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Matematica Universitaria N° 18, dezembro de 1993, 1-12, Existem fungdes que geram os numeros primos? Paulo Ribenboim* \ Comegamos listando alguns niimeros primos: p; = 2, pr=3, ps=5, pa=7, Ps= 11, ps= 13, pp=17, pg= 19, po=23, pio = 29,.... ‘Todos nds conhecemos a definigiio de um ntimero primo: “Um mimero primo é um nimero natural maior que 1 cujos tinicos divisores so 1 e¢ ele préprio”. O conjunto dos ntimeros primos é portanto um subconjunto do conjunto IN dos niimeros naturais. Nés nos propomos estudar um subconjunto de IN, para cuja definiggo necessitamos apenas da multiplicago enquanto que para o conjunto IN necessitamos da adigdo, da multiplicagdo e de uma relagGo de ordem. i Sempre que desejamos estudar um subconjunto de um conjunto, nos ocorrem. varias quest6es bastante naturais tais como: | 1) Quanto? Isto é quantos néimeros primos existem? | 2) Como geré-los? Existem meios de produzir ntimeros primos? Em outros | termos, é possfvel encontrar formulas que geram os ntimeros primos? 3) Como reconhecer um mimero primo? Dado um nimero natural é possivel dizer se ele é primo ou nfo? Como fazé-lo? Existem outras questées relativas distribuigdo dos nimeros primos: 4) Como so repartidos os ntimeros primos entre os ntimeros naturais? Quantos ntimeros primos existem entre 1 eum milhio? Entre | eum bilhio? Como i se determina os nimeros primos em um intervalo dado, por exemplo, fa, 2a]? Existem aqui dois aspectos a considerar: a primeira questo é um problema global de distribuicdo; a segunda é um problema local. Nao trataremos disto nestas notas. : Retornemos a primeira questo, Observa-se imediatamente que ela nao é : evidente a priori pois 0 subconjunto dos ntimeros primos é dado pela propriedade: | ' * Traduzido do francés pelo Professor AntGnio Paques, a quem os editores consignam aqui seus ' agradecimentos. 2 *n é primo se néio tem divisores exceto 1 ¢ ele proprio”. Inicialmente, recordemos um velho resultado muito bonito, devide 4 EUCLI- DES, que asseguta a existéncia de uma infinidade de mimeros primos. Como mostramos que um conjunto é infinito? Podemos fazé-lo de duas maneiras essencialmente diferentes: a) Podemos compard-lo com um outro conjunto infinito, encontrando uma injegdo tal como: conjunto dos nimeros naturais (infinito) conjunto dos niimeros primos fines f(n) primo Abordaremos este método direto posteriormente. b) E impossivel que 0 conjunto dos ntimeros primos seja finito pois, se este for o caso, é possivel mostrar que existe um outro nimero primo maior que todos os inicialmente considerados. Este método de demonstragiio é indireto, ele é baseado em uma contradigfio. De fato, foi por absurdo que EUCLIDES procedeu. Analisaremos esta demonstragio, de onde poderemos tirar alguns problemas interessantes. Ademonstragiio de EUCLIDES ¢ a seguinte: Suponhamos que q,, 4,,.--.4, sejam todos os ntimeros primos sem excegio. ‘Vamos construir um outro néimero primo diferente de todos esses. Para isso consideremos o numero NeQ Qin Guth ‘Temos entiio duas alternativas: -Né primo e neste caso nada mais resta a verificar pois N é maior que todos ‘os outros e portanto diferente deles. - Nilo é primo. Por definiggo, ele possue um fator primo q necessariamente menor que ele. Nestas condig6es: N=qm=Q-q Qt le q divide N e no pode ser nenhum dos fatores 4,, 4,. ..-»,,.Pois, nesse caso, dividiria 1 queéadiferengaenire g.m © g)- 4g... + gy. Portantogéumntimero primo diferente daqueles considerados inicialmente. Este estudo é bem conhecido. Entretanto, analisemos as alternativas que cocorrem na demonstragao. No primeiro caso, temos um procedimento muito simples de se obter um novo ntimero primo: efetua-se o produto dos ntimeros primos inicialmente dados e adiciona-se 1 ao resultado. Podemos portanto imaginar esse procedimento apli- cado uma infinidade de vezes ¢ obter dessa forma um processo construtivo para produzir uma infinidade de mimeros primos. Isto é muito interessante. No segundo caso, observamos que é possivel obter uma infinidade de ntimeros primos mas © cardter construtivo desaparece, No se conhece o divisor de N. Hi, portanto, neste caso, uma indeterminagio. Esta questio tem despertado interesse de muitos. Denotemos por p* o produto de todos os primos g < p. Questo: Existem uma infinidade de nimeros p tais que p*+ 1 seja primo? Eis, portanto, uma questéio cujo enunciado é clementar e pode ser estudada com 0 auxilio de micro-computadores. E suficiente fazer os cdlculos para ver 0 que se passa experimentalmente. A partir da observag%o experimental pode-se fazer hipéteses e conjecturas ¢ tentar demonstrar estas de maneira rigorosa. Devo confessar-lhes que isto é dificil. © maior mimero prinio conhecido e obtido dessa maneiraé 4787" + 1. Eo maior obtido até o momento e entre os mimeros de mesmo tipo existem somente dez primos inferiores a este, 4787" + 1 € portanto o décimo ptimeiro. Tem-se, portanto, muito pouco. “Ter-se muito pouco” nio quer dizer nada ou, mais exatamente, quer dizer que existe uma densidade fraca, As questdes telativas 4 procura de conjuntos com baixa densidade siio evidentemente muito dificeis. A moral de tudo isto é que nfo é, de forma alguma, facil encontrar processos para gerar miimeros primos e isto nos conduz i nossa segunda grande questo: Como gerd-los? ‘Todos nds jé procuramos, em algum momento, encontraruma formula para descrever os nimeros primos. Nao sei'se vocés sabem 0 que significa: “Encontrar uma férmula.” Vou expor trés significados possiveis. Antes, recordo que existem conjuntos de ntimeros que so gerados mecani- camente por recorréncia. Por exemplo, os mimeros de FIBONACCI. Vocés comegam por u=1 e u,=1 ec aplicama regra: By = Ua # Uy Se vocés conhecem dois, vocés conhecem o seguinte. Trata-se de uma geragdo por recorréncia de segunda ordem. Existe alguma coisa semelhante para os niimeros primos? J4 vimos que para os nimeros primos, seguramente, nfo ha nada assim tao simples, mas existe, talvez, algo ainda que mais complicado? ‘Vou propor-lhes trés questées: Para alguém muito otimista, pode-se propor como problema: a) Encontrar uma fungao f tal que: Van f()=p, ondep, 60 n-ésimo nimero primo: Para alguém um pouco menos exigente: b) Encontrar uma fungao f tal que: Vn f(n) éprimoese n#m entio f(n)#f(m). oO problema b) requer encontrar uma forma de gerar uma infinidade de ntimeros primos enquanto que 0 problema a) requer encontrar todos os mimeros ptimos em uma certa ordem. B, de fato, exigir muito. Fm b) requer-se encontrar uma infinidade de mimeros primos mas nao emuma boa ordem e talvez nem todos. O que seria portanto uma nova demonstragiio da existéncia de uma infinidade de ntimeros primos por um método direto como jé manifestado anteriormente. A terceira maneira de propor o problema provém de uma certa verificacio das duas primeiras. Nés vamos ver que para chegar as duas primeiras hi a necessidade de fungdes muito complicadas. As fungées complicadas n&o sdo desejéveis porque ao procurar descrever os ntimeros primos por meio de coisas que nio se conhece muito bem, muito pouco, ou nada, hé a se ganhar. O que se deseja é estudar coisas que sao dificeis descrevendo-as através de coisas que sfo mais féceis, Se os mimeros sao expressos, por exemplo, em termos de logaritmos ou de outras fungdes mais complexas, as quais nfo se pode nem mesmo calcular ~ 0 que vem a ser o caso - entiio’nada se ganha. Resta, contudo, as fungées mais simples: os polinémios. Seria desejével poder-se descrever os mimeros primos através deles. Dai, portanto, a terceira formulagiio: ¢) Deserever 0 conjunto de ntimeros primos por meio de polinémios. ‘Vocés perceberam que existem diferentes niveis de exigéncia ao se considerar © problema: “Como geré-los?”. Vou apresentar-lhes, a titulo de exemplo, no que conceme & questo a), algumas formulas absolutamente imiteis. Vocés podem se surpteender mas vou mostrar-lhes em que clas sao totalmente inéteis e esta é a inica razo porque lhes observo isto. Para citar a primeira, 6 necessério, inicialmente, recordar um belo teorema. Este teorema é verdadeiro para os mimeros inteiros que sio primos e é falso para todos os outros, o que é, de qualquer forma, muito raro. Trata-se do teorema de ‘WILSON: Consideremos o mimero N=(n-1)!+1 ‘Duas coisas podem ocorter: | i | | | | | * Né divisivel porn. * N nao é divisivel por n. O primeiro caso ocorre se ¢ somente se n primo. Isto é facil de demonstrar. O matemitico inglés WILSON fez essa demonstragiio no século XVIII. Esse teorema nos permite descrever a primeira formula: F()=1 » E@i-1)!+1) ~~) ‘De acordo com o teorema de WILSON temos portanto: F(j= [ex onde [x] denota a parte inteira de x. FO) 1 se j=l ou j é primo { 0 caso contrério - Se desejamos fazer a soma dos F(j) de 1 a 1000, cada vez que obtemos um 1 isto significa que encontrarmos um ntimero primo e que, portanto, devemos contar 1 tantas vezes quantos so os mimeros primos de 1 a 1000. Isto é descrito pela seguinte fSrmula: SF()=1+00m). an AfungSoI 6a famosa fungiio dateoria de mimeros primos que conta os niimeros primos até m. Por exemplo II (29) = 10; ev n’io conhego 11 (100) mas é possivel calcul4-lo. Esta fungio é fundamental no estudo da distribuigdo de nimeros primos. Ainda no que conceme ao problema a), a férmula dada por WILLANS em 1964 é a seguinte: oad [ TSS ] onde [x] 6a parte inteira de x. mt Ela é um pouco miraculosa. Nela ocorrem somas muito complicadas e ela fornece o n-ésimo niimero primo. Ela é indtil mas é bonita! Por exemplo, para n= 10 temos: = a V iene =] Observemos como essa férmula é engracada! Se desejamos saber qual é 0 décimo primo, devemos contar quantos primos existem até 1024(!!). Certamente existem muito mais que até 29(!), Eu acho que existem-pessoas preocupadas pela I6gica para saber como a aritmética é “feita”, Os logicos sentem-se satisfeitos em poder dizer que é possivel obter o n-ésimo ntimero primio efetuando-se as operagGes perfeitamente definidas, ‘Vou exibir-Ihes duas outras f6rmulas utilizando outros tipos de fungdes e que silo, talvez, mais agrad4veis. Foi o matemético indo-americano GANDHI que demonstrou em 1971, a férmula oe=[ tt (3 z > 24) , onde P= py pr--* Prt — é a fungdo de MOBIUS Ix] éa parte inteira de x d\P significad divide P. Existem nessa formula muitos ingredientes: In 60 logaritmo neperiano. p &a fungdio de MOBIUS, que é muito importante na teoria de ntimeros wd)=1 BL} Wd) =(C1)™ quando d possue m fatores 2.4 2 distintos H(d)=0 nos outros casos Porexemplo (15 (20) = Nessa férmula o ntimero P possue muitos divisores e se desejdssemos calcular, por exemplo, pio seria necessdrio conhecer 1 (d) para muitissimos de de novo recairfamos em uma férmula impraticavel. Mas ha talvez alguma coisa escondida nesta f6rmula e, sem diivida, algum dia ela seré melhor compreendida. ‘Vou apresentar-lhes agora uma segunda férmula..., ou melhor, no you fazé-lo! Vou somente dizer-lhes que existem outras formulas e isto é suficiente, Vocés compreenderam que a exigéncia do a) de encontrar on-ésimo niimero primo por meio de uma férmula explicita naio nos conduziu, até agora, e n&o nos conduziré, talvez jamais, a coisas interessantes. A exigéncia do b) nao é to ruim assim. Dado um numero inteiro, digamos 10, vou utilizar uma férmula e © que saird do outro lado é um ntimero primo mas no o décimo. Se é dado o mimero 11, teremos um outro ntimero primo e assim. sucessivamente. Essa férmula permite obter um niimero primo 4 partir de cada ntimero inteito mas ela apresenta de novo um defeito grave. Ela se escreve: 20 fin) -| 32° , onde [x], sempre a parte inteira de x, 20 227" representa ni etapas de expoentes ¢ = 1,92827800 ... . Aexisténcia de @ foi demonstrada e até 0 célculo foi feito, mas com uma certa aproximagio. F este o defeito desta formula, Além disso, decimais de @ so conhecidos e vocés podem calculé-los. Se no o conhecemos muito bem, podem ocorrer erros grossciros que se superpdem e acabamos por obter um ntimero que nao é primo. Esta formula é devida 4 WRIGHT (1954). Ela faz parte de toda uma familia de teoremas do mesmo tipo. WRIGHT é muito conhecido como o co-autor de um excelente livro de teoria de mimeros: “An Introduction to the Theory of Numbers” de HARDY-WRIGHT. Este livro € extraordindrio pois ele parte de quest6es muito simples. HARDY é um dos grandes mateméticos da teoria de ntimeros do século XX. Até © momento nao estamos muito contentes pois, como vimos até agora, para descrever os niimeros primos somos obrigados a recorrer & férmulas muito complicadas. Mas eu jé havia observado: “os polinémios so muito mais agradé- veis”. Podemos perguntar se nao existe um polinémio de grau suficientemente grande, com varias indeterminadas, que possa dar um mimero primo toda vez.que substituirmos as indeterminadas por nuimeros inteiros positivos. Para os polin6- mios de uma varidvel isto ndo acontece devido ao teorema seguinte: “Se f(X) € um polinémio 4 coeficientes inteiros com grau d21 ¢ seu coeficiente dominante é maior ou igual a 1, entao existe uma infinidade de inteiros n, maiores ou iguais a 1, tais que fn) € composto.” ‘Vejamos uma demonstragiio rapida: Seja (X) = dy H+ a X414~4a,, a; inteiros, ay2 1,021. Temos lim f(x) > +02. Desejamos mostrar que existe uma infinidade de ntimeros inteiros n para os, quais f(n) é composto. Primeira alternativa: Wn fin) &composto; nada mais resta a demonstrar! Segunda alternativa: Ano fl%)=p, p primo. Devido ao limite infinito, o valor de f supera, a partir de um certo momento, o valor p. Entio, existe 1, que se pode tomar maior que np, tal que Vn 2m, f(n)> p. Vamos tentar, agora, encontrar valores compostos. Mais preci- samente, tentaremos encontrar grandes valores n para os quais jf) é miltiplo de p. Calculemos: fla + hp) = ao (no + hp) (tot hay tt tae = (a, nf + anf! +~+a,)+miltiplo de p =p-+ miltiplo de p. Se tomamos /1 muito grande, ny + hp vai superar n;. Portanto, n=no+hp > n, € fn) 6 miltiplo de p superior 4 p e, por conseqiiéncia, fn) & composto. Como existe uma infinidade de h que da tais inteiros n, a demonstragao est terminada. Acabamos de mostrar que nao é possivel obter 0 que desej4vamos com os polinémios de uma varidvel A coeficientes inteiros. A ciéncia nos ensina a ser modestos! Nem sempre € possivel obter-se muitos nimeros primos? O que significa a palavra “muito”? Vejamos! Sobre a questo de gerar primos por meio de polinémios conhece-se coisas muito interessantes, gragas 4 EULER que muito contribuiu para a teoria de niimeros. Ele sabia calcular e fez intimeras observagGes, que ele nao explicou. Mas estas observacGes despertaram a curiosidade dos matematicos ¢ 0 que ele ndo podia explicar na época sabe-se fazé-lo atualmente e com métodos muito pode- rosos da teoria de mimeros. Comegamos pelo mais famoso polinémio de EULER: SX) =X? 4X44, Este polinémio é tal que para n = 0,1,2,3. £(40) =40(40+ 1)+41=41-41. Euler encontrou outros polinémios desse tipo, que produziam ntimeros primos dando-se & varidvel valores inteiros sucessivos & partir do zero. O polind- mio acima citado é 0 “maior”, aquele que forneceu o maior mimero de primos que EULER tenha encontrado. Isto nos leva ao problema seguinte: Para q primo, encontrar os polinémios (X) =X?+X+q_ tais quef{n) soja primo, para n=0,1,..., = 2. ‘Uma resposta positiva a este problema seria muito bem vinda pois permitiria obter muitos ntimeros primos, no somente com um 36 polinémio, como jé vimos que ndio é possivel, mas com a colegio dos polinémios X?+X+q. Apés EULER a questo se toma: “Existem ntimeros primos q > 41 verifi- cando 0 problema?” EULER nao os encontrou, mas procurar e nao encontrar nao 6 prova de nao existéncia, Todos os nimeros que se pode examinar, por tentativa empirica, sto sempre, em um certo sentido, “pequenos”, pois apés ha tantos outros!! Toma-se necessério, portanto, encontrar uma demonstragiio. Isto se faz ..39f{n) 6 primo, mas para n = 40 | telacionando-se esta questo & outras questdes, em um contexto sobre © qual eu vou dizer duas palavras. Existe uma relacdo muito direta com a teoria de classificagaio das formas bindrias - portanto com o estudo dos corpos imaginérios - e a determinagiio dos corpos que tém um mimero de classe igual a 1. S40 conhecidos alguns exemplos de tais corpos, dos quais 0 “maior” correspondendo & X?+X +41 € g(V—163). Foi necessario aguardar HEEGNER em1952, completado por BAKER em 1966 ¢ STARK em 1971, os quais utilizaram métodos muito sofisticados da teoria de formas modulares elipticas, para estabelecer que @(V-163) de fato o “maior”. Este € portanto um problema resolvido. Este problema, que acabo de fazer surgir de meu chapéu tal como um migico, ndo aparece por “acaso”. Para que um problema seja interessante é necessério colocd-lo em um contexto e observar que ele é apenas um dos problemas posstveis em meio a questées miltiplas. Trabalhamos até agora com polinémios de grau 2 particulares. Poderfamos, 6 claro, procurar outros tipos de polinémios de grau 2, com coeficientes mais complicados - fazendo, por exemplo, mudangas de varidveis - mas pode-se mostrar que o problema se reduz cssencialmente ao estudo dos polindmios H+X+q. Mas porque nfo se interessar por polinémios de grau 1 e apés, talvez, passar aos polinémios ctibicos? Eu retorno sempre a esta questiio! ‘Vejamos 0 caso dos polinémios de grau 1 da forma f (X) = aX + b, Natural- mente, f(0) deve ser primo e portanto nos interessam os polinémios da forma F(X) = aX +q, onde g € um primo dado, Queremos saber se este polinémio tera valores primos para X = 1,2,... Observemos ainda que jg) nao é primo e que na melhor situagao possivel teremos f(0), f(1)..... lq-1) primos, Existem tais poliné- mios? Isto reduz-se finalmente a procurar um inteito a tal que gq +4, q+ 20... @+(q- La sejam primos, Em outros termos: Existe uma progressio artimética comegando porg tendo gtermos,cadaum primo? Este € 0 mesmo problema que tinhamos com X?+X +41. Progressées aritméticas, niimeros primos; isto lembra-nos alguma coisa: um teorema muito importante que relaciona progressao aritmética e ntimeros primos. Este teorema € devido A DIRICHLET e diz que dado uma ptogressao aritmética que comega por q e de razo a tal que mdc(q,a) = 1, é possivel encontrar na progressdo %4+4, q+ 2a,... uma infinidade de ntimeros primos. Mas nao é sabido onde eles se encontram. Por exemplo, para g = /, a = J obtém-se a seqliéncia dos ntémeros naturais que contém uma infinidade de mimeros primos! O que desejamos agora é muito mais exigente. Desejamos somente um mimero finito de primos e desejamos obté-los rapidamente. Se fosse sabido que as progresses aritméticas fornecem primos rapidamente, poder-se-ia resolver 0 primeiro caso do problema de FERMAT. ‘Vamos, de qualquer forma, comegar a resolver nosso problema. Para q =3, é necessario encontrar trés mimeros primos. Tentemos a=2: 3,5,7. Conseguimos! Para q = 5, procuremos cinco mimeros primos. ‘Tentemos a=2; 5,7,9; niio é bom! Tentemos a=4: 5,9; tampouco é bom! Vocés véem a que somos levados? A tentar! Existe um teorema que diz que nao é necess4rio tentar niimeros muito pequenos, Vejamoso6: 5, 11, 17, 23, 29; este funciona! Continuemos. Para g =7, devemos encontrar sete ntimeros primos. O teorema ao qual me referi acima - trata-se de um teorema de LAGRANGE, muito elementar - nos diz que é necessério tentar uma razio a pelo menos igual ao produto dos primos que precedem 7 isto é, pelo menos igual a2 3-5 =30. ‘Tentemos 30: 7, 37, 67, 97, 127, 157, 187 = 11.7. Que azar! Tentemos um niimero maior que 30. O primeiro que se encontra é 150, Este nos dé: 7,157,307, 457,607, 757, 907, sete ntimeros primos. Este funciona, mas isto comega a ficar ruim porque, de imediato, j4 é necessdrio tentar uma razio muito grande. Eu procurei para g = 11 mas nao pude encontrar uma razio a que fosse conveniente, Contudo, conhego um calculador muito bom na Alemanha. Ele encontrou o resultado seguinte: a=2-3-5-7-7315048 = 1536160080 . Para 11 a razio @ € grande demais! Para q = 13, araziio @ émaior ainda! a= 9918821194590 Que ligo tiramos de tudo isto? Oassunto é extremamente dificil. O problema é saber se é possivel encontrar uum mimero, téo grande quanto se deseje, de primos em progressio aritmética, Se vocés me perguntam se é possivel encontrar treze primos sucessivos em progres- sio aritmética, eu respondo que sim. E sabido fazé-lo até mesmo para 19. Mas isto conduz a calculos astronémicos ¢ nfo se sabe demonstrar que para todo g, existem q primos em progressio aritmética. Isto tudo nos leva a uma questiio bem mais modesta: aquela dos polinémios tendo ao menos um valor primo, que pode ser enunciada assim: E verdade que para todo polinémio X), tendo seus coeficientes inteiros com mde igual a 1, de grau maior ou igual a 1, existe um ntimero natural » tal que f(a) seja primo? Esta éaconjectura de SCHINZEL e SIERPINSKI. Ninguém sabe demonstra- Ja, Uma conjectura é uma coisa que néio se conseguiu demonstrar mas deseja-se aol que seja verdade. Entiio assume-se que ela seja verdade ¢ tira-se conseqiiéncias. As conseqtiéncias sio deduzidas rigorosamente desta hipétese ¢ quando se recai em uma conseqiiéncia evidentemente falsa entZo rejeita-se a hipétese. Mas quando se recai em conseqiiéncias que no se sabe se sio falsas ou verdadeiras costuma-se dizer: “Bis 0 que se poderia demonstrar se nossa primeira hipétese fosse verdade”, Estas so as matemiticas conjecturais ¢ se faz, muito disso na pesquisa! No que conceme a conjectura de SIERPINSKI existem indicios que mostram que a questio é dificil - muito dificil. De fato, se temos um polinémio, nés podemos talvez, fazendo muitos cdlculos, chegar a encontrar um valor que seja primo. E se tomamos um outro polinémio nés podemos, pelo mesmo tipo de edilculo, encontrar ainda um valor primo, mas isto é bem menos provavel. Em todo caso, é praticamente impossivel encontrar um método de eélculo uniforme que permita encontrar os valores primos para todos os polindmios. De qualquer modo, quando fazemos calculos, de maneira empirica, com um polinémio e depois com um outro, s6 podemos realizar esses célculos para um ntimero finito de polindmios €, portanto, nfo teremos uma demonstragiio para todos os polinémios. Esses célculos sie dificeis porque mesmo com um polinémio “pequeno” pode ocorrer que este produza valores primos muito lentamente. Vejamos um exemplo devido 4 SHENG JINGRUN: fX) = X6+ 1061 ix) é composto para todo mimero natural inferior 4 3906 e f(3906) é primo! De fato, estuda-se muito esse género de polinémios que fornecem poucos mimeros ptimos, 0 que mostra que a conjectura de SIERPINSKI é dificil. Pode-se igualmente prever a dificuldade pelas conseqtiéncias que esta con- Jjectura implica. Vou dar-Ihes duas: A primeira é que existe uma infinidade de niimeros primos gémeos tais como 3€5,5e7, 17e 19, etc, Até o momento nao existe demonstragio deste fato. A segunda é que o polinémio X?+1 assume uma infinidade de valores primos (como por exemplo 4? + 1 = 17 ) ¢ isto nao se sabe demonstrar. Vemos portanto que toda uma série de resultados sobre os mimeros primos decorre desta conjectura e é por isto que ela é muito estudada atualmente. Antes de concluir, retornemos a exigéncia c) referente a geraciio de mimeros primos. Hé um resultado extremamente surpreendente que diz a coisa seguinte: existe um polinémio (que pode ser escrito explicitamente) de grau 25 4 26 varidveis tal que, quando se substitui as varidveis por inteiros positives, obtém-se inteiros que quando sao positivos sto também primos e obtém-se assim todos os niimeros primos. Dito de outra forma: conjunto dos ntimeros primos é © conjunto dos valores positives de um 12 polindmio de grau 25 ¢ de 26 varidveis. Este resultado surpreendente é devido a MATUASEVIC que resolveu assim, pela negativa, o décimo problema de HILBERT. Este décimo problema € 0 seguinte: fabriquemos uma maquina - uma mAquina teérica - tal que colocando-se nessa mAquina uma equacio dita diofantina ¢ fazendo-a funcionar, cla indique se a equag&o possue ou ndio soluges inteiras. Era um sonho de HILBERT encontrar uma tal méquina capaz de dizer se uma equagdio diofantina possue ou nfio solugSes. Pois bem, em 1970 MATIJASEVIC mostrou que uma tal maquina nio pode existir ou, dito de outra forma, que qualquer que seja 0 algoritmo inventado para mostrar aexisténcia de solugdes para equagdes diofantinas, existe sempre pelo menos uma equaciio que lhe “escapa”. E um resultado negativo, mas podemos vé-lo sob um aspecto positivo: para nés, ele mostra que sempre existird problemas A resolver dentro da teoria de mimeros. Segue abaixo uma mini-bibliografia para os curiosos que quizerem ir um pouco mais além. Ribenboim P., The book of Prime Numbers Records, Springer Verlag, New York,1988. Ribenboim P., Algebraic Numbers, Willey - Interscience, New York, 1972. Borevich Z, 1, Chafarevitch E. R., Théorie de Nombres, Gauthier- Villars, Paris, 1966. Ellison W. J., (en collaboration avec Mendes-France M.) Les nombres premiers, Hermann, Paris, 1975. Department of Mathematics Queen’s University Kingston, Ontario K7L 3N6, Canada

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