Você está na página 1de 10
ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA CLASSICA E POLITICA A teoria do valor na Economia classica: seus avancos e limitagées Maura Locla Montella Carvalho Anse Profesorado Departamento de 0 estudo do valor pela Escola Classica serviu ‘muito mais como instrumento para andlise de outras ‘quests relatvas & Economia do que como moti para uma anise prépra E por isto que, Davi Ricardo, preocupado em eterminar as leis que regulavam a distibuigéo do Produto entre as classes sociais, ndo abordou a ‘questéo do valor como Adam Smith, intressado, Pr sua ver, na origem e na causa da riqueza das rages. Outta uilizacéo do valor foi ela por Marx, para quem a *teoria do valor-rabalho néo era apenas uma evindicagio de que o trabalhador tem. direto 20 produto de seu trabalho. Pelo contrrio, sua alegagdo € de que a teora do valor € precisa: mente o que explica a exploracio™. Em suma: meios ‘uals para aleancar finalidades diferentes, Ateoria do valor de Adam Smith ‘Adam Smith, em meio & Revolugéo Industrial, observava que as maiores poténcias econdmicas do passado, como Portugal e Espanha, esmoreciam frente &inglaterra do fim do sécul XVI. Vendo isto, ropos-se a explicer por que umas nagdes tora: vam-se mais ricas do que outras;utizando a andlise do valor das mercadorias como instrumento para ating esse objetivo. Em seu wo A rigueza das nagbes:investigagdo sobre suas naturezas suas causa, publicado em 1776, Smith afirma que *o trabalho anual de toda ‘ago éofundo que originalmente a prove de todas 4» coisas necessriase dtels que consome anual: mente, € que consistem sempre, seja no produto medio do trabalho, seja no que é comprado com aquele produto de outras nagdes.(..) Na medida em que este produto, ovo que 6 com ele comprado, traga uma maior ou menor proviso a0 contingente daqueles que vao consumito, a nagéo estaré melhor ‘0u piorabastecida com os bens de que necessita"* Entra daf que, segundo Smith 1) a riqueza de uma nagéo consste nas coisas necesséiase itels ‘de que ela dispde; e 2) 0 trabalho ¢ o fundo de Beondmicas da FEA-URIF proviso destas coisas, sea pela posbidade de Inigo deta de seu produto sia pela posbiade de toca por mercadeis de outs nagtes sas obseragbeslevaram-no a anlar qua as condigdes mais favoraveis para 0 maior rendims to do trabalho socal. Concluiu que “0 maior apimorament das frgas predutias do trabalho, a malor parte da habibdade, desrezae bom senso om os quis trabalho € em tod parte digo ov executed, parecer ter sid resulados da visio do trabalho”, “Uma ver plenamenteestabeleclda a dso do tabaho, € mito edu a parela de necessida des humanas que pode ser atendida pela producéo Individual do proprio trabalhador. A grande maioria de suas neessidaes, le a satan pernutano[o excedente] do seu trabalho (...). Assim sendo. todo homem subsist por melo da toc ‘tree, por sua vex, requero aparecimerto da moeda, hj vita que *(.) toa pessoa prcente, ‘em qualquer sociedade e em qualquer periodo da his, depois de adotr pela primeira vera visio do taalho, deve natualment terse emperhado em conus seus nego deal forma que, acada rmament tess consi, além dos produtos dretos de seu prépio trabalho, uma cera quantdde de alguna otra coisa [a moeda, no casa, .) ta gue, fem seu entender, poucas pessoas recusariam Feceber em toca do produto de seus propos trabalhos."* Tendo comentado o desenvohimento da disso do trabaloe resatado a decorentenecessade da moeda como meio de troca,restava a Smith responder ".) qi sé asregrs que naurmen- te as pessoas obseram ao tocar suas meteacoras ‘Por dinheiro ou por outras mercadorias? De fato, tio logo prods voada para 0 mercado se general, foma-se necessroexcor tar uma uridede de medida capaz de quar o Valor das mereadarias a serem tocadas. Se sia 20 -Meva XT ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA CLASSICA E POLITICA unidade de medida surge exclusivamente por causa a troca, diz-se que 6 0 “valor de troca" das ‘mereadorias que interessa a Smith e aos demais ‘economists cléssicos. “valor de uso” fica fora de suas andises;néo porque igorem que as mercado- tas o possuam, dada sua qualidade de coisas ites, 'mas sim porque, como querem invesigar exclusiva: mente a troca,o valor que sobretudo Ines importa € aquele que tém os bens de confiarem a0 seu possuidor a capacidade de adquiiroutos bens. E este valor ndo outro senéo o valor de troca.” ‘Ao valor de troca de uma mercadoria, Smith também denomina “prego real" dessa mercadaria; « chamathe real em contraposicéo a sua expresso monetria. Para ele, o preco em moeda de uma ‘mercadoria (ou “prego nominal) néo representa 0 ‘que ela realmente vale®. © que uma mercedoria realmente vale, ou sea, seu “valor real” €0 trabalho ‘© incdmodo que seu possuidor pode poupara sie pode impor a outros: *O que € comprado com Ainheio ou com bens, 6 adquitido pelo trabalho, tanto quanto aquilo que adquirimos com 0 nosso prio trabalho. Aquele dinheio ou aqueles bens 1a tealidade nos poupam este trabalho. Ele contém © valor de uma certa quantidade de trabalho que permutamos por aquilo que, na ocasio, supomos conter o yalor de uma quantidade igual (de trabathol"®. ‘Smith pretende mostrar com iso, que o trabalho 6 abase das relagées de toca , portant, do valor. Logo, € o trabalho que se comanda (ou, que se compra) que dé a medida da rqueza:“Néo fl por ‘ouro ov por prata, mas pelo trabalho, que foi ctiginamente comprada toda a iqueza do mundo; eovaor dessa rqueza, para aqueles que apossuem, « desejam trocéa por novos produits, éexatamen- te igual &quantdade de trabalho que ess riqueza Ihes dé condigées de comprar ou comandar” Segue que, numa sociedade mercantil, onde prevalece a divisto do trabalho, em conseqéncia, a troca, 0s bens necessérios & proviséo de uma pessoa advém cada vez menos do proprio trabalho «cada vez mais do trabalho dos outros. Neste contexto em que o valor se subordna&riqueza, “um homem seré rico ou pobre conforme a quantdade de serio aheig que esté em condigées de comprar ‘ou comandar""", A riqueza de uma pessoa 6, pos, ‘seu poder de compra sua capacidade de “coman- 4o sobre todo 0 trabalho ou sobre todo 0 produto 4o trabalho dlsponvel no mercado". 0 valor de ttoca de uma mercadvia, por suave sex igual & eantensio do poder de compra que esta mercadoria, confre a seu propretro, Entéo, eo valor de troca 6 a capacidade de obler Fiqueza ist €, valor de uso, deco da, qu valor de uma mercadoria, para quem a possti e no tenciona usé-la ditetamente em seu consumo, Sendo trocéla por outros bens, ¢ igual &quantidade de trabalho alheio que essa mercadora Ihe permite ‘comprar ou comandarna hora da roa. Conseqien- temente, ‘o trabalho comandado 6 a medida real do valor de troca de todas as mercadorias'13 Bis a teoria do valorrabalho comandido des- cia por Sith em A Rigueza das Nag6es. Toda essa teoria esté correta enquanio Smith anaisa uma sociedad em que os produtores diretos so, a0 mesmo tempo, possudores e verdedores das mercadorias, Entretanto, a0 pressentr que na passagem da sociedade rude e primitva para a sociedade capitalist, o trabalho contido em uma ‘mercadori dversia do trabalho comandado por ela, Smith abandona a concepgéo de valor-rabalho em favor de uma teoria dos custos de produgéo (ou teria do prego natural), baseada na justaposigéo dos tr€s componentes do prego, quais sejam: saléio, lueros renda da tere Esta aitude deu margem a rés quests crucial 1) porque a teoia do valortrabalhoeraincompativel com a realdade capitalist; 2) em que ponto Smith percebeu que o trabalho contido nas mercadorias vergia do trabalho comandado; e 3) em que consist a teora proposta em subsituigéo & teoria do valortrabalho comandado? Na troca simples, tipica da sociedade “rude primitiva’ou *sociedade mercanil simoles", 0 trablhador &proprietéio de todo o produ de seu trabalho; natroca entre mercadorias produsidas em condigées capitalists, 0 trabalhador nio mais se apropria de todo produto, uma vez que deste mesmo produto passam ase “deuzidos"8 0 lucro do capitalist ea renda do propretério da tera préprio Smith afima que no estégio antigo primitivo anterior 20 acimulo de capital e & apropriagdo da terra, todo o produto do ‘rabalho pertence 20 trabalhador. Enretanto, no tomento fem que o capital se acumula nas maos de um determinado grupo de pessoas, os trabahadores deixam de ser donos dos meios de produsio, ou, Mesa XI. 21 ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA CLAS EPOUITICA pelo menos, deixam de ser donos de meios de Producao capazes de concorrer com aqueles comprados pelos detentores do capital. A partir dessa nova stuagho, as pessoas laborisas se Wem ‘obrigadas a trabalhar para ocaptita (é que no podem concorrer com ele) para garantr sua subssténcia. Em troca da subsisncia (expressa pelos saléros), os trabalhadores devem dar 20 ‘apitalista uma parte daqulo que 0 seu trabalho produz, Esta parte ou porgéo constitu o “iro do capita. ‘Aralogamente, no momento em que toda a tera de um pals se toma propriedade pivada, os donos das teres passam a exigir uma renda de quem tenciona usélas, mesmo que seja para colter seus produto naturals, Tas produtos, que custavam a0 trabalhador apenas o trabalho de apanhé-los, a Patt dessa nova stag tém ose prego onerado. Este nus se deve a0 fato de o traalhador ter que pagar pela permisséo de apanhar os produtos da terrae de ter que dar ao proprietério uma parte ‘aguilo qu 0 seu trabalho cole ou produz. Esta parle ou porcéo constiui a “renda da tera. Deduz-se a partir daf, que uma mercadoria produsida 3 condgbestipicamente capitalists, deve comandar néo 86 a quantdade de trabalho necessira para produzia (isto 6, o sali), mas também uma porgéo adicional, que servic para cobrir 0 valor do lucro e o valor da renda. E justamente neste ponto que Smith conclai que 0 trabalho contido nas mercadorias diverge do trabalho por elas comandado, No caso, 0 vabalho contdo nas mercadarias comesponde ao sao, e 6 trabalho par elas comandado coresponde & soma oa, co rend, qu, dae, stoma diferentes. Para fugir a essa dificuldade, Smith propée a teora do prego natural em substiugéo & tera do valor.rabalho comandado. A nova teoria traz 0 Seguinteraciocinia: o valor (ou prego natural) de um bem equivale& soma do slo, do lucro e da renda. Assim, trabalho, capital e tera, que antes consiufam aTonte de todo o rendienio, mas no 2 font de todo o valor, passam ase (para dil a constalagio de que o wabalho contido ¢ diferente o trabalho comandado) a fonte de todo rendimen- to € de todo valor, a0 mesmo tempo. Desta forma, Smith era duas concepgies opostas: de acordo ‘com uma ~a teoia do valor‘rebalho comandado - , salvos, rose rena da tera constituem as tes Dares em que se distribu um valor, De acordo com ‘outa ~atevia do prego natural -, ests tés partes, ‘compéem o valor. No primelto caso, 0 valor se forma antes da distibuigéo dos rendimentos. No segundo, séo os rendimentos que se encontram pressupostes, e, por isto, s4o eles que formam 0 valor, Huma vise! crulridade nesta ima versio: sua iia bsica€ de que a mercadoria tem um valor (ou prego natural), e que este € a soma do sali, do lucto e da renda da tra; mas 0 valor do salério, do lucro e da renda da terra (embora suposto predeterminado) depende, na realdade, do valor de outros bens, e, potato, da soma dos salérios, Iueros ¢ rendas despendidos na producdo destes bens. £ 0 caso, por exemplo, do componente ‘salirio", que depende dos valores (ou pregos naturais) dos bens de subsisténcia, os quais, dependem, por saver dos saléros, eros erendas gastos para produztlos. Desse mado, chega-se & concluséo que 0s precos dependem dos precos. Mas, como diz Joan Robinson, ‘Adam Smith teimoso”. Ignora a nti contradigéo que permeia, sua alse edescreve: “Hs em toda sociedade uma norma ou média, tanto de salétios quanto de lucros e rendas (..) Essas norma ou taxas médias podem ser chamadas de taxas naturals de saléios, crs e rendas, no tempo e espago em que normaimente prevalecem. Quando o prego de qualquer mercadoriando é nem superior nem inferior ao sufcent pare pagar essas, texas naturais, a mercadoriaesté sendovendida pelo que poderemos chamar seu prego natural. A mercadoria esta, portanto, sendo vendida por ‘exalamente 0 que ela vale*15, O preco de mercado desta mesma mercadoria & ‘o pro pelo que el ¢ efetivamente vena. Com estes concetos, Smith explca 0 funciona- ‘mento do mercado: “O preso de mercado de uma mercadotia€ regulado pela proporcéo entre a quantidade que ¢ efetivamente colocada no mercado [oferta efetva] ea demanda daqueles que esti disposos a pagar o prego natural da merce dora [demanda efetival"I6 Entéo, quando a oferta efetiva € inferior & demands efetva, a mairia dos consumidores se Aspe 2 pagar mais pla mercado. O alto prego que pagam resulta na elevacdo do prego de 22 Mesa XI ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA CLASSICA | ‘mercado frente 20 prego natural dessa mercadora ‘Analogamente, quando a oferta efetva é maior ‘que a demanda efetva, apenas parte dos consu- dares compra a mercadoria pelo seu valor integral. s demais consumidores 6 aceitam pagar menos, € 0 baixo preco que pagam pela mercadoria necessariamente reduz seu prego de mercado. Enfim, quando a oferta efetiva¢ igual demanda efetva 0 prego de mercado 6 igual ao preco natural, ‘© 0 mercado encontrase em equibio. *Conseqientemente,o prego natural € como 0 prego cenital ao redor do qual continuamente estéo ‘sravitando os precos de todas as mercadorias. (..) E, quaisquer que possam ser as obstéculos que os impecam de frar-se nesse centro de repouso contnuidade, constantemente tenderéo para ele."I7 Estee outros postulados de Smith mostram que ‘le avangou muito além do que as peculardades do seu tempo permitiriam: ‘Smith escreveu cexalamente nos primérdios,sendo na véspera, da Revolucdo Industrial". Em conseqdéncia, ‘a sua “outtina 6 pode ser apropriadamente compreen- ida come refiexo dum perfodo de transigéo, cujos problemas consisiam exclusivamente em desbra- var o tereno para o investimento e a expansio industial"18 No obstante, fcaram de heranga duas fortes limitagbes em sua andlise: a primeira reere-se & controvertida criagio de duas terias do valor: @ “teoria do valortrabalho" e a *teoria do valor- custo". A outa diz respeito a0 fato de Smith ter se limitado ao trabalho como tnico meio de produgio capaz de gerar renda, dado que a tera ‘era consderada um fator exégeno; eo capita, nada ‘mals do que *ofrto da acumulacio proporcionada pela parcimdnia sobre os futos do trabalho"20. ‘A despeito das criticas que se suscitaram, a formulagéo de uma teoria, notadamente tosca, acerca do valor, serviusufcientemente aos propés- tos de Smith, euja preocupacéo principal era com © ‘erescimento do produto, € no com os presos propriamente dios A teoria do valor de David Ricardo Sequindo a tina de Smith, pla qual ateoria do valor se presta muito mais como instrumento para ‘alguma andlise do que como motivo desia andlise, *para Ricardo, também, o valor era uma questéo secundétia. Ricardo inicialmente nio se pos em LITICA, campo para procurar uma teoria dos precos*21 ‘Ao contro, esta preocupado em determinar as is que regulavam a distibuiggo do produto entre as diferentes classes socials: *0 produto da tera - tudo o que se obtém de sua superticie mediante a aplicacdo conjunta do trabalho, da maquinaria e do capital ~se divide entre ltés classes da comunidade, a saber: o propieério da tera, 0 dono do capital (..) € os tabalhadores ). “Mas, em diferentes estigios da sociedade, as porgées do produto total que serio distibuidas entre estas tés classes, sob os nomes de renda, Iucroe sali, serdoessencialmente diferentes (.) *Determinar as les que regulam esta distrbuigio 0 principal problema da Economia Poltica."22 Para alcangar este objetivo, Ricardo, ao contrério de Smith, ndo se pend a sistemas pré-capitalsas, como 2 sociedade mercantil simples ou o estado rude e primtivo da sociedade. Em seu lo Principios de Economia Politica e Tributacdo, publicado em 1817, o capitalismo aparece como um sistema Plenamente consoidado, cuja mola propulsora é a ‘obtengdo de luero. Achava, por isso, que, determi- ‘nando o lucro, determinara as leis que fegulam & sua distribuigéo e a distribuigéo dos demais rendimentos (salto e renda da tra) por entre as classes socias A primeira tentativa de abordar o problema da Aistbuigéo apareceu dois anos antes de publicados 9s Principios, em um panflto initulado Ensaio ‘acerca da influéncia do batxo preco do cereal sabre 0s lucros do capital (1815). Neste trabalho, Ricardo apgiase em dois preceitos bésicas: 1) 0 cro da ‘economia como um todo depende da taxa de hero formada na agrcultura; e 2) devido & conconéncla entre os capitals da agricultura e da manufatura, & taxa de lucro da sociedade em geral & sempre uniforme. Segundo Srafa, “a base racional do principio do papel determinante dos luros na agricultura, que jamais se enconira expictamente apresentado por Ricardo, & que na agricultura a mesma mercadoria, isto €, 0 trigo, consitu tanto o capital (compreen: ddido como sendo composto pelos géneros de subsisténcia necessaios aos trabalhadores) como © produto; consequentemente, a determinacio do Io mediante a diferenga entre o produto total e 0 capital adiantado, e também a determinacéo da Mesa XI. 23 ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA CLASSICA E POLITICA, ropory ente esse lucro e o capita, se efetuam Airtaente ene quantdades de igo, sem con derar 0s problemas de valor’™. Ttava-se de leva até ao limite o que os foera- tas pensavam da estrutua da producéo agricola, 11 sea, de coneeber esta como uma aidade que produ una tea mercado, o igo, e que dela faz uso como o seu Ginico meio de produgéo (no caso, para a subsisténcia dos trabalhadores). De fto, a grande contbuigéo dos fisiocrtas foi ter observado que “se o produto social (...) devesse ser obtido ano aps ano, uma pate dele ei de er reempregada na produgio. Alem do necesito 3 reposgdo dos meas de produc, eta parte inclla 4 subsistncia dos uabathadores agcoas:0 que resiasse do produto anual consituiria um ‘exceden- te’ ou produit net do qual a sociedade poderia dispor(.)°™ Neste sentido, a parte destinada aos trabalha ores aparcia como requisito necessro para a petpetuacio da producto. O excedete, 20 contr Ti, era excess, sobejo. Era aquela parte que no precsava de ser reempregada para garantr a producio do ano seguint. Era, em suma, a parte ‘estnada aos rentists, apenas por serem eles, os ddonos da tera. Smith jé havia estendido 0 raclocinio dos fisiocratas, quando mostrou que o excedente crigitavase da producéo em geal, néo apenas da produco agricl. Apart da mouse comum «2 decomposigéo do excedente em vas partes: uma Parte destinada aos donos da terra (ou rentistas), e ‘ura destnada 2s donos dos melas de produgao (ou capitis). Ete novo conceiio de excedente Consituiu a base da teria da distibuigdo dos economistascléssicos até Ricardo Ricardo, em sua vez, exclu a renda da terra, ‘dentiicando o excedente~ da versio smithiana ~ apenas com os lueros do capitalist, Para tant, apoiou-se na tora da renda de Malthus a0 afm 0 senhor Malthus define muito coretamente a renda da tera como 'a parte do valor do prodto total que resta 20 proprietério apés 0 pagamento de todas as despesas (..) correspondentes a0 cult, incluindo-se nesta despesas os lcros do capita empregado, caleulados segundo a taxa usual « comum dos lueos do capital agcla no perfodo de tempo considera’ “Portanto, quando a taxa usual e comum dos Iucros do capital agricola e as despesas corespon- dentes 20 cultvo da terra so, em conjunto, iguais 20 valor do produto total, no pode ser registreda ‘qualquer enda.*® ‘As palavras de Malthus ¢ Ricardo podem ser Sead nm equa prio lmao Ym soon Yom Si fen Quando a soma entre paréneses for igual a0 rota toa 2 rend coment, srs nts Obserase,enretant, que, em momento al gum, Ricard se que ¢ agli nfo gerara Tua eds, apenas, que ete ir (ou exces) desinavese aos donos dos meios de producto ¢ no aor dance dea, como pensar os hoes tes, Para Rearo, nse, o qu os dons deter recebiam oes um excedet, mas un resid hia a edad ea da rmua do excede- te = ae, porto, paso cone nteramente Com hc restr sRicedo encontrar o luge bio pels eapalitasagrcls(undamentao ragule precio de qe atx de hur oma a ultra rela aa deur nos demas eos a economia) para conor soa era ait so do produto, Parana esabelece qu aaa de nro na agi- cal € determina en emos materi pla rari ene a quanidade Seto que, no fi {0,0 capitan tem como iro, ea quant ae de igo que, nono do ano ele aan caro capt Coma Ricardo ienteso capital com 8 sans srangados analment, ata de ee fem tems materia) pode ser expres como snd ioe taadetaro =? valroe Dado que o luc € a dierenca entre o produo cbt no fm do ao eo cpl ives nen do ano, a equacio ds taxa de lcro pode se ree como send, roo obit -capatinestio taradeluro = © = C apt investigo Agora, se 0 aumento da populacéo determinase, para fins de subsisténcia, 0 cultvo de teras cada ‘ver menos féteis, o lucro seria tanto menor quanto ‘menor for afetilidade da tera, Sendo assim, unt ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA CLASSICA E POLITICA mesmo montate e capt, investi nama ter ra cutvada (ou terra margina),proporcionaia um cro menor que aquee proporionado pela na tera ctvada anterormente Consderando que a taxa de lero € uma relagéo entre hero e saliios lequacéo (2), € dese supor que luctos diferentes proporcionem taxas de huctos diferentes. Entretano, um dos preceitos béscos de Ricardo diz que, em virtue da concoréncia, a taxa de lucro deve sera mesma para diferentes capitis. Neste sentido, os capitis investdos nas tras mais ‘res (teas inramarginas) devem obter taxas de Ir iuais quel obida peo capital investdo na terra marginal. Mas, como isto € possive, se se sabe ‘que a ferildade a tera ateao cro do capital, e, em conseqincia, a taxa de cro? Aresposta€ que adiferenca entre produto obtido «capital investid, que antes constitu integrlmen- te olucro, passa, devid ao cultio de teras menos fetes, a constr, em part, o lcr, , em parte, uma rend arenda diferencia, que cabe 2 propre: tério das teas intramarginas, apenas por serem mais fries, ‘Ao contrétio do luo ~ que € um excedente- @ renda € uma deducéo; € uma porcéo dos lutas previamente obtidos da terra, Nunca é uma nova ‘iagéo de rendimento, mas sempre uma parte de ‘um rendimento ji criado, Os cro do capital cimi- ‘iyem simplesmente porque néo se pode obter tera igualmenteapta para produsr alimentos e, assim, 0 rau em que éiminuem os ives e aumentam 2s, rendas depende, iteiramente, do aumento nos gastos de producio™® Fortanto, sabendo que a tara de Iucro formada na agriculture depende da ferlidade do solo, e que 0s diferentes graus de feriidade determinam a renda diferencia, resta saber, por que, segundo Ricardo, € a taxa de lucro da agricultura que determina a taxa de lucro do sistema como um tod. A explicacéo encontra-se na forte heranca fisioerdtico-smithiana, segundo a qual, somente a Agricultura dispunha do privilégio de ser uma atvidade origina’, isto 6 de ndo empregar, em seu processo produtivo, produtosvindos de outras atividades. Estas outras atvidades, a0 contro, precisavam do produto da agrcultura como fator inispensdvel& sua produgéo, Assim, o meio neces- sério para 0 desenvolvimento destas consitua seu ‘topo limit, fato que néo ocota com a agricul tur, por s6 depender dela mesma Devido & concoméncia entecapitas, a taxa de lucro deve ser igual em todas as atvidades, send for 2 atvidades menos renves ero seus capitals transerdos para aquelas de maior rentabldade, a6 qu, em virude desta alleagbes, haja uma taxa 4e ico uniforme para todo o sistema. Como a taxa de luero formase na agicultura (pr ser esta uma atividade “origina, € sobre os valores de troca dos produtos manufaturados que deve recsir 0 Impacto da adaptagéo entre a taxa de cro da manufatura aquea formada na agiculura, [En ouraspalawas, se deve exis uma taxa de luero uniforme para todos 0s setores da economia, sho os valores de toca dos produtos manufatu ratos (ou seus pregosrelativamente a0 tig) que precisam ser austados de maneia a alcangar taxa de lucto estabeecida na agrcultura Isto porque, somente na agriculture, mudancas no valor dos produtos (ou no prego relativo deles) mantém Inallerada a taxa de cro, baja vita que a taxa de Iuero€ uma relagéo ente produto e capital, e que, na agrcutur, ambos consisem na mesma merea: ora o trig. Entetanto, a dterminaggo da taxa de Iver por esse camino revlouse problemStica pela propia fraglidade de suas hipoteses cenras: ade que 0 ‘capital consist exchusvamentenosmeios de subs tencia antecipados aos trabalhadoes (seus saliios reals); ea de ques saris so constitudos apenas e cereal (igo). i, pos, para resolver o problema Jevantao por Malthus de que a cesta de consumo os trabalhadores entram outos produto além do trig, que, por isso, uma mudanga na rlagdo de roc ere trgo eum destesproduosalteraia 0s solrios reais, qu Ricardo vai procurar uma medida e valor capaz de homageneizar os diferentes bens e consumo. nos Princpis que Ricardo abandonaahiptese resttva de deteminacéo dos luce em termos ma teri, eadota a quartidede de rabatho incorpra- do como medi de valor das mercadois. Desta forma, a tara de iro definida como a relagdo pro- dato € capital, expressos em quantdades de igo [equacéo 9], cede ugar taxa de hero defnida como a rlagio entre 0 valor do produto (P) ¢ 0 ‘aor do capital necesséio & producdo (N), expres Sos em quantdade de tabalhoincorporao, ou Mess XI 25 ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA CLASSICA E POLITICA o onde r€ taxa de luero em trmos de valor. corre que, quando se vi compelide a medir os ‘componentes da taxa de lucro em termos de valor, Ricardo apenas substiuiu a “medida-tigo" pela ‘medidacrabalho" . Segundo Napoleon, Yembora ‘ela mediagdo da categoria do valor, a taxa de lero vem novamente deteninada em temos materi, ‘com a subsituigéo do tigo pelo trabalho" * ‘Anda assim, a construgso de uma teoria do valor baseada na quantidade de trabalho incorporado, seriu suficientemente a0s_prop6sios de Ricardo, cujo objetivo nunca foo de encontrar as origens do valor, mas sim de explicar as varlagdes nos valores de troce das mercadorias com vistas a valdar sua teria da distibuigso. No curso de sua investiga, entretanto, Ricardo identifica outra causa, além da quantidade de trabalho incorporado, capaz de altear os valores 4e troca (ou precos telatvos) das mercadorias, a saber: 0 “valor do treba". Segundo Ricardo, “mesmo no estigo primitvo ‘a0 qual se refere Adam Smit, algum capital, embora possivelmente fabrcado e acumulado pelo proprio cagador, seria necessério para capacit-o a matar sua pesa. Sem uma arma, nem ocastornem oveado Poderia ser moro. Portanto, 0 valor desses animals devera ser regulado nio apenas pelo tempo pelo trabalho necessérios & sua captura, mas também pelo tempo e pelo trabalho necessios & produgéo do capital do cagador: @arma”™ "(.) Mas, em cada estigio da sociedade, as ferramentas, eifcagées e maquinara empregados em diferentes atvdades podem ter vrios graus de durabitidade e exigit diferentes quantidades de trabalho para sue produyéu. Alem tsso, as propor {Goes entre 0 capital empregado para sustentar 0 trabalho [capital crculante] eo que 6 investdo em. ferramentas, maquiaria e ediicagbes [capital fixo] Podem combinar-se de véras formas. Essa diferenga ro grau de duablidade do capital fix eas variagBes nas proporgdes em que se podem combinar os dois tipos de capital, inwoduzem outra causa, além da ‘aior ou menor quantdade de trabalho necessiia a produczo de mercadorias, responsavel pelas ‘atiagbes no valor relativo das mesmas: esta causa €0 aumento ou a reducéo do valor do trabalho." Camo a proporgéo entre capt e trabalho varia de mereadria para metcadoria, uma moaifcacéo no rendnento de um destes ators, eno Neo do capital ou no salério que cabe ao trabalho, aller, neitavelmente, os valores de toca dessas meteadrias. Caso os saros se madiiquem, e 0s Yaloes das mercadois pemanesam os mesmnos, porque as taxas de co apresentam-e diferentes em cada ramo de produgo Mas como a concar rnc ene capitis unfoniza a axa de iro, ma alterago nos salros seré acompanada, neces. sarfanent, de uma mudanga nos pregs ou valores relatvs das mercadoras, garantindo a todos os amas produtvos uma nova taxa geral de lucro ‘comespondente ao novo slo ‘Uma mudanca nos saliis,acescena Ricardo, altera de diferentes maneias os prego ou valores de treca das mercedaris, conforme o setor (01 Inds) que as produz,utlize mais ou menos capital fxo capital cixblante. Assim, os pregos telatios das mereadoras produzidas com mais capital fxo que trabalho, diminuiréo quando os saléris aumentarem, e aumentardo quando os ‘altos diminuirem. Ao contéro, os pregos das mercadorias produzidas prinipalmente com trabalho e com pouco capital fixo, aumentarao 4quanco os saléros aumentarem, e diminuirao quando os salériosdiminuite. “Iso resultou na cconclsio vtoriosa de que néo somente era falso ‘que un aumento dos salrioselevatia o prego de todas as metcadorias (como Adam Smith e seus seguidotes afirmaram), mas, a0 contrério, que rovogava uma queda no prego de vrias mereado- rias"® em virtude da conseqtente reducio dos lueros Surg aqui um problema adciona:2o estabee- cer que 0 valor de toca das mercadois também estava suelo a futuacbes provocadas por uma Varlagéo nos saltins,e conseqente variagdo nos ucts, Ricardo, “Tonge de limitare efraquecer seu coro antSmith, acaba paradoxalmente por reforgédo™ © ieulovciosovvdo por Sith, pontanto, no esteve menos presente na teora do valor de Read sea taxa de Iuero, como apresenada na equagéo (4), € uma relagioente valores, enti soos valores ‘que deteminam a taxa de ueo. Entetanto, se se considera que os valores so aetados pelos slo, que uma modieagéo nos saris altera os uc, 26 Mesa Xt ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA CLASSICA E POLITICA €.a taxa de lucto que determina os valores. is @ ‘rcularidade presente também na teoria do valor de Ricardo, Ricardo ndo s6 percebe este problema, como tenta escapardhe propondo a determinacéo de uma ‘medida invardvel de valor, representada por uma mereadoria produzida sempre com una propor entre capital e trabalho muito préxima da proporgéo ‘méaia utlizada para produzt as demais mercado- tas Desta forma, ao subirem os saris, algumas ‘mercadoras'teriam seus precos relaivoselevados (precisamente aquelas em cvja produséo fosse uilzado menos capital fxo que a média), enquanto ‘outras (produzidas com uma maior parte de capital fixo) teriam seus pregos relatives reduzidos. Este movimento nos precos relativos de todas as ‘mercadorias faria 0 prego da média do sistema Permanecer inalterado mesmo depois de uma vatlagéo nos saltos. Entretanto, 0 proprio Ricardo alega que é mpossivel encontrar tal mercadoria. Somente mais tarde, no lito Producdo de mercadorias por meio de ‘mercadoras,publicado em 196, Sraffa ver mostrar que uma mercadoria média (ou *mercedoria- Padréo", como denomina), que obedecesse as mesmas caracteristicas da unidade de medida ricardana, néo era impossvel de ser determinada Dependia, apenas, da construcéo de um modelo onde valores taxa de lucrofossem determinados simultaneamente, a fim de escapar do cfrculo vicioso defrontado por Ricardo, segundo 0 qual, os valores determinam a taxa de lucro e ao mesmo tempo dependem dela Ainda que se possaresaltar os avangos da teorla do valor medido pela quantidade de trabalho incorporado frente & teoria smithana do valor- trabalho comandado, € inegavel que Ricardo, tembora tivese suspeitado da lautlogia envolvendo valores taxa de luero quando erticou Smith, néo tenha, ele mesmo, conseguido resolvéa Consideradas as devidas proporgdes, Smith € Ricardo caitam em contradigdo exatamente quando Perceberam que, no processo de troca, néo mais. havia troca de equvalentes. Smith constatou, em sdeterminado momento, que o trabalho incorporado ‘em uma mercadoria era capaz de comandar no s6 ‘a quantidade de trabalho que custouproduaita, mas também uma quantidade adiional,equivalente a0 Iucro e & renda da tera. Com isto registra o fato ‘mas néo consegue explicé-lo. Ricardo, por seu tumo, constatou que a quantidade de mercadorias ‘que 0 trabathadorrecebe sob a forma de salio & inferior aquela que produz e enrega ao capitaista Daf, como Smith, registra o fato mas abandona a discussio, De qualquer forma, ambos hanam reconhecido © problema. Eo problema era explicar a origem do ‘excedente. Para fugirthe, Smith props uma nova e controvertida teoria do valor baseada nos custos de producto. Ricardo, no menos contraditio, perdeu-se a0 tenlar descobrir valor da “mercado. tia™ trabalho: *Como medir o valor do trabalho? ~ pergunta- ram-se 0s ricardianos;e tiveram de se contentar Polo trabalho necessrio que estéincorporado nel. ‘Mas, quanto valor havia no trabalho de um operdtio durante uma hora, um dia ou uma semana? Ora, 0 trabalho de uma hora, um dia ou uma semana. Pls, se 0 trabalho € a medida de todos os valores, néo demas expressar o ‘valor do trabalho’ sendo em trabalho. Mas ~ adverte Engels ~ ‘nada sabemos absolulamente acerca do valor de uma hora de trabalho quando s6 sabemas que 6 igual a uma hora 4e trabalho. Entéo os reardianos recorreram a um expediente: declararam que o valor do trabalho {como o das ouras mercadoras] se mede por seu ‘esto de produgéo."® Como Smith, Ricardo ignora a nitda contadicéo ‘que permeia sua andlise, mantém a expresséo equivocada “valor do trabalho", ainda formula uma teoria sobre 2 determinagéo dos salétios e 0 funcionamento do mercado, toda esquematizada de maneia a valida sua teora acerca da distibuiggo os rendimentos. ‘Arma que “todas as coisas que se compram € vendem, e cuja quantidade pode aumentar ou

Você também pode gostar