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Recife, 2005
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Recife, 2005
Andrade, Lourdes Magalhães Corrêa de Oliveira
Jogos de poder na revitalização dos centros
históricos : o caso do bairro de Jaraguá em Maceió /
Lourdes Magalhães Corrêa de Oliveira Andrade. –
Recife : O Autor, 2005.
241 folhas : il., fig., quadros.
1 Introdução
Becos, esquinas, ruas, avenidas; praças, prédios, monumentos; rumores de vozes,
passos e carros; símbolos elaborados nos espaços urbanos. Palco do luxo e da miséria, locus
em sua história e identidade (FISCHER, 1997). Dão tom a essa pluralidade e singularidade
debates que perpassam setores diversos da sociedade, trazendo à tona temas como a
memória social e da identidade coletiva, bem como na transmissão desses bens, enquanto
manifestações culturais e símbolos da nação, para gerações futuras. Este pelo menos é o
caracterizada não apenas pela participação do setor público como também de outros atores,
nomeadamente a iniciativa privada. Além disso (ou talvez por isso), essas intervenções não se
entendido como:
*
Por centros históricos, compreende-se o segmento de um acervo maior, intitulado Patrimônio Cultural,
correspondente a áreas antigas com edificações e construções de grande qualidade arquitetônica representativas
de gerações passadas. (LEMOS, 1987).
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revitalização de centros históricos, que, como o próprio nome sugere, significa dar nova
Não por acaso, esse cenário vem à tona num momento em que mudanças no papel do Estado
contribuem com um forte protagonismo das cidades na vida econômica, política e social.
Com a crise do Welfare State (Estado do bem estar social), assiste-se à ascensão da
serviços outrora executados pelo poder público. O efeito mais penetrante desta retórica foi a
subnacional e local ante o nacional e transnacional (FISCHER, 2002, p.12). Eis que os
desenvolvimento.
urbano (HARVEY, 1998; 1996). De acordo com o autor, o intuito é dotar a cidade de apelo
Desenhava-se, assim, o cenário promissor para que as áreas urbanas antigas de grande
intervenção. Só na região nordeste, destaca-se, entre outros, o Projeto Reviver em São Luiz, o
entre os quais o de Jaraguá. Das diversas vozes que versam sobre o assunto, duas (não
sustentável local promovido pela intervenção nestes espaços, via parceria setor público-
esse desenvolvimento.
desenvolvimento sustentável local, posto que viabilizam uma série de benefícios e efeitos
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valorização das potencialidades locais, melhoria da qualidade de vida e inclusão social nos
núcleos receptores.
(leia-se: importa) um consenso sobre o que deve ser a cidade, financiada pelo capital privado
analisa, sob uma perspectiva organizacional, o caso Jaraguá. O intuito é aprofundar o debate
responsabilidade substancial em tais crises e descaminhos (SERVA, 1997), uma vez que os
efeito, nada mais sensato do que chamar a teoria organizacional a dar sua parcela de
Inserindo a temática no escopo organizacional, Fischer (2002) afirma que esse modelo
Ainda que se descarte uma visão monolítica das interorganizações, a integração e a conexão
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das relações entre os atores organizacionais são destacadas no conceito. “As interorganizações
são constituídas por organizações diferenciadas, conectadas por propósitos comuns, isto é,
também o foco de análise deste trabalho. Admite-se, entretanto, que um corpo teórico cuja
ênfase se deposita no critério funcional de agregação entre os atores (como a perspectiva das
interorganizações) não capta, em essência, a complexidade das relações que se dão no seio do
de poder que destacam a harmonia entre os atores (e, portanto, mais compatíveis à perspectiva
relações de poder.
setor público, a iniciativa privada e a sociedade civil é um elemento central para sua efetiva
encontros das cidades patrimônio mundial das Américas*. Parece simplória e inócua, portanto,
corpo teórico cujo núcleo conceitual perceba os conflitos e arranjos de poder, estabelecidos
*
Do romance Memórias Póstumas de Brás Cubas de Machado de Assis (capítulo II, "O emplastro"). No referido
livro, Brás Cubas (defunto autor) relata, ironicamente, que morre devido a uma pneumonia adquirida quando
preparava e apurava uma invenção milagrosa, um medicamento sublime (o emplastro) destinado a aliviar “nossa
melancólica humanidade”, capaz de curar todos os males e de trazer-lhe a notoriedade e a fortuna.
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compreender como e por que os atores se relacionam, a influência que exercem uns sobre os
outros, bem como os reais interesses que subjazem seus objetivos oficiais (metas
publicamente assumidas).
sociedade civil é o pilar sob o qual se sustentam os discursos, pautados numa perspectiva
simétrica de poder, que buscam atestar a ampla sintonia entre a revitalização de centros
pilar de vidro, frágil, à medida que coloca à distância o conflito entre os atores
organizacionais envolvidos.
abarcando desde a fase de planejamento desta intervenção urbana até sua implementação. A
hipótese central do estudo é que a divergência entre os objetivos operativos (fins realmente
poder entre os mesmos pressupõem transformação de suas ações, uma vez que necessitam
fazer concessões entre si a fim de que se tornem parceiros. Adota-se como premissa, portanto,
*
A exemplo do Relatório do 1o Encontro de Cidades Patrimônio Mundial das Américas e do 2O Seminário
Internacional de Conservação e Desenvolvimento Sustentável (SOUZA, 2003).
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• Caracterizar as relações e arranjos de poder entre esses atores, tais como: alianças e
conflitos;
condicionada pela compreensão das organizações, devido ao poder que estas exercem sobre
macrossociológicos. Segundo Turk (1970 apud Hall, 1984, p.171), “[...] as provas
concernentes ao caráter proveitoso dessa abordagem são suficientes para levantar a questão:
será que a organização não é a unidade adequada para a análise dos sistemas sociais
modernos?”.
contribui para ampliar as dimensões dos estudos organizacionais a partir de uma interpretação
Trabalhos recentes revelam como os espaços urbanos são alvos de múltiplos olhares
que podem se cruzar nas rotas transdisciplinares dos estudos organizacionais e dos estudos
urbanos, a exemplo de Fischer (1997), Mc Allister (2002), Carvalho e Fischer (2003) entre
outros, cujas investigações exibem por pano de fundo a metáfora da cidade enquanto
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relações organizacionais, o que contribui para ampliar seu escopo, aprofundar seus
fundamentos conceituais e fortalecer sua capacidade explicativa. Muito embora exista uma
2004), a questão do poder, que possui centralidade na análise organizacional, não tem sido
iniciativa privada e a sociedade civil bem como o incentivo a parcerias ativas que articulem os
três elementos desse triângulo através de uma gestão integrada de políticas públicas são
centros históricos como um palco de disputas, um complexo jogo de poder entre atores
*
Ao tratar a cidade como megaorganização ou organização virtual, Fischer (1997) faz uma alusão à relevância
do papel das organizações na sociedade contemporânea e da teoria organizacional na compreensão dos estudos
urbanos. Trata-se de uma linguagem metafórica, que não desconsidera a cidade enquanto produto social provido
de infra-estrutura, patrimônio, etc.
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privilégios, tais como a manutenção e ou expansão de seu poder (PERROW, 1986). Com
efeito, justifica-se a presente pesquisa, em termos de sua originalidade (MONTE, 2004), por
de centros históricos urbanos depositando ênfase não sob um enfoque harmônico, senão que
asfixiante para as manifestações culturais tradicionais e que faz do espaço urbano, ou melhor,
atualizam-se e alteram-se como espetáculo (COM CIÊNCIA, 2002). Há pouco, Yázigi (1995)
alertava para a carência de estudos que retratem as perdas irreparáveis ao patrimônio cultural
em prol das possíveis divisas oriundas dessa atividade. Hoje, alguns esforços têm sido
despendidos no intuito de minorar tal carência. Esta pesquisa soma-se a esses esforços
2 Abordagem teórica
A preocupação central deste capítulo é contemplar um suporte teórico capaz de
histórico Jaraguá. Com efeito, o edifício teórico sobre o qual repousa esta dissertação
preservação do patrimônio são difusas e diminutas. Esse fato exibe ressonância ainda mais
forte quando visualizado na cena brasileira. No país das belezas tropicais, do futebol e do
samba, o patrimônio arquitetônico parece funcionar “[...] mais como símbolos abstratos e
distantes da nação do que como marcos efetivos de uma identidade nacional com que a
Nas últimas décadas, entretanto, assistiu-se à ascensão dessa temática, evidenciada por
uma prática que vem imperando nas grandes cidades do Brasil e de muitos países do globo: a
identidade do lugar tomam conta da mídia, dando início a uma série de intervenções em
Não por coincidência, esse movimento emerge sob um cenário de mudanças no papel
esfera local? E como fica a questão urbana no meio de tudo isso? As linhas abaixo procuram
centros históricos.
assunto ocupado o centro da cena no que tange aos debates que versam sobre a questão do
política, remonta ao momento histórico do surgimento do Estado moderno. Nas formas pré-
(PEREIRA, 1999).
Numa perspectiva mais recente, a definição do papel do Estado na sociedade pode ser
retratada através da taxonomia de H. J. Change (SACHS, 1999), a qual sugere que, a partir da
e executadas pelos governos centrais, sob o pressuposto de que estes primariam por uma
coordenação das ações do país como um todo, de modo a minorar os desequilíbrios regionais.
2003).
É nesse contexto que a idéia de um “Estado mínimo” - que não crie nenhum embaraço
ao mercado – ganha força e, com ela, a tendência nos últimos anos de reduzir as dimensões do
Estado. O discurso intitulado por muitos como “o fim do Welfare State” foi exaustivamente
pelos EUA – e que, com efeitos mais deletérios, acabou sendo importado pelos países da
falência das economias centralmente planejadas como uma prova da excelência de seu
modelo (SACHS, 1999). A ressonância desta retórica se traduziu numa “[...] massiva
bem-estar social traz à tona, de forma crescente, a necessidade de uma articulação entre as
esferas pública, privada e também das organizações civis. Contudo, segundo Sachs (1999,
p.198), mais perturbador do que a falência desses dois pólos opostos tem sido a ascensão
desorientada dos programas e políticas de meio termo, que procuram “[...] pragmaticamente
da esfera local, intensificadas a partir dos anos oitenta pela crise fiscal do Estado. Consolidada
a noção de que não há mais espaço para a administração centralizadora outrora marcada pela
VIEIRA, 2003).
A difusão desse padrão de conduta junto aos governos locais perpassou, em ritmos
recursos de produção (OLIVEIRA, 2003 p.47). Não há, contudo, um consenso entre os
cientistas sociais quanto à definição do referido termo. Segundo Sen (1999, p.51), duas
“amigável”.
em que ambos se estimulam reciprocamente” (SOUZA, 1999, p.18, grifos do autor). Para
disciplina” de modo que a existência de redes de seguridade social para proteger os muitos
pobres, bem como o fornecimento de serviços sociais para a população podem a vir a ser
favorecidos num segundo momento, quando da suficiente produção dos frutos oriundos do
processo de desenvolvimento.
participação cidadã, a proteção ao meio-ambiente, entre outros. Esta última linha teórica tem
recebido atenção especial nos últimos anos e é a mais compatível com a abordagem de
desenvolvimento local.
local, adquire uma elevada ressonância a fundamentação do tema num movimento que se
(2002, p. 17), a referida definição é uma reação à camisa de força das definições calcadas no
arcabouço econômico e sugere a integração dessa esfera a outras duas (a dimensão social e a
Numa linha similar de orientação, Dowbor (1995) afirma que esse paradigma de
cidadania, defende o autor, só é aceitável uma visão de desenvolvimento que permita destacar
poder, distribuição da renda e democratização do acesso aos serviços públicos, aos bens
desenvolvimento local.
Pode-se constatar sem dificuldades que as palavras de Fischer (2002) e Dowbor (1995)
que emerge com esse novo paradigma é idéia de favorecimento das potencialidades locais e
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regionais de uma dada comunidade. Elucidativas neste sentido são as palavras de Ávila (2000
p. 68, grifos meus), que, a partir do exame de várias concepções abraçadas ao assunto,
sociais, políticas, institucionais, éticas, humanísticas e culturais) poderiam ser mais facilmente
2003). Com efeito, o município desempenha um papel central no processo. “De certa forma, a
papel semelhante, para a sociedade, ao que a empresa moderna representa para as atividades
parcerias entre eles podem ser organizadas da maneira mais flexível. O desenvolvimento local
políticas públicas que articule os três elementos do triângulo (PIMENTA, 1998). “Já não se
*
Por sustentabilidade, compreende-se aquilo que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a
capacidade das gerações futuras de satisfazerem suas próprias necessidades, conforme definido pela Comissão
Mundial de Meio Ambiente e desenvolvimento.
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trata mais de escolher entre o Estado e o privado, entre o social e o econômico. O conceito-
chave não é escolha e sim articulação” (DOWBOR, 1999, p.5 grifos do autor).
As macroestruturas, quer seja do poder estatal, quer seja do poder privado, não
regional e local não pode prescindir de parcerias e alianças estratégicas entre os atores sociais.
Ele deve integrar demandas, interesses, recursos, ações de diferentes áreas, níveis e
modo que estes participem do processo de desenvolvimento. Em parceria com eles, deve-se
Faz-se importante ressaltar, contudo, que a valorização da esfera local enfatizada por
Pimenta (1998), aspectos essenciais para a construção de um Estado justo e solidário são a
âmbito municipal ou regional não descarta o papel das políticas nacionais, que foram
Indo mais além na compreensão desse modelo de paradigma emergente, Ávila (2000)
tece uma distinção entre “desenvolvimento local” e “desenvolvimento no local”. Para ele,
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evidencia-se a diferença fundamental entre esses dois conceitos na forma com que ambos
acionam a comunidade para que ela mesma se torne capaz de promover o progresso, a
harmonia com o meio ambiente e a qualidade de vida, enfim sob os mais variados pontos de
vista, inclusive no que tange à contínua atração e metabolização das contribuições exógenas
desenvolvimento local consiste na capacidade que cada comunidade tem de despertar seus
cada comunidade localizada, tais como os interesses e objetivos comuns, a identidade social,
Para uma efetiva promoção do desenvolvimento local, de acordo com este raciocínio,
há que se somar e interagir estratégias de dinâmicas tanto exógenas como endógenas, uma vez
que estas sem aquelas se configuram como mera ‘caiação desenvolvimentista’ e aquelas sem
autor:
reflete, no seu bojo, uma perspectiva cuja ênfase se deposita, segundo Moura (1998) em
cidade com vistas a melhorar a qualidade de vida da população local, gerar emprego e renda.
(MOURA; CODES; LOIOLA, 2003). Com efeito, ampliar as vantagens comparativas das
cidade para melhor posicioná-las frente a suas concorrentes torna-se a palavra de ordem. A
análise de Harvey (1996) quanto ao forte protagonismo adquirido pelos governos locais e
dos anos 80, reflete esse fenômeno, o qual é denominado pelo autor de empresarialismo
urbano.
Estado, que exerceu influência na mudança estrutural do padrão de gestão das cidades. Eis a
definição do fenômeno:
sugerindo a atuação conjunta e permanente entre ambos não só na execução, mas inclusive na
governos locais primam pela otimização dos atrativos econômicos potenciais das áreas locais,
assumindo uma dimensão empreendedora e estratégica de modo que seus projetos se dotam
empresarial.
'Pão e circo' foi a famosa fórmula romana, que está sendo agora reinventada
e revivida, enquanto a ideologia da localidade, de lugar e da comunidade,
tornam-se centrais para a retórica política da gestão urbana que se concentra
na idéia de união como defesa contra um mundo hostil e ameaçador do
comércio internacional e de alta competição.
contemporâneo, que acentua o papel empreendedor dos governos locais: a competição entre
comerciais gerando uma intensa competição entre cidades e regiões, em que as mesmas
eventos efêmeros numa dada localidade representam os remédios favoritos para economias
urbanas moribundas” (HARVEY, 1996, p.59). Esses investimentos urbanos tendem a ser
especulativos. De acordo com Melo (apud Fernandes, 1998), típicas dessas ações locais são a
conjuntos históricos.
desenvolvimento local.
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(públicos, privados e organizações civis) como meio apontado para a efetiva concretização
dos planos e projetos de desenvolvimento (MOURA; CODES; LOIOLA, 2003). Sobre este
aspecto, estudos recentes, a exemplo de Holanda e Vieira (2003), têm demonstrado a sua
difícil operacionalização, já que a articulação entre os atores sociais, central no discurso desse
foca nas relações de poder entre atores envoltos na revitalização de centros históricos,
conservação e recuperação de edificações de valor histórico, das quais duas se destacam. Por
um lado, alguns estudiosos defendem que o valor dos monumentos históricos só se mantém
quando estes permanecem inalterados, intocáveis. Por outro, há aqueles que primam pela
execução de ações de intervenção de imóveis que visem repor com exatidão os desgastes e
A primeira vertente, mais rígida, desaprova qualquer intervenção que não seja o
A segunda considera fundamental para a adequada leitura do valor histórico dos imóveis, que
os mesmos sejam mantidos íntegros através do que se poderia chamar de uma restauração
2001). Esta última, aparentemente, tem sido mais aceita entre os estudiosos.
permanente e que sua conservação é compatível com a função útil à sociedade, desde que a
evolução dos usos e costumes não altere a disposição ou a decoração do edifício. O referido
dos governos locais a agentes ativos (já expostas no sub-tópico anterior) são apontadas como
as molas propulsoras para que as cidades fossem compelidas a gerar estratégias municipais de
paradoxal das esferas locais e globais, em que as especificidades locais (com destaque
Mais do que nunca as cidades, nesta nova ordem, têm que explorar
positivamente as suas próprias especificidades. E estas aparecem, entre
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aquelas que coincidem com os espaços centrais mais antigos, os “berços das cidades”,
centros históricos revitalizados. A escolha dessas áreas não se dá por acaso, senão que pelo
isolamento das mesmas diante do alargamento dos espaços urbanos, o que viabilizou a
[...] no interior deste modelo, as áreas centrais das grandes cidades, que
concentram parte significativa dos sítios históricos, começam a perder
posição relativa, em favor dos novos bairros sofisticados da periferia. Este
movimento se refletiu na montagem não só das políticas locais, mas no
próprio processo de expansão imobiliária que, gradativamente, foram
desprivilegiando os centros tradicionais como espaço de investimento
continuado, o que contribuiu para aceleração do processo de degradação
que hoje caracteriza parte significativa das áreas centrais das grandes
cidades (PNUD/MDU 1995 apud SARMENTO, 1997 p.10).
Por esta razão, as revitalizações nestas áreas costumam ser compreendidas tal qual
define Lacerda (ca. 2000, p.2), isto é, como um processo de requalificação espacial, que
A prática da revitalização dos centros históricos teve início em vários países europeus
e nos Estados Unidos a partir dos anos 70. Barcelona, Paris, Londres, Baltimore e muitas
modernas. As atividades de lazer e turismo dão tom aos projetos, com ênfase nos aspectos
baixa renda (HARDOY, 1986), a revitalização parece se revestir ainda mais fortemente da
Eis o quadro também pintado na cena brasileira. No Brasil, o Programa das Cidades
Históricas, nos anos setenta, configura-se um divisor de águas na trajetória da proteção dos
conjugam o crescimento das cidades à preservação das raízes históricas presentes nos centros
históricos foram raras na década de setenta. Somente nos anos oitenta, as formas de gerir o
desenvolvimento das cidades brasileiras começam a tomar novos rumos (SARMENTO, 1997,
p.10), tendo sido impulsionada pela nova Constituição da República de 1988. Esta desobriga
No final dos anos 80 e início dos anos 90, a temática de revitalização no Brasil se
por empresas em parceria com as prefeituras visando à preservação dos conjuntos urbanísticos
nestes espaços ganharam uma intensa repercussão societária, polarizando um debate que
vislumbra o processo por dois ângulos opostos, um depositando ênfase nos aspectos positivos
classes médias da cidade e do turismo, com todas os benefícios que o segundo promete trazer,
tais como renda e emprego. Num segundo plano, a “limpeza” social mediante a expulsão
camadas mais baixas da escala social, a descaracterização de antigos sobrados, e cidades que,
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paradoxalmente, buscam um diferencial e se vêem cada vez mais iguais, diante da intersecção
revitalização de centros históricos no Brasil imperou num curto espaço de tempo, seguindo os
ditames dos casos internacionais e/ou nacionais considerados modelos e com freqüência
conjuntos históricos abundam nas cidades do país, eis algumas: Recife-PE, Salvador–BA, Rio
de Janeiro-RJ, São Paulo-SP, São Luiz- MA, Belém-PA, Curitiba-PR, Florianópolis-SC, São
Maceió-AL.
Vitoriana, embora procurado, desejado e utilizado sob a proteção das trevas, não era
desuso, a referida citação permanece válida no cenário contemporâneo. A luta pelo poder
revela-se uma faceta obscura que poucos assumem abertamente: aqueles que o desejam,
crucial e onipresente na vida social bem como das mais antigas nos estudos das ciências
humanas, abarcando uma série de definições e abordagens por vezes opostas entre si. A
gênese de seu conceito vincula-se propriamente à filosofia e à ciência política, mas seu uso se
disseminou para todas as áreas dos estudos sociais (FARIA, 2003, p. 67), tendo alcançado
assunto, vislumbra-se que uma das grandes dificuldades na conceituação do poder pelos
inclusão de todas as manifestações sob as quais este fenômeno fugidio e multiforme pode
alguma coisa que B não teria feito sem a intervenção de A. O estudo deste cientista político, e
capazes de ter acesso à arena da decisão. O objetivo maior era o de reconhecer quem
prevalece sobre quem nesta arena (VIEIRA; MISOCZKY, 2000; HARDY; CLEGG, 2001).
situação. Não obstante, ao longo dos anos, esta definição clássica e aparentemente simples de
poder tem sido contestada, estendida, criticada e repelida, mas permaneceu como um dos
pontos de partida para um variado leque de estudos sobre a temática (HARDY; CLEGG,
2001).
Desvelando uma outra faceta do poder, Peter Bachrach e Morton Baratz constatam que
este fenômeno não é tão visível como supõe a concepção de Dahl (1996). Partindo da
premissa de que o uso da não-decisão pode ser funcional para suprimir temas inconvenientes
aos que dominam a arena de decisão, eles constatam que o poder pode ser exercido (e
seguros. Um grande leque de barreiras para evitar uma participação plena de subordinados no
processo decisório estaria disponível aos grupos dominantes (VIEIRA; MISOCZKY, 2000,
Indo mais além, Steven Lukes sugere que o poder é freqüentemente invisível. O autor
alega que o modelo de Peter Bachrach e Morton Baratz permanecia confinado ao conflito
observável, sendo frágil por desconsiderar que o poder poderia ser utilizado para evitar a
caso, o poder é exercido pela supressão dos interesses concretos de um ator e a criação de
uma falsa consciência, ou seja, pela manutenção do conflito no modo latente. Eis o conceito
de Robert Dahl revisado: “A exerce poder sobre B quando A afeta B de um modo contrário
aos interesses de B” (VIEIRA; MISOCZKY, 2000, p.9; HARDY; CLEGG, 2001, 268).
Um olhar sob a forma como os autores citados até então (e muitos outros) vislumbram
inúmeras concepções que abarcam o tema. De fato, no âmago das visões de poder, dois
aspectos são amplamente aceitos pelos teóricos: o caráter relacional e a noção de provocação
conceitos de poder.
No que tange ao primeiro aspecto, Arendt (1997, p.213) defende que “[...] o único
poder revela sua característica social por excelência, ele permeia de tal maneira as relações
sociais, que estas poderiam ser denominadas “relações de poder”. O poder não é propriedade
do indivíduo, já que este não o possui isolada e independentemente, senão que num processo
(seja ele um indivíduo ou uma coletividade) está em relação com algum outro (HALL, 1983).
Quanto ao segundo, Lukes (1980, p. 825) chega a afirmar que “[...] o núcleo
conseqüências, sem nenhuma restrição ao que tais conseqüências poderiam ser ou o que as
provoca”. Qualquer concepção de poder útil à compreensão das relações sociais incorpora a
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O relativo consenso entre os teóricos quanto aos dois aspectos supracitados não
encerra, contudo, o debate em torno das múltiplas concepções que abarcam o tema. Aliás,
estes parecem ser os pontos em que a convergência e a sinergia terminam neste campo
assunto (HARDY; CLEGG, 2001), há uma longa história que retrata o esforço de estudiosos
poder. O autor enquadra as concepções de poder em duas amplas categorias não mutuamente
de um objetivo comum. “[...] O poder é exercido mais com os outros do que sobre eles [...]” e
tende a ser compreendido como uma realização harmoniosa, na qual todos podem ganhar
(LUKES, 1980, p. 829). Como o próprio nome sugere, há uma relação de simetria entre as
consensualmente.
Hannan Arendt. A autora faz referência a uma concepção clássica da política na qual a
capacidade humana de agir em conserto” (LUKES, 1980, p. 830). Para ela, os homens
somente retêm poder à medida em que vivem tão próximos uns dos outros que as
potencialidades de ação estão sempre presentes. Com efeito, a fundação das cidades (que,
Segundo Hannan Arendt, o que manteria as pessoas unidas depois do momento fugaz
da ação e o que elas mantêm vivo ao permanecerem unidas é o poder. Todos que se isolam
Arendt (1997, p.212) defende que, ao contrário da força (aqui compreendida como uma
mensurável, ele passa a existir entre os homens quando estes agem juntos e desaparece no
que o poder não é somente poder sobre os outros, é também um capacitador para atuar,
podendo não só ser distribuído como também produzido. Este autor é considerado o mais
influente entre os que concebem o poder como um fenômeno consensual. Para ele,
detentores do poder certos direitos e impõe algumas obrigações em relação àqueles que lhe
estão sujeitos. Os que se encontram no poder e aqueles sobre os quais o poder é exercido
estão sujeitos a obrigações recíprocas. Por poder, compreende-se a mobilização dos recursos
sociais na consecução de metas, em torno das quais houve (ou pode haver) um compromisso
público geral (LUKES, 1980, p. 830). Como corolário, o exercício do poder se dá num
compartilhadas tanto pelos que exercem o poder quanto pelos demais (CLEGG, 1990 apud
da analogia por Parsons entre dinheiro e poder. O autor parte da premissa de que tanto o poder
do poder que confere aos seus detentores o reconhecimento dos demais (VIEIRA;
MISOCZKY, 2000).
Ainda que o enfoque simétrico do poder não encerre uma categoria dicotômica à
perspectiva assimétrica que será apresentada a seguir, pode-se afirmar que, ao visualizar o
poder como fenômeno consensual, Arendt e Parsons encontram-se “no outro extremo do
é inerentemente conflitivo.
políticas. A resistência e a perturbação dos efeitos do poder de um ator sob o outro são, com
freqüência, destacadas.
De acordo com Lukes (1980, p. 827), a perspectiva assimétrica de poder abraça três
aquiescência ou controle (quer seja tentado quer seja conseguido), o enfoque da relação de
dependência e o da desigualdade.
necessariamente manifestos. Neste caso, o poder pode ser concebido como um modo de
bem como ao grau de aquiescência obtido daqueles sobre os quais o poder é exercido.
relação de dependência entre dois atores, o mais dependente se submeterá não devido a
ameaças e coerções de um sob o outro, senão que em virtude das próprias relações entre
ambos. A ênfase aqui se deposita na análise “[...] dos tipos e formas como se sustentam as
relações de dependência entre o sujeito e o objeto do ato de poder, e ainda porque e como este
Na terceira perspectiva, interpreta-se o poder como “[...] uma noção distributiva que
focaliza as capacidades diferenciais dos atores dentro de um sistema para assegurar vantagens
e recursos valiosos, mas escassos” (LUKES, 1980, p.828). Sob o enfoque da desigualdade, o
entre os agentes. Mensura-se o poder pela determinação dos que ganham e dos que perdem,
visualiza o poder sob esta última perspectiva, posto que compreende as classes e os grupos de
autor ressalta que os três enfoques de poder assimétrico delineados acima são
“[...] a probabilidade de que um ator, dentro de uma relação social, esteja em condições de
realizar sua própria vontade apesar da resistência, independente da base na qual essa
probabilidade repousa”.
Interpretando o referido conceito, percebe-se que, para Weber, o poder é tanto maior
outros, abarcando os que relutam ou se opõem. Ou seja, refere-se à habilidade de uma ou mais
pessoas em realizar a própria vontade num ato comum contra a vontade de outros que
poder. Ele e muitos cientistas políticos e sociológicos construíram o pilar sob o qual o estudo
que muitos dos pressupostos dessa ciência sejam concebidos, revistos e reinventados a partir
1991), depositam sua ênfase “[...] sobre o quantum de desvio da estrutura formal”
(CARVALHO, 1998 p. 13; grifos da autora). Hardy e Clegg (2001), examinando trabalhos-
chaves para as fundações da atual literatura sobre o poder no âmago das organizações,
afirmam que os estímulos vieram de dois vetores distintos ainda que não de todo antagônicos,
dos sociólogos Karl Marx e Max Weber. As contribuições desses autores são o ponto de
partida para pesquisas organizacionais centradas na estreita relação entre poder e dominação,
bem como na resistência enquanto forma de confrontar esta dominação. Ainda que sob visões
diferentes, pode-se afirmar que, para ambos os estudiosos, o poder era derivado da
organizacionais.
início, duas classes são definidas: aqueles que possuem capital e aqueles que não o possuem”
(HARDY; CLEGG, 2001, p.263). Já o segundo argumentava que o poder não se reduzia, de
forma exclusiva, às categorias dicotômicas propriedade e não propriedade, uma vez que o
dos trabalhadores descrito por Marx apresenta-se mais reduzido do que o descrito por Weber.
O legado deixado por este último proveu as bases teóricas de reflexão sobre a resistência de
desses autores constroem o pilar sob o qual muitos teóricos organizacionais realizam suas
organizacional.
teóricos da literatura crítica tratam o poder como uma forma de dominação legitimada nas
estruturas organizacionais: o poder penetra nessas estruturas “[...] de modo a servir a alguns,
mas não a todos os grupos de interesse” (HARDY; CLEGG, 2001, p.4). Muitos destes
por grupos dominantes, a opção de que os trabalhadores desafiem o poder daqueles que os
Entre os sociólogos cujas obras têm inspirado e norteado recentes trabalhos na área
organizacional sob uma perspectiva crítica de poder, cita-se Pierre Bourdieu (a exemplo dos
disputas entre os detentores dos diferentes tipos de capitais. A sociedade é substituída por um
luta pelo poder, almejando definir a estruturação e as regras do campo. Mudanças no campo
simbólico: “[...] poder invisível o qual só pode ser exercido com a cumplicidade daqueles que
não querem saber que lhe estão sujeitos ou mesmo que o exercem” (BOURDIEU, 2000, p. 6-
legitimada e transfigurada de poder e seu alcance é determinado não pela simples posse dos
diferentes capitais, senão que pelo reconhecimento dos demais frente à combinação destes
capitais.
tampouco os valores desses capitais são fixos no campo. Com efeito, os atores se impõem
logra excessivo valor ao capital econômico, aqueles que abarcam para si esse tipo de capital
também resgatada por teóricos da literatura gerencialista, entretanto, para estes, os arranjos
organizacionais não são estruturas de dominação, senão que autoridade formal, legítima e
55
sinaliza a ausência ou fragilidade de poder. É assim que muitas investigações desse corpo de
trabalho se voltam para a observação das ações que caem fora das estruturas legitimadas e que
da organização buscam adquirir e manter um poder que não lhes foi concedido dentro do
O último destes três autores abordou o problema das relações de poder através de uma
Segundo Crozier (1981), na referida organização, a área de manutenção detinha em suas mãos
uma poderosa fonte de poder: a capacidade de consertar o maquinário quando de uma pane.
Este era o único acontecimento relevante que não podia ser previsto nem tampouco havia
como estabelecer regras estritas, impessoais e imperativas para evitá-lo. Como os operários de
A partir desta pesquisa, Crozier (1981, p.234) constata que o controle dos recursos nas
organizações não é distribuído uniformemente e o comportamento dos atores nem sempre são
facilmente previstos de modo que, aqueles que controlam determinados recursos (as zonas de
incerteza) impõem-se frente aos demais. O autor lança, então, um novo conceito de poder que
parte do clássico conceito de Dahl (1966, grifos nossos): “o poder de A sobre B depende da
comportamento de A”.
56
a possibilidade deste de desafiar o poder frente aos que os controlam são consideravelmente
mais amplas do que as descritas na perspectiva crítica. O poder como resistência, no campo
do management, é o poder de uma espécie ilegítima, disfuncional. É por esta razão que, para
subestima os abusos de poder pelos grupos dominantes e prima pela condução dos indivíduos
para que cooperem com os interesses da organização. Nas palavras de Carvalho (1998), tal
conceito de conflito na sua análise, não é menos verdade que o faz de forma marginal, com
caráter passageiro.
apresentada por Morgan (1996, p.193). Utilizando termos oriundos da ciência política, o autor
entre o indivíduo e a sociedade caminhe lado a lado com o relacionamento entre o indivíduo e
conflito se trata de um fenômeno raro e ainda passageiro, podendo ser removido através de
tendências autoritárias são potencialmente mantidas sob controle por meio de um jogo livre de
grupos de interesses. A sociedade possui diferentes grupos que negociam e competem “[...]
57
por uma participação no equilíbrio do poder e usam a sua influência para realizar o ideal
aristotélico da política: uma ordem negociada que cria unidade a partir da diversidade”
(MORGAN, 1996, p.192). A organização, por sua vez, apresenta uma pluralidade de
detentores de poder, que são obtidos mediante uma pluralidade de fontes. Aqui, o conflito se
deposita em seus aspectos potencialmente positivos e funcionais. Com efeito, por poder
compreende-se a forma pela qual os conflitos de interesses são afinal aliviados e resolvidos.
caracterizadas por divisões sociais e políticas profundas e enraizadas. Influenciada por uma
perspectiva marxista, a visão radical deposita sua ênfase nas divergências de interesses,
relações na sociedade, estando próximas de amplos processos de controle social como, por
que o conflito pode ser suprimido, sendo este predominantemente latente em lugar de uma
autores que se fundamentam sob uma abordagem crítica (a exemplo de Pierre Bourdieu)
Toda e qualquer tipologia, ainda que válida e relevante para a melhor compreensão de
apresenta algumas arbitrariedades, esta tende a ter uma ressonância ainda mais forte quando
58
análise das três tipologias anteriormente citadas - Lukes (1980); Morgan (1996); Hardy e
Clegg (2001) - é bastante elucidativa neste sentido, permitindo inferir que as mesmas
dos interesses e dos conflitos, elementos centrais nas variadas taxonomias de poder e
um esforço de melhor compreensão das variadas tipologias, não estando nem de longe imune
teórico bem delineado é não apenas relevante, mas essencial quando um trabalho se propõe a
expostas e sintetizadas no quadro 2 (2) acima, há sempre a divisão entre, percepções mais
harmônicos. Com efeito, adotou-se, na presente pesquisa, a abordagem do conflito que será
recursos de poder controlar uns aos outros e controlar o ambiente, em função dos mais
diversos objetivos e movidos pelos mais variados interesses. Nesta arena, freqüentemente há
conflito latente. Nesta arena, atores de parte a parte, sós ou em coalizões, disputam pelas
Uma melhor percepção da dinâmica do poder perpassa a seguinte questão: “de onde
provém o poder ou essa capacidade de influenciar o outro ou outros?” (KRAUSZ, 1991, p.18)
A resposta a essa indagação simples, porém central, deposita-se na compreensão das fontes e
60
bases de poder. Estas correspondem àquilo “[...] que indivíduos ou grupos controlam e que os
Uma análise sobre a literatura em torno desta temática permite inferir que, apesar da
alguns estudos chegam até mesmo a se confundir. A referida literatura é ainda bastante ampla,
sendo possível encontrar contribuições dos mais variados investigadores quer se aproximem
Max Weber, ao vislumbrar que o poder emana por múltiplas formas, contribuiu
bastante com a temática, defendendo que “[...] todas as qualidades possíveis de um homem e
sua vontade em determinada situação” (WEBER, 1983, p.113). É sob uma linha de orientação
Segundo o autor, tais fontes vinculam-se de forte modo a três instrumentos de poder
pessoais. Esta fonte estaria mais associada ao poder condigno, poder exercido de forma
de persuasão por parte deste no intuito de fazer prevalecer seus interesses sobre outros.
Por propriedade (ou riquezas) compreende-se a posse de bens materiais, o que facilita
a submissão de um ator por outrem em função de critérios econômicos. Essa fonte se vincula
61
pecuniário.
dominado não costuma questionar aquilo que é socialmente aceito, não discute valores
relevantes para a análise das fontes de poder, mas se configura como limitada no que tange à
tipologia, a autora sugere a existência de duas fontes de poder de caráter mais geral: a pessoal
que prima pela dimensão individual do ser humano e a contextual que prima pela dimensão
social.
A fonte de poder pessoal independe do status e dos papéis que os indivíduos ocupam
na sociedade. Refere-se a um conjunto de atributos pessoais e profissionais que não pode ser
distribuído nem atribuído, tais como a personalidade, criatividade, competência técnica, nível
experiências pessoais que constituem um patrimônio único de cada ser humano. É uma fonte
vinculando-se à função que o mesmo ocupa e à extensão que tal função lhe confere na
pessoas, podendo também ser “[...] retirado e concentrado nas mãos de uma minoria, em
(1980 apud HALL, 1984, p.96) afirmam que o cargo ou a posição estrutural, as características
pessoais como o carisma, bem como a especialização (formação profissional, por exemplo)
As bases de poder podem ser enumeradas a partir dos estudos de French e Raven
(CARVALHO, 1998; HALL, 1984; KRAUSZ, 1991). Esses autores estabelecem uma
tipologia de cinco bases de poder fundamentadas nas relações interpessoais entre o detentor e
o receptor do poder: (a) poder coercitivo: capacidade de influenciar via punições e sanções;
vantagens; (c) poder legítimo: baseado na posição que o indivíduo ocupa em uma estrutura
numa dada situação e (e) poder referente: aquele advindo da admiração ou identificação por
pessoas tomadas como referência. Bacharach e Lawler (1980 apud HALL, 1984 p.96)
conhecimento.
Diante das taxonomias apresentadas, infere-se que a análise do poder por meio de suas
explicar todas as situações (CLEGG; DUNKERLEY, 1991). Esse caráter é invalidado diante
Enumerar todos os recursos [...] é impossível, uma vez que coisas diferentes
tornam-se recursos diferentes em contextos diferentes. Sem uma teoria total
dos contextos, o que é impraticável, não se pode demarcar todas as bases
sobre as quais surge o poder. Elas podem ser qualquer coisa sobre as
condições apropriadas.
É assim que ao procurar identificar as fontes e bases de poder, este trabalho tenta
histórico Jaraguá. Ao afirmar que uma organização utiliza uma fonte ou base de poder para se
relacionar com outras, nem de longe se pretende dizer que os indivíduos nas organizações,
ou “coalizões de objetivos múltiplos”, isto, é palcos de luta entre esses interesses e objetivos
dispõem amplamente das fontes e bases de poder, podem utilizá-las no intuito de fazer
prevalecer seus interesses. Eles moldam as direções que as organizações tomam influenciando
16). É importante ponderar, contudo, que se é verdade que a relação entre organizações trata-
se essencialmente de relações entre pessoas, não é menos verdade que a realidade das relações
inclusive à reificação das mesmas por alguns teóricos, ou seja, a tratá-las como algo além de
fenômeno do poder quando tratado não no âmbito interno de uma organização, senão que na
Já foi salientado que a questão do poder refere-se às relações entre dois ou mais atores
sociais, em que o comportamento de um é afetado pelo outro (HALL, 1984). Esses atores
podem ser indivíduos, grupos, associações, organizações, estados, nações (DAHL, 1966;
KRAUSZ, 1991). Entretanto, parece coerente relativizar que a análise do poder nas inter-
relações organizacionais, e não entre indivíduos, grupos e unidades circunscritos aos limites
cada organização, condicionando a luta pelo poder. Dimensões tecnológicas, legais, políticas,
econômicas e culturais do ambiente são cruciais na análise das relações entre organizações
(HALL, 1984).
específica sobre o poder numa perspectiva intra-organizacional remonta à época dos famosos
fechados em si) trouxe à tona a idéia de que o ambiente exerce influência nas estruturas e
processos organizacionais. Há uma relação recíproca, uma confluência de mão dupla, entre
ambiente e organização. Um afeta o outro à medida que interagem (HALL, 1984). Os efeitos
tratados em inúmeros trabalhos, de modo que hoje a relação entre ambientes mutáveis e
impactos na organização tornou-se lugar comum. Não obstante, muitos teóricos têm
observado que também as relações entre as organizações nesses ambientes vêm se tornando
função de razões ou bases de contato que incluem desde situações ad hoc (quando há pouca
interorganizações, tratando-se de relações que ocorrem aos pares, ou seja, entre duas
organizações, conforme figura 1 (2). Na segunda, “a ênfase recai sobre um órgão focal e suas
relações diáticas com outras organizações”, tal qual a figura 2 (2). A terceira, exposta na
entrelaçam num sistema social para atingir metas coletivas e de auto-interesse ou para
solucionar problemas específicos numa população-alvo” (VAN DE VEN; FERRY, 1980 apud
1 2
1 3
2 4
2 5
3 4
A última forma de interorganizações (as redes) parece receber uma atenção especial na
comunidade. É sob essa dimensão que muitos estudos têm se centrado na compreensão dos
espaços urbanos, conforme observado nas palavras de Turk (1970) apud Hall (1984, p. 171):
interdependência das partes envolvidas e alcance dos objetivos comuns. A idéia subjacente a
esta premissa é a de que raramente uma organização é capaz de controlar todos os recursos de
que necessita, dependendo, portanto, de outras. Logo, os objetivos comuns tendem a ser
alcançados a partir de relações de troca. Como seria inócuo ignorar que as organizações
almejam fazer com que outras tornem-se dependentes delas, a teoria interorganizacional
aponta também preocupações com a questão do poder nas relações que as organizações
A partir da revisão de diversos estudos que abarcam o assunto, Hall (1984, p. 174-188)
constata que, os correlatos do conflito nas relações interorganizacionais costumam não ser
cooperam em algumas situações e entram em conflito em outras. Esse conflito tende a estar
relacionado às diferenças de poder entre as partes. Nas palavras de Hall (1984), os conflitos
existem poucas Guerras dos Cem Anos entre as organizações, é seguro concluir que a maioria
dos conflitos é solucionada”. A resolução de velhos conflitos prepara o cenário para novos
A partir da análise dessa retórica, infere-se que, mesmo entre os teóricos que
passageiro e ainda visível. Ora, a não-eclosão de uma guerra entre as organizações não
significa inexistência do conflito, posto que ele, como defende Lukes (1980), é
não-reação de uma parte não significa satisfação diante de uma situação. E mais: longe de
resolvido o conflito tende a se manter de forma latente, ainda que possa se manifestar ou não.
Neste trabalho, sugere-se que uma possível resposta a essa pergunta repousa na
permita evidenciar como os atores procuram impor seus interesses sobre os dos outros e como
o conflito (visível ou não) pode ser o elemento-chave para a compreensão das relações entre
alcançar seus próprios interesses e ainda quando ela é compelida por uma outra parte,
conscientemente ou não.
múltiplos e conflitivos, podendo, portanto, oferecer suporte enquanto arcabouço teórico mais
objetivos organizacionais são abstrações que teriam pouca ou mesmo nenhuma capacidade de
partir dessa compreensão da realidade organizacional que Perrow (1978, p.309) dedica sua
objetivos operativos designam os fins realmente visados pelas organizações e desvelam o que
69
estas de fato almejam. A convergência entre os dois tipos de objetivos não é descartada,
entretanto, em geral, ocorre uma fraca correspondência entre ambos. Tecendo sua
Tais objetivos operacionais não-oficiais costumam estar mais diretamente relacionados aos
objetivos de grupo (em geral estão estreitamente ligados aos interesses dos grupos
São exatamente as decisões sobre questões inerentes aos objetivos operativos que
distinguem duas organizações com objetivos oficiais idênticos (PERROW, 1978). Com efeito,
contribuem para uma melhor visualização das relações de poder nas inter-relações
organizacionais. Ora, a não distinção entre esses diferentes tipos de objetivos sugere que
que seus objetivos se reforçam e se coadunam. Se objetivos oficiais são aqueles publicamente
assumidos, então, estes irão compor os objetivos exaltados pelas organizações quando as
parecem advir, então, da divergência de objetivos operativos. Como estes não costumam ser
publicamente assumidos, qualquer estudo que pretenda identificar as relações de poder deve
“Embora o conflito individual, sob a forma de lutas e debates, tiroteios e assim por diante seja
organizações que realmente altera e estrutura a sociedade” (HALL, 1984, p.13). O usual
a mudança social.
grupos de indivíduos, exercendo papel central quando da tomada de decisão no que tange às
repercussões societárias. Precisa-se ter em mente, contudo, que o poder das organizações é
direcionado para impedi-las, para efetivar a manutenção de uma dada situação, conservando a
desigualdade dos recursos existentes entre pessoas e entre as organizações (LUKES, 1980).
organizações têm um grande potencial para afetar todos que entram em contato com elas e
controlam ou podem ativar uma multiplicidade de recursos que vão bem além de maquinarias
e empregados. Elas podem requerer alterações diversas em áreas do governo, apoiar ou lutar
afetam a sociedade apenas pela coordenação ou pelos serviços que proporcionam, elas
também podem servir aos seus próprios interesses. As “informações oficiais” podem ser
71
usadas para servir aos propósitos de detentores de cargos e de servidores públicos (HALL,
1984, p.16). O mesmo raciocínio pode ser utilizado para as organizações civis, ainda que com
freqüência estas abarquem uma parcela de poder consideravelmente menor que as duas
primeiras.
“Em síntese, as organizações geram uma grande quantidade de poder que pode ser
usado de uma maneira não diretamente relacionada com a produção de mercadorias e serviços
ou com a sobrevivência” (HALL, 1984 p.12). Elas são agentes de mudanças ativos uma vez
que lutam por uma legislação e normas favoráveis a seus próprios programas, programas
esses que conduzem mudanças societárias. Sayles (1958) desenvolveu um estudo com grupos
que podem ser estendidas para a compreensão dos estilos de luta das organizações: a apatia, a
A apatia implica em uma vida de grupo passiva com poucas revoltas e uma fraca
atuação da liderança (ou mesmo inexistência de líder). A errática se caracteriza por muitas
revoltas, ainda que irregulares, uma capacidade de mobilização maciça do grupo, uma forte
perseguido. A estratégica é marcada por uma atuação do grupo com pressão contínua e
de um líder. A conservadora, por fim, destaca-se pela existência de grupos específicos, coesos
poder e o estilo de luta coletiva dos atores envolvidos na recuperação de Jaraguá. Adota-se
por premissa que as organizações nos espaços urbanos apresentam-se imersas num jogo de
espelhos, cujos reflexos emanados traduzem as distorções com que umas vêem as outras,
processo. Julga-se que esse é um vínculo frágil diante das relações de poder entre as partes,
3 Procedimentos metodológicos
Um trabalho teórico-empírico não se estrutura sem o sólido apoio de uma adequada
desenvolvimento local?
Cristina Amélia Pereira de Carvalho). Com efeito, a seleção dos termos centrais e variáveis
bem como de alguns elementos do delineamento desta dissertação, que serão descritos a
• Atores organizacionais
relações que se estabelecem junto a outros atores (HALL, 1984; HOLANDA, 2003).
DO: foram mapeados pela identificação das principais organizações envolvidas no processo
• Inter-relações organizacionais
DO: foram operacionalizadas por meio da identificação das regras (expressas e obscuras) que
• Poder
provocação de conseqüências, sem nenhuma restrição ao que tais conseqüências poderiam ser
DO: mensurou-se a partir das citações dos atores, procurando detectar a capacidade de uma
• Conflitos
DC: divergências de interesses entre os atores, podendo provocar reação das partes
(MORGAN, 1996).
DO: foram identificados a partir dos discursos dos entrevistados, procurando verificar suas
• Objetivos oficiais
(PERROW, 1978).
DO: foram identificados a partir da leitura do plano desenvolvido para a intervenção urbana
• Objetivos operativos
DC: correspondem aos fins realmente visados pelos atores organizacionais (PERROW, 1978).
DO: foram identificados a partir da análise do discurso dos entrevistados quanto à efetivação
pelos atores organizacionais, bem como através da observação das prioridades dadas ao
processo de revitalização de Jaraguá e a explicativa diante da leitura desta realidade com base
particularmente aqueles voltados para construção de espaços turísticos, culturais e de lazer, tal
centro histórico Jaraguá foi retratada a partir do desvelamento dessas relações ao longo dos
usos/atividades almejadas para Jaraguá. Essa perspectiva seguiu a orientação de Hall (1984,
p.178), segundo o qual um estudo que se disponha a analisar relações entre organizações
A estratégia de pesquisa utilizada foi o estudo de caso tendo sido escolhido, conforme
bairro não ocorreu por acaso, senão que em função das peculiaridades do mesmo.
Nomeadamente conhecida pela beleza de suas praias, Maceió é um exímio exemplo entre as
revitalização do centro histórico da cidade apresenta ampla sintonia com esta orientação, uma
vez que objetivou fomentar a atividade turística, aliando as belezas naturais já existentes em
Julgou-se adequado fazer uso do estudo de caso como estratégia de pesquisa, porque
profundidade na análise diante da concentração no caso objeto de estudo, que não seria
conflitantes pontos de vista presentes numa determinada situação social (YIN, 2001). Com
Identificou-se esta população a partir da compilação de uma lista com seus respectivos
documental.
moradores do bairro.
Por adotar uma população amostral que se constitui de atores com funções centrais
triângulo formado pelo setor público, a iniciativa privada e as organizações civis, infere-se
leque vasto de entrevistados, capaz de retratar os múltiplos interesses desses três segmentos,
2004, foi antecedida pela elaboração de um plano (disponível no apêndice A), com base nas
unidades de estudo para a coleta de dados secundários e elaboração de roteiro para realização
de entrevistas.
e/ou instrumentos que prepararam a realização das duas etapas seguintes, respectivamente,
fotográfico de Jaraguá, que permitiu retratar o bairro em diferentes momentos de sua história.
disponíveis sobre o processo de revitalização do Jaraguá, em especial, nos acervos dos órgãos
dos dados secundários coletados na fase anterior e dos próprios entrevistados que atuaram
compreensão do fenômeno, num efeito intitulado por Roesch (1999, p.140) de “bola de
neve”. No total, foram aplicadas 25 (vinte e cinco) entrevistas junto à população amostral.
O tempo médio de duração das entrevistas foi de 75 minutos, tendo sido os inquiridos
entrevistas foram conduzidas por roteiro misto, isto é, parte estruturado e parte semi-
estruturado. Nas questões fechadas, os sujeitos poderiam optar por julgar (quantificar) ou não
cada item de investigação em análise. As questões abertas não foram impostas e serviram de
eles apresentadas e não emitir juízos de valor ou opiniões pessoais que viessem a influenciar
expressam seus resultados numa perspectiva quantitativa. No caso da avaliação dos resultados
decorrentes da revitalização de centros históricos não tem sido diferente. Números que
costumeiramente apontados.
Como este trabalho investiga o outro lado da moeda, ou melhor, a quem se destinam
esses números e que grupos de interesse dominam o espaço e se beneficiam dos resultados,
De acordo com Godoy (1995), a pesquisa qualitativa busca obter dados sobre pessoas,
estudo, no intuito de compreender o fenômeno sob a ótica dos atores que participam do
mesmo.
Assim, no seu bojo, os dados foram interpretados por meio da análise de conteúdo de
orientação qualitativa (GODOY, 1995; BARDIN, 2000), com base no norteamento teórico
elaborado para o estudo. Esse tipo de análise, nas palavras de Bardin (2000, p.38),
respostas dos entrevistados à parte estruturada do roteiro de pesquisa foram contabilizadas por
métodos de análise acima expostos remonta à intenção de ter acesso a diferentes níveis da
realidade, de modo a mergulhar a fundo na proposta central desta pesquisa que consiste em
histórico Jaraguá.
organizações civis. Em função desta limitação, a escolha dos indivíduos e organizações foi
informações foram utilizadas na triangulação dos dados coletados em entrevistas, tais como o
Outro fator limitador do trabalho decorreu das desconfianças e resistências por parte de
abertamente suas opiniões (CARVALHO, 1992). Além disso, a pesquisa ocorreu num ano de
84
cargos públicos que, durante boa parte do segundo semestre de 2004, dedicaram-se às
foi dilatado, visando minorar os efeitos desses problemas sob os resultados da investigação.
revitalização do centro histórico de Jaraguá e, embora válida para subsidiar outras pesquisas
sobre o tema, seus resultados não podem ser estendidos aos demais casos de revitalização de
adotados no trabalho. Apesar dos aspectos limitantes expostos, os métodos escolhidos para
coleta e tratamento dos dados se configuram como os mais apropriados diante dos objetivos
eminentemente científico.
85
resgata-se o desenrolar dos fatos circunscritos ao processo desta intervenção urbana que
descrição das informações expostas na subseção anterior, à luz do referencial teórico proposto
nesta dissertação, em sintonia com os objetivos de pesquisa. O quadro 4 (4) abaixo sintetiza
APRESENTAÇÃO DOS DADOS - A enseada das ANÁLISE DOS DADOS - Desvelando as cortinas
canoas: ontem e hoje da revitalização de Jaraguá
Aspectos geográficos, sociais e econômicos de Mapeando os atores e seus objetivos oficiais e
Jaraguá operativos
Este item discorre brevemente sobre a localização O presente item realiza uma breve apresentação das
espacial, a topografia, o inventário e o uso do solo da organizações envolvidas na revitalização de Jaraguá. A
área em estudo. O intuito precípuo é esboçar um análise se concentra nos atores organizacionais mais
desenho das características naturais, construídas e representativos. Estes foram estudados do ponto de
sócio-econômicas do bairro, consideradas relevantes vista intra-organizacional, de modo a mapear as
para uma adequada compreensão de sua evolução características nucleares que compõem o estilo de luta
histórica, bem como do processo de revitalização nele coletiva dos mesmos, bem como os seus objetivos
ocorrido. oficiais e operativos.
Jaraguá de outrora: maresia, boemia e melaço Delineamento das inter-relações organizacionais
O tópico apresenta os principais acontecimentos Neste tópico, foram delineadas as inter-relações
históricos de Jaraguá desde sua formação até os anos organizacionais, visando compreender os arranjos de
noventa, quando se inicia o planejamento de poder existentes (simétricos e assimétricos) e o impacto
intervenção no bairro. A descrição do desenvolvimento destes nas ações dos atores em estudo. Para tal, buscou-
do bairro abarca três grandes fases, incluindo a fase de se identificar e analisar os conflitos, alianças e também
comércio fino e residências abastadas, a de comércio as fontes/bases de poder que caracterizam estas
atacadista e, por fim, a do porto mecanizado e relações.
prostituição.
A revitalização do velho (ou novo?) Jaraguá Desenvolvimento local: social ou competitivo?
Esta secção destina-se a relatar a história da Esta seção destina-se a comparar e analisar a estratégia
revitalização de Jaraguá, delineada em três momentos: de desenvolvimento adotada para o bairro de Jaraguá,
• Momento 1 - O planejamento: luta pelos recursos e através de sua revitalização, com os indicadores
elaboração do roteiro existentes da literatura de desenvolvimento local do
• Momento 2 - Os bastidores: construção do cenário tipo social e do tipo competitivo. O intuito é averiguar
e articulação com atores qual das duas vertentes melhor representa as ações
• Momento 3 - O Espetáculo: tempos de glória planejadas e implementadas em Jaraguá.
versus ocaso
Quadro 4 (4) - Dinâmica de apresentação e análise de dados
Fonte: elaboração própria
86
‘enseada das canoas’, é o foco central do presente sub-tópico (MOREIRA E SILVA apud
mediante articulação com atores envolvidos e, por fim, o efetivo funcionamento dos novos
Alagoas, situada a 9º30” de latitude sul e 35º44” de longitude oeste, na Região Nordeste do
Brasil (MACEIÓ, 1995). Planície quartenária de origem marinha, Jaraguá apresenta altitude
de apenas dois metros acima do nível do oceano e já possuiu formações antigas de dunas, hoje
aplainadas pelo homem. A enseada das canoas ocupa uma área de 140,64ha e faz divisa com
o centro de Maceió a Oeste, a praia de Pajuçara a leste, o bairro do Poço ao norte e o Oceano
Jaraguá é um porto natural. Antes mesmo de ser feito esse porto [leia-se: instalado o cais do
porto], ele já servia de porto [...]”. Os arrecifes constituem uma barreira de proteção contra as
configuração mais recente, pode-se afirmar que a exportação de produtos relacionados ao pólo
cloroquímico alcança 40% das cargas transportadas, o açúcar representa cerca de 27% e o
Jaraguá de desenvolveu através de seu porto, em torno do qual foram edificados seus
disponibiliza-se uma série de mapas que retratam, com detalhes, a localização do patrimônio
natural e construído de Jaraguá na atual configuração, destacando suas ruas, praças, prédios
históricos símbolos, estacionamentos, favelas bem como as águas que cortam a enseada. Esses
mapas deverão nortear o leitor na compreensão da história do bairro, que será descrita nos
próximos subitens.
acordo com a autora, o uso ocorria de duas maneiras distintas: a zona portuária, incluindo os
Vinte anos mais tarde, após a revitalização ocorrida no bairro, observa-se similar perfil
do uso do solo de Jaraguá (ver mapa 04, disponível no apêndice F) traçado em Pereira (2001),
vinculados a este setor. O percentual do número de imóveis de uso habitacional, por sua vez,
que se submeteu, posto que, as unidades de pesquisa pertinentes dispõem de dados sobre o
município de Maceió como um todo, mas não de informações específicas sobre o bairro de
Jaraguá na qual se possa evidenciar uma série histórica contínua entre esses dois momentos.
Contudo, algumas poucas inferências podem ser realizadas a partir do confronto entre o
intervenção urbana em Jaraguá, e os dados fornecidos pelo IBGE no censo de 2000, quando o
Em 1991, o bairro de Jaraguá abrigava uma população de 3817 residentes, sendo 1742
homens e 2075 mulheres. Este número totaliza 0,6% da população urbana de Maceió e
informações sobre as condições de vida dos habitantes que residiam nos domicílios
permanentes, neste período, mas, pelo próprio curso da história do bairro, estima-se o
predomínio de pessoas de classe média baixa (com provável concentração nas regiões mais
internas do bairro) e uma ínfima parcela de pessoas de classe média alta (aparentemente
situadas no entorno da Av. da Paz). É lícito afirmar, entretanto, que, já a esta época, o uso
da presença de uma favela à beira-mar, localizada ao longo da Av. Cícero Toledo, também
6
O decréscimo do uso habitacional trata-se de uma especulação diante das informações disponíveis, posto que
não foram encontradas pesquisas com metodologias idênticas para confronto, o que pode provocar distorções
nesta inferência. Procurou-se minimizar tais distorções, adequando os parâmetros classificatórios utilizados em
Nogueira (1981) e Pereira (2001).
89
como constituída por casebres erguidos com restos de madeira sem revestimento e/ou pintura
jovens (a grande maioria sem qualquer documentação de seu imóvel) e que sempre moraram
pesqueira, mas também habitantes do setor informal da economia, com baixa renda e escassa
números absolutos para 4.219 habitantes, sendo 1963 homens e 2256 mulheres (BRASIL,
decréscimo proporcional, em relação à década anterior, já que este número totaliza 0,52% da
população de Maceió no referido ano. De acordo com a estatística fornecida por esta
instituição, a renda média dos moradores de Jaraguá responsáveis pelo domicílio em que
residem era de R$ 724,65, sendo que aproximadamente 12,62% não possuem qualquer
rendimento, 55, 48% detêm renda de até três salários mínimos, 21,56% mais de três a dez
salários, 7,09% mais dez a vinte e 3,25% recebem renda superior a vinte salários (BRASIL,
2000).
período em análise. Pode-se afirmar apenas que a atual condição de vida das comunidades de
urbana básica.
exaltado nos versos acima, por onde escoavam as exportações e importações do Estado de
Alagoas. Em função de sua localização central e do seu ancoradouro natural, o bairro tornou-
cidade de Maceió, o berço da capital de Alagoas. Citações do tipo “Maceió começou aqui em
Comercial de Maceió - E16) são, com freqüência, observadas no discurso dos entrevistados e
bairro de Jaraguá e da cidade de Maceió seja fato para os historiadores alagoanos, não há um
consenso entre os mesmos quanto à verdadeira origem da capital. Algumas vozes defendem
qual Maceió teve início por volta do século XVIII a partir de um fluxo populacional em torno
fundação de engenhos em várias cidades interioranas como Porto Calvo, Penedo, São Miguel
dos Campos, Camaragibe e Santa Luzia do Norte teria alcançado as margens do riacho
Maçayó (atual Salgadinho), onde se ergueria, por volta de 1708, um engenho de mesmo nome
Depois da restauração é que deve ter tido início o povoado de Maceió, pelo
engenho de açúcar que aí existiu [...] Alguém, certamente de Santa Luzia do
Norte, desgarrou-se do burgo lacustre, com escravaria e gado, à aventura da
indústria do açúcar, e, à margem do riacho Maçayó, fundou um engenho
(COSTA, 1981, p.8-9).
As afirmações dos historiadores supracitados são embasadas numa tradição oral, pois
nenhum deles conheceu documentação escrita que ateste a existência do tal engenho Maceió
erigido pelo então capitão Apolinário Fernandes Padilha. O que vem a consolidar essa
Padilha datado de 1724, o qual discorre sobre o engenho de nome Maceió (NOGUEIRA,
O citado testamento relata que o engenho moeu apenas duas safras, ambas de forma
segundo o documento, o ano de 1724 foi de fogo-morto e o engenho teve curta duração, o que
corrobora a conclusão por alguns estudiosos (Nogueira (1983), por exemplo) de que o
engenho erigido pelo capitão Apolinário não se desvelou como a causa inicial da expansão do
vilarejo da cidade. Essa linha de pensamento dá tom à versão de que Maceió surgiu em função
do porto de Jaraguá:
comércio pelo porto de Jaraguá ou foi o porto e o bairro de Jaraguá que evoluíram em função
João III, Alagoas era parte integrante da Capitania de Pernambuco (MACEIÓ, 1995), de
elevada à categoria de vila pelo alvará régio de 1815) em 27 de dezembro de 1818, criando
A enseada das canoas, por esta época, era um areal alvo e escaldante com algumas
Antônio Martins que percebera a vocação comercial do local (COSTA, 1981). É a partir da
capela citada que tem início o núcleo de Jaraguá, com suas edificações definitivas, construídas
por outros habitantes que lá também passaram a residir (NOGUEIRA, 1981). Costa (1981,
ficaram limitadas, “[...] foram adiante, estenderam-se à remodelação urbana, traçando o plano
de uma cidade, cortada por grandes avenidas, partindo do mar [...]”. Pode-se afirmar que as
histórias de Jaraguá e Maceió caminham juntas neste momento. Em registros históricos, fica
inconteste a relevância do porto do bairro (também intitulado “Portal de Maceió”) para esta
estrutura destinada ao comércio e residências que por ali surgiam (NOGUEIRA, 1981;
SARMENTO, 1997).
fumo, cereais, madeiras de construção civil e naval, farinha de mandioca e couro chegavam ao
litoral em carros de boi e comboios de bestas. O açúcar revelava-se o “[...] gênero principal de
exportação, em caixas, e a sua hegemonia na vida econômica das Alagoas ficou até hoje,
Nova notícia sobre Jaraguá data de 1839 e é fornecida por um viajante que desembarca
no porto da enseada das canoas. Segundo ele, “[...] um pouco atrás da linha d’água se elevava
um único correr de casas brancas, sombreadas, aqui e acolá, por moitas de coqueiros
majestosos. [...] Um pouco atrás de uma colina, eleva-se a cidade, habitada por quase três mil
almas”. O ‘correr de casas’ ao qual o viajante se refere, delineia os primeiros traços da atual
começou a se definir como espaço urbano. Maceió passou a receber diversos produtos de
Portugal e da Grã-Bretanha (vinhos, azeites, algodão, linho, ferragens, chapéus, entre outros),
época. Na segunda metade do século XIX, Jaraguá já esboçava sua tendência para bairro
de Jaraguá e uma vida cultural intensa caracterizava o bairro (ver fotos antigas do bairro no
apêndice B). Segundo estatística fornecida pela UEM (ver MACEIÓ, 1999a), neste período,
Jaraguá possuía fábricas de vinagre, refinaria, o consulado provincial (atual prédio do Museu
de Imagem e Som – MISA), 05 (cinco) armazéns de grande porte, 09 (nove) pontes para
agências de navegação e 04 (quatro) trapiches alfandegários. Estes últimos são descritos com
Por volta de 1910, Jaraguá desponta como terceiro porto do Brasil (MACEIÓ, 1999a).
Na primeira metade do século XX, o bairro conta com fábrica de sabão, bonde elétrico
cartão postal da cidade de Maceió. Em concomitância, os trapiches e suas velhas pontes, local
preferido dos casais, perdem sua funcionalidade e têm sua morte decretada (LEITE JR, 2000).
É que em 1942, o cais do porto de Jaraguá foi inaugurado com fins de facilitar o escoamento
da produção do Estado e receber navios de grande porte. “Inaugurado o cais, só mesmo para
depósito serviam os trapiches, pois açúcar, algodão, coco, tecidos, etc. tudo era conduzido
do cais do porto de Jaraguá suscitou o acúmulo excessivo de areia entre o este e a Rua Sá
Albuquerque. O assoreamento distanciou o mar da citada rua, gerando um amplo espaço que
cedeu lugar, depois de 1950, à rua Cícero Toledo, onde um núcleo de pescadores se instalou
maiores (e com eles seus marinheiros) também favoreceu o crescimento do número de cabarés
Muitas são as profanas histórias de bordéis tagareladas por saudosistas nos bancos de
praças e ruelas de Jaraguá (MONTEIRO, 2004), sempre repletas do pitoresco das noites
boêmias ao som de boleros, twist e músicas da Jovem Guarda típicas dos anos 50 e 60. Neste
período, a antiga Rua da Alfândega (hoje Sá Albuquerque) concentrava cabarés luxuosos que
sociedade. Nas ruas adjacentes, proliferavam casas noturnas mais modestas, freqüentemente
No final dos anos sessenta, sob imposição do Cel. Adauto Teixeira, a “zona” de
Jaraguá (como era chamada a região dos bordéis) foi transferida para espaços mais afastados
da cidade, para satisfação das senhoras que residiam nos bairros da redondeza e protesto dos
Bradesco aí me dá uma raiva [...] que aquilo ali era o armazém mais bonito
que a gente tinha aqui, era o armazém do Faustino [...] Então, devido a isso,
eu tenho uma teoria que nós temos o Jaraguá graças às putas que
permaneceram aqui. [...] Foram elas que conservaram esse acervo
arquitetônico histórico nosso, aqui de Maceió.
em conseqüência, das águas que banham a praia de Jaraguá (também conhecida como praia da
Av. da Paz). A referida praia tornou-se um depósito de lixos, dejetos e agentes poluidores
Isto ocorreu porque desde os anos 40, a Ilha de Chiés (um trecho por onde passa o
Salgadinho) foi aterrada e o antigo riacho Maçayó passou a desaguar na praia da Av. da Paz.
encontrar Robson Crusoé7 e o índio Sexta-Feira ou tesouros enterrados por piratas caolhos de
perna-de-pau, fugiam do Liceu Alagoano, do Almeida Leite e outros colégios da época, para
mergulhar e remar em suas águas sobre velhos paus de jangadas (LIMA JR, 1976). A
Me criei nessa bela praia da avenida, que não tinha poluição porque o
Salgadinho não era poluído. Eu cheguei a pescar no Salgadinho, tomar
banho. [Eu e um amigo de infância] fizemos uma cota e compramos uma
rede e tínhamos uma jangada, de tronco de bananeira, e colocava no
7
Personagem do livro de mesmo nome de Daniel Defoe. Robson Crusoé é um jovem que foge de casa num
navio, sonhando em viajar pelo mundo, encontrar novas terras e viver aventuras. É amigo do índio Sexta-Feira.
98
Eis que Jaraguá chega aos anos oitenta com parte de seu patrimônio natural e
posições de destaque enquanto recantos das classes mais favorecidas da cidade. Mesmo o
porto do bairro, que esteve entre os mais modernos e movimentados do país, apresenta sinais
entrevistados discorre sobre o fato: “[...] era um bairro esquecido sim, podemos dizer, pela
administração [pelo poder público]. As pessoas não gostavam de morar lá, porque se deixou
habitações da qual Jaraguá foi palco ao longo dos anos se refletiu na tipologia de seu
patrimônio urbanístico (MACEIÒ, 1995), conferindo valor histórico aos sobrados da área e
Sá e Albuquerque:
Segundo o citado documento, tais ações deveriam obedecer aos ditames da Carta
artigo 1º, acata a decisão do Conselho de Preservação de Alagoas: “[...] Fica homologada a
verdes” (ALAGOAS, 1984, p.1). Sarmento (1997, p.39) assinala, contudo, que essa decisão
não concorre para a conservação de Jaraguá, uma vez que suas edificações permaneceram em
local via recuperação de antigos espaços urbanos, a ‘enseada das canoas’, outrora
abandonada, torna-se alvo de múltiplos olhares e interesses. Não demorou muito para que os
100
governos locais percebessem que um grande filão econômico se escondia por trás de seus
históricos sobrados em estado de depreciação. E o velho Jaraguá, que nascera sob os signos da
maresia, da boemia e do melaço, seria então revitalizado para se transformar num pólo
centros históricos, o pressuposto em geral subjacente é que de estes ambientes passaram por
envolvidos (1996-2000) e, por fim, a descrição do efetivo funcionamento dos novos usos e
atividades almejados para o bairro (2000-dias atuais). Cabe ressaltar que a divisão proposta é
meramente didática, posto que, na prática, houve uma concentração (e não a totalidade)
foram tecidas durante a gestão da Prefeitura Municipal de Maceió por Ronaldo Lessa (1993-
1996). O cenário dos anos 90 foi extremamente promissor para que o ideal de transformar
Jaraguá num pólo turístico, cultural e de entretenimento ocupasse o centro dos debates entre
todo, que se revelaram contundentes sobre este aspecto. O intuito precípuo era não só copiar o
processo de revitalização dos centros históricos de outras cidades, como, inclusive, identificar
seus pontos fortes e fracos, visando enfatizar os primeiros e minorar os segundos. É uma ex-
aprimorar esse processo, através da reestruturação urbana de Jaraguá: “[...] ninguém quer
inventar a roda, porque a roda já foi inventada, você pode até decorá-la melhor”.
especial a primeira) e despontam como as mais citadas pelos inquiridos. Tal fato pode ser
102
próxima a Recife e Salvador, mas também em função de uma competição interurbana pelo
mercado turístico nordestino. As próprias expressões ‘decorar melhor a roda’ ou ‘copiar pra
ser mais eficiente’ sugerem uma espécie de benchmarking8 ou o que poderíamos chamar de
A citação permite inferir que Maceió não almejava ficar à deriva das demais capitais
nordestinas e que, para atrair visitantes, seria imperial investir em espaços turístico-culturais,
destacando a singularidade e a história da cidade. Não por acaso, as atenções se voltam para
Jaraguá. A ‘enseada das canoas’ na década de noventa era um sítio histórico abandonado,
detentor de posição estratégica privilegiada e talvez o único da capital alagoana que marque
uma época por sua arquitetura. Preenchia, dessa forma, os requisitos basilares e norteadores
8
Benchmarking é um processo de comparação entre práticas gerenciais frente os concorrentes mais fortes, a fim
de identificar as práticas que se revelam mais eficientes e de maior vantagem competitiva.
103
com o fomento à atividade turística: o pano de fundo desta intervenção urbana expressa a
motivação dos poderes locais em aliar as belezas naturais já existentes em Maceió às opções
culturais e de lazer pleiteadas para Jaraguá. O pressuposto implícito é que investimentos desse
porte contribuem para ampliar o tempo de permanência do turista na cidade, como assinala
Ronaldo Lessa, então prefeito da cidade, no fragmento do ofício nº051/94 que pleiteia apoio
Nomeadamente conhecida pelo verde de suas praias, Maceió figura entre as cidades
saída do Estado é o turismo. E alguém já disse até que Maceió é a Miami dos miseráveis [...]”
expectativa, portanto, era de que o projeto de recuperação de Jaraguá viesse a atrair visitantes
de classes sociais mais abastadas e que completasse o “turismo de sol e mar”, que segundo
Denise Gomes, ex-gerente de turismo da UEM, tratava-se até então do principal produto
da UEM (E14) recorda que o BID apresenta uma série de estudos com indicadores que
duas grandes razões pelas quais o investimento no setor do turístico se revela mais promissor
segunda que se trata de uma solução mais econômica para estados e regiões de menor porte.
Salientando uma conversa com um representante da cúpula do BID em que o mesmo expõe
econômica e inadimplência. Com efeito, foi a administração do então prefeito Ronaldo Lessa
em Washington, a qual sinaliza uma aprovação preliminar. Destas articulações iniciais resulta
105
Paraíso das Águas que inclui ações diversas ao longo do litoral alagoano e cuja proposta
contrata a empresa ‘TCI planejamento, Projeto e Consultoria Internacional Ltda’ para elaborar
da administração municipal.
com a preservação dos sistemas cultural e natural”. A contemplação de todas essas esferas
forneceu as diretrizes para a elaboração de sete programas do poder público municipal, que,
(MACEIÓ, 1994a).
que, no conjunto, visam elevar a qualidade de vida urbana e induzir mudanças de uso e
ocupação do solo. Estas ações são previstas para curtos e médios prazos e encontram-se
definidas no plano como “[...] condição de especial relevância para habilitação da área a
implementação são mais elásticos, em geral, médios e longos. Este tipo de intervenção
encontra-se prevista sob duas formas: primeiro, através da elaboração de legislação corretiva
programas e o grau de prioridade para sua consecução estão sintetizados no quadro 5 (4).
Cada programa é composto por subprogramas, ações ou projetos setoriais, que, no conjunto,
Maceió como um todo, uma vez que o tratamento conferido a Jaraguá com implementação
dos programas sugeridos serviria de indução para a remodelação de outras áreas urbanas da
capital alagoana.
110
planejamento do poder público em criar na área alguns espaços que também se configurariam
funcional em Jaraguá, bem como gerar benefícios para o bairro, seu entorno e a cidade de
arte, academia de dança e videoteca. A localização da segunda estava prevista entre a Av.
Cícero Toledo e a Bacia de Evolução do Porto (ver mapa 04, apêndice F). Conforme relatado
Projetos, solicitado pela Prefeitura de Maceió, estas condições eram também propícias à
para o bairro, que se iniciariam com recursos do próprio município. A solenidade contou com
Enrique Iglesias. Este último foi homenageado na ocasião pela Prefeitura Municipal de
Uma das exigências do BID para a liberação dos recursos era a criação da Unidade
Executora Municipal (UEM), que seria responsável por gerir o programa de revitalização do
bairro. Como corolário, o prefeito Ronaldo Lessa sanciona a Lei Municipal 4.487/96, que
pela fiscalização das obras de Jaraguá, também se vincula à Unidade Executora Municipal.
Tal estrutura, que sofreu algumas modificações no decorrer da implantação do projeto (ver
organograma atual da UEM no anexo B), foi também uma exigência do BID, conforme relato
de um entrevistado:
poder público, por um lado, as condições de numerário necessárias para ofertar melhores
compor o corpo técnico da unidade. Por outro, a equipe técnica da UEM foi utilizada, dentro
do tempo disponível, em trabalhos paralelos “[...] para ter uma espécie de planejamento e de
exigências do BID às necessidades do município, “[...] sem afetar nenhum trabalho do banco
arquitetura e história da cidade de Maceió, bem como disciplina a preservação desses bens
parágrafo único da referida lei, “[...] O Chefe do Executivo Municipal, mediante decreto,
estabelecerá cada Zona Especial de Preservação (ZEP) aprovando seu respectivo regulamento
pelo capítulo I, art. 1º: “[...] fica instituída a Zona Especial de Preservação 1 (ZEP-1),
(MACEIÓ, 1996c, p.1). Através deste documento, a ZEP-1 é dividida em cinco setores de
“[...] o núcleo de preservação, instituído por decreto municipal, concentrou o foco das ações
para as demais áreas do bairro (MACEIÓ, s/d, p.1). As atividades implementadas nos outros
setores assumem caráter mais específico. Como corolário, a atenção deste trabalho se acentua
no SPR-1, abarcando, nas demais regiões, apenas áreas pontuais contempladas no plano de
desenvolvimento de Jaraguá.
sociedade civil organizada em Maceió teve uma fraca expressão em torno da temática de
esforços neste sentido, destaca-se o papel da AMAPAZ (Associação dos Amigos da Av. da
Paz), fundada pelo escritor Carlito Lima. A citada associação chegou a realizar alguns
Paz. Dois deles alcançaram maior repercussão, com cobertura dos jornais locais.
ocorreu durante uma visita do então Presidente da República Fernando Collor à cidade,
Salgadinho’[...]”. O segundo foi em 1993, em protesto ao fétido odor exalado pelo riacho
[...] esse foi um protesto dos mais bonitos já feitos em Maceió. Fizemos
uma propaganda, saímos por aí [...] Quatro mil pessoas, todos eles com uma
máscara aqui na cara e cantando, essa coisa toda, foi uma coisa... Foi assim
de duas horas da tarde até cinco horas [...] (membro da cúpula da AMAPAZ
- E03).
Outras campanhas foram realizadas ao longo dos anos 90 pela AMAPAZ como, por
exemplo, a tentativa de atrair a atenção da população para o coreto da Av. da Paz via
2002). Também foi realizada uma homenagem às prostitutas de Jaraguá (placa colocada em
um dos sobrados do bairro – ver foto 31 no apêndice B), que, para o líder desta associação,
entrevistados ao discorrer sobre o assunto, sempre enfatizando que Maceió foi o primeiro9
UEM (E14):
[...] foi realmente uma luta muito grande, só na saída do governo [gestão do
prefeito Ronaldo Lessa] foi que a gente conseguiu assinar o contrato. Então
o recurso só foi usado, na verdade, numa administração posterior, a da Kátia
Born, mas, naquele momento, podia ter sido qualquer candidato. A gente
queria deixar, pelo menos, aquele recurso para a idéia do projeto. Esse foi o
grande início como surgiu [a revitalização de Jaraguá]. Graças a Deus,
Maceió foi o primeiro município acho que de todo Brasil que teve
financiamento do BID.
financiadas pelo PRODETUR/NE I em sessenta por cento10, sendo quarenta por cento com
operacionais da UEM (E12), acorda-se, neste momento, que o BID financiaria a longo prazo
(20 anos) e o BNB administraria e repassaria os recursos, sob o pagamento de uma taxa pelo
devem passar pelo crivo de estudos exigidos pelo banco, nomeadamente o de impacto sócio-
econômico e o de impacto ambiental. Também seria exigida uma minuta do edital de licitação
antes que este fosse publicado pela Prefeitura de Maceió. Periodicamente, o município teria
9
Observou uma assimetria quanto a esta informação no discurso dos entrevistados, alguns diziam que Maceió
foi o primeiro município do NE a receber esta concessão do BID, outros do Brasil e há quem diga que foi uma
concessão a nível mundial. Pela análise de dados secundários, pode-se afirmar que Maceió foi o primeiro
município contemplado pelo PRODETUR/NE I.
10
Em alguns documentos, encontrou-se a informação de que o BID financiaria 50% e o município de Maceió
entraria com a contrapartida de 50%. Aparentemente, esse foi o percentual inicialmente acordado, mas houve
uma negociação entre o município e o BID com fins de diminuir a contrapartida do primeiro para 40%.
116
que enviar as faturas das obras que viesse implementando. Estas seriam fiscalizadas pelo
BNB e somente então se consolidava o envio dos recursos, como prossegue o inquirido.
bairro histórico da capital alagoana. Jaraguá estava muito próximo de passar por uma
profunda reestruturação urbana, rumo à modernização. Eis que a velha ‘enseada das canoas’
instância, a realização de obras revitalizadoras na cena urbana, que se apóia numa gestão
Jaraguá se dará através da implantação de uma estrutura formal de funcionamento que integra
os parceiros do Setor Público, Privado e da Sociedade Civil (MACEIÓ, s/d, p.3)”. Este
período pode ser descrito em duas grandes fases, que se sobrepõem em certos momentos. A
poder público e a segunda decorre das articulações com os atores potencialmente envolvidos
Lessa, a partir de 1996. Em 1997, Kátia Born assume a Prefeitura Municipal de Maceió.
Aliada política e integrante do mesmo partido do ex-prefeito Ronaldo Lessa (PSB), a então
ao bairro com a pavimentação da Av. Assis Chateaubriand, Av. Humberto Mendes, Av.
Robert Kennedy, Av. Duque de Caxias e da Rodovia MAC-204. O asfalto negro da Rua Sá
Albuquerque, centro vital de Jaraguá, foi substituído por pedras de modo a relembrar a origem
do bairro. Nesta mesma rua, realizou-se o aterramento das redes elétricas e telefônicas e
foram substituídos os postes em concretos que lá existiam por postes de época em ferro
fundido importado da França. Estes últimos causaram polêmica nos veículos de comunicação
Comercial entre outros foram recuperados sendo que este último através do sistema de
comodato. Houve também a restauração do coreto da Av. Duque de Caxias e das praças Dois
Leões, Dezoito do Forte de Copacabana, Bom Jesus dos Navegantes, Rayol, Marcílio Dias,
Aloísio Nogueira e Homero Galvão. As pontes do bairro foram reforçadas e/ou alargadas.
estacionamento numa área de 37.536m2 com capacidade de cerca de 1.400 vagas. No tocante
esgoto com recursos do governo federal, por intermédio da Caixa Econômica e do programa
Habitar Brasil (cujas articulações iniciais ocorreram na fase de planejamento – momento 1). O
resultado foi uma medida paliativa, muito aquém da despoluição do riacho como planejada,
condições operacionais adequadas para manter o patamar de qualidade dos serviços almejados
maceioenses a mensagem de que o bairro de Jaraguá estava passando por um grande processo
CANTEIRO DE OBRAS” (JARAGUÁ, 1997, p.1). À medida que as obras iam sendo
incentivos fiscais ocorre de acordo com o tipo de obra realizada pelo investidor e uso
destinado ao estabelecimento (conforme expõe quadro 6 (4) abaixo), podendo alcançar até 10
anos de isenção de IPTU, redução de ISS em 20% pelo período de um ano e ainda isenções de
prédios históricos, segundo os ditames da Lei Municipal 4.545/96, que prevê penalidades por
seu descumprimento, desde o embargo, multa até demolição da obra irregular. Os projetos de
Conservação: “[...] intervenção de natureza preventiva, que consiste na Isenção de IPTU pelo prazo de até
manutenção do Bem Cultural a ser preservado”. dois (02) anos.
Reparação: “[...] intervenção de natureza corretiva, que consiste na Isenção de IPTU pelo prazo de até
substituição, modificação ou eliminação de elementos estranhos ou cinco (05) anos.
incompatíveis com a unidade arquitetônica do conjunto ou edifício
isolado a ser preservado”.
Restauração: “[...] intervenção, também de natureza corretiva, que Isenção do IPTU pelo prazo de até dez
consiste na reconstituição das características originárias de imóvel, (10) anos.
mediante a recuperação da estrutura afetada e dos elementos destruídos,
danificados ou descaracterizados ou, ainda, o expurgo de elementos
estranhos ao Bem Cultural a ser preservado”.
Conservação, reparação ou restauração, em conformidade com as Isenção da taxa relativa à concessão de
normas estabelecidas na Lei nº 4.545/96 e com regulamentação própria licença para execução de obras de
da ZEP baixada pelo Decreto nº 5.569/96. construção.
Usos diversos incentivados pelo poder público em conformidade com o Isenção da taxa relativa à concessão de
Decreto nº 5.569/96 (ver relação no anexo F). licença de instalação e funcionamento.
Usos diversos incentivados pelo poder público em conformidade com o Redução em 20% das alíquotas do ISS
Decreto nº 5.569/96 (ver relação no anexo F). pelo prazo de 01 (um) ano.
Quadro 6 (4) - Incentivos fiscais ofertados pelo poder público
Fonte: elaborado com base na Lei Municipal 4.545/96, capítulo IV, art. 32 (MACEIÓ, 1996b, p.7-8).
120
transferência, para fora da ZEP de atividade não compatível com os usos para ela previstos no
seu respectivo decreto regulamentador” (MACEIÓ, 1996b, p.8). Para estes casos, o município
realizadas obras de construção (por até cinco anos) e de reforma (por até dois anos) e 3)
isenção da taxa relativa à concessão de licença para execução das obras, à qual se refere o
intuito de que estas se transferiram para outros bairros da cidade, a UEM procurou,
Jaraguá antes do início da revitalização, almejando que estes também recuperassem os prédios
históricos em que funcionavam. Um caso bastante citado pelos inquiridos foi o do Bradesco
sediado no antigo armazém Faustino e que, nesta época, estava totalmente descaracterizado.
Apesar das negociações entre a UEM e a direção do citado banco, a recuperação deste antigo
trapiche não se concretizou. Oficialmente, o poder público alegou que não havia valor
Neste período, as recuperações urbanas promovidas pelo poder público ainda estavam em
andamento, o que provocou certo desconforto aos empresários da área, insatisfeitos com os
desapropriações para dar continuidade às ações nas malhas viárias. A análise das atas de
reunião interna da UEM presidida pelo então secretário executivo, Otávio Lessa, sugere que
engajar os demais órgãos da Prefeitura Municipal nos trabalhos que vinham sendo
ETJ em prol de uma maior fluidez na implementação dos projetos. Problemas desta ordem
município (conforme descrito no momento1) também pode ter contribuído para ampliar as
122
Em seu bojo, as obras públicas do núcleo histórico principal do bairro (entorno da Rua
Sá e Albuquerque) foram concluídas por volta de 1999. Neste mesmo ano, a administração da
revitalização de Jaraguá com o Banco do Nordeste do Brasil (BNB), “[...] com vistas ao
empreendedores do setor venham a se instalar no bairro de Jaraguá, bem como aqueles que já
O intuito precípuo era financiar gastos em construção, reformas e benfeitorias nos imóveis,
tenham como principal objetivo econômico a exploração da atividade turística nos segmentos
123
que compõem o trinômio turismo, cultura e lazer. Com efeito, abarca empresários de ramos
lazer almejado para o bairro, conforme expõe o termo do próprio documento: “[...] serão
também beneficiados com esta linha de financiamento aqueles agentes produtivos que
queiram se transferir do bairro de Jaraguá, por exercerem atividades não contempladas por
das obras públicas municipais no núcleo histórico de Jaraguá, amplia-se o interesse dos
empresários pelo espaço e novos empreendimentos começam a se instalar. Essa fase inicial de
marcada pelo entusiasmo de ambas as partes. Frases do tipo “No início foi tudo lindo [...]” ou
“No começo foi legal, mas depois...” (proprietário de uma danceteria do bairro – E06) são
comuns no discurso dos inquiridos. Os estímulos criados pelo poder público pareciam
para alguns, a isenção fiscal foi um atrativo relevante, outros consideraram os descontos
pouco expressivos e uma parte dos empresários sequer requisitou seus direitos, conforme se
Teve uma série de incentivos [...] Isso foi passado para todas as pessoas,
através de meio de comunicação. [...] Enfim, foi bem divulgado isso, mas
mesmo assim muitas pessoas desconhecem esses direitos que elas têm com
a questão do bairro de Jaraguá (secretária de planejamento do município –
E17).
[...] na ocasião, o único incentivo que foi dado pra gente que quis investir
aqui, foi a não cobrança do IPTU. Hoje o IPTU aqui é irrisório [...], é muito
pouco a título de incentivo (proprietário de um bar em Jaraguá – E02 e
membro da Associação de Bares e Restaurantes).
local foi a expectativa de que Jaraguá se transformaria na ‘bola da vez’, no point da cidade e,
portanto, num espaço propício ao lucro rápido. Nesta época, as revitalizações de centros
privada embarca, então, numa corrida para revitalizar imóveis particulares, onde viriam a
cyber-café, galerias, antiquários, casa de eventos, entre outros, sobretudo os três primeiros,
particulares pela iniciativa privada sob incentivo do poder público, algumas dificuldades
relacionais são apontadas por ambos os segmentos. Em geral, trata-se de impasses decorrentes
dos cuidados com o restauro exigidos aos investidores pela equipe de arquitetos do ETJ/UEM.
Para o poder público, a atenção aos detalhes, às cores e à arquitetura da época nem sempre era
atendida pelo empresariado, que deseja dispor do espaço tendo em vista sua funcionalidade e
para a iniciativa privada, as exigências do poder público eram, por vezes, mandatórias e
Ah, com certeza! [...] o poder público [...] ele apenas quer revitalizar. Até
faz questão de ter uma coisa nos padrões antigos mesmo, que mostre o
passado num presente novo. A iniciativa privada tinha discussões, com a
equipe [do ETJ]. A equipe era uma luta tremenda, porque cada coisa que
fosse fazer ali tinha que ter uma aprovação prévia dessa equipe de
arquitetos, justamente para você manter um padrão arquitetônico dentro de
uma coisa bonita, mas atendendo também às necessidades da iniciativa
privada [...] Então, existe uma diferença enorme com relação a isso, os
interesses são diferentes: a iniciativa privada está muito na frente naquele
sentido de querer atrair o cliente dela. Então, o poder público [...] quer
colocar bonitinho, ficar como antigamente, tudo bonitinho e tal, que o
turista venha olhe e goste. E a iniciativa privada não, ela quer copiar o
que está dando certo no Sul, no Sudeste trazer para cá e que eles
ganhem bastante dinheiro realmente [...] (ex-secretário executivo da
UEM - E14).
126
do poder público:
[...] na ocasião que eu peguei isso aqui, que era uma ruína pra recuperar. A
gente fez um projeto básico, apresentou para elas [as arquitetas do
ETJ/UEM]. Elas fizeram as modificações dentro das necessidades, dentro
das exigências. E as arquitetas adequaram tudinho, inclusive opiniões
até mandatórias a respeito de cores, tipo de piso, tipo de telhado [...]
(proprietário de um bar em Jaraguá e membro da cúpula da Associação de
Bares e Restaurantes – E02).
alugado, nosso no caso. [...] Ele achava que se era dele, ele poderia colocar
a cor que quisesse. Foi um negócio enjoado, mas depois foi contornado.
Elas aceitaram a cor que ele quis usar. Elas entenderam que ele não era
mais menino [...] Elas terminaram cedendo porque elas viram que
quem não iria ceder era ele (empresária de Jaraguá – E19).
este acaba por ceder aos interesses dos primeiros. Não houve relato pelos empresários
condução de suas obras e, segundo uma gerente de planejamento da UEM (E01), houve
vista as dificuldades relatadas pelo próprio poder público e as concessões realizadas por este,
segmentos.
Inicialmente o ETJ procurou impor rigor no tocante aos cuidados com os restauros
realizados pelo empresariado. Aparentemente, este fato reforça o propósito do poder público
(descrito no momento 1) de “decorar melhor a roda”, isto é, promover uma revitalização mais
minuciosa e criteriosa do que as capitais nordestinas vizinhas tomadas como espelho. Nesta
decorrentes das ações revitalizadoras em vários centros históricos. Apesar disto, o ETJ não
conseguiu sustentar sua política inicial e precisou ser mais flexível para atender às pressões e
Olhe não é fácil, porque todo mundo é importante, todo mundo tem seus
aderentes que são importantes, enfim. [...] A prática começou a nos mostrar
que não precisava rigidez toda para você ter o que queria [...] A lei não
chega a dizer você tem que usar isso, isso e isso, a própria lei tem sua
flexibilidade e na vida a gente também tem que ter essa flexibilidade
(secretária de planejamento do município – E17).
demonstram que os primeiros depositam uma atenção mais apurada na preservação da parte
128
descaracterizações costumavam a ocorrer com mais freqüência nos imóveis revitalizados pela
iniciativa privada. Pode-se inferir com propriedade também que as obras promovidas pela
Evidencia-se tal fato pelo número de anos isentos de IPTU dado como incentivo à
receberam-na pelo período de dois a cinco anos. Tal informação foi também corroborada pela
bar/restaurante chegou a receber uma concessão de isenção de IPTU superior a cinco anos
(ver quadro 6 (4) sobre concessão de incentivos fiscais por tipo de obra).
Associação Comercial de Maceió (E16), o qual defende que, sobretudo na parte interna dos
Muitas vezes, por uma questão de como vai ser usado aquele prédio, você é
obrigado, dentro do prédio, a fazer determinadas concessões. Então, você
preserva pelo lado de fora, mas, pelo lado de dentro, você é obrigado a
colocar um piso diferente, um ar condicionado, alguma coisa que muda, que
prejudica. Então, infelizmente ocorre isso. Um exemplo vivo disso é o
MISA [Museu de Imagem e Som, revitalizado pelo poder público]. [...] O
MISA tem umas colunas de madeira no meio que foram revestidas por uns
painéis de vidro, uma iluminação própria [...]; na frente colocou-se uma
porta de vidro, para poder usar ar condicionado; quer dizer, é uma série de
coisas, foi colocado um elevador... Então, é uma série de coisas que entrou
ali, que foi colocado ali, que mudou realmente.
A própria Lei Municipal 4.545/96, em seu capítulo III, seção II, artigo 16º, prevê a
localizados em Setor de Preservação Rigorosa (SPR), podem sofrer modificações desde que
129
não provoquem alteração no seu aspecto externo, podendo ser analisados em condições
se, então, a aceitação de concessões legais para a realização de obras no interior dos sobrados,
em detrimento de sua arquitetura original e que poderiam ser implementadas tanto pela
Jaraguá se justifica diante dos interesses de ambas as partes: poder público e iniciativa
clientes, quer sejam turistas, quer sejam habitantes locais. Aquele, em função da atividade
turística, almejando contemplar ou mesmo superar as expectativas dos visitantes, através, por
exemplo, do revestimento de espaços públicos, tal qual o museu citado, com materiais e
o raciocínio:
[...] essa interface da cultura com o turismo é saudável, mas por vezes
estupra alguma coisa com relação ao processo de revitalização. Intervém
demais, exacerba no processo [...] Então, eu acredito que parte dessa
extravagância que eles fizeram em Jaraguá se deve a isso, a atender
necessidades de turismo, a tornar visualmente, na visão deles, mais atraente,
mais bonito. [...] Eu acho que isso influi no visual, se você perguntar à
geração que alcançou a efervescência daquele bairro, [essa geração] vai
achar estranho aquelas cores. A geração que eu falo, é a geração que tem
60 anos, 70 anos, que conviveu com a efervescência daquele bairro,
enquanto bairro portuário. Então, eu acho que interfere, que deveria ter as
cores originais (representante da sociedade civil organizada voltada para a
preservação do patrimônio cultural – E13).
foram informados sobre as ações que seriam desenvolvidas para minorar os problemas da
[....] ela [a prefeita Kátia Born] fez uma reunião com todos os pescadores de
liderança da comunidade, mostrando uma maquete [o entrevistado
provavelmente se refere à apresentação do projeto em um programa de
computação gráfica] da construção da vila dos pescadores que ia ser
construída, que os pescadores não iam sair daqui de Jaraguá porque ela
apoiava o pescador dentro de sua área de trabalho [...] (representante de
uma das organizações civis da Vila dos Pescadores – E10).
recursos aos pescadores pelo BNB e, inclusive, de ceder o terreno onde foi erguida a fábrica.
nuances do estilo de sobrados da área) e foram fiscalizadas pela UEM, conforme relata um
[...] mas era muito protocolo, chegava arquiteto, engenheiro, parava a obra:
‘Ah não pode, tem que ser igual à revitalização de Jaraguá’11. Isso é que
encareceu muito, porque o empréstimo era de 90 mil reais e ficou em torno
de 145 mil, porque a gente teve que fazer de acordo com a revitalização.
Isso foi bom pra gente, mas prejudicou também. Fomos fazer uma estrutura
que a gente não pode assumir perante o banco. E a gente ficou de uma
forma assim sufocado.
11
Embora a fábrica de gelo se trate de uma edificação moderna, observa-se que as portas e janelas foram
projetadas num estilo arredondado lembrando os demais sobrados da área, o que aparentemente demonstra a
intenção do poder público de deixar esta edificação em sintonia com a revitalização. Não se pode afirmar que a
fábrica de gelo foi erguida com parâmetros idênticos à revitalização (a exemplo do tipo de material, detalhes,
etc), mas o rigor da equipe técnica parece ter provocado o descontentamento dos trabalhadores da pesca dado o
encarecimento da obra, como relata a entrevistada em questão.
131
seus órgãos e secretarias, para fazer cumprir a reurbanização da favela. De modo geral, há um
Vila dos Pescadores, conferindo ao bairro uma imagem contrastante entre prédios
revitalizados e favelas.
Ao tentar delinear as razões para a não implementação deste projeto, não houve
uniformidade nas respostas dos entrevistados, que apresentaram duas justificativas: um grupo
parte dos habitantes da Vila dos Pescadores. Um dos coordenadores operacionais da UEM
(E12), contudo, discorreu sobre o caso com uma resposta que parece contemplar ambas as
justificativas.
estudo precisaria demonstrar que os habitantes que não permaneceriam em Jaraguá teriam
construção da Vila dos Pescadores, os recursos para habitação provenientes de ações de re-
exemplo do Programa Habitar). Imagina-se que esse fato poderia suprir a lacuna de recursos
alegada oficialmente, desde que fosse dispensado ao projeto de reurbanização da Vila dos
papel (ver anexo C). Restava, contudo, a expectativa da sociedade maceioense e, em especial
público.
bastante variada entre R$ 60.000,00 e R$ 300.000,00, resultando numa média estimada por
(ver investimentos detalhados do poder público, data de atualização dos valores apresentados
durante a execução das obras (MACEIÓ, ca. 2000). No apêndice B, figuram fotos de Jaraguá
de seus prédios, equipamentos e monumentos urbanos. Estas fotos ilustram o reflexo das
público responsáveis pela gestão de Jaraguá estavam mutuamente envolvidos, quer por dividir
12
O número corresponde apenas ao montante dos investimentos na reestruturação (interna e externa) dos
imóveis, não inclui valor de aquisição. Todos os entrevistados da iniciativa privada entrevistados afirmam ter
alugado os imóveis, exceto um (E06), que teve dois estabelecimentos sendo um alugado e outro (uma
danceteria), cujo espaço foi efetivamente comprado, pelo valor de um milhão de reais.
133
o mesmo espaço físico, quer por almejar a concretização de seus objetivos mediante o efetivo
entretenimento e lazer. Poucos são os ambientes expressivos que contam com a aglomeração
apêndice F) e, mesmo estes se caracterizam mais pela gastronomia do que como espaços para
divertimento com bares e casas noturnas dançantes. Com efeito, a revitalização de Jaraguá,
SETURMA (que dividia o mesmo sobrado onde se instalou a UEM) para a promoção dessas
SETURMA com apoios diversos, que marcam a presença de Jaraguá em eventos nacionais e
134
“Venha descobrir que Maceió é muito mais que praia” e “Maceió é bom demais”, que exibem
as belezas naturais da cidade e culturais em Jaraguá, como retrata um fragmento: “Mas não é
só isso! A cidade que durante o dia esbanja beleza natural, à noite muda de cenário e abre
espaço para o agito e a badalação da vida noturna”. Em geral, esse material exibe, aliado às
Bairro que retoma a vanguarda de sua história e propõe um novo porto para
os ACONTECIMENTOS de Maceió. Parte do ir e vir das pessoas, Jaraguá
oferece agora uma Estação permanente para seu PRAZER e
DIVERTIMENTO. O antigo que se renova com um novo jeito de viver e
morar. Ponto de chegada e saída, uma atração para TURISTAS que querem
conhecer e se deixar atrair por Alagoas e Maceió (MACEIÓ, letras garrafais
do próprio documento, s/d, p.5).
não teve uma participação ativa na condução do projeto de revitalização do bairro, nem
nesta época, a articulação entre a Secretaria de Cultura e a SETURMA revela-se tênue e fraca,
com a realização de eventos e shows públicos, o bairro se torna o novo ponto de encontro da
visitantes de Maceió. Não por acaso, Jaraguá alcança, neste período, o centro dos debates e
revitalização torna-se alvo simultâneo de elogios e críticas entre as várias facções e partidos
políticos.
bairro para o orgulho e auto-estima maceioense, bem como para a promoção do turismo e do
(descrita anteriormente) foi atestada pessoalmente pela prefeita Kátia Born, que mergulhou
em suas águas às vésperas das eleições. É a oposição, contudo, quem confere o contra-
aparentemente se sobrepuseram às críticas e a população escolhe mais uma vez Kátia Born
como chefe do executivo de Maceió, a qual permanece na Prefeitura Municipal por mais um
mandato (2001-2004).
No início da segunda gestão da prefeita Kátia Born, Jaraguá apresenta uma imagem de
público no local despontam como principais aliados dos empresários, que passam a cobrar
altos valores por serviços/produtos ofertados. Uma das diretoras da Secretaria de Turismo
(E04) discorre sobre o assunto: “[...] era uma grande reclamação da população, do público,
dos visitantes e da população local, porque se tornou um lugar muito caro, a cerveja era muito
mais cara do que em qualquer outro lugar, o tira[-gosto], o petisco também [...]”.
136
“[...] Houve uma valorização enorme do patrimônio imobiliário, [...] foi uma valorização
por um inquirido:
Contudo, a citação acima se soma à mudança no perfil do uso do solo de Jaraguá antes da
1991 e 2000, conforme relatados no item 4.1.1. Nesta oportunidade, demonstrou-se um suave
setor de serviços.
Como o último perfil de uso do solo do bairro foi traçado em 2001 e o último censo do
IBGE é de 2000, essas mudanças apresentam-se sutis muito provavelmente porque os efeitos
decorre da venda/locação pelos proprietários dos imóveis às novas atividades que vinham se
instalando no bairro, com fins de ampliar seus rendimentos. Com efeito, tem-se um
O tempo de glória em Jaraguá, entretanto, foi fugaz. Ainda durante a fase áurea do
uma série de reivindicações por parte dos segundos, sintetizadas no quadro 7 (4).
até dificuldades de maior amplitude. É possível afirmar que algumas destas solicitações
tiveram soluções imediatas, outras foram avaliadas, ao longo das atas de reunião, com
alcançaram maior ênfase por parte dos entrevistados. É sobre estas que serão realizadas
01. Realização de eventos: os investidores desejam que a Prefeitura promova mais eventos para atrair o público e preencher o
bairro com atividades, inclusive em ruas paralelas e transversais à Sá e Albuquerque, mais desertas.
02. Propaganda: reivindicação de ampla divulgação do bairro e também dos empreendimentos ali instalados.
03. Policiamento: a segurança no bairro é avaliada pelos empresários em atas de forma intercalada: em algumas demonstra-se
que houve melhoras, em outras reivindica-se novas providências. Solicita-se, conjuntamente, o controle de ambulantes
(intensificar fiscalização).
04. Regulamentação/normatização da ocupação de Jaraguá: solicita-se que a Prefeitura Municipal priorize a busca de
estabelecimentos e atividades carentes (âncoras) necessários no bairro.
05. Fechamento das Rua Sá e Albuquerque: reclamação dos empresários quanto ao não cumprimento regular dos horários de
fechamento da citada rua, conforme estabelecido em reunião.
06. Agilização dos processos de incentivos fiscais: refere-se à concessão de isenção fiscal (IPTU, ISS, etc) aos empresários
pelas obras revitalizadoras realizadas no bairro.
07. Passagens de carros pesados: reivindicação quanto ao controle/fiscalização da passagem de carros pesados nas ruas e
praças do bairro.
08. Limpeza: os empresários solicitam providências em relação à limpeza pública do bairro, quanto ao acúmulo de insetos em
espaços abandonados, bem como retirada de entulhos resultante de obras.
09. Rede de esgotos da Rua Sá e Albuquerque: observa-se reclamação do empresariado referente aos problemas com as bocas
de lobo da Rua Sá e Albuquerque.
10. Problemas específicos diversos: empresários solicitam providencias quanto à adequada iluminação das ruas do bairro, ao
efetivo conserto de equipamentos urbanos em geral, ao estabelecimento de horários das reuniões para evitar evasão, etc.
Nota: este quadro foi montado com base nas atas de reunião entre o poder público/empresariado realizadas em datas diversas.
Trata-se da compilação de informações documentais fragmentadas, posto que as atas encontravam-se dispersas em diferentes
instâncias do poder público e não foi possível ter acesso irrestrito. Como o conteúdo desse material apresenta-se em tópicos,
aliou-se também a análise de discurso dos entrevistados, a fim de prover a compreensão mais ampla das reivindicações
pleiteadas.
138
No tocante às duas primeiras, observa-se que ambas decorreram das queixas dos
assessor do gabinete da Prefeitura Municipal (E5) “[...] era um público de sexta e sábado e os
iniciativa privada almejava novos investimentos para a área: realização de shows, eventos e
em televisão, folder, cartaz, outdoor, e outros. O objetivo central era atrair o público para o
apresentaram o projeto ao poder público, pleiteando que este entrasse com o capital. A
campanha, contudo, não foi implementada sob a alegação de ausência de recursos por ambas
as partes, como prossegue o entrevistado E05, “Divulgar o trabalho, é um projeto muito caro.
[...] Se você realmente quer fazer uma mídia boa, [...] não é uma coisa fácil, você tem que
público foi bastante incipiente. Segundo a gerente de planejamento da UEM (E01), houve por
parte dos empresários uma postura passiva, no sentido de aguardar que o poder público
[...] aí chega um momento que tem que ter um parceiro. [...] Eles [os
empresários] queriam só o apoio do poder publico, eles estão esperando que
a prefeitura dê o material pra divulgação [...] Só cobrar do poder publico,
ele [o poder público] já investiu, agora é fazer a sua parte.
contundentes quanto ao policiamento do bairro (item três do quadro 7 (4) ). Os furtos e roubos
eram freqüentemente associados à Vila dos Pescadores, conforme relatos dos empresários:
139
O poder público, por sua vez, confirma o aumento dos problemas de segurança,
entretanto, alega que este quadro não é exclusivo do bairro de Jaraguá, mas da cidade de
O pior é o seguinte o Jaraguá virou uma vitrine política [...] Podia acontecer
qualquer tipo de assalto, roubo de carro, em qualquer parte de Maceió, se
acontecesse em Jaraguá, era um caos (ex-secretária de turismo do município
- E20).
interpretação do discurso dos representantes da Vila dos Pescadores permite inferir que os
mesmos reconhecem a criminalidade na favela de Jaraguá, mas não confere a ela a causa
exclusiva da marginalidade no bairro. Há, por parte destes, uma defesa veemente dos
sido construído mais tardiamente (conforme descrito no momento 2) chegou a figurar entre as
O estacionamento também foi outro elefante branco que foi feito no Jaraguá
que a gente achou que fosse dar certo. [...] Eu digo elefante branco pelo fato
de a gente não poder utilizar, porque os marginais roubam os cabos de
eletricidade, o estacionamento fica todo escuro. Aí não tem ninguém pra
deixar o carro no breu, naquela escuridão toda.
O referido estacionamento se situa muito próximo à Vila dos Pescadores (ver mapa 04,
apêndice F). Os moradores desta favela, embora neguem ligação com os problemas de
estacionamento, sugerindo que o mesmo é amplo demais e pouco utilizado. De acordo com o
encurtar o espaço para pressionar a saída dos pescadores. Sua área seria melhor aproveitada,
Pescadores:
[...] acho que eles já fizeram isso já para jogar o pessoal fora, porque eu não
estou vendo utilidade nenhuma naquele estacionamento, grande demais e
que você vê todo dia poucos carros estacionando [...] Do meu ponto de
vista, eles já fizeram aquilo ali mesmo, já pra dizer quando quiser revitalizar
aquilo que botou em projeto: ‘ah não vai dar não que não tem espaço’. Quer
dizer, e que houve, claro, união entre empresários.
É verdade que os problemas de segurança no bairro não podem ser ignorados, não é
menos verdade que colocá-los como fator nuclear do declínio e falência dos bares,
141
conveniente para a iniciativa privada. A cidade de Maceió não se encontra entre as capitais
criminalidade nas capitais brasileiras no período de 1999-2001 (ver anexo D), Maceió
revela-se como a capital do NE de menores taxas nos três anos consecutivos da pesquisa. O
mesmo ocorre em relação à quantidade de roubos de veículos, exceto no ano de 1999, quando
a cidade apresentou índices mais altos que Fortaleza e João Pessoa. No tocante aos demais
roubos, Maceió só possui taxa mais elevada no período em relação a Fortaleza. A cidade
apresenta a menor taxa de lesão corporal seguida de morte em 1999, sendo que em 2001
criminalidade e que aferir a falência dos investidores do bairro a esse fator é ocultar diversos
possui outros bairros tipicamente conhecidos pela violência, cujos índices de ocorrências são,
provavelmente, maiores. Além disso, os próprios empresários sugerem, que, a longo prazo,
Apesar das considerações acima, não se pode negar que os problemas relacionados à
resultaram numa difícil convivência entre uma parcela de empresários (em especial os
entre estes dois atores, responde de forma contundente: “Uma guerra! Eu vejo uma guerra,
elaboração do projeto da Vila dos Pescadores, previa o deslocamento de parte dos moradores
desta comunidade (os que não trabalhavam diretamente na pesca) para outras regiões da
cidade. Entretanto, apenas tentativas e ações paulatinas de retirada dos moradores, ao longo
dos anos, foram implementadas pelo poder público. Os destinos, segundo a comunidade dos
pescadores, eram o Tabuleiro dos Martins, Clima Bom e Benedito Bentes, bairros distantes de
Jaraguá e de menor poder aquisitivo de Maceió (ver mapa 02, apêndice F).
Este relato deixa claro que o propósito da Prefeitura Municipal de Maceió era realmente
reduzir a quantidade de moradores das comunidades carentes do bairro de Jaraguá, com fins
143
entrevistado prossegue afirmando que foi, inclusive, estudada uma possibilidade de retirar
[...] tem aquela proposta definida, mas tem uma proposta auxiliar13, que
seria realmente tirar todo mundo e jogar os pescadores ali para beira da
lagoa dentro de um conjunto residencial e tal, que é muito difícil
porque existe uma distinção do cara que pesca na lagoa, do cara que
pesca em alto mar, não dá pra você conciliar isso, mas é uma coisa que não
foi realmente realizada e realmente esse conflito é muito forte [...] Na
minha opinião, o primeiro passo que nunca pôde acontecer já que o
estacionamento está pronto, é realmente tirar... Ou fazer o projeto acontecer
da vila dos pescadores, fazer um cadastro apertado, só pescador mesmo,
verificar se o cara é pescador (ex-secretário executivo da UEM - E14).
na Vila dos Pescadores, das que saíram e nem tampouco das que retornaram. Contudo, de
comunidade, um grande agravante nesse processo é que muitas pessoas que viviam direta ou
indiretamente da pesca também foram retiradas, isto porque nem todos possuem documentos
oficiais como pescador, que serviu de base para as ações de re-assentamento do pessoal por
Em conseqüência, muitos dos que foram expulsos não tiveram como desenvolver outra
de Moradores da Vila dos Pescadores (E07): “[...] lá não tem de que eles viverem, você vê
que um peixe fora d’água morre”. Além disso, os entrevistados afirmam que as condições dos
locais de destino são péssimas: “[...] ali é uma fábrica de marginal, ali não tem como o
pescador viver” (representante de uma das associações da Vila dos Pescadores – E08). Ainda
de acordo com o inquirido, as ações por parte do poder público são desumanas:
13
A pesquisadora não teve acesso a essa proposta. Aparentemente tratou-se de uma cogitação entre os membros
da cúpula da administração municipal, que não foi implementada. O mais provável é que tal proposta não tenha
sido divulgada oficialmente, já que este entrevistado foi o único a discorrer sobre o fato.
144
televisão, pertences de casa, ela perdeu tudo. [...] Aqui é como se fosse uma
aldeia, nós nascemos e crescemos aqui, então, nós temos um direito nosso,
só que eles não querem saber.
próprios pescadores tinham interesse na retirada das pessoas que não viviam da pesca,
havendo inclusive, na época, algumas denúncias por parte dos moradores da própria Vila.
Contudo, talvez pela própria forma como as ações de retiradas foram realizadas pelo
habitantes da favela parecem ter desenvolvido um senso de união em torno da causa bastante
Ninguém sai daqui. Ninguém sai. Nós estamos todos unidos: é um por todos
e todos por um. A gente só sai daqui no caixão. Todos aqui! Nós estamos
todos combinados, porque eu mesmo criei dez filhos sem pai aqui dentro,
meus filhos não usam drogas, meus filhos não roubam, meus filhos são
educados.
protestos, quando das novas tentativas de retirada da população local, como afirma um
representante desta organização (E08): “[...] fizemos um piquete, interditamos essa passagem
de carro aí [Rua Cícero Toledo], tocamos fogo em pneus. Foi uma revolta grande”. Ainda
Só que nós ficamos fortes, perdemos o medo, porque nós tínhamos medo,
perdemos esse medo e fomos para o Ministério Público. Botamos a boca no
trombone mesmo, fomos para rádios, TV. E aí eles acalmaram mais, mas
não está muito longe de acontecer de novo não. Daqui a alguns anos pode
acontecer a mesma coisa. É por isso que estamos fazendo uma associação
aqui [o entrevistado se refere a reestruturar a associação já existente] e
juntando o povo pra que nós fiquemos fortes.
sobre a mesma em tom de ironia: “[a associação funciona] há oito anos, agora é só no papel
145
como esse projeto no Jaraguá [o projeto da Vila dos Pescadores]”. O medo de uma nova ação
de despejo por parte do poder público está presente não só no discurso dos líderes da
comunidade, como nas atas de reunião da associação, quando estes invocam a participação
dos demais: “[...] é importante que nós nos organizemos para impedir qualquer projeto de
remoção da comunidade deste local para outro, por parte do poder público porque é aqui que
conseguimos o nosso pão de cada dia” (ata de assembléia da Associação da Vila dos
A beleza da recuperação apenas do ‘Jaraguá dos ricos’ soa quase que como uma
mesmos:
A revitalização de Jaraguá foi boa para os ricos, mas para os pobres não foi
[...], porque isso é uma vergonha. Jaraguá aí bonito com a favela aqui
dentro. Isso aqui é o centro [leia-se núcleo formador] de Maceió. Então, é
uma vergonha. Eu achava que a prefeita devia ter olhado a Vila dos
Pescadores para poder ela fazer o bairro tão bonito que nem ela fez. Só
virou em discoteca, restaurante [...] (presidente de uma das associações da
Vila dos Pescadores – E08).
146
68% 50%
17% 17%
8% 8%
14%
9% 9%
Figura 4 (4) - Atores menos beneficiados Figura 5 (4) - Atores mais beneficiados
Fonte: elaboração própria, com base nas entrevistas. Fonte: elaboração própria, com base nas entrevistas.
beneficiados com a revitalização de Jaraguá, conforme figura 4 (4). A revolta dos moradores
da favela aparenta se acentuar no que se poderia interpretar como uma postura demagoga por
dos Pescadores:
[...] época de política aí eles [os candidatos] vêm aqui pegar nas nossas
mãos, nos abraça, mas depois já era, esquece. Depois eles fazem um muro,
fecha tudo, tem direito a mais nada. [...] No início da campanha dela [o
entrevistado se refere à prefeita Kátia Born], ela veio aqui sentou com a
gente, comeu com a gente [...] e depois ela fechou os olhos, começou a
remover todo mundo. [...] Na reeleição, ela teve aqui sentou com a gente,
sentou na nossa mesinha simples, comeu com a gente no pratinho de
plástico. [...] A gente deveria ter expulsado ela na época, mas não fizemos
isso. Como pobres, como humildes, nós suportamos todas as coisas dela. Só
que depois chegou o momento de não aceitar nem ela, nem mais ninguém.
(representante da Associação de Moradores da Vila dos Pescadores – E08)
local. Nesta época, a UEM, outrora sediada no próprio bairro, já havia se transferido para o
centro de Maceió. Os empresários, por sua vez, alegavam abandono por parte do poder
público e ausência de uma unidade responsável por concentrar ações de cunho gerencial e
ilustram o fato:
Turismo como gestora oficial de Jaraguá. O objetivo era delegar à SETURMA determinadas
ações operacionais do bairro bem como conferir à Secretaria o papel de coordenadora dos
órgãos municipais e estaduais, essenciais para o adequado funcionamento dos novos usos
artísticos e culturais do bairro e de receber os navios turísticos, passou também a ativar órgãos
reconhecimento por parte do poder público do maciço investimento na parte física de Jaraguá:
“[...] o projeto de revitalização de Jaraguá concentrou-se em seu primeiro momento nas obras
que consiste a ações de gestão e marketing”, como assinala release da própria Secretaria de
Turismo do Município (MACEIÓ, ca. 2003). Com efeito, a SETURMA, agora responsável
entretenimento’, que, entre outros, tem por objetivos ampliar a freqüência e a diversificação
acolher o maior número de eventos possíveis para o bairro a fim de movimentar a cena
cultural maceioense centrada no bairro de Jaraguá [...]” (MACEIÓ, ca. 2003). O ‘Jaraguá:
integrada, já que funcionaria como um elo articulador entre as diversas instituições e órgãos
consultoria contratada pelo poder público, a Trade Consultoria e Marketing, que compõe a
‘Agenda Jaraguá 2003’. Há, neste momento, um re-planejamento da revitalização por parte do
poder público, mais uma vez centrado nas alianças com o empresariado local:
do espaço, entre elas, cita-se: ‘cinema na praça’, com exibições de filmes de longa e curta-
metragem; ‘Feira do Porto’, uma feira de variedades (de colecionadores, antiquários, etc) com
xadrez, dama, tênis de mesa, etc; ‘Você é o show’, evento semanal em que um espaço com
som e palco era cedido pelo poder público para que os artistas locais apresentassem suas
neste período (tanto promovida pelo poder público como, internamente, pelos bares e
comemorações em datas festivas (carnaval, São João, Natal, aniversário da cidade, etc)
palestras e outros, durante variados dias da semana em largos, museus, praças e ruas do bairro
Tentando dinamizar o bairro, a SETURMA, utiliza o slogan “Programe sua vida para
o novo Jaraguá” em material publicitário, discorrendo sobre as novas atividades que seriam
promovidas: “[...] um novo Jaraguá estará de braços abertos para você. Cultura,
histórico de Maceió como você nunca viu”. Em release, o orgulho cívico também é enfocado:
diversos atores, sendo alguns em caráter mais freqüente e outros com ações mais tênues,
ações contínuas, de caráter mais sólido. Entre os principais aliados, cita-se: Associação
Comercial, Banco do Nordeste, Museu Théo Brandão, Sebrae, Fundação Pierre Chalita,
inclusive uma específica para marketing, turismo e investimento. Não houve uma articulação
UEM (E25) “[...] a SETURMA foi designada [gestora oficial do bairro], com isso, ela
função. Quando questionado se as ações de marketing eram implementadas por esta gerência,
a resposta foi enfática: “Não!” (gerente de marketing e turismo da UEM - E25). Esse quadro
não era exclusividade da citada gerência, outras áreas da UEM, que chegaram a desempenhar
Um dos meios para que todo esse funcionamento entre secretarias pudesse
ter uma maior abrangência é que faltou esse elo, esse entrosamento, essa
troca de idéias, essa cooperação mútua. Todo mundo trabalhou e trabalhou
muito, mas isoladamente. Então, é preciso que se pense nisso futuramente,
porque quando se junta, quando há realmente uma harmonia, a coisa tende a
render muito mais (presidente da Fundação de Ação Cultural – E22).
Apesar das ações implementadas pela SETURMA, a satisfação dos empresários, agora
reuniões entre o poder público e a iniciativa privada são consideradas ineficazes por ambas as
[...] o que acontecia ali é que alguns empresários se reuniam para tentar
melhorar a nossa situação no bairro. Então, alguns donos de bares e
restaurantes tinham reuniões semanais com o pessoal da SETURMA. A
gente estava sempre exigindo, solicitando algumas coisas, tentando
viabilizar algumas coisas para que a gente conseguisse levantar novamente
o Jaraguá, que o Jaraguá voltasse a ser o que era. Mas era muito difícil. A
gente, apesar de ter essas reuniões semanais com o pessoal da SETURMA,
151
não conseguia sair da estaca zero. A gente queria fazer as coisas e não
conseguia, por mais que a gente tentasse e que mostrasse, muitas vezes, o
foco dos problemas, mas parece que o pessoal da SETURMA também
estava de mãos atadas, não sei porquê. [...] Tanto que chegou uma hora que
nós desistimos. Nós éramos convocados para reunião e ninguém ia mais.
Falava: ‘eu vou para reunião para fazer o que? Pra ouvir ela falar, jogar um
monte de asneira no ouvido da gente e o que a gente quer fazer nem ser
analisado?’ Então, esses motivos que foram se acumulando, fizeram com
que a gente passasse a ter a idéia de estar saindo de Jaraguá (proprietário de
um restaurante - E09).
[...] o que eu sentia é que esses membros participavam das reuniões mais
para cobrar. Cobrar assim, porque eles estão falindo, estão fechando, ou não
estão dando certo, é porque o poder público não faz nada. Agora a minha
opinião, é que quem não faz é ele, porque oportunidade foi dada [...] Agora
se você quer sobreviver, tem que fazer alguma coisa, você é quem tem que
fazer. Então não deve só culpar: ‘eu não sobrevivo, porque o poder público
não faz isso’, esperar que o governo faça alguma coisa. Eu acho que não é
por aí. Então, assim, havia isso sim em reunião, essa cobrança, mas eu
sempre coloquei como uma postura errada. Eles estão há tantos anos ali e
reclamando que estão na mesma coisa e o que é que eles fizeram para poder
mudar? Minha pergunta sempre era essa. E você nesses anos todinhos, o
que é que você fez para mudar, para reverter essa situação? Quer dizer,
durante esses anos todos continua reclamando? Se você não reverter vai
continuar a mesma coisa. Então, acho assim: tinha muitas queixas nessas
reuniões sim, mas sempre cobrando do poder público alguma coisa, não que
eles pudessem trazer uma solução, ‘olha vamos fazer isso’ (gerente de
marketing e turismo da UEM - E25).
De fato, tudo leva a crer que não foi apenas a Prefeitura de Maceió que deixou a
funcionamento dos bares, restaurantes e danceterias abertos. Os altos preços cobrados pelo
empresariado, por exemplo, criavam uma imagem negativa para este complexo turístico,
cultural e de lazer.
bairro. O entrevistado (E21) é um dos poucos que se arrisca: “Na época de picos eu cheguei a
tirar na faixa de oito mil, nove mil reais por dia”. Todos, contudo, relatam diferenças
substanciais no lucro entre essa fase do bairro e o momento atual ou quando optaram por
Esse fato se soma à falta de planejamento, por parte dos investidores de Jaraguá, da
qual fala o inquirido E13 no segundo momento da revitalização delineado neste trabalho. É
muito comum nos discursos dos entrevistados o relato de uma ausência de estudo orientado de
oferta versus demanda, com fins de averiguar se havia clientela suficiente para tantos
eram bares e boates bastante similares entre si, com rara diversificação temática e/ou oferta
[...] Lá [em Jaraguá] você não tinha nem um bar que tivesse um diferencial
gastronômico. Se você colocasse uma venda nos seus olhos, fosse passando
de bar em bar, com exceção de um ou dois, mas de modo geral [você teria a
mesma coisa] [...], não tinha nada diferente em Jaraguá [...] (ex-secretária
de turismo do município – E20).
[...] Quando foi montado aqui o Jaraguá, todos os bares começaram a fazer
a mesma coisa. [...] Não houve uma perspectiva de ‘vou fazer alguma coisa
diferente para poder sobressair, para poder sobreviver’, porque quando você
tem diferencial, você sobrevive (gerente de marketing e turismo da UEM –
E25).
enfatizada por muitos entrevistados e inclusive detectada como uma das razões centrais da
apresentou uma opinião divergente no tocante a esse aspecto, como salienta: “[...] tem alguns
lugares no Brasil que tem vários bares e funciona super bem”. Com efeito, procurou-se
sufocado uns aos outros se sustenta na tentativa de trabalhar o espaço urbano de Jaraguá com
entrevistados, que não haveria ocorrido e, que teria decretado, em conseqüência, a morte dos
se, ainda, a falência de investidores de outros ramos do setor turístico-cultural que, ao que
tudo indica, não possuíam tantos concorrentes em Jaraguá, como galerias de arte/antiquário. O
Além disso, se a cidade de Maceió não se caracteriza por ter muitas opções de lazer noturno,
Esse fato sugere a existência de outros problemas mais intrínsecos. Como, na presente
pesquisa, entrevistou-se uma média de 12,5% dos empresários que investiram em Jaraguá, é
possível realizar algumas inferências sobre o perfil dos mesmos e seu estilo de gestão. Muitos
Tal perfil levanta, como corolário, três outras causas possíveis para o insucesso dos
imóveis. Nas palavras de uma empresária de Jaraguá (E19), “[...] os donos dos prédios
pensavam que tinha sido descoberto a galinha dos ovos de ouro, porque os preços são altos
dos alugueis e por isso a maioria [dos estabelecimentos] fecha”. Também segundo uma
melhor a razão da saída de empreendimentos que ali se estabeleceram antes mesmo do início
do processo de revitalização ou num momento inicial deste processo. As outras duas causas
Segundo uma ex-secretária municipal de turismo (E20), houve uma má qualidade dos
serviços ofertados pelos estabelecimentos de Jaraguá, o que pode ser justificado pela baixa
qualificação profissional dos investidores. Nas suas palavras: “bares caros e com atendimento
precário [...]”. Corroborando este raciocínio, nas atas de reuniões entre empresários e poder
(E19):
155
recuperação dos sobrados e não ter se endividado, como os que optaram por tomar
Restaurantes, um empresário (E06) define categoricamente a organização: “[...] era uma coisa
só pra dizer que existia”. Não houve entre os integrantes da Associação de Bares e
raros, como prossegue o inquirido: “[...] se houve foi muito fraco, foi uma coisa que não teve
conotação nenhuma”. Segundo um membro da AMAPAZ (E03), “[...] cada investidor, ele
fazia as coisas individualmente, ele não fazia a coisa coletiva”. Também os próprios
danceterias caracteriza suas relações: “[...] Lá era cada um por si, mesmo porque eram todos
concorrentes, então, cada um fazia o que era melhor para si” (proprietário de uma danceteria -
E06).
Numa mesma linha de orientação, uma proprietária de restaurante (E19) afirma: “[...]
as pessoas que tinham bar, eu sempre digo que eles legislavam muito em causa própria. Eles
intervenção da SETURMA.
principal de Jaraguá, que compõe a quinta reivindicação do quadro 7 (4). De forma geral, os
de danceterias (que possuem suas próprias atrações internas) e outros localizados em ruas
[...] era uma briga constante. A gente queria, pra gente trazer público pro
Jaraguá, o que atrai o turista era sempre o quê? Era um evento, tinha que ter
um evento, uma música na rua, alguma coisa assim. Pra gente colocar uma
música na rua, tinha que fechar a rua, a Sá e Albuquerque, a principal.
Quando a gente conseguia fechar a rua era uma briga, era uma briga
medonha, um queria, o outro não queria, ficava aquela briga de
interesses. (proprietário de um restaurante - E09).
157
argumenta uma ex-secretária de turismo do município: “[...] quase os empresários vão às vias
de fato, de briga, por discordância disso. E no meu entendimento o fato de fechar a rua era
apenas um apêndice na questão do Jaraguá. O que tava por trás da gestão do Jaraguá era
muito maior do que uma rua aberta, fechada”. A discussão foi tamanha que o poder público
realizou uma pesquisa com a população visando julgar o caso, mas discordâncias diversas
poucas realizações de eventos coletivos também geraram polêmica. A questão era que alguns
Calcule que eles fizeram um evento aqui bem grande e botaram o palco de
costas para cá. O palco ficou de costas, uma concha acústica que eles
botaram ali junto da Associação Comercial e, ao invés de colocarem ela de
frente para cá, para a Sá e Albuquerque, colocaram assim inclinado. E nós
ficamos nos fundos [...] Quer dizer, pra gente não adiantava de nada.
em material publicitário, a exemplo do Piano Bar e do Bar da Sogra. Ao que tudo indica, não
158
interesse dos proprietários de bares, restaurantes e similares pela história e cultura local é
reforçado pelas palavras de um membro da coordenação cultural da ACM (E16): “[...] não me
convence que uma pessoa pegue um cartaz de propaganda de um show de uma boate e pregue
tentativa de realização de alianças com outras empresas do setor turístico. Em verdade, houve
turismo do município (E15), “[...] o turismo enquanto ação dirigida, não incluiu ainda Jaraguá
no circuito turístico”.
Esse fato demonstra uma incipiente agregação dos atores organizacionais do setor
inclusive apoiar ações conjuntas de alianças entre uma agência turística de viagem e os
destinos às praias do litoral alagoano, inserindo entre eles, como um gancho de vendas, o
Jaraguá boêmio. À medida que o turista comprasse dois ou três pacotes, ganharia também um
beneficiariam com o aumento do público para o bairro no dia estipulado, contudo, precisariam
159
arcar com o custo da vinda dos ônibus, nomeadamente R$50,0014 por cada. A SETURMA,
por sua vez, disponibilizaria, neste dia específico, uma atividade cultural, como um grupo de
“[...] chegava ônibus aqui com quinze pessoas, com dezoito pessoas. Daqui a pouco teve um
dia que nós tivemos doze ônibus aí, doze vezes [valor cobrado]. O número de pessoas, talvez
desse pra encher três ônibus. Inviabilizou...” (empresário e membro da cúpula da Associação
de Bares e Restaurantes – E02). Também foi argumentado que estes turistas permaneciam
pouco tempo em Jaraguá e que olhavam as edificações, mas não ingressavam nos bares,
este raciocínio:
Em síntese, pode-se afirmar que a dependência das ações do poder público, por parte
(E06) sobre como ele avalia a participação da iniciativa privada e do poder público na
Eu acho que a parte da iniciativa privada já era estar fazendo com que
acontecesse o Jaraguá [...] E a parte da Prefeitura era botar todo final de
semana, ou dia de semana, projetos culturais, artistas, não só alagoanos,
mas artistas nacionais... Tentando conduzir a sociedade ao Jaraguá. [...]
Acreditamos numa coisa que estava para acontecer, a Prefeitura era a
14
Houve divergência entre os entrevistados quanto ao valor cobrado pela a vinda dos ônibus. Segundo um
empresário e membro da cúpula da associação de bares e restaurantes (E02), o valor pago pelos empresários
correspondia a R$70,00 por ônibus.
160
do bairro outrora abandonado “em casas que viessem a atender à sociedade”, mediante
investimento dos empresários em seus próprios imóveis. É interessante observar que há por
parte deste e outros empresários inquiridos, a concepção de que cabe à Prefeitura de Maceió
para com o sucesso do projeto de revitalização se limitasse ao simples fato de abrirem bares,
semanais com artistas alagoanos, via o projeto ‘Jaraguá: porto cultural e de entretenimento’,
estes aparentemente não satisfaziam a iniciativa privada. Como afirma o entrevistado, faz-se
necessário promover eventos com artistas nacionais, capazes de atrair efetivamente o público.
dinamizar o bairro:
menos fugazes, de caráter permanente. O mesmo entrevistado prossegue afirmando que não
161
foi incentivado em Jaraguá a habitação, de modo a gerar um efetivo re-povoamento das áreas
abandonadas do espaço.
argumento:
empresário que se mudou de Jaraguá para o bairro de Ponta Verde (E19): “[...] tantos foram
os problemas que no fim eu falei: ‘se eu ficar aqui em Jaraguá, eu não agüento mais não, eu
quebro’”. Nas entrevistas realizadas nesta pesquisa, foram contactados não só os empresários
que permaneceram no espaço como os que desistiram de Jaraguá. O que se percebeu é que
tanto uns, quanto outros conferem a culpa do insucesso do projeto de revitalização ao descaso
presente momento, que a presente pesquisa captou através do discurso dos entrevistados, um
162
efetivo funcionamento das atividades almejadas ao bairro, nem na fase áurea e nem na
ca. 2005, p. 10-11). As expectativas atuais, contudo, são desanimadoras: “no início [da
revitalização], a oferta de empregos foi bastante [numerosa]. Muito trabalho, não só na área
de engenharia, lembro que havia vários garçons. Essa avaliação é do antes [do passado].
Depois, teve uma redução, com certeza” (gerente de planejamento da UEM – E01).
Além de reduzidos, tudo indica que estes empregos nunca beneficiaram diretamente a
Para que isso acontecesse, seria necessário haver um treinamento para esse
pessoal, porque esse é um pessoal bruto. Não é um pessoal que tem
facilidade de acesso, de conversar com o cliente, são pescadores [...] Eu
não recordo de ninguém que era daquele miolo ali [da comunidade dos
pescadores], que tivesse trabalhando nas casas [nos bares, restaurantes
e danceterias].
Na favela dos pescadores, o quadro é desolador (ver fotos no apêndice B). Além de
da fábrica de gelo junto ao BNB, o que vem causando descontentamentos e atritos entre seus
membros. Estes se julgam prejudicados com os preços, acima do valor de mercado, cobrados
pela fábrica, outrora erguida sob o intuito de facilitar a atividade pesqueira. Alguns
163
contemporaneamente estimada entre 250 e 300 pessoas/mês, o que reflete os atuais números
minguados do público de Jaraguá, que foi potencialmente previsto como capaz de mobilizar a
sociedade maceioense e seus turistas. Esse fato se soma à inferência de uma empresária do
local (E19) sobre um dos dias da semana que já concentrou a noite de Jaraguá: “[...] o sábado
aqui é totalmente morto. Não passa uma alma nem voando, quanto mais andando” e também
de um empresário que saiu do bairro (E09): “[...] as casas [os bares, restaurantes e
refletem a política de investimento da cidade neste setor. Fica evidente nesses indicadores,
contudo, que, mesmo com a revitalização de seu bairro histórico, “[...] Maceió continuou
vendendo lá fora a imagem de paraíso das águas” (membro da coordenação cultural da ACM -
E16). O fator decisório da visita dos turistas nos últimos três anos se pautou,
ínfimas taxas (sempre inferior a 1%) neste mesmo período (ver tabela 05 do anexo E). Por
outro lado, a taxa de permanência do turista na cidade, a taxa de ocupação e o fluxo hoteleiro
convenções encontram-se em ritmo acelerado, mas o centro náutico (marina) não foi
torno de 40%.
Também neste ano, ocorreram as eleições municipais e, mais uma vez, o projeto
Jaraguá se insere nos debates político-eleitorais. Ironicamente, a mesma cena da prefeita Kátia
Born mergulhando nas águas de Salgadinho é apresentada, agora pela oposição, atestando a
Jaraguá não se consolidam e são enfatizados na mídia, contribuindo para minorar as intenções
de votos ao candidato apoiado pela administração da então prefeita. Desta vez, um segmento
da oposição sai vitorioso e assume a Prefeitura de Maceió. Esse fato, sob a ótica dos
de revitalização de Jaraguá.
implementadas nos três momentos descritos para esta intervenção urbana. O quadro 8 (4)
dados até então realizada. É importante ressaltar que esses números visam tão somente prover
um retrato simplificado da revitalização do bairro, exibindo as metas que, sob a ótica dos
programas previstos.
166
O tratamento dos dados, através de estatística descritiva, permite que o leitor visualize
as variações das respostas dos inquiridos, tais como os julgamentos mais freqüentes, o grau de
aproximação/distanciamento dos mesmos, entre outros (ver apêndice C). Não se objetiva
qualitativas apuradas, que dão sustentação e consistência a este trabalho. Com efeito, ao longo
do tópico 4.2, serão realizados comentários analíticos, incluindo inferências sobre as respostas
dos entrevistados em relação aos aspectos mais relevantes observados nesta etapa específica
da coleta de dados.
público não só porque estes compuseram a maior parte da população amostral como também
pelo fato de que os representantes da Prefeitura Municipal de Maceió tiveram amplo contato
com a realidade em análise, o que suscitou um maior número de respostas por parte destes. De
modo geral, os programas foram avaliados pelo poder público com pontuações mais altas do
que as aferidas pela iniciativa privada e pelas organizações civis, o que, de certa forma,
Outro aspecto relevante é que, como uma espécie de protesto, boa parte dos
pontuar os programas em que, sob a ótica destes, houve efetivo investimento do poder público
ou exprimiam seu desejo de aferir baixas conceituações, solicitando reiteradas vezes a nota
zero (não enquadrada entre as possíveis respostas). Esse fato se refletiu na avaliação de alguns
programas. O programa de nº6 foi afetado pela insatisfação da favela dos pescadores, já que
não houve a reestruturação da infra-estrutura urbana da Vila, que estava prevista no programa
de nº3 (nem sempre foi possível evitar uma correlação entre esses dois programas). A
167
Reginaldo/Salgadinho foi motivo de anedota por muitos entrevistados e, de defesa, por parte
de uma minoria, o que se explica em função da repercussão que o mesmo teve na mídia. As
atribuídas, sobretudo, por parte do poder público e das organizações civis. Os poucos
iniciativa privada.
dos pescadores (ambos definidos no plano como meta de prioridade 1) aliados à criação de
‘Seu bairro sua casa’ se configuram entre as metas que receberam menores pontuações. Por
outro lado, as ações que obtiveram maior pontuação pelos inquirido foram: inventário,
sistema de energia elétrica/telefonia, sendo que as duas primeiras estavam definidas como
avançados de fácil visualização e consultas digitais (MACEIÓ, ca. 2001). Nestes mapas,
públicos e a revitalização de praças, por sua vez, revelaram-se entre as poucas metas que não
elétrica/telefonia chamou atenção por ter figurado entre as ações mais bem avaliadas por parte
dos empresários.
delineamento de suas inter-relações, arranjos, fonte e bases de poder, bem como verificação
no item 4.1. Este último, em função de abarcar uma ampla quantidade de informações, foi
brevemente sintetizado no apêndice D, com fins de arrematar a apresentação dos dados, bem
processo de revitalização de Jaraguá, abarcando as três fases descritas no item 4.1.3, e foi
metodologia desta dissertação, chegou-se à configuração apresentada no quadro 9 (4), que não
SETURMA* Possui, além de uma área administrativa, duas direções, sendo uma
operacional (responsável pela realização de eventos e shows) e outra de
desenvolvimento (que realiza ações de planejamento, de marketing, etc).
Intitulada gestora oficial do bairro de Jaraguá em 2002, implementou, entre
outras atividades, o projeto ‘Jaraguá: porto cultural e de entretenimento’,
coordenou reuniões com os empresários, ativou órgãos de segurança (polícia
militar e guarda municipal), determinou o controle do trânsito
(estacionamento, sinalização, fechamento/abertura de ruas, etc).
FUNDAÇÃO DE AÇÃO Funciona como uma secretaria municipal de cultura. Forneceu apoios às
CULTURAL atividades e eventos culturais promovidos no bairro em caráter esporádico.
Não houve um planejamento conjunto ou divisão responsabilidade de
programas específicos com os órgãos/secretarias envolvidas na gestão de
Jaraguá.
ASS. DE BARES E Fundada em 2002, tem por objetivo oficial atuar como agente de manutenção
RESTAURANTES* e desenvolvimento de Jaraguá em conjunto com o poder público. Trata-se de
uma organização que reuniu vários proprietários de bares, restaurantes e
danceterias de Jaraguá (ver relação no apêndice E). É formalmente
estabelecida (com estatuto) e composta por presidente, vice, tesoureiro,
relações públicas, conselho fiscal e administrativo. Coordenou várias
reuniões com os proprietários de bares e restaurantes de Jaraguá, contudo
seus associados nunca estabeleceram uma taxa para contribuir com despesas
ou necessidades coletivas. Atualmente, encontra-se esvaziada/estagnada de
função e praticamente não dispõe de associados. Embora os bares,
restaurantes e danceterias, em geral, sejam também integrantes da ACM, esta
não chegou a desempenhar o papel de representante dos mesmos, tendo
apenas cedido o espaço em que ocorriam a reunião destes empresários com o
poder público.
(continuação)
171
AMAPAZ* Esta organização é conhecida por Associação dos Amigos da Av. da Paz e foi
fundada em 1990 sob liderança do escritor Carlito Lima, popularmente
chamado de Duque de Jaraguá. Aparentemente, o núcleo da Av. da Paz (e
entorno) concentra os residentes da classe mais favorecida de Jaraguá. A
associação se estrutura em função de seu líder-fundador, um intelectual e
historiador da sociedade maceioense, cujas ações objetivam, oficialmente,
defender/preservar o patrimônio natural e construído de Jaraguá,
nomeadamente no tocante ao saneamento do Complexo
Reginaldo/Salgadinho.
ASS. MORADORES DA VILA Fundada legalmente em 1996, esta organização se situa na Vila dos
DOS PESCADORES* Pescadores e representa a classe menos favorecida do bairro de Jaraguá. É
intitulada em estatuto como ‘Associação de Moradores e Amigos de Jaraguá’
e tem como objetivo oficial resolver as necessidades do bairro de Jaraguá, a
partir da união de seus moradores. A associação, entidade sem fins lucrativos,
apresenta-se praticamente desativada, funcionado em caráter esporádico, sem
reuniões ou contribuições regulares. Possui presidente, vice, tesoureiro,
secretário e conselho fiscal. Desempenha funções/finalidades de intermediar e
resolver problemas/atividades específicos da convivência de seus membros,
bem como “lutar contra discriminação e injustiça social praticada contra os
moradores do bairro de Jaraguá” (ASSOCIAÇÃO DE MORADORES E
AMIGOS DE JARAGUÁ, 1996, p.1). Na revitalização do bairro, a
associação representa os interesses da comunidade na reurbanização da Vila
prevista no plano de desenvolvimento elaborado para o bairro, tendo atuado,
sobretudo, no fortalecimento da comunidade quando das tentativas de
expulsão dos habitantes locais por parte do poder público. Durante a fase de
coleta de dados, passava um processo de reestruturação com novas eleições
previstas.
ASS. TRABALHADORES DA Fundada em novembro de 1995, tem por objetivo oficial organizar a
PESCA* comunidade dos pescadores para facilitar a atividade pesqueira, melhorando
suas condições de trabalho. Trata-se de uma organização formalmente
estabelecida com estatuto e sem fins lucrativos. É administrada pelo
presidente, 1ª secretária e 2ª secretária. Na fase de coleta de dados, a
associação contava apenas com cerca de 22 associados legalizados, dos quais
a grande maioria não é contribuinte ativo. Representa os interesses dos
trabalhadores da pesca no processo de revitalização do bairro,
nomeadamente, no tocante às ações previstas no plano com fins de aprimorar
o trabalho da pesca, tais como a abertura da fábrica de gelo, que ocorreu em
maio de 1998 e é gerida pela associação até os dias atuais. A organização já
contou com uma líder fortemente reverenciada pelos entrevistados, Creuza
dos Santos (falecida), que exerceu papel de articuladora com o poder público
para a consecução da fábrica de gelo.
(continuação)
172
(conclusão)
Quadro 9 (4) - Atores organizacionais envolvidos na revitalização de Jaraguá
Fonte: elaboração própria.
Legenda: *Atores organizacionais mais representativos na revitalização de Jaraguá, sob a ótica dos inquiridos.
atores, este trabalho concentra a atenção, nomeadamente, na análise das organizações mais
Pescadores), Associação dos Amigos da Av. da Paz e a Prefeitura Municipal de Maceió que
na própria descrição destas seis unidades organizativas, que os objetivos oficiais destes atores
oficialmente, cada um desses atores compõe o retalho de uma colcha, a parte de um todo, a
peça de um quebra-cabeça, que, quando unidas, funcionariam como uma espécie de alavanca
bares e restaurantes, reforçam suas ações voltadas para a recuperação do patrimônio histórico
poder público. As associações das comunidades locais destacam o zelo em relação aos
ambientes naturais e/ou construídos de Jaraguá, bem como a preocupação dos moradores (e
organizações em estudo leva a crer que existem diferenças e também de similaridades entre os
(continua...)
175
enquanto indicadores precisos. Os operativos, que por natureza exigem maior sutileza para
ações implementadas pelos atores, o modo como elas foram priorizadas, as características
observadas entre o discurso e a prática. O confronto entre ambos para cada uma das seis
estudos que destacam o turismo como vetor de desenvolvimento local, disponibilizados pelo
176
BID, demonstram sua forte capacidade de negociação (leia-se transação com a outra parte),
contemporaneidade, ratifica que as pesquisas veiculadas pelo BID, por si, vêm influenciando,
função de outro, isto é, uma relação de poder. Mais do que incentivar a atividade turística
como forma de promover a qualidade de vida aos núcleos receptores, como propõe
oficialmente, o BID dissemina, através de seus estudos, o pressuposto de que este é o caminho
gastos menores do que no setor industrial, além de gerar emprego e renda em números bem
mais elevados. Com efeito, admite-se que convencer as nações sobre esta teoria compõe a
oficiais que realçam e atestam os benefícios proporcionados pela atividade turística. Este fato
sugere uma correlação com a inferência de Perrow (1978), segundo a qual os objetivos
Para Perrow (1978), quando há íntima correlação entre objetivos oficiais e operativos é
porque os segundos tendem a ser um meio de atingir os primeiros, mas como os objetivos
como fins. Ao se retirar os recheios mais abstratos que suavizam o discurso oficial do BID e
turismo), ditando quando, onde e como seus investimentos serão realizados. Infere-se,
disseminada pelo BID determina a opinião de um dos entrevistados que exerceu função
central na fase de planejamento da revitalização de Jaraguá (E14), fazendo com que o mesmo
será analisada mais adiante, como uma inter-relação organizacional, sob o arcabouço teórico
de poder.
florescem sem um vínculo específico com aqueles, como Perrow (1978), aliás, assinala que
freqüentemente tende a ocorrer nas organizações. Pode-se afirmar que a expectativa do lucro
rápido foi a engrenagem motora para a atração dos investidores na área, retratando o objetivo-
exigiram um esforço do poder público em fazer com que a iniciativa privada acreditasse nas
transformaria numa “mina de ouro”, similar ao que vinha ocorrendo nas capitais nordestinas
vizinhas.
178
era baratear os custos e revitalizar os sobrados de forma que estes se tornassem atrativos ao
uns não cooperem com outros, obscurecendo, inclusive, a visualização na literatura de uma
forma específica de luta coletiva. Por outro lado, também atestam a própria
shoppings.
com a cobrança de taxas coletivas impostas a todos os estabelecimentos que desejam aderir ao
núcleo comercial, nos espaços urbanos não há como obrigar qualquer tipo de colaboração
mútua. A própria lógica de mercado prima pela lei da vantagem, em que os atores só tendem a
cooperar se todos forem obrigados a tal, porque ninguém quer agir coletivamente e beneficiar,
em conseqüência, aqueles que por ventura não-cooperam. É por esta razão que Associação de
Bares e Restaurantes aparenta não funcionar, já que “fazer lucro” e “vencer a concorrência”
sempre aquele que não irá contribuir com a organização central, no caso a Associação de
179
da empresária que afirma que o palco de um evento coletivo ficou de costas para seu
eventos coletivos em conjunto com os demais (caso dos estabelecimentos com atrações
internas), e há ainda aqueles que simplesmente pretendem usufruir e tirar vantagens dos
Como ninguém quer arcar com os custos e, implicitamente, ajudar quem não está
contribuindo, o resultado é que nenhum dos empresários se dispõe a agir coletivamente, todos
imaginam que seus interesses são contemplados, ou pelo menos que não saiam prejudicados.
Por exemplo, era senso comum entre os empresários a necessidade de melhorar a segurança
atração de turistas para o bairro através da promoção “Jaraguá boêmio”, custeados pelos
seus próprios negócios e não com a prosperidade do bairro, como atestam oficialmente. O
equívoco, portanto, parece ser o de esperar que a iniciativa privada se organize coletivamente
para promover o bem comum. Pressupõe-se, de forma inócua, que, fomentando associações e
desenvolvimento de Jaraguá. Na prática, como se observa no caso em estudo, isso tende a não
ocorrer. “As empresas falam em seu nome e em nome de seus interesses, e o primeiro deles é
180
não perder” (FREITAS, 1999, p. 320). Por conseguinte, suas ações, enquanto cidadãs, são
Jaraguá não é o primeiro espaço urbano (e nem será o último) em que se concentram
estabelecimentos do mesmo ramo. Mas o que faz com que um pólo/centro urbano de
indissociável do mundo dos negócios e ela permanece. Esses centros conseguem sobressair,
entretanto, através de um outro requisito: a imagem. É sob esse pilar que se sustentam os
mercado e a atividade predatória de uma nata da sociedade maceioense, que tenta fazer de
qualidade e, sobretudo, caros. Eis a imagem negativa criada para o bairro e algumas possíveis
estabelecimentos.
1958). Observou-se que a articulação entre seus membros tende a ocorrer de forma
foi fortemente encontrada. A Associação dos Amigos da Av. da Paz se estrutura em torno de
seu fundador, Carlito Lima, cujas ações lhe conferiram o título simbólico de Duque de
Jaraguá. Uma evidência deste fato ocorre durante a fase de coleta de dados: este líder (e não a
entidade apresenta uma vida de grupo predominantemente passiva, com poucas ações
reivindicatórias (a exemplo das citadas no momento 1), características estas que são mais
comuns da apatia.
maciça por parte dos membros da cúpula desta entidade sobre os demais (característica do
estilo errático). Esses representantes exerceram papel influenciador nas revoltas, protestos e
manifestações implementados pela Vila dos Pescadores. A veemência das palavras de seus
líderes com expressões do tipo “a gente só sai daqui no caixão” reflete a intensidade com que
visualizam a luta (marcada sobretudo pela permanência no bairro de Jaraguá), o que também
No entanto, a atuação cotidiana dessas entidades indica sintonia com estilo apático,
fábrica de gelo). A segregação social da qual Jaraguá (dos ricos e dos miseráveis) é palco
182
encontra repúdio por parte dos moradores, mas não ações de protesto ou articulações efetivas
persistirem no local onde hoje residem. Sobre este último, contudo, houve, aparentemente, um
funcionaram como uma espécie de aprendizado para a comunidade, que taxa esses locais de
“fábrica de marginais” e luta a todo custo, colocando em questão a própria vida, para
permanecer em Jaraguá.
embora pouco comum, não é descartada. No caso das organizações civis supracitadas, não se
visualizou diferenças substanciais entre os objetivos oficiais e operativos, posto que há uma
correspondência entre ambos. O grau de abstração dos primeiros, entretanto, tende a ser maior
que os segundos. Nos objetivos oficiais destas entidades, é comum se encontrar expressões
que evocam a amizade pelo bairro de Jaraguá como um todo (inclusive presente em seus
nomes oficiais). Operacionalmente, o que tende a ocorrer é uma ação particularizada ao locus
pesca, isto é, ela tem objetivo-fim de atrair investimentos ou prover melhorias para o seu
âmbito de atuação e não para o bairro de Jaraguá como um todo. No caso da AMAPAZ,
foram observadas ações implementadas por Carlito Lima em outras regiões de Jaraguá (a
momento 1), entretanto, as lutas coletivas mais intensas dizem respeito à despoluição da Praia
183
interesse da entidade.
A Prefeitura Municipal de Maceió, por fim, apresenta um estilo de luta coletiva, sob a
perspectiva de Sayles (1958), mais condizente com a posição conservadora, caracterizada pela
existência de grupos coesos, que, no curso de suas ações, fecham-se em si mesmos. A análise
divisão de programas.
Corrobora este raciocínio, os fragmentos das atas das reuniões internas da UEM
(apresentados no momento 2), quando se observou que esta unidade, reiteradas vezes, vinha
para responder e apoiar a reestruturação urbana pela qual Jaraguá vinha passando. Problemas
Além disso, com a intitulação da SETURMA como gestora oficial do bairro (descrita
no momento 3), não houve uma perspectiva de somar forças à Unidade Executora Municipal,
até então gestora do programa de revitalização. Esta teve parte de suas funções esvaziadas, o
que resultou inclusive no sentimento, por parte de alguns de seus setores, de estarem sendo
ignorados por aquela. Por outro lado, a Fundação de Ação Cultural, potencialmente envolvida
papel significativo neste processo. Apresentou, isto sim, uma tênue articulação com as demais
esporádicos em eventos.
184
da Prefeitura Municipal, que pode ser traduzido pela tentativa de fomentar, através da
outros aspectos, segundo David Harvey, pela ampliação das vantagens comparativas de
mercado nordestino), ‘criação de uma imagem’ para a cidade (despertando o orgulho cívico) e
oficiais (visualizados através de um discurso híbrido). Optou-se por explicar e detalhar este
contudo, no tópico 4.2.3, quando a revitalização de Jaraguá (no discurso e na prática) será
realizada no presente sub-tópico, constitui o pano de fundo para a compreensão das inter-
(4) e 8 (4). Estas não visam apresentar todos os atores envolvidos na reestruturação urbana do
bairro, mas apenas os mais representativos, em cada uma de suas três fases.
ambos os aspectos são satisfeitos. A ação do setor público e a inserção de novos atores
primeiro e o segundo bem como entre ambos e as comunidades locais quer seja através de
coalizões, quer seja a partir de conflitos. Inevitavelmente, esses conflitos e/ou coalizões geram
exercício do poder.
ênfase recai sobre uma organização focal (a Prefeitura Municipal de Maceió, através de sua
esclarecidas, este estudo se concentra nas relações entre o poder público e as duas últimas
organizações.
Segundo a tipologia de Galbraith (1986), a fonte de poder dos atores que perfilam esta relação
Interpretando esta relação sob a perspectiva simétrica descrita por Lukes (1980),
relatos dos inquiridos vem a fortalecer o pressuposto de uma relação harmoniosa entre o BID
Maceió por sua participação no progresso da cidade, funciona como um dos indicadores de
apresentação dos dados, relatou-se que a fase de planejamento da revitalização é marcada pelo
que o poder público chama de “uma luta intensa”, “uma batalha” com fins de atender aos
ditames do BID não devido a ameaças ou coerções, senão que em virtude das próprias
O município acata todas as imposições do BID, detentor dos recursos financeiros que
pleiteia. Com efeito, muito embora não se evidencie conflitos reacionais entre as partes, estes
despesas com os salários do corpo técnico da UEM, dos estudos de viabilidade sócio-
exigidos pelo BID, ainda que, quando possível, tente lapidá-los para contemplar seus
de Jaraguá. Além disso, percebe-se também a existência de uma outra forma de poder entre as
detrimento do setor industrial (aqui entendidos como um de seus objetivos operativos) são
modo que ele toma, como se dele fossem, os pressupostos disseminados pelo banco.
Isso é o que Steven Lukes chama de poder invisível na qual surge a criação de falsa
consciência ou, segundo Galbraith (1986), uma fonte de poder vinculada ao instrumento
paradigmática, de modo consciente ou não. O próprio ambiente, neste momento, com diversas
Este contexto contribui para que o inquirido citado enxergue a realidade através de
uma lente que toma por certo o discurso em que a atividade turística é compreendida como
uma espécie de solução mágica para as economias moribundas. Cabe ressaltar que aceitar essa
promover a atuação do poder público perante os cidadãos maceioenses. Tem-se, dessa forma
Os contatos relacionais entre a AMAPAZ e a Prefeitura de Maceió, por sua vez, são ad
doc (com pouca padronização) e apresentam caráter ocasional, o que dificulta a visualização
de uma relação específica de poder. Pode-se afirmar, contudo, que a Prefeitura de Maceió
detém uma fonte de poder contextual, como define Krausz (1991). Em nome dos interesses
comuns da sociedade, uma minoria, representada pelo poder público, concentra em suas mãos
a decisão de concretização dos investimentos pleiteados pela Associação dos Amigos da Av.
inexistência de uma articulação contínua da sociedade civil maceioense não confere aos
membros da AMAPAZ uma base/fonte de poder capaz de fazer valer seus interesses.
apaixonadas é a estruturação em torno de seu líder, o duque de Jaraguá Carlito Lima, bem
implementadas pelo poder público no Riacho Maceió não aparentam decorrer da canalização
de forças dos movimentos solitários realizados pela referida organização civil, senão que das
*
Herói romântico, idealista e sonhador da obra D. Quixote de la Mancha, de Cervantes.
189
como a natureza de suas ações é fugaz e esporádica, a relação poder público/AMAPAZ tende
cooperativa, nem conflituosa. Indo mais além, a abordagem assimétrica detecta o conflito
seus objetivos operacionais. Neste caso, as campanhas desenvolvidas pela AMAPAZ nada
mais são do que manifestações reacionais que exteriorizam o conflito latente. Como a praia de
AMBIENTE
TCI
ÍMPAR UEM
AMAPAZ
PRODETUR-NE/BID
ÓRGÃOS/SECRETARIAS
HABITAR-BRASIL/CEF
(HALL, 1984), sendo que, neste momento, a Unidade Executora Municipal encontra-se criada
trabalhadores da pesca.
e com relativa formalização (por leis que regem a preservação do patrimônio histórico, os
através da UEM, detém nesta relação algumas bases de poder: o poder legítimo (decorrente da
nomeação de órgão fiscalizador e gestor que lhe foi conferida no âmbito da recuperação de
empresários, por sua vez, conforme Galbraith (1986), detêm a fonte de poder denominada
Há, neste caso, um confronto entre fontes/bases de poder, no qual ambas as partes
procuram impor seus interesses concretos. Conforme relatado na apresentação dos dados,
da equipe técnica do ETJ e a demora na conclusão das obras. Em síntese, observou-se uma
unidade gestora do programa de recuperação de Jaraguá precisou ser mais flexível para
propósitos iniciais: o de “decorar melhor a roda”, isto é, revitalizar com maior propriedade do
que outras recuperações de centros históricos que serviram de modelo para Jaraguá.
Embora, nesta relação, o poder púbico detenha bases de poder, a relevância destas para
a iniciativa privada assume caráter limitado. No caso do poder de recompensa, por exemplo,
191
observou-se que os incentivos fiscais não despontaram como a causa central da atração dos
referencial teórico, Bourdieu (2000) defende que o alcance do poder não é determinado pela
simples posse de diferentes capitais (ou bases de poder), senão que pelo reconhecimento dos
Esse fenômeno, quando interpretado sob uma ótica funcionalista, demonstra que as
relações entre poder público e iniciativa privada se apresentaram com caráter alternado entre o
decorrentes da paralisação de algumas obras por intervenção da UEM e das discussões entre
espaço. Contudo, para esta abordagem de poder, a relação poder público/iniciativa privada,
processo de revitalização em si não deixa de ocorrer, uma vez que os inconvenientes citados
patrimônio histórico e sugere que mais valia para a Prefeitura Municipal de Maceió acatar as
O indicador mais apurado deste fato é que, embora alguns empresários tenham
no com vistas a ampliar a funcionalidade do espaço, adquirir lucro, atrair clientes e/ou
ostentar riqueza para a nata da sociedade maceioense. Esses interesses culminam com a
poder público para dispor dos sobrados históricos como efetivamente desejam.
Isso é acatado pelo poder público, porque, neste momento, o município já havia
aplicação das penalidades da lei que rege o patrimônio histórico termina por não ocorrer
sobrados símbolos), para que, então, o empresariado se interessasse por Jaraguá. A atração da
iniciativa privada, mediante intervenção indireta (como incentivos fiscais) era condição
Tem-se, mais uma vez, um arranjo de poder, do ponto de vista assimétrico, pautado no
neste momento, também do capital privado (empresários). Esse arranjo não se caracteriza pela
cooperação mútua, mas pela escolha de cada ator do melhor caminho que viabilize alcançar
seu objetivo-fim. Fazer concessões à iniciativa privada foi a trilha percorrida pela Prefeitura
Municipal de Maceió. O maior efeito dessas relações de poder é uma repercussão nos próprios
193
promovidas pela iniciativa privada (com modificações internas e externas dos sobrados),
ainda que também possam ser observadas em ações promovidas pelo poder público
CORRENTE Os sobrados devem ser recuperados e restaurados, mediante trabalho minucioso que
FLEXÌVEL retrate fielmente suas características arquitetônicas e históricas. O imóvel deve
permanecer íntegro, mediante expulsão de elementos estranhos e interpretação de
suas feições originais.
REVITALIZAÇÃO Em diferentes formas e intensidades, boa parte dos sobrados sofre modificações
JARAGUÁ internas e/ou externas em prol da atividade turística e empresarial. Principais
indicadores: demolições parciais, cores externas fortes e/ou chamativas, ampliação da
funcionalidade do espaço, substituição da originalidade por materiais mais baratos.
Há ainda relatos de revitalizações mais criteriosas, o que implica em compatibilidade
com a corrente flexível, porém desacordo com a corrente rígida.
construção de uma pequena fábrica de gelo para a comunidade dos pescadores. A base de
contato entre ambas, neste período, desponta como intensa e com relativa padronização. As
194
bases de poder da UEM, nesta relação, são as mesmas descritas em suas inter-relações com os
Ao contrário dos empresários, contudo, a Associação dos Trabalhadores da Pesca não detém o
intermediação deste para que a associação obtivesse o financiamento das obras pelo BNB e a
inexistência de conflitos manifestos são indicadores de uma relação cooperativa para a teoria
simétrica de poder. Segundo esta perspectiva, ambas as partes ganham: a Prefeitura caminha
Trabalhadores da Pesca.
manutenção da fábrica de gelo em função dos elevados valores que permanecem pagando ao
por perder a funcionalidade, já que os pescadores precisam arcar com um alto custo na
compra do gelo. A ausência da manifestação desse conflito se dá, ao que tudo indica, em
Além disso, sem o apoio de poder público, muito provavelmente a fábrica não seria
erguida, o que gera um caráter de dependência desta entidade em relação ao poder municipal.
Também para a teoria radical de poder, a consecução de alguma ação em prol da comunidade
dos pescadores, ainda que ínfima se considerado todo o projeto de revitalização destinado à
195
Vila, pode ser conveniente à própria Prefeitura de Maceió como uma espécie de mecanismo
de controle social, já que o projeto de recuperação da favela em si não saiu do papel. Tal
atitude pode ser entendida como uma forma de camuflar que o poder é um fenômeno que não
dados, segundo a UEM, não há valor histórico em devolver a fachada original do Bradesco
(antigo Armazém Faustino). Ora, por que o aparente rigor, então, para que uma construção
contemporânea (fábrica de gelo) não destoasse da revitalização? Uma possível resposta a essa
pergunta é que a Prefeitura Municipal detinha recursos de poder para com a Associação de
Trabalhadores da Pesca (interessada em abrir a fábrica de gelo), mas o mesmo não ocorria
com o Bradesco.
ainda que este estivesse desprovido de valor histórico. Se bem observado, o próprio curso da
evolução de Jaraguá (descrito no sub-tópico 4.1.2) demonstra que, embora uma parte do
patrimônio do bairro mantivesse feições originais, outra foi deteriorada por usos diversos ao
longo dos anos, o que, por si, comprometia seu verdadeiro valor histórico. A Prefeitura
para imitar um estilo antigo que já não existia. Evidentemente essas ações, embora possam
trazer beleza física, não conferem ao espaço significado de preservação da memória, senão
que a representação (e, portanto, irreal) daquilo que o bairro foi numa época específica.
relações efetivamente traçadas em contrato, de modo que não foram evidenciadas mudanças
Salgadinho permanecem em seu estado latente. No que tange à relação entre o poder público e
revitalização, pode-se afirmar que esta até então havia se desenvolvido de forma muito
dos Pescadores. Por essa razão, considerou-se mais adequado tecer comentários sobre as
AMBIENTE
BNB PRODETUR-NE/BID
PREFEITURA MUNICIPAL DE MACEIÓ
EMPRESÁRIOS DE JARAGUÁ
(RAMOS DIVERSOS) ASS. MORADORES VILA
Atores preponderantes
Na fase de efetivo funcionamento dos novos usos e atividades almejados para Jaraguá
(momento 3), tem-se a formação interorganizacional do tipo “rede” (HALL, 1984). Este
modelo é o mais condizente com a análise da dinâmica cotidiana dos espaços urbanos. A
ênfase não mais recai sob uma organização focal, senão que no conjunto dos atores
organizacionais entrelaçados num dado sistema social. Foram estudadas, neste momento, as
empresariado como cooperativa na fase áurea de Jaraguá, em que o bairro encontra-se repleto
manifestação de conflitos. De um lado, o poder público faz do projeto de Jaraguá uma vitrine
eleitoral e logra êxito, com a reeleição da prefeita Kátia Born. Do outro, a iniciativa privada
consegue cobrar preços elevados por seus produtos e serviços, obtendo o lucro desejado.
bairro como destacado oficialmente. Consolida-se no auge de Jaraguá, sob esta ótica, o ideal
maceioense. Tem-se, neste momento, o retrato da divisão de classes, no qual bares e boates
sofisticados convivem lado a lado com uma favela (Vila dos Pescadores), que em nada se
beneficia com a beleza, o lucro e a riqueza que parte do novo Jaraguá ostenta, nem mesmo
inquirido (E8) deixa claro este conflito ao falar da existência de dois Jaraguás, um dos ricos
pertencente aos senhores donos de bares e boates e outro dos pobres pertencente aos
pescadores.
198
Lukes (1980), pode-se afirmar que a oligarquia maceioense faz uso de seu poder objetivando
a manutenção de seu status quo, utilizando-o para conservar a desigualdade de recursos entre
a nata da sociedade e aqueles que não detêm o capital econômico. O arranjo de poder entre
de declínio do bairro. Neste momento, a exteriorização dos conflitos se dá de tal maneira que
insatisfação dos empresários. Esse fato, somado às reivindicações dos proprietários de bares e
restaurantes nas reuniões realizadas com as unidades gestoras do bairro, incitam atitudes
diversas por parte do poder público, tais como providências no tocante às questões de
No conjunto, todas essas ações do poder público visavam de alguma forma atender às
expectativas dos investidores. Há mais uma vez um confronto entre bases/fontes de poder, na
qual o poder público (representado nomeadamente pela SETURMA neste momento) detém o
poder legítimo e contextual, isto é, poder de contemplar os anseios da iniciativa privada. Esta,
por sua vez, faz uso de seu capital econômico. Havia interesse por parte da Prefeitura de
do poder público demonstram insatisfação com o caráter de dependência dos empresários, que
aguarda, convenientemente, uma atitude de proteção por parte do poder público. Contudo,
Bares e Restaurantes não gera uma uniformidade de reivindicações, fragilizando sua base de
fortalecem as providências do setor público no sentido de minorar esses problemas, que, para
os empresários de modo geral, estavam relacionados aos habitantes da Vila dos Pescadores. O
conflito, neste momento, também se torna extremamente visível e é absorvido tanto pela
desarticulação entre os membros de suas organizações, não dispõem de uma base de poder
Parte dos moradores da favela foram expulsos, o que corrobora a fragilidade de suas
transferência dos que residiam na favela para outros bairros de Maceió, contribuiu para a
retorno de uma parcela dos expulsos. Entende-se que as comunidades locais desenvolveram
uma base/fonte de poder que pode ser compreendida mediante a extensão do que Galbraith
(1986) denomina de poder condigno ou ainda o que Krausz (1991) intitula de poder pessoal.
individual de seus membros: permanecer em Jaraguá. Essa fonte de poder parece advir,
sobretudo, da luta pela sobrevivência, ao reconhecer as dificuldades de vir a morar nos bairros
Associação de Moradores de Jaraguá lutou pela minimização de uma ação prevista em plano
base/fonte de poder que as duas primeiras organizações detinham, mas da sintonia com metas
aparenta ter se fortalecido em função do descrédito do poder público (que não implementou o
programa de reurbanização da Vila dos Pescadores), tendo desenvolvido uma fonte de poder a
É verdade que essa fonte não garantiu forças para a concretização da reurbanização da
Vila como prometida pelo poder público, contudo, parece ter suavizado o peso das ações da
Prefeitura Municipal de Maceió em torno da retirada compulsória dos moradores, ainda que,
comunidades locais, há, por parte do primeiro, a mesma base/fonte de poder que detinha para
com os empresários: o poder legítimo e contextual, traduzido na condição legal de que dispõe
seus próprios destinos. Não se observa uma luta organizada da comunidade para reivindicar as
comunidades locais e o predomínio do conflito sob esse aspecto são visualizados por uma
abordagem crítica de poder. Numa perspectiva funcional, essa mesma relação nem é
tentativa de retirar a população do local e esta é captada tanto pelas abordagens simétricas
Ressalta-se, por fim, o predomínio do conflito nas relações entre os atores estudados.
se torna de tal forma externalizado que ambas as vertentes de poder (simétrica e assimétrica)
conseguem visualizá-lo. A forma como os atores vêem uns aos outros, durante todo o
processo de revitalização, sugere uma espécie de ‘diálogo entre surdos’, em que cada parte
visualiza tão somente os seus próprios interesses. Trata-se, portanto, de uma realidade que
muito diverge do triângulo harmonioso entre poder público, iniciativa privada e organizações
AMBIENTE
HABITAR-BRASIL/CEF TRADE
UEM FUND. CULTURAL
ALIADOS ESTRATÉGICOS
SETURMA (EVENTOS/DIVULGAÇÃO)
ÓRGÃOS/SECRETARIAS
EMPRESÁRIOS LOCAIS MUNICIPAIS
COMUNIDADES LOCAIS
Atores preponderantes
revitalização de Jaraguá foram sintetizadas. A análise conjunta dessas fases sugere que os
(riqueza). Essa conclusão encontra respaldo nas palavras de Bourdieu (2000), quando o
mesmo assinala que, na sociedade contemporânea, aqueles que abarcam o capital econômico
intensidade com que estas foram observadas no caso em estudo. O intuito precípuo é discutir
Legenda:
O primeiro aspecto a ressaltar diz respeito ao forte protagonismo dos governos locais
com intervenções pontuais na escala do lugar (cidade), que se revela um pressuposto basilar
do desenvolvimento local, quer do tipo social, quer do tipo competitivo. Essa variável
encontra elevada sintonia com o caso em estudo já que todo o processo de recuperação e
indubitavelmente destaca o papel ativo das instâncias locais de poder na condução políticas de
de uma participação conjunta entre os órgãos públicos municipais e também destes com os
órgãos, o que, por si, dificulta a realização de uma política integrada entre a Prefeitura
imediatas de segurança pelo município, sob a alegação de que esta é uma esfera de
poucas ações substanciais, nestes sentido, duas se destacam: um paliativo temporário efetuado
revitalização deve se pautar pelo ideal da valorizar aspectos culturais da cidade, exaltando sua
singularidade e suas diferenças frente a outros espaços urbanos. No entanto, essa retórica
assume, aparentemente, um caráter híbrido. O próprio zelo com patrimônio histórico, tão
enfatizado nos discursos oficiais, é camuflado pelas famosas ‘brechas da lei’. No caso em
Isso acontece, provavelmente, porque o próprio poder público também previa dispor
contudo, é incompatível com uma preservação rigorosa dos prédios históricos de Jaraguá. Em
verdade, tem-se uma transformação dos valores. Ao invés de primar pela preservação dos
essa orientação. Fato que, no mínimo, traz à tona um questionamento quanto ao verdadeiro
valor histórico de parte daqueles sobrados que foram desgastados e deteriorados pelo uso
fora, quando não, em certos casos, até parcialmente demolidos. Uma interpretação profunda
quando da descrição dos dados. Nestes mesmos discursos oficiais, contudo, encontra-se certa
pesqueira) também é prevista desde o próprio plano de desenvolvimento do bairro, ainda que
justificada sob palavras recheadas de sustentabilidade e com o pressuposto de que essa ação
beneficiaria tal população. Isso é tão verdade que este mesmo documento oficial do município
contém uma pesquisa de consulta aos moradores da favela para o caso de uma eventual (leia-
Esse fato encontra elevada consonância com a inferência da escolha entre valores
competitivos de Perrow (1978), segundo a qual, um objetivo operativo pode estar em sintonia
com um objetivo oficial, muito embora subverta um outro objetivo oficial. Ao propor
comunidades de baixa renda foram consideradas pela maior parte dos inquiridos como os
justificado, com base num discurso híbrido, em um objetivo oficial, uma vez que o poder
público sempre soube dos problemas de convivência e de segregação que existiriam entre os
moradores da Vila dos Pescadores e a nova classe mais abastada da sociedade maceioense
para a qual o bairro de Jaraguá estava sendo recuperado. A região beira-mar da cidade de
208
Maceió e, particularmente, a orla do bairro de Jaraguá, são espaços nobres da cidade. Por esta
razão, tem-se implicitamente o pressuposto de que estes não deveriam estar sendo ocupados
por uma comunidade carente, senão que a uma camada social mais privilegiada da sociedade.
evidência deste fato é que um dos entrevistados (E14) discorre sobre a cogitação (não
transferência de todos os habitantes (e inclusive pescadores) para uma outra área de Maceió,
(conforme relatado no momento 3). Ao que parece, a comunidade dos pescadores sempre
variadas classes sociais, mas visava, sobretudo, fomentar o turismo de alta renda (ver
descrição no momento 1). Um dos pólos indutores desses visitantes de alto poder aquisitivo
seria a construção do centro náutico (marina). No mapa 04 (apêndice F), observa-se que a
comunidade da pesca ficaria bastante próxima desta marina. Por mais que o município
investisse na Vila dos Pescadores, o natural seria que, ao longo dos anos, a baixa capacidade
(vestimentas penduradas em varal, deteriorização dos imóveis, etc) que tende a ser
empresários que optaram por abrir seus estabelecimentos em Jaraguá (como efetivamente
ocorreu). É muito provável, portanto, que essas razões somadas também tenham contribuído
para fazer cair por terra a idéia de transformar a Vila dos Pescadores numa espécie de atrativo
que parcerias entre o poder público e a iniciativa privada são a chave do sucesso da
Apenas os bares, restaurantes e danceterias exerceram um papel ativo como atores, realizando
alianças mais sólidas com o poder público e, mesmo assim, muito distante do que se define
por gestão integrada. Conforme mostrado no sub-tópico anterior, as relações entre esses dois
De modo geral, pode-se afirmar que não ocorreram parcerias significativas entre o
poder público e outras organizações privadas do setor turístico (atores potenciais), nem entre
fracamente inserido no circuito turístico da capital alagoana. Por outro lado, as expressões das
organizações civis, corrobora-se a idéia de que o mero fomento ao turismo pelo poder público
não é suficiente para que alianças e parcerias representativas no setor turístico ocorram e, em
que tudo indica, não contemplou as comunidades de baixa renda de Jaraguá. A relação direta
entre o turismo e o desenvolvimento local, pautada na harmonia deste tripé, tende a ser,
portanto, falaciosa.
que com uma estratégia de desenvolvimento local. Isso porque, apesar de tomar as esferas da
sustentabilidade como palavras de ordem nos documentos oficiais, a hibridez dos mesmos
desde seu planejamento (ainda que em caráter sutil e/ou híbrido), a revitalização de Jaraguá
fontes externas de financiamentos e fomento à parceria com a iniciativa privada. São estes
qualidade de vida nos núcleos receptores. A participação da sociedade civil, neste caso, é uma
conseqüência.
concessão de incentivos fiscais. Ora, que classe pode se integrar a esse sistema? Muito
majoritariamente pela baixa renda, não poderia adquirir um financiamento junto ao Banco do
Nordeste. Tal fato, por si, corrobora que a estratégia de revitalização de Jaraguá sempre se
23%
77%
NOTA: Em obras, foram incluídos investimentos em infra-estrutura (sistema viário, enterramento de rede
elétrica e telefonia, resíduos sólidos, etc), bem como obras de recuperação e restauração de praças, sobrados,
monumentos, etc). Em desenvolvimento institucional, inseriu-se a estruturação e modernização dos órgãos
públicos, a capacitação de seus servidores, bem como contratação de consultorias.
entrevistados, deixa claro que foi, sobretudo, sob este aspecto que a Prefeitura Municipal
concentrou suas ações, como, aliás, o próprio poder público reconhece em seus documentos
sobrados foram o ponto central da ação do poder público, onde houve maior alocação de
recursos.
no marketing político que as grandes obras são capazes de proporcionar. Maceió é uma cidade
que passou muitos anos sem que houvesse um grande investimento em obras públicas do
possível observar, nos veículos de comunicação local, inferências sugerindo que o atual
governador Ronaldo Lessa (nesta época prefeito da capital alagoana) entraria para a história
213
da cidade como uma espécie de salvador do bairro histórico de Maceió. Isso porque, tal como
planejada, a recuperação de Jaraguá se configurava como uma das maiores obras públicas a
objetivos operativos da cúpula gestora da Prefeitura de Maceió. Como afirma Perrow (1978),
Jaraguá, outrora recanto da boemia, transformou-se numa vitrine política, alvo dos
publicidade em torno das obras concluídas. Estas, sobretudo a recuperação das praças e de
quadro.
O destaque, contudo, fica por conta do banho da prefeita nas águas fétidas do
Salgadinho, às vésperas das eleições. Cabe ressaltar que o inócuo investimento realizado no
construção da vila dos pescadores (ver anexo A), a qual não se beneficiou com a
214
Jaraguá (na prática não alcançada) parece assumir proporções maiores do que um possível
esta, existiam outras alternativas, como transferi-la (ou melhor, escondê-la) para regiões
menos nobres de Maceió, como de fato aconteceu com parte desse contingente, num
traçada para o bairro. Nos documentos e na mídia, é possível observar correlações entre
Maceió e as demais cidades nordestinas (ver descrição no momento 1), demonstrando que a
capital do Estado de Alagoas necessita valorizar seu bairro histórico como forma de dispor de
um pressuposto sutil de que Maceió precisa se sobressair na disputa pelo mercado turístico
nordestino.
intervenção mais eficiente e eficaz do que as revitalizações que também ocorriam nacional e
para Jaraguá. Contraditório nesta política é que, ao mimetizar outras cidades, o mais lógico é
215
que os espaços urbanos tendam a se tornar cada vez mais iguais e não singulares como
de realizar uma forte campanha de marketing para Jaraguá, capaz de enfatizar suas
o bairro estava passando. Este documento fornece o pano de fundo do que Harvey (1996)
pela campanha de marketing implementada, que essa imagem se torna mais transparente.
informativos veiculados pela UEM, que focam na idéia de que a revitalização devolveria o
coadunam com a “criação de uma imagem urbana”. Estes eventos públicos e de gozo comum
que a totalidade dos benefícios proporcionados às populações de baixa renda de Jaraguá com
a intervenção urbana, muito aquém dos que foram previstos em plano. Faz lembrar, inclusive,
216
uma das nuances da gestão urbana empresarialista descrita por Harvey (1996): a reinvenção
turismo está fortemente presente tanto na fase de planejamento como de implementação desta
intervenção urbana, inclusive, com a nomeação da Secretaria de Turismo para gestora oficial
capital alagoana enquanto cidade de belezas naturais e também culturais, como ‘Venha
descobrir que Maceió é muito mais que praia’ e ‘Bairro de Jaraguá – Estação do Divertimento
Essa orientação encontra plena sintonia com a “turistificação” dos espaços urbanos ou
o que Harvey (1996) intitula de remédios favoritos das economias urbanas moribundas. A
retrata o quanto esses investimentos turísticos despontam como paliativos imediatos, contudo,
voraz dos preços de aluguéis na área, revela-se um indicador também representativo. Esse fato
bairro para um novo público: a classe média e alta. Contradiz, inclusive, o próprio conceito de
moradia, o que definitivamente não ocorreu em Jaraguá, tal qual quadro 8 (4). Explica
também as respostas dos inquiridos que aferiram aos proprietários dos imóveis o papel de ator
revalorização dos centros históricos urbanos abandonados (com pouca vida) e degradados
apresentava-se bastante povoado e com grande parte do uso do solo destinado à habitação
(conforme relatado no tópico 4.1.1), entretanto, tratava-se de uma população de baixa renda.
A revitalização é que teria suscitado a saída de parte desses habitantes. E, quanto ao descaso
com o patrimônio histórico, se analisado por uma vertente rígida de preservação, também
termina por aumentar com a revitalização. Para esta corrente, a deteriorização do tempo é
Sob esta ótica, muito provavelmente a ocupação dos imóveis por pessoas de baixa
renda ou mesmo pelo baixo meretrício termina por ser menos prejudicial do que as ações
Jaraguá foram responsáveis involuntárias pela preservação do bairro. Com efeito, infere-se
que o uso turístico-cultural, almejado com a revitalização de Jaraguá, embora possa ter
embelezado a cena urbana, tende a contribuir para desvalorizar ainda mais o patrimônio
de lazer demonstra-se fugaz, de curta duração. O pressuposto nuclear dessa estratégia é de que
eventos e produção de espetáculos de consumo, que, por natureza, são passageiros, não
218
deixam vínculos, nem raízes. Sem atentar para fatores administrativos e de gestão intra-
adotaram esta premissa como solução para sua sobrevivência. Em conseqüência, observa-se a
poder público, o qual deveria promover eventos e marketing, constantemente, visando atrair o
condutor de seu discurso seja secreto, que suas regras sejam obscuras, as suas perspectivas
enganosas, e que todas as coisas escondam uma outra coisa [...]” (CALVINO, 1990, p.44).
Ao comparar as cidades a sonhos, admite-se que elas não são feitas apenas de concreto, senão
que de um complexo quebra-cabeça, que se esconde por trás do que vemos. É exatamente este
bairro de Jaraguá. O presente capítulo destina-se a responder à pergunta central que norteou a
as relações entre os atores, analisadas sob uma perspectiva assimétrica de poder, são
por esta razão, não estão coerentes com o tripé harmonioso de desenvolvimento formado pelo
poder público, a iniciativa privada e a sociedade civil, tão enfatizado e disseminado pela
literatura.
pelo que se pode denominar de intuito nuclear desta intervenção urbana: a transformação do
bairro num pólo turístico, cultural e de lazer, pleiteando que este se somasse aos atrativos
a relação de atores representativos nos diferentes momentos que perfilam todo o processo da
Jaraguá. No setor público, realçou-se o papel da Prefeitura Municipal de Maceió, que atuou na
comunidades locais de Jaraguá com os dois primeiros segmentos citados. O BID, através do
221
ao estilo de luta coletiva de cada um desses atores, a pesquisa retratou que os conflitos e a
de contato que tais atores estabeleceram entre si, sob uma perspectiva assimétrica de poder,
incomensuravelmente maior pelos atores que detêm o capital econômico, sendo estes os
população maceioense. Recuperou-se este espaço da cidade para transformá-lo num locus no
tornou-se um espetáculo com hora e data marcadas para acontecer: o show se inicia quando
cultura numa redoma, num espaço físico preciso e apurado. Com a revitalização, Jaraguá
culturais deveriam se concentrar, porque é ali o lugar em que a cultura maceioense acontece.
Ignorou-se que a cultura é tecida no dia-a-dia, faz parte dos costumes de um povo, daquilo
que é realizado no seu cotidiano. Esqueceu-se que a cidade não conta a sua história e nem sua
cultura para quem chega, ela as contêm expressas em cada detalhe de suas construções, no
contorno de seus monumentos, nos hábitos, ritos e mitos de seu povo. Relegou-se que o
espaço urbano tem que ser bom, sobretudo, pra quem nele mora, para aqueles que compõem
seu dia-a-dia e não um local de passagem, fictício, elaborado para o turista e para o cliente.
o mais provável é que o mimetismo de Maceió a outras cidades, decorrente da exposição dos
entre Jaraguá e outros centros históricos revitalizados. O apelo visual deste bairro desperta o
interesse da sociedade atraída pelo belo (e não pelo valor histórico), mesmo que isso tenha
campanhas publicitárias.
de lucro rápido da nata oligárquica maceioense e por ter aceitado as estratégias disseminadas
223
geral, calcada na atividade turística. Contudo, o poder público também aparentou optar pela
visualizá-lo.
pleno funcionamento de seus negócios para as esferas concernentes ao poder público. Este
precisou reiteradas vezes acatar as exigências daquele, ainda que reconhecesse a postura de
estabelecimentos.
esforços para dinamizar o bairro, mediante promoção de festas e shows diversos com fins de
atrair o público, conforme solicitado pelos empresários. Isso não acontece por acaso, mas,
de um pólo turístico, cultural e de entretenimento, como foi a de Jaraguá, tende a ser efêmera.
atração da classe média e alta das cidades: o de eventos. Com efeito, ou se alimenta
inevitável. No caso em análise, os conflitos entre a iniciativa privada e o poder público, bem
como a ausência de promoção do bairro mediante ação conjunta e parceira terminam por
ápice (tempos de glória) e, com igual velocidade culminou no ocaso. Neste intervalo, Jaraguá,
no circuito turístico de Maceió, o qual permanece focado em suas belas praias, atestando a
Jaraguá. Tal fato ocorre, aparentemente, porque suas atividades empresariais, independem de
Associação de Bares e Restaurantes, bem como entre tal associação e o poder público.
inerentes à lógica que permeia o mundo dos negócios e, portanto, indissociável ao próprio
meio empresarial. Invocar uma espécie de redenção voluntária destes e sua efetiva
consolidação como empresas cidadãs tende a ser uma postura essencialmente inócua. Na
mesmo tendo um estilo individualista de luta, os empresários conseguiram ter maior poder de
poder público sempre teve conhecimento do inevitável conflito que se estabeleceria entre os
núcleos de baixa renda e o novo empresariado que ingressaria no bairro, atraídos pela
maceioense, às classes com maior poder aquisitivo, posto que desconsidera o impacto social
alta renda e para famílias mais abastadas da sociedade maceioense, por si, revela-se
incompatível com a persistência de uma favela e de classes menos afortunadas que ocupavam
Diante do rolo compressor da ‘limpeza social’ e da ‘gentrificação’ da qual Jaraguá foi palco,
menores. Ainda que não mais retrate com fidelidade a história alagoana, o âmbito do concreto
nordestino. Neste contexto, é comum a tentativa de criar uma imagem urbana, fazendo uso de
social e o orgulho cívico, gestão integrada, parcerias e alianças, combate à exclusão social,
auto-sustentabilidade, etc.
estudar as relações entre os atores através de uma abordagem assimétrica de poder, sugere a
desenvolvimento, do que uma mera lacuna entre discurso e prática: as expressões bucólicas e
harmônicas são, antes, mecanismos vorazes de controle social, máscaras de que faz uso a
dominação. A razão subjacente para que a retórica permaneça no papel deposita-se também
na perversa dubiedade, sutileza e/ou hibridez dos próprios objetivos oficiais intrínsecos a esse
tipo de estratégia, que subvertem uns aos outros. Desmistifica-se, assim, um suposto
Pelo exposto, no caso Jaraguá, as expressões organizativas que compõem o tripé setor
numa arena de disputas na qual a palavra de ordem se traduz em seus interesses concretos.
Nesta arena, conflitos (latentes e manifestos) perpassam e se enraízam nas relações entre os
atores que, sós ou em coalizões, tentam com suas fontes e bases de poder, subjugar,
influenciar e dominar uns aos outros. A revitalização de Jaraguá é um exemplo vivo das
múltiplas facetas de poder. Infere-se, portanto, que os resultados apontados pela presente
conflitos visíveis, em que há reação de uma ou mais partes envolvidas numa dada relação. As
existência ou não de reação das partes. O estudo constatou, inicialmente, que os conflitos
manifestos tendem a florescer com maior freqüência nas relações ad doc do que nas relações
Com a aplicação dessas duas vertentes de poder no caso em estudo, observou-se que
realidade, enquanto o oposto ocorre nas perspectivas conflituosas, que captam o mundo real
228
de forma dinâmica, com foco em suas múltiplas complexidades. Por outro lado, foi também
esta razão que as teorias interorganizacionais, inclusive aquelas que incluem o conflito em
suas análises, são trabalhadas sob as abordagens de poder mais simétricas. Isso se explica
ideal aristotélico de criação de uma ordem negociada que cria unidade a partir da diversidade.
depositam ênfase no equilíbrio das relações entre os atores e na estrutura, não conseguindo
demonstrando que as perspectivas de poder que estudam não apenas os conflitos manifestos,
mas também os latentes, tendem freqüentemente a captar, nas relações em análise, a presença
Isso ocorre porque as relações sociais são elas mesmas relações dinâmicas de poder,
em que os atores tendem a se sobrepor, influenciar e dominar uns aos outros. As próprias
figuras 6 (4), 7 (4) e 8 (4) sobre as inter-relações organizacionais apresentadas neste trabalho
são compreendidas como inócuas para esta perspectiva, uma vez que fragmentam um
depositando ênfase na possibilidade de que estes caminhem unidos, de mãos dadas, de modo a
fragilidade nos discursos e pressupostos das teorias de desenvolvimento local (do tipo
229
desarticulação e apoiar, como corolário, a necessidade da atuação conjunta entre os atores que
compõe esses três segmentos tal qual se observa em um vasto número de estudos urbanos e de
Pelo contrário, julga-se que, apenas somando esforços para a desconstrução desse
paradigma, será possível galgar estratégias de desenvolvimento mais realistas que não se
pautem numa erradicação da assimetria relacional dos atores, posto que utópica. A presente
capazes de suavizar o peso da sociedade atomizada em que vivemos. Ateve-se, tão somente, a
potencialmente irmanados, da suposta união contra um mundo hostil, tão presentes nas
desenvolvimento.
corroborada por um amplo leque de pesquisas, que, apesar disto, permanecem invocando a
necessidade de ajuda mútua entre os atores. Motivou o trabalho uma investigação norteada
conjugação de fontes e bases de poder entre os atores como mecanismo de estabelecer canais
mergulho mais profundo na temática, demonstrando que tal desarticulação deve-se, sobretudo,
às estruturas de dominação da sociedade que reforça o poder nas mãos de um pequeno grupo
mediante controle de recursos econômicos, do sistema legal, da educação, etc. Isso tende a ser
A atividade turística tem sido apontada por estes últimos como uma espécie de
cultural de revitalização de centros históricos apresenta plena sintonia com esta retórica. Os
números fabulosos de renda e emprego indicados por estas reativações em antigos núcleos
tecnológica, industrial e científica dos países periféricos em relação aos países centrais. É,
sobretudo, em função dos investimentos nessas áreas, que ocorreu o desenvolvimento das
optado pelo turismo como solução rápida e de baixo custo. Essa é uma solução que,
definitivamente, vem saindo cara, às custas do consumo da cultura e de seu simbolismo. Tal
retórica tem encontrado respaldo e aceitação pelos governantes nacionais e por um pequeno
grupo detentor do capital econômico quer por fazerem uso da máquina pública para a
poder primam pela manutenção do status quo destes atores e não por mudanças sociais de
caráter mais profundo. Os mecanismos de controle são cada vez mais perversos e intensos,
Esta pesquisa convida o leitor, portanto, a refletir sobre uma questão atual no âmbito
com pleno sabor das esferas da sustentabilidade são soluções aparentemente tópicas e
qualquer consonância com uma resposta otimista: escrever sobre coalizões, conflitos e jogos
gestão de cidades. Com a expectativa de abrir caminhos capazes de enriquecer o debate, bem
como de aprofundar questões não investigadas em função dos imperativos limitantes deste
internacionais) com fins de realizar uma análise comparativa frente aos resultados
inspirações da autora, com as quais o leitor poderá ou não se identificar, mas que espera-se
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NOTA: todas as informações apresentadas neste anexo, referentes a indicadores de criminalidade nas capitais brasileiras, foram retiradas (com adaptação) da
pesquisa intitulada “Perfil de País - Brasil” (BRASIL, 2003), cuja elaboração competiu ao Escritório das Nações Unidas contra Drogas e Crime (UNODC). Realizou-
se um recorte das tabelas sobre questões de segurança do referido documento, posto que estas tratam de demonstrativos pertinentes às constatações aferidas
neste trabalho.
ANEXO E - indicadores turísticos da cidade de Maceió
FATOR DECISÓRIO DA VISITA 2002 2003 2004 MEIO DE TRANSPORTE 2002 2003 2004
Manifestações populares 1,37% 0,71% 0,25% UTILIZADO
Atrativos Naturais 90,79% 92,81% 92,91% Avião 62,06% 53,08% 51,83%
Ecoturismo 1,66% - 0,76% Ônibus/Carro 37,65% 46,52% 46,59%
Turismo Rural 0,1% 0,14% 0,51% Outros 0,29% 0,4% 1,58%
Patrimônio Histórico/Cultural 0,98% 0,99% 0,25% TOTAL 100% 100% 100%
Custo Total da Viagem 0,98% 2,11% 1,01%
Compras 0,59% 0,85% -
Outros 3,53% 2,39% 4,31%
TOTAL 100% 100%
Tabela 05 – Perfil do turista de Maceió em função do fator decisório da visita
Fonte: Secretaria Executiva de Turismo do Estado de Alagoas FLUXO 2001 2002 2003 2004
GLOBAL
Maceió 833.731 889.622 1.012.618 951.922
Alagoas 1.250.596 1.334.433 1.518.927 1.427.883
MEIO DE TRANSPORTE UTILIZADO 2002 2003 2004
Hotel 36,61% 34,29% 39,17%
Casa de parente/amigo 32,34% 31,97% 37,96%
Pousada 17,54% 18,07% 15,57%
Apart-hotel 6,57% 6,63% 0,85% RANK CIDADES MAIS VISITADAS
Casa/Aptº aluguel 4,68% 4,56% 3,04% (2003)
Casa própria 1,95% 2% 1,7% 1º Rio de Janeiro
Pensão/hospedaria 1,17% 0,72% 0,24% 2º São Paulo
Camping 0,58% 0,08% -
3º Salvador
Albergue 0,34% 0,64% 0,37%
4º Fortaleza
Outros 1,22% 1,04% 1,1%
5º Recife
TOTAL 100% 100%
6º Foz do Iguaçu
Tabela 07 - Perfil do turista de Maceió em função do meio de hospedagem utilizado 7º Búzios
Fonte: Secretaria Executiva de Turismo do Estado de Alagoas
8º Porto Alegre
9º Florianópolis
10º Belo Horizonte
11º Natal
12º Curitiba
FLUXO HOTELEIRO 13º Balneário de Camboriu
2001 2002 2003 2004 14º Manaus
342.830 384.139 357.758 372.868 15º Belém
16º Brasília
Tabela 09 – Fluxo hoteleiro de Maceió
17º Porto Seguro
Fonte: Secretaria Executiva de Turismo do Estado de Alagoas
18º Maceió
19º Paraty
20º Morro de São Paulo
21º Ipojuca
22º Ouro Preto
23º Vitória
24º João Pessoa
25º Angra dos Reis
Tabela 10 - Estudo da demanda turística internacional
Fonte: EMBRATUR
NOTA: as tabelas apresentadas neste anexo (exceto a tabela de nº 10), referentes a indicadores turísticos de Maceió, foram retiradas (com adaptação) do ‘Relatório de
Finalização de Projeto do PRODETUR/NE I’ (MACEIÓ, ca. 2005), elaborado pelo município de Maceió. Deste documento, realizou-se um recorte das informações que
permitiam traçar o perfil do turista da capital alagoana.
ANEXO F - controle dos usos/atividades em Jaraguá
Decreto municipal nº 5.569, de 22 de novembro de 1996 - Prefeitura de Maceió
(relação dos usos/atividades de instalação permitida e/ou que receberam incentivos fiscais na ZEP-1)
R - Uso Residencial
Até o limite de 2 (dois) pavimentos, incluindo o térreo, sem limite de área. Pode ser:
R1 - Quando existe apenas 1 (uma) unidade domiciliar no lote
R2 - Quando existem 2 (duas) unidades domiciliares no lote
R3 - Quando existem 3 (três) ou mais unidades domiciliares no lote
R6 - Conjunto habitacional ou programa de interesse social para as populações baixa renda
Atividades de comércio que atendam às necessidades de consumo vicinal e/ou cotidiano até o limite de
200m² (duzentos metros quadrados) de área construída :
• Padaria
• Pastelaria
• Sorveteria (*)
• Mercearia
• Açougue
• Armarinho
• Quitanda
• Farmácia
• Mercadinho
Atividades de comércio que atendam às necessidades de consumo geral e especializado, até o limite de
350 m² (trezentos e cinqüenta metros quadrados) de área construída. Incluem-se neste caso, todas as
atividades acima citadas que ultrapassem o limite de área do CPP, e mais:
• Loja de tecidos
• Loja de confecção pronta
• Loja de artesanato (*)
• Loja de artigos de uso doméstico
• Loja de artigos de escritório
• Loja de artigos religiosos
• Loja de brinquedos
• Loja de discos e vídeo
• Loja de artigos náuticos (*)
• Loja de informática e equipamentos
• Loja de plantas medicinais
• Loja de produtos alimentícios
• Floricultura (*)
• Jóias e relógios (*)
• Vidraçaria
• Fotóticas
• Antiquários (*)
• Galerias de arte (*)
• Papelaria
• Drogaria
• Livraria
• Tabacaria
• Numismática (*)
• Filatelia (*)
• Mini-shopping (*)
CE - Comércio Especial
Engloba atividades de prestação de serviço que atendam às necessidades da vizinhança imediata, até o
limite de 200m² (duzentos metros quadrados) de área construída:
• Confecção sob medida
• Conserto de sapatos
• Salão de beleza (*)
• Tinturaria
• Lavanderia
• Salão de cabelereiro (*)
• Copiadora
• Casa funerária (**)
• Casa lotérica
• Encadernação
• Revelação fotográfica (*)
• Posto dos correios
• Consultório médico e odontológico
• Consultório Veterinário (**)
• Laboratório de análises (**)
• Escritório de profissionais liberais
• Reparação de móveis, conserto, restauração e conservação de objetos
• Agência de empregos
• Agência de turismo (*)
• Pousada (*)
• Lanchonete (*)
Engloba atividades de prestação de serviço que atendam às necessidades gerais e especializadas, até o
limite de 500m² (quinhentos metros quadrados) de área construída. Incluem-se nesse caso todas as
atividades acima citadas que ultrapassem a área limite do SPP e mais:
• Cinema (*)
• Teatro (*)
• Jogos de salão (*)
• Jogos eletrônicos (*)
• Clube noturno (*)
• Boates (*)
• Cafés (*)
• Danceterias (*)
• Auditório de rádio e/ou televisão (*)
• Estúdio fotográfico (*)
• Restaurantes (*)
• Bares (*)
• Hotel (*)
• Hotel residência (*)
• Hospedaria (*)
• Albergues (*)
• Firma de consultoria e projetos
• Escritório de despachantes e corretores
• Agências bancárias e financeiras
• Agência de correios e telégrafos (*)
• Centrais telefônicas (*)
• Gráficas
• Termas, saunas e centro de cultura física (*)
• Guarda e estacionamento de veículos (*)
• Estabelecimentos de ensino especializado - dança, música, teatro, pintura, escultura e afins (*)
• Creche particular
• Pré-Escola (particular) (**)
• Escolas de 1º e 2º graus particular (**)
• Cursinhos
• Leiloeiros (*)
Engloba atividades de prestação de serviço específicos para o incremento do turismo que tenham área
superior a 500m² (quinhentos metros quadrados):
• Espaço de exposições (*)
• Ginásio de esporte (*)
• Parque aquático (*)
• Marina (*)
• Aglomerados de atividades de SMP em uma única edificação (*)
LEGENDA:
(*) Estão marcadas com um asterisco as atividades que deverão ter sua instalação permitida nos SPR-1
e SPR-2 e estimulada através dos incentivos fiscais de que trata o inciso V do artigo 32 da Lei municipal
nº 4.545, de 14 de novembro de 1.996, que concede isenção da taxa relativa à licença de instalação e
funcionamento e o inciso VI do artigo 32 da mesma Lei, que concede isenção de 20% (vinte por cento)
do Imposto sobre Serviços (ISS) pelo prazo de um ano.
(**) Estão marcadas com dois asteriscos as atividades que terão sua instalação permitida apenas para o
SPA-1 e SPA-2.
OBSERVAÇÕES:
1- As atividades permitidas para o SPA-3 serão apenas as referidas no quadro de usos urbanísticos.
2- Outras atividades de natureza e portes similares aos especificados serão analisadas de forma especial pela
Comissão Técnica do orgão competente da Prefeitura Municipal de Maceió.
QUADRO DE USOS E ÍNDICES URBANÍSTICOS - ZEP - 1 – JARAGUÁ
Nº de Afastamentos
Usos permitidos Taxa de pavi- Gabarito Frontal Lateral Fundos
ocupação mentos máximo (mínimo) *9 (mínimo) *9
SPR-1
residencial R1 (*1) ;
R2 (*1)
comercial CPP, CMP,CGP
prestação de SPP, SMP,
serviços SGP Observação: ver artigos 5º e 7º deste
institucional IU Decreto e
industrial IPP (*2) a Lei municipal nº 4.545/96
misto R1/CPP (*1);
R1/SPP (*1);
R1/CMP (*1); R1/IPP
(*1);
IPP/CPP (*1)
SPR-2
residencial R1
comercial CPP, CMP
prestação de SPP, SMP, Observação: ver artigos 5º e 7º deste
serviços SGP Decreto e a Lei municipal nº 4.545/96
institucional IU
industrial IPP
misto R1/CPP; R1/SPP;
R1/CMP; R1/IPP;
IPP/CPP
SPA-1
residencial R1; R2 (*2); 70% 2 7,00 m 0 - -
R3 (*3)
comercial CPP; CMP (*4); 70% 2 7,00 m 0 - -
CGP (*4)
prestação de SPP; SMP (*5) 70% 2 7,00 m 0 - -
serviços SGP (*5)
institucional IU (*4) 70% 2 7,00 m 0 - -
industrial IPP 70% 2 7,00 m 0 - -
misto R1/CPP; R1/SPP;
R1/CMP; R1/IPP 70% 2 7,00 m 0 - -
SPA-2
residencial R1; R2 (*3); R3 70% 2 7,00 m 0 - -
comercial CPP; CMP; 60% 3 12,00 m - - -
CE (*6); CGP
prestação de SPP; SMP; SGP 60% 3 12,00 m - - -
serviços
industrial IPP 70% 2 7,00 m 0 - -
misto - - - - - - -
SPA-3
residencial R6
comercial CMP (*7)
Observação : ver artigo nº 19 deste
prestação de -
serviços Decreto
institucional IU (*6)
Industrial -
misto -
FONTE: Todas as informações constantes no presente anexo foram retiradas do Decreto municipal nº 5.569 (em seus anexos III e IV com
adaptação), de 22 de novembro de 1.996, onde ser observa os usos permitidos em Jaraguá e o fomento às atividades turístico-culturais
nomeadamente na SPR-1, núcleo histórico principal de Jaraguá, através de incentivos fiscais (MACEIÓ, ca. 2005).
APÊNDICE A - plano de coleta de dados e cronograma de
execução das atividades (planejamento versus realização)
 Tópicos de investigação
Nesta etapa, os tópicos de investigação da coleta de dados foram delineados em função
dos seis objetivos pré-estabelecidos na dissertação, são eles:
NOTA: por estratégia de revitalização, compreende-se não apenas a recuperação das casas e ruas, mas esta
recuperação aliada à transformação do espaço urbano (centros históricos antigos) em um pólo turístico, regado
por um cenário de imóveis históricos revitalizados e pelo estímulo à promoção de estabelecimentos e eventos
artísticos, culturais e de lazer no local.
 Dados secundários
Para consulta do acervo bibliográfico que compôs essa fase de coleta de dados, as
seguintes unidades de estudo foram selecionadas:
NOTA: os nomes dos entrevistados serão relacionados no apêndice reservado, isto é, aquele que, pela natureza
das informações que contém e preservação do compromisso de sigilo, não é divulgado para o público em geral,
constando apenas na versão do trabalho entregue à Banca Examinadora.
1 Controle
Número da entrevista:
Data coleta: ____/____/________ Entrevista analisada em: ____/____/________
Local de realização: ______________________________________________________
Autorização para gravar entrevista: ( ) Sim ( ) Não
Deseja receber resumo final do trabalho: ( ) Sim ( ) Não
2 Informações gerais
SOBRE O ENTREVISTADO
Nome: ________________________________________________________________
Função (qualificação pertinente à entrevista): _________________________________
Tel: ________________________ Horário para contato: ________________________
E-mail: ________________________________________________________________
SOBRE O ESTABELECIMENTO/INSTITUIÇÃO
Nome da entidade: ______________________________________________________
Endereço: ______________________________________________________________
___________________________ Telefone: ___________________________________
Home page: ____________________________________________________________
3 Perguntas norteadoras da entrevista
NOTA: durante a pontuação, a pesquisadora presta, se necessário, esclarecimentos adicionais sobre o programa
ao entrevistado e, com base no andamento da entrevista, poderá solicitar que o mesmo justifique algumas de suas
respostas. A aferição de notas destina-se apenas a complementar à análise qualitativa dos dados apurados, bem
como fornecer um retrato simplificado das ações implementadas de forma adequada, segundo a ótica dos
inquiridos.
Fase 2: neste momento, a pesquisadora continua a entrevista fazendo perguntas em sintonia
com o plano de desenvolvimento de Jaraguá trabalhado na fase anterior, de modo a estimular
a conversação e o esclarecimento sobre ponto específicos do plano de desenvolvimento
elaborado para o bairro.
ATIVIDADES/ 2004/2005
MESES J F M A M J J A S O N D J F M A M J J A
Revisão da P
literatura R
Elaboração do P
projeto R
Defesa do P
projeto R
Coleta de dados P
R
Org./categ. dos P
dados R
Análise dos P
dados R
Redação da P
dissertação R
Defesa da P
dissertação R
LEGENDA:
Planejamento
Realização
APÊNDICE B - fotos de Jaraguá
Fotos antigas:
Foto 01 – Vista de Jaraguá com o Trapiche novo em primeiro plano. Observa-se também o
prédio da Associação Comercial e alguns trapiches avançando sobre o mar.
Foto 02 – Fachada da Fábrica de sabão “Dois Irmãos” e sua ponte. Escritório da Rua Sá e
Albuquerque, nº 6.
Foto 03 – Banco de Alagoas na Rua Sá e Albuquerque
Foto 04 – Rua Sá e Albuquerque.
Foto 05 – Rua Sá e Albuquerque.
Foto 06 – Ponte de embarque em Jaraguá na Rua Sá e Albuquerque.
Foto 07 – Igreja Nossa Sra. da Mãe do Povo
Foto 08 – Rua Sá e Albuquerque, 137 (Pedro Vianna Filho)
Foto 09 – Rua Sá e Albuquerque, 141 (Pharmacia Sul Americana)
Foto 10 – Rua Sá e Albuquerque, 117 (Fohlmann e Cia – exportadores de açúcar)
Foto 11 – Alfândega
Foto 12 – Rua Sá e Albuquerque, 75 (Henrique Vianna)
Foto 13 – Rua Sá e Albuquerque, 123 (Tavares Irmão Typographia)
Foto 14 – Rua Sá e Albuquerque, 115 (Typographia Americana)
Foto 15 – Rua Sá e Albuquerque (Padaria Ramires)
Foto 16 – Perfil da Rua Sá e Albuquerque
Foto 17 – Rua Sá e Albuquerque
Foto 18 – Associação Comercial de Maceió
Foto 19 – Fotografia provavelmente tirada de cima da ponte de embarque, vendo-se a
Recebedoria (atual MISA)
Foto 20 – Recebedoria Estadual (atual MISA)
Foto 21 – Museu Théo Brandão antes de sua feição atual
Foto 22 – Vista da Av. da Paz
Foto 23 – Av. da Paz com destaque para o local onde foi construída a Capitania dos Portos
Foto 24 – Trecho da Av. da Paz
Foto 25 – Museu Théo Brandão, na Av. da Paz
Foto 26 – Museu Théo Brandão, visto a partir do Salgadinho
Foto 27 – Av. da Paz com o coreto em construção
Foto 28 – Av. Duque de Caxias
Foto 29 – Rua Barão de Jaraguá no carnaval de 1905, em frente à antiga sede do Clube Fênix
Alagoana
Foto 30 – Av. Comendador Leão (enchente ocorrida em 1924)
Foto 31 – Ponte de desembarque de Jaraguá
Foto 32 – Construção do Porto de Jaraguá
Foto 33 – Construção do primeiro armazém do cais do Porto de Jaraguá
Foto 34 – Inauguração do Porto de Jaraguá com a presença de Getúlio Vargas em 20/10/1940
Foto 35 – Visita dos navios mineiros ao Porto de Jaraguá em dezembro de 1940
Foto 36 – Praça Manoel Duarte em 1950
Foto 37 – Praça Manoel Duarte (inundação em 1960)
Foto 38 – Praça Dois Leões em 1910
Foto 39 – Praça Dois Leões em 1950
Foto 40 – Trapiche Novo
Foto 41 – Canteiro de obras da Associação Comercial com Trapiche Novo ao fundo.
Foto 42 – Armazém Faustino (atual Bradesco), pintura de decoração do bar Casa da Sogra
Foto 43 – Armazém Faustino (atual Bradesco), pintura de decoração do bar Casa da Sogra
Foto 44 – Estátua da Liberdade na Praça do Centenário, então chamada Getúlio Vargas
Foto 45 – Grupo escolar Diegues Jr. em 1924
Fotos contemporâneas:
• Média aritmética (M): entende-se por “[...] média aritmética de duas ou mais
quantidades como o valor que cada uma delas teria se, mantendo-se a soma delas,
todas fossem iguais” (PAIVA, 2002, p. 221). Assim, a média aritmética dos números
[X1, X2, X3,...Xn] é dada por:
M= X1 + X2 + X3 + ...Xn
n
• Moda (Mo): moda é o valor dominante de uma série numérica, o valor que possui
maior freqüência que os valores contíguos do conjunto (anterior e posterior) ordenado.
Um conjunto de valores pode ser plurimodal (conter mais de uma moda) ou unimodal
(conter apenas uma moda) (GONÇALVES, 1978). Assim, dada a série:
[4,5,6,6,6,7,7,8,9], Mo = 6 e dada a série: [4,5,6,6,6,7,7,7,8,9], Mo = 6 e Mo = 7.
• Desvio Padrão (DP): um das medidas de dispersão que permitem identificar até que
ponto os resultados se concentram ou não ao redor da tendência central. O desvio
padrão pode ser calculado pela a raiz quadrada da variância (V2). Esta trata-se de uma
medida que indica o afastamento dos elementos de uma série numérica em relação à
média aritmética, podendo ser definida como a média aritmética entre os quadrados
dos desvios dos elementos de uma série numérica (PAIVA, 2002). Assim, a variância
e o desvio padrão dos números [X1, X2, X3,...Xn] são dados por:
• Erro padrão (EP): trata-se do desvio padrão da estimativa. Assim, considerando a série
[X1, X2, X3,...Xn], tem-se o seguinte erro padrão:
EP = DP
n
• Soma (S): corresponde à soma total dos valores de uma série numérica. Assim, dada a
série: [5,5,6,6,2,2], S = 26 e dada a série [5,6,6,6], S = 23.
• Valor máximo (Mx): trata-se do maior valor de uma série numérica. Assim, dada a
série: [1,2,3,4,5], Mx = 5
• Valor mínimo (Mn): trata-se do menor valor de uma série numérica. Assim, dada a
série: [1,2,3,4,5], Mn = 1
APÊNDICE D - síntese dos fatos históricos de Jaraguá
(continua...)
Momento 1 – O Planejamento: a luta pelos recursos e a elaboração do roteiro
1996 Criação da UEM (gestora do programa de revitalização) por exigência do BID através da lei
municipal 4.487/96.
1996 Publicação da Lei Municipal 4.545/96 sobre normas de preservação e conservação de edificações
arquitetônicas expressivas da cidade de Maceió.
1996 Assinatura do Decreto Municipal 5.569/96 que intitula o bairro de Jaraguá de Zona Especial de
Preservação 1 (ZEP-1).
1996 Assinatura de contrato para financiamento de recursos da revitalização com o BID.
Momento 2 – Construção do cenário e articulação com atores
Cenário A construção do novo pólo turístico, cultural e de entretenimento em Jaraguá é divulgada na mídia,
destacando o orgulho cívico, a relevância do bairro para a cidade de Maceió e os benefícios de
investir em Jaraguá.
1996 Primeiras obras de intervenção de Jaraguá realizadas pelo poder público.
1997 Kátia Born assume a Prefeitura Municipal de Maceió e sua administração dá continuidade às
aspirações da gestão anterior com a implementação das obras de revitalização.
1998 Atraído pelos incentivos fiscais e pelo fenômeno da revitalização, o empresariado investe em
Jaraguá recuperando sobrados, sob fiscalização da equipe técnica da UEM (surgimento de
problemas relacionais entre os dois segmentos).
1998 Atraso na conclusão das obras públicas e descontentamento de investidores.
1998 Construção da fábrica de gelo na Vila dos Pescadores.
1999 Conclusão de boa parte das obras públicas no entorno da Sá e Albuquerque.
1999 Assinatura de convênio entre o município de Maceió e BNB visando fornecer financiamentos de
despesas pré-operacionais à iniciativa privada.
2000 Outras empresas privadas do setor turístico-cultural se instalam em Jaraguá.
Momento 3 – O espetáculo: tempos de glória versus ocaso
Cenário Jaraguá é palco de especulação imobiliária e ‘gentrificação’, apresentando imagem de ponto de
encontro da cidade e de ambiente que oferta produtos/serviços com preços elevados, mas de baixa
qualidade. Realização de festas, shows e eventos diversos no bairro com aumento do número de
pedintes e surgimento de problemas relacionados à segurança.
2000 Diversos bares, restaurantes, danceterias e outros estabelecimentos encontram-se instalados e
funcionando a todo vapor no bairro.
2000 Jaraguá se insere nos debates políticos das eleições municipais.
2001 Kátia Born permanece na Prefeitura Municipal de Maceió. Visualiza-se, em maior intensidade,
conflitos relacionais na convivência entre setor público, iniciativa privada e comunidades locais de
Jaraguá por motivos diversos.
2002 Fechamento de vários estabelecimentos em Jaraguá vinculados ao setor turístico-cultural.
2002 SETURMA é designada gestora oficial de Jaraguá, objetivando dinamizar o bairro.
2003 Novos investimentos públicos em eventos e divulgação através do Projeto ‘Jaraguá: porto cultural
e de entretenimento’, contando com aliados estratégicos.
2003 Outros estabelecimentos privados fecham/transferem-se para outros bairros da cidade.
2004 Visível insatisfação e desânimo dos atores envolvidos na revitalização de Jaraguá.
(conclusão)
Fonte: elaborado com base em documentos oficiais diversos do poder público, literatura disponível e
depoimentos dos entrevistados.
APÊNDICE E - lista de estabelecimentos que compõem o
trinômio turismo, lazer e cultura em Jaraguá*
ESTABELECIMENTO RESPONSÁVEL TELEFONE
AEROGATO ARNALDO (82) 336.1237
AEROPORCO RAIMUNDO/ANDRÉA (82) 9991.1948/ 9902.4444
ALHAMBRA - -
ALMOÇO E CIA - -
AQUI GELO MICHEL (82) 9306.3373
ÁREA - -
ARENA CLUB - -
ARMAZÉM 384 - -
BALI KAI - -
BARAGUÁ RICARDO (82) 221.7463
BARBARICO JOSÉ CARLOS (82) 9991.7080
BARBATUQUE - -
BRIC-À-BRAC - -
BUDEGA - -
CANTINA DI BACCO LUCIANO (82) 8804.7457/326.4514
CASA DA SOGRA TANAGY (82) 223.8741/326.6348
CAZA HENRIQUE -
CHURRASQUINHO ANA MARIA (82) 9977.0200
D´ ÓMENA DIVALDO (82) 2352313
DOWN TOWN ROBERTO NASI (82) 9306.2622
EMPÓRIO JARAGUÁ DIARY (82) 326.7445/ 9308.1910
ÉPOCA ANTIGUIDADES - -
ESCRITORIO HOTEL PRATAGY - -
ESPETINHO JARAGUÁ CARMEN LÚCIA -
HANSBURGERS HANS VAN ROOY -
LEKKER RAUL (82) 8805.4225/326.5171
MACARRONADA EUREKA WALTER (82) 326.4975/3033.3449
MALASARTES - -
MARQUÊS D´LATRAVEA LUCIO CANUTO (82) 327.3008/9908.9288
MENOS DOIS GRAUS ERICK (82) 8805.3115
MISTURA DE CULTURA LUIZ CARLOS (82) 9966.9250
MR. ECCO - -
O-PIANO - -
ORÁCULO CARLOS/WAGNER (82) 32676/76/9997.6054
PIANO´S BAR E PIZZARIA ADEMIR (82) 9981.0130/326.2624
PÍER CARLOS/WAGNER (82) 32676/76/9997.6054
PLANETA DANCE RHODS B. PEREIRA (82) 8804.0760
PORTO LIVRE ROBERVAL (82) 9904.8225
QUAR UP GILBERTO (82) 9996.1333
RODA MUNDO VERÔNICA (82) 9305.8748/9311.4945
SEM CENSURA - -
SURURU DE CAPOTE - -
UAU MUSIC HALL CARLOS BOLA (82) 9308.3939
VARING TRAVEL - -
VIRGULINO JOSÉ MARANHÃO (82) 3034.0117
ZONNA - -
Fonte: elaborado com base em dados coletados na SETURMA e UEM, aliado a depoimentos dos inquiridos.
*
Esta lista inclui estabelecimentos ativos e inativos.
APÊNDICE F - mapas da região em estudo