Você está na página 1de 43
Jair Ferreira dos Santos _OQUEE POS-MODERNO editora brasiliense Copyright © by Jae Feria dos Santos, 1986 ‘Nenhuna pre dese pba pode ser roads, ‘mesma senesced, repre por mor connor Que om autre pene de aor. ISBN S-ILD1I65-X Primera ego, 1980 18 rempesin. 1998 ‘eve: Reasa N. Mores © Newon T.L. Soe (Capo Cvs Mach astose s ust 18 Ter cept Sto lo“ Fone) 6008 Poel Fac 1)611 519 Ema aster br Yemcomigo que no cain eu expion ~ Do boom ao bit 20 blip — Do sacrossanto no ao zero patafisico |... 32 43 se 71 rho trono 86 = Deménio terminal e anjo anunciador 108 — Indicagoes para leitura ................ 112 Para Erica Villa, ‘no brilho dos sous dez anos e para Marilu Martens, @ Ruy @ Arlene Sampaio Todo livro nasce também da colaboragao volun téria ou involuntiria de amigos. Devo agradecer, portanto, a Carlos Alberto de Mattos, Eduardo Neiva Jr., Elvira Borges, Sénia Khéde, Arthur Omar, Licia Mattos, Camilo Attie, Lina Soares, Carlos Deane, Maria Emilia Bender, Bruno Bonwini, Dréuzio Gonzaga e Antonio Fernando. VEM COMIGO QUE NO CAMINHO EU EXPLICO Cagando o fantasma Ha qualquer coisa no ar, Um fantasma circula entre nés nestes anos 80: 0 pés-modemismo. Uma vontade de participar e uma desconfianga geral Jogging, sex-shops, mas gente dizendo: “Deus esté morto, Marx’ também e eu no estou me sentindo muito bem.” Videogames em casa, auroras de laser na danceteria. Nietzsche e Boy George comandam o desencanto radical sob 0 guarda-chuva nuclear. Nessa geléia total, uns véem um piquenique no jardim das. delicias; outros, 0 Ultimo tango a beira do caos. Pés-modernismo é o nome aplicado as mudancas ocorridas nas ciéncias, nas artes e nas sociedades avangadas desde 1950, quando, por convencao, Jair Ferreira dos Santos se encerra 0 modernismo (1900-1950). Ele nasce com a arquitetura e a computacio nos anos 50. ‘Toma corpo com a arte Pop nos anos 60. Cresce a0 entrar pela filosofia, durante os anos 70, como critica da cultura ocidental. E amadurece hoje, alastrando-se na moda, no cinema, na misica e no cotidiano programado pela tecnociéncia (ciéncia + + tecnologia invadindo 0 cotidiano com desde alimentos processados até microcomputadores), sem que ninguém saiba se 6 decadéncia ou renas- cimento cultural. ‘Mas apertemos 0 cerco ao fantasma. Imaginemos uma fabulazinha onde 0 herdi seja um certo urbandide pés-moderno: vocs. Ao acordé-lo, 0 rédio-relégio digital dispara informagées sobre o tempo ¢ 0 transito. Ligando a FM, ld estd o U-2. © vibromassageador amaciathe a nuca, enquanto (© forno microondas descongela um sanduiche natural. No seu micro Apple 11, sua agenda indica: REUNIAO AGENCIA 10H/ TENIS CLUBE 12H/ ALMOGO/ TROCAR CARTAO MAGNETICO BANCO/ TRABALHAR 15H/ PSICOTERAPIA, 18H/ SHOPPING/ OPGOES: INDIANA JONES- BLADE RUNNER VIDEOCASSETE ROSE, SE LIGAR / SE NAO LIGAR, OPCOES: LER O NOME DA ROSA (ECO) ~ DALLAS NA TV — DORMIR COM SONIFEROS VITAMINADOS/. Seu programa rolou facil. Na rua divertiuse pacas com a manifestacdo feminista pré-aborto que contava com um bloco s6 de freiras e, O que ¢ Pissmodemo metros dali, com a escultura que refazia a Pietd (aquela do Miguel’ngelo) com baconzitos e cartes perfurados. Rose ligou. Vocé embarcou no filme Indiana Jones sentado numa poltrona estilo Men- phis — uma pirdmide laranja em vinil — desfiando piadas sobre a tese dela em filosofia: Em Cena, a Decadéncia, A camera adaptada 20 video filmou voo8s enquanto fazia amor. Seré 0 pornd que animaré a proxima vez | ‘Ao trazé-lo de carro para casa, Rose, que esti- caria até uma festa, veio tipo impacto: maquiagem teatral, brincos enormes e uma gravata prateada sobre 0 camiséo lilés. Na cama, um sentimento de vazio e irrealidade se instala em vocé. Sua vida se fragmenta desordenadamente em imagens, digitos, signos — tudo leve e sem substancia como um fantasma, Nenhuma revolta. Entre a apatia ea satisfagio, voce dorme. ‘A fabulazinha, claro, no tem moral nem per- mite conclusées, mas poe na bandeja os lugares por onde circula o fantasma pos-moderno. 1. Para comegar, ele invadiu 0 cotidiano com 2 tecnologia eletrOnica de massa e individual, visando & sua saturagio com informagées, diversbes @ servigos. Na Era da Informatica, que é 0 trata- mento computadorizado do conhecimento e da informagao, lidamos mais com signos do que com coisas. 0 motor a explosio detonou a revolucdo moderna hé um século; 0 chip, microprocessador Para Erica Villa, ‘no britho dos seus dez anos epara Marilu Mértens, @ Ruy e Arlene Sampaio Todo livro nasce também da colaboragdo volun- téria ou involuntéria de amigos. Devo agradecer, Portanto, a Carlos Alberto de Mattos, Eduardo Neiva Jr., Elvira Borges, Sonia Khéde, Arthur Omar, Licia Mattos, Camilo Attie, Lina Soares, Carlos Deane, Maria Emilia Bender, Bruno Bonwini, Dréuzio Gonzaga e Antonio Fernando. VEM COMIGO QUE NO CAMINHO EU EXPLICO. Cagando o fantasma Ha qualquer coisa no ar. Um fantasma circula entre nés nestes anos 80: 0 pés-modernismo. Uma vontade de participar e uma desconfianca geral. Jogging, sex-shops, mas gente dizendo: “Deus esté morto, Marx também e eu néo estou me sentindo muito bem.” Videogames em casa, auroras de laser na danceteria. Nietzsche e Boy George comandam 0 desencanto radical sob 0 guarde-chuva nuclear. Nessa geléia total, uns véem um piquenique no jardim das delicias; ‘outros, 0 iltimo tango a beira do caos. Pés-‘modernismo é o nome aplicado as mudancas ocorridas nas ciéncias, nas artes e nas sociedades avancadas desde 1950, quando, por convengéo, 10 Jair Ferreira dos Santos com 0 tamanho de um confete, esté causando 0 rebu pés-moderno, com a tecnologia programando cada vez mais 0 dia-a-dia. 2. Na economia, ele passeia pela avida sociedade de consumo, agora na fase do consumo persona: lizado, que tenta a sedugdo do individuo isolado até arrebanhé-lo para sua moral hedonista ~ os valores calcados no prazer de usar bens e servigos. A fabrica, suja, feia, foi 0 templo moderno; o shopping, feérico em'luzes e cores, ¢ 0 altar pés- moderno, 3. Mas foi na arte que o fantasma pés-moderno, ainda nos anos 50, comecou a correr mundo. Da arquitetura ele pulou para a pinturae a tura, dat para o romance e o resto, sempre satiric ppasticheiro e sem esperanca. Os modernistas (vejam Picasso) complicaram a arte por levé-la demasiado a sério. Os pés-modernistas querem rir levianamente de tudo. 4. Enfim, 0 pés-modernismo ameaca encarnar hoje estilos de vida e de filosofia nos quais viceja uma idéia tida como arquisinistra: 0 niilismo, 0 nada, 0 vazio, a ausincia de valores e de sentido para a vida. Mortos Deus e os grandes ideais do assado, 0 homem moderne valorizou @ Arte, a ist6ria, 0 Desenvolvimento, a Consciéncia Social para se salvar. Dando adeus a essas ilusdes, 0 homem pés-modemo ja sabe que néo existe Céu nem sentido para a Historia, e assim se entrega 20 presente a0 prazer, a0 consumo e ao indi O que é Pismodemo dualismo. E aqui voo8 pode escolher entre se aba crianca radiosa — 0 individuo desenvolto, sedutor, hedonista integrado a tecnologia, narci sista com identidade mével, flutuante, liberado sexualmente, conforme 0 incensam Lipovestsky, Fiedler e Toffler, alegres gurus que vamos visitar logo ma b)o andrdide melancélico ~ 0 consumidor progra- mado e sem historia, indiferente, dtomo estatistico ‘na_massa, boneco ‘da tecnociéncia, segundo o abominam Nietzsche e Baudrillard, Lyotard, profetes do apocalipse cujo evangelho também vamos escutar. Assim, tecnociéncia, consumo personalizado, arte e filosofia em torno de um homem emergente ou decadente so 0s campos onde o fantasma p6smoderno pode ser surpreendido. Ele ainda esté bastante nebuloso, mas uma coisa é certa: 0 pés- modernismo € coisa tipica das sociedades pés- ‘industriais baseadas na Informacéo — EUA, Japa0.€ ‘centros europeus. A rigor nada tem a ver com 0 Brasil, embora j& se assista a um trailer desse filme por aqui. Bye, bye, real Tornemos mais concretas as coisas. Vejamos 0 R Jair Ferreira dos Santos que significa 0 ambiente pésmoderno. Saque essa. “Que crianga linda” — disse a amiga & mde da garota. ~ “Isto & porque vocé no viu a foto. grafia dela a cores” — respondeu a mie! Cinica, a Piada_contém a esséncia da posmodernidade: preferimos a imagem ao objeto, a copia ao original, © simulacro (@ reproducdo técnica) a0 real. E por qué? Porque desde a perspectiva renascentista até a televisio, que pega 0 fato 0 vivo, a cultura ‘ocidental foi uma corrida em busca do simulacro perfeito da realidade. Simular por imagens como na TV, que dé 0 mundo acontecendo, significa apager a diferenga entre real e imaginério, ser e aparéncia. Fica apenas o simulacro passando por real. Mas o simulacro, tal qual a fotografia a cores, embeleza, intensifica o real. Ele fabrica um hiper-eel, espetacular, um real mais real e mais interessante que a propria realidad Observe 0 videoclip que abre o programa de TV Fantastico, 0 Show da Vida, que jé no titulo espetaculariza o viver. Uma pirémide e um cone dourados evoluem na tela, fragmentam-se em anéis transformados em plataformas suspensas onde bailarinos em trajes a0 mesmo tempo futuristas antigos dancam uma peca musical executada por orquestra e sintetizador. Para quem ndo sabe, 0 balé foi filmado em palco normal no Maracand- zinho e um computador recortou toda a seqiiéncia para imprimita sobre as plataformas aéreas, cujos, movimentos também foram criados por computa- O que é Pissmoderno Go. O show na verdade ndo ¢ nem a energia misteriosa simbolizada pela pirdmide (passado), nem a ciéncia sugerida pelo cone (futuro), mas a danga livre da matéria no espaco, a levitagdo simu- lada tecnologicamente. Aliada ao computador, a televiséo simulou um espaco hiper-real, espeta- cular, que excita e alegra como um acrobata, E dai? Daf que a levitacdo, em si desejével mas invidvel na gravidade, parece ser possivel na TV. O hiper-real simulado nos fascina porque é o real intensificado na cor, na forma, no tamanho, nas suas propriedades. E um quase sonho. Veja um close do jogurte Danone em revistas ou na TV. Sua superficie ¢ enorme, lustrosa, sedutora, tat = dé agua na boca. O Danone verdadeiro é um alimento mixuruca, mas seu simulacro_hiper- realizado amplifica, satura sua realidade. Com isso, somos levados @ exagerar nossas expectativas e modelamos nossa sensibilidade por imagens sedutoras. (© ambiente pos-moderno significa basicamente isso: entre nés e © mundo estdo os meios tecno- légicos de comunicacdo, ou seja, de simulagdo. Eles no nos informam sobre o mundo; eles 0 refa- zem 8 sua maneira, hiper-realizam 0 mundo, transformando-o num espetéculo. Uma repor- tagem a cores sobre os retirantes do Nordeste deve primeiro nos seduzir e fascinar para depois nos indignar. Caso contrério, mudamos de canal. Nao reagimos fora do espetéculo. 4 Jair Ferreira dos Santos Breve babado teérico Se 0 ambiente pésmoderno ¢ dominado pela tecnociéncia aplicada a informaco e & comuni- cacio, este ¢ 0 caminho para se encurralar 0 fantasma. Seja Reagan ou Brucutu das cavernas, © homem ¢ Linguagem. Palavra, desenho, escrita, pintura, foto, imagem em movimento, s40 lingua gens para a comunicacdo feitas com signos em eddigos que, gerando mensagens (como esta frase em portugues), representam a realidade para o homem, Livro, jornal, cinema, rédio, tv, so ‘meios que vieram ampliar 0 pablico e acelerar a circulagdo das mensagens, Sé recentemente se Teconheceu a importaneia dese Quarto Poder, mas hé tempos existem ciéncias para estudé-lo: uma é a Semiologia (ciéncia dos signos), a outra 62 Teoria da Comunicagao. © esqueminha a seguir ¢ 0 famoso modelo de signo bolado pelos semiblogos ingleses Ogden e Richards e que, tendo muito a ver com a Lin Giiistica, a Cibernética, a Estética e até a Filo- sofia, serve para explicar carradas de coisas na atualidade. Signo ¢ toda palavra, nimero, imagem ou gesto que representa indiretamente um referente (uma cadeira) através de uma referéncia (a idéia da cadeira na nossa cabeca). Desde a Antigdidade, os filésofos olharam, quando olharam, com desconfianca pata a Lingua: gem. Os idealistas explicavam a matéria pelo O que é Pismodemo Espirito lea Sujeito Rotepéncia Signo Reterente Linguagem Objeto Simulacro Realidade Espetdcuio, Matéria espirito, 0s materialistas cafam na explicagio inverse,’ mas quase ninguém foi fundo na questéo dos signos. Ora, descobriu'se ha alguns anos, com a Linguistica, @ Antropologia, a Psicandlise, que, para _o homem, no hé pensamento, nem mundo {nem mesmo homemb},sem linguagem, sem algum tipo de Representacio, Mais: a linguagem dos meios de comunicaggo dé forma tanto a0 nosso mundo (referente, objeto), quanto 20 nosso pensamento (referéncia, sujeito). Para serem alguma coisa, sujeito e objeto passam ambos pelo signo. A pésmodernidade é também uma Semiurgia, um ‘mundo super-recriado pelos signos. ‘Quando nosso urbandide, na fabulazinha, se sente irreal, 0 ego e 0 mundo surgindo-lhe vagos como um fantasma, & porque ele manipula cada vez mais signos em vez de coisas. Sua sensibilidade & frégil, sua identidade, evanescente. Na pés: modernidade, matéria e espirito se esfumam em 16 Jair Ferreira dos Santos O que é Pésmodeno imagens, em digitos num fluxo acelerado. A isso 0s fil6sofos esto chamando desreferencializacso do real e dessubstancializaco do sujeito, ou seja, © referente (a realidade) se degrada em fantas- magoria ¢ 0 sujeito (0 individuo) perde a substén- cia interior, sente-se vazio. Hé exemplos chocantes disso. Quanto ao refe- rente: compra-se um Monza no tanto por suas Qualidades técnicas, mas por seu design, seu nome obre, seus signos na publicidade, que compéem uma imagem de status e bom gosto europeizados. Compra-se um discurso sobre 0 Monza. Quanto a0 sujeito: a falta de substancia esté na extrema diferenciago que as pessoas procuram através da_moda, personalizando-se pela aparéncia e 0 narcisismo levado & extravagincia; ou entéo, imitando modelos exdticos. Para encerrar, uma distinglo importante. Cs signos podem ser digitais ou analégicos. Nameros, letras, Iinguas, so digitais porque s80 desconti ‘nuos @ arbitrérios: 0 ndimero 470 tem os digitos separados e & arbitrério com relacio, por exemplo, 20 Snibus que identifica. Ja 0s analdgicos $80 ontinuos e se assemelham a0 objeto representado: fotos, gréficos se parecem com aquilo que repre- sentam, seja uma crianga, seja a alta dos pregos. digital permite escolher, o analégico, reconhe- cer ou compreender. Com a invaséo da computacéo digital no cotidiano (calculadoras, painéis eletré- niicos), estamos assistindo a digitalizapdo do social. Teclados e videos com letras e niémeros surgem por toda parte, na cozinha como nos bancos, nas Tojas como nos automéveis. E a propria imagem, que & analégica, esté funcionando digitalized nas vitrines, cada liquidificador & um signo anal gico dos modelos & venda, mas acha-se desenhado com tragos que funcionam digitalmente para diferencélos das outras marcas. Assim so. as cores nas embalagens de sabonetes, por exemplo. isto acelera a escolha na base do SIM/NAO, oposi Gio igual a0 O/1 — 0 bit, digito bindrio, O bit 6 a base légica do computador e constitui, atual mente, 0 gargalo bindrio por onde o social esté sendo forcado a passar. Na pés-modernidade, 0 individuo vive banhado num rio de testes perma rente. Digitalizedos, 0s signos pedem escolha, Nao uma decisio profunda, existencial, mas uma resposta répida, impulsiva, boa para 0 consumo, O pds contém um des Sublinhamos até aqui palavras que so verda- deiras senhas para invocar o fantasma pés-moderno: chip, saturagdo, seduce, niilismo, simulacro, hiper-real, digital, desreferencializagio, etc. Difi cilmente elas serviriam para descrever 0 mundo de 30 ou 40 anos atrés, 0 mundo moderno, quando se falava em energia, maquina, producio, prole- 18 Jair Ferreira dos Santos tariado, revolucdo, sentido, autenticidade. Mas se 4 pés-modernidade significa mudangas com relago 8 modernidade, 0 fato ¢ que ndo se pode dispensar © ago, a fabrica, 0 automével, a arquitetura fun ional, a luz elétrica ~ conquistas associadas a0 modernismo. Assim, no fundo, 0 pés-modernismo 6 um fantasma que passeia por castelos modernos, Mas as relacdes entre os dois so ambiguas. Hé mais diferengas que semelhancas, menos prolon gamentos que rupturas. O individualismo atual asceu com 0 modernismo, mas 0 seu exagero narcisista_ ¢ um acréscimo p6s-moderno. Um, filo da civilizago industrial, mobilizava as massas para a uta politica; o outro, florescente na socie- dade p6s-industrial, dedica-se as minorias — sexu raciais, culturais —, atuando na micrologia do Por ora, contentemo-nos com saber que 0 pés contém um des — um principio esvaziador, diluidor. © pés-modemismo desenche, desfaz princ regras, valores, praticas, realidades. A des-referen- po do real e a des-substancializago do sujeito, motivadas pela saturacdo do cotidiano pelos signos, foram os primeiros exemplos, Muitos outros virgo. Entendamos ainda que 0 pésmodernismo 6 um ecletismo, isto é, mistura vérias tendéncias e estilos sob 0 mesmo nome. Ele ndo tem unidade; 6 aberto, plural e muda de aspecto se passamos da tecnociéncia para as artes plésticas, da sociedade Oqueé Pésmodemo para a filosofia, Inacabado, sem definicio precis eis por que as melhores cabegas esto se batenc para saber se a ““condigdo pés-moderna” — mesc de purpurina com circuito integrado — é decadénc fatal ou renascimento hesitante, agonia ou éxtas Ambiente? Estilo? Modismo? Charme? Para d dos coragées dogmiticos, 0 pés:modernismo p enquanto flutua no indecidvel. O que é Pis-modemo DO BOOM AO BIT AO BLIP Apocalipse, Uau! Simbolicamente o pés-modernismo nasceu as Bhoras e 15 minutos do dia 6 de agosto de 1945, quando a bomba atmica fez boooom sobre Hiroxima. Ali a modernidade — equivalente a civilizagZo industrial — encerrou seu capitulo no livro da Histéria, ao superar seu poder criador pela sua forca destruidora. Desde entJo, 0 Apo- calipse ficou mais préximo. Historicamente 0 pésmodernismo foi gerado por volta de 1955, para vir & luz la pelos anos 60. Nesse periodo, realizagies decisivas irromperam na arte, na ciéncia e na sociedade. Perplexos, sociélogos americanos batizaram a época de pésmoderna, usando termo empregado pelo historiador Toynbee em 1947. Em 1955, arquitetos italianos abrem as baterias, contra o internacionalismona arquitetura moderna, propondo uma revalorizagio do pasado e da ‘cor local. O pintor Jaspers Johns, um pioneiro Pop, ironiza @ América com sua bandeira ame ‘cana sobre a tela, E John Barth publica nos EUA um romance amoral e cinico: The Floating Opera (A Opera Flutuante). A critica aplaude seu humor apocaliptico. Um pouco antes, em 1953, a descoberta do DNA, o cédigo da vida, impulsionaria o salto para a biologia molecular, hoje téo cortejada. O desenho do chip, em 1957, permitira a reduco ‘dos computadores-dinossauros aos micros abethas ‘atuais, Nesse mesmo ano, 0 sputinik soviético revoluciona a astrondutica e as telecomunicagées. self-service, acoplado a0 marketing e a publi- cidade em alta rotagdo, consagra 0 consumo massivo. A pflula, 0 rock, © motel, a minissaia — liberadores que emergem nos anos 60 — preparam a paisagem desolada da civilizago industrial para a quermesse eletronica pés-industrial. Adama de ferro Capitalista ou socialista, a sociedade industrial descende da méquina, produtora de artigos em série padronizados. Sua can¢o é uma s6; boom Jair Ferreira dos Santos = explodir, expandir. No século XVIII, essa dame de ferro celebra as nipcias da Ciéncia com a Liberdade individual do burgués capitalista para gerar 0 Progresso, e cria 0 chamado Projeto Hlumi nista da modernidade: o desenvolvimento material e moral do homem pelo Conhecimento. ‘A essa dama pode ser creditado 0 imenso pro: gresso das nacdes capitalistas nos séculos XIX e XX, progresso fundado nas grandes fabricas, ferrovias, navega¢do e, claro, na explorago. Com ram o automével e 0 avido; 0 telégrafo, 0 © rédio, a TV; o petrbleo e a eletricidad © crédito ao consumidor e a publicidade; 0 indi- viduo burgués, sujeito livre, empreendedor, ¢ seu arquiinimigo, ‘0 operério revolucionério;, junto com macroempresas burocratizadas, rotinizando a Vida, ela promoveu 0 Estado nacional, que cuida dos servigos (sade, transporte, ensino} e exerceu, modemamente, 0 controle social e politico (exér: cito, policia). Completando 0 cenério modemo, com a dama de ferro expandiram-se também as metrépoles industriais, as classes médias consumidoras. de moda e lazer; surgiu a familia nuclear (marido- mulher-filhos isolados no ap} e a cultura de massa (revista, filme, romance policial, novela de TV) Dando ‘a vitéria & Razdo técnico-cientifica, inspi Fada no tluminismo, @ méquina fez recuar a tra- diggo, @ religiéo, a moral e ditou novos valores ~ ‘mais ‘livres, urbanos, mas sempre atrelados a0 O que é Pés:modemo pprogresso social. Por fim, ela gerou a massa indus- trial, combative, ¢ 0 individuo mecanizado, soli- tério na multiddo das grandes cidades, desuma- nizado, tema téo explorado pela arte moderna Essa imagem da civilizag3o moderna industrial, assentada na produgio e na méquina, iria se modi- ficar desde 0s anos 50, a0 rumar para 2 sociedade pés.industrial, mobilizada pelo consumo e a informacio. Rede pensante, gandaia global | que hé de comum entre um empréstimo | noturno ao Brasil por um banco de Téquio ¢ o penteado simulado por um computador grafico num cabelereiro em Nova York? Hé o seguinte: 1) séo servigos; 2) sf informacio e comunicacéo, dependendo de tecnologias avangadas como 0 ‘computador, o satélite (hd 1000 deles no cosmos); 3) chegaram com a sociedade pos-industrial ‘2 multinacional; 4) significam a desmaterializacio da economia pela informagéo; 5) constituem 0 réprio cenério pésmoderno. PRNo. ano 2000, diz relatorio da empresa de consultoria Rand Corporation, 2% da forca de trabalho produziro todos os bens necessérios a sociedade americana. O testo estaré manipulando signos nos setores de servigos e técnico-cientfficos. sale Ferreira dos Santos O queé Pissmodemo Isto serd possivel pela automaco quase completa £ 3S, 2.8 alg agile 22848 rr EB ° S35 ge8 be da segunda revolugdo industrial ora em marcha, fig beh2 ,igbeg? capitaneada pela tecnociéncia, em especial B/3s82g3 BEFZE ES informatica. . gl] £3822 FR sh see No esquema proposto pelo sociélogo americano 3 soe8es sages es Daniel Bell, vemos que @ sociedade industrial 5 Geeske ESPE2 SE produz bens materiais, enquanto a pés-industrial z a consome servicos, isto é, mensagens entre pessoas. gs: ¢ oo Comércio, finangas, lazer, ensino, pesquisa cient/- é 6 8 = 3 BE fica nao exigem fabricas com linha de montagem, z zg? # 28 22 mas pedem um aceleradissimo sistema de infor- é 8 8 $ Bs a2 macio. Da balistica dos misseis ao ticket de pe ieeg ceeeeerei cca al metré, tudo 6 signo processado, passado pela & 5 SERoS ae légica 0/1 do computador. Eis por que 0 boom 3 ged S2ERE FE se faz bit, e as grandes fabricas convivem, supe- 2 = se radas em’ nimero, com pequenas empresas de = 8 og = = servigos tendo menos de 300 funciondrios. eae g Codificar © manipular 0 conhecimento e @ alee tae asi é informaggo na légica 0/1 & vital para as sociedades Siaig g8 Ese ge pés-industriais, também chamadas sociedades pro- Blz\2 3: agg 82 ‘gramadas, onde cada servigo — banco, biblioteca, a/d/<, 25 28 33 turismo ~ tem uma tela e um teclado com digitos Hr") gig Bee 38 | para vooé operar. A programacio da producto, do

Você também pode gostar