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ÁGUA DE TEMPESTADE

Tudo começou com uma intensa ventania


Nesta terra, árida e vazia
O mau tempo e o veneno
Forçavam a rastejar
Pelas sombras escuras do templo

Presa e hipnotizada
Pelo brilho e engano do falso mestre
A serpente que se aproveitava
Enrolava e paralisava
Num vai e vem insano
De paixão e servidão

Enquanto entregue a fascinação,


Cada vez mais e mais
A mente e a alma cegas e arruinadas
Encantando, inebriando e usando
Nem percebeu-se quando aqueles gordos olhos
Cintilavam, se apoderavam e a tudo devoravam

A boca perversa sussurrava promessas incertas


Ela, crédula, amava e acreditava
Devotada, fiel e escrava
Viciada pelo veneno tóxico e alucinógeno
Tinha a consciência totalmente dominada

Até que a serpente se fartou


Digeriu e caprichosa enjoou-se
E, de seu vômito negro,
Restou, apenas, frágeis ossos

O implacável guardião do umbral,


Em um golpe prateado de desilusão fatal
A fez morta, putrificada, maldita e exilada

Mas veio a intervenção


Através de um poderoso e estrondoso Trovão
Para lavar e curar a venenosa sedução
E abrir o olho da percepção
E mostrar quão era tola e falsa
Qualquer esperança de ascensão

O deus Trovão surgiu


Arremessando, com força e honra,
O seu poderoso e sagrado martelo
A chuva e suas águas divinais
Finalmente chegavam
Em pesadas e depressivas nuvens cinzentas
Entre raios dourados e divinos
Libertar e despertar
Esfriar as cinzas do que restou
Da sábia e imortal fênix
Agora, curada e perfeitamente refeita

Uma voz, antes apática e muda


Contida e imersa
Ao completo abandono e silêncio
Ressuscita, sobre a água de tempestade,
Para um novo e desconhecido recomeço

Sobre as bênçãos de um anjo andrógino


De cabelos metade azuis, metade vermelhos
Ela aprende a dividir, equilibradamente
Dois pesos em duas medidas

Exerce a sagrada missão


Da sabedoria alquímica
Do exato manejo das duas mágicas e invisíveis urnas

E, apenas...
O tempo e o vento
O silêncio e a solidão
São necessários para contar com exatidão
As areias do tempo
E não mais
Memórias desbotadas ou histórias envelhecidas

Contar para formar


O conhecimento e o compartilhar
De grandes Obras

Até que vai


Indo com a maré
Mergulhando no azul profundo do mar
Ondulando, inalterada
Avançado no tempo
Sem mais perder
Nenhuma gota sequer
De sangue, suor e lágrimas.

Simoni Dimilatrov
Santos, 27 de janeiro de 2017

(Completa, revisada e publicada).

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