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Cadernos Espinosanos 15
Cadernos Espinosanos 15
XV
São Paulo – 2006
ISSN 1413-6651
Departamento de Filosofia
Chefe: Moacyr Novaes
Vice-Chefe: Caetano Ernesto Plastino
Coordenador do Programa de Pós-Graduação: Marco Antônio de
Ávila Zingano
7. NOTÍCIAS 153
8. CONTENTS 157
Résumé:
La question de la nature et du sens d’un “idéalisme leibnizien”
se trouve, depuis plus d’une vingtaine d’années, au centre d’un grand
débat dans les études leibniziennes, principalement anglo-saxonnes.
La conception la plus conséquente et la plus radicale d’un tel idéalisme
a été exposée par Robert Merrihew Adams (Leibniz, Determinist,
Theist, Idealist, 1994): “Le principe le plus fondamental de la
métaphysique de Leibniz est que ‘il n’y a rien d’autre dans les choses
que les substances simples et, en elles, les perceptions et les appétitions’.
Cela signifie que les corps, qui ne sont pas des substances simples,
peuvent seulement être construits à partir des substances simples et
de leurs propriétés de perception et d’appétition” (p. 217).
Ce débat en rencontre un autre, qui porte sur la reconnaissance
de périodes dans la formation de la métaphysique leibnizienne et sur le
point de vue qui permet d’en rendre compte de la façon la plus adéquate:
expression constante d’un « Système de Leibniz » invariant dans ses
thèses et sa structure, ou plutôt recherche ouverte où l’invention
conceptuelle ne se referme jamais sur une formule systématique unique?
En effet, ceux-là même qui ont voulu reconnaître une période des
“années moyennes” (Daniel Garber), où Leibniz n’aurait pas adhéré à
l’idéalisme, ont généralement concédé que la dernière métaphysique,
celle qui se déploie proprement selon la thèse monadologique, est
bien caractérisée finalement par cette adhésion.
*
Versão de uma conferência proferida na Universidade de São Paulo, em 16 de
outubro de 2006. Agradeço imensamente Tessa Lacerda por sua tradução para o
português.
**
Professor da Sorbonne (Paris 4).
Resumo:
A questão da natureza e do sentido de um “idealismo
leibniziano” encontra-se, já há vinte anos, no centro de um grande
debate nos estudos leibnizianos, principalmente anglo-saxões. A
concepção mais conseqüente e mais radical desse idealismo foi exposta
por Robert Merrihew Adams (Leibniz, Determinist, Theist, Idealist,
1994): “o princípio mais fundamental da metafísica de Leibniz é que
não há nada mais nas coisas que substâncias simples e, nelas, as
percepções e as apetições” (p. 217).
Esse debate encontra um outro sobre o reconhecimento de
períodos na formação da metafísica leibniziana e sobre o ponto de
vista que permite dar conta desses períodos da maneira mais adequada:
expressão constante de um “Sistema de Leibniz” invariável em suas
teses e sua estrutura, ou, antes, pesquisa aberta na qual a invenção
conceitual não se fecha nunca em uma fórmula sistemática única? Com
efeito, mesmo aqueles que quiseram reconhecer um período de “anos
intermediários” (Daniel Garber), durante o qual Leibniz não teria
aderido ao idealismo, geralmente concederam que a última metafísica,
aquela que se desenvolve propriamente segundo a tese monadológica,
está, finalmente, bem caracterizada por essa adesão.
Proponho-me desenvolver os seguintes argumentos:
1. Do ponto de vista genético, a tese monadológica responde
originariamente à exigência de um fundamento da realidade dos corpos.
2. Os desenvolvimentos da metafísica leibniziana do último
período (depois de 1700) não dispensam a caracterização de uma
verdadeira “substância corporal”.
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fragmentos que não são mais para nós algo artificial e não
têm mais nada que identifique a Máquina para o uso da
qual está destinada a roda. Mas as Máquinas da Natureza,
isto é, os corpos vivos, são Máquinas inclusive em suas
menores partes até o infinito.
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os corpos que são ditos assim, uma vez que Leibniz, precisamente,
jamais reduziu a realidade dos corpos ao movimento e à matéria. Em
uma carta de 1699 a Thomas Burnett, na qual é exposta uma
aproximação muito precisa da realidade da substância corporal segundo
sua fundação monadológica, Leibniz opera rigorosamente a distinção,
nos corpos, “entre a substância corporal e a matéria”, e “distingue a
matéria primeira da segunda”. Com essa distinção é introduzida uma
noção tradicional cuja significação dada por Leibniz precisa ser
analisada: o que é a “matéria segunda”?
A matéria segunda é um agregado ou composto
de várias substâncias corporais, como um rebanho é
composto de vários animais. Mas cada animal e cada planta
também é uma substância corporal, tendo em si o princípio
de unidade, que faz com que seja uma verdadeira
substância e não um agregado. E esse princípio de unidade
é o que se chama Alma ou então alguma coisa que tem
analogia com a alma. Mas além do princípio de unidade, a
substância corporal tem sua massa ou matéria segunda,
que é ainda um agregado de outras substâncias corporais
menores, e isso vai ao infinito (GP III, 260).
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Notas
1
“Qui me non nisi editis novit, non novit”, carta a Placcius, 1696, in
Leibnitii Opera omnia, ed. Dutens (1769), VI, 1, p. 65. E também:
“Scripsi innumera et de innumeris ; sed edidi pauca et de paucis”,
carta a Jacob Bernoullli, 1695, in Mathematische Schriften, ed.
Gerhardt, III, p. 61.
2
Cf. a “Probevorlesung” (1881) de Paul Natorp, “Leibniz und der
Materialismus”, publicado por H. Holzhey, Studia Leibnitiana, XVII
(1985).
3
Opuscules et fragments inédits de Leibniz, Extraits des manuscrits
de la Bibliothèque royale de Hanovre, publicado por Louis Couturat,
Paris, 1903.
4
Uma Série V está prevista para reunir as obras históricas de Leibniz,
mas ela ainda não é objeto de nenhum trabalho preparatório.
5
Esse volume é de livre acesso em: http://www.uni-muenster.de/
Leibniz/downloadbereich.html. As informações completas sobre o
estado da edição em seu conjunto se encontram no site http://
www.leibniz-edition.de.
6
Leibniz, Sämtliche Schriften und Briefe - VI. Reihe Herausgegeben
von der Berlin-Brandenburgischen Akademie der Wissenschaften und
der Akademie der Wissenschaften in Göttingen - Philosophische
Schriften - Band 4: 1677–Juni 1690. Bearbeitet von Heinrich Schepers,
Martin Schneider, Gerhard Biller, Ursula Franke und Herma Kliege-
Biller, Akademie Verlag, Berlin, 1999. O conteúdo integral está
acessível na internet no mesmo endereço.
7
A versão francesa foi publicada na obra póstuma Etudes d’Histoire
des sciences et d’Histoire de la philosophie, vol. 2, Paris, 1908.
36
8
Originalmente publicados por Couturat, Opuscules et fragments
inédits, op. cit., p. 356-399. Excelente edição com tradução alemã e
comentários por Franz Schupp, Allgemeine Untersuchungen über die
Analyse der Begriffe und Wahrheiten, Felix Meiner Verlag, Hamburg,
1982.
9
Para mais detalhes, cf. meu ensaio “L’invention métaphysique”, in
Introduction à Leibniz. Discours de métaphysique suivi de
Monadologie, et autres textes. Edição estabelecida, apresentada e
anotada por Michel Fichant, Gallimard, Paris, 2004.
10
Cf. respectivamente, Princípios da natureza e da graça, art. 1, “É
preciso que em toda parte haja substâncias simples porque sem as
simples não haveria compostos”, e “não há multiplicidades sem
verdadeiras Unidades”, carta à Princesa Sophie, 31 de octobre de 1705,
in Die philosophischen Schriften, ed. Gerhardt (citado doravante GP),
VII, p. 558, fórmula já literalmente presente na carta a Arnauld de 30
de abril de 1687, GP, II, p. 97.
11
O artigo de referência aqui é o de Daniel Garber : “Leibniz and the
Foundations of Physics : The Middle Years”, em The Natural
Philosophy of Leibniz, ed. by K. Okruhlik and J.R. Brown, Reidel,
Dordrecht, 1985.
12
Esse capítulo retoma e estende consideravelmente o artigo mais
antigo do mesmo autor “Phenomenalism and Corporeal Substance in
Leibniz”, Midwest Studies in Philosophy, 8 (1983),
13
GP, II, p. 270.
14
Essa interpretação foi exposta por Donald Rutherford em uma série
de artigos: “Phenomenalism and the Reality of Body in Leibniz’s Later
Philosophy”, Studia Leibnitiana, 22 (1990); “Leibniz Analysis of
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22
Sistema novo da natureza e da comunicação das substâncias, GP
IV, p. 482.
23
“Multum enim interest inter animal et gregem”, em um opúsculo de
1702, GP IV, p. 395.
24
Ibid., p. 395-396.
25
“Assim, não digo na verdade que um pedaço de pedra seja em si
mesmo uma substância corporal animada ou dotada de um princípio
de unidade e de vida; mas antes que há em toda parte tais substâncias
e que não há nenhum pedaço da matéria no qual não haja ou animal ou
planta, ou qualquer outro corpo orgânico vivo, embora só conheçamos
plantas e animais. De sorte que uma massa de matéria não é
propriamente o que chamo de uma substância corporal, mas um
amontoado ou um resultado (aggregatum) de uma infinidade dessas
substâncias, como um rebanho de carneiros ou um monte de larvas”,
Eclaircissement sur les Natures Plastiques et les Principes de Vie et
de Mouvement (GP VI, 550).
26
“Accurate autem loquendo materia non componitur ex unitatibus
constitutivis, sed ex iis resultat”, carta a De Volder de 30 de junho de
1704 (GP II, p. 268).
27
A vida consiste para Leibniz em “percepção e apetite”,
Animadversiones circa assertiones aliquas Theoriae medicae verae
Clar. Stahlii, § VIII (Dutens II-2, p. 137).
28
“Os corpos orgânicos não estão nunca sem almas, e […] as almas
não estão nunca separadas de qualquer corpo orgânico […] Não
admito, portanto, que haja almas inteiramente separadas, nem que
haja Espíritos criados inteiramente destacados de algum corpo […] as
criaturas que ultrapassassem ou estivessem livres da matéria estariam
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Professor titular do Departamento de Filosofia da FFLCH-USP.
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Notas
1
Leibniz, G., Mathesis Universalis, in Gerhardt, Matematische
Schriften, VII, p.53, apud Cardoso, A., Leibniz Segundo a
expressão, Lisboa: Colibri, 1992, p.32.
2
Leibniz, G., Verdades necessárias y contingentes, in Escritos
Filosóficos, org. Ezequiel de Olaso, Buenos Aires: Charcas, 1982,
p.338ss (o título foi dado pelo organizador do volume).
3
Idem, ibidem, p.331.
4
Idem, ibidem, p.331.
5
Idem, ibidem, p.328.
6
Idem, ibidem, p.332.
7
Leibniz, G., Meditaciones sobre el conocimiento, la verdad y las
ideas, in Escritos Filosoficos, ob. cit., pp.271 ss.
8
Idem, ibidem, p.272-273.
9
Idem, ibidem, p.273.
10
Idem, ibidem, p.273.
11
Leibniz, G., Historia y Elogio de la Lengua ou Característica
Universal, in Escritos Filosóficos, ob. cit., p.165.
12
Idem, ibidem, p.166.
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*
Professor do Departamento de Filosofia da FFLCH-USP.
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A alternativa de Adams
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A contingência da escolha
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o mais perfeito... respondo que ele o quis livremente, isto é, por que
quis. Então ele quis porque quis querer, e assim infinitamente...”(Grua
302).23 O texto invocado por Curley apresenta uma argumentação
incomum na obra de Leibniz. Adams apresenta vários textos, referidos
tanto aos homens quanto a Deus, em que Leibniz recusa a série de
infinitas volições. A vontade se dirige a ações, não ao próprio querer.
E a razão disso é que semelhante regressão ao infinito viola o princípio
de razão suficiente. Como explica Adams, o uso leibniziano do princípio
na prova da existência de Deus requer que não se aceite uma regressão
infinita de razões como constituindo, em si mesma, uma razão
suficiente. Ao contrário, a razão suficiente do contingente deve
encontrar-se em um ser metafisicamente necessário, Deus, cuja
natureza impeça a regressão.
Mas se é assim, parecem esgotadas todas as alternativas para
evitar a necessidade da bondade divina e, como já mostramos as
fragilidades da tese de que este mundo é apenas contingentemente o
melhor, resulta que a contingência está mesmo expulsa do real. Não
podemos, porém, fazer tal afirmação antes de verificar como o próprio
Leibniz apresenta a bondade divina, não em suas conseqüências (o
que foi nossa perspectiva até o momento), mas nela mesma.
A vontade divina
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O querer e o criar
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dissemos, todos são bens e inexiste combate entre eles enquanto está
ausente a perspectiva de criação. Não há muito sentido, portanto, em
falar de contingência, já que não há exclusão de possíveis, sendo todos
igualmente queridos pela bondade divina. Ao contrário, quando a
existência entra em jogo, e só então, a vontade conseqüente seleciona
o melhor, sem contudo tornar impossível aquilo que foi excluído. Daí
não ser descabido pensar que as vontades antecedentes sejam vistas
como necessárias, mantendo a necessidade da bondade divina, e a
vontade conseqüente, ou seja, o decreto divino, como contingente,
garantindo a contingência da criação. É necessário a Deus ser bom,
porém não lhe é necessário ser criador, pois Deus poderia permanecer
satisfeito apenas com a contemplação de suas próprias perfeições.
Deus não carece de nada que implique criação, não precisa da
glorificação dos seres criados, que em nada aumenta Sua infinita
perfeição.
Por que então decide criar? O princípio de razão suficiente
nos impõe esta pergunta ou uma versão dela: Assentado este princípio,
a primeira pergunta que temos direito de formular será: por que há
algo em vez de nada? Pois o nada é mais simples e mais fácil que
algo.37 Todavia a pergunta não tem resposta. O primeiro decreto livre
atesta a opção divina pelo ser, pela criação, mas não revela as razões
disso. Talvez os seres criados representem maior variedade, mas quem
negará que o nada é imbatível quanto à simplicidade?
Dado o Deus perfeitíssimo, é necessário que seja bom e queira
o melhor; dado o decreto de fazer, toda a criação segue com igual
necessidade. Entretanto, como o decreto em si mesmo não é
metafisicamente necessário, seu vínculo necessário com a criação não
basta para torná-la metafisicamente necessária, mas apenas
hipoteticamente. E mais ainda, a contingência do decreto, decorrente
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Notas
1
Carta de Leibniz a Arnauld de 4 de julho de 1686, in Leibniz, G.W.
Discours de Metaphysique et correspondance avec Arnauld. Paris,
Vrin, 1993, pág. 115.
2
Adams, R. M. Leibniz´s Theories of Contingency in Woolhouse, R.
S. (ed.) Gottfried Wilhelm Leibniz: Critical Assessments. Londres e
Nova York, Routledge, 1994, vol I, pág. 141.
3
Leibniz, G. W. Textes Inédits, editados por Gaston Grua, Paris, PUF,
1948, pág. 493.
4
Leibniz, G.W. Sobre a Contingência in Recherches Générales sur
l’Analyse des Notions et des Vérités, 24 thèses métaphysiques et autres
textes logiques et métaphysiques. Introd. et notes par J.-B. Rauzy.
Paris: PUF, 1998, pág. 326.
5
Ribeiro de Moura, C.A. Contingência e Infinito in Racionalidade e
Crise: estudos sobre História da Filosofia Moderna e Contemporânea.
São Paulo-Curitiba, Discurso-Ed. UFPR, 2001, pág. 81.
6
Leibniz, G. W. Recherches..., pág. 327.
7
Leibniz, G. W. Sur la liberté in Recherches..., pág. 333.
8
Ribeiro de Moura, C. A. Leibniz, a liberdade e os Possíveis, in Vários
autores, O filósofo e sua história. Campinas, CLE, 2003, pág. 283.
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9
Além disso, outra conseqüência perigosa para o pensamento
leibniziano segue da desconsideração de que o melhor é único: se o
melhor não for único, recairemos no meio da escala de perfeição dos
mundos, o que impossibilitaria uma escolha divina fundamentada;
caminho este que o princípio de razão não comporta. Neste espírito, o
próprio texto da Teodicéia parece nos indicar que é necessário que
este mundo seja o melhor: E como nas matemáticas, quando não há
maximum nem minimum, nada enfim de distinto, tudo é feito
igualmente; ou, quando isto não é possível, não se faz nada; pode-se
dizer o mesmo em matéria de perfeita sabedoria, que não é menos
regrada que as matemáticas, que se não há melhor (optimum) entre
todos os mundos possíveis, Deus não teria produzido nenhum. Leibniz,
G.W. Essais de Théodicée. Paris, Garnier-Flammarion, 1969, par. 8,
pág. 108.
10
Leibniz, G. W. Em torno da liberdade e da necessidade. In Escritos
en torno a la libertad, el azar y el destino. Madrid, Tecnos, 1990,
pág. 7.
11
Leibniz, G. W. Essais de Théodicée, par. 230, pág. 256.
12
Id., par. 282, pág. 285.
13
Leibniz, G. W. Monadologia in Discurso de Metafísica e outros
textos. São Paulo, Martins Fontes, 2004, pág. 139.
14
Leibniz, G.W. Essais de Théodicée, par. 150, pág. 201.
15
Leibniz, G. W. Discurso de Metafísica, 2, pág. 4.
16
Id. Ibid.
17
Leibniz, G. W. El Ser perfectísimo existe in Escritos Filosóficos.
Ed. de E. Olaso; notas de E. Olaso y R. Torretti; trad. de R. Torretti,
T. Zwanck, E. Olaso. Buenos Aires: Editorial Charcas, 1982, pág.
148.
18
Leibniz, G.W. Discurso de Metafísica, par.1, pág. 3.
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19
Leibniz, G.W. Essais de Théodicée, par. 230, pág. 256.
20
Leibniz, G.W. Defesa da Causa de Deus, par. 67, in Escritos
Filosoficos, pág. 545.
21
Russell, B. Russell, B. A Filosofia de Leibniz (uma exposição
crítica). São Paulo, Companhia Editora Nacional, 1968, pág. 40.
22
Id. Ibid.
23
Curley, E. The Root of Contingency. In Woolhoouse, R. op. cit. ,
pág. 204.
24
Leibniz, G. W. Essais de Théodicée, par. 22, pág. 117.
25
Leibniz, G. W. Exame da física de Descartes in Escritos Filosóficos,
pág. 437.
26
Leibniz, G. W. Nouveaux Essais sur l´entendement humain. Paris,
Garnier-Flammarion, 1966 II, I, 2, pág.92.
27
Leibniz, G. W. Notas sobre o livro Da origem do mal publicado há
pouco na Inglaterra. In Essais de Théodicée, pág. 409.
28
Leibniz, G. W. Essais de Théodicée, par. 311, pág. 302.
29
Leibniz, G. W. Notas sobre o livro..., pág. 399.
30
Leibniz, G.W. Nouveaux Essais..., II,XXI, 5, pág. 146.
31
Id., II, XXI, 39, pág. 164
32
Leibniz, G. W. Essais de Théodicée, par. 7, pág. 108.
33
Id., par. 22, pág. 117.
34
Leibniz, G.W. Em torno da liberdade e da necessidade in Escritos
en torno a la libertad..., pág. 8.
35
Leibniz, G. W. Essais de Théodicée, par. 235, pág. 258.
36
Id., par. 237, pág. 259.
37
Leibniz, G.W. Princípios da Natureza e da Graça fundados em
razão, par. 7 in Escritos Filosóficos, pág.601.
85
Bibliografia
86
Leibniz:
Expressão e Característica Universal*
TESSA MOURA LACERDA**
Resumo:
A crítica de Leibniz à prova a priori da existência de Deus,
retomada de Anselmo por Descartes, resume-se à observação de que,
antes de admitir a existência de um ser perfeitíssimo, é preciso provar
a possibilidade da noção de um tal ser; e, para isso, é preciso mostrar
a compatibilidade entre as perfeições divinas. A prova é correta, mas
incompleta.
Leibniz jamais completou essa prova, com exceção de um texto
escrito em 1676, porque, para isso, precisaria lançar mão de sua
Característica universal, cujos elementos seriam os pensamentos
simples que exprimiriam as formas simples ou perfeições divinas.
O projeto de criação de uma língua formal ou Característica
universal, embora tenha permanecido inacabado, jamais foi abandonado
por Leibniz. Todavia, ao delinear o projeto, Leibniz esclarece que a
Característica explicaria com exatidão as verdades necessárias, mas
não as verdades contingentes (as quais poderiam ser admitidas com
alta probabilidade, mas não com exatidão).
Ora, se fosse possível provar a compatibilidade entre as
perfeições divinas, seria também necessário explicar como a
incompatibilidade entre os mundos possíveis se origina dessa
compatibilidade primordial; seria preciso explicar como o contingente
nasce do interior do necessário.
*
Este texto foi originalmente apresentado no XII Encontro da Associação Nacional
de Pós-Graduação em Filosofia, ANPOF, realizado em Salvador, em outubro de
2006 e é parte de uma pesquisa financiada pela Fapesp.
**
Pós-doutoranda em Filosofia no Departamento de Filosofia da FFLCH-USP.
87
Abstract:
Leibniz’s criticism of the a priori proof of God’s existence,
taken from Anselm by Descartes, is restricted to the observation that,
before the existence of a perfect being may be admitted, one must
prove the possibility of the notion of such a being, which, in turn,
requires a demonstration of the compatibility between divine perfec-
tions. The proof is correct, but incomplete.
Leibniz never completed this proof, except for a text written
in 1676, since, to manage that, he would have to employ his universal
Characteristic, the elements of which would be the simple thoughts
expressing the simple forms, or divine perfections.
The project to create a formal language, or universal Charac-
teristic, was never abandoned by Leibniz, even though it was to re-
main unfinished. However, in outlining the project, he clearly states
that the Characteristic would accurately explain the necessary truths,
but not the contingent truths (which could be admitted with a high
degree of probability but not with exactness).
If it were possible to prove the compatibility between divine
perfections, it would also be necessary to explain how the incompat-
ibility between possible worlds stems from this primordial compatibil-
ity, and how the contingent originates from within the necessary.
Our hypothesis is that the apparent failure of the Characteris-
tic project and the lack of understanding of the relationship between
necessity and contingency results in a theory of expression that, in
opposition to the clarity of intuition, reserves a place for the confuse
and the obscure.
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Bibliografia
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Notas
1
Leibniz – “Carta a Elisabeth, 1678”, in Die philosophischen Schriften.
Ed. C. I. Gerhardt, 7 vols., Berlin, Halle: 1949-63; reimpressão
Hildesheim, 1962 (doravante citado PS, seguido do volume e da
página) – IV, p.296.
2
Leibniz – “Meditações sobre o conhecimento, a verdade e as idéias”,
PS, IV, p.425.
Tradução argentina in Escritos Filosoficos, Edição de Ezequiel de
Olaso, Buenos Aires, Charcas, 1982. – p.275.
3
Leibniz – Novos Ensaios, IV, x, §7. Paris: GF- Flammarion, 1990
(citado NE, seguido de livro e artigo) – p.345.
4
Cf. Descartes – A Mersenne. Oeuvres de Descartes. Publiées par C.
Adams e P. Tannery. 11 volumes. Paris: Vrin, 1971 – III, p.393.
5
Leibniz – “Observações sobre parte geral dos Princípios de
Descartes”, §18. PS, IV, p. 360.
Tradução argentina in Escritos Filosoficos, Buenos Aires: Editorial
Charcas, 1982 – p.422.
6
Leibniz – Quod Ens Perfectissimum existit. Sämtliche Schriften und
Briefe, herausgegeben von der deutschen Akademie der Wissenschaften
zu Berlin, VI, iii, p.578-579.
Tradução francesa in Recherches générales su l’analyse des notions
et des vérités. Introduction et notes par J.-B. Rauzy. Paris: PUF, 1998.
– p. 28.
7
Leibniz – “Carta a Elisabeth, 1978”, PS, IV, p.295.
8
Leibniz – “Meditações sobre o conhecimento, a verdade e as idéias”,
PS, IV, p.425.
Tradução argentina in Escritos Filosoficos, Edição de Ezequiel de
Olaso, Ed. cit. – p.275.
107
9
Sem título, PS, VII – p.184-189 (tradução francesa in Recherches
générales sur l’analyse des notions et des vérités. Paris: PUF, 1998 –
p.63-70).
10
“eu ignorava que os geômetras, quando colocam as proposições
segundo a ordem que permite demonstrá-las umas a partir das outras,
fazem exatamente o que eu desejava.” PS, VII – p.185 (tradução
francesa in Recherches générales sur l’analyse des notions et des
vérités. Ed. cit. – p.65).
11
“Assiduamente dedicado a essa tarefa, era inevitável que eu
chegasse a esta consideração admirável, a saber, que se pode elaborar
um alfabeto dos pensamentos humanos e que a combinação das letras
desse alfabeto, juntamente com a análise das palavras feitas com
elas, permitiriam encontrar e discernir todas as coisas.” PS, VII –
p.185 (tradução francesa in Recherches générales sur l’analyse des
notions et des vérités. Ed. cit. – p.66).
12
PS, VII – p.200 (tradução francesa in Recherches générales sur
l’analyse des notions et des vérités. Ed. cit. – p.163). Cf. também PS,
VII – p.188 (tradução francesa in Recherches générales sur l’analyse
des notions et des vérités. Ed. cit. – p.69).
13
PS, VII – p.201 (tradução francesa in Recherches générales sur
l’analyse des notions et des vérités. Ed. cit. – p.163).
14
PS, VII, Einleitung.
15
Deleuze, G. – Spinoza et le probleme de l’expression. Paris: Minuit,
1968 – p.306.
16
[Zu Lockes Urteil über Malebranche], PS, VI – p.576.
17
Cf. Leopoldo e Silva, F. – “Universalidade e simbolização em
Leibniz”, publicado neste número dos Cadernos espinosanos – p. 49.
18
Leibniz – NE, III, iv, §16. Ed. cit. – p.232-233.
108
19
Leibniz – Opuscules et fragments inédits (ed. par L. Couturat).
Paris: Alcan, 1903 – pp. 518-23.
20
Eco, U. – A busca da língua perfeita. Bauru: Edusc, 2001 – p.327.
21
Leibniz citado por Eco, U. – A busca da língua perfeita. Ed. cit. –
p. 338.
22
Leibniz citado por Eco, U. – A busca da língua perfeita. Ed. cit. –
p. 338.
23
Lebrun, G. – “A noção de ‘semelhança’ de Descartes a Leibniz” in
Dascal, M. (org.) – Conhecimento, linguagem, ideologia. São Paulo:
Perspectiva, 1989 – p.53-54.
24
Leibniz – PS, IV, p.423.
25
Leibniz – Teodicéia, II, §124. Paris: Flammarion, 1969 – p.181.
26
Lamarra, A. – “Sur l’origine de la theorie de l’expression dans la
philosophie de Leibniz” in Recherches sur le XVIIe siècle, número 5 –
p. 78-83.
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*
A redação deste artigo muito se deve à contribuição feita por outros pesquisadores
no XII Encontro da ANPOF, realizado em Salvador Bahia em 2006. A compreensão
do que seria o mecanicismo em Espinosa tornou-se fundamental, o que nos levou
a discuti-lo oportunamente no III Congresso Spinoza realizado na Univesidad
Nacional de Córdoba, e que resultou na publicação do resumo da comunicação
como “Spinoza y el mecanicismo en el siglo XVII: ¿una herencia cartesiana?”
Desde então, as articulações internas sobre o mecanicismo foram sopesadas e
reelaboradas, alguns argumentos acrescidos,e a recusa à interpretação do
paralelismo em Espinosa acabou recebendo a ênfase e destaque que ora procuramos
analisar neste artigo.
**
Doutoranda em História da Filosofia pelo Departamento de Filosofia da USP.
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DEFINIÇÃO.
Quando alguns corpos de mesma ou diversa
grandeza são constrangidos por outros de tal maneira
que aderem uns aos outros, ou se movem com o mesmo
ou diverso grau de rapidez, de tal maneira que comunicam
seus movimentos uns aos outros numa proporção certa,
dizemos que esses corpos estão unidos uns aos outros e
todos em simultâneo compõem um só corpo ou Indivíduo,
que se distingue dos outros por essa união de corpos.
LEMA 5.
Se as partes componentes de um Indivíduo se
tornam maiores ou menores, mas em proporção tal que,
como dantes, todas conservam umas com as outras a
mesma proporção de movimento e de repouso, da mesma
maneira o Indivíduo manterá a sua natureza de antes
sem nenhuma mutação de forma.9
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traduzir por uma ação e uma idéia correspondente, mas uma ação-
idéia nascida e produzida na rica experiência vivida pela complexidade
relacional simultânea experenciada pelo corpo e pela mente. “Se a
mente não tivesse aptidão para excogitar, o corpo seria inerte”, mas
também “se o corpo fosse inerte, a mente seria simultaneamente inepta
para pensar”21. Além de denunciar o império da vontade, Espinosa
está, em primeiro lugar, defendendo a potência do corpo que “apenas
pelas leis da Natureza considerada como corporal” é capaz de
“construir edifícios, pinturas, edificar um templo”, o que surpreende a
sagacidade humana. Porém, e em segundo lugar, é destacando os
grandes feitos do corpo agente, somente enquanto considerada a sua
potência, que Espinosa parece mesmo repelir que se possa dar qualquer
superioridade de um âmbito racional despido de um corpo imerso no
mundo e em suas construções, em nós ou fora de nós.
Para explicitar o que pretendemos apontar, gostaríamos de
tomar de empréstimo as palavras de outro pensador contemporâneo,
e perguntar se não haveria, no escólio analisado, o repúdio ao “monstro
no qual se desenvolveu até o absurdo a faculdade que temos de extrair
pensamentos de nossos atos em vez de identificar nossos atos com
nossos pensamentos”22 ?
O corpo em Espinosa é portanto, juntamente com a mente,
parte que expressa a potência da Natureza inteira. Ora, não poderíamos
reconhecer que é pelas complexas relações com os outros homens,
com o mundo e as coisas que desvelamos na potência própria do corpo
a produção de feitos surpreendentes, não somente por sua beleza e
engenhosidade, mas porque tais feitos seriam a recriação das formas
mesmas de relação com este mesmo mundo, estes mesmos homens,
estas mesmas coisas? Não poderíamos reconhecer nisto que a expressão
é, inseparavelmente, mental e corpórea? Se assim fosse, Espinosa não
133
Notas
1
Koyré, A. Estudos de História do Pensamento Científico, Rio de
Janeiro: Forense Universitária, 1991, p. 182. Os grifos são de Koyré
(1a. edição francesa pela Éditions Gallimard, 1973)
2
Christiane Vilain faz uma interessante análise sobre as divergentes
concepções da geometrização do movimento no século XVII, tendo
como ponto de partida a comparação das definições de espaço,
extensão e movimento em Galileu e Descartes. Vilain, C. “Espaces
et Mondes au XVIIe siècle” in épistémologiques – philosophie,
sciences, histoire, (Cosmologie et philosophie – hommage à
Jacques Merleau-Ponty), vol. I (1-2), janvier-juin 2000, Paris- São
Paulo: Université Paris 7/Denis Diderot - Discurso Editorial.
3
Blay, M. “Infini, géometrie et mouvement au XVIIe siècle” in
épistémologiques – philosophie, sciences, histoire. Cosmologie et
philosophie – hommage à Jacques Merleau-Ponty, vol. I (1-2),
janvier-juin 2000, Université Paris 7/Discurso Editorial, Paris/São
Paulo, p. 163
4
Cf. Ramond, C. Spinoza et la pensée moderne. Constitutions de
l’objectivité, Paris: Éditions Harmattan, 1998,p. 112 e segs.
5
Cf. Guénon, R. Le Règne de la Quantité et les signes des temps,
Paris: Gallimard, 1945
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6
Ramond, C. Spinoza et la pensée moderne, Paris: L’Harmattan,
1998, p. 113. Os grifos são de Charles Ramond.
7
Traité de l’homme, A.T. VI, p. 202. Para este trecho, utilizamos a
tradução feita por Jordino Marques, em Descartes e sua concepção
de homem, São Paulo: Ed. Loyola, 1993.
8
Jaquet, C. Le corps, Paris: PUF, 2001, p. 102.
9
EII P13, grifos nossos. Para todos os trechos citados da Ética, a
tradução utilizada foi realizada pelo Grupo de Estudos Espinosanos,
ainda não publicada.
10
Guéroult, M. Spinoza. II-L’âme, Paris: Aubier, 1974, p. 171.
11
Guéroult, M. Spinoza. II-L’âme, Paris: Aubier, 1974, p. 175.
12
E2 P13 L7 e S.
13
Guéroult, M. Spinoza. II-L’âme, Paris: Aubier, 1974, p. 178.
14
Guéroult, M. Spinoza. II-L’âme, Paris: Aubier, 1974, p. 182
15
Martial, G. Spinoza. II-L’âme, Paris: Aubier, 1974, p. 185
16
Ramond, C. Spinoza et la pensée moderne, Paris: L’Harmattan,
1998, p. 123.
17
EII P7 S
18
Ep.81, escrita a Tschirnhaus em 05 de maio 1676, p. 409
19
Ep. 83, escrita a Tschirnhaus em 15 de julho de 1676. p. 412
20
EIII P2 S
21
EIII P2 S
22
A expressão é de Antonin Artaud em sua obra O teatro e seu
duplo.
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Bibliografia
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Doutoranda do Departamento de Filosofia da FFLCH – USP.
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EVENTOS
Chantal Jacquet
A professora da Universidade de Paris I (Panthéon-Sorbonne)
apresentou, a convite do Grupo de Estudos Espinosanos e do GT
Pensamento do Século XVII, uma conferência: Bacon e o problema do
conhecimento, no dia 21 de novembro de 2006; e um ciclo de seminários:
As relações entre corpo e mente em Espinosa e suas implicações atuais,
entre 14 e 22 de novembro de 2006.
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7. NEWS 153
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