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Miracy Barbosa de Sousa Gustin Maria Tereza Fonseca Dias MIRACY BARBOSA DE SOUSA GUSTIN Especialista em Metodologia pela Universidade de Michigan —EUA. Mestreem Ciéncia Politica e Doutoraem Filosofia do Direito pela UFMG. Professora Adjunta dos cursos de Graduagio ¢ Pos-graduagio da Faculdade de Direito da UFMG. MARIA TEREZA FONSECA DIAS Professora e Coordenadora do Nécleo de Pesquisas e Estudos “Monogtificos do Curso de Direito das Faculdades Metodistas Integradas Izabela Hendrix. Mestranda do Curso de Pos-graduagio ‘em Direito na UFMG, (RE)PENSANDO A PESQUISA JURIDICA Teoria e Pratica 238.1554 22Sem ISBN 65-730 1, Projet de pesquisa — 1LDias, Maris Teens nse. epp: 00182 eDb. 00.81 as Coie Ara Hotes Vicker Genero sr Pea Artin Pri Rodrigo da Cunha Perea Kow-how rato letra "Revsto Vedana Mack ‘Capa eran Gesin onyright © 2002 by REY EDITORA as O80 720013 ~ Tea (11) 3IOL9T7S dekeysptvotconte parte deste vo poder er produ, ej qua form os melos ‘mpregadc, sem a permit, por ect da Edna PREFACIO Os julgamentos dos projetos de pesquisa em Direito no Ambito do CNPq, dos quais participo como integrante do co- mité assessor nessa Area, tém sido monocérdios e recorren- tes. Invariavelmente, a cada sesso 90% dos pedidos sao re- jeitados logo de inicio, por falta de um rigor metodolégico. Mal formulados em seus objetivos, inconsistentes em termos analiticos e inconvincentes em sua fomentagio tedrica, esses projetos revelaram o grau de desinformagao de seus autores. Além de nfo saberem claramente 0 que é um projeto acadé- mico ou uma tese, eles também desconhecem o funciona- mento das universidades norte-americanas e européias mais importantes, 0 nome de seus principais professores, as pes- quisas de ponta em andamento 0 prdprio “estado da arte”de suas respectivas dreas de especializagio. Este problema € de cardter estrutural e esta ligado & ma qualidade do ensino juridico, tanto na graduag%o quanto, em alguns casos, na propria pés-graduagao, Excessivamente formalista € restrito ao aprendizado de cédigos ultrapassados, cle nfio acompamhou as sucessivas transformagées sofridas pelas instituigdes de Direito no Ambito de uma sociedade marcada pela velocidade, intensidade e profundidade de suas mudangas. Acima de tudo, 0 ensino juridico se destaca pelo fla- grante envelhecimento de seus esquemas cognitivos ¢ pelo esgotamento de seus paradigmas tesricos. Por isso, tornou-se incapaz de identificar e compreender a extrema heterogeneidade dos novos conflitos sociais, a enorme complexidade técnica 8, as interd is cada vez mais pres os valores, as demandas & los na sociedade e a emergéncia de ra esse diagnéstico seja conhecido ha anos, as poucas ies adotadas até agora — como a flexibilizagao curricular ntrodugiio de maior niimero de disciplinas te6ricas — nao m os resultados esperados. Esta situagdo, contudo, nao é exclusiva da drea de Di- reito, Num belo texto sobre sua 4rea de atuagao, a economia, Robert Heilbroner e William Milberg lembram que a teoria ccondmica atualmente ensinada na graduagiio e na pés-gra- duagao estaria atingindo um grau de isolamento e distancia- mento da realidade compardvel apenas ao alcangado pelo pen- samento escolastico medieval (The crisis of vision in modern economic thougth. Cambridge: Cambridge University Press, 1966). Essa teoria econdmica é repleta de abstragdes e mo- delizagdes matemiticas dos mercados afirmam eles, sem ne- nhuma relevancia — inclusive ética — para o entendimento do mundo real. O hiato entre essa teoria e a realidade é cada vez. mais flagrante e perigoso, concluem, levando assim os cursos de economia a terem uma percepgdo equivocada ou enviesada quer do préprio objeto do ensino, quer do mercado de trabalho. A mesma critica, creio, também pode ser feita ao ensino jurfdico. Ele continua preso a uma concepagio estrita de so- ciedade (encarando-a como um sistema dotado de estruturas estabilizadas), a um tipo de Direito (0 editado por um Estado soberano) ao papel dos tribunais como locus privilegiado de resolugiio dos conflitos. Na pratica, contudo, a crescente com- plexidade da sociedade contemporanea vem tornando inviaveis 0s mercanismos juridicos de controle e direg&io baseados na rigida dicotomia entre 0 constitucional e 0 incostitucional, 0 legal € 0 ilegal. Est tornando impossfvel 0 enquadramento jurfdico de situacées heterogéneas e multifacetas por normas padronizadas com validade universal. E tem minado a efetividade das intervengoes diretas por parte do Estado, rompendo com le de sous ‘fo jurfdica 4 tentativa de coordenar essas diferentes for mas emergentes de legalidade. Apesar de seu impcato desagregador sobre os paradgimas te6ricos vigentes no ensino juridico, essa metamorfose do Direito e de suas instituigées continua sendo por ele ignorada. ‘A maioria dos cursos trata a ordem juridica contemporanea como se ela nao tivesse sofrido nenhuma alteragao estrutural nos tiltimos 50 anos, quando o Pais sofreu sua revolugao in- dustrial. Confunde-se a elaboragilo de uma dissertagao ou tese com a redaciio de projetos de lei pretensamente capazes de resolver problemas socioecondmicos cujos alcance e implica- Ges ainda nem sequer so conhecidos. Acima de tudo, sio ignoradas algumas questes essenciais para a revitalizagio do ensino do Direito e do préprio pensamento juridico, dentre as quais se destacam: * Como € possivel a produgio legislativa em contextos marcados pela velocidade e intensidade das tranfor- mages econdmicas e pela proliferagio de situagdes is novas e ainda ndo estruturadas? soci © Se os direitos civis ¢ politicos nasceram contra o Es- tado, © que podera acontecer com eles, agora que 0 Estado-nagdo parecer entrar em refluxo com a trans- nacionalizagio dos mercados? Nesse contexto, em outras palavras, nflo estZo esses direitos com sua con- tinuidade ameagada? © Se os direitos econdmicos e sociais foram concebidos para serem concretizados basicamente por meio das politicas governamentais de cardter distributivo, como podem ser eficazes no Ambito de Estados enfraqueci- dos perante o poder econdmico transnacional? © Até que ponto tribunais empenhados em assegy cumprimento desses direitos ndo correm 0 risco de encarecer os custos das transagSes econdmicas ¢, por conseqiiéncia, afungentar investimentos externos ge- radores de empregos, prejudicando indiretamente os supostos beneficidrios desses mesmos direitos? © Se, com o fendmeno da globalizagao, a esfera da poli- tica vem sendo progressivamente esvaziada pela esfe~ ra da economia, ¢ como esta vai sendo cada vez, me- nos determinada pelos Estados e cada vez mais condi- cionada pelas empresas transnacionais, sem nehum compromisso social como 0 ambiente em que atuam, de quem cobrar responsabilidade? Que tipo de direito pode ser invocado € que tribunal pode ser acionado? © Com a redugiio do tamanho € do alcance do positivo, a paralela expansio do Direito Internacional, aemergéncia do Direito da integragdo regional, o res- surgimento da lex mercatoria e a proliferacio de nor- mas técnicas produzidas por entidades privadas, como 0 Accounting Standards Committee © a International Organization for Standardization, a ordem juridica se estilhaga em distintos sistemas normativos inde- pendentes ¢ colidentes entre si? Ou, ao contrario, exis- te entre eles algum tizo de sincronia ¢ congruéncia? © Porfim, o processo de deslegalizagao atualmente patro- cinado pelos Estados e © peso crescente da lex merca- toria produzida pelos ccnglomerados transnacionais po- dem levar ao refluxo do direito ptiblico e ao retorno do ito privado como paradigma da reflexio juridica? Evidentemente, ha muitas outras questées mais técnicas ¢ interdisciplinares. O problema & saber como traté-las com igor metodolégico. E é justamente essa a tarefa_a que se pro- péem as professoras Miracy Barbosa de Sousa Gustin e Ma- ia Tereza Fonseca Dias, neste livro. Ou seja, fornecer aos studantes de Direito um roteiro metodolégico para a elabo- \Gfio de projetos ¢ execugio de pesquisas juridicas, permi- desprovido da massa critica necessiria para fo mentar sua modernizacio. José Eduardo Faria Professor Titular do Departamento de Filosofia e Teoria do Direito da Universidade de Sao Paulo (USP). © Até que ponto tribunais empenhados em assegy cumprimento desses direitos ndo correm 0 risco de encarecer os custos das transagSes econdmicas ¢, por conseqiiéncia, afungentar investimentos externos ge- radores de empregos, prejudicando indiretamente os supostos beneficidrios desses mesmos direitos? © Se, com o fendmeno da globalizagao, a esfera da poli- tica vem sendo progressivamente esvaziada pela esfe~ ra da economia, ¢ como esta vai sendo cada vez, me- nos determinada pelos Estados e cada vez mais condi- cionada pelas empresas transnacionais, sem nehum compromisso social como 0 ambiente em que atuam, de quem cobrar responsabilidade? Que tipo de direito pode ser invocado € que tribunal pode ser acionado? © Com a redugiio do tamanho € do alcance do positivo, a paralela expansio do Direito Internacional, aemergéncia do Direito da integragdo regional, o res- surgimento da lex mercatoria e a proliferacio de nor- mas técnicas produzidas por entidades privadas, como 0 Accounting Standards Committee © a International Organization for Standardization, a ordem juridica se estilhaga em distintos sistemas normativos inde- pendentes ¢ colidentes entre si? Ou, ao contrario, exis- te entre eles algum tizo de sincronia ¢ congruéncia? © Porfim, o processo de deslegalizagao atualmente patro- cinado pelos Estados e © peso crescente da lex merca- toria produzida pelos ccnglomerados transnacionais po- dem levar ao refluxo do direito ptiblico e ao retorno do ito privado como paradigma da reflexio juridica? Evidentemente, ha muitas outras questées mais técnicas ¢ interdisciplinares. O problema & saber como traté-las com igor metodolégico. E é justamente essa a tarefa_a que se pro- péem as professoras Miracy Barbosa de Sousa Gustin e Ma- ia Tereza Fonseca Dias, neste livro. Ou seja, fornecer aos studantes de Direito um roteiro metodolégico para a elabo- \Gfio de projetos ¢ execugio de pesquisas juridicas, permi- desprovido da massa critica necessiria para fo mentar sua modernizacio. José Eduardo Faria Professor Titular do Departamento de Filosofia e Teoria do Direito da Universidade de Sao Paulo (USP). SUMARIO LISTA DE FIGURAS .... CAPITULO 1 APRESENTAGAO CAPITULO 2 VISAO GLOBAL SOBRE A PESQUISA .. 2.1 Conceitos e definigdes preliminares 2.2 Origem das investigacées cientificas .. 2.3 A mudanga de rumos na concepcao da pesquisa CAPITULO 3 A CIENCIA JURIDICA E SEU OBJETO DE INVESTIGACAO 3.1 O paradigma da razio comunicacional CAPITULO 4 A OPCAO METODOLOGICA 4.1 Grandes vertentes (e6rico-metodolégicas da pesquisa social aplicada e juridica ... 4.2 Tipos genéricos de investigagées das Ciéncias Sociais Apli- cadas a Ciéneia Jurfdiea : : 4.3 As fontes da produgio do coi v7 45 50 CAPITULO 5 O DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA, SEUS ELEMENTOS E FASES ESSENCIAIS ve 53 5.1 A definigiio do mareo teérico .. daa 5.2 Desenvolvimento da investigacio ot CAPITULO 6 ESTRUTURA DO PROJETO DE PESQUISA 63 6.1 Indicacées preliminares ...... teasers (68 6.2 Partes pré-textuais .. . 65 6.3 O corpo ou texto do projeto de pesquisa Rn 6.3.1 Acolocacio do problema nR 6.3.2, Osobjetivos da pesqui 15 6.3.3 Ahipotese ... 7 6.3.4 Variéveiseindicadores 81 6.3.5 Revisiioda literatura sobreo assunto 88. 6.3.6 Ametodologia .. 7 89, 6.4 Partes pés-textuais do projeto .. : us CAPITULO 7 © RELATORIO DA PESQUISA, A MONOGRAFIA FINAL DE GRADUAGAO EM DIREITO, A DISSERTAGAO DE MES- TRADO E A TESE DE DOUTORADO es. 7.1 Desenvolvimento da argumentagio ou corpo do relaté 1 Introdugdo teérico-metodologica 7.1.2, Ocorpodorelat6rio 3. Conclusto ou Consideragoes finals. 7.2, Notas sobre 0 formato do texto € apresentagiio dos originais CAPITULO 8 NOTAS CONCLUSIVAS ..... REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS morentecrrevte 159) HIBLIOGRATIA COM TAR ANEXOS Anexo A Proposta para fichamento de textos . Anexo B Projeto de pesquisa. eereeee Anexo C Quadros-sintese das geragées metodolégicas da hist6ria Anexo D Exemplo de pesquisa diagnéstica ¢ andlise de dados Anexo E Exemplo de questionario para acompanhamento de egressos. 165 167 167 m1 185 197 221 Fig. 1. Fig. 2. Fig. 3. Fig. 4. Fig. 5. Fig. 6, Fig. 7. Fig. 8. Fig. 9. Fig. 10, LISTA DE FIGURAS Exemplo de folha de rosto de projeto de pes Exemplo de resumo de projeto de pesquis. Exemplode sumitio de projeto de pesqui Exemplo de fotha de rosto de tese de Doutoramento Exemplo de folha de rosto de equipe de pesquisadores . Exemplo de folha de rosto de: menografiainal de pesq ciagio cienifica.. Exemploder Exemplo deresumo para partcipago em enconttoscientificos imo de tese de Doutoramento. Exemplo desumétio de tesede Doutoramento .. Exemplodeepfgmae CAPiTULO 1 APRESENTACAO O texto a seguir tem o propésito de apresentar um conjun- to de indicagdes basicas e preliminares para o desenvolvimento de pesquisas no campo das Ciéncias Sociais, mais especifica- mente no campo do Direito. Além do curso promovido pelo Ntcleo Interdisciplinar para a Integragio do Ensino, Pesquisa ¢ Extensio — NIEPE, da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, este texto & produto de diversos outros cursos ministra~ dos em graduagdes e pés-graduagées e palestras proferidas sobre os temas, em varios Estados brasileiros, bem como de uma larga experiéncia em planejamento e pesquisa na Funda- cio Jodo Pinheiro, por parte de uma das autoras.! Um outro motivo, de igual importincia, derivou da inclusiio nos curricu- Jos dos cursos de Direito da disciplina Metodologia da Pesqui sa em Direito e da obrigatoriedade da apresentagio e defesa de monografias de final de curso para obtengio do titulo de Ba- charel em Direito.? Também na disciplina de pés-graduagao * As autoras puder n aplicar ¢ adequar seus conhecimentos metodoldgicos 20 campo do Direito, no planejamento, implementagao e avaliagao da pes- quisa-agio do Projeto Polos Reprodutores de Cidadania, da Faculdade de Direito da UFMG, em convénio coma Coordenadoria de Direitos, da Prefeitura de Belo Horizonte, também sob achancela do CNPq, eno acom- panhamento de orientacao da Graduagao e Pés-graduagao, 2 Vide Portaria n, 1886, de 30/12/94, do Ministério da Educagio e Cultura da Pes sae do Ensino em Direito, urge a ade- qiugiio de metodologias genéricas ao campo da produgio do hecimento juridico, O motivo maior deva ser, talvez, a exigitidade de textos especificos sobre 0 assunto, dado o surgimento recente do inte- resse pela pesquisa cientifica na esfera jurfdica do conheci- mento. Hoje ja néio se contesta a insergito da Ciéneia Juridica dentre as chamadas Ciéncias Sociais Aplicadas. E nesse cam- po de conhecimento, justamente, que a produgao do conheci- mento jurfdico vai buscar os fundamentos de sua metodologia cientifica. Apesar de vivermos um momento de incertezas em rela~ ao A fundamentagZio do conhecimento cientifico, a ciéncia, dentre todas as demais formas de conhecer a realidade, pare- ce ser a que ainda pode contribuir para a emancipagio dos sujei- tos e para a alteragtio do status quo vigente. Apesar das ma- zelas a que se prestou, a ciéncia resta proporcionar a demo- cratizagio do conhecimento produzido ¢ a melhoria das con- digdes sociais da humanidade, A Lei de Diretrizes e Bases da Educagiio Nacional ~ LDB (Lei n. 9.343/96), alicergada nos fundamentos do ensino uni- yersitério, quais sejam, a indissociabilidade entre ensino, pes- quisa ¢ extensio, prevé que a educagio superior tem como finalidades “... estimular a criago cultural e 0 desenvolvimen- to do espitito cientifico e do pensamento reflexivo” e, ainda, .. incentivar 0 trabalho de pesquisa e investigacio cientifica, visando 0 desenvolvimento da ciéncia” (art. 43, ines. I ¢ IID) (BRASIL, 1996). A referida norma veio disciplinar uma descoberta jé an- tiga das universidades ptiblicas: a de que o ensino superior deve refletir sobre 0 conhecimento que procura transmitir e sobre a formagdo que deve necessariamente proporcionar a seus alunos. A disciplina Metodologia da Pesquisa Juridica, recen- temente introduzida nas grades curriculares dos cursos de Direito, dentro da diretriz tragada pela LDB, € ainda uma disciplina em construgao. Primeiramente, porque cabe a ela wo antes pela como também aprofundar o debate sobre qual 0 contetido a ser dado a essa mais nova “cadeira” do curso de Direito. Outra observagiio que se faz pertinente € o fato de ainda nao possuirmos material didatico sobre a metodologia da pesquisa voltada exclusivamente para a Ciéncia Juridica. As peculiaridades do Direito, como Ciéncia Social Apli- cada, reclamam uma reflexao sobre os aspectos teGricos e meto- dolégicos que lhe dizem respeito, para posteriormente serem aplicados & compreensao e ao ensino da Ciéncia Juridica, A Metodologia da Pesquisa Juridica pode desenvolver seu objeto de estudos sobre dois aspectos distintos. Do ponto de vista te6rico, cabe a disciplina apresentar os principais de- bates sobre a fundamentacio do conhecimento cientifico por meio do estudo da metodologia cientffica das Ciéncias Sociais Aplicadas. No que concerne ao aspecto pratico da disciplina, a busca descrever os elementos fundamentais para o desen- volvimento de uma pesquisa cientifica, com a finalidade de dar orientagdes gerais para a composi¢io da monografia de gradua- io, exigida para a obtengaio do diploma de bacharel em Direito, € propor redirecionamentos para as pesquisas que fundamen- tam as dissertacdes e teses das pos-graduacdes em Direito. Percebeu-se, no ensino superior, que nao basta apenas apropriar-se do conhecimento produzido e transmiti-lo aos alunos. E necessario fazé-los sujeitos do processo de apren- dizagem, bem como individuos criticos em relagiio ao que é ensinado, no s6 em relagio ao contetido das disciplinas como em relagdo & sua pratica profissional cotidiana. Cabe ao cientista do Direito um papel de reflexao sobre © objeto de suas investigages, no sentido de transformar e redefinir o papel do Direito na sociedade. A primeira parte do texto dedica-se a uma visio global sobre a pesquisa como fungio académica de grande relevo para a produgito do conhecimento cientffico, dando-se valor todologia © as s de ra io © de argu- investigagio do fendmeno juridico. Apresenta-s eira parte a disjungio entre a concepgao tradicio- nal de pesquisa ¢ uma nova concepeao que se institui por seu contetido problematizad A segunda parte apresenta as grandes vertentes meto- dolégicas da pesquisa nas Ciéncias Sociais Aplicadas, dando relevo As condigées € possibilidades de utilizagio des tentes no campo especifico do Direito. Enfim, a terceira parte discute os elementos essenciai do desenvolvimento de pesquisas no campo juridico, desde a colocagio do tema-problema e da fundamentago tedrica até As particularidades da montagem de um projeto de pesquisa com todos os seus elementos, quer pré-textuais, quer textuais ou pés-textuais. Deve-se fazer um alerta ao leitor: este texto no tem o propésito de constituir-se em um manual completo de pes- quisa. Ele é simplesmente um roteiro geral de reflexdes e sugestées, aberto a critica e &s intimeras adaptacées e comple- mentagées que se fizerem necessarias. E apenas um dos tex- tos — € no tinico — para ser utilizado e discutido pelos alunos das Faculdades de Direito. Espera-se, inclusive, que este trabalho possa ser titil, de alguma forma, aos nossos pro- fessores de Metodologia da Pesquisa em Direito. Procuramos adotar neste livro as formas de referéncias bibliogrificas, citagdes, tabelas, graficos, notas de rodapé, nu- meraciio e paginagiio da forma mais aproximada das regras da Associagao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) aplicaveis & confecgio de monografias, dissertagSes e teses. Mas como a répria ABNT possui regras diversas para a normatizagio de trabalhos monograficos, relatérios técnico-cientificos, publi- agdes periddicas, livros e relat6rios de pesquisa, sugerimos uma consulta direta 4s normas da ABNT no que diz respeito A adequagiio formal dos trabalhos académicos. \s ver- CAPITULO 2 VISAO GLOBAL SOBRE A PESQUISA 2.1 CONCEITOS E DEFINIGOES PRELIMINARES Existem, em sentido corrente ou vulgar, varias acepgdes de pesquisa, Uma delas, e a mais corriqueira, é a que concebe a pesquisa como uma simples consulta de determinado tema ‘em manuais didaticos, enciclopédias, jornais, revistas ou ou- {ros textos com maior ou menor aprofundamento do assunto. Esta acep¢io foi-nos transmitida, supostamente, por nossos professores primérios ou secundérios, que insistem em de- nominar “pesquisa” todo e qualquer aprofundamento de estu- do sobre determinado tema previamente escolhido e indicado a seus alunos. Quase sempre o produto desse estudo restringe- se & repeticaio de trechos (com uma linguagem bem mais su- perficial do que no original) de livros ou de revistas, algumas vezes até mesmo acompanhados de sfnteses ¢ an formuladas e inovadoras. Apesar disso, o produto desse esfor- 0 niio passa de um estudo mais ou menos aprofundado sobre determinado tema, ¢ no de uma investigagio cientffica. Isto niio significa que bons estudos sejam desnecessirios ou, até mesmo, que no colaborem com 0 desenvolvimento de pesquisas cientfficas. O que se pode afirmar, contudo, é que nao devem ser considerados verdadeiras pesquisas cientificas, mas (Go-somente aprofundamentos de estudos. Outra acepgio vulgar de pesquisa é aquela que a corre- laciona com simples levantamentos de opinides sobre deter- ado tema ou assunto. E levantamentos” podem até se transformar em estratégias imprescindiveis para o desen- volvimento de uma investigag%o, mas nao so, por si, uma pesquisa cientffica. Pode-se, pois, concluir que uma pesquisa cientifica, em nosso caso aplicada ao campo juridico de co- nhecimento, tem uma concepgao bem mais complexa do que aquela que o senso comum the atribui. Isto nao significa, contu- do, que devemos apresentar, neste texto, pesquisa cientifica somente como a elaboracdo de projetos de investigacio ou seu desenvolvimento. A metodologia cientifica deve envolver desde as abordagens tedricas que vém sendo utilizadas nos trabalhos cientfficos — 0 que exigiria retorno hist6rico as varia- das dimensdes epistemoldgicas sobre a ciéncia e sua relagio com 0 senso comum ~ até as técnicas e procedimentos utili- zados na produgdo do conhecimento das Ciéncias Sociais Apli- cadas e, dentre elas, a esfera de produgiio do conhecimento jurfdico. Inserem-se af, inclusive, as formas de preparagio e divulgagaio da pesquisa, ou seja, 0 projeto, 0 relatério e a comunicagao do conhecimento cientifico. Optou-se por um texto de contetido mais objetivo: breves reflexes sobre cién- cia e seu estatulo te6rico, as formas de elaboragao do proje- to, as opgdes discursivas para desenvolvimento do relatério, quer como monografia, quer como dissertagio ou tese, sem, contudo, deixar de indicar a complexidade epistemoldgica em que essas escolhas estio inseridas 2.2. ORIGEM DAS INVESTIGACOES CIENTIFICAS «A definigto mais simples de pesquisa poderia ser for- mulada como a procura de respostas para perguntas ou pro- blemas propostos que ndio encontram solugdes imediatas na literatura especializada sobre o assunto. Vé-se, pois, que uma pesquisa cientifica origina-se sempre de uma indagaciio, de uma questio posta pelo pesquisador, sem solug&o imediata. Sc essa resposta é passfvel de ser encontrada por meio de simples consultas a livros, revistas ou jornais, sem a utiliza- gio de um método sistematico de investigagaio que possa ser verificavel mediante procedimentos racionais e criticos, é um Naio se pretende dizer, contudo, que a pesquisa cientifica € © tinico caminho para a produgio de conhecimento ou de verdades. © homem, em seu cotidiano, aproxima-se de seu mundo por intermédio de sua capacidade de conhecé-lo e de transform4-lo. EB um erro entender que somente o cientista é capaz de produzir conhecimento. A diferenga entre a produgio de conhecimento do homem em seu cotidiano e a produgio de conhecimento com objetivos cientificos é a forma de observa- 4o utilizada. A primeira 6, na maioria das vezes, sensitiva ou vivencial, desordenada e superficial, ou melhor, sem a exigén- cia de uma conduta voltada para a sistematicidade de procedi- mentos utilizados ou de um necessério aprofundamento desse conhecimento, de modo que o indivfduo no se satisfaga com as aparéncias dos fatos e dos fenémenos. Nao queremos afir- mar, entretanto, que © conhecimento popular é sempre super- ficial e acritico. O que se diz é que a observagaio que cotidiana- mente realizamos no tem a necessidade de ser sistemética ou de se fundamentar numa teoria erftica. Seguindo a contribuig&o de Boaventura de Sousa SAN- TOS, no livro A erftica da raz@o indolente: contra o desper- dicio da experiéncia (2000), entende-se a teoria critica como aquela que no reduz a “realidade” ao que existe, pois esta é um campo de possibilidades que devem ser confirmadas ou superadas (condigées positivas ou negativas). Nas Ciéncias Sociais Aplicadas estaremos sempre incomodados com rela- ¢do A natureza moral de nossa sociedade e & qualidade dessa moralidade. As inyestigages no campo do Direito estariio, portanto, sempre voltadas A procura de possibilidades eman- cipatérias dos grupos sociais e dos individuos. Afirmamos, assim, que © Direito e a produgiio de seu conhecimento nao se restringem & regulagdo social. Se assim fosse, as investiga © Sobre as diversas formas de conhecer a realidiade vide: (DEMO, 1995 e 2000), (LAKATOS, 19822)e (SANTOS, 1988, 19932000). ces seriam desnecessarias, pois 0 ho social nao ser (ransformador. A produgao de um conhecimento emancipador origina-se em um problema complexo que é vital e que se configura a partir de um fenémeno juridico compreendido a partir de sua dimensio cultural e tridimensional: fatica, axio- l6gica e normativa. Logo, a produgio do conhecimento é sempre contextua- lizada, Bla tem um tempo e um espaco e se inicia pela critica nfo s6 de seu contexto como dos préprios meios ¢ métodos que utiliza para a produgiio do conhecimento juridico. Por essa razio, o conhecimento cientifico origina-se em si mesmo por meio de seus métodos, procedimentos, formas sistematizadas e criticas de raciocinio, mas aspira a um conhecimento final que promova um senso comum emancipado em relagao a seus sentidos ético, politico, estético e do proprio saber que produz. 2.3. A MUDANCA DE RUMOS NA CONCEPCAO DA PESQUISA Na concepgiio tradicional da pesquisa eram valorizados critérios légico-formais e estatfsticos. Eram priorizadas, exten sivamente, as experimentagdes e todas as investigagdes que valorizassem as quantificagdes © mensuragées de todos os tipos. Os campos de conhecimento eram fragmentados e uni- disciplinares. Essas caracterfsticas estavam relacionadas e, a0 mesmo tempo, se dissociavam de suas condigdes no momen- to do surgimento das ciéncias sistematicas do século XVI. Deu-se, nessa fase, a necessidade de emancipago dessas no- ‘vas formas de saber em relagao ao campo monolitico da Filoso- fia, Substitui-se 0 método dedutivo-demonstrativo pelo méto- do indutivo da observagio e da experiéncia. Essa “nova” cién- cia exigia uma demarcagio de fronteiras: fazer de cada ciéncia uma especializagao.? 2 Naausénciade uma nomenclatura adequada para amuclanga de paradignna, em- se adotado diversas terminologias, tais como: “O novo espftito cientifico” (BACHELARD, 1998:9), “Paradigm Emergents" (SANTOS, 1989),“CiénciaPés- ‘Moderna’ (SANTOS, 1995),entre outtas concepsbes. Até muito feeentomente (seg ude do século XX), pred que 1 complexa é problematizada e experimenta-se a institucionali- zacio da pesquisa. O enfoque metodolégico deixa de ser mo- noldgico ¢, no primeiro momento, assume uma vertente da pluridisciplinaridade, ou seja, de cooperagiio teérica entre campos do conhecimento antes distanciados. Passa-se, dat, nfio mais somente para a cooperagio, mas para a coordena- cdo de disciplinas conexas ou para a interdisciplinaridade. Atualmente, a transdisciplinaridade ou a produgio de uma teoria Gnica a partir de campos de conhecimento antes com- preendidos como auténomos é a tendéncia metodolégica que emerge com maior forga.’ Os dois tiltimos enfoques exigem uma nova linguagem, dial6gica e interativa. Do paradigma da consciéneia, que antecedeu a esses novos enfoques, passa-se para o paradigma da inter e da transcompreensio, perfodo conhecido como da emergéncia de um novo paradigma (SAN- TOS, 1988, 1993 e 2000). Da antiga razfio centrada no sujei- to e na metodologia monogrdfica surge a razdio metodolégica comunicacional. Inserem-se, aqui, as “novas” vertentes meto- dol6gicas da Ciéncia do Direito e da Sociologia Juridica. O ob- jeto do Direito passa a ser uma varidvel dependente e a rela Ho juridica, um fendmeno social Até pouco tempo os cursos juridicos brasileiros faziam tabula rasa da pesquisa como fonte propulsora de novos co- nhecimentos ou como manancial de renovagdio do conheci- mento jurfdico-cientifico. Quando existia, a pesquisa qua- se sempre se restringia a consultas a manuais, a coletaneas de jurisprudéncia, a recortes de jornais, a anotagdes de revis- tas especializadas ou a simples levantamento de opinides so- bre determinado assunto ou tema especitico. Muito generica- mente, mas sempre com honrosas excegdes, as “pesquisas 2 Uma disciplina possui natureza transdisciplinar quando se institui além das tradicionais fronteiras diseiplinares (MIAILLE, 1989:61). juridicas” era e sem adequada fundamentagio teérica. A problematizagio d da reali- ace ou 0 teste de hipdteses eram questdes tidas como dis- pensdveis e irrelevantes. Supunha-se, tal como na concepgiio de senso comum, que os dados normativos “falavam por si”, tornando dispensavel qualquer tipo de diivida ou de incerteza sobre o fendmeno juridico real. Nesse panorama estéril & pesquisa, qual foi a fungiio da “iniciagao cientifica”? Sem divida, a insergdo dos alunos da graduacio nas atividades de pesquisa validou o surgimento de uma multiplicidade de enfoques ¢ de tipos de investiga- Ges jurfdicas que conduziram os cursos de Direito a estimu- los incessantes e & busca de novos métodos e técnicas que pudessem dar conta desses interesses de natureza diversificada, Encontramos, hoje, muito especialmente na Faculdade de Direito da UFMG, desde investigagées histérico-juridicas até aquelas de contetido jurfdico-projetivo e juridico-propositivo. As metodologias também se multiplicaram, Temos, atualmente, procedimentos que se utilizam nao s6 das chamadas “fontes de papel” (pesquisas bibliografica, documental e jurispruden- cial) como das “fontes personificadas”, como os estudos de caso, de opinido e a pesquisa-agio. O que devemos, pois, esperar dessa inusitada e extraordi- naria movimentagao de alunos & procura de orientadores e de indicagdes metodolégicas para a investigagao de questées re- levantes para a problematizagzio do campo jurfdico como co- nhecimento critico? Dessa efervescéncia de saber deve-se esperar 0 maximo. E 0 que seria esse nivel “maximo” ou “6ti- ino” de pesquisa? Nao seria, por certo, continuarmos a prio- rizar a unidisciplinaridade do conhecimento, dando relevo so- mente a critérios 16gico-formais e nao pretendendo uma visio critica da totalidade. Devemos, isto sim, realizar a passagem de uma raziio centrada no sujeito e no paradigma da consciéncia a rao comunicacional e ao paradigma da intercompreensio e da transcompreensio. A problematizacio da realidade juridi- ca brasileira, por nossos pesquisadores, deve representar um movimento objetivo em favor da coordenagao de discip m comum e segundo marcos teéricos convergentes. Essa movimentagao pode conduzir orientadores € orientandos a serem capazes de, por intermédio da pesqui- sa, iniciar um grande esforgo argumentativo que nao perma- nega fechado na tradicionalidade discursiva unidisciplinar do Direito. Para tanto, tornam-se imprescindiveis uma lingua- gem compreensiva € novos v6os metodolégicos e conceituais que fagam aflorar um aluno-pesquisador mais criativo e mais, consciente de sua importancia no mundo vivo da ciéneia, Com isto, novas possibilidades de conhecimento seriam permitidas © uma nog&o mais adequada da complexidade jurfdica pode- ria surgir de estudos objetivos, conduzidos segundo os para- metros das novas metodologias cientificas, CapiTuULo 3 A CIENCIA JURIDICA E SEU OBJETO DE INVESTIGACAO Na atualidade, a maioria dos teéricos do Direito afirma que o saber jurfdico nao se restringe a um saber dogmitico.' Até meados do século XX, afirmava-se que a Ciéncia do ‘eito nfo passava de um conjunto de teorias sobre a norma- tividade vigente e suas exigéncias priticas, dando assim um. maior realce ao aspecto regulative do Direito. A esfera do Direito restringia-se a um elenco de normas, proibigdes, obriga- G&es e instituigdes, ¢ a Ciéncia do Direito dedicava-se a siste- matizagio ¢ interpretagio unidisciplinar desse elenco. O sa~ ber jurfdico tinha natureza dogmatico-tecnolégica, preocupan- do-se com as nogdes de vigéncia e de eficiéncia procedimen- tal; por essa raziio, priorizava a criagio de condigées para a ago e para o aumento de decidibilidade dos conflitos sociais, sem se preocupar com a problematizacao dos fendmenos sociojuridicos e das formas de atuagdo e de regulagio desses mesmos fendmenos. Novas condigdes de concepgiio da Ciéncia do Direito foram constituidas a partir da nogio da complexidade das relagdes sociais, que n&io podem ser compreendidas em sua plenitude a partir do aumento da eficiéncia dos procedimen- "ssa discussto €aprofundada em FERRAZ.JONIOR (1989¢ 1994). 0 conhecimento eritico € reconceituagio do ato justo. Sua formas de produgao do conhecimento sao discursivas seu conjunto de complexos argumentativos trabalha com a valida- de dos argumentos por sua relevancia prética e sua capacidade de emancipagiio dos grupos sociais ¢ individuos. S6 podem ser considerados emancipados aqueles grupamentos que, a partir dos conhecimentos cientfficos, convencem-se da validade dos argumentos e do saber produzido e, por isso, adquirem a capacidade de julgé-los ¢ justificd-los perante si mesmos e os demais grupos sociais e individuos. Alguns modelos tedricos tém sido atribufdos & produgo do saber juridico: 0 analitico, 0 hermenéutico, o empirico © 0 argumentativo. O modelo analitico foi sempre apresen- tado com um carater formalista que se dedicava & sistematiza- Gio de regras e de normas. O modelo hermenéutico, ou a teoria da interpretagdo — tradicionalmente assim concebido ~, cons- t16i-se como sistema juridico aplicado e compreensivo das con- dutas humanas por meio da atividade discursiva-interpretativa. O modelo empirico, razoavelmente trabalhado por VIEHWEG (1979) e, entre nés, por Tércio Sampaio FERRAZ JUNIOR (1994), constitui-se como teoria da decisio jurfdica no sentido de investigar normas de convivéncia, no interior ou nas externa- lidades do ordenamento jurfdico, para facilitar os procedimen- tos decisérios formais e nao formalizados. O modelo da teoria da argumentagio juridica é aquele que sustenta a necessidade de convencimento — por meio da atribuigdo de validade aos ar- gumentos utilizados — e de legitimidade dos procedimentos decisdrios. Este modelo inverte o procedimento da subsungio silogfstica: a tendéncia contempordnea & de construgao da pre- missa maior a partir do esclarecimento do caso. O fundamento dessa inversiio deriva do entendimento de que as premis-sas maio- res, por si, j4 no dio conta da complexidade do “real” como dado antecedente ou construido. Nessa andlise dos modelos mais correntes € necessirio entender que ha uma interagio entre esses modelos que nfo se constitui, porém, como uma unidade io en- istemation (f tre esses modelos dii-se por meio de um processo dialético de usiio/complementagiio/distingao. Para Boayentura de Sousa SANTOS (2000), urge uma nova sintese juridico-cultural, um “des-pensar” o Direito fun- dado em tradicionais dicotomias: Estado Nacional x Sistema Mundializado; Sociedade Civil x Sociedade Politica; Direito PAblico x Direito Privado; Utopia Juridica x Pragmatismo Ju- ridico. Somente o “des-pensamento” dessas dicotomias pode revelar dissimulagGes tradicionais que ocultavam 0 fato de que © Direito, assim pensado, pode “regular” tanto o progres- So ou 0 desenvolvimento quanto a estagnagao ou a decadén- cia, Esse processo pode culminar na eliminagiio da dicotomia fundamental: regulagao-emancipagiio. Para © mesmo autor, em obra anterior (SANTOS, 1988), © conceito de ciéncia requer, na atualidade, ser formulado € justificado a partir de um conjunto de quatro teses que se inter-relacionam ¢ se complementam, A primeira tese afirma que todo conhecimento cientifico-natural é cientifico-so- cial. Enquanto na ciéncia dos tempos modernos havia uma nitida separagao entre Ciéncias Naturais e Ciéncias Sociais, no paradigma emergente fenémenos naturais também séio expli- cados a partir de conceitos origindrios das Ciéncias Sociais. Ao mesmo tempo, teorias fisico-naturais so aplicadas ao domi- nio social. A pessoa surge como autor e sujeito do fhundo e este, por supor constantes situagdes comunicativas, nado mais permite campos de conhecimento unidisciplinares e fragmen- tados. A segunda tese refere-se ao conhecimento como lo- cal ¢ total. O conhecimento total é aquele que tem como horizonte uma globalidade universal ¢ indivisa. Ele é também local, no entanto, pois é formado por temas que, em momen- tos determinados, so assumidos por grupos sociais concretos com projetos locais de vida. Essa ciéncia pode ser dita como uma ciéncia tradutora, pois estimula os conceitos ¢ teorias desenvolvidas localmente a tornarem-se universais. A tercei- 1a tese afirma que todo conhecimento é autoconhecimento. s existe a distingaio dicotomica entre sujeito do conhe: mento € objeto: um conhecimento compreensivo e intimo, que nos relaciona ao que estudamos, torna 0 objeto uma con- tinuagio do sujeito. O ato criativo da produgao cientifica deve conhecer-se intimamente antes de conhecer aquilo que cria ou compreende. A iiltima tese culmina com a postulagdo de que todo conhecimento cientifico visa constituir-se em senso comum. Sendo assim, nenhuma forma de conhecimento é, em si mes ma, racional; necessita-se dialogar com outras formas de co- nhecimento que se interpenetram e se completam. Apesat do conhecimento cientifico originar-se de regras metodolégicas proprias, mas transdisciplinares, cle s6 se realiza quando se transforma em senso comum, sé assim se constituindo como cigncia clara e transparente. O conhecimento cientifico, a partir dessas teses, visa construir um paradigma em que a ciéncia, por ser social, é coneebida como um conhecimento prudente para a constitui- go de uma vida humana decente ¢ 0 desenvolvimento tecno- l6gico deve traduzir-se em sabedoria de vida (SANTOS, 1988). Deixam-se de lado, pois, todas as concepges anteriores de um conhecimento absoluto ou de verdades absolutas. A produgao do saber esta sempre condicionada por um sistema de referéncias do sujeito de conhecimento que se insere em um patrim6nio cultural comum a determinados grupos sociais ou sociedades mais abrangentes. A ciéncia, como um conjun- to de constatagdes, deverd ser sempre passivel de verificacio por ser um saber coerente, metodicamente fundado, demons- trado e sistematizado. O método, como atividade ordenada segundo princfpios proprios e regras peculiares, possibilita fundamentar a relativa certeza do saber cientifico e de sua validade para o ser humano e a sustentagiio de seu bem-estar e de sua dignidade. 3.1 O PARADIGMA DA RAZAO COMUNICACIONAL X_ Assumimos neste trabalho a posigaio tedrico-metodolégica que entende ser objeto do Dircito o fendmeno jurfdico histori- ivi Omeno que se posi © que se realiza como experiéncia efetiva, passa . Entende-se, portanto, que nao ha Cigncia I sem referéncia a um campo de experiéncia social, daf sua nelustio dentre as Ciéncias Sociais Aplicadas. Uma forma de conhecimento que se torna objetiva no decurso do processo t6rico e cuja principal fungdio, segundo RODRIGUEZ MO- LINERO, € “... atribuir valor e submeter a jufzo critico 0 contet- do regulativo do direito, expresso através de normas estabele- cidas em determinado espaco e tempo.” (1991:153) Esse objeto, estrutura-se a partir de um paradigma que denominamos “da razio_comunicacional” (DEMO, 2000); (GUSTIN, 1999 ¢ 1999a); (HABERMAS, 1994 e 1997); (SAN- ‘TOS, 2000). Para explicagiio dessa nova racionalidade ha que se compreender que os seres humanos convivem com uma tens’o permanente em razio de sua dupla natureza, ao mes- mo tempo individual e social. Hé que se entender, igualmen- te, que esses seres, na atualidade, inserem-se em uma ordem ser humano continua a estruturar sua partir de relagdes de fidelidade com as esferas locais e com os grupos menores e mais préximos (familiares, profissionais, de amigos, dentre outros), as fronteiras nacionais se expan dem ¢ os seres ¢ as entidades coletivas (sociedades nacionais, empresas de grande porte, grupos associativos ¢ representa- Go profissional etc.) passam a conviver em um ambiente cos- mopolita, de expansio nao s6 de fronteiras geogréficas mas, inclusive, dos limites morais, politicos e juridicos, numa ex- pansao também permanente de suas necessidades. A indivi- dualidade torna-se, portanto, ao mesmo tempo, local e glo- bal, dependendo de sua insergiio nas estruturas da sociedade. E isso afeta sobremaneira as formas tradicionais pelas quais tem sido concebida, tendo em vista a perspectiva de um desabrochar dessa individualidade por meio da superagio de suas necessidades, visando a um ser capaz de recriar sua propria autonomia, Considerando essas afirmar que: 1-se possivel a) Deve-se garantir aos individuos ¢ aos grupos, ou co- letividades, oportunidades que Ihes permitam adqui- rir capacidades efetivas de minimizagio de danos, pri- vagdes ou sofrimentos graves e, assim, ampliar essa potencialidade de atividade criativa e interativa, cuja pré-condigao é a autonomia, b) Sendo assim, a realizagio ou nao-realizagiio das neces- sidades afetaré positiva ou negativamente a plenitude das pessoas ou das coletividades em sua busca perma- nente de um ser humano emancipado e auto-realizado. Essa realizagiio parece estar limitada tGio-somente pela escassez de tempo da vida humana, Mesmo assim, néio se pode afirmar que essa auto-realizagao esteja limitada pelo tempo biolégico de forma inexoravel. Sabe-se que 0 ser recebe capacidades e potencialidades que sio an- teriores ao seu limite biolégico, tais como influéncia familiares ¢ comunitérias, dentre outras. , afinal, a morte niio é seu limite, pois lega 2 sua posteridade nfo s6 descendentes, como agées relevantes ¢ os mais varia- dos tipos de herangas ¢ sucessées. c) As necessidades, por todas essas razdes, concedem aos individuos argumentos sobre a justiga e a justeza dos fatos e das relacées; portanto, sobre os fundamen- tos de sua legitimidade. Sendo assim, a constituigao dessa legitimidade deverd ter, igualmente, contetido so- cial e cultural, obtido a partir do consenso discursivo ¢ do exercicio de uma democracia na qual a participa- io se estruture de forma solidéria e emancipada. @) A autonomia, aqui reafirmada como necessidade pri- mordial do homem ocidental contemporineo, deve ser considerada num sentido interativo ¢ dialégico, por isso, também de natureza social e transcultural, que supera a concepgao restrita e individualizante da ndo modero e que rompe com ‘io tradicional da tensio irremediavel da disjun- cio entre as esferas piiblica ¢ privada. A autonomia reconceituada nesse sentido ¢ obtida mediante f x mas discursivas e auto-reflexivas passa a vislumbrar um privado que se realiza no ptiblico, este dltimo construido a partir de uma concepgdo de cidadania ativa e de sociedade civil que se expande além das fronteiras locais ou nacionais. e) A potencialidade de aprendizagem, de criatividade e de inovacao do ser humano tem permitido que ele, por meio da condigdo de uma crescente autonomia, seja capaz de transcender uma visio e um discurso comunitério t6picos e os limites de uma linguagem nor- mativa particular, possibilitando um processo de eman- cipagiio do homem ao qual no se pode atribuir um termo. E um processo de construg%o normativa que, por intermédio da expansio das relagbes democréti- cas, realiza-se no constante desvendamento de novas alienag6es ¢ das variadas formas de exclusiio do mun- do contemporaneo. certo que a sociedade contemporanea teré de propor- cionar aos cidadios mecanismos efetivos de satisfagiio das necessidades que agora se expandem de forma incomensura- vel a partir da expansio dos mercados e das formas de comu- nicagio. E necessdrio que se submeta a economia a fins Ulti mos, tais como 0 acesso a igual poder ¢ a igual participagao, oportunidades justas de desenvolvimento das competéncias comunicativas © a efetivagao igual e para todos dos direitos fundamentais ¢ humanos, conferindo a esses temas sentido politico e diregdes normativas cada vez, mais precisas e mais adequadas ds condigdes estruturantes da nova ordem social. Todas essas iniciativas deveriio ter como meta o desenvolvi- mento da potencialidade criativa, interativa e dialégica da pes- soa humana em niveis cada vez mais altos, no sentido de ampliar sua capacidade de insergdo autOnoma em seu contex- Xx i mesmo e p: coletividade comunicativa. Para que essas inspiragdes tornem- se realidade é indispensavel um processo de reanimagao ¢ de reconjugagiio de esforgos dos sistemas politico ¢ juridico de cada sociedade, com o objetivo de estabelecer uma nova ca- pacidade de debate nacional sobre as escolhas fundamentais que devem ser feitas e os procedimentos a serem utilizados. Cada participante desse debate devera estar consciente do valor de sua prépria competéncia comunicativa para o de- senvolvimento de uma dialogicidade e de uma discursividade democratica que possam dar legitimidade politica e normativa a esse processo. Na atualidade, uma sociedade justa deve supor a existéncia de politicas e de critérios normativos, discur- sivamente estabelecidos por individuos com autonomia, que re- gulem uma distribuigdo eqiitativa do produto social e que permitam a obtengao de novos patamares de emancipagao social. Tudo isso permitiria a realizagfio da autonomia privada por meio da consolidagdo do debate na esfera piiblica e do efetivo desenvolvimento da capacidade de convencimento como expediente de consenso e de legitimacao das estruturas e dos canais normativos democraticamente obtidos. A tarefa metodolégica nao pode desconhecer esse novo homem que se constréi numa malha complexa de relacdes que combina as pretensdes de institucionalizacio das rela- “ ges sociais com 0 valor inescusdvel da autodeterminagaio da Pessoa. Isso supéc a dialogicidade como método € a atitono- »mia interativa e discursiva como fundamento dessa relagio metédica, A razio comunicativa ou comunicacional (GUSTIN, 1999a:209) 6 aquela que promove a inclusfio de um sujeito emancipado que se insere socialmente por meio de miltiplas formas de participagao nas esferas puiblicas e privadas de tomada de decisaio. Ele é um sujeito complexo ¢ mtiltiplo. De um lado, ele é interesses e papéis diversificados, muitas vezes dicotémico: Pai/filho, trabalhador/patrio, professor/aluno, cidadiio, dentre outros que se diversificam em termos de habilidades, qui cages, capacidades ¢ responsabilidades. Sio maltiplas suas relagdes discursivas: grupos diferentes de pessoas interagem com sua identidade heterogénea. Finalmente, esse set com- plexo comunica-se por meio de mais de uma linguagem mo- ral, ou seja, ele estrutura sua individualidade por intermédio de valores e princfpios diversificados. CAPITULO 4 A OPCAO METODOLOGICA Toda opedo metodoldgica supSe uma concepgao provi- s6ria da realidade a ser conhecida. Trés elementos de grande importéncia condicionam, em nossos dias, a escolha do mé- todo cientffico para a pesquisa a ser desenvolvida. O primeiro elemento ¢ a idéia de que a realidade juridica esta condiciona- da pela trama das relagdes de natureza econémica, politica, ética e ideolégica. Esse elemento aponta para o fato de que o Direito, como fendmeno juridico, é também social e cultural. O segundo elemento constitui-se na necessidade de questio- har os institutos do Direito Positivo nacional que reproduzem © status quo € que, por conseguinte, desconhecem as deman- das de transformaciio da realidade mais abrangente. O tercei- ro elemento refere-se ao fato de que a escolha do método significa a adogdo de uma postura politico-ideolégica perante a realidade, ou seja, a procura nas reivindicagdes ¢ demandas sociais de uma racionalidade que se desprende da racionalidade formalista e que supde a produgio de um conhecimento juridico, realiza por meio de reflexes discursivas inter ou transdisciplinares. Apesar das reagdes em contririo, 0 Direito hoje se ins- tala na sociedade como um dos elementos de transformagio modernizadora das sociedades tradicionais, especialmente aquelas que so referidas como de Terceiro Mundo ou de desenvolvimento precsrio. Ap6s a década de 60 surgem novas metodol6gico, ¢ o interesse pelas novas formas de andilise das instincias de decisdo ¢ de poder politico surgem como for- mas metodoldgicas de grande importancia, que permitem a conexiio entre as Ciéncias do Direito e da Politica, do Direito e da Cigncia da Administragio, do Direito e da Economia etc.! As condigdes sociais do pés-guerra e a insuficiéncia da aco publica em relagiio as varias crises que se colocam fa- zem surgir novos formatos estatais, os quais no sto capazes de debelar a explosiio de litigiosidade que se faz acompanhar de novos atores coletivos sociais (as organizagdes n&io-governa- mentais e os novos movimentos sociais). Esse contexto social téncia & uma das raz6es para o surgimento da crise de tragiio da justiga ao lado da crise de identidade e de refe~ réncias politicas. A nogiio dessa complexidade social vem valorizar a ne- cessidade de investigagdes que se pautem por novas meto- dologias, novos temas como foco de estudo ¢ a delimitagao de objetos de pesquisa que exigem problematizagées e teorias explicativas de contetidos cada vex mais complexos. 4.1 GRANDES VERTENTES TEORICO-METODOLOGICAS DA PESQUISA SOCIAL APLICADA E JUR{DICA Acomplexidade contextual conduziu a superagaio de me- todologias de cortes puramente positivistas ou formalistas. Dessa reagio ao tradicionalismo jurfdico formalista surgiram trés grandes linhas metodol6gicas, originariamente sem qual- quer complexidade conceitual, que, aos poucos, foram se defi- nindo como grandes vertentes tedrico-metodolégicas, agora Jj com maior elaboragiio de conceitos e diretrizes. As trés grandes linhas metodolégicas que se destacaram foram: Acercada Teoria das Organizagées, que oferece importantes elementos aoesti- do das instituigdes jurficas, consulte MARCH&OLSEN (1989). neering) produgiio em uma tecnologia voltada para as ques- tes sociais, mas que substitui drasticamente os valo- res pelos fins e os fundamentos pelos efeitos. Essa grande linha ganhou forga nos EUA; © alinha metodolégica de sentido jurisprudencial con- figura-se a partir de um novo modo de assumir metodi- camente a dialética entre sistema e problema, enquan- to coordenadas complementares e irredutiveis do jutzo juridico; © a linha critico-metodolégica, supGe uma teoria criti- ca da realidade e sustenta duas teses de grande valor para o repensar da Ciéncia do Direito e de seus funda- mentos ¢ objeto: a primeira defende que o pensamen- € nao sistematico. Essa tese trabalha com a nogao de razio pritica e de raziio prudencial para o favoreci- mento da decisdo juridica. A segunda tese insere-se, na versio postulada pela teoria do diseurso ¢ pela teoria argumentativa, Essa linha compreende 0 Di- reito como uma rede complexa de linguagens e de jignificados. Dessas linhas surgem grandes vertentes te6rico-metodo- Igicas propostas de forma diversificada. Sio exemplos des- sas vertentes aquelas propostas por HERRERA (1998) e por WITKER (1985). Em nosso conceito, deve-se pensé-las em(ré3) grandes vertentes tedrico-metodolégicas: jurfdico-dogmatiea, juridico- sociolégica ou empfrica e juridico-tesrica. A primeira vertente, juridico-dogmética)considera 0 Direito com auto-suficiéncia metodolégica ¢ trabalha com os elementos internos ao ordenamento jurfdico. Desenvolve investigacdes com vistas 4 compreensdo das relagdes nor- mativas nos varios campos do Direito e com a avaliagiio das estruturas internas do ordenamento juridico. Acentua a no- Giio de eficiéncia das relagdes entre € nos institutos juridi- vilise do discurso norm limites do ordenamento, * A segunda vertente, juridico-sociolégicd“ou empirica, propoe-se a compreender 0 fendmeno jurfdico no ambiente social mais amplo. Analisa 0 Direito como varidvel depen- dente da sociedade e trabalha com as nogées de eficdcia e de efetividade das relagdes Direito/sociedade. Preocupa-se com a faticidade do Direito e as relagdes contraditérias que esta~ belece com o préprio Direito e com os demais campos: socio- cultural, politico antropolégico._ A vertente juridico-teérica acentua os aspectos concei- tuais, ideolégicos e doutrindrios de determinado campo que se deseja investigar. Essa vertente relaciona-se, mais direta- mente, com a esfera da Filosofia do Direito ¢ com as dreas teGrico-gerais dos demais campos juridicos. Essa vertente deverd seguir os mesmos passos das demais, & excegiio dos procedimentos metodolégicos de campo. Isto nao significa, porém, que as investigages inseridas nessa vertente no te- nham natureza aplicada como as demais, visto que toda in- vestigagiio te6rica, no campo das Cigncias Sociais Aplicadas, deve visar uma aplicagao pratica. Os raciocinios desenvolvidos nas investigagées dessas vertentes te6rico-metodolégicas podem ser do tipo indutivo, dedutivo, hipotético-dedutivo e dialético. O raciocinio indutivo é um processo mental que parte de dados particulares e localizados e se dirige a constatacies gerais. Assim, as conclusées do processo indutivo de racioct- nio sao sempre mais amplas do que os dados ou premissas “dos quais derivaram. E 0 caminho do particular para o geral, fo tr€s as Fases do processo indutivo de conhecimento: a obser- vagiio dos fatos ou fenémenos, a procura da relagdo entre eles 9 processo de generalizagiio dos achados nas duas primeiras fases. Nas Ciencias Sociais Aplicadas, a critica que se pode fazer a uso da indugio € que as pesquisas desse campo nao permitem generalizagées completas por se restringirem a cam- Pos sociais especificos, sendo dificeis as universalizagdes dos conhecimentos obtidos. ivo i inio dedutivo & éneia ‘ou a normas ¢ regras em relagio a {pios ger jor nimero de casos que a eles 1 ser referidos. Esse raciocfnio trabalha com a suposigao de subordinago, ou seja, uma regularidade subordina-se a uma regularidade geral, Comparando esses dois primeitos raciocinios, © segundo tem como objetivo explicitar o contetido das premis- sas € 0 indutivo tenta ampliar 0 alcance dos conhecimentos. SALMON (1974) apresenta a distingdio entre esses dois racioci- nios a partir de duas caracterfsticas fundamentai Dedugio_————_—*|indugio 4) Setodas.as premissas so | a) Se todas as premissas si verdadeiras, aconclus verdadeiras, a conclusio é | deve ser verdadeira. provavelmente verdadeira, rmasnfo necessariamente veradeira, 1b) Todas informagioon b) Aconelustio encerra contetido fatualdaconclusio| informactio que io jiéestava, pelo menosimplici- va, nem implicita- tamente, nas premissas. ‘mente, nas premissas, Fonte: SALMON, 1974:3031), Critica-se 0 raciocinio ou a argumentaciio dedutiva por- que fornece premissas gerais das quais um fato ou regularida- des podem ser derivados, mas isso nem sempre é suficiente para uma compreensio mais ampliada. Do mesmo modo, pode-se criticar essa forma de argumentagio por nio ser ela condicAo suficiente de explicagdo, nem necessaria. Muitas siio as explicagdes que podemos fornecer ¢ que niio estio conec- tadas com leis ou prinefpios gerai Lembremos que 0 argumento ou raciocinio indutivo par- te da observagiio de fendmenos de determinada categoria para a tolalidade daquela mesma classe; 0 dedutivo parte de gene- ralizagSes ou premissas ja aceitas — as leis, as totalidades —

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