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INSTITUTO DA PSICANALISE LACANIANA EsTupos © QUE E SER LACANIANO? Jacques-Alain Miller Desde a questéo do vocabulario, passando pela presenga de seu ensino como objeto preferencial até o estabelecimento de diferencas (variavei nao a0 kleinismo, que a dicotomia palavra vaziaiplena, a énfase no par analista/analisando e a estrutura se reconhece na pulséo surjam como tragos distintivos do lacanismo. E minha intengao dedicar um seminario mensal politica da psicanilise, liberando assim este Curso para questées propriamente lacanianas. Seria bom se nos perguntassemos, a sério, como é ser lacaniano, em psicandlise. Nunca fiz essa pergunta nestes termos, até agora, e preciso entéo saber o porqué. De onde vem essa pergunta? Em que somos lacanianos? Que significa ser lacaniano? No fim de tudo, possivelmente saberemos. Para comegar, vamos tentar dizer o que ser lacaniano nao é. Ser lacaniano nao é simplesmente reconhecer a importancia de Lacan na psicandlise nem ler Lacan, pela simples razdo que reconhecer a importancia de Lacan ou ler Lacan nao é apanagio nosso, nem privilégio nosso. Pode ter sido assim, o que tornava ociosa a pergunta. Houve tempo em que se ouvia de Lacan, “Isso nado é psicanalise”. Quanto ao essencial, esse é um tempo passado. O que é que motivava essa disjungao entre Lacan e a psicanalise? Primeiro, era a teoria. E fato que Lacan ofereceu uma alternativa aos termos de Freud, izando outros termos, um outro vocabulario, até pelo emprego que fazemos de termos como 0 sujeito, o Outro com maidscula, assim como também o a pequeno, termos que nao pertencem a linguagem de Freud. Outrossim, a prevaléncia dada durante certo tempo por Lacan a fungao da palavra e ao campo da linguagem, cujas referéncias em Freud sao - é o minimo que se pode dizer — menos numerosas, menos insistentes do que em Lacan. E, portanto, houve tempo em que Lacan pareceu substituir obra de Freud uma outra légica. Desde entao, porém, foi possivel verificar na psicanilise, tal como existe no mundo, que se multiplicaram os termos e as locugées tomados de Lacan, e até mesmo ha uma, digamos, escola, que se apregoa com pés-acaniana. Essa escola congrega nao poucos analistas que pensam terem passado por Lacan, e admitirem a influéncia e a incidéncia, de seu ensino, tanto sobre sua decepcao quanto sobre sua pratica psicanalitica. Pode-se néo ligar para isso. Mas isso questiona o que é ser lacaniano. Em segundo lugar, existe a pratica, distinguida, aqui, da teoria: ja se disse de Lacan que ele ofereceu uma altemativa a pratica psicanalitica prescrita por Freud. E que, com a pratica incitada por Lacan, em particular pos suas sess6es de tempo variavel, como se definia do outro lado, até por suas sessées curtas — e até mesmo ultracurtas — que ele retornava a uma pratica de sugestdo, fazendo do analista um grande Outro — nisso eles recorriam a seu vocabulario — um grande Outro onipotente, nao respondendo, nao devendo obediéncia a nenhuma lei superiora. Chegou-se a ver em seu “nao ha Outro do Outro” a permissao concedida ao analista, de certa forma, estrutural, de agir como bem Ihe parega na condugéo do tratamento, abandonando-se - como é a expressao usada - @ sua contratransferéncia. No nivel pratico, tal objegao é certamente a mais re: ‘Ao mesmo tempo, nao se pode consideré-la como decisiva no momento atual, quando a questéo se reduz a um contragolpe sobre a pratica “padronizada”, esta mesma sendo ligeiramente evolutiva. Apratica de Freud era, parece, seis sessdes de uma hora por semana. Os anglo-saxées a definiram como cinco sessées de cingiienta e cinco minutos e, com os franceses, ela se tornou trés ou quatro sessdes de quarenta e cinco minutos, ou até mesmo de meia hora. Todo esse pessoal pensa pelo menos atender a um padrao, até que recentemente comegou-se a se observar uma certa falta de convicgao quanto a tais normas, cujo efeito é reduzir a objegao feita a Lacan quanto a sua pratica. De tal maneira que uma pessoa de destaque no campo da psicanalise se contenta em qualificar a pratica de Lacan como “problematica”. Esse adjetivo data de 1995 - ¢ & certamente o mais doce de quantos utilizados para qualificar a pratica de Lacan. E clara a tendéncia entao: é que 0 padrao, o que foi promovide como tal por varios decénios, e que legitima a expulséo de Lacan do campo da psicanilise, esta, ele mesmo, rachado. Nao se gosta mais dele. © fato é que ndo me parece exagerado considerar que, tanto na teoria como na pratica, admite-se hoje internacionalmente — 0 que nao era o caso quando este Curso - que Lacan é coisa de psicana Decorre disso que a pergunta “o que é ser lacaniano? é para nés presente e insistente. Eis porque, em primeiro lugar, se faz essa pergunta. E também por uma segunda razdo, esta, interior ao ensino de Lacan, como dizem seus alunos. Ser lacaniano torna-se problematico para nés mesmos, toma-se objeto de uma pergunta assim que se percebe que Lacan nao dogmatico, e que nao se pode fazer uma lista de teses que seriam lacanianas, de teoremas ou axiomas, visto ser obrigacdo complementar tais teses, teoremas, tais axiomas eventuais com a preciso referente ao seu contexto. Por conseguinte, nao ha estatuto lacaniano de psicandlise. E até fica evidente que o préprio Lacan esta as voltas com um problema. E que ele evolui, tenta solugées, 0 que leva seus alunos ~ os mais bem orientados, se ouso dizer — a periodizar seu ensino, ¢ a admiti conduzidos por uma leitura atenta, que ele talvez tenha dito, sendo tudo e 0 contrario de tudo, pelo menos, que tenha tomado as avessas suas teses aparentemente mais garantidas. E dai, desse estudo rigoroso do ensino de Lacan, nasce a pergunta: “que é ser lacaniano?” e essa pergunta de identificagao, e de papéis, passa a ser “qual é 0 problema lacaniano na psicanalise?” Em terceiro lugar, ser lacaniano torna-se uma questo de exercicio pleno, uma questao nova quando a resposta “ser lacaniano é ser freudiano” ja nao satisfaz. No entanto, essa resposta é um convite de Lacan. E pode-se dizer que, realmente, durante um bom tempo era possivel pensar que ser lacaniano nada mais era do que ser freudiano, ser autenticamente freudiano. Mas isso sé valeu, s6 po relagdo a essa variedade de freudismo, o anafreudismo. © anafreudismo é uma versao do freudismo que s anos da existéncia de Freud, dominando a psicanalise durante varios decénios. Foi - e hoje podemos perceber isso — uma interpretacao do freudismo, canénica, dogmatica, de certos elementos da doutrina de Freud. Considerando este anafreudismo, era entao possivel responder ‘er lacaniano nada mais é do que ser freudiano”. Vale a pena langar um olhar retrospective sobre o anafreudismo, olhar detalhado, contentando-me hoje, em apontar seus pri tragos. Em primeiro lugar, ha a preferéncia dada a segunda topica de Freud sobre a primeira; entao, o anafreudismo se apresenta como uma leitura retrospectiva de Freud, descartando a reparti¢ao freudiana, inconsciente, pré-consciente, consciente, em beneficio da tépica isso, supereu e eu. Qs manuais do anafreudismo fazem disso uma exposigao clara. Expéem claramente a evolugao do pensamento de Freud, acima de tudo periodizada conforme essas reparticées, e esses manuais ‘escolhem privilegiar a segunda (tépica), considerando a primeira uma preparagao, um esboco da segund: Em segundo lugar, 0 anafreudismo tem por conceito fundamental, colhide na segunda tépica, 0 ego considerado como fungéo de sintese, de comando, de integragao da personalidade, e é por ai que o anafreudismo propée, aspira a uma conjungao entre psicanal psicologia geral. A experiéncia analitica ¢ apresentada como o meio de obter do ego a resposta a seu conceito sintético. Em terceiro lugar, 0 anafreudismo tende a considerar o aparelho psiquico como isolado. Isto é, o anafreudismo exclui, ou de todo modo atenua, tudo que seja da ordem da relaco de objeto e assim nao da lugar nenhum as relagées intersubjetivas. A pedra angular do anafreudismo que permitia dizer que ser lacaniano no era nada mais que ser freudiano é a minha escolha de hoje, mas isso parece-me baseado nos textos. Sua pedra angular era o reconhecimento do carater primario, no desenvolvimento do ser humano, de uma fase narcisica e auto-erética varios meses apés 0 nascimento, tema que foi objeto de um conflito entre os analistas, cujo carater agudo ¢ hoje imaginavel. Ha ou néo ha uma fase primaria de narcisismo e de auto-erotismo? Estava em jogo nessa disputa a propria definigéo do psiquismo poi se, originaimente, o psiquismo é de certo modo fechado sobre mesmo, tudo da ordem da relagdo é entéo secundario, acess6r adjacente. E isso que Ana Freud péde formular em 1943, nas discussées da Sociedade Britanica de Psicanalise. Sabemos com certeza que em Londres, em 1943, havia discussdes animadas, tedricas e clinicas. Nem todas as energias da nacao convergiam para objetivos de guerra, mundiais, entéo sobrava algum tempo para raciocinar sobre o auto- erotismo e nas discussées travadas na Sociedade Bi aa propésito dos subsidios da escola Kleiniana, Ana Freud podia formular, com uma certa condescendéncia a respeito da escola Kleiniana, concedendo-Ihe, apesar de tudo, alguma coisa: “Considero = dizia ela — que ha uma fase narcisica e auto-erética de varios meses, que precede a relacdo objetal em sentido estrito, ainda mesmo — acrescentava — que os comecos da relacdo objetal se construam lentamente durante esse periodo inicial”. E conhecida essa frase bem precisa a pal por Joan Riviére, em sua introdugao denominada Desenvolvimentos da psicanalise. ir da mengao que Ihe é feita obra kleiniana coletiva Em relagao a esse anafreudismo, ser lacaniano péde ter, outrora, o sentido de uma volta a Freud. Primeiramente, ser lacaniano, era voltar a primeira tépica, atrés da segunda. Era devolver seus direitos & tripartigao de inconsciente, pré-consciente e consciente, era também fazer novamente o uso do conceito de inconsciente, do qual se pode dizer de fato que tinha passado de moda ou nao era mais uso na psicandlise. Ser lacaniano significava levar em conta a descoberta do Inconsciente e, portanto, soletrar os primeiros textos de Freud, considerados como ultrapassados pelo anafreudismo, A interpretagao dos sonhos, Psicopatologia da vida cotidiana, O chiste e sua relagdo com o inconsciente, e era também reconsiderar os termos da segunda tépica a partir da primeira, e em particular, reinterpretar 0 superego, 0 id, a pulsao de morte, a partir do inconsciente. Era portanto restituir, parecia a Freud, a integralidade de seu ensino, e até mesmo o movimento de sua pesquisa. Em segundo lugar, ser lacaniano era tomar como conceito fundamental nao o ego mas o inconsciente. Era uma diferenga patente, em relagao as elaboragées do anafreudismo. Isso implicava repensar o id, o superego e o ego a partir do Inconsciente, e portanto, implicava em tratar todo 0 vocabulario prevalecente no anafreudismo - 0 de comando, de sintese e de integragao - como um verdadeiro avesso da psicanilise, titulo de um Seminario de Lacan que, mesmo sendo bem posterior a esse debate inicial, no fundo, era o molde préprio em relagao ao anafreudismo. E um avesso da psicanilise. Aprendemos entao, na esteira de Lacan, a descartar esse vocabulario do comando, para utilizar outro, 0 vocabulario da submissao, da sujeicdo, da determinagao, e foi o que veio marcar, ordenar o termo, inédito em Freud, de sujeito. Com o sujelto substituindo o ego, pode- girava 180 graus. Ali, onde o assunto era um ego, com supremacia a reforgar, eis que o caso era com um sujeito fundamentalmente submetido a uma estrutura em cuja realizagao se fazia empenho. E 0 sujeito — traco distintivo dos que pensavam corresponder a ser lacanianos — longe de ser uma funcao de sintese, era vazio, e até mais precisamente, s6 tinha valor como uma variavel, cujo valor é determinado pela cadeia significante que o comanda. Pode-se dizer que lacaniano, a esse respelto, era visar, no individuo que se apresenta como paciente, lidar, visar o sujeito nele, isto é, uma variavel determinada pelo significante. Isso faz periclitar, exclui qualquer idéia de reforgo. A questéo passa a ser: “que valor ele deve tomar no curso do processo analitico, que lugar acabara por tomar no processo analitico?” Portanto, é totalmente o oposto da nogéo que haveria no individuo uma fungao a ser reforgada. E uma questao de valor a tomar, antes do que reforcar uma poténcia. E entao ser lacaniano, simplesmente, quer dizer nao ser anafreudiano, ou mesmo, ser antianafreudiano. Em quarto lugar: “ser lacaniano?” Ponto de interrogagao: isto se torna uma questao ao se admitir, ao se levar em conta seriamente, e nao como um capitulo da histéria da psicandlise, que ha outras maneiras, além de Lacan, de interpretar Freud, e mesmo de interpretar a psicanalise. Por exemplo, ser lacaniano faz sentido em relagao a ser te tanto assim na Franga, e entéo nossa tendéncia é cuidar disso pelo lado histérico. Mas na superficie do globo, ha numerosos psicanalistas, talvez tio numerosos quanto nés mesmos, que no campo da analise se dizem Kleinianos, quer dizer, agarram a invengao freudiana a partir de Melanie Klein. E, alias, é justamente por se referirem como Kleinianos que so muito abertos ao fato de haver outros que se referem como sendo lacanianos. Entao, o que é ser kleiniano? Peguemos esse modo enviesado para fazer a diferenga com o nosso ser lacaniano, talvez agora um pouco mais problematico do que de costume. Visto sermos aqui lacanianos, e, se posso dizer, de nascenga (risos), somos lacanianos assim como respiramos, comegamos a ler Freud, para alguns de nés — eu também, talvez — a toma-lo a sério, porque Lacan estava ai. Ja é tempo de nos desprendermos um pouco dessa evidéncia para perceber que ha outros, que pensam em corresponder como freudianos sendo kleinianos, certamente de modo diferente de como se é freudiano, sendo lacaniano. Afinal, o que é ser kleiniano? Preciso inventar um bocadinho e, a partir dos textos de Melanie Klein ¢ de seus discipulos, jé que nao convidamos aqui um Kleiniano, alias, acabara acontecendo, certamente, porque precisamos disso para nos localizarmos. Que é entéo ser kleiniano? Tal como procuro me orientar nesse ponto, evidentemente a partir do “ser lacaniano”, por problematico que seja. Isso consiste em acrescentar algo a Freud, sem duvida, consiste em recentrar a experiéncia analitica na relagao primitiva da crianga com o seio da mi Entre os kleinianos existem diferentes obediéncias, mas o que hes & comum @ tomar como matriz fundamental da interpretagao, do teresse do paciente, tanto adulto como infantil, essa relagéo E sé por esse fato, é isso oposto ao solipsismo anafreudiano. Ser kleiniano é proclamar que uma relagao de objeto é primordial e, por isso, 0 debate Ana Freud/Melanie Klein tem como de auto-erotismo e de harcisismo. Dessa relagao primitiva, pode-se dizer, claro, que existem tragos em Freud, alusées, aqui e ali um paragrafo de Freud, mas sem divida foi Melanie Klein quem dela fez uma relagao fundamental e primordial. Apciando-se alias, pelo menos seus discipulos, sobre o subsidio trazido pelos behavioristas, observadores do comportamento, e assim @ que Joan Riviére e Suzan Isaac prestam homenagem a investigagao behaviorista do lactente, especialmente a obra denominada The nursing couple, o par mae-lactente. E, pode-se dizer, ser kleiniano pér em fungao esse par originario. Se eu quisesse puxar, um pouquinho, para nés, abrir uma via de investigagao na qual, 4 minha moda, eu acabaria me envolvendo, eu diria que 0 seio, o leite materno, na interpretagdo kleiniana da psicandlise, 6 de algum modo o parceiro-sintoma da crianca. E 0 que me parece ao reler Melanie Klein do ponto que estamos. E que o seio ‘em questo é um seio-sintoma pois é antes de tudo um objeto que satifaz, isto 6, em termos freudianos, cuja fungdo é antes de tudo pensada em termo econémico, é um objeto de satisfacao, eis sua definicdo, evidentemente pensada de maneira global, 4 qual Lacan posteriormente acrescentou tonalidades, niveis e dialética. Mas, enfim, @ um objeto que satisfaz primeiramente 4 necessidade de ser alimentado, portanto, que responde a fome, que responde a pulsdo alimentar, e, em segundo lugar, como diz Melanie Klein de maneira global e um tanto vaga, satisfaz todos os nosso desejos da crianca Nesse sentido, o seio participa de um funcionamento cujo produto é 0 gozo, um gozo. Digo o gozo por ser para Melanie Klein 0 gozo fundamental e nessa mesma linha se percebe que ele pode nao satisfazer, pode acontecer que venha a faltar. O que se passa quando falta esse objeto de satisfacao? Primeiramente ele suscita a 0, isto 6, a crianga imagina a satisfagao que Ihe falta, @ édio, desperta a tendéncia de destruir, a despedacar tanto esse selo como a mae que o suporta. Sao esses os elementos que formam a matriz infantil, primordial, de toda a vida afetiva tal como descrita por Melanie Klein e seus discipulos. E ao mesmo tempo a matriz do amor concebido a partir dessa plenitude de satisfagao e, por conseguinte, do amor antes de tudo concebido como seguranga. Nesse contexto, seguranca é um termo constante do kleiniano, o sujeito quer a sua seguranca, a satisfacao é a seguranca, matriz do amor concebido como seguranga, matriz do édio, e é proprio ao Kleiniano considerar o édio nao somente como uma agressao dirigida para o exterior, mas conceber o édio como ameaga de comego para o proprio lactente. © valor especifico atribuido a esse termo - édio -, em Melanie Klein, & que nao visa somente ao exterior mas é uma ameaga interna. O 6di fragmenta o mesmo sujeito que o suporta. Matriz do amor e do édio, é de certo modo o retrato emocional, a verséo emocional da diferenga entre pulsao de vida e pulsao de morte. De tal modo que, no kleiniano, o temor primordial, a angustia ‘aria, € o medo da morte e os senhores tém um eco em Lacan, em todo o tempo onde, nos primeiros anos de seu ensino, ele faz da morte a verdade do ego, a verdade verdadeira do ego, e faz da assungao da morte a chave do fim da analise. Essa presenga da morte no ensino de Lacan, em seus primeiros anos, sem duvida reveste-se de referéncias a Hegel, mas clinicamente, seu alicerce é Melanie Klein. Pode-se dizer que 6 mesmo num segundo tempo que Lacan vai recuperar sob a morte, sob a instancia da morte, a da castragéo. Como escreve Joan Reviére (hoje vou cité-la de bom grado, preferindo-a Melanie Klein, em razéo da limpidez de suas formulagées): “Freud sempre manteve sua opinido de que nao ha temor de morte no inconsciente, que o inconsciente néo pode considerar pior destino que o da castracao”. E a isso efetivamente ela opée o seu ser kleiniano que, pelo contrario, faz do temor da morte o nec plus ultra da angistia originaria. E aliés, 0 que permite colocar em seu lugar o conceito de afanise promovido por Jones e que perturbou muito Lacan, pois ele o retomou de diversas maneiras em seu ensino até encontrar para ele uma fungao em sua ‘esquematizacao da alienagao e da separacao; a afanise de Jones era um conceito “morcegal” (chauve-souris) permitindo a compatibilidade de Freud e Melanie Klein. Jones denomina afanise a extingao de todo prazer e toda capacidade sexual, situando esse conceito a meio caminho entre o temor freudiano da castragao e o temor Kleiniano da morte. De certo modo, era uma solugao politica entre Freud e Melanie Klein. Claro é que no kleinismo a castragao é absolutamente atenuada, ao passo que no ensino de Lacan é promovida como conceito axial; em Melanie Klein é apenas uma versao adocicada e mi a do temor da morte. E mesmo 0 falo como tal, longe de ser essa instancia = percebe-se isso — originaria em Lacan, no kleinismo nao é senao uma versdo derivada do bico do seio - eu nao estou exagerando, como se poderia pensar - e Joan Reviére, sempre ela, escreve precisamente que o menino acha nele o érgao semelhante ao mamilo, produzindo liquidos, etc., e que encama uma certa poténcia. Portanto, para os discipulos de Melanie Klein, o préprio falo é um derivado do objeto fundamental, 0 seio materno, e pois de uma parte desse objeto fundamental Isso nos permite dizer, mesmo nao sendo muito urgente ou inquietante para nés, que ser lacaniano é nao ser kleiniano, o que pode hoje parecer longinquo, porém o comeco do ensino de Lacan ficou marcado como: nao ser kleiniano. Apesar de fazer uso — deve-se Jo de Melanie Klein. A esse respeito, ha uma dissimetria entre anafreudismo e kleinismo, quanto ao lacanismo. A relagao de Lacan com o anafreudismo foi polémica, uma oposigao que o conduziu a contrapor ao ego anafreudiano, o sujeito como fungao vazia, um sujeito, marcado pelo existencialismo, na medida em que a intengao era opor a esse ego-mestre um sujeito tendo de se fazer ser. Entéo, considerando o anafreudismo, a posic¢éo ser lacaniano consistia, ficou com a cara, o jeito de uma polémica, o que nao é 0 caso quanto ao kleinismo. Quanto ao kleinismo, ser lacaniano representou uma reformulagao, admitindo que Melanie Klein trazia fatos, e aceitando-os. Aliés, quando Lacan promove como dele a imago primordial do corpo despedagado - a referéncia esta nos Escritos - pode-se dizer que ele apenas reformula as Ses de Melanie Klein. © corpo despedacado é situado por Melanie Klein em seu lugar, efeito do édio suscitado pela falta do seio como objeto de satisfacao. Ela diz: “a crianca faz em pedacos — em seu fantasma inconsciente — 0 corpo da mae e o seu proprio”. ‘Também se pode dizer que o que Lacan sublinhou no kleinismo f nogao de um Edipo ultraprecoce, em contradigéo a cronologia do desenvolvimento proposta por Freud. Dito de outro modo, ele aceitou a revisao cronolégica de Melani como uma via de acesso para a saida da cronologia. Esse Edipo kleiniano 6 de tal maneira precoce que definitivamente, para explica-lo, Lacan propée sair da cronologia para pegar um ponto de vista estrutural, e portanto, para fazer depender o Edipo, a presenga do pai, o pénis do pai, etc., de uma ordem simbélica que ja é de certo modo de toda etemidade, isto é, nao-cronolégica. Lacan admitiu ainda que Melanie Klein o carater poster ‘emergéncia do ego no que diz respeito a relagao do objeto, quer Lacan admitiu a reagao depressiva de Klein nas origens do ego, ¢ ja é © precursor de sua doutrina do objeto petit a. Enfim, pode-se também dizer que ele reformulou a nogao kleiniana de que o aparelho psiquico nao é fechado sobre si mesmo, mas esta fundamentalmente em relagao ~ é esta a ténica dos kleinianos. Simplesmente para eles esse aparelho_psiquico esta fundamentalmente em relagéo com um objeto de satisfagao, e Lacan partiu do fato de estar o aparelho psiquico fundamentalmente em Telagéo com o Outro, como lugar de linguagem. Mas o que ha de comum nestas duas concepgées fica marcado por ser para os Kleinianos fundamentalmente intersubjetiva a experiéncia analitica. Essa é a ténica toda que Paula Heimann coloca sobre a situacdo analitica, a saber, é uma relacdo. E esse elemento relacional da situagao analitica que era colado, isento de anafreudismo. A inclinagéo mesma do ensino de Lacan, que leva a colocar em duvida, em suspenso, entre parénteses, a existéncia do Outro, em beneficio da relagao com o objeto do gozo, tem uma curvatura que se poderia dizer quase kleiniana, de reencontrar como primordial a relagao ao objeto do gozo. Mas enfim, em quinto lugar, ser lacaniano. Uma vez transpostos o anafreudismo e o kleinismo que continuam ativos, hoje, a seu modo, aquele de modo indireto, este ao contrario, “o que @ ser lacaniano em relacéo a tais abordagens da experiéncia analitica?” Pode-se dizer que, do mesmo modo como o kleinismo tem sua matriz de referéncia no par ma lactente, analista-analisando, é que os kleinianos se centram sobre os primeiros momentos da existéncia para captar a relagao primordial. Alias, uma relagéo em que ha campo para interpretar, como Freud sublinha, assim como Joan Riviére e Suzan Isaac, o bebé se exprime,a relacao toda é adaptar-se a sua linguagem. Esse, porém, é 0 polo dos primeiros anos da existéncia, e o lacaniano se desenvolve, com suas elucubragées préprias,a partir da outra ponta da cadeia, a saber, 0 paciente vem, toma-se analisando. Se se quisesse uma terceira via - nao 6 0 meu caso -, seria possivel dizer que ser kleiniano e ser lacaniano é pegar os dois polos “do desenvolvimento”: 0 lacaniano considera 0 sujeito no momento em le chega a psicanalise, em que ele se ispositivo ico, enquanto o kleiniano considera o sujei passo de sua existéncia vivente. Portanto, dois pares de certo modo simétricos que assim se correspondem. Dai pode-se dizer que o inconsciente lacaniano fica definido a partir da pratica analitica. Entao, se eu continuar um pouco mais esse paralelo entre ser lacaniano e ser kleiniano, se eu entrar nisso em ch levando em conta que Melai nao é para os meus leitores uma ista que @ kleiniano. Refiro-me a meu amigo Etchegoyen, antigo presidente da Associagao Internacional de Psicanilise — IPA, do qual é a referencia essencial, que me faz entrar neste paralelo. Klei referéncia importante, se faco isso ¢ por ter um amigo psican: Seria possivel dizer, entrando nesse paralelo, quanto ao lacanismo, que é uma tentacéo dar muito sentido ao fato de proceder ele da 40 palavra vazia/palavra plena. Como se sabe, Lacan comeca assim seu “Relatério de Roma”, consistindo em dizer: nem tudo no falar do paciente é interessante. Que 6 de maneira fugaz, de vez em quando, que interrompe a volta do recalcado. E que, quase sempre, sua palavra circula na fala normal. E preciso aguardar a emergéncia do lapso, do dito espirituoso, da mancada, do sonho, para a palavra se fazer plena. Para nés, na pratica, isso ¢ como uma segunda natureza. Ja se pode dizer que na diferenga entre palavra vazia e palavra plena, esta, bem preparada, a nogao que Lacan sé iré desenvolver depoi: que finalmente, tudo isso, essa palavra toda, converge para o nao senso. Entdo, para os kleinianos, o que afinal é bem marcante é nao haver palavra vazia. Isto é, tudo precisa ser interpretado e resulta, na pratica, em uma grande diferenca. Claro que eu ja o havia percebido, quando de meus primeiros contatos com os colegas kleinianos. Eu ja 0 havia percebido de modo sarcastic, a saber: eles falam tanto quanto os pacientes, os quais penam para colocar uma palavra porque, do outro lado, logo vem interpretacao. Recordo que neste Curso, faz muito tempo, passei a fazer uns gracejos. Nao é que eu estivesse muito errado, mas voltemos ao fundo da questo, vamos debochar um pouquinho de nés mesmos. E que continuamos, bem ou mal, a funcionar sobre a dicotomia palavra vazia = palavra plena. Pensamos que é rara a emergéncia do inconsciente. E, vez por outra, diriam os malévolos, quando esta para acontecer isso, epal — interrompe-se a sessio (risos). O universo kleiniano é outro, a saber: para eles tudo deve ser interpretado. Como diz minha querida Joan Riviére, o psiquismo é um todo. Eis 0 principio que se opée a dicotor inconsciente ndo é um aspecto residual - diz ela -, de modo nenhum é da ordem do lixo, do que é repelido, néo é da ordem do lapso, que é anulado logo em seguida a seu aparecimento, etc.; 0 inconsciente é para eles - ¢ muito curioso ~ © érgao ative no qual os processos psiquicos entram em funcao”. Entao, isso significa que nao ha nenhuma atividade psiquica e, em particular, néo ha expressao verbal nenhuma que possa ocorrer sem ligagao com 0 inconsciente. Isto é, toda atividade psiquica e, po toda enunciagao ou todo enunciado no tratamento é de certo modo duplicado por um fantasma inconsciente. Isso obriga o analista a um transporte constante do que é enunciado, em superficie, para a profundidade do fantasma inconsciente. “O trabalho do analista — diz Joan Riviére — é descobrir e interpretar 0 contetido inconsciente que é expresso a cada momento pelo paciente aqui e agora na sesso”: SUPERFICIE Dito de outro modo, o esquema é de preferéncia dessa ordem — fazer um circulo e nao uma linha, pois é um todo, tudo que se diz tem © seu correspondente inconsciente. Tudo que esta na superficie tem seu correspondente na profundidade. Portanto, quanto mais 0 analisando enuncia, tanto mais o analista, continuamente, decifra para ele o valor inconsciente do que ele entrega. Ou, por outra, de certo modo, temos o que os americanos chamam de holismo do inconsciente, uma concepgao totalitaria de inconsciente, um holismo kleiniano. Entao, vé-se bem que a esse respeito, isso nos ajuda a captar os tragos préprios de nosso lacanismo. Poderiamos opor ao holismo Kleiniano a antinomia lacaniana. Este esquema restitui um valor a essa cruz, a essa bandeira lacaniana que opée o imaginario ao simbélico. E que de imediato o lacaniano entra na experiéncia analitica com uma antinomia, a saber, ndo é uma escuta global, é uma escuta que reparte © que é da ordem do imaginario, da ordem da fantasmizacao, da ordem do que Melanie Klein e seus discipulos conotam tao longamente de introjegao, uma projecéo concebida como simétrica, de identificagao com 0 outro, cruzada, multiplicada, que encerra todo este registro no eixo imaginario e que convida a dai destacar alguma coisa muito mais rara, que é fugaz, interrompida, e que é a palavra verdadeira, ai onde a dinamica jel de remanejar o que for imaginario e contingente. Ou seja, pode-se dizer que ser Kleiniano é conceber 0 psiquismo como um todo e pode-se dizer que isso se estende. Esse ‘esquema que eu entendo como sendo o da sessao analitica kleiniana & também 0 esquema da relagéo com o Outro, pois entre a mae e 0 lactente observam-se essas trocas simétricas continuas. Isso fez Melani 0s anafreudianos a repeliam para o exterior, porém na con acoplata com as pulsées de vida, considerando-se apenas como o duplo do amor e do édio se correspondendo. Enquanto, para o lacanismo, 0 que vale é alojar todos esses recolamentos simé! hum mesmo eixo, o eixo da relagao de objeto, como queiram, o eixo da libido freudiana, 0 eixo da introjecolprojecao kleiniana, e disso distinguir a relagao do sujeito com o Outro. Simplesmente, isso prescreve 0 estilo do lacanismo, que é de sempre se envolver - é a cruz dos lacanianos, foi a cruz de Lacan - com essa antinomia de formas diferentes e cada vez mais complexas. Ser lacaniano é sempre estar envolvido, em definitivo, em um problema de articulagao, para dizé-lo simplesmente: entre a libido e o simbélico. Os lacanianos, sao eles que ficam perturbados com isso. Isso no perturbou Freud. Meus leitores se lembram de termos lido cuidadosamente Os chistes e sua relagéo com o inconsciente. N6s 0 lemos com cuidado, deixando de lado apenas as técnicas do chiste, porque isso nés conhecemos de cor e salteado. O caso é que, com nossa metéfora e nossa metonimia, simplificamos toda essa técnica do chiste. Mas, se bem me lembro, eu tinha realcado que Freud, depois de dar essas técnicas com mintcias na primeira parte, di jue dessas fontes jorrava o prazer do chiste. Para Freud, o importante 6 que tais técnicas so Lustquelle - fontes de prazer - e mais, 0 aparelhamento psiquico funciona para a satistagao pulsional, isto é, funciona para 0 gozo. Os leitores talvez conhegam a condecoracao prussiana intitulada em francés “Pour l'honneur”, em francés! Tal é a influéncia da lingua francesa no século XVIII. O francés irradiava nessa época, por isso, no século seguinte, eles vieram se instalar em Versailles, pela honra. Pois bem, o aparelho psiquico freudiano é pelo gozo, essa é sua medalha, sua palavra de ordem. Ao passo que Lacan, seu ponto de partida, o do seu ensino, con: em colher em Freud as técnicas do chiste, as técnicas do trabalho do sonho, e depois do mecanismo do ato falho. Logo, Freud revelara as técnicas, o trabalho, o mecanismo, e tinha demarcado, de fato, que a partir do contetido manifesto do sonho, era- se conduzido a elaborar pensamentos latentes do sonho e a considerar que esse contetido manifesto nao era sendo a transcrigéo modificada, mutilada dos pensamentos latentes. Isso conduzia ao que ele chamava, pelo menos na época do chiste, a hipétese do inconsciente, isto é, de alguma coisa que nao se conhece, porém que se é constrangido a admitir por dedugées irrefutave Somente o que para ele ndo era uma deduao, era a agao, tudo isso funciona para o Lust, isto é, prazer e gozo. Lacan, sim, 0 tomou como principio, concernente a estrutura do inconsciente, entéo o inconsciente é estruturado como uma linguagem, muito bem! Isso nao dizia nada, porém, do funcionamento estruturado como linguagem. Fica claro, contudo, que ele gastou seu tempo inventando finalidades outras que nao o Lust. Assim @ que ele pode dizer, por exemplo: a finalidade de tudo isso é o reconhecimento. Ele foi obter isso mais de Hegel que de Freud. 0 fato de privilegiar a técnica e o mecanismo em relacao a finalidade, fazia com que ele atribuisse necessariamente como finalidade, a essa estrutura de linguagem, o sentido mesmo, a produgao do sentido. Origem de todo 0 lado do primeiro ensino de Lacan, dessa ordem: 0 homem nao vive somente do seio, diz Melanie Klein, o homem nao vive somente do Lust, vive também do sentido. Por isso é que ele teve quinze ou vinte jesuitas em sua escola (risos). © que acendeu o ensino de Lacan, no comego, foi a redugao do Lust jo. Aquela cruzinha do comego, que esté em seu esquema L, todos a viram voltar muitas vezes. O grande grafo de Lacan, se reduzido a sua mais simples expressao — todos esses anos esforcel- me em demonstra-lo, e esta manha isso me tocou especialmente — 0 grande grafo de Lacan sao estas duas linhas assim, colocadas em paralelo. Ai elas sao colocadas em cruz, é quando verdadeiramente Ihe parece que tudo quanto ¢ libido, finalmente, libido e fantasmatizagao, sua fungao @ de perturbador, em relacéo a comunicagao simbélica fundamental, e depois ele faz um grande grafo, muito complexo, mas fundamentalmente para mostrar que aqui temos a cadeia significante, mostrar bem que a pulsao é estruturada exatamente como a cadeia significante. Bem, evidentemente é um pouco mais complicado: ha a pulsdo, ha o desejo que ocorre como o significado da cadeia significante da pulsao, mas o grafo é uma transformagao desse esquema inicial, visando mostrar que a estrutura simbélica se reconhece na pulsao, ¢ que © desejo nao é sendo o significado de cadeia significante pulsional. Pode-se dizer que, quando ele aparece em 1964 com sua “Posigao do inconsciente”, é ainda uma outra versao, desta vez como isto, uma outra versao destes dois eixos e em “Posigao do inconsciente” ole chama esta zona aqui de sujeito, e esta outra zona de Outro, e ao ler 0 texto percebe-se que progressivamente este S tomou-se 0 vivo, o lado do vivo, isto 6, ficou ai também incluida a pulsao. Nesse esquema de “Posigao do inconsciente” qual é 0 esforgo de Lacan? E que, bem claramente, os fenémenos do inconsciente, as formagées do inconsciente, so da ordem da alienagao. Ele procura somente anexar ai de um modo légico o objeto petit a como objeto da pulsdo. Ele procura construir uma articulagao entre inconsciente e pulsdo, e pode-se dizer que 0 ponto alto, o apice desta construgao, o primeiro tempo, o segundo e 0 terceiro. © que ele procura, com seu discurso do mestre, ¢ em definitive recuperar a intuigdo freudiana ial, e por isso ele o denomina discurso do inconsciente, a saber, 0 significante funciona no seu par fundamental, certamente gera, suscita efeitos de verdade, mas para produzir 0 gozo-a-mai Somente com esta construgao ele pode recuperar a intuicao freudiana, ou seja, que o saber do inconsciente trabalha para produzir um gozo- a-mais. Entao, isto nao é mais simplesmente uma estrutura, € um funcionamento e a partir deste ponto é que Lacan chega a acentuar 0 trabalho do inconsciente e pode dizer: no trabalho do inconsciente ha © gozo, isto é, o que Freud formula, as técnicas do chiste, sao as fontes do Lust e esta é a questdo na qual Lacan — e isso define os lacanianos — ficou. Como se passa do significante ao gozo? Como a vontade de dizer da conta do grande grafo de Lacan? (Eu ja havia chamado a atengao para isso.) Todo esse grande grafo é suportado no comego por um vector animado, chamado por Lacan intuicéo de significacao, e que esta destinado a sé se satisfazer pelo sentido. Entao, como se passa da vontade de dizer & vontade de gozar? A palavra se dirige para o Outro, ela diz, ela explica, ela narra, ela se faz reconhecer, ela se dirige para o sentido, ela pode ir para o nao- sentido, mas é totalmente outra coisa dizer: Hé um gozo do bla-bla-bla, isto 6, isso nao vai tanto em direcéo ao Outro, isso nao vai para o Outro para explicarthe, para oferecer sentido, sendo porque a finalidade ¢ produzir petit-a, gozo-a-mais. Por isso é que o horizonte do ensino de Lacan é um além do inconsciente como produtor de efeitos de verdade e o sintoma que Lacan elaborou no seu ultimo ensinamento poderia ser um nome desse além do inconsclente. Que é um sintoma analitico? Poderia ser precisamente alguma coisa correspondente a esse esquema do discurso do mestre. O que é real no sintoma é isso que serve ao gozo, que isso fale, que seja uma mensagem, que seja decifrada, ndo é do mesmo nivel daquilo para que isso serve. Bom, entao digo que @ esse tormento, situado naquele local, que define hoje o que é ser lacaniano. Pronto. do Curso: “O parceiro-sintoma”, em 26 de novembro de 1997 tradugo de: Dr. Luiz de Souza Dantas Forbes da revista: revista de Psicanalise e Cultura— Dora Ano 1-n? 1~ 1998

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