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EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL DA ____ VARA DA

SEÇÃO JUDICIÁRIA DE FORTALEZA/CE

Ação de Desconstituição de Débito c/c Indenização e Antecipação de


Tutela

João Marcos de Meneses e Silva, brasileiro, casado, médico, oficial do


Exército Brasileiro, RG: 95002333976 e CPF 840.430.913-20, residente e domiciliado
na Rua Pedro Rufino, nº 100, ap 1103 A, Varjota, Município de Fortaleza/CE, através de
seus procuradores “in fine” assinados, mediante instrumento de procuração em anexo,
vem, com o devido respeito e súpero acatamento recíproco perante Vossa Excelência,
com fulcro no que dispõe os artigos 5º, inc. X, da CF/88, assim como no artigo 944 e ss.
do Código Civil Brasileiro e no Código de Defesa do Consumidor, propor a presente
AÇÃO DE DESCONSTITUIÇÃO DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO E
ANTECIPAÇÃO DE TUTELA contra CAIXA ECONÔMICA FEDERAL (CEF),
empresa pública federal, com sede em Brasília – DF e Superintendência na Cidade
de Fortaleza/CE, na Avenida Santos Dumont, nº 2772, 2º andar, CEP: 60.150-121,
com sede nos fundamentos de fato e de direito que adiante passa a expor:
1. DOS FATOS

1.1. Da dinâmica dos fatos

No início de fevereiro de 2010, o requerente abriu uma conta na


agência da Caixa Econômica Federal localizada na avenida Francisco Sá, nº 3832, em
Fortaleza/CE.
O requerente, inicialmente, utilizou a conta como conta-salário,
recebendo proventos de um dos seus empregos (Faculdade Christus).
Posteriormente, foi aberto um financiamento para compra de um
imóvel. O pagamento mensal do financiamento seria descontado da referida conta.
Após, o autor da ação saiu do emprego, deixando de receber sua
remuneração na conta.
Para evitar que o saldo ficasse negativo, o autor, religiosamente,
depositava o valor da parcela, mantendo todos os pagamentos do financiamento
quitados.
Ocorre que, atraído por uma proposta melhor, o requerente transferiu o
financiamento para o Banco do Brasil, deixando de utilizar a conta na Caixa. Entretanto,
antes de qualquer ato, cuidou em deixar o saldo positivo, evitando-se qualquer
incidência de juros ou outras taxas referentes a “cheque especial”.
Acontece que, a partir dos últimos meses de 2015, o autor foi
surpreendido ao receber constantes ligações, cobrando uma dívida contraída com a
Caixa.
Por fim, recebeu um comunicado, informando que sua conta havia
sido encerrada, e que sua dívida seria cobrada.
Sem entender a origem desta dívida, e se ela realmente era real, João
Marcos dirigiu-se até a agência da Caixa, buscando informações a respeito.
Em conversa com o gerente, questionou se seria possível que tal
cobrança se desse apenas pela incidência de taxas na conta. O gerente explicou que,
caso a conta estivesse positiva e passasse seis meses sem movimentação, a conta seria
encerrada, deixando de incidir qualquer taxa.
Entretanto, ao analisar o extrato da conta-corrente, o gerente percebeu
a cobrança mensal de uma parcela (débito em conta), referente a Associação de
subtenentes e sargentos …
Explicou que a sucessão destes descontos, fez com que a conta ficasse
com saldo negativo e incidisse a cobrança de taxas referentes ao cheque especial.
Pela soma de todas estas cobranças, o valor devido pelo requerente
seria este.
Ocorre que o autor jamais autorizou o desconto desta parcela. João
Marcos não tem qualquer vínculo com esta Associação, nem sequer sabia da existência
dela.
Após consulta, foi descoberto que a Associação tem sede no Rio de
Janeiro, e que a solicitação para autorização do débito fora feita numa cidade do interior
do Rio Grande do Sul, local em que o requerente jamais pisou.
Questionado acerca da autorização pelo banco de tal desconto, o
gerente informou que a Caixa não tem como verificar a legitimidade de todos os
pedidos de débito em conta. Apesar disso, diante da flagrante fraude cometida pela
associação, se prontificou em notificá-la, requisitando a documentação que
comprovasse a legitimidade do pedido de débito em conta.
Explicou também que, caso comprovada a fraude, o banco se
responsabilizaria pelo ressarcimento dos valores descontados.
Por fim, solicitou o prazo de uma semana para que colhesse referidas
informações.
Entretanto, após insistentes contatos do autor, durante mais de dois
meses, o banco não apresentou qualquer posição acerca dos fatos, nem sequer informou
sobre a legitimidade do pedido de débito em conta.
Além disso, João Marcos continua a receber ligações exigindo o
pagamento da suposta dívida, comprometendo sua qualidade de vida, perturbando sua
convivência familiar e atrapalhando suas atividades laborais, que por si só, já tem sido
muito estressante, tendo em vista atualmente trabalhar como chefe do serviço de
Neonatologia da Maternidade Escola Assis Chateaubriand, um dos hospitais de
referência no acolhimento de bebês portadores de microcefalia.
Se já não fosse suficiente tamanho dano, o requerente ainda teve
negada a possibilidade de financiamento para execução de projetos pessoais, por parte
do Banco Bradesco, baseando-se em referida “dívida”, conforme documento em anexo,
e, diante desta situação, não havia outro sentimento a não ser espanto e
constrangimento.

2. DO DIREITO

2.1 Dos motivos ensejadores da tutela de urgência para obstar a inscrição do


devedor no cadastro de proteção ao crédito (SERASA)

O artigo 300 do novo Código de Processo Civil Brasileiro (CPC)


enuncia a possibilidade de tutela de urgência em casos específicos e quando satisfeitos
certos requisitos, senão vejamos:

Art. 300. A tutela de urgência será concedida


quando houver elementos que evidenciem a
probabilidade do direito e o perigo de dano ou o
risco ao resultado útil do processo.

Da análise do dispositivo acima transcrito, percebe-se que os


elementos “probabilidade do direito” e “perigo de dano ou o risco ao resultado útil do
processo” são requisitos indispensáveis para a concessão da tutela antecipada. Uma vez
presentes e existindo os requisitos, deve o juiz conceder a tutela pretendida.

No caso em tela, percebe-se que o autor preenche o requisito de


probabilidade do direito, uma vez que arrolou, em sede de exordial, vasta produção
probatória documental apta a justificar a satisfação do requisito “probabilidade do
direito”, inclusive colacionando notificação da empresa que expõe, de maneira
cristalina, a iminente inscrição do nome do Requerente no SERASA, além da
declaração do Bradesco, informando o motivo da negativa de financiamento.

Sobre o tema, esclarece Elpídio Donizete que: “Por prova inequívoca,


entende-se a prova suficiente para levar o juiz a acreditar que a parte é titular do
direito material disputado. Trata-se de um juízo provisório. Basta que, no momento da
análise do pedido de antecipação, todos os elementos convirjam no sentido de
aparentar a probabilidade das alegações” (Curso Didático de Processo Civil, p. 219,
10ª ed., editora Lumen Juris).
No que tange à verossimilhança da alegação, tal requisito é o que mais
está adstrito ao princípio do livre convencimento racional do juiz, uma vez que cabe ao
magistrado, no caso concreto, decidir quando a situação trazida pelo autor é verossímil
ou não. Sobre o assunto, ainda através do escólio de Elpídio Donizete, temos: “Para a
concessão da tutela antecipada, não se exige que da prova surja a certeza das
alegações, contentando-se com a verossimilhança delas, isto é, a aparência de verdade.
A verossimilhança guarda relação com a plausibilidade do direito invocado, com o
fumus boni iuris. Entretanto, na antecipação de tutela, exatamente porque se antecipam
os efeitos da decisão de mérito, exige-se mais do que a fumaça: exige-se a
verossimilhança, a aparência de direito.( Curso Didático de Processo Civil, p. 219, 10ª
ed., editora Lumen Juris).

No caso em análise, facilmente se constata a verossimilhança das


alegações do Requerente, visto que o extrato da conta, bem como o motivo do débito
mostram claramente a fraude aplicada.

Vencidos tais requisitos, cumpre apontar em qual dos dois dispositivos


se encaixa o pleito do Autor, sendo inevitável a conclusão de que o que se pretende
encontra-se previsto no artigo (“perigo de dano”)

De fato, a pretensão da tutela antecipatória pretendida pelo Autor diz


respeito somente à obrigação de fazer, a ser imposta pelo douto Magistrado, no
sentido de determinar que a a empresa reclamada retire o nome do requerente do
banco de dados do Serviço de Proteção ao Crédito – SPC e seus respectivos
congêneres. O que se anseia in limine é a concessão da tutela antecipada para garantir
ao Requerente que a retirada imediata de seu nome nos órgãos de proteção ao crédito
(SPC e SERASA, p. ex.).

Sendo pacífica na doutrina e na jurisprudência a possibilidade de se


conceder tutela antecipada relativa à apenas parte do pedido, e que o pleito não encontra
óbice quanto à reversibilidade do provimento (conforme impõe o art. 300, CPC), vem o
Autor requerer a tutela antecipada no que tange a proibição, destinada à Requerida,
quanto à inscrição nos quadros de defesa do consumidor. Ressalte-se que tal medida em
nada prejudica o Requerido, situação que, portanto, nada impede, mas pelo contrário até
aconselha, tal decisão.

2.3. Da inversão do ônus da prova

A inversão do ônus da prova é técnica processual que busca a


efetivação do princípio da igualdade na relação processual, ou seja, busca efetivar a
chamada “paridade de armas”.

Sobre o assunto, discorre Fredie Didier Jr, Paula Braga e Rafael


Oliveira: “A previsão da inversão dos ônus da prova amolda-se perfeitamente ao
princípio constitucional da isonomia, na medida em que trata desigualmente os
desiguais (consumidor e fornecedor) – desigualdade essa reconhecida pela própria lei.
Assim, a inversão pode dar-se em qualquer ação ajuizada com fundamento no CDC.”
(Curso de Direito Processual Civil, p.81, 3ª edição, editora JusPodivm, 2008).

No caso concreto, a referida técnica processual é essencial para a


facilitação da defesa do Autor, pois este não possui meios de acesso aos dados relativos
à prestação de serviço para melhor embasar sua defesa processual, uma vez que estes
estão na posse exclusiva da Requerida.

Tal pleito possui embasamento legal no art. 6º, inc. VIII do Código de
Defesa do Consumidor (CDC), vejamos:

Art.6º. São direitos básicos do consumidor:


VIII – a facilitação da defesa de seus direitos,
inclusive com a inversão do ônus da prova, a
seu favor, no processo civil, quando, a critério do
juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele
hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de
experiências.

Ora, fácil constatar que diante dos dados técnicos que a Requerida
possui e levando em consideração o conjunto de prova documental integrante desta
inicial, forçoso se concluir pela inversão do ônus da prova em favor do Requerente para
que possa melhor produzir sua defesa em juízo.
Por esta razão, a parte requerente pugna para que V. Exa. conceda a
inversão do ônus da prova em seu favor, ordenando que a parte requerida apresente em
juízo contrato, autorização para o débito em conta, extrato completo da conta,
especiamente no que tange ao começo do débito e à data que, caso não houvesse tal
cobrança, a conta estaria sem movimentação, autorizando seu encerramento sem
qualquer ônus ao requerente.

2.3. Do dano e do dever de indenizar

É incontestável por força de dispositivo legal que: “Aquele que, por


ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar
dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito” (art. 186,
CC/2002, in verbis).

A esse dispositivo some-se o art. 927 caput, in verbis:

“Aquele que, por ato ilícito causar dano a


outrem, fica obrigado a repará-lo.”

Combinando-se os dois dispositivos, percebe-se amparo legal idôneo


para a pretensão do autor no intuito de mover ação de indenização. Para que seja
configurada situação ensejadora do dever de indenizar, via de regra, necessário se faz a
o preenchimento dos requisitos: a) ação ou omissão do agente; b) culpa do agente; c)
relação de causalidade; d) dano experimentado pela vítima.

No caso em tela, a conduta da Requerida se perfaz através da cobrança


de valores que, em verdade, não podem ser imputados ao Requerente, uma vez que não
que ele jamais autorizou tal cobrança. O argumento do gerente de que o banco não deve
ser responsável pela análise da veracidade de todos os documentos que autorizam débito
em conta é irresponsável e temerário. Será que qualquer associação ou empresa pode
simplesmente requerer um desconto em conta e será atendida. Tal situação mostra quão
vulnerável o cliente está.
A instituição “banco” foi criada com intuito de oferecer aos seus
clientes segurança a respeito da conservação do seu dinheiro. A afirmativa do gerente de
que o banco não poderia ser responsável por evitar tais fraudes contraria frontalmente a
missão do banco, rompendo a confiança que o contratante tem ao manter valores lá
depositados.
Some-se a isto, ao desgaste experimentado pelo Requerente para
conseguir efetuar o cancelamento do débito, a tentativa infrutífera de explicar para a
empresa de cobrança que a dívida não lhe pode ser imputada. Afora tudo isso, o
constrangimento, a revolta e os danos gerados pela inscrição de seu nome nos quadros
de proteção ao crédito.

É importante ressaltar também que a atitude da parte Requerida


configura prática abusiva prevista no Código de Defesa do Consumidor (CDC), uma
vez que a fornecedora do serviço exigiu valores indevidos como base em autorização
sem legitimidade, solicitação ou meio algum hábil para tanto, conforme exposto acima.
Mais precisamente, houve a violação do dispositivo constante no inciso III, do art.39, do
CDC, senão vejamos:

Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos e


serviços, dentre outras práticas abusivas:
III – enviar ou entregar ao consumidor, sem
solicitação prévia, qualquer produto ou fornecer
qualquer serviço;

Na doutrina, acerca do assunto, sobressai os ensinamentos do


professor Luiz Antônio Rizzato Nunes, que preleciona:“Acontece que alguns serviços
fornecidos sem solicitação implicam graves violações aos direitos do consumidor,
podendo causar-lhes severos danos. É o caso, infelizmente bastante conhecido, porque
muito praticado, dos cartões de crédito. Sem que o consumidor tenha solicitado (aliás,
ele se surpreende), a administradora do cartão remete-lhe pelo correio o próprio cartão
físico (de plástico), informando que ele já (!) é um novo ‘associado’ da administradora.
Em primeiro lugar, para abrir a conta do consumidor, cadastrá-lo e fornecer o cartão,
a administradora viola sua privacidade, uma vez que manipulou seus dados sem
autorização. Depois, colocou em risco a imagem e o nome do consumidor, pois, ao
enviar o cartão pelo correio, este poderia ter se extraviado ou sido substituído, podendo
gerar problemas para a pessoa do consumidor, que tem seu nome impresso no cartão (e
nem desconfia do que está acontecendo). Lamentavelmente pode ocorrer até de o
consumidor, nesses casos, chegar a ser cobrado por compras que não fez e ser
negativado nos serviços de proteção ao crédito.” (Curso de direito do consumidor. 4 ed.
São Paulo: Saraiva, 2009, p.545).

Quanto ao elemento “culpa do agente”, importante ressaltar que, nos


termos do art. 14, “caput” e §1º, do CDC, in verbis:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde,


independentemente da existência de culpa,
pela reparação dos danos causados aos
consumidores por defeitos relativos à prestação
dos serviços, bem como por informações
insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e
riscos.
§1º. O serviço é defeituoso quando não fornece
a segurança que o consumidor dele pode
esperar, levando-se em consideração as
circunstâncias relevantes, entre as quais:
I – o modo de seu fornecimento;
II – o resultado e os riscos que razoavelmente
dele se esperam;
III – a época em que foi fornecido.
(grifos nossos)

Como se pode ver, a responsabilidade por parte da Requerida é


objetiva por força de dispositivo legal, isto é, independe da existência de culpa.

Nem se venha, futuramente, alegar a parte requerida que desconhecia


o vício ocorrido dentro do seu controle interno, pois tal alegação não impede a
responsabilização pelo ocorrido, como se vê através do art. 23, CDC, abaixo transcrito:

Art. 23. A ignorância do fornecedor sobre os


vícios de qualidade por inadequação dos
produtos e serviços não o exime de
responsabilidade.

Seguindo em atenção aos elementos configuradores do dever de


indenizar, temos que a relação de causalidade está plena e satisfatoriamente descrita na
descrição dos fatos.

Quanto ao dano experimentado pela vítima, segue abaixo a


explanação quanto ao dano moral.
Entretanto, antes, cumpre colacionar os julgados dos Colendos
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e
Criminais do DF, que, em casos semelhantes, decidiram acerca emissão de cartão de
crédito sem solicitação seguida de cobrança indevida e ocorrência de dano, conforme se
vê:

EMENTA: RESPONSABILIDADE CIVIL. REMESSA DE


CARTÃO DE CRÉDITO SEM SOLICITAÇÃO DO CONSUMIDOR.
PRÁTICA ABUSIVA. INDEVIDA COBRANÇA DE FATURAS
MENSAIS. AUSÊNCIA DE PROVA DA ANUÊNCIA E
UTILIZAÇÃO DO CARTÃO PELO CONSUMIDOR. DANO
MORAL CONFIGURADO. NEXO CAUSAL. MONTANTE
INDENIZATÓRIO.
1 - Apresenta-se ilegal o procedimento do banco que envia cartão de
crédito ao consumidor sem a prévia solicitação. Termo de
Compromisso originado no Ministério da Justiça. Prática abusiva -
CDC, art. 39, III. Procedimento que colore a figura do ilícito,
ensejando reparação por danos morais. Nexo causal configurado.
2 - A fixação do montante indenizatório a título de dano moral segue
critérios subjetivos do juiz, e deve ser consentâneo à realidade dos
fatos. Proveram o apelo.
(Apelação Cível Nº 70004903480, Décima Câmara Cível, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Paulo Antônio Kretzmann, Julgado em
02/10/2003)

EMENTA: Indenização por danos morais. Cartão de crédito não


solicitado e não utilizado pelo consumidor. Envio de faturas, por
longo tempo, cobrando anuidades e encargos indevidos. Prática
abusiva. Dano moral configurado. Sentença mantida. (...) (1ª Turma
Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais – DF. Ap. Cível
Juizado Especial 20040110093547. DJ. 1º/07/2005)

No mesmo sentido, abaixo os julgados do Egrégio Superior Tribunal


de Justiça – STJ, a saber:

EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO.


REMESSA A CLIENTE DE CARTÃO DE CRÉDITO NÃO
SOLICITADO. DEVOLUÇÃO. EXTRAVIO. UTILIZAÇÃO POR
TERCEIROS. INSCRIÇÃO RESTRITIVA EM ÓRGÃOS
CADASTRAIS DE CRÉDITO.
DANO MORAL. LEGITIMIDADE PASSIVA E
RESPONSABILIDADE DO BANCO PELO ILÍCITO.
INFRINGÊNCIA AO ART. 39, III, DO CDC. LEGITIMIDADE
PASSIVA CONFIRMADA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA NÃO
CONFIGURADA. JUROS DE MORA.
CONDENAÇÃO EM SENTENÇA. PRECLUSÃO. CPC, ART. 530.
INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO.
I. O banco é parte legitimada passivamente e comete ato ilícito,
previsto no art. 39, inciso III, da Lei n. 8.078/90, quando,
fornecendo ao cliente cartão de crédito por ele não solicitado, dá-
se ulterior extravio e indevida utilização por terceiros, gerando
inadimplência fictícia e inscrição do nome do consumidor em
cadastros restritivos de crédito, causadora de dano moral
indenizável.
II. Dada a multiplicidade de hipóteses em que cabível a indenização
por dano moral, aliada à dificuldade na mensuração do valor do
ressarcimento, tem-se que a postulação contida na exordial se faz em
caráter meramente estimativo, não podendo ser tomada como pedido
certo para efeito de fixação de sucumbência recíproca, na hipótese de
a ação vir a ser julgada procedente em montante inferior ao assinalado
na peça inicial. Precedentes do STJ.
III. Não se configura ofensa ao art. 530 do CPC, se o acórdão dos
embargos infringentes, ao se referir aos juros moratórios, apenas
repetiu a decisão proferida monocraticamente nos aclaratórios, que os
inseriu na condenação, sem oposição do réu, restando preclusa a
matéria.
IV. Recursos especiais não conhecidos.
(REsp 514358/MG, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR,
QUARTA TURMA, julgado em 16/03/2004, DJ 03/05/2004, p. 172)

RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE


INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ENVIO DE CARTÃO DE
CRÉDITO NÃO SOLICITADO E DE FATURAS COBRANDO
ANUIDADE. DANO MORAL CONFIGURADO.
I - Para se presumir o dano moral pela simples comprovação do ato
ilícito, esse ato deve ser objetivamente capaz de acarretar a dor, o
sofrimento, a lesão aos sentimentos íntimos juridicamente protegidos.
II - O envio de cartão de crédito não solicitado, conduta
considerada pelo Código de Defesa do Consumidor como prática
abusiva (art. 39, III), adicionado aos incômodos decorrentes das
providências notoriamente dificultosas para o cancelamento
cartão causam dano moral ao consumidor, mormente em se
tratando de pessoa de idade avançada, próxima dos cem anos de idade
à época dos fatos, circunstância que agrava o sofrimento moral.
Recurso Especial não conhecido.
(REsp 1061500/RS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA
TURMA, julgado em 04/11/2008, DJe 20/11/2008)

Assim é que se conclui pela ilicitude da conduta da parte


requerida, o que gera dever de indenizar. Indenização essa advinda de dano moral.

2.4 Do Dano Moral

No que tange ao dano moral, também este é reconhecido pela


Constituição Federal, assegurando a Carta o direito à indenização em caso de sua
violação, conforme se infere do cristalino comando normativo insculpido no artigo 5°,
inciso X da Constituição Federal, ao dispor que:

“São invioláveis a intimidade, a vida privada, a


honra e a imagem das pessoas, assegurando o
direito à indenização pelo dano material ou
moral decorrente de sua violação”.

Doutrinariamente, o dano moral é objeto de amplos estudos, que


melhor permitem aferir sua natureza e efeitos, sendo de salientar os ensinamentos
trazidos pelos mais renomados doutrinadores, senão vejamos:

AGUIAR DIAS distingue os danos patrimoniais e morais afirmando


que a distinção “ao contrário do que parece, não decorre da natureza do direito, bem ou
interesse lesado, mas do efeito da lesão, do caráter de sua repercussão sobre o
lesado”, anotando ainda, “que a inestimibilidade do bem lesado, se bem que, em regra,
constitua a essência do dano moral, não é critério definitivo para a distinção, convido,
pois, para caracterizá-lo, compreender o dano moral em relação ao seu conteúdo, que
invocando MINOZZI- ‘... não é o dinheiro nem coisa comercialmente reduzida a
dinheiro, mas a dor, o espanto, a emoção, a vergonha, a injúria física ou moral, em
geral uma dolorosa sensação, experimentada pela pessoa, atribuída à palavra dor o
mais longo significado” (Da Responsabilidade Civil Forense, Rio, Vol. II, 8° ed., 1987,
números 226e 227).

RICARDO DE ANGEL YÁGÜEZ, por sua vez, apresentou os


chamados danos morais como aqueles “impostos às crenças, aos sentimentos, à
dignidade, à estima social ou à saúde física ou psíquica, em suma, aos que são
denominados diretos da personalidade ou extrapatrimoniais” (La Responsabilidad
Civil, Universidad de Deusto, Bilbao, 1988, p. 224).

Já SAVATIER entende por dano moral todo sofrimento que não é


causado por uma perda pecuniária. Pode ser sofrimento físico, sendo a indenização aqui
denominada pretium doloris. É, mais freqüentemente, uma dor moral de variegada
origem, assim o agravo à reputação, à autoridade legítima, à sua segurança e sua
tranqüilidade, ao seu amor próprio estético, à integridade de sua inteligência, etc.
(Traité de la Responsabilité Civile. II, 1939, números 525 e 532).

PONTES DE MIRANDA abre o seu estudo sobre a matéria fixando


um conceito básico, in Tratado de Direito Privado, Borsói, T. LIII, §§ 5509 e 5510, T.
XXVI, § 3108, esclarecendo que “nos danos morais a esfera ética da pessoa é que é
ofendida, sendo atingido o ser humano”.

Para o mestre não é só no campo do direito penal que se há de


perquirir quanto ao dano moral, porquanto afirma:

“Se há de reagir contra a ofensa à honra, à


integridade física e moral, à reputação e à
tranqüilidade psíquica”.

E mais:

“A sensibilidade humana, sociopsicológica, não sofre somente o


lucrum cessans e o damnum emergens, em que prepondera o caráter material,
mensurável e o suscetível de avaliação mais ou menos exata. No cômputo das suas
substâncias positivas é dúplice a felicidade humana: bens materiais e bens espirituais
(tranqüilidade, honra, consideração social, renome). Daí o surgir do princípio da
reparabilidade do dano patrimonial”.

Decisão unânime do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, quando do


julgamento da AC 2.059/91 é esclarecedora quanto ao tema ao afirmar que:

“O dano moral como conseqüência da violação de um dos direitos da


personalidade é melhor compreendido quando se percebe completamente a realidade
da natureza humana. Ao estudar os fundamentos da moralidade, na sua monumental
obra sobre os direito natural, JOHANNES MESSNER mostra que o homem é perfeito
da razão e por meio da razão, segundo as exigências da realização plena de sua
natureza (cfr. Ética Social, Política y Economia a la luz del Derecho Natural, trad.
espanhola. Ediciones Rialp, S.A., Madrid, 1.967, p. 34). Isto quer dizer que o ser
humano tem uma esfera de valores próprios que são postos em sua conduta não
apenas em relação ao Estado, mas, também, na convivência com os seus semelhantes.
Respeitam-se, por isso mesmo, não apenas aqueles direitos que repercutem no seu
patrimônio material, de pronto auferível, mas aqueles direitos relativos aos seus
valores pessoais, que repercutem nos seus sentimentos, postos à luz diante dos outros
homens”. Vale lembrar, ainda uma vez, a lição de MESSNER: “La conducta
especificamente humana no está determinada por fuerzas ciegas, que actuán de la
forma ineludibie que es propia dei instinto animal. La conducta dei hombre, tanto si
esta de acuerdo com si contraria lãs exigências de su verdadero ser, depende de la
intervención de su razón, de su autodeterminación. Esta disposición a la
autodeterminación propia de la naturaleza del hombre es el fudamento de la
responsabilidad de la conducta humana y del nascimiento del fenômeno de la
moralidad en el hombre” (loc. cit).””

Com a fixação de indenização a título de dano moral não se pretende


desfazer o desgaste, a chateação, o aborrecimento, ou a eliminação dos prejuízos ou das
conseqüências experimentadas pela parte Requerente, estes dificilmente “calculáveis”.
A “indenização” consiste, isto sim, numa compensação, numa tentativa de substituir o
sofrimento por uma satisfação, além do aspecto retributivo e verdadeiramente punitivo
no tocante à Requerida, legalmente responsável, que ver doer em seu mais sensível
“órgão”, o bolso.

No que toca ao quantum indenizatório, inclinam-se os tribunais pátrios


a agravá-lo, aumentando-lhe o valor proporcionalmente à gravidade da conduta do
agente infrator, dando ao dano moral o “colorido” de punição ao responsável.

Por todas as razões doutrinárias e jurisprudenciais, impõe-se a


condenação da Requerida quanto ao dano moral, única forma de minorar as
consequências da conduta que deu causa ao ilícito.

Entende-se, in casu, mesmo diante da dificuldade de determinar-se o


valor a ser pago a esses títulos, ser razoável a condenação da Requerida em valor não
inferior a R$ 32.700,00 (trinta e dois mil e setecentos reais), tendo em vista a
chateação, a amargura e o temor experimentados pelo Requerente e sua família que,
apesar de todo o cuidado de manter um comportamento exemplar, pois é pai de família,
homem casado e honrado, médico da EBSERH, lotado na Maternidade Escola Assis
Chateaubriand e do HEMOCE, membro e diácono da Igreja Assembleia de Deus, filho
de pastor evangélico teve seu nome maculado pela inscrição nos órgãos de proteção de
crédito e sob a angústia de ter dívida abusiva em seu nome.
Enfatize-se a reincidência da parte ré, que em 2011 foi condenada
a pagar indenização por dano moral por ter incluído o nome do autor no SERASA,
em razão do não pagamento de um débito decorrente de compras efetuadas
através de cartões de crédito (clonados) não solicitados, não recebidos e muito
menos utilizados pelo requerente, nos autos do processo 0511551-05.2011.4.05.8100,
que tramitou perante a 13ª Vara Federal Da Seção Judiciária No Estado Do Ceará.
É importante lembrar que é a jurisprudência é segura em considerar,
ao se determinar o quantum indenizatório, a capacidade econômica do ofensor e do
ofendido, bem como a extensão do dano, sem perder de vista o caráter punitivo,
preventivo, compensatório e pedagógico da sentença.
A requerida é uma das maiores empresas do país. Criada pelo governo
federal para benefício dos cidadãos, demonstrou tremenda insensibilidade ao agir de
forma tão irresponsável. Abusou do seu poderio econômico e de todos os recursos que
possuía, como parte hipersuficiente da relação, para intimidar o autor, tentando de todas
as formas forçá-lo a pagar uma dívida que, sabidamente, não contraiu.
Bastaria uma análise superficial para se perceber a inexistência do
débito, mas a Requerida preferiu ignorar os apelos do seu cliente e aplicar-lhe todas as
penas de um mau pagador.
Diante disso, é imprescindível que a indenização mostre-se suficiente
para prevenir outras situações semelhantes, o que, infelizmente, não aconteceu com a
decisão do processo acima citado.
Infelizmente no Brasil são poucas as pessoas que buscam o amparo do
Poder Judiciário para se socorrer de abusos do Estado e de grandes empresas. Por isso
as relações, que naturalmente já seriam desequilibradas, tornam-se excessivamente
injustas.
É muito mais lucrativo abusar de todos e pagar pequenas indenizações
aos poucos que lutam por seus direitos do que diligenciar em todos os atos e procurar
sempre fazer a coisa correta e justa para evitar futuras compensações.
Diante de casos em que tais, a jurisprudência é uníssona no sentido do
cabimento de danos morais – devendo cumprir sua dupla função, qual seja o
ressarcimento dos danos decorrentes do ilícito, bem como a função punitiva-
pedagógica, a incutir na mente do transgressor a idéia de prevenção, prudência e
responsabilidade, evitando-se novos ilícitos – senão vejamos:
AÇÃO INDENIZATÓRIA – DANOS MORAIS –
DÉBITOS INDEVIDOS NA CONTA POUPANÇA DA
AUTORA – CLONAGEM DO CARTÃO – DANO IN
RE IPSA – DEVER DE INDENIZAR – Efetivamente
constata-se dos autos que a CEF efetuou o
ressarcimento de R$ 4.908,00 à autora. No entanto, tal
quantia diz respeito tão somente à perda patrimonial
sofrida pela demandante, não abrangendo os danos
morais sofridos, os quais entendo presentes no caso em
tela. No que tange à fixação do quantum indenizatório
devem ser observados os princípios da razoabilidade e
proporcionalidade. O valor arbitrado deve guardar
dupla função, a primeira de ressarcir a parte afetada
dos danos sofridos, e uma segunda pedagógica,
dirigida ao agente do ato lesivo, a fim de evitar que
atos semelhantes venham a ocorrer novamente. (...)
(TRF 4ª R. – AC 2004.70.00.038044-8 – 3ª T. – Relª
Juíza Fed. Vânia Hack de Almeida – DJU 04.10.2006 –
p. 785) (grifo nosso).

3. DO REQUERIMENTO

Diante do exposto, o autor vem requerer a V. Exa:

1. Seja o réu citado para responder aos termos desta, sob pena de
revelia;

2. Seja o presente pedido de antecipação de tutela julgado procedente,


ordenando que a parte requerida retire o nome do requerente do banco de dados do
Serviço de Proteção ao Crédito – SPC e seus respectivos congêneres, sob pena de multa
diária a ser arbitrada por este douto juízo, sob pena de aplicação de multa;
3. Que seja enviado ofício ao SERASA e SPC para que enviem a esse
Juízo extrato a fim de se comprovar a quantidade de dias que o nome da Requerente
ficou negativada.

4. Seja concedida a inversão do ônus da prova em benefício do


Requerente;

5. Seja a presente ação julgada procedente em todos os seus termos,


desconstituindo o débito, ressarcindo-se todos os pagamentos feitos à Associação,
encerrando-se a conta-corrente sem qualquer ônus ao requerente e condenando a Ré ao
pagamento de R$ 20.400,00 (vinte mil e quatrocentos reais) a título de danos morais,
tendo em vista o evento ocorrido e sua repercussão para o Requerente;

6. Protesta-se pela produção de prova documental, testemunhal,


pericial, inspeção judicial e de todos os meios probantes em direito admitidos, ainda que
não especificados no CPC, desde que moralmente legítimos (CPC, art. 369), e obtidos
de forma lícita.

Dá a causa o valor de R$ 32.700,00 (trinta e dois mil e setecentos


reais).

Nestes termos em que pede e espera deferimento.

Fortaleza, 30 de março de 2016.

Taianne Nayara Sampaio Batalha


OAB/CE 31299

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