estudo de caso
Resumo
O presente artigo tem por objetivo analisar as práticas de gestão de pessoas e a inter-relação
com o processo de Aprendizagem Organizacional, identificando os fatores facilitadores e
limitadores desse processo. A estratégia metodológica utilizada foi o estudo de caso realizado
em uma Cooperativa localizada no interior do Estado do Rio Grande do Sul, destaque em
qualidade na região. Os sujeitos da pesquisa são em número de 11, incluindo-se o presidente,
a gerência de Recursos Humanos e os gerentes das unidades de negócios que fazem parte do
Comitê Gestor da Qualidade. A coleta dos dados foi baseada em fontes documentais,
questionários e entrevistas individuais semi-estruturadas. A análise dos dados foi feita
qualitativamente à luz do referencial teórico utilizado nesse estudo. Os entrevistados
revelaram que as práticas de gestão de pessoas incentivam a aprendizagem organizacional,
porém têm consciência da necessidade de um trabalho mais intenso neste sentido e
manifestaram não ter clareza quanto à aprendizagem individual e organizacional. É relevante
ressaltar que o conceito de aprendizagem organizacional foi confundido com mudança e
adaptação, uma vez que todos os entrevistados citaram a implantação da qualidade como uma
estratégia de aprendizagem adotada pela organização.
1. Introdução
Neste mundo de rápidas transformações, muitas empresas têm buscado meios e ações
estratégicas para garantir a sobrevivência no mercado. A preocupação com a qualidade,
produtividade e competitividade tem sido, cada vez mais, uma constante na vida das
organizações. Essa preocupação exige a predisposição por parte das pessoas e organizações de
permanente aprendizado, visando acompanhar esse turbulento cenário de mudanças.
Cada vez mais é preciso que haja o reconhecimento da necessidade de profissionais
qualificados, preparados para enfrentar a acirrada competitividade e, principalmente,
dispostos a “aprender a aprender” e a oportunizar o aprendizado a outras pessoas que fazem
parte da organização. Para isso, salienta-se a grande ênfase que tem sido dada às práticas de
gestão de pessoas alinhadas a novos formatos de aprendizagem e desempenho, buscando-se
instituir uma cultura de aprendizagem nas organizações.
Assim, as práticas de gerenciamento das pessoas que atuam nos mais diversos setores,
incluindo-se as cooperativas, são consideradas necessidade imperante, visto ser a forma mais
rápida e eficaz para alavancar e conduzir o processo de mudanças e aprendizagem nas
organizações.
Observa-se, porém que, se de um lado as organizações têm necessidade de buscar a
qualidade, diminuir os custos, aumentar a produtividade, etc., como fonte de flexibilidade,
agilidade, competitividade e modernidade; do outro têm necessidade de investir em práticas
contemporâneas de recrutamento e seleção, treinamento e desenvolvimento de pessoas, bem
como remunerar estrategicamente, além de qualificar seus recursos humanos, pois esses são
considerados a verdadeira fonte de vantagem competitiva, devido à sua “capacidade original
de combinarem emoção com razão, subjetividade com objetividade quando conhecem
situações, quando desempenham tarefas, interagem e decidem” (Davel & Vergara, 2001
p.32).
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enxergarmos a área de Recursos Humanos sob uma nova visão, pautada no caráter estratégico
coerente com as exigências do mundo contemporâneo.
Nessa perspectiva, surgem alguns questionamentos que suscitam reflexões: estão as
empresas, realmente, administrando Recursos Humanos ou gerindo pessoas? Em que sentido
a área de Recursos Humanos (ARH) tem assumido papel estratégico no contexto das
organizações? Como as práticas de gestão de pessoas podem facilitar a aprendizagem
individual e organizacional?
Assim, passa-se a seguir a explanação sobre a abordagem estratégica da área de
Recursos Humanos (ARH) nas organizações.
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Dando continuidade ao seu pensamento, Fleury & Fleury (1997, p. 222) defendem
alguns pressupostos que orientariam as empresas e dariam sustentação ao processo de
aprendizagem, dentre os quais destaca-se: pensamento sistemático, ação estratégica,
integração dos processos de decisão, definição de políticas de RH que sustentem e
impulsionem a aprendizagem e, fundamentalmente, o desenvolvimento de uma cultura de
aprendizagem. Schein (1996) trabalha nessa linha, enfatizando a construção de uma cultura de
aprendizagem nas organizações, sendo essa tanto conseqüência das experiências e
aprendizagem quanto base para sua capacidade para o aprendizado contínuo. Para
desenvolver essa cultura, os autores enfatizam que as organizações necessitam apoiar-se nas
pessoas, uma vez que as mesmas constituem a base do processo.
Segundo o pensamento de Boyett & Boyett (1999) o aprendizado do indivíduo é uma
condição necessária mas não suficiente para a inteligência organizacional. O fator crucial
reside na eficácia com que os indivíduos transferem o que sabem para a organização como um
todo.
Os autores Caravantes & Pereira (1985, p.6) definem a aprendizagem como “o processo
de aquisição da capacidade de usar o conhecimento, que ocorre como resultado da prática e da
experiência crítica e que produz uma mudança relativamente permanente no comportamento.”
Esta definição em muito se assemelha com a de Garvin (1993) que destaca que “as
organizações que aprendem devem estar capacitadas a criar, adquirir e transferir
conhecimentos e em modificar seus comportamentos para refletir estes novos conhecimentos
e insights.”
Na percepção de Kolb (1997), a aprendizagem constitui-se num processo onde o
conhecimento é criado através da experiência. Esse autor considera o modelo de como as
pessoas aprendem denominado de modelo vivencial, como um ciclo quadrifásico, onde a
experiência concreta imediata é a base da observação e da reflexão. Para o efetivo
aprendizado as pessoas necessitam de quatro tipos diferentes de habilidades: experiência
concreta, observação reflexiva, conceituação abstrata e experimentação ativa.
Assim, vem à tona outro questionamento: Como as pessoas aprendem e como
transferem o que sabem para a organização, a fim de que ela também possa aprender?
Face aos questionamentos elucidados, convém ressaltar a concepção de Kim (1998)
ao salientar que, nos estágios iniciais de uma organização, a aprendizagem individual se
confunde com a organizacional, pelo fato de a empresa ser constituída por um número restrito
de pessoas e por possuir uma estrutura pequena. Com o crescimento da empresa esta
distinção vai tornando-se mais clara, uma vez que a organização é afetada pelo aprendizado
individual de seus membros.
Embora possa existir esta confusão entre a aprendizagem individual e organizacional,
a aprendizagem organizacional, segundo os autores, é mais do que a simples soma das
aprendizagens dos indivíduos. Sweringa & Wierdsma (1995) salientam que a aprendizagem
individual é necessária mas não suficiente para o aprendizado coletivo.
Vinculada a esta questão, focaliza-se o processo de aprendizagem organizacional, que
apesar de ser uma abordagem relativamente recente, já existe diferentes concepções a respeito
deste assunto.
Destaca-se o estudo de Argyris & Schön (1978) sobre aprendizagem de single loop
(ciclo único) e doble loop (ciclo duplo). A aprendizagem de ciclo único refere-se ao “como”
fazer as coisas melhor através da experiência e exerce impacto sobre parte da organização. A
segunda foca o “porquê” das coisas serem feitas, gera efeitos e impactos de longo prazo,
refere-se a mudanças mais radicais e tem como objetivo o desenvolvimento de novos
paradigmas, envolvendo o questionamento dos valores fundamentais da organização.
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3. Método e Procedimentos
O problema dessa pesquisa procura relacionar dois pontos essenciais: as práticas de
gestão de pessoas que, segundo diversos autores, estão assumindo papel estratégico, trazendo
implicações ao modo como as pessoas aprendem e como transferem o conhecimento para que
a organização também possa aprender, e a percepção sobre os fatores que facilitam ou
dificultam o processo de aprendizagem individual e organizacional. Esses pontos serviram de
orientação básica para definir a problemática dessa pesquisa que consiste na seguinte questão:
de que modo as práticas de gestão de pessoas podem facilitar e/ou dificultar o processo de
aprendizagem nas organizações?
O método adotado para o desenvolvimento dessa pesquisa de caráter exploratório é o do
estudo de caso que, segundo Yin (2001, p.32), “investiga um fenômeno contemporâneo dentro
de seu contexto da vida real, especialmente quando os limites entre o fenômeno e o contexto
não estão claramente definidos”.
A organização, objeto desse estudo, foi uma Cooperativa localizada no interior do
Estado do Rio Grande do Sul, destaque em qualidade na região. A escolha do local do estudo
deve-se ao fato de a mesma ser pioneira no município a participar do Programa Gaúcho de
Qualidade e Produtividade (PGQP) e por ser uma das organizações do setor agronegocial a
receber o Prêmio Qualidade RS – Categoria Troféu Medalha no ano de 2001.
Os sujeitos da pesquisa são em número de 11, incluindo-se o presidente, a gerência de
Recursos Humanos e os gerentes das unidades de negócios que também fazem parte do
Comitê Gestor da Qualidade.
A coleta dos dados foi baseada em fontes documentais, questionários e entrevistas. A
pesquisa documental foi realizada através de subsídios oferecidos pela cooperativa como:
relatório desenvolvido para inscrição Prêmio Qualidade RS, material sobre os produtos que a
cooperativa comercializa e folders institucionais.
Posteriormente, utilizou-se como instrumento de coleta de dados o questionário sobre
as práticas de gestão de pessoas adotadas pela Cooperativa e, por fim, realizaram-se
entrevistas individuais semi-estruturadas, que foram gravadas e transcritas com a permissão
dos entrevistados, realizadas no local de trabalho dos mesmos.
A análise dos dados foi feita qualitativamente à luz do referencial teórico utilizado
nesse estudo, tomando-se como material de análise os documentos que foram
disponibilizados, as informações constantes dos questionários e as transcrições das
entrevistas.
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A fim de tornar mais claro esse conceito perguntou-se aos entrevistados que fatores
podem facilitar ou dificultar o processo de aprendizagem organizacional, os quais são
apresentados no quadro abaixo:
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5. Considerações Finais
A realização desse estudo revelou que os entrevistados têm clareza de que a gestão de
pessoas nas organizações está passando por um momento de grandes transformações,
assumindo realmente um papel estratégico e modificando sua forma de atuação. Prova disso é
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o fato de que, na organização objeto desse estudo, alguns esforços estão sendo feitos no
sentido de (re)pensar o RH, de modo a facilitar o desenvolvimento e o crescimento da
organização, no entanto ainda há muito a ser feito.
Os entrevistados revelaram que as práticas de gestão de pessoas incentivam a
aprendizagem organizacional, porém têm consciência da necessidade de um trabalho mais
intenso nesse sentido. É relevante ressaltar que o conceito de aprendizagem organizacional foi
confundido com mudança e adaptação, uma vez que todos os entrevistados citaram a
implantação da qualidade como uma estratégia de aprendizagem adotada pela organização.
Entende-se que qualidade e aprendizagem estão inter-relacionadas, porém a aprendizagem vai
além , uma vez que deve produzir uma mudança permanente no comportamento das pessoas.
Guimarães, Angelim, Spezia, Rocha & Magalhães (apud Cabral 2001) assinalam que
aprendizagem, inovação e mudanças organizacionais são constructos interdependentes, os
quais podem ser vistos, em algumas circunstâncias, como sinônimos. Para o autor os estudos
sobre inovação privilegiam os resultados da organização e os estudos sobre aprendizagem
tendem a enfocar processos de gestão.
Os gerentes manifestaram não ter clareza quanto à aprendizagem individual e
organizacional, uma vez que mencionaram fatores pessoais e organizacionais como
facilitadores e dificultadores do processo de aprendizagem nas organizações. Segundo Stata
(1997) a aprendizagem organizacional difere da aprendizagem individual em vários aspectos.
Para o autor a aprendizagem organizacional ocorre através de percepções, conhecimentos e
modelos mentais compartilhados e o aprendizado é construído com base em conhecimentos e
experiências passadas, ou seja, com base na memória organizacional.
Por fim, destaca-se que é preciso agir, sair do discurso e redimensionar as práticas de
gestão de pessoas visando alavancar o processo de aprendizagem nas organizações. A
aprendizagem, apesar de ser um tema relevante e essencial para a competitividade das
organizações, necessita ser mais difundida no meio empresarial. Não se pode deixar de
considerar as questões intrínsecas ao processo de aprendizagem, as individualidades de cada
pessoa e a forma como as mesmas aprendem e como transferem o que sabem para que a
organização também possa aprender.
Espera-se que essa pesquisa contribua no sentido de provocar reflexões que levem ao
desenvolvimento de outros estudos que possibilitem um melhor entendimento sobre essa
temática, assim como sugere-se que o mesmo seja ampliado, utilizando-se outras fontes de
evidências como as opiniões dos colaboradores que atuam nos níveis inferiores da
organização.
6. Referências Bibliográficas
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de Aprendizagem. In: EASTHERBY-SMITH, M; ARAÚJO, L. & BURGOYNE, J.
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ARGYRIS, C. Enfrentando desafios empresariais. Rio de Janeiro: Campus, 1992.
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Addison-Wesley, USA, 1996.
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BOOG, Gustavo. Manual de Treinamento & Desenvolvimento. São Paulo: Makron Books,
1999.
BOYETT, Joseph H. & BOYETT, Jimmie T. O guia dos gurus: os melhores conceitos e
práticas dos negócios. Rio de Janeiro: Campus, 1999.
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