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Três grandes linhas/mitos de longa duração, as vezes confluentes e as vezes dissonantes, que
conectaram política-família por vias de um poder paterno:
Nas três linhas a questão da família gira entorno da hierarquia/ordenamento social e do poder.
Buscaremos estudar de que forma essas linhas são entretecidas na política de Vargas e Perón
como forma de criação de um ideário paternalista de legitimação de poder. Para isso,
precisamos compreender o contexto da família no BR e AR da época:
Ênfase e interesse dos governos Vargas e Perón na organização, proteção e amparo da família
(Cosse, Schwartz, lei 3200/41, plan quinquenal...).
Autoridade e liderança
Resumo: Família dá poder ao homem pai e lhe garante a personalidade, que instituem a
autoridade, que fundamenta a liderança, que sustenta simbolicamente os regimes
autoritários.
Capítulo 2) Paternalismo e Masculinidade nas Biografias e Discursos
Biografias
Um novo gênero literário, momento em que a biografia ou análise da personalidade se
confunde com a história da nação.
Analisar biografias – Características das personalidades dos líderes que os fazem autoridades
(pais da nação). Como tais personalidades são veiculadas ao ideário familiar da infância (de
Vargas) e do exército (de Perón).
Arrematar com “Getúlio Vargas e a psicanálise das multidões” (G. da Silva). Faz o cruzamento
entre: Governo – personalidade – família pela metáfora do governante como pai. Articulação
simbólica entre o líder político e o pai da nação - por meio da Psicanálise.
Discursos
Vargas e Perón como presidentes de uma era discursiva (sem televisão). Assim seus contatos
com o povo era por meio dos discursos (Verón; Sigal).
Governo como dádiva; Ideologia da outorga (A.C. Gomes). Fala do governante como
autoridade e povo como minoridade.
Análise dos discursos: Como os presidentes e alguns de seus braços direitos se punham
discursivamente no lugar simbólico de defensores das famílias, amigos da população,
carinhosos protetores da nação. - Casal Evita-Perón; fraternalismo; Assistencialismo;... Como
se punham, ou eram postos, como pais/chefes/sagrados da nação.
Gênero articula família e política por meio da hierarquização (Scott). Ideário político da
massa/política/pátria como infante/feminina/materna e do líder/estado/autoridade como
pai/viril/esclarecido. (Eliana Dutra, Discursos, Ministros, Evita).
Discursos misturam virilidade e paternidade: Tanto na forma (linguagem, origens dos termos,
lugar de fala do enunciante, pressuposição do enunciatário, termos e posições). Quanto no
conteúdo (“jovem viril”, “necessidade de servir a pátria”...) Ver diferenças em Vargas e Perón.
Admiração pelos homens inalcançáveis – mas como modelos/espelhos de como devem portar-
se os homens. Deve-se ser homem como o presidente/pai. Tanto a política autoritária quanto
o gênero são formas de governo de conduta/subjetividade. Paternalismo como modelo de
paternidade/masculinidade.
Criação do “novo homem” a responder pelas viris demandas de um “estado novo” [Lissovsky].
Família, masculinidade, trabalho, retidão moral, ordem hierárquica, disciplina e docilidade
como sustentação do paternalismo (da paternidade e dos regimes autoritários) da época
[“Vargas trabalha”; “papai é um homem que trabalha”].
Tipos ideais masculinos, moralidade a ser seguida. Paternalismo enquanto ideário político e
formação de subjetividades [Guattari e Foucault].
Apresentar a imagética proposta pelo Estado Novo e pelo Justicialismo. Utilizar cartilhas e
cartazes para apresentar o ideal de gênero, familiar/moral/paternal em imagens. [cartilhas e
cartazes].
Crítica de Vargas e Perón à desarmonia e conflitos na família nacional: Censura, DIP, Lei da
multa ao solteiro... Comunismo (varguismo) e vendepátrias (peronismo) como equivalentes
simbólicos ao divórcio/desagregação da família (Dutra).
Perigo da desagregação ensejada pelo poder das imagens não domesticadas. Perón proibiu a
veiculação de sua imagem em caricaturas e Vargas aliciou a maior parte do mercado editorial
de quadrinhos do país [A Guerra dos Quadrinhos].
Chichorro – Já desenhava quadrinhos “desagregadores” da família desde a década de 20, e
mesmo sendo censurado explicitamente (até foi preso) realizou suas piadas (que em 1945
foram veiculadas inclusive por revistas filiadas ao DIP).
Divito – Um solteirão rico e boêmio convicto – Liderava a revista Rico Tipo. Apenas de
humorismo. Não fala de política, contexto mais polarizado, Divito era um antiperonistas
declarado.
Que Pai que nada... Cafagestismo e malandragem do solteirão em Divito e Chichorro.
O boêmio solteirão como antídoto ao humanismo dos regimes – escapa do padrão de
paternidade e domesticidade ensejado: Pouca docilidade e disciplina; preguiça e avareza.
Frequentes relações extraconjugais – personagens solteiros e não pais; Desarmonia no lar
(constantes brigas entre marido e mulher); Homens sem filhos e sem poder, submissos ao
mando feminino (apanha da mulher com rolo de macarrão).
Dupla personalidade do personagem Dr. Merengue põe em cheque a interioridade verdadeira
da personalidade do líder.
As duas imagens das mulheres nos quadrinhos: Ou machorras subjugadoras de homens
(esposas) ou exibicionistas, voluptuosas, erotizadas e levianas (secretárias, mulheres da rua).
Identificação do leitor com o personagem é uma marca gráfica do quadrinho. Traz o leitor
masculino para dentro do drama. O retira do mundo da domesticidade burguesa para inseri-lo
em outra lógica machista [pornotópica]. Utilização de um leitor ideal masculino e dos mesmos
valores machistas.
Mesmo com os mesmos cruzamentos e estruturas de gênero dos discursos paternais de
Vargas e Perón, Divito e Chichorro trocam as polaridades e se utilizam do quadrinho/do riso
para a realização de uma crítica irreverente ao pai (simultaneamente engraçada/não faz
reverências).
Riso castiga os costumes e caricaturiza (Bergson); Riso como forma mais civilizada de liberar
pulsões (Freud); Riso como mecanismo psicológico para ridicularizar (Kris e Gombrich); Riso
diminui a autoridade (Propp).
Quadrinhos não se referem diretamente à política estatal (macropoítica), mas sim ao gênero e
a família (micropolítica), veiculada ao poder do pai. Nesse contexto de mescla entre Estado e
Família, os quadrinhos passam a ter consequências simbólicas na política, consciente ou
inconscientemente.
Resumo: Quadrinhos de Divito e Chichorro, mesmo com os mesmos ideais machistas e
articulações simbólicas, operam em polaridade oposta aos discursos de Vargas e Perón.
Atacam o ideal de domesticidade familiar e paternidade, que são as bases de sustentação
simbólica e discursiva do ideário paternalista proposto pelos regimes de Vargas e Perón.
Conclusão: Dissenso entre subjetividades masculinas:
O paternalismo (cruzamento poder/pai) é o argumento pelo qual tanto os discursos se utilizam
para se legitimar quanto os quadrinhos utilizam para os ridicularizar. Quadrinhos e discursos
concorriam por uma hierarquização, por um modelo de conduta, por uma subjetivação
masculina, familiar e social.
Múltiplos usos e reinterpretações entrecruzadas entre gênero e política – ambos se resinificam
retroalimentarmente.