Discussão a respeito do antigamente chamado Elevado Costa e Silva, construído no governo do prefeito Paulo Maluf. Aqui se tem uma perspectiva da história urbana do centro de São Paulo, considerando os aspectos sociais e ambientais, ao debater a proposta de um parque elevado, numa possível desativação do Minhocão para os auto-móveis.
Discussão a respeito do antigamente chamado Elevado Costa e Silva, construído no governo do prefeito Paulo Maluf. Aqui se tem uma perspectiva da história urbana do centro de São Paulo, considerando os aspectos sociais e ambientais, ao debater a proposta de um parque elevado, numa possível desativação do Minhocão para os auto-móveis.
Discussão a respeito do antigamente chamado Elevado Costa e Silva, construído no governo do prefeito Paulo Maluf. Aqui se tem uma perspectiva da história urbana do centro de São Paulo, considerando os aspectos sociais e ambientais, ao debater a proposta de um parque elevado, numa possível desativação do Minhocão para os auto-móveis.
As dinmicas espaciais no Minhoco e suas implicaes sociais
Larissa Valencia da Silva 8982498
FLG0560 Geografia Urbana
Prof. Simone Scifoni
Dezembro, 2015
SO PAULO As dinmicas espaciais no Minhoco e suas implicaes sociais
O centro de So Paulo encontra-se atualmente em transformao, com a criao
de novas espacialidades. Diferentes projetos e construes esto acontecendo em locais que haviam sido desvalorizados devido aos investimentos realizados em outras reas da cidade. Essas transformaes espaciais no acontecem de maneira isolada, elas esto associadas a mudanas no modelo de produo capitalista, que gera novas caractersticas ao espao urbano. A rea ao redor do Elevado Costa e Silva, que se encontra no centro, est sendo, de igual maneira, local de projetos e transformaes. O elevado, tambm conhecido como Minhoco, estende-se desde a Praa Roosevelt, na Rua da Consolao, at o Largo Padre Pricles, na Avenida Francisco Matarazzo, atravessando a Rua Amaral Gurgel e as Avenidas So Joo e General Olmpio da Silveira, cortando os bairros da Consolao, Repblica, Santa Ceclia, e Barra Funda. Nos ltimos anos, o elevado tem sido tema de debate em relao ao uso do seu espao e, atravs de diferentes perspectivas e interesses, includos os econmicos, so propostos planos para dar novo uso ao Minhoco. Dentro deste cenrio, duas propostas ganham destaque, uma delas defende a manuteno da estrutura transformando o elevado em parque suspenso, outra proposta quer a sua demolio. O destino que for decidido em relao ao Minhoco ter como consequncia impactos sociais e econmicos, incluindo a segregao socioespacial, s pessoas que se encontram na regio. Para compreender em amplitude este cenrio, necessrio olhar as dinmicas espaciais a partir de diferentes escalas, compreendendo o contexto econmico em que surgem as atuais propostas e transformaes na rea do elevado. Do mesmo modo, importante entender a poca em que o Minhoco foi construdo, as consequncias geradas na cidade e suas implicaes sociais, correlacionando com a maneira em que se reflete na atualidade. O Elevado Costa e Silva, cujo nome teve inspirao num dos presidentes da poca da ditadura, foi construdo, ainda no regime militar, sob o governo do prefeito Paulo Maluf no ano de 1969, no transcurso de 11 meses, e inaugurado em 1971. Assim, passou a existir a que considerada a maior via elevada da Amrica Latina. Concretizou-se, ento, o antigo interesse, que data desde a dcada de 1930, de fazer interligao entre as zonas leste e oeste de So Paulo. No contexto do sculo XX, em que o carro era visto como smbolo da modernidade, o elevado foi mostrado como uma soluo aos problemas de trfego, com a ideia de atravessar a cidade, num fluxo contnuo, somente com automveis, por meio de uma via expressa. No entanto, no resolveu de maneira efetiva o problema da mobilidade, pois, aps a sua inaugurao, constatou-se que os congestionamentos no deixaram de acontecer. Do mesmo modo, contribuiu para a diminuio da qualidade de vida dos habitantes ao redor, pois muitos dos apartamentos encontram-se a poucos metros do elevado, entrando em maior contato com o barulho dos automveis e a contaminao do ar. Isto levou a que o elevado fosse fechado durante a noite como forma de diminuir o impacto aos moradores ao redor no horrio de descanso. Antes do elevado, a regio se enquadrava no contexto de uma rea central com espao valorizado, contando, expressivamente, entre as dcadas de 1940 e 1960, com a presena de cinemas, casas residenciais de alto padro, modernas edificaes da poca, e espaos comerciais requintados. Com a construo do Minhoco, e suas implicaes no ambiente, como poluio sonora, visual e atmosfrica, houve a desvalorizao do local, em um momento em que novos investimentos estavam sendo destinados a outras reas da cidade, com a formao de novas centralidades, assim como tambm de novas formas de moradia. Dessa maneira, pessoas de classe mdia- alta passaram a morar em outros locais valorizados ou em processo de valorizao. A desvalorizao, ento criou a possibilidade de pessoas de baixa capacidade econmica habitar o centro e aproveitar a facilidades que este lhes d. O perfil que, desde ento e at o momento atual, passou a predominar nas reas prximas ao elevado demonstra desigualdade em relao ao habitar. O Minhoco tem o papel de abrigo queles moradores que se encontram em situao de rua, muitos deles sendo trabalhadores excludos do mundo do trabalho. Encontram-se, tambm, trabalhadores pobres, alguns, dedicados ao trabalho informal e que moram em penses e cortios; outros, so pobres do tipo intermedirios, que pagam baixos aluguis nas moradias ao redor do elevado. Conjuntamente, h a presena de pequenos proprietrios e pequenos comerciantes, enquadrados na classe mdia e que moram nas ruas laterais construo. As aes por parte dos setores pblico e privado criam e transformam os espaos de acordo aos seus interesses, dentro da dinmica do capitalismo. Levando em considerao a abordagem de Glria Alves (2014), as transformaes ocorridas no centro, incluindo a rea do Minhoco, podem ser associadas aos processos que ela chamou de Valorizao, Desvalorizao e Revalorizao do centro. A valorizao aconteceu no conhecido centro tradicional/histrico, visto como a nica centralidade da cidade at meados dos anos 70 do sculo XX, onde havia a concentrao de elementos associados a diferentes mbitos como o econmico, poltico, social e cultural, mostrando que o centro era o local das possibilidades, em contraponto com a periferia, que era caracterizada pela precariedade e ausncia da vida citadina. J, na dcada de 1960, os investimentos comearam a se deslocar a outros locais, entre eles a Avenida Paulista, que passou da imagem de zona residencial de centro financeiro de So Paulo. Na dcada de 1970, o desinvestimento na rea do centro, de modo geral, torna-se evidente, constatando a sua desvalorizao. A construo do Minhoco, dentro do contexto de desvalorizao do centro, contribuiu para que a regio passasse a receber um conceito pejorativo, graas s caractersticas que essa rea foi adquirindo, por meio do perfil dos moradores que comearam a predominar no local, do tipo de atividades econmicas menos sofisticadas, se comparadas a outras centralidades, dos problemas do trnsito e da poluio ambiental, que estimularam a formao de um consenso, por parte do setor pblico como do privado, de degradao daquele lugar. Dessa maneira, foi se construindo no senso comum a ideia de abandono, perigo e insegurana da regio prxima ao elevado, restringindo os investimentos para justificar o foco de investimento em outras reas da cidade. Com a transio do modelo fordista para o de acumulao flexvel, que se caracteriza pela descentralizao da produo, com o deslocamento de indstrias para reas perifricas e ao redor da metrpole, e com a financeirizao da economia e centralizao das sedes das corporaes, inseridas num mercado a nvel mundial, comeam-se a observar na dcada de 1990 novas configuraes espaciais em So Paulo. Segundo CARLOS (2006, p. 83) a mercadoria-espao mudou de sentido com a mudana de orientao das aplicaes financeiras, que produz o espao enquanto produto imobilirio. Por sua vez, esse processo requer uma outra relao Estado/espao pois s ele capaz de atuar no espao da cidade atravs de polticas que criam a infraestrutura necessria para a realizao deste novo ciclo econmico. Nesse sentido, a produo do espao se realiza num outro patamar: o espao como momento significativo e preferencial da realizao do capital financeiro.
Antigos bairros passam a ter conjuntos de casas transformados em modernas
edificaes, destinadas s grandes empresas, cuja funo principal se encontra no setor tercirio, de servios. As antigas reas centrais passam a ter novas caractersticas, dentro do processo de revalorizao. Estas mudanas esto enquadradas no fenmeno j definido por Neil Smith (2007) como Gentrificao, tendo o espao que foi produzido socialmente apropriado pelo setor privado. Surgem novas centralidades, associadas ao modelo flexvel de acumulao. O setor imobilirio criou as condies para que pessoas com melhores salrios e dedicadas a atividades mais especializadas fossem morar nas reas centrais, localizando-se mais perto dos seus locais de trabalho. Passam a predominar condomnios, que, junto com os edifcios empresariais, manifestam um alto grau de verticalizao. Assim, reas no centro, que num determinado perodo sofreram desvalorizao pelo deslocamento das atividades econmicas para a periferia e que foram ocupadas por moradores de baixa renda, comeam a serem revalorizadas atravs do setor imobilirio, que viu no diferencial de renda a potencialidade de obter mais ganncias sobre os terrenos que foram adquirindo. Ao mesmo tempo, pessoas de baixo poder aquisitivo so expulsas dessas reas, tendendo a deslocar-se para locais mais perifricos, o que lhes dificulta o uso da cidade. Deste modo, demonstra-se na cidade um fenmeno no recente, mas com um novo contexto, que o Lefebvre chamou de Crise da cidade, que, constata a expulso de moradores pobres para a periferia e evidenciam-se perdas de sociabilidade no centro, assim como a sua homogeneizao desde o posto de vista das classes sociais, diminuindo a reproduo da vida no centro. Estas caractersticas foram classificadas por Lefebvre dentro daquilo que ele denominou de exploso-imploso. No meio desse contexto, surgem as propostas para um novo uso ou demolio do Minhoco. Na dcada de 1990 j se pensava na possibilidade de derrubar o elevado. No entanto, a partir do final da primeira dcada do sculo XXI que essas propostas comeam a tomar mais fora. O seu desmonte foi proposto, durante os seus mandatos, tanto por Gilberto Kassab em 2010, como por Jos Serra, anteriormente, em 2006. No mesmo ano, um grupo de arquitetos obteve o Prmio Prestes Maia, por propor a construo de um parque por cima do elevado, mantendo ainda a circulao dos automveis. assim que tambm a ideia de transformao em parque vai ganhando mais relevncia. Em 2013 surge a Associao Amigos do Parque do Minhoco, sendo um dos principais movimentos que propem converter o elevado numa rea de lazer. A associao possui um prdio com a sua sede na frente do elevado e tem sido atrativo de importantes figuras pblicas que se manifestam a favor do parque. Teve inspirao no Friends of the High Line na rea de Manhattan, em Nova York, que inaugurou em 2008 um parque naquilo que era uma ferrovia que foi desativada na dcada de 1980. O diferencial entre esses dois locais habita no fato de que em Nova York a via j no se mostrava como necessria, e que, como caso contrrio, em So Paulo, o Minhoco ainda mantm sua importncia para a circulao de automveis na regio. Por outro lado, a construo do High Line um exemplo de que criao de um novo parque na regio implicaria na sua valorizao. No meio da expectativa em relao demolio ou transformao em parque, novos empreendimentos imobilirios comearam a surgir na rea do Minhoco. Tal como pode ser visto no mapa a seguir, eles se concentram principalmente entre o Largo Sta. Ceclia, e as Avenida So Joo e Duque de Caxias, sobre a premissa de que mesmo para as reas hoje mais deterioradas a chegada de novos empreendimentos tende a criar um crculo virtuoso, que vai melhorar a oferta de servios e a prpria segurana, tal como afirma numa entrevista Folha de So Paulo o diretor da Incorporadora Setin, Joo Mendes, atuante nessa rea. E, por meio da ideia de renovao, segurana, embelezamento e requalificao se tm no senso comum as justificativas necessrias para estimular as transformaes no local, pouco se importando com a situao daqueles que se encontram nele.
Mapa de novos empreendimentos imobilirios na rea do Minhoco. Fonte: Repositrio de Geografia
Urbana I, prof. Simone Scifoni, do site tidia-ae.usp.br . Dezembro de 2015
Portanto, as ideias que atualmente predominam como as de derrubar o
Minhoco ou de construir um parque por cima dele no se demonstram como uma boa opo desde a perspectiva do social, pois, o mercado pretende agir no local com os interesses de revalorizao econmica e social da regio, aproveitando-se do diferencial de renda, que nela se encontra. Com as transformaes no elevado, efetivaria a transformao da regio a construo de novas edificaes, alm das existentes e o aumento do custo de vida, atraindo pessoas de camadas sociais mais altas e, aumentando assim a desigualdade na regio, promovendo a expulso dos habitantes pobres para a periferia e contribuindo perda desse espao como lugar de sociabilidade, manifestando desta maneira a continuao da crise da cidade. Outras alternativas para o Minhoco devem ser pensadas, baseando-se principalmente numa perspectiva social como modo de contribuir diminuio das desigualdades e problemas que se encontram na regio, por meio de polticas pblicas que garantam a permanncia dos seus moradores em detrimento dos interesses do mercado e, junto a ele, do setor imobilirio, pois estes agiriam com a inteno de gerar mais capital, contribuindo com a segregao socioespacial. Assim, evitaria o favorecimento a grupos economicamente mais privilegiados, que, tendo atuao no espao eliminariam as possibilidades dos moradores de se manterem nas mnimas condies. Por outro lado, tendo em vista os problemas de mobilidade que se registram nessa rea, e que so resultado do modelo predominante de transporte, que o do automvel, devem-se procurar alternativas que promovam o deslocamento de maior quantidade de pessoas atravs dos meios de transporte pblico e coletivo, em detrimento do transporte particular e individual. Referncias bibliogrficas:
Acervo, como era So Paulo sem o Minhoco.
http://acervo.estadao.com.br/noticias/acervo,como-era-sao-paulo-sem-o- minhocao,9070,0.htm. Acesso em novembro de 2015.
ALVES, Glria A. Transformaes e resistncias nos centros urbanos.In: CARLOS,
A.F.A. (org). Crise urbana. P. 143-153.
Anunciados os vencedores do Prmio Prestes Maia de Urbanismo
http://www.prefeitura.sp.gov.br/portal/a_cidade/sala_de_imprensa/fotos/index.php?p=94 10 Acesso em novembro de 2015.
Associao quer transformar o Minhoco em um parque
http://revistagalileu.globo.com/Revista/Common/0,,EMI341269-17770,00- ASSOCIACAO+QUER+TRANSFORMAR+O+MINHOCAO+EM+UM+PARQUE.html . Acesso em novembro de 2015.
CARLOS, A. F. A. Dinmicas urbanas na metrpole de So Paulo. En publicacin:
Amrica Latina: cidade, campo e turismo. Amalia Ins Geraiges de Lemos, Mnica Arroyo, Mara Laura Silveira. CLACSO, Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales, San Pablo. Diciembre 2006.
'Cicatriz', Minhoco inibe empreendimentos ao seu redor
http://especial.folha.uol.com.br/2015/morar/centro-paulista/2015/10/1696298-cicatriz- minhocao-inibe-empreendimentos-ao-seu-redor.shtml . Acesso em dezembro de 2015.
LEFEBVRE, H. O Direito Cidade. Traduo Rubens Eduardo Frias. So Paulo:
Centauro, 2001.
Projeto de lei pretende fechar gradativamente o Minhoco
http://cidadeaberta.org.br/projeto-de-lei-preve-fechar-gradativamente-o-minhocao/ . Acesso em novembro de 2015. Prefeitura de So Paulo estuda demolir o Minhoco http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2010/05/prefeitura-de-sp-estuda-demolir-o- minhocao.html. Acesso em dezembro de 2015.
Site da Associao Parque Minhoco
http://minhocao.org/ . Acesso em novembro de 2015.
SMITH, Neil. Gentrificao, a fronteira e a restruturao do espao urbano.
GEOUSP - Espao e Tempo, So Paulo, N 21, pp. 15 - 31, 2007.