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Intro)

Capítulo 1) Família, Personalidade, Liderança e Autoridade na Política.

Finalidade do capítulo: Perceber o cruzamento do ideário da família/paternidade e da política


como fundamento de um poder ancorado na personalidade. A Família e a personalidade como
pilares de sustentação simbólica da autoridade/poder personal do líder/pai.

Interseções entre família/paternidade e política – fundamentos do paternalismo

Três grandes linhas/mitos de longa duração, as vezes confluentes e as vezes dissonantes, que
conectaram política-família por vias de um poder paterno:

1) Sagrado direito dos Reis contra o contratualismo/iluminismo. (Maioridade e


minoridade; autoridade/autonomia; conexão poderes terrenos com os divinos).
2) Poder pastoril e governamentalidade (governar estatisticamente/estatalmente como
um pai/pastor governam seus rebanhos. Conduzir as subjetividades, de todos e de
cada um).
3) Psicanálise (Família sentimental; Tríade Pai-Deus-Chefe; Personalidade íntima;
Traumas de Infância; Psicologia Social).

Nas três linhas a questão da família gira entorno da hierarquia/ordenamento social e do poder.

Conceituar paternalismo como fusão Estado/família a partir do cruzamento entre público-


privado [Sennett]. Poder simbólico/metafórico de Identificação entre pai – líder – deus com o
poder (Enriquèz).

Buscaremos estudar de que forma essas linhas são entretecidas na política de Vargas e Perón
como forma de criação de um ideário paternalista de legitimação de poder. Para isso,
precisamos compreender o contexto da família no BR e AR da época:

Diagnóstico da crise da família tradicional e sua reação conservadora; Cristianismo Latino;


Patriarcalismo: Estrutura jurídica e institucional de poder ao pai de família (voto masculino,
pater potestas, filiação ilegítima...). Entrada de uma nova família focada na domesticidade
burguesa: intimidade e sentimentalismo; Paternidade e maternidade como definidores dos
papéis de gênero (Friedli); Psicanálise modifica: da família eugênica à família psicológica
(Vezzetti).

Ênfase e interesse dos governos Vargas e Perón na organização, proteção e amparo da família
(Cosse, Schwartz, lei 3200/41, plan quinquenal...).

Família entendida como microcélula do social, modulo de alcance ao homem e à população,


base de sustentação econômica, administrativa e moral dos regimes Vargas Perón
(Figueiredo).

Família burguesa funda mentalidade autoritária de obediência (Adorno e Horkheimer).


Francisco Campos, Capanema e Perón sabiam disso investiram num “autoritarismo familiar”.
Fortalecimento político da família como sustentação dos ideários de personalidade, espírito e
humanismo dos novos estados (Figueiredo).

Autoridade e liderança

Constatação conservadora de crise da família também é da crise de autoridade moral e


política. Solução encontrada na personalidade autoritária unificadora: “Tempo em que reina o
irracionalismo na política. Única forma de conduzir as massas é por meio da personalidade”
(Francisco Campos). “Precisamos focar os refletores em um dos nossos” (Perón).

Personalidade na política (Sennett) e Liderança (Cohen). Personificação do leader e


necessidade do chefe (Bessoin du cheff). “Massas são massas e devem ser lideradas”
(Figueiredo) por um homem forte.

Resumo: Família dá poder ao homem pai e lhe garante a personalidade, que instituem a
autoridade, que fundamenta a liderança, que sustenta simbolicamente os regimes
autoritários.
Capítulo 2) Paternalismo e Masculinidade nas Biografias e Discursos

Finalidade do capítulo: Como as biografias hagiográficas e os discursos de Vargas e Perón


criaram e resinificaram o ideário simbólico do paternalismo. E que tipo de subjetividades
paternas/masculinas ensejaram para sustentar seus governos.

Biografias
Um novo gênero literário, momento em que a biografia ou análise da personalidade se
confunde com a história da nação.
Analisar biografias – Características das personalidades dos líderes que os fazem autoridades
(pais da nação). Como tais personalidades são veiculadas ao ideário familiar da infância (de
Vargas) e do exército (de Perón).

Arrematar com “Getúlio Vargas e a psicanálise das multidões” (G. da Silva). Faz o cruzamento
entre: Governo – personalidade – família pela metáfora do governante como pai. Articulação
simbólica entre o líder político e o pai da nação - por meio da Psicanálise.

Discursos

Discurso como performatividade: criação de realidades (tanto da política quanto do gênero).


Linguagem como inconsciente, nome do pai como estruturante da ordem simbólica,
fundamenta a ligação entre significante e significado. (Lacan)

Vargas e Perón como presidentes de uma era discursiva (sem televisão). Assim seus contatos
com o povo era por meio dos discursos (Verón; Sigal).

Governo como dádiva; Ideologia da outorga (A.C. Gomes). Fala do governante como
autoridade e povo como minoridade.

Análise dos discursos: Como os presidentes e alguns de seus braços direitos se punham
discursivamente no lugar simbólico de defensores das famílias, amigos da população,
carinhosos protetores da nação. - Casal Evita-Perón; fraternalismo; Assistencialismo;... Como
se punham, ou eram postos, como pais/chefes/sagrados da nação.

Garantia da sinceridade e da legitimidade de ideais do líder por meio de um discurso


sentimental que lhe demonstre sua personalidade, interioridade mais profunda e verdadeira.

A masculinidade nos discursos e biografias

Hierarquias de gênero utilizadas/escoradas discursivamente a partir dos sentimentos. Discurso


político e a gestão dos sentimentos. Nem manipulação (populismo) nem resistência pura.
Busca de adesão emocional via signos comoventes (Ansart).
O gênero também ancora o paternalismo: Apenas um homem pode ser pai e apenas é homem
se for pai [Pater potestas (Guy; Agamben). O pai redimido (Cosse)].

Gênero articula família e política por meio da hierarquização (Scott). Ideário político da
massa/política/pátria como infante/feminina/materna e do líder/estado/autoridade como
pai/viril/esclarecido. (Eliana Dutra, Discursos, Ministros, Evita).
Discursos misturam virilidade e paternidade: Tanto na forma (linguagem, origens dos termos,
lugar de fala do enunciante, pressuposição do enunciatário, termos e posições). Quanto no
conteúdo (“jovem viril”, “necessidade de servir a pátria”...) Ver diferenças em Vargas e Perón.
Admiração pelos homens inalcançáveis – mas como modelos/espelhos de como devem portar-
se os homens. Deve-se ser homem como o presidente/pai. Tanto a política autoritária quanto
o gênero são formas de governo de conduta/subjetividade. Paternalismo como modelo de
paternidade/masculinidade.

Criação do “novo homem” a responder pelas viris demandas de um “estado novo” [Lissovsky].
Família, masculinidade, trabalho, retidão moral, ordem hierárquica, disciplina e docilidade
como sustentação do paternalismo (da paternidade e dos regimes autoritários) da época
[“Vargas trabalha”; “papai é um homem que trabalha”].
Tipos ideais masculinos, moralidade a ser seguida. Paternalismo enquanto ideário político e
formação de subjetividades [Guattari e Foucault].

Capítulo 3 e 4) Os quadrinhos irreverentes de Divito e Chichorro.


Finalidade do capítulo: Perceber como os quadrinhos de Divito e Chichorro também realizaram
uma articulação simbólica entre paternidade, masculinidade, família e hierarquias de poder
(mesmo que pouco tratam diretamente do Estado).
Ideário imagético Republicano/positivista põe república como mulher e os heróis nacionais
como seus grandes homens).

Apresentar a imagética proposta pelo Estado Novo e pelo Justicialismo. Utilizar cartilhas e
cartazes para apresentar o ideal de gênero, familiar/moral/paternal em imagens. [cartilhas e
cartazes].
Crítica de Vargas e Perón à desarmonia e conflitos na família nacional: Censura, DIP, Lei da
multa ao solteiro... Comunismo (varguismo) e vendepátrias (peronismo) como equivalentes
simbólicos ao divórcio/desagregação da família (Dutra).
Perigo da desagregação ensejada pelo poder das imagens não domesticadas. Perón proibiu a
veiculação de sua imagem em caricaturas e Vargas aliciou a maior parte do mercado editorial
de quadrinhos do país [A Guerra dos Quadrinhos].
Chichorro – Já desenhava quadrinhos “desagregadores” da família desde a década de 20, e
mesmo sendo censurado explicitamente (até foi preso) realizou suas piadas (que em 1945
foram veiculadas inclusive por revistas filiadas ao DIP).
Divito – Um solteirão rico e boêmio convicto – Liderava a revista Rico Tipo. Apenas de
humorismo. Não fala de política, contexto mais polarizado, Divito era um antiperonistas
declarado.
Que Pai que nada... Cafagestismo e malandragem do solteirão em Divito e Chichorro.
O boêmio solteirão como antídoto ao humanismo dos regimes – escapa do padrão de
paternidade e domesticidade ensejado: Pouca docilidade e disciplina; preguiça e avareza.
Frequentes relações extraconjugais – personagens solteiros e não pais; Desarmonia no lar
(constantes brigas entre marido e mulher); Homens sem filhos e sem poder, submissos ao
mando feminino (apanha da mulher com rolo de macarrão).
Dupla personalidade do personagem Dr. Merengue põe em cheque a interioridade verdadeira
da personalidade do líder.
As duas imagens das mulheres nos quadrinhos: Ou machorras subjugadoras de homens
(esposas) ou exibicionistas, voluptuosas, erotizadas e levianas (secretárias, mulheres da rua).
Identificação do leitor com o personagem é uma marca gráfica do quadrinho. Traz o leitor
masculino para dentro do drama. O retira do mundo da domesticidade burguesa para inseri-lo
em outra lógica machista [pornotópica]. Utilização de um leitor ideal masculino e dos mesmos
valores machistas.
Mesmo com os mesmos cruzamentos e estruturas de gênero dos discursos paternais de
Vargas e Perón, Divito e Chichorro trocam as polaridades e se utilizam do quadrinho/do riso
para a realização de uma crítica irreverente ao pai (simultaneamente engraçada/não faz
reverências).
Riso castiga os costumes e caricaturiza (Bergson); Riso como forma mais civilizada de liberar
pulsões (Freud); Riso como mecanismo psicológico para ridicularizar (Kris e Gombrich); Riso
diminui a autoridade (Propp).
Quadrinhos não se referem diretamente à política estatal (macropoítica), mas sim ao gênero e
a família (micropolítica), veiculada ao poder do pai. Nesse contexto de mescla entre Estado e
Família, os quadrinhos passam a ter consequências simbólicas na política, consciente ou
inconscientemente.
Resumo: Quadrinhos de Divito e Chichorro, mesmo com os mesmos ideais machistas e
articulações simbólicas, operam em polaridade oposta aos discursos de Vargas e Perón.
Atacam o ideal de domesticidade familiar e paternidade, que são as bases de sustentação
simbólica e discursiva do ideário paternalista proposto pelos regimes de Vargas e Perón.
Conclusão: Dissenso entre subjetividades masculinas:
O paternalismo (cruzamento poder/pai) é o argumento pelo qual tanto os discursos se utilizam
para se legitimar quanto os quadrinhos utilizam para os ridicularizar. Quadrinhos e discursos
concorriam por uma hierarquização, por um modelo de conduta, por uma subjetivação
masculina, familiar e social.
Múltiplos usos e reinterpretações entrecruzadas entre gênero e política – ambos se resinificam
retroalimentarmente.

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