 08 efeitos de poder centralizadores que estdo ligados @ instituigao ao funcionamento de wn discurso cientifico organizado no inte- rior de wma sociedade como a nossa...) Sdo 0s efeitos de poder préprios a um discurso considerado como cientifico que a genealogia deve combater” (FOUCAULT, 1989: 171). Segundo a citagdo unem-se os dois primeiros objetivos do projeto. Para relativizar a Verdade produzida pelos discursos tidos como legitimos 6 preciso recolocé-los como 0 que so: discursos entre outros discursos. E, por outro lado, ao fazé-lo ja se esté inserindo na histéria os saberes locais, tradicionalmente vistos pelas instancias “competentes” como desqualificados ou ilegitimos. Fou- cault, ao recuperar os diversos enunciados como igualmente rele- vantes no Ambito dos saberes, est relativizando a eiéneia como 0 Linico discurso verdadeiro e, nesse sentido, realizando seu terceiro objetivo: lutar contra os efeitos de poder que as verdades exercem.’ Em “O Nascimento da Clinica” Foucault se propoe a analisar a fomacdo dos enunciados médicos e a mudanga destes a0 longo dos séculos XVII, XVIII e XIX. A partir de um exame detalhado dos discursos médicos, observa a formagao de um novo tipo de concepgo sobre a medicina que incidira sobre a doenga, sobre 0 corpo ¢, finalmente, desembocaré num novo tipo de prati- ca: a clinica, Em “Verdad y Poder” o autor esclarece que seu objetivo, naquele trabalho, é 0 de descrever uma nova politica do enunciado cientifico que esti se configurando naquele momento Para Foucault, ndio basta apenas saber que novo discurso € este Ele se interessa, sobretudo, pela circulagaio de verdades que esses discursos possibilitam. Isto porque é em nome de tais verdades 108 Plural; Sociologia, Us Os efeitos dos discursos: saber poder para Michel Foucault e Pierre Bourdieu ‘Ana Paula Cavalcanti Simioni Certamente Foucault nao analisa apenas discursos em "Vigiare Punt”, ele trabalha também com o aumento demogritico, ‘on 6 novo sistema produtivo no momen oem que vé surgi o poder diseiplinar. FOUCAULT, Michel. op. cit. 1990, p.133, 5. Paulo, 6: 103-117, 1sem, 1999 Os efeitos dos discursos: saber e poder para Michel Foucault e Pierre Bourdieu ‘Ana Paula Cavaleanti Simioni “FOUCAULT, M. “Disciplina” In — Vipiar e Punir historia da violencia nas prisdes. PetrSpolis, Vores, 1987. pp. 164-172. que se exerce 0 poder, por exemplo, de definir quem & normal e quem nio 0 €, quem deve ser medicalizado e quem nao necesita ser objeto de cuidados médicos. Em “Vigiar e Punir”, mais precisamente na sua tercei parte denominada “Disciplina”, o autor analisa o dispositivo di ciplinar denominado Exame"’: procedimento que retine as técni- cas de vigiar, classificar, qualificar, estabelecer distingdes entre que é ou no normal e, finalmente, punir. O médico, o psiquiatra, © psicélogo encarregados do exame submetem o examinado ao seu olhar que disseca, classifica, hierarquiza e pode estabelecer 0 que deve e o que nio deve ser punido (ou medicado). Este peque- 1no ato € entio o momento em que se estabelece a verdadeira con- digdo do examinado, é em nome de tal parecer que se pode agir sobre seu corpo, seja no intuito de curilo, seja no de puni-lo. A verdade, no caso, passaporte para a realizado do poder. Por outro lado, o procedimento do exame é acompanhado de documentos e registros sobre os examinados, indicando uma ° acumulagio de saberes engendrados através desse dispositivo Analisar, descrever, levantar os tragos particulares do individuo tomam-no um objeto descritivel e compardvel a outros, 0 que pos- sibilita a estimativa dos desvios numa populagao. Foi o exame um dos viabilizadores do nascimento das eiéncias humanas. Saberes, verdades © poderes esto, assim, completamente interligados. A verdade é um dos efeitos do poder, assim como o poder nec das verdades, da crenga nas verdades, para que circule e interve- nha nos corpos. Quando a genealogia se propde a anal ar as condigdes politicas de formacdo dos discursos, isto é, 0 porqué destes discur- sos, tem em vista demonstrar a relagio de consubstancialidade entre 8 saberes e os poderes. O saber se encontra dotado de poder, inclu- sive institucionalmente, é enquanto se tem saber (ou nos termos de Bourdieu, competéncia) que se tem poder. Ao mesmo tempo toda a de poder exige um campo de saber para seu exereicio, como ber ao passo rela JA fo} visto no caso do “exame” , dispositive que gera que realiza o poder. Como diz Roberto Machado: Plural; Sociologia, USP, . Paulo, 6: 103-117, Lem. 1999 109 “O que faz a genealogia é considerar o saber-compreen- Os estos dos dieconon, saber me dido como materialidade, como prética, como acontecimento” — oe paula Cavaleant Sion como peca de um dispositive politico que, enquanto dispositive, se articula com a estrutura econdmica. Ou, mais especificamente, a questiio da genealogia tem sido a de como se formaram dominios de saber a partir de praticas politicas disciplinares” (MACHADO, 1988:198). Finalmente, 0 quarto ¢ tltimo objetivo se refere aquilo que ja foi mencionado anteriormente: o deslocamento em relagao as anfilises tradicionais do poder, que 0 tomam como um atributo exclusivo do Estado. Contra essa concepgao, Foucault desenvolve a nogo de poder disciplinar, que é ao mesmo tempo um aconteci- mento na histéria e uma maneira de 0 autor se contrapor &s tradi- Ges da filosofia e da ciéncia politica". A disciplina é um tipo de organizagao do espago, um con- trole do tempo; tem como principal instrumento a vigilancia © implica num registro continuo de conhecimentos. Nao é, assim, uma instituig&o, um aparelho ou uma norma estatal. Ela atravessa as instituigdes, os aparelhos, os corpos dos individuos e o Estado. £ uma rede sem fronteiras definidas, que nfo tem seu centro de origem em lugar algum, mas que est4 em todos os corpos (cabe notar que é contra este tipo de abordagem que Bourdieu se opde), atuando sobre eles minuciosamente — sobre seus habitos, discur- sos, gestos ete. — de forma a disciplind-los. E disciplinar signifi- ca transformar os corpos em forga titil economicamente ¢ retirar sua forga politica, sua capacidade de oposigao ¢ de luta, em uma tinica palavra, docilizé-los. Nessa concepgao 0 poder nao é visto como atributo mas como relaciio. Nao € algo que se possui, nao é um objeto, mas sim um elemento que se exerce nas ¢ pelas relagdes sociais. Por outro lado, nao deve ser visto apenas como repressivo, como aquele que interdita, que diz. nfo, Ele € também criativo, constitui positivi- dades: saberes, praticas, corpos déceis, verdades etc. Dito isto, entende-se que analisar os efeitos de poder significa estudar os no Plural; Sociologi ‘A nogio de acontecimento, embora mu 10 importante para a genealogia de Fou ‘eat, no foi aguitrabalhada. Mas pode- se dizer que se refere A nova abordagem dda histéria que tem o autor. Sinifica ra buathar com a originalidade dos evento ¢ ‘o.com a historia tradicional que 0s dis solve num processo. Cf, FOUCAULT, 1990, p. 134 DDeixamos de lado as nogSes de govern _mentabildade e biopoder. USP, §, Paulo, 6: 103-117, 1sem, 1999 0s efeitos dos discursos: saber e poder para Michel Foucault e Pierre Bourdieu ‘Ana Paula Cavalcanti Simioni “FOUCAULT, Michel. Op. cit. 1990. p. 1s. "© Bourdieu inicia seu livro “O Poder Sim- bolico” dizendo que procurari ver 0 poder por toda parte, mas sem fazer dele “numa outra mancira de o dissolve, uma especie de ‘eculo cujo centro est em toda a parte © em parte alguma’ ~ & rnecessirio saber descobri-lo onde ele se deixa ver menos, onde ele € mais com pletamenteignorado, portanto, reconhe: ido: o poder simbilico é, com efeito, ‘esse poder invisivel o qual s6 pode ser ‘exercido com a cumplicidade daqueles ‘que no querem saber que The estio Sujeitos ou mesmo que 0 exercem" BOURDIEU, Pierre ~ "Sobre © poder simbslico” em O Poder Simbatico. Lis boa, Difel, 1989. pp. 7¢ 8 Plural: Sociologia, USP, S. Paulo, 6: 103- ‘mecanismos através dos quais 0 poder se exerce e as positividades que instaura. E € precisamente isso que faz 0 autor quando, em “Vigiar e Punir”, diz que sua primeira regra geral é a de: “Nao centrar o estudo dos mecanismos punitivos unica- mente em seus efeitos repressivos, 56 em seu aspecto de sangao, mas recolocd-los na série completa dos efeitos positivos que eles podem induzir, mesmo se d primeira vista sto marginais (..)" (FOUCAULT, 1987: 26) Fontana" aponta o fato de ter sido Foucault o primeiro a abordar, na andlise dos discursos, a questio do poder. A genealo- gia proposta por Foucault estabelece uma relativizagao do discur- so “competente” como 0 tinico verdadeiro, ao recolocd-lo num campo mais geral dos saberes. Questiona-o como sede da razio neutra ao colocar em seu horizonte o vinculo consubstancial que tem com os poderes e ao apontar sua condigio de possibilidade do no desenvolvimento da razio humana ao longo da histéria, mas ao determinar as contingéncias politicas de sua elaboracao. Os discursos, no caso, aparecem como enunciados em relagao, espalhados por toda a sociedade © que podem perpassar institui- es diversas, corpos distintos e performadores de varias origens. Isto 6, tem a mesma atuagGo que o poder, uma vez que é um de seus instrumentos de exercicio ¢ um de seus efeitos. £ contra a nogdo de um poder disseminado, que Bourdieu chama “dissolvi do”, que sua andlise se desenvolverd, ainda que parta € se utilize dos deslocamentos te6ricos e metodolégicos realizados pelo autor {jd referido”. O ESTRUTURALISMO GENETICO DE PIERRE BOURDIEU Como Foucault, ou melhor, a partir de Foucault, Bourdieu procura analisar 0 poder nao como atributo, mas como relagao e algo que perpassa toda a sociedade. Também, como Foucault, 7, L.sem, 1999) ui procura ver os discursos ndo como epifenémenos da estrutura social, reflexos enganosos do real, mas como fatos lingiiisticos imbuidos de forca, inclusive politica. Assim, 0s aborda como instauradores de positividades, de realidades. Bourdieu relativiza também o postulado iluminista de que a ciéncia seria a promotora de discursos verdadeiros posto que dotados de uma racionalidade neutra. Para tanto observa nos dis- cursos cientificos o imbricamento entre 0 poder, os interesses em disputa num determinado campo social e os enunciados. Sua anélise contempla, como a anterior, as condigdes de possibilidade de emergéncia dos discursos, que esto atreladas as contingéncias que Ihe so exteriores, como os determinantes sociais, hist6ricos e politicos. Hé todavia uma diferenga importante entre um e outro. Em “Vigiar e Punir” fala-se de discursos sem jamais precisar quem os enuncia, jé que os discursos perpassam todos 0s corpos e instituicées, e em uma época pode-se ver uma certa regulari- dade na formagao dos enunciados e na maneira com que se rela- cionam com o poder, no sendo necessério, pois, precisar os agentes que os emitem. J4 para Bourdieu, 0 poder se exerce de forma generalizada porque € reconhecido, ou seja, nao é perce- ido enquanto tal, tem como parceiro 0 consentimento que advém do desconhecimento A tarefa do socidlogo, para Bourdieu, no que se refere a0 projeto genealégico, € a de mostrar onde e quem exerce esse po- der, tornando visivel 0 que é invisivel, especificando quem o exer- ce e, consegiientemente, quem enuncia os discursos. A diferenga, em termos analiticos, nfo pequena e implica em pesquisas dis- tintas. No caso de Bourdieu importa reconstituir 0 “campo” dos agentes emissores dos discursos e a posigao que cada um destes ‘ocupa no espago social em que se inscrevem, para se compreen- der a que tipo de poder se esta referindo. Em “As Regras da Arte”* Bourdieu critica Foucault afir- mando que, ainda que seja o autor que melhor formula uma andilise estrutural das obras culturais dentro da tradigio estrutura- 2 Plural; Sociologia, US (0s efeitos dos discursos: saber ¢ poder para Michel Foucault e Plerre Bourdicu ‘Ana Paula Cavalcanti Simioni » BOURDIBU, Pierre ~ "Questdes de Mé- todo” In As Regrat da Arte: génese ¢ cestrunura do campo tterdrio. So Paulo, Corypanhia das Letras, 1996. ' Paulo, 6: 103-117, 1 sem. 1999 Os efeitos dos discursos: saber e poder para Michel Foucault ¢ Pierre Bourdieu ‘Ana Paula Cavalcanti Simoni " Ver BOURDIEU, P-Coisas Ditas op eit p18. lista, na medida em que est consciente das ligagdes entre todas as obras, esse, ao recusar uma andlise que busque o prinejpio de elu- cidagdo fora do “campo discursivo”, postula a autonomia de tal campo. Ao fazé-lo, segundo Bourdieu, “(...) transfere para 0 céu das idéias as oposigdes ¢ os antagonismos que se enraizam (sem se reduzir a isso) nas relagGes entre os produtores, recusando, desse modo, todo relacionamento das obras com as condigdes sociais de sua produgio (como continuard a fazé-lo mais tarde com um discurso critico sobre saber e o poder que, na falta de levar em conta os agentes ¢ seus interesses e sobretudo a violén- cia em sua dimensao simbélica, permanece abstrato e idealista)” (BOURDIEU, 1996: 225-6). Contra a andlise “idealista” e © reducionismo materia- lista, o estruturalismo genético desenvolvido por Pierre Bourdieu se propée a analisar o mundo como um composto de estruturas que escapam A consciéncia dos agentes, coagindo suas praticas € representagoes, e concomitantemente, introduzir a dimensao genética destas préticas. Procura ver como através de esquemas de percepedo adquiridos — os habitus — os individuos partici- pam da construgio deste mesmo mundo, através de suas ages € classifieagdes" Tmporta, na ética de Bourdieu, nao reduzir o mundo social as representagdes que dele fazem os agentes, mas ao contrério, ver nas representagdes © produto especifico (o que equivale a dizer singular, que ter suas proprias leis de formulagao e signifi- cago) da posigao que esses ocupam num espago social constan- temente em disputa. E, todavia, € preciso evitar a visio de que a pritica desses mesmos “sujeitos” resultam diretamente das imposigdes colocadas pela estrutura social. B preciso ver que cada campo tem suas prdprias leis, sua l6gica diferenciada, que as ativi- dades simbélicas nao podem ser deduzidas de outras atividades sem mediagGes. As representagdes e discursos proferidos nesses espacos referem-se mais a eles proprios que a uma “estrutura social” que se imagina estar em toda a parte. Isso dito, com- preende-se que as praticas e discursos dos agentes s6 adquirem Plural; Sociologia, USP. S. Paulo, 6: 103-117, I sem, 1999) ua significados quando referidos ao campo em que sto produzidos, campo este no qual os participantes esto constantemente se posi- cionando e lutando para adquirir novas posigdes através da imposico de suas visdes de mundo. Assim, 0 campo é tido como locus de concorréncia em que 0 individuo ¢ ator, imprime sua marca, € ndo 6 meramente um suporte das estruturas Compreender os discursos, para Bourdieu, significa por um lado vé-los como inseridos em um campo e, por outro, como produtos de agentes em luta pela imposigao de suas vis6es de mundo como as tinicas verdadeiras. Assim, os enunciados devem ser sempre remetidos ao contexto em que surgiram, um espago objetivamente definido pelas posigdes dos agentes, determina- das pelas posses desiguais de capital (econdmico, simb6lico ou politico, dependendo do campo em questio). O campo é estrutu- rado pelas posigdes que os agentes nele ocupam e, assim, & pre- ciso especificar quem sao eles, quais as suas trajet6rias, que tipo de capital acumularam durante suas carreiras, ou seja, recons- truir suas biografias sociais para que se esclarega a génese de suas posigdes e, conseqiientemente, 0 significado de suas toma- das de posigao, Segundo Bourdieu, $6 € possivel compreender as diferen- tes visdes de mundo, representagoes € discursos quando hé uma circunscrigdo de quem as esté pronunciando, de onde o esté fazen- do e qual o seu interesse ao fazé-lo, Ou seja, diferente de Fou- cault, no presente caso 0 agente que enuncia o discurso — enquanto fruto de uma trajet6ria socialmente determinada que Ihe impés um habitus viabilizador de uma pratica especifica ‘enquanto ocupante de uma dada posi¢o — é importante para elu- cidar qual a fungao e o significado politico dos discursos."" 0 projeto genealdgico de Bourdieu, num certo sentido, é o mesmo de Foucault: o de desafiar as convengdes, a maneira tradicional de abordar 0 poder e a dominacao. Enquanto Foucault aponta a concubinagem entre saberes e poderes ¢ vé toda a relagao social como imbuida de poder, de sorte que 0 poder nao é mais um atributo exclusivo do Estado, Bourdieu pretende focalizar as Os efeitos dos discursos: saber e poder para Michel Foucault ¢ Pierre Bourdieu ‘Ana Paula Cavalcanti Simoni Em “As Regras da Arte” Bourdieu re ‘consti todo 0 campo dos eseritores do séeulo XIX na Franga para, posterior mente, analisar a trajet6ria de Flaubert dentro deste, o que Ihe permite com: preender o significado de sua obra "Bdu- cago Sentimental” e 0 “poder” que esta ‘obra teve no sentido de alterar uma con- fomagio do campo, impondo uma nova visto de mundo, na Plural; Sociologia, USP, S. Paulo, 6; 103-117, Lsem, 1999) Os efeitos dos discursos: suber e poder para Michel Foucault e Pierre Bourdieu ‘Ana Paula Cavalcanti Simioni Phural; Sociologia, USP, S. Paulo, 6: 108-117, 1 se relages de dominagdo como relagdes ao mesmo tempo estrutu- rais e simb6licas. No seu entender existe desigualdade na dis- tribuigao de capital entre os agentes, © que implica em posigdes distintas: dominantes e dominados. Mas ha também dominagio simbélica, 0 que signi pensar que também mentalmente os individuos estio sujeitados a0 poder de outros. O poder é antes de tudo um poder simbélico, um poder que deriva das classificagdes que os homens fazem do mundo em que vivem. Classificagdes estas vividas como naturais, espontneas ¢ que retiram sua forga justamente deste fato, de se- rem reconhecidas, ou seja, ignoradas enquanto tal. Ao adquirirem forca de verdades se impdem como orientadoras das priticas, ao passo que obscurecem suas origens (0 campo, 0s interesses que ai esto em jogo e quem est construindo estas representagdes como ‘a verdadeiras) ‘A forga dos discursos vem deste “desconhecimento” que implica num “reconhecimento” das idéias formuladas sobre 0 mundo, como a Verdade deste mundo. A intengio do autor é a de quebrar com esta crenga nas verdades. Como fazé-lo? Através de uma conscientizagao acerca das condigdes de produgio dos discursos © das classificagdes sociais, de sua génese, isto é tornar visivel esse poder que retira sua forga da invisibilidade. Mostrar o poder onde ele se deixa ver menos e, assim, possibi- litar a reagio dos dominados aquilo que os sujeita, Nas palavras do autor: ‘A destruigao deste poder de imposigdo simbélico radi- cado no desconhecimento supde a tomada de consciéncia do arbi- tririo, quer dizer, a revelacao da verdade objectiva e 0 aniquila- mento da crenga: é na medida em que 0 discurso heterodoxo destr6i as falsas evidéncias da ortodoxia, restauragao ficticia da doxa, e the neutraliza o poder de desmobilizagao, que ele encer- ra um poder simbélico de mobilizagdo ¢ de subversao, poder de tornar actual o poder potencial das classes dominadas”. (BOURDIEU, 1989:15) us Como no caso de Foucault, também nessa abordagem os discursos sao vistos como propagadores de verdades e, portanto, exercem 0 poder. Bourdieu insiste na necessidade de uma socio- logia do conhecimento para que se combata o desconhecimento que viabiliza a execugao do poder simbélico. Se esse € exercido a partir das classificagdes e nomeagSes que orientam os agentes no mundo, faz-se necessdrio entdo reconstruir a génese destas, romper com seu “naturalismo”. E quem sio as pessoas que, em nossa sociedade, esto na posigio de dizer as verdades sobre o mundo, de classificar? Os intelectuais ¢ cientistas, gragas ao capital simb6lico que pos- suem, so os enunciadores competentes das verdades sobre 0 nosso mundo, eles produzem as divisdes nomeagGes tidas como legit: mas €, portanto, vélidas. Esse capital simbélico, no dizer do autor, “éum crédito, um poder atribuido aqueles que obtiveram reconheci- mento suficiente para ter condigdo de impor o reconhecimento” (BOURDIBU,1990:166). Porque dotados de uma dada competén- cia, os intelectuais e cientistas ocupam a posigio de dominantes no que se refere & imposigiio de uma determinada visio de mundo. E. enquanto “grupo dominante” no campo simbélico que estabelecem as verdades, as classificagdes, os discursos que impdem o “reconhe- cimento”, 0 “desconhecimento” do funcionamento deste mundo. Justamente enquanto intelectuais, tidos socialmente como porta vozes da racionalidade e da objetividade, & que exercem o poder. As andlises de Bourdieu sobre os diversos campos simb6li- cos, intelectuais, escritores, pintores, fotografia, moda ete tm em vista mostrar que longe de estarem isentos das relagdes de poder, esto por elas imbuidos e possuem um papel capital no que se refe- re ao exercicio do poder simb6lico. Sdo campos em que as divisdes, nomeagées, representagGes e discursos impde determinadas visdes ‘de mundo como verdadeiras em detrimento de outras. Seus agentes © so também no que se refere ao exercicio das dominagdes sujeigdes. Nessa ética, a Verdade no é a filha da histéria do desen- volvimento de uma razo neutra; a questdo outra, ade a quem interessa a verdade e como esta domina, exerce 0 poder. Como para Foucault, entre saberes e poder hd uma relagdo de intimidade Os efeitos dos discursas: saber e poder para Michel Foucault e Pierre Bourdieu 116 Plural: Sociologia, USP, S. Paulo, 6: 103-117, sem. 1999 Os efeitos dos discursos: saber e poder e continuidade, porém, no caso de Bourdieu, para se romper com sae Cerdenne piers Bourdieu ists no hasta reativar os saberes locais e recolocar a ciéncia (e tam- bém a filosofia) no Ambito dos saberes, sem primazia alguma: é preciso especificar quem exerce esse poder de dizer o que € ou no verdadeiro, porque o faze de onde 0 faz. $6 assim 0 reconhec mento/assentimento se transformaria em conhecimento. i SIMIONI, Ana Paula Cavalcanti. The effects of discurse: Knowledge and power for Michel Foucault and Pierre Bourdieu. Plural; Sociologia, USP, S. Paulo, 6: 103-117, L.sem, 1999, Abstract: This article aims to compare the meaning of “genealogical research” for Picrre Bourdieu and Michel Foucault. The emphasis is the interdependence between discourse and power, what makes the originality of these authors, Uniterms: genealogy, power, discourse, ruth, knowledge BIBLioGRAFIA BOURDIEU, Pierre ~ Coisas Ditas. Sao Paulo, Editora Brasiliense, 1990, — As Regras da arte: génese e estrutura do campo literdrio. So Paulo, Companhia das Letras, 1996, = O poder simbélico. Lisboa, Editora Difel, 1989, PERRY, Luc & RENAUT, Alain ~ Pensamento 68: ensaio sobre 0 anti-huma- nism contemporiineo. Sio Paulo, Editora Ensaio, 1988. FOUCAULT, Michel ~ Microfisica do Poder: Rio de Janeiro, Editora Graal, 1989. = Vigiar e Punir: histéria de violéncia nas prisdes. Pete6polis, Editora Vozes, 1991 ~ Un dialogo sobre el poder. 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