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Quem você salvaria primeiro: policial ou traficante?

A
enquete de Fátima Bernardes
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Sérgio Henrique da Silva Pereira November 22, 2016

Sérgio Henrique da Silva Pereira

Publicado em 11/2016. Elaborado em 11/2016.

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O problema dos direitos humanos no Brasil está nos conservadorismos ("bandido bom é
bandido morto", na ideia de "criminoso nato"...), que nada contribuem para diminuir as
causas reais da criminalidade.

A apresentadora Fátima Bernardes fez enquete [utilitarismo] sobre preferência aos


primeiros socorros: traficante ou policial. A maioria dos convidados escolheu [utilitarismo]
salvar, primeiramente, o traficante.

Contudo, que fique claro, a apresentadora fez a seguinte pergunta:

"Quem você salvaria primeiro, um policial levemente ferido ou um traficante em estado


grave?"

Ou seja, o policial não corre perigo de vida, enquanto o traficante está em perigo devida.

Entre os convidados, a apresentadora pede que o médico Bernardes possa participar. O


médico — honrando o juramento de Hipócrates — asseverou que durante atendimento não
há discriminação, pois todos são seres humanos. Ou seja, não importa a condição
socioeconômica, étnica, religiosa, sexual, se criminoso ou não, se político ou não. Eis o
primado do juramento de Hipócrates: a vida.

REPERCUSSÃO

Jair Bolsonaro se manifestou contra a enquete e a favor dos policiais

"Uma mídia completamente parcial. Haja vista a questão que aconteceu agora, de Fátima
Bernardes, que prefere conduzir o seu programa dando mais atenção a traficante ferido do que
um policial, um herói, a serviço nosso nas ruas"

"Uma política completamente equivocada sobre os Direitos Humanos, onde só a bandidagem


encontra guarita contra esses também marginais defensores dos Direitos Humanos"

"Vamos cada um de nós fazer a nossa parte, combater o politicamente correto. Botar um fim
nos Direitos Humanos, revogar o fim da audiência de custódia, buscar maneira de a mídia
valorizar esses verdadeiros heróis, que arriscam as suas vidas 24 h por dia em defesa da
população de bem. Revogar também o Estatuto do Desarmamento entre outras medidas"

A LIBERDADE DE EXPRESSÃO
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Nenhuma democracia sobrevive sem a liberdade de expressão. A liberdade de expressão,
um desdobramento da liberdade de expressão, permite que os cidadãos possam pensar
por si mesmo. O cerceamento à liberdade de imprensa é típico de Estado Déspota.
Enquetes sempre são necessárias para tirar da zona de conforto os seres humanos, os
quais, por condição natural, sempre procuram um porto seguro. Mudanças causam medos,
pois mudar exige o inquirir pessoal e coragem para mudar. Auscultar os próprios
pensamentos, estes formados pela junção de valores familiares e culturais, é enfrentar
dogmas, tabus, noções de civismo. Ora, no início do século XIX o "bom cidadão" era quem
escravizava, quem batia em mulher em nome da honra — ou a mulher que perseguiam
mulheres que desafiam os "bons costumes"; neste aspecto interessante a teoria do
criminoso nato de Cesare Lombroso sobre "mulher prostituta": a mulher que não obedecia,
cegamente, ao homem, era uma criminosa nata prostituta.

Fátima exerceu o direito de liberdade de expressão. Isso é democracia. Além disso, ela
criou um situação de prioridade no atendimento médico.

OS DIREITOS HUMANOS
Os direitos humanos, em analogia, seguem o pensamento de Hipócrates: todos são iguais
e merecem o mesmo tratamento: quem está uma condição desigual, merece o amparo
necessário para igualar ao igual. Na enquete de Fátima, o traficante, que também é ser
humano, não está com os sinais vitais iguais ao do policial; este se encontra em situação
de menor potencial de perigo de vida.

O problema dos direitos humanos no Brasil está nos conservadorismos "Bandido bom é
bandido morto" e "Criminoso nato". Ora, como já explanei várias vezes, os conservadores
não se perguntam sobre suas posturas de bons cidadãos, como "Costela de Adão"
[homem é sempre superior à mulher], "Patriotismo ou ponta de baioneta" [bom exemplo é
quanto às ações de policiais, no início do século XIX, os quais combatiam os desordeiros
"sambistas" e "capoeiristas"; ou qualquer ação estatal contra movimentos sociais, como os
que ocorreram a partir de 2013]. Desafiei os conservadores — seletividade penal — quanto
ao tipo de criminoso nato. Seriam os ladrões de energia elétrica e água potável, os
cidadãos que sonegam o Imposto de Renda, os condutores que cometem crimes de
trânsito, os indivíduos que cometem violência doméstica, os perseguidores dos LGBTIs, a
prática de corrupção (passiva e ativa) para "abafar" o ato infracional na condução de
automotor, os pais que ensinam a "supremacia branca", os professores que se sentem
"deuses" nas salas de aulas, o cidadão que vende seu voto para candidato em época de
eleição, o cidadão que vende seu voto para conseguir furar fila no SUS, o médico que
vende atestado médico, o engenheiro civil que coloca fiação incompatível com a carga
elétrica, o dono de padaria ou supermercado que vendem alimentos com datas vencidas,
os operadores de Direito que rasgam o Código de Ética?

Eis o problema dos direitos humanos, não somente no Brasil, mas nos países
democráticos. A vitória de Donald Trump foi possível com o aspergir de promessas
conservadoras, e a maioria dos que votaram nele eram conservadores. São os cidadãos
que querem o retorno da "supremacia branca", do antigay, antifeminismo, antiestrangeiro e
tantos outros "anti".

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Quando os direitos humanos começaram a ser aplicados com força total na década de
1990, o Estado do Bem-Estar Social, conservadores foram contrários. Nas redes sociais
não faltaram repúdios aos programas sociais, que começaram pelo ex-presidente
Fernando Henrique Cardoso. Depois vieram Lula e Dilma. Dilma fora atacada também por
ser mulher, como o decalque colado na entrada do tanque de combustível, sendo a
imagem da presidente de pernas abertas — alguém já viu algum decalque de homem
(político) de quatro na entrada da tubulação do tanque de combustível?

De 1891 até 1988, o que realmente se fez para diminuir as desigualdades sociais? A partir
de 1990, avanços, significativos se fizerem, e os relatórios da ONU atestam os avanços
conseguidos nas últimas décadas. No Portal Brasil, notícia de que o “Brasil apresenta
avanços em nutrição durante encontro mundial”. O problema desses avanços aos direitos
humanos está na revolta dos conservadores (utilitaristas) em ter seus parâmetros de vida
modificados. A zona de conforto quando é modificada, bruscamente, como tem sido pelos
direitos humanos — Guerra da Secessão, nos EUA, Revolução Francesa, Revolução
Russa de 1917, Guerra dos Marimbondos (Brasil), Revolta da Chibata (Brasil), Ministério
Público e chute na imagem de Nossa Senhora; os direitos civis nos EUA, na década de
1960; a Revolução pela Paz, de Mahatma Gandhi — criam revoltas nos conservadores, os
quais como náufragos se agarram, desesperadamente, as suas ideologias.

Existem seres humanos, indiferentemente de etnia, religião, sexualidade, morfologia, os


quais querem o caso, pois pelo caos se lucra. Alguns apenas promovem o caos pelo
desejo de se vingar contra tudo e todos, mas a vingança nada mais é do que lança de
projeção dos próprios tormentos internos. Como se pode exigir justiça se há irreal justiça?
Abuso de autoridade, corrupção começando pelos próprios administrados, e se
propagando pela máquina estatal. Se aplicarmos "bandido bom é bandido morto" pelo
ângulo da cidadania (civismo), quantos cidadãos brasileiros estarão fora dos presídios? Os
países Escandinavos têm qualidade de vida, assim como Japão, pois aplicam a
generalidade dos direitos humanos. Países com extremas desigualdades sociais tendem a
ter aumento de presídios, seletividade penal, alto consumo de drogas, lícitas ou ilícitas etc.

O crime de colarinho branco, este protegido pela cleptocracia (oligarquia e aristocracia), já


lesou e matou muito mais do que os crimes cometidos com arma de fogo. Os assaltos nas
vias públicas são visíveis, enquanto os crimes de colarinho e os crimes cometidos dentro
dos lares (cifras criminais) não chegam ao conhecimento da sociedade — apesar de que a
própria sociedade tem conhecimento de tais crimes: misoginia; homofobia; gayfobia;
ateufobia; idosofobia; bullying; e tantas outras neuroses típicas da civilização.

O Brasil foi construído sob pilares discriminatórios, ideologias de "superioridade". O crime


é cultural, como já expus alhures. É um mal, mas este mal é relativizado. A seletividade
penal é condição de se manter arcaicas e perversas ideologias da Arquitetura da
Discriminação.

Para finalizar, faço desafios aos que são contrários aos direitos humanos:

1. Se o estuprador deve ser castrado, quem defende "mulher que anda quase pelada
merece ser estuprada" também deve ser castrado?
2. "Bandido bom é bandido morto", quem será? A começar pelos que furtam energia

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elétrica, principalmente durante o Carnaval? Pelo uso do preço psicológico, por
exemplo, de R$ 1,99 (um real e noventa e nove centavos) para, por saber, o
fornecedor, que moeda de R$ 00,01 (um centavo) está escassa, subtrair o dinheiro
do consumidor e fraudar o Imposto de Renda?
3. O Estado Máximo Penal em punir qualquer cidadão que não aja com civismo
(aplicação das filosofias antes do século XXI) Será punido: os que não batem em
mulher; os que não escravizam; os que não cometem abuso de autoridade; os
professores que não batem em seus alunos os quais não aprendem suas matérias;
as mães que não expulsam de seus lares as filhas que tiveram gravidez antes do
casamento; os pais (homens) que não dão uma surra por dia no filho "efeminado"; o
servidor público que não participar da norma interna "comparecer, mas não
trabalhar".

REFERÊNCIAS:

Noronha, E. Magalhães. Direito penal, volume 1: introdução e parte geral/ E. Magalhães


Noronha. — 38 ed. Rev. E atual., por Adalberto José Q. T. De Camargo Aranha. São
Paulo: Saraiva, 2004.

PENTEADO FILHO, Nestor Sampaio. Manual esquemático de criminologia / Nestor

Sampaio Penteado Filho. – 2ª. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2012.

SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais


na Constituição Federal de 1988. 5. Ed. Rev. E atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
2007.

WILKINSON, Richard; PICKETT, Kate. O Espírito da Igualdade – Por que razão


sociedades mais igualitárias funcionam quase sempre melhor. Coleção: Sociedade Global.
Nº na Coleção: 40. Data 1ª Edição: 20/04/2010. Nº de Edição: 1ª. Editora Presença.

Youtube. Enquete de Fátima Bernardes. Disponível em: https://youtu.be/bo5VkYJHgwo

Youtube. Jair Bolsonaro contra a enquete de Fátima. Disponível


em:https://youtu.be/O6CasLdje0Y

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