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INDIOS: Direitos Historicos Cadernos da Comissio Pré-indio Ne Il Stio Paulo Penso que uma reunido do quilate apresentado pela Comissdo Pro-Indio de Sto Paulo, assegurando 0 enconiro dos maiores lideres existentes no Pais, das ‘mais variadas tribos, jamais poderd ser efetuada nas mesmas proporeées. © pensamento organizador desse encontro, a principio se baseava em reunir as entidades de apoio e os indios passiveis desse apoio. Entretanto, dada a forma como se conduzia a Fundagdo Nacional do Indio, sob a orientagdo do Coronel Nobre da Veiga, os indios se sentiram ultrajados em vérios de seus direi- tos e se idenuificaram nos problemas, sintomas estes que os levaram a se sentir solidérios uns com os outros: questdes de satide, de educagdo e principalmente ‘as quesibes de demarcagdo de terras. Assim sendo, nada mais natural que este encontro se transjormasse da noite para o dia em wma forma de organizagao indigena, dirigida e organizada pelos préprios indios, 0 que veio a acontecer dando mais énfase e forca ao pensamenio de unido, dando assim um verdadeiro sentido @ organizagéo até entdo existente no coragdo de todos os que ali se encontravam, a Unido das Nacoes Indfgenas — UNIND. Apés varias horas de discussdes, 0 bom senso veio a prevalecer e, com isso, reforcar o sintoma de solidariedade quando todos, quase que undnimes, resolveram escolher para orientar e presidir a sua associagio, trés jovens. Julga- ram, talvez, 0 pensamento jovial como o mais vidvel, capaz de proporcionar confianca e esperanca de que algo de novo fosse feito ao longo do tempo. Creio que uma reunido nos mesmos moldes desse Encontro, jamais seré vista, O homem indio, hoje, sabe que & preciso caminhar objetivamente buscando, com 0 uso de todas as armas disponiveis, se preciso for, aquilo que sempre Ihe foi negado, a sua autodeterminacdo e 0 reconhecimento, pela sociedade maior, de seus reais valores e capacidades. Quando pudermos considerar 0 passado dos povos indigenas com seus métodos de sobrevivéncia e suas experiéncias como orientagdo para melhorar (0 futuro do indio, saberemos entéo que os caminhos tracados de acordo com 0 pensamento do indio também esto voltados para o sentimento de braslidade € expressam preocupacao com as coisas do Brasil Brasilia, 17 de novembro de 1981 M, MARCOS TERENA Unido das Nagées Indigenas Direitos reservados COMISSAO PRO-INDIO/SP. MINDIOS: DIREITOS HISTORICOS’ CADERNOS DA COMISSAO PRO-INDIO/SP. ns IIT 1982 Conselho Editorial: LUCIA M. M. DE ANDRADE LUX VIDAL MARA L. MANZONI LUZ ALBA FIGUEROA ANDRE AMARAL DE TORAL ANDRE CARAMURU TEIXEIRA AUBERT. ARACY LOPES DA SILVA Créditos Fotogrificos: CLAUDIA ANDUIAR (fotos: 1- 11 - 33) SONIA DA SILVA LORENZ (fotos: 2-3-4-8-9-10-12-13-16-17- 19-20 21-22-23 - 24-25 - 26 -27- 30-31 - 32) VINCENT CARELLI (fotos: 5-6-7- 14-15 - 18-28-29) Capa: VINCENT CARELLI (edicéo e fotos) CLAUDIA ANDUIAR (fotos) SONIA DA SILVA LORENZ (fotos) Planejamento Gréfico/Produgao Editorial: MARA MOHMARI Revisio: CELIO FRANCO DE GODOY JR. JOLIO DIAS GASPAR ‘Composiio: LINOTIPADORA LIBERDADE LTDA Fotolitos: RM. FOTOLITOS Impress © Acabamento: ‘0 ESTADO DE SAO PAULO’ Agradecimentos: GLOBAL EDITORA E DISTRIBUIDORA LTDA. INDICE APRESENTAGAO INTRODUGAO {NDIOS: DIREITOS HISTORICOS Programagio ENCONTRO DE LIDERANGAS INDIGENAS E ENTIDADES DE APOIO . Debate {NDIOS: DIREITOS HISTORICOS . A UNIAO DAS NACOES INDIGENAS PLENARIA FINAL Documento A HORA DO INDIO Avéndice / Documento Especial RELATORIO MANGUEIRINHA a 12 16 41 50 69 6 Apresentagao De 26 a 30 de Abril reuniram-se em Sio Paulo 250 pessoas, e Giscutiram a questio indigena. A notfcia é esta, e parece semelhante a de outras tantas reunides anuais em grandes cidades, com especialis- tas discorrendo e alertando o grande publico, com alguns indios deco- rativos esteticamente distribufdos. Acho que esta reunifio foi, a0 contrério, uma novidade total. De saida a proposta, nascida na 2" reunifio de entidades de apoio em Brasflia, em Setembro de 1980, englobava uma nova reunifio de enti- dades, a 3, ¢ uma reunifo de representantes indigenas. Algo meio hibrido, de que uma comissio composta de representantes da Comis- sho Pr6-Indio de Sio Paulo, do CIMI e da Secretaria Executiva ficaria encarregada. Em margo de 1981 vazou o documento Golbery, parecer elabo- tado por advogados do SNI, contrério a incipiente Unido das Nacdes Indigenas, encaminhado pelo chefe do Gabinete Civil ao Ministro do Interior. © documento, produzido logo apés 0 memorével julgamento do habeas-corpus de Mério Juruna, em que o Tribunal Federal de Recursos sancionava a interpretagio dbvia da lei, de que tutela néo 6 coeredo, anunciava j& a retaliagdo prevista pela Funai que se ten- taria levantar a tutela. As regras, no Brasil, séo coisas curiosas: ficam em vigor enquanto é possivel infringi-las sem muitos embaragos. Se comegam realmente a atrapalhar, mudamse as regras no meio da partida. © documento vazado recomendava exatamente isso: j4 que uma organizagéo indigena nacional aparentemente ndo contrariava a lei vigente, que se mudasse a Ie. Claramente, definiam-se dois novos terrenos de enfrentamento, simples transformagées, aliés, de anteriores. Tratavase de ser reco- nhecido como fndio e de ter direito a se organizar. A primeira questao é bastante intrincada. Estabeleceu-se desde © comego deste século, a idéia falsa e perigosa de que os indios tem privilégios porque so incapazes de se moverem na sociedade brasi- Ieira e devem portanto ser protegidos. Isto significaria que, se conse- guissem se mover, nfio necessitariam de protegéo. A tutela ¢ vista como essa protecéo, geralmente pela Funai, como poder de coercéo. Tudo isto esté colocado em falsos pressupostos, Os indios nao tém privilé- gios, e sim direitos especificos, que sempre Ihes foram recdnhecidos, na medida em que eram senhores das terras que ocupavam. Alifis, é isso que fica claro na Constituigio, que coloca a Unido como guardii das terras indigenas. A tutela é na verdade uma tutela sobre as terras indigenas. Esta garantia do Estado ¢ independente de qualquer conside- rag&o sobre a convivéneia e conhecimento de que as comunidades indi- genas tém da sociedade brasileira. Posto em duas palavras: as terras indigenas so cobigadas e os indios organizados incomodam. Uma maneira expeditiva de resolver tais questées é declarar emancipados (isto é, nfo legalmente indios) 0s individuos que incomodam. A partir dai pode-se até pensar em impedir os lideres de voltarem a suas comunidades. Outra medida complementar é dizer que muitos grupos, por exemplo os do Leste e Nordeste, nao sfo indios e portanto nfo tém direito a terra. ¥ com este pano de fundo e estas ameagas pairando que se de- senrolou a reuniéo de Abril. Essa reunifio nfio pode ser subestimada. Sua grande novidade decorreu precisamente da mudanga nos termos em que se coloca, hoje, a questo indigena no Brasil: nfo se tratava 86 dos direitos indigenas como havia sido proposto, mas da participagéo dos indios na afirmagio e defesa destes direitos. Ou seja, foi a pri- meira reuniéio urbana em que os indios ocuparam todo o espaco. ‘Tanto ocuparam, aliés, que a reunifio de entidades de apoio acabou no sendo concluida, 0 que levou a declarar que nfo se havia real- mente realizado a 3." reunifio de entidades de apoio. A reunifio de abril foi essencialmente um espago de debate dos indios de todas as regides do Brasil, # dificil prever as direcdes que serio agora tomadas. As articulagées locais e regionais tém certamente ritmos e raz6es diferentes das nacionais. Resta defender o principio JA firmado da legitimidade da organizagio indigena. Paralelamente, é © papel das organizagGes de apoio tais como a nossa que tem de ser repensado. ‘Manuela Carneiro da Cunha Introducaéo Neste caderno foram reunidos os depoimentos apresentados du- rante 0 Encontro “indios: Direitos Histéricos”. Os textos aqui publi cados sio a transcrigdo direta desses depoimentos que foram selecio- nados com os objetivos de: (1) Permitir a apresentagio mais ampla possivel dos participan- tes e da diversidade e importéncia dos temas debatidos. (2) Apresentar uma selegéio dos diferentes momentos do Encon- tro: 0 debate puiblico, os grupos de trabalho por regilio, a eleicdio da nova diretoria da Uniio das Nagdes Indigenas as Tesolugées finais do Encontro. (3) Levar aos indios os temas e problemas discutidos durante a reuniao para reflexo e futuros debates. Esse caderno seria entio, uma oportunidade para um maior entrosamento entre 0 indios através do conhecimento de problemas enfrentados por comunidades indigenas em todo o territério brasileiro. Pensamos especialmente naqueles que ndo puderam assistir ao Encontro, esperando, através deste caderno, a mais ampla divulgacéo possivel. * Indios: Direitos Histéricos A idéia do Encontro surgiu durante a segunda reunifo de enti- dades de apoio & causa indigena de 1980, em Brasilia, por sugestéo de D. Tomés Balduino, Bispo de Goids Velho e vice-presidente do CIMI ‘© Encontro, organizado pela Comissio Pré-Indio de Sao Paulo, realizowse nos dias 26, 27, 28 e 29 de abril de 1981, com a participagéo de representantes de trinta e duas nacdes indigenas e trinta entidades de apoio.” Os propésitos da reuniio eram varios: (12) Sensibilizar a opinidio publica para a ameaga de alteragio da legislagio vigente (Hstatuto do Indio) que permitiria a emaneipagio compulsdria de indios. (2°) Retomar, apés cinquenta anos de esquecimento, uma visio no paternalista da politica indigenista, enfatizando que os indios tém direitos espeeificos que se prendem & sua condi- cdo histérica, assim como direitos comuns aos dos outros brasileiros, a saber o direito & organizagio e representagio. (3°) Ouvir e divulgar as reivindicagGes especificas de cada grupo indigena. B proporcionar a troca de informagées entre os proprios indios. (4) Realizar um encontro nacional de entidades de apoio & cau. sa indigena. Foram realizadas trés atividades publicas, um debate juridico ¢ duas apresentagdes coordenadas pelos indios. As sessées de trabalho foram muito importantes. Divididos re- gionalmente, os indios expuseram os problemas especificos de suas compnidades. Em sessGes plenérias, foi reatirmada a necessidade e a legitimidade de uma organizagdo indigena. Embora nao estivesse pro- gramado para o Encontro de Séo Paulo, os Iideres indigenas presentes decidiram realizar eleic6es para renovagao da diretoria da Unitio das Nagées Indigenas. Na sua grande maioria, os representantes indfgenas s¢ manifes- taram entusiasmados com 0 Encontro. Na assembléia final, coorde: nada paritariamente (indios e entidades de apoio) foram decididos pontos importantes, sempre com ampla disoussio. O sucesso dessa reunifio deveu-se ao fato de ter fortalecido a legitimidade das organi zagées indigenas e chamado a atengio sobre as ameagas de uma eman- cipagiio compulsérie. * Reunido realizada com o apoio financeiro da CEBEMO e MISEREOR e com a valiosa colaboragio dos Dominicanos que cederam as instalagbes onde se realizou © Encontro, u PROGRAMACAO Encontro de Liderancas Indigenas e Entidades de Apoio Lideres de 32 nagées indigenas reuniram-se em Sio Paulo, nos dias 26, 27, 28 e 29 de abril, para marcar um importante passo na sua luta conjunta em defesa de seus direitos. Auspiciados por entidades de apoio ao fndio e varias outras enti dades, sediados no Convento Dominicano, os Ifderes indigenas relata- ram seus graves problemas, reivindicaram seus direitos, apresentaram solugées € encaminharam propostas de organizacao prépria, delineando assim novos caminhos de luta. Paralelamente, 33 entidades que trabalham pela defesa dos direitos indigenas reuniram-se em apoio a esse encontro, na certeza de estarem presenciando um marco inédito na historia das relagOes entre indios @ brancos ¢ na histria da formagio de uma consciéneia pan-indigena. © Encontro, denominado “Indios: Direitos Histéricos”, foi organiza do em forma de depoimentos, debates, semindrios e assembléias, em alguns casos de caréter privado, em outros com a participagio aberta ao ptiblico. Abertura: Domingo, 26 de abril A abertura desse encontro foi feita no dia 26 de abril, domingo, &s 20:00 horas, no saguiio do Estédio do Pacaembu, pela antropéloga ‘Maria Manuela Carneiro da Cunha, presidente da Comissio Pré-Indio de Sao Paulo. Todos os lideres indigenas em seguida se apresentaram, confraternizando-se por essa ocasiso. Segundatetra: 27 de abril Neste primeiro dia de trabalho ficou organizada a forma desse encontro. Pela manhé constituiram-se quatro grupos de trabalho, com- postos por representantes indfgenas e associados & causa indigena, ‘que ficaram encarregados de levantar os problemas e as reivindicagSes de cada regido, nagéo indigena e entidades compreendidas nos grupos. Os quatro grupos de trabalho foram assim constituidos e repre- sentados: Grupo Sul KAINGANG (Rio Grande do Sul ANAT-Parané e Parand) CESINA GUARANI (M’Boi Mirim - Sio CPLSé0 Paulo Paulo) CTI-Sio Paulo ANAL (Porto Alegre) CIML-Porantim Igreja Evangélica de Confissio CIMLSé0 Paulo Luterana do Brasil (RS) GTMEPiracicaba ANAL-Tjui CEDOPI-Campinas 2 Grupo Nordeste-Leste XOCO (Sergipe) POTIGUARA (Paraiba) PATAXO (Bahia) PANKARARS (Bahia) KIRIRI (Bahia) XUCURU-KARIRI (Alagoas) TINGUL-BOTO (Alagoas) WASSU (Alagoas) XERENTE (Fazenda Guarani-MG) KRENAK (Minas Gerais) ANAT-Bahia ABARIo de Janeiro CPLSergipe CIML-Nordeste CPL-Alagoas CPLRio de Janeiro ANALRio de Janeiro GREQUI Museu Nacional-R Associagao Mineira de Defesa do Meio Ambiente Grupo CentroOeste BAKAIRI (Mato Grosso) CARAJA (Goids) IRANTXE (Mato Grosso) Grupo Norte KRAHO (Goids) TERENA (Mato Grosso do Sul) TAPIRAP# (Goids) XAVANTE (Mato Grosso) PARECI (Mato Grosso) SUIA (Xingu) Secretaria Executiva CPSP CTLSP GALIBI (Amapé) APURINA (Acre) MIRANHA (Amazonas) ‘TIRIO (Paré) TIKUNA (Amazonas) TUKANO (Amazonas) WAPIXANA (Roraima) MAKUXI (Roraima) CIMLNorte I CIMLNorte 11 CIMLPorantim CPL-Acre OXFAM Grupo Kukuro GAI-Belém OPI-Maranhio CIMI-MA/GO De mani, esses grupos se reuniram para tomar conhecimento e analisar ® situagio de cada povo representado, Wssa atividade teve prosseguimento nas manhiis seguintes. A tarde, houve um debate sobre 0 tema: “‘fndios: Direitos Hists- ricos”, com a participagio de representantes indigenas, advogados, antropélogos ¢ missionérios, A noite, foi exibido um documentério sobre os contatos da frente de atragio da Funai com os indios Arara que denunciava os interesses politico-econémicos que motivam tais expedicées. Em seguida, apresen- touse a cantora Marlui Miranda e Paulo Acdcio dos Santos, que cantou miisicas de seu povo, os Xocé de Sergipe. ‘Terca-feira: 28 de abril ‘A parte da manhf fol dedicada &s conclusdes dos encontros por regifio, tendo em vista a elaboragio de relatério sobre as diversas na. g6es indigenas presentes e suas principais reivindicagées. A noite, em sesso aberta ao ptiblico idealizada e realizada pelos indios, foram divulgadas demincias e prestados depoimentos. Alguns grupos apresentaram cantos e dangas caracteristicos de cada povo. 13 Quarta-feira: 29 de abril ‘A parte da manhé foi ocupada por debates das indios, separadamente. entidades @ dos A tarde foi realizada a assembléia final e nesta noite realizouse outra apresentacdo publica, nos moldes da noite anterior. Filmagem: Foi realizado um filme para a documentagio visual do seminério, Aequipe de filmagem foi formada por: Hermano Penna, Alba Figueroa, José Luiz Penna, Katia Coelho, Ricardo Mendes, André Luiz de Oliveira e Francisco Jorge Melo. PARTICIPANTES DO SEMINARIO “{NDIOS: DIREITOS HISTORICOS” Representantes indigenas: José Oliveira de Araujo — Apurin& Manoel de Oliveira — Apurind ‘Terencio Luis Silva — Makuxi Antonio Tiriés — Tirid Paulo Honorato — Tikuna Pedro Indcio Pinheiro — Tikuna Roberto Mossambite — Tikuna Alvaro F. Sampaio — Tukano Clovis Ambrosio — Wapixana Casimiro M. Cadete — Wapixana Arlindo Paula — Kaingang Durvalino Lopes — Kaingang Domingos Ribeiro — Kaingang Francisco Luiz dos Santos — Kaingang ‘Manoel Wera — Guarani Anisio Tupa Mirim — Guarani Paulo Tapirapé — Tapirapé Awatekantoi José Miguel — Tapirapé Ivo Woué — Xavante Renato Xavante — Kavante Lourenco Wa'aué Dubtuwe — Xavante Aniceto Tsudzaweré — Xavante Lino Tsere’ubidai — Xavante Manuel Tsdrié — Xavante ‘Segundo Xavante — Xavante Celestino Tserob’s — Xavante Mario Juruna — Xavante Lino Cordeiro — Miranha Felizardo dos Santos — Galibi Domingos V. Marcos — Terena ‘Mariano Marcos Terena — Terena Regina Miguel — Terena 4 Zilda Miguel — Terena Iza Moreira — ‘Terena Elias Terena — Terena Calixto — Terena Pahéri — Xavante Sipriano — Xavante Macedonio Maiavai — Bakairi Atamésio — Irantxe Carlos WaxiMauri — Caraja Wetague — Suid José A. dos Santos — Koes José A. da Silva — Potiguara José F. do Nascimento — Pataxd Antonio Branco — Guarani Mauricio Txidju — Guarani Pedro — Xavanite Simio Butsé — Xavante Cecilia — Guarani Joventina — Guarani Benedito F. Braz — Pataxd Menezes Celestino — Pankararé Manoel P. Xavier — Pankararé Lagaro G. de Souza — Kiriri Silvino Pereira — Kaimbé Milton Celestino — Xucuru Kariri Manoel Celestino — Xucuru Kariri Antonio Celestine — Xoké Adalberto da Silva — Tingui Paulo Acécio dos Santos — Xocé Hibes Menino de Freitas — Wassu ‘Manuel Pataxé — Pataxd Bibiano Xerente — Xerente Augusto Paulino — Krenak Adio Luis Viana — Krenal Francisco Queiroz — Kariri-Xok6 Matias Atomowe — Xavante Joao Tiarawa Carajé — Carajé José Pio — Tapirapé Entidades: Conselho Indigenista Missiondrio CIMI Maranhio CIMI Nordeste CIMI Norte CIMI Nortert CIMI Porantim CIMI Sao Paulo Associacio Nacional de Apoio ao tndio ANAfBahia ANAL Tjui ANALParané ANALPorto Alegre ANAERio de Janeiro Comissio Pré-fndio CPr-Acre CPI-Alagoas CPI-Maranhao CPLSio Paulo OPLSergipe CPLRIo de Janeiro Igreja Evangélica de Confisstio Luterana do Paulo Carajé — Caraja Aleixo Rodrigue S. — Krahé Milton Krahé — Krahé Olair Carajé — Carajé Acelino Alves — Pareci Jaime — Pareci Brasil TECLB Associagio Mineira de Defesa do Meio Ambiente — AMDA Secretaria Executiva das Entidades de Apoio Grupo de Apoio ao Indio - Belém Grupo de Estudos sobre a Questiio Indfgena- GREQUI CEDOPI-Campinas GTMEPiracicaba Museu Nacional - Rio de Janeiro OXFAM GTME - Santa Catarina CESINA UNB Associagio Brasileira de Antropologia-ABA Comissio Especial para Assuntos Indigenas — CRAI/ABA Centro de Trabalho Indigenista-CTI Comissio pela Criagio do Parque Yanomami- copy Grupo Kukuro de Apoio & Causa Indigena ‘Voluntirios que colaboraram na organizacio do Seminério: M. A. Rudge do Amaral André Caramuri Teixeira Aubert Paulo J. Almeida Neto Alexandre Gongalves Mello Noémia dos Santos Garrido Annete Serber Beatriz H. M. Penna Jofio Villa Real M. Ligia Trucco ‘Marta do Amaral de Souza Aranha Eduardo Soares da Silva Luiz Antonio Francisquetti Tone Soares da Silva Frangoise Andriollo Vilela Aurea Dulce Lagoz Jennifer S, Stuart Ewaldo Dantas Ferreira 15 DEBATE Indios: Direitos Histéricos ‘TEMARIO PROPOSTO 1 — Direitos dos indios enquanto um grupo diferenciado — justifica- tivas — paternalismo ou reconhecimento de direitos histéricos? a) Indigenato, enquanto titulo congénito, por oposigaio & ocupa. Gio, que ¢ titulo adquiride — reconhecimento dos indios como “primérios e naturaes senhores das terras” (Alvaré de 1-4-1680, ratificado pelo Decr. 1318, de 30-01-1854), 2 — Conseqtiéncias e extensdes do reconhecimento de direitos histé- rieos: a) Territério b) Autodeterminagéo (autonomia) 3 — Origem da tutela 4 — A tutela face aos direitos histéricos: restrigio aos direitos hists- ricos ou mecanismo auxiliar de defesa dos indios? 5 — Legislagdo atual e 0 reconhecimento de direitos histérieos: a) CONSTITUICAO BRASILEIRA b) CoDIGO CIVIL c} ESTATUTO DO £NDIO 6 — Posicgio da politica indigenista oficial — paternalismo — sujei¢io da Funai a0 Ministério do Interior — visio do problema do indio dentro do contexto maior da situacéo politica brasileira — caréter fechado e burocrético da Funai — Estadualizagio nfo é solugio, a) Posigéo da Funai — tentativa de modificagio do Estatuto do Indio — recentes press6es do Poder Executive — tutela como mecanismo de coagio — emancipacéio compulsria, ) Dentincias de abusos: Judicisrio x Executivo x Estado Parques Fundagées ©) Propésito da politica indigenista: integragiio x assimilagéio 7 — Reivindicagées concretas: a) Direitos individuais (Juruna) ) Direitos coletivos (Terras) ©) Autodeterminacdo/Organizagio (UNI) (pessoas relativamente incapazes podem constituir uma pessoa juridica?) 8 — Formas de reivindicagéo politica: a) Cidadania b) Organizacéo ©) Representacéo 4) Aliangas 9 — Quem fala pelo indio? 16 Nill ssid — participantes: Francisco dos Santos, Kaingang de Mangueirinha José Augusto da Silva, Potiguara da Paraiba ‘Hibes Menino, Wassu de Alagoas Alvaro Sampaio, Tukano do Amazonas Mario Juruna, Xavante de MT. Domingos Verissimo, Terena de MT Mariano Marcos, Terena de Brasilia Caio Lustosa, ANALRS Manuela: Nos ultimos 40 anos os indios tem sido tratados de forma paternalista. O que ¢ isso? 36 o seguinte: em vez de reconhecer os direitos dos indios, se os trata como privilegiados, como pes- soas que estéio com regalias, ou seja, se concedem coisas, se outorgam beneficios, mas nio se respel- tam os direitos, nfo se ouvem os indios. Se ha uma coisa importante aqui, é que esto aqui pre- sentes as liderangas que esto se constituindo ulti- mamente e que querem ter voz neste pais. Até cerca de 50 anos atrés se reconhecia que 0s direitos dos indios derivavam do fato deles esta- rem aqui antes dos colonizadores. O fundador do Direito Internacional, Frei Francisco de Vitoria, di- zia que nfio S6 os indios eram senhores destas ter- Alain Moreau Maria Helena Pimentel, CPI-SP Joao Pacheco, CPI-RJ Olympio Serra, ANAT-Brasilia Pedro Agostinho, Comissao de Assuntos Indigenas da ABA sunice Durham, presidente da ABA Dom Tomas Balduino, vice-presidente do CIMI Silvio Coelho dos Santos, antropélogo da UFSCAR Manuela Carneiro da Cunha, OPI-SP ras mas que o Papa nfo tinba autoridade para atri- buir os territrios da América aos portugueses ou aos espanhdis. Mais tarde, em varias leis se reco- nhecia que os indios eram os naturais senhores desta terra, tanto assim que eles nao precisavam pager tributo ou imposto nenhum, porque se re- conhecia que eles eram os verdadeiros senhores de suas terras e que seu titulo era um titulo de indigenato, nao necessitando assim de legitimagio. Dentro desta perspectiva é que deveriamos também pensar 0 atual artigo 198 da Constituicio que ga- ante as terras indigenas. Assim, pareceme que a tutela deveria ser entendida como um mecanismo auxiliar desse direito principal e histérico dos in- dios que 6 0 direito de suas terras. 7 Maria Helena: A questo 6 reconhecer que os indios tém dircito a essas terras, que essas terras sio deles, 0 que alids a propria Constituicio, que 6 a let maior do pais, reconhece. Mas na pritica, embora exists toda uma legislagdo que garanta es- ses direitos, temos assistido a um desrespeito re- gular, cotidiano desses direitos dos indios, quer por parte de grupos econdmicos, quer por parte do proprio érgio tutor. A questéo da tutela deve ser vista como um mecanismo auxiliar que nao pode ser transforma- do num meio de coagéo; ela sé tem sentido en- quanto sirva a manutencio dos direitos dos indios. A origem da tutela 6 a substituieio do papel do pai, 6-0 mecanismo pelo qual ha maior ligacio, maior vontade de proteger, isto 6, 0 tutor substi- tuiria 0 pai ©, portanto, os interesses de tutor ¢ tutelado deviam ser sempre coincidentes. Calo Lustosa: Eu gostaria de acrescentar ao debate, que 0 direito que se fez e se faz neste pais € obviamente um direito feito da sociedade domi- nante sobre aqueles que no processo de coloniza- 40 foram dominados. No entrechoque de interes- ses que 6 a sociedade brasileira, 0 indio padece sempre das mazelas desse direito na sua aplicacio conereta, Vemos claramente isso, no exemplo da responsabilidade civil. Quando € para a sociedade agir contra um indio assaltante, ela age com todo © rigor. Neste caso, 0 Estatuto do Indio ¢ total- mente esquecido, apesar de dizer que 0s grupos indigenas tém direito a aplicar suas prdprias san- 96e8. Quando se trata de aplicar a lei penal, que € uma lei de represséo, de punigéo, as garantias que 0 Estatuto daria, no séo aceitas. Mas, quando se trata de beneficiar as comunidades indigenas e seus membros, em caso de litfgios, em casos de di- Teitos pessoais como o da tutela — 0 caso Mario Juruna e o Tribunal Russel, manipula-se a lei de todas as formas possfveis para evitar que as comu- nidades ¢ seus membros se beneficiem de direitos que estfio claramente consagrados, quer no Esta- tuto do indio, quer numa Convencio Internacional, como a 107. (0 importante hoje ¢ dar ao indio as condigées de crescer, de exercer os direitos de reunifio, de par- ticipagdo no seu destino. Eu acho que somente a partir desse enfoque poderemos falar num direito dos indios endo um direito sobre ou contra os indios. Hibes Menino de Freitas: Bem, meu nome é Hibes Menino de Freitas. Sou vice-cacique da tribo 18 Wassu em Cocar, Joaquim Gomes, uma tribo do Nordeste, que por si sé em falar Nordeste, ja fala marginalizagao. Mas eu nao vim falar do Nordeste, vim falar da familia indigena do Nordeste, que sio exatamente 22 mil indios marginalizados, e atro. fiados os seus direitos. Hoje, como os senhores véem, a gente olha com alegria, cheguei na grande cidade Sao Paulo, pela primeira vez vejo uma coisa tao bonita, mas bonita mesmo. Eu nunca pensei vir aqui, principalmente para um encontro desse. Porque 0 indio é visto pela sociedade em determi- nados setores como bicho do mato. O leigo, o tolo, @ pessoa capaz de aceitar a doutrina imposta por outros, sem poder gritar, exigir os seus direitos, se € que existe um direito, o Estatuto de protegio ao indio, como nos esto falando aqui, os senhores que entendem de leis, porque eu sou leigo para leis. Eu sou mais ou menos vivido pra realidade do meu povo, pra realidade do indi, O indio nordestino que hoje esté em extingio. E no sé 0 indio nordes- tino. Se, de uma maneira ou de outra, nfo se mudar essa politica indigenista que se implants no Brasil atualmente, niio ser sé 0 indio do Nordeste que vai a extingao, mas, sim, todos 0s indios do Brasil, do Amazonas a todo 0 territério brasileiro, 0 indio daqui a 10 anos vai ser simples peca de museu. E a nossa finalidade no € essa. A nossa finalidade 6 reunir as liderancas dos remanescentes, pra gente vir com as propria palavras da gente aqui, dizer as dificuldades, as ameacas que a gente so- fre, as humilhagdes que a gente tem. Os senhores devemn ter observado, ha pouco tempo, a minha tribo teve um grande problema com os grileiros. Agente tem, tinha 4 léguas de terra doada por Dom Pedro II aos meus antepassados, pela luta deles na guerra do Paraguai. Esta area de terra j4 foi toda tomada pelos grileiros em beneficio do Pro- Alcool, em beneficio dos grandes latifundidrios do Nordeste que querem a terra para status... O indio, do nordeste e de todo o Brasil, quer a so- brevivéncia, porque pra gente interessa a sobrevi- véncia do diaa-dia, dos nossos filhos e dos que iro nascer. A comunidade indigena no Brasil nao foi criada por decreto. Néo foi criada por simples atos de assinatura, foi criada pela natureza, pelo nosso Deus. E essa comunidade indigena do Brasil poderd ser extinta por decreto? O nosso povo in- defeso no tem nem mesmo alimento para sobrevi- ver a0 dia-adia, porque suas terras jé foram usur- padas pelos grandes e poderosos fazendeiros e gri- leiros. Agora mesmo, na invasfo que teve na minha aldeia na 2. feira passada, os grileiros ameacaram que iriam 14 cercar a aldeia de qualquer jeito, cer- car armado de jngungo pra matar todo o mundo. Bu, como vice-cacique, o cacique, 0 pajé e o repre- sentante do conselho tribal nos reunimos para com- bater. Mas ndo temos nada, s6 temos pedaco de pau, enxada e foice, e a coragem que foi dada por Deus, que ndo foi comprada nao. Existe uma ponte de acesso & aldeia, vamos derrubar a ponte. Der- rubamos a ponte. Agora, vocés facam vigilia den- tro da aldeia e aqui na ponte, porque eu vou & cidade pedir socorro. Telefonei para Policia Fede- ral: por favor mande pelo menos um agente na nossa area pra verificar as condig6es, 0 que est acontecendo agora na Area. O delegado disse pra mim: “Eu sé poderia entrar na sua drea, se eu recebesse uma autorizagao da Funai, porque vooés sio de menor”, Eu digo: muito bem, se amanhé os grileiros entram na nossa 4rea e matam os nossos filhos, matam os nossos parentes, os senhores nfo vio poder ficar omissos, dizer que nio foram avi- sados, eu avisei com antecedéncia. E eles néo fo- ram. Eu procure! a imprensa, a imprensa foi de imediato, notificou as barricadas, conversou com 0 pessoal, fizemos entrevista. 5.4 feira a polfcia bateu na drea, a Policia Federal. A Policia Militar foi na 22 feira acompanhada pelo prefeito de Joa- quim Gomes, Gendevaldo Cicero dos Santos; che- gou Ié na aldeia, a ponte estava derrubada pra nao dar acesso, porque os jagungos entrariam de ca- minhio, armados, e matariam o pessoal na aldeia, mas a pé eles nfo entravam porque eles néo sio doidos. Podem ser doidos, mas nao sao bestas. Ai 0 que € que 0 delegado e 0 preteito fazem — dizem: “No, vamos levantar a ponte, porque essa ponte aqui dé acesso a interesse de Ae B e ld vai. E vocés niio se mexem, vocés nao vaio ajudar?” E 0 meu povo disse: “Nés nio ajuda, nds derrubamos ola, e se tiver necessidade, a hora que o senhor der ‘as costas nds derrubamos de novo”. Ele disse as: sim: “Se vocés se meterem a doidos, lembrem-se ‘que uma rajada de metralhadora mata vooés todi- nhos”. Quer dizer, premeditou a morte de uma co: munidade indigena, e no bastando, no outro dia, procurou @ imprensa e me denuneiou como agita- dor. Bu sou agitador?! O cara entra na minha casa, leva meus méveis, dé na minha familia, meus pais, eu vou defender os meus direitos, sou agitador. Eu The pergunto: por que isso? Sera que a Constituicio, a lei dos brancos manda que isso seja imposto & uma comunidade indefesa, que nao sabe nem ler nem escrever? Existe uma série de erros em toda administragao do Governo para com os indios. Nés somos fndios. Eu repeti essa frase no Congreso ¢ repito aqui — NOS SOMOS INDIOS — e s6 nés € quem devemos dizer 0 que queremos! Nao é fazer como ha pouco a Funai fez com a tribo dos Potiguara: invadiu a aldeia, fez um projeto mal bolado aproveitando-se da cumplicidade do governo do Estado, implantou um projeto que néo satisfaz © interesse daquela comunidade e quer que o, pes soal fique caladinho, agradega a Deus, porque a Funai est fazendo alguma coisa. Nao é bem isso nao. A gente esté aqui para isso, para, diante dos senhores, denunciar a mio de ferro dos grileiros e do poder dos grandes latifundidrios do Nordeste @ om todo o Brasil, massacrando e marginalizando 0 indio cada vez mais. E olhe, que se eu fosse falar de toda a problemitica do indio do Nordeste aqui, eu ia tomar muito tempo, porque existem dezenas de tribos que estao tendo os seus direitos atrofia- dos pela justiga que a Funai diz implantar. Mas eu no vou me alongar. Pois 0 que interessa é que a gente sain daqui com um resultado. positive. Eu prefiro que os senhores depois me procurem para eu dar mais uma informagio correta, Agora, fagam um apelo a quem é de direito. Se é uma politica humana, como a propria declaragéo dos direitos humanos diz que a familia é a base da sociedade, e como tem 0 direito e protegao do governo. A co- munidade do indio é uma sociedade. 6 uma ta. milia, Nao queremos ser tratados como esmoléos, nfio queremos ser tratados como bicho, nao que- remos ser tratados como pessoa de outro planeta, nfo queremos ser tratados como leprosos. Quere- mos ser tratados como gente, com nossos direitos, queremos que as autoridades olhem para a gente da melhor maneira possivel e digam: “Vocés tém 0 direito, vamos dar o direito de vocés”. Porque os direitos tém que ser conseguidos através daquelas pessoas que sabem. Eu no posso dizer quais sio ‘0s meus direitos todos. Mas no é isso que estamos querendo, nfo é luta. Queremos os nossos direitos. indio luta pelas terras, mata e morre. Porque geralmente, até um tempo atrés, principalmente a imprensa que era controlada pelo Governo, quando havia um massacre de indio e branco, ela nunc Gizia “branco entrou armado e tentou matar indio, indio se defendeu”; ela dizia “indio violento mata branco” e ai metia no jornal desse tamanho! Ai pessoal dizia: “Sio bicho. mesmo, n&o vai nao, sio bicho mesmo, so bicho, morde...” Mas somos humanos igual a vocés. Queremos fazer um apelo aqui que, por favor, ndo deixem uma tradig&o, no deixem uma comunidade que hé tantos anos Iutou pelo engrandecimento dessa patria, e que de fato @ de direito, o indio 6 0 verdadeiro dono da Nagao. Porque nenhuma pessoa chegou aqui para desco- 19 brir o Brasil. Isso af é 56 histéria feita na gritica do Governo. O portugues, ou quer que seja, chegou. aqui, jé encontrou a gente nessa terra abengoada por Deus, ¢ encontrou os nossos antepassados aqui; mas 0 que a gente vé aqui 6 que aquelas pessoas que se propdem a lutar em defesa dos indios, so tratados de agitadores, de tal e tal. Eu nfo entendo porque. O que entendo 6 0 seguinte: a minha comu- nidade esté em dificuldades. A comunidade, a fa- milia indigena no Brasil esté em séria dificuldade, esta num processo elevado de extingao. Eu apelo para que se faca alguma coisa, senhores que tém a lei, que sabem das leis, por favor. Pedro Agostinho: Para fazer valer os direitos histéticos dos indios as suas terras e & protegao garantida por lei, a questo central é saber exate- mente 0 que é 0 indio. Gostaria, para isso, de con- ceituar trés termos que considero importantes: in- tegragio, assimilagio e indianidade. Para os antro- pélogos, a palavra integragio nfo é um proceso que leva 0 indio ao nfio-indio; é um processo du- rante 0 qual as minorias etnicamente diferentes se articulam com o sistema da sociedade nacional, mas continuam a ser, dentro desse sistema, entidades perfeitamente distintas e claramente definidas que, mesmo transformadas culturalmente, nfo dei- xamn de ser indios. © que vemos no discurso polt- tico oficial € a anulagio de qualquer tipo de dis- tingdo entre indios e néo-indios, 0 que pressupée a assimilacéio. A prdpria lei diz: no é por terem sido reconhecidos como plendmente capazes do ponto de vista do Direito Civil, que os indios dei- xam de ser indios e, nesta medida, continuam a ter pleno direito as suas terras e & protegdo me- diante 0 instituto da tutela. Neste sentido, para se poder definir se alguém ¢ ou no indio, néo é por meio de critérios como a Funai, revelando mais uma vez a incompeténcia que Ihe é caracteristica, esta tentando aplicar. Isto néo é possivel fazer do ponto de vista cientifico. Essa indianidade que per- siste s6 pode ser reconhecida através da prépria afirmagao ritual, cultural e lingtiistica do grupo; portanto, impossivel por meio de critérios de in- dianidade. De qualquer forma, a aplicagio desses critérios parece ser dirigida a poder manipular a classificagao de pessoas como indios e n&o-indios, de modo a submeté-los aos interesses da sociedade dominante para negar-Ihes o direito as terras. Deixo aqui a dentincia que isto jé est sendo feito com indios do Nordeste, especificamente os Pankararé, cuja identidade étnica esté sendo negada pela Fu- nai, apesar de serem mais de mil pessoas. Por- 20 tanto, temos que estar muito alertas para essa ten- tativa de negar que alguém seja indio; mesmo que © indio seja um dia emancipado, num ato de vio- Téncia, quer queiram ou nao, ele continuard indio. Marcos ‘Terena: Tem-se comentado muito ulti- mamente, tem-se falado bastante no indio, 0 pro- blema da terra, questo da emancipagio e integra. io; enfim, diversos assuntos que muitas pessoas que no entendem o que seja isso se confundem. E justamente esse tem sido o trabalho da Funda. 0 Nacional do {ndio ultimamente. Nao digo da Funai, em si, porque a Funai é um corpo, é um organismo federal que foi criado principalmente para dar uma assisténcia adequada e necesséria a0 indio no Brasil. Creio que 0 ponto falho nesse es- quema 6 0 humano. Temos também a legislagio, a lei 6001, que fala dos diversos direitos e deveres do indio brasileiro e também da Funai como 6rgio tutor. No entanto, essa lei esta ai, ele acabou de explicar um ponto de vista da lei. No entanto, a interpretagdo aqui é uma, se vocé I o Estatuto do ndio voes pode ter uma interpretagdo também. E se voc for ouvir 0 corpo juridico da Funai, vai notar que ela também tem uma outra interpre: tag&io. Entio, dessa forma eu acho que o tempo esté andando muito répido e o indio tem que acor- dar 0 quanto antes porque ele esté em fase final de vida, De todas as formas, ultimamente, se tem debatido os diversos caminhos que a Funai esté utilizando, usando o préprio Estatuto do Indio con- tra o indio. Como é que vou explicar isso para vo- cés? Eu nfo sou jurista, eu néio sou antropélogo. Eu sou um indio, e gostaria de explicar para vocés alguma coisa pritica e concreta do que tem sido realmente esse grande drama para nés, os indios do Brasil Eu sou estudante 1é em Brasilia e, ha pouco tempo atrés, a Funai, usando argumentos do Esta- tuto do Indio, disse que o indio nao poderia estudar em Brasflia porque era anti-cultural para o indio estudar em Brasilia, porque Brasilia era a capital do pais e 0 centro politico do pais também. Ora, 0 proprio Estatuto do fndio diz que a Funai tem que dar subsidios, condigdes para que indio adentre a sooiedade brasileira, gradualmente e harmonio: samente; entio, 0 que.eu entendo por harmonia, é buscar o bem comum, interesse do indio, o inte- esse do branco, para que o indio se ajuste, se adapte @ sociedade brasileira. Entio veja que a propria. Funai utilizou 0 Estatuto do tndio para usé-lo contra 0 proprio indio. Bles se esqueceram, porém, que o indio também é bo zi, brasileiro e que 0 indio também é gente, e, como gente, como voces, como qualquer um aqui presen- te, 0 indio também sente dor no coracdo, sente amor no coragio, sente alegrias, sente tristezas © sente vontade de aleangar um ideal também. Tudo isso foi exposto a eles, mas jamais ouvimos uma palavra de apoio, uma palavra de consideragio da parte daquela direcdo; palavras essas que anterior- mente, em outras gestGes, tinhamos ouvido: pala- vras de incentivo para que adentréssemos a socie- dade envolvente e que um dia nos torndssemos nés mesmos os dirigentes de nossos destinos. Por isso eu disse no infcio que a Funai é um organismo, mas que na verdade o trabalho da equipe humana no tem sido adequado para o humano que € 0 indio. Outro ponto, a questéo de indianidade. UIti mamente temos ouvido muito falar que o indio, do ponto de vista juridico, detxa de ser indio, e conse- aiientemente deixa de ter os direitos de indio. Se por exemplo eu fosse um indio emancipado, eu néio poderia me colocar aqui na condicio de indio Entéo, quando 6 que o indi poderia atingir uma autodeterminagéo, se ele é tolhido pela emancipa- ‘do? L6gico, nés buscamos uma integracio & socie- dade. Uma autodeterminagao, como um povo que possui uma cultura diferente, uma lingua dife rente, mas que também quer compartilhar da so- ciedade brasileira, como brasileiros que somos. | ALVARO TUKANO, MARIANO MARCOS TERENA € MARIO JURUNA, A Funai esté pensando em criar critérios de indianidade, esté pensando em mudar o Estatuto do Indio, esté pensando em fazer projetos ou ela borando projeto de emancipagéo ex-oficio, ou seja, a critério da Funai. O mais interessante de tudo isso é que a Funai usou o servigo secreto brasileiro para trabalhar nesse sentido. Conseqiientemente, 0 fndio passou a ser olhado, a ser visto como um elemento nocivo as questées de seguranca nacional; interessante como é 0 critério do que seja seguran- a nacional aqui no Brasil. No entanto, eu penso que se eu fosse estrangeiro, eu teria as portas do Brasil & minha disposic&o. 16 lamentével isso, e profundo esse pensamento, porque, enquanto pos: suimos um Brasil rico em todos os setores, quer no subsolo, no mar, na terra, possuimos, entretanto, uma nagéo muito pobre. Assim sendo, o indio tam- bém como minoria racial tem passado por esses vexames. Isso ja faz 500 anos e 0 indio tem di- minuido a sua populagao. E 0 que nés estamos pro- curando agora, nesse Encontro, nessas oportunida- des? Eu penso que o tempo é curto e néio podemos ficar discutindo pontos de vista, como se a gente estivesse atirando uma pedra na Funai, a Funai atira uma pedra na gente e assim aquela guerrinha que nao leva a nada... N6s temos que sentar, dis- cutir e agir. Agir, nfio em sessbes secretas, como eles tém agido, mas abertas ao publico, a0 povo 24 brasileiro que esta buscando essa liberdade dentro de si mesmo, essa liberdade de pensamento, de ambig6es, de ideais que também o indio possui. Nés gostariamos que fossemos mais objetivos, por- que se a gente comeca a atacar, atacar, a gente estd dando subsidios para eles se prepararem; e vocés sabem que uma doenca que 6 recolhida, quando ela volta, ela volta mais forte. Entio, nfo podemos perder tempo, néo podemos ficar discutindo pon: tos de vista técnicos; eu acho que nés devemos ser mais objetivos, eu apresentei aqui assuntos concre- tos que ocorreram comigo, com outros indios e que tém ocorrido quase diariamente. Ouvimos ago- ra algumas dentincias, algumas... e quantas nao temos sabido delas? Fu acho que voe8s que esto aqui podem, de alguma forma, dar a sua partici pagio, para que o indio, mais do que nunca, bus- que 0 cumprimento dos seus direitos. Vamos ver como € possivel fazer cumprir o Estatuto do Indio. Domingos Verissimo: Desde a época da cold- nia os fndios estio sofrendo, mas a luta continua, porque nfo esta atingindo apenas as terras dos indios, mas também sua cultura, que é o principal na existéncia dos indigenas. Os indios estio sendo destrufdos, dizimados, desaparecendo. Entéo, é muito importante estarmos aqui reunidos para que possamios lutar e conseguir alguma coisa. Os indios esti sendo perseguidos por todos os lados, inclu sive nfo pode mais falar, esté proibido de se orga- nizar. HA pouco tempo sai no jornal que os indios esto proibides de se organizar. Por que? Seré que nfo é um direito nosso, como brasileiros? Ou somos estrangeiros? Entéo esté nas maos dos se- nhores uma orientaglio que nds precisamos, para levar & frente a nossa luta. D. Tomis: O objetivo deste Seminario é politi- co, um instrumento que criamos para ouvirmos isso, que 6 0 clamor dos fndios, que esta abafado e eles estio cada vez mais encurralados e, como disse Marcos Terena, numa posi¢éio pior que os estrangeiros. Hstrangeiros grandes tém as portas abertas; 0 Projeto Jica esté atraindo milhares de japoneses e 05 indios nesta condig&o de pessoas consideradas perigosas para a seguranga nacional. Em contrapartida, existe uma forga que é a nossa consciéncla, juntamente com a consciéncia dos in- dios... eles esto pedindo aqui apoio dos antro- pélogos, dos juristas © vemos que esté comegan- do-se a fazer um pouco de luz nesta historia dos direitos historicos dos indios. 22 Nos jé nos beneficiamos um pouco com o ga- nho de causa por ocasifio da saida de Mério Juruna para a Holanda. Agora nds temos essa lei ntimero 6001 que, embora feita por nfio-indio para indio, colocando 0 indio como ausente, tem algo de post- tivo e nds temos que ver o que essa lei pode servir para a libertagéo do indio. Para 0 indio no 6 s6 a sua sobrevivéncia, mas a sua condigio de outro, de comunidade que tem a sua identidade propria. Neste ponto acho que a participagdo da Igreja também tem a sua histéria. Antes da década de setenta era uma pastoral mais genérica, de catequese. Depois, vem vindo a nossa Pastoral Indigenista, tomando um cunho diferente, Neste sentido, 0 documento “A Igreja e os proble- mas da Terra” (Itaici-1980) 6 0 mais explicito e diz: “apesar da vigéncia do Estatuto do Indio, os confli- tos em dreas indigenas se tornam cada vez mais violentos e generalizados”. Eu acho importante ci tar isto porque a consciéncia da Igreja é um aliado @ mais, Tais conflitos se ligam aos seguintes fatores: nfo demarcagéo oficial de suas terras; invasdo de territérios j4 demarcados; comercializacéo ¢ apropriago pela Funai dos recursos de suas ter ras; desconhecimento das exigéncias especiticas do relacionamento do indio com a terra, segundo sua cultura. Para coneluir, lei nés temos, 0 que falta a sua aplicacio, pois 0 Governo, sabendo que a lei 6 favoravel a0 fndio, tem investido em diversas oportunidades contra o Estatuto do Indio, pro- curando sua modificacéo. Do tempo da falsa Eman- cipagéo, agora com os critérios de indianidade, a esse documento meio conhecido de todos nés que impede a organizagho das nagées indigenas. Entio, na minha opinido, nés temos que acreditar na forea da consciéneia ptiblica, no nosso povo junto com a consciéneia dos nossos irméos indios. Manuela: Quero apenas lembrar que a lei exis te e 6 fazer com que ela seja cumprida, O préprio Estatuto do Indio, quando trata da tutela, diz que (© indio tutelado precisa da presenca da Funai, seu tutor. Mas a prépria lei prevé que naqueles casos que o indio revela consciéncia do ato prati cado, e néo sendo prejudicial aos interesses dos indios, essa obrigagio de ser tutelado nao existe; a propria lei quando fala da tutela nfo diz que o indio nao pode se manifestar. Toda a idéia da tutela 6 que ela sirva de protecdo. Portanto, 6 muito claro que essa lei existe € nés precisamos encontrar to- dos os mecanismos para aplicé-la, ‘Mério Juruna: Nos somos chamados de tute- lado, n6s somos chamados de menor. A FUNAI NAO Vi O INDIO COMO PESSOA, como adulto. Nin- guém entende o indio como adulto. A Funai pode curprir a sua obrigacdo aplicando melhor o Es- tatuto do Indio e nfo passar por cima e fazer amea- ca ao indio com o Estatuto. Por que a Funai cha- ma de agitador quem quer defender 0 indi? Entéio nés podemos chamar a Funai de traidora. O pr6- prio Estado tem que reconhecer 0 indio como bra- sileiro porque ninguém tem mais direito do que nés. © Governo esté tomando terra de indio, branco procurando indio para matar, roubando a terra do indio, Se a gente nfo existisse aqui no Brasil, como que © branco faria para proteger o pais? Ainda bem que tem muito indio esparramado junto as divisas do pais. Se existisse sé branco, o que eles fariam? Eu acredito que o estrangeiro ja teria to- mado a nossa terra, O préprio governo brasileiro como empregado do estrangeiro e nés emprega- dos do governo brasileiro. Parece que nds indios prasileiros, somos escravos do branco. Ends nic somos escravos de ninguém. Indio é pessoa, 0 indio quer ser ouvido ¢ respeitado. Francisco dos Santos: Muito obrigado a todos que esto interessados por este povo pobre e hu- milde, mas que 6 0 verdadeiro dono deste Brasil. Toda essa luta de sacrificio para a defesa de nos- sas terras, para a educacdo, a satide, é para que indio tenha sua sobrevivéncia, sua terra legalizada, porque a terra é a nossa vida. Tudo que eu quero para os indios, também quero para os caboclos © posseiros que vivern quase na mesma situagio que nés, dominados pelas multinacionais e pelo capitalismo, E os nossos tutores no querem que ‘a gente venha a esses encontros, para nfio aprender ‘a conhecer nossas dificuldades. Espero que voces sempre permanegam com essa coragem de lutar por um povo sofrido, Muito obrigado. Olimpio Serra: Nos estamos buscando aqui o reconhecimento dos direitos dos povos tribais en- quanto nag6es, enquanto povos. # um direito que no se vislumbra na Histéria, Que eu. me lembre, 86 em duas oportunidades o Estado reconheceu os povos indigenas enquanto povos: no final do sé- culo XVITT quando foi assinado um tratado com os Guaicuru-Kadiwéu para a defesa das fronteiras com © Paraguai; ¢ outra, uma declaracio formal de guer- ra de Dom Jofio VI aos Botocudos de Minas Ge- rais. De resto os fndios foram tratados, como defi- niu muito bem Mario Juruna: brasileiros escravos dos brancos, Nesses 400 anos de Histéria os indios passaram mais ou menos 300 como escravos. Com isso podemos concluir que 0 pensamento do Esta- do brasileiro, em relagao aos indios, sempre foi buscar que eles se transformassem em nio-indios. Fosse pela morte étnica, para servirem de forga de trabalho, como escravos 7u trabalhadores assala- riados, fosse a morte bioldgica. Nao podemos per- der de vista as tentativas de assassinato étnico, co: mo essa. da emancipagiio ¢ a do néo-reconhecimento dos povos indigenas enquanto povos. Durante todo este més de abril eu fui levado a viver a tragédia de uma familia indigena que perdia sou filho nos hospitais de Brasilia, com uma participagao minima dos érgios que Ihes deviam prestar um minimo de conforto. A Funai s6 apa- receu em duas ocasides: uma para assinar a guia de internagfo, outra para fornecer a documentacio de 6bito. Em 1981, faz dez anos que a Funai langou 23 seu primeiro programa de satide. Busquel informa- Ges na Funai e fui informado de que esse pro grama de satide no existe mais. Meu desespero aumentou, uma vez que nesses dez anos, quando a Funai tinha esse programa, nds assistimos em 73 os Kreen-Akarore com 360 pessoas e quando chegaram ao Parque do Xingu, em 1975, eram ape- nas 70. Outro exemplo é 0 dos Yanomami, que, apés a passagem da Perimetral Norte, algumas al deias sumiram. Eu percebo que nesta mesa nao ha nenhum médico. Nao estamos preocupados com © assassinato biol6gico dos indios, e deve ser uma preocupagao constante. Dai minha proposta: que se avalie os 10 anos de programa de satide da Funai. Quanto ao assassinato étnico, as liderangas in- digenas levantam mais uma vex a necessidade de se reconhecer os povos indigenas enquanto nagdes. ‘Vamos iniciar uma campanha pelo menos para que os indios tenham o direito de se organizarem. A Unido das Nacdes Indigenas ¢ hoje uma iniciativa das liderangas indigenas, mal vista e perseguida pelo governo. Portanto, é importante que tomemos essa bandeira, talvez a mais importante de toda a histéria do indigenismo brasileiro: 0 direito dos indios a se organizarem. Hibes Menino de Freitas: Nao adianta a Funai dizer: “Nao, eu nao tenho culpa, eu apenas cum- pro a lei”. Ela propria burocratiza o negécio. Nés vemnos que realmente estamos querendo chegar a uma organizagéo com liderangas autenticamente indigenas. Para isso temos capacidade, temos ma- terial humano para resolver nossos problemas. Aqui vocés podem contar dezenas de liderangas in- digenas que tém condigdes de sentar’ numa mesa ou numa tenda, numa palhoca & beira da fogueira, e dizer: “o que é que a gente quer?” Eu garanto que ninguém vai dizer: “desejamos fazer uma bom- ba atémica ou roubar a férmula da bomba de néutron”; a gente deseja uma férmula para dis- cutir os nossos meios de vida, pra que a gente con- tinue sobrevivendo. E sem medo de Seguranga Na- cional, grileiros e Policia Federal. Porque sé digo uma coisa: todos aqueles que hoje tentam ignorar © direito sagrado do indio, um dia a justica pai- rard sobre os oprimidos e mostrard a realidade, Joao Pacheco: Em primeiro lugar, parece bas- tante importante nés nos perguntarmos em que medida as entidades de apoio tém tido a capaci dade efetiva de contribuir para a aplicagao desses direitos histéricos. Os movimentos de defesa do 4 indio surgiram prinoipalmente a partir da campa- nha contra a emancipacéo do indio e a minha per- gunta 6 até que ponto nés conseguimos arquivar esse projeto. Porque 0 que temos visto é que esse projeto de emancipagéo foi efetivamente condu- zido & prética nos mais variados aspectos. A pré- pria militarizagéo da Funai, através de coronéis sem qualquer contato com soviedades tribais, que nunca viram indio na vida, mas no entanto sio pessoas eficazes enquanto técnicos da Seguranga ‘Nacional e outros organismos. No entanto, me pa- rece que nio devemos partir para uma viséo nega- tiva da questio; precisamos, sim, ver que 0 movi. mento de apoio & causa indigena deve ser integrado a um processo muito mais amplo, de real demo- cratizagéo da sociedade. O préprio objetivo deste seminétio 6 fazer com que os oprimidos se mani- festem, que as populagées vitimas de politicas ela- boradas nos Gabinetes de Brasilia ou no Conselho de Seguranca Nacional partam realmente para se- rem ouvidos por toda a populagao brasileira. Caio Lustosa: A meu ver, com o surgimento dessa nova manobra da Funai, de estabelecer os chamados critérios de indianidade, hé uma exigén- cia da nossa parte que é levar esse projeto a pilbli co e mostrar a nivel de opiniao publica, o que ele realmente representa: mais um atentado contra os direitos dos indios. Eu sugeriria que saisse dessa reuniéo um apelo, no sentido que antropélogos, advogados, as entidades pré-indio e a Unitio das Nag6es Indigenas instituissem um tribunal interno de efeito moral como 0 Tribunal Russel. Eu tenho a impressio que seria mais uma forca moral para nés ganharmos espago e chegarmos ao ponto fun- damental que é a autodeterminagao dos povos indigenas. Alvaro Sampaio: Senhores, eu sou Tukano do alto Rio Negro. Em novembro do ano passado eu e Juruna estévamos na Holanda a defender os nos- sos direitos humanos, direitos indigenas. Foi um fato que marcou a Histéria. Foi uma viagem longa e dificil onde todo 0 povo brasileiro acompanhou a grande batalha do Mario Juruna enquanto que eu, Alvaro Tukano, considerado brasileiro no sei por- que, jé que Juruna também nasceu dentro do Bra- sil, tive @ facilidade de sair do Brasil. Mas sou in- digena para minha nacio e purissimo; sou Tukano ¢ falo minha lingua. Levamos uma mensagem a0 povo europeu, aos homens que conseguiram entender 0 nosso direito. Nao fomos falar da vida alheia, nem fazer propa- | ganda comercial, e sim falar de uma vida que senti- mos, que vocés brancos no sentiram, Falamos so- bre as nossas derrotas, as perdas de vida, os nossos planos, 0 que queriamos fazer, mas néo foi suficien- te, Chegando 14 na Holanda eu soube que a Funai nfo reconhecera a minha pessoa como entidade in- digena, mas disseram que eu era um filho de norue- gués. Seré que eu nasci naquela terra fria? Sei, pelo contrario, que nasci numa pequena aldeia cha- mada Sao Francisco, que fica nos confins do Bra- sil, no Amazonas... Na verdade, eu confesso a voces aqui, que nasci no norte do Brasil, isto 6, no noroeste da AmazOnia, onde existem cerca de 33 grupos indigenas, cada qual mantendo a sua fungéo mitolégica e 0 direito de sobreviver na terra em que nasceu. Mas esta questo de terra nao é ques- to somente do indio; se 0 indio ¢ conhecido pelo povo brasileiro, por descendentes de estrangeiros, 6 porque é 0 nosso problema comum. ‘Uma vez em Manaus eu estava assistindo a uma reunifio com varios lideres indigenas, quando, no final da reunifo, s6 porque sabia ler, assim fui obrigado a ler uma frase que marcou toda a his- t6ria de minha vida: “A AmazOnia s6 seré nossa quando for habitada por brasileiros convictos, nio por indios que nao tém nacionalidade”. Seria esta definigéio de grandes homens brancos? Os bran- cos que se dizem benfeitores nossos? Serd assim? Creio que nfio, meus irmios. Na Amazénia voces sabem como é a histéria. fndios que morrem, in- dios que vio morrer como aqueles que j4 morre- ram. Porque no tempo da colonizacio calcula-se cerca de um milhio de indios e hoje nds somos menos de 200.000 (duzentos mil). Morremos, digo, morreremos todos se conti- nuarem ainda a mexer com 0 Estatuto do Indio. # a pior coisa que conhecemos na nossa histéria. ‘Vooés cresceram. Vocés fizeram grandes cidades como essa aqui, nao sei quantos milhées existem. Eu na minha aldeia de Sio Francisco, nés somos menos de 90 pessoas, e onde que foram os outros? Os outros aprenderam a falar a lingua de voces, ‘0s costumes de vocés, aprenderam e néio souberam mais viver dentro das aldeias. Aprenderam a reli- gifio de voces, e a nossa que deveria ficar com a gente, morreu; € por isso que 0 nosso povo brasi- Ieiro nfio sente mais coragem de ficar na tribo para unificar toda a idéia indigena. Essa é a opor- ‘tunidade tinica que nds tivemos, em toda a Hist6- ria brasileira. Dentro de Sao Paulo, e de todo o Brasil, conseguimos amigos brancos que nos pro- porcionaram esse encontro. Como todo indio oportunista que somos pe- rante vocés, eu peco em nome de muitos lideres indigenas que nic puderam vir aqui, vocés brancos Jevem para casa de vocés, digam que nés somos brasileiros também, nés somos com sangue dife rente de pessoas estrangeiras, quer dizer, purissi- mos brasileiros. Temos direito de viver em nossa terra. Como povo temos o nosso direito de nos or- ganizarmos, fazer nossas reivindicagdes. Porque somos nds que sentimos. Nao sio vocés brancos que sentem @ nossa responsabilidade, porque vo- 8s so outros para nés. Isso em sentido indigena, mas todos nés devemos caminhar. % por isso que n6s chegamos aqui, viemos pregar uma democra cia, uma democracia de bem-estar comum, defen- der a terra, Essa 6 a nossa palavra. Vocés devem defender 0 indio, escondé-lo das leis que levam a populagao indigena ao genocidio. Leis que matam 0 pobre, que matam o menor, e devem também cor- rigir esses grandes homens que armam o menor para matar o inferior ainda. O indio nunca faz uma, palestra assim na tribo minha. Uma reunisio camu- flada onde s6 duas ou trés pessoas fazem leis, como acontece ultimamente. Como D. Tomas Balduino falou, eles fazem isso porque eles pensam que nds somos bestas ainda. Segundo ele disse também, 0 escondido é sempre o primeiro que nds vemos. Nos nunca vamos fazer dos filhos de vooés, escravos. Vamos primeiro educar vossos filhos, educar no sentido de amar a nossa Pétria, procurar defender cada qual os seus direitos coletives também. Eis a minha palavra a vocés presentes. ‘Manuel Celestino: Senhores presentes, aqui me apresento como cacique da tribo Xucuru-Kariri em Palmeira dos indios, Alagoas, chefiando 900 indios na minha aldeia e presidente do Conselho Indigena das tribos de Alagoas. A luta em Palmeira dos fn- dios é a reivindicagéo de uma légua de terra de- marcada antigamente, em 1822. Esta luta vem nos trazendo uma vitéria de 170 anos, numa retomada de uma mata cafurna, o terreiro sagrado de nossos antepassados. Foi feita a demarcacio, mas apenas de 389 tarefas de terra, quando ld é uma légua em quadra. Isto foi uma reivindicacio, naquela época, feita pelos nossos antepassados que lutaram na guerra do Paraguai, saindo de Palmeira dos fndios 100 guerreiros, quando voltou somente um indio. Entio, com toda luta, com toda briga, com todo sangue, assim mesmo conseguimos com a nossa coragem entrar numa mata, que era denomi- nada “mata da prefeitura”; foi preciso mesmo mui- ta coragem, quando alguém dizia: “Vocés entram mas vao sair pelo cansaco da fome”. Entdo eu en- 25 trando em contato, gracas & Legifio Brasileira de Assisténcla que nos ajudou, e a Ordem dos Advo- gados do Brasil, e os direitos humanos, fot quem nos favoreceu, quando os indios, até criancas no- vas, doentes, chegaram a ser operadas em Maceid, Com tudo isso, a Funai chegou, assinou um do ‘cumento junto comigo e o prefeito para fazer esta legistagao dentro de 60 dias. Quando passou 11 me- ses para chegar em nossas mios essa legalizagio. Ento a luta néio acabouse, a luta continua junto com os parentes, junto com os irméos, junto com os estudantes, antropdlogos e universitérios. Cada vez mais pedimos apoio & nossa Federacio indi gena porque achamos que seré necessdrio para agirmos nos nossos problemas entre os nossos pa- Tentes e os nossos irmios indios. Em Alagoas represento e grito nfo s6 pelo direito de Palmeira dos tndios, como tam bém dos TinguiBots. Os Tingui de Terras Novas néo esto sendo reconhecidos como acabou de apresentar 0 nosso amigo Hibes, que é Wassu de Joaquim Gomes. Entéo, somos cinco tribos ala- goanas que estiio reivindicando os seus direitos. Te- mos dois postos de atracio em Alagoas, Palmeira dos Indios e Kariri-Xok6, mas os outros precisam também. Nés estivemos em audiéncia nos dias 12 e 18 no Recife, junto & propria Funai que nos reu- niu para uma assembiéia. Quando no Recife eu pedia documentos das nossas palestras, nossas pa- lavras, para que chegassem ao mundo, ao pais, pa- ra conhecer 0 que foi que o indio falou diante de nossos dirigentes do érgéo tutelar, saiu ao mundo, na televiséo, mas 86 sai 0 comeco, a entrada da rounio. O que eu falei diante de nossos dirigentes no saiu, Todos os grupos gritavam, cantavam as necessidades que passavam, necessidades que pas- savam afligéio. No estamos brigando néo, estamos reivindicando 0 que é nosso. Nao estamos também pedindo esmola, nfo senhor. © indio nio pede es- mola, 0 indio cobra o que é nosso, o que 6 de di- reito, 0 que é da gente. Manuela: © Manuel Celestino trouxe aqui a si: tuagao geral de todos os grupos do Nordeste e Les- te, que € uma espécie de morte no papel, decre- tada pela Funai como um nao reconhecimento de um grande numero de grupos indigenas, A Funai quer se arrogar 0 direito de decidir quem ¢ e quem nao ¢ indio, esquecendo que o tinico critério para saber quem é e quem niio ¢ indio € 0 reconheci- mento da propria comunidade que tem a conscién- cia histérica de sua indianidade. Isto tem implica- g6es evidentes, pois esses direitos dos indios sé 26 serfio legalmente aceitos na medida em que o indio € legalmente entendido como indio, de forma que negar essa identidade, como a Funai esta preten- endo, tem como conseqtiéncia a negacio desses direitos, Augusto Paulino — Adio Luis Viana — Krenak — Carissimos irmios, estou aqui para apresentar essa fraca figura, que ver sofrendo hé muitos anos. Hé 22 anos que vem sofrendo. Vou contar pra vocés a historinha do Krenak, o que ver acontecendo faz 22 anos. Lé no nosso terri- térlo, desde a época do SPI, 0 Chefe 14 do Posto comegou... Nos tinha muito gado, era bem organizado, nds tinha 900 cabegas de boi, 600 cabe- gas de carneiro, 300 cabecas de animal, tinhamos de tudo, af comecaram a vender, a vender, e foi acabando, tiraram-nos de 14 ¢ levaram pra Maxa- calis. No gostamos, voltamos de volta, tudo a pé, 92 dias de volta. Chegamos, ficamos acampados nu- ma ilha; af chega o Capitdo Pinheiro e disse que ia liberar outra vez a nossa sede. Comegou a nossa Mberagdo outra vez, levounos pra 14 ¢ comecamos a trabalhar, trabalhamos plantando roga e juntan- do gado, nds jé estava comecando outra vez. Cons- truiu cadeia, enfim, liberou tudo. Comecamos a or- ganizar 0 terreno outra vez. Naquela organizagio, ‘0s fazendeiros desconfiaram que iam ocupar a terra toda, 0 territério todo. Af comecaram andar daqui pra ali, tornaram a tirar nds para levar pra Fazenda Guarani. Enfim, levaram-nos pra Fazenda Guarani, 1 em Crenaque; nessa época, construiu cadeia, construiu tudo, af trazia indio do Amazo- nas, indio de tudo quanto é canto, ld prendia, ba. tia, espancava. Lé, nessa época que foi tirar-nos, foi em 68, tiraram-nos ¢ levaram pra Fazenda Guarani. Os indios que nfo queriam ir, eles amarravam, prendiam na cadeia, deixavam 14, dois, trés dias com fome. Ai conduziram nés pra Fazenda Gua- rani. Ficamos lé sete anos. Em sete anos come- gamos a descobrir a lei, tornamos a voltar. Esta- mos acampados no nosso territério outra vez, che- gamos 14, também jé tinham destrufdo tudo. Tinha acabado tudo o que nés tinha deixado. Nés acam- pamos, acampamos e af comegaram a querer tirar- nos outra vez. Mas ai comegamos a reconhecer a lei, andar para aqui, andar para ali. Deixaram-nos auietos, Estamos 14 acampados em 13 alqueires. Nés queremos organizar o territério para frente. Ai foram 14, juntaram, foram 14, perguntaram a ns quantos alqueires nds queria para organizar nosso territério, que nosso territério 14 € 1.950 alqueires, Para nos organizar, pra nos trabalhar, nds somos em 80 pessoas $6, éramos 600. Foi mor- Tendo tudo, aquilo. .. os mais velhos ia apaixonan- do com 0 local do lugar, querendo voltar, nfio po- dia voltar. Falava em voltar, eles prendia, batia, e af foram morrendo. Tornamos em 80 sd. Esta- mos acampados 1é nesses 13 alqueires. Tentaram de organizar para nés 250 alqueires, entéo nds com 250 alqueires ficava satisfeitos. Mas nfo qui- seram. Ai, a gente vai lé na delegacia, em Baladares, conversa com 0 delegado: “Mas, pra que que indio quer terra? Indio é preguicoso, indio nao trabalha, esse indio Krenak nfo 6 indio nenhum que tra- balha, pra que quer terra, indio come peixe e caga!” Bom, antigamente o indio tinha caca pra comer, tinha muito peixe, que 14 no nosso territé- rio d& muito peixe, 0 que 0 fndio comia era cara- tinga, era caga, era o peixe, tinha muito. Agora, hoje em dia, como é que 0 indio convive, 80 pessoas dentro de 13 alqueires de terra? O que que tem pra comer? Tem que comer do fruto da terra e tem que trabalhar. Ai, eu pego a todos vooés, todos os ir- méios ai, 0 que puder comparecer pra gente ai, a gente agradece e fica muito satisteito. E pego a todos os irmios que estavam dizendo ai, que nao enfraquegam, nfo. Consigam a batalha de frente, porque © sapo que para, a cobra come ele. O sapo sempre mais um pulinho & frente, Nunca se para nfo, porque tem 22 anos que eu venho sofrendo, mas agora, se Deus quiser, eu vou em frente, nem que seja pulando um metro, amanha eu pulo dois e se Deus quiser, eu chego ld. Mesmo pra deixar pros meus filhos, meus sobrinhos, meu primos, pra minha comunidade, eu quero deixar alguma coisa. Mas, muito obrigado pra voces Ligia Simonian: Eu gostaria de colocar aqui 8 questo da emancipacéo nos dois grupos indfge- nas que ja @ pediram formalmente, 0 caso de Gua- rita (RS) e os Xokleng de Tbirama. Os indios de Guarita esto sendo pressionados ¢ manipulados pela elite econdmica e politica regional e eles jé encaminharam 0 pedido de emancipacio. A ques- to 6 que os indios continuam bastante desinfor- mados a respeito disso e nés temos que ter um compromisso em esclarecer nfo 86 a sociedade en- volvente, mas principalmente os grupos indigenas, aqueles que ficaram nas reservas, pressionados pe- pelos chefes de Posto totalmente impedidos de aqui estarem. Manuela: Para finalizar acho que ha uma ques- tao fundamental a ser lembrada, que o direito dos indios é parte dos direitos do povo brasileiro. DEPOIMENTOS Reuniio do Centro-Oeste 27-04-81 MARIO JURUNA Devemos nos ajudar ¥ hoje. Estamos em 81 e estamos comegando © debate, estamos procurando uma semente mais e melhor e procuramos a nossa cultura e nossa se- mente para levar a cada casa e a cada um. Eu quero pedir 0 apoio de vocés porque existem 160 tribos no Brasil, e todo chefe de comunidade que entende o problema tem que defendér 0 problema de seu local, Eu sei 0 que a Funai pensa: que temos pouca lideranga para nos defender. Nos so- mos poucos os que defendem a tribo. Entéo hoje nos devemos amarrar, nés vamos amarrar a nossa forga & coluna da casa. Demarcagio nés temos que conseguir no peito, na luta, Devemos ajudar 0 companheiro, nés so- mos a raca e somos donos de nossa terra e nds que nascemos no mesmo pais somos obrigados a aju- dar 0 nosso companheiro. E depois do debate va- mos falar muita coisa e nds vamos apresentar men- tira e apresentar verdade, porque @ mentira tem © pé muito curto e a verdade néo acaba. MARCOS TERENA Precisamos formar um conselho ‘Vamos ver 0 que podemos fazer, 0 que é pos- sivel fazer. A Funai foi criada para assistir o in- dio, mas ela nfo ests fazendo isso. Pelo menos é 0 que todos disseram aqui. Vamos pensar o que fazer para apressar a demarcacao da terra, para que a Funai dé mais assisténcia na educacio e satide. Vamos pensar na realidade, nfo vamos pen- sar em sonhos porque, como o Mario falou, tem que ser palavra firme. Nio podemos mais ficar de reuniao em reunifio. Vamos ver se é possivel fazer um CONSELHO de indios, por exemplo. Vamos pensar qual é a solugéo que a gente vai dar. Primei- ra coisa, 0 que fazer com a Funai para ela andar direito, porque 0 pessoal que esta ld, esta ganhan- do dinheiro em nosso nome. Vamos pensar a rea- lidade de agora porque amanhi nao sabemos 0 que vai acontecer: projeto de emancipacao, mudanca de Estatuto. Isso vai prejudicar a gente, entao a gente vai ter que pensar répido, & frente do branco. 2 CARLOS CARAJA DE LUCIARA Invasio de terras Primeiro os Carajé moravam em Luciara, Es- tado de Mato Grosso, que era s6 Caraja. Depois um branco chegou, chamado senhor Lucio, Che- gou e chamou a presenga de todos os indios. Todos ficaram de acordo de vender o lugar, a propria mata onde faziam a roca a troco de farinha e ra- padura. Assim ficaram e foi aumentando. Ai eles viram Sio Domingos que era muito bom para botar Toga, ai pediram para o capitio ceder um pedago pra botar a roca. Como Caraja era besta, cedia. ‘Voce é meu amigo, eu teu vizinho. O dia que voce precisar de teu amigo, eu estou aqui mesmo, encos- 28 tado de yoo, entéo 0 que vocé precisar eu estou aqui. Bom, entéo fica, isso af € seu, pode botar uma Toga e algum gadinho. Mas porque ele fazia isso? Ele no sabia de nada. Ele pensava que ficava em aquilo mesmo. Mas 0 outro no pensa assim. Ele entrou e ficou. Ele pegou doado e depois vendeu. Outro entrou e pediu também. Que ele era pobre, que era isso e aquilo. Que ele nfo podia ficar perto da cidade, que a cidade com esse negécio de im- posto ele néio podia, que ele ficava no sertio mes- ‘mo, que ele n&o podia pagar nada. Entéio conver. Sou com 0 chefe. Foi indo. Se voed me agradar um pedago de terreno, eu também te agrado, eu dou uma vaca procé. Isso eu nfo estou comprando, eu estou te dando um presente, como voce vai me dar também. E assim 0 velho foi nisso: “té aqui, tem ai um pedago proce, como océ esta me fornecendo, também vou te fornecer”. Por que? Porque, o velho néio sabia, Néo sabia o que ia dar no fim. Mas quando ele entrou, que deu uma cabeca de vaca para o velho, af que o trem comegou a aumenta: “6, vou comecar a comprar meu gadinho que aqui 6 to bom da gente criar”. Af foi comegando, eu era pequeno e nao sabia de nada, Os outros per- guntavam: como vocé esté fazendo para entrar? “No, voc’ conversa com ele, vai indo na conversa € voce entra também.” E assim foi indo e o outro entrou também. E assim foi indo, e outro entrou € a gente vai piorando cada ver mais. Cachaga Meu pai também ¢ muito errado. Ele era da- nado para fazer confusio. Bebia e fazia briga com seu prdprio irméo, com seu proprio cunhado e com seu sogro que era capitio. Hle nfo respeitava ninguém nessa aldeia Luciara e assim todo mun- do ia saindo com medo dele. Nao era o medo. A cachaga enfraquece 0 homem. Mas 0 homem que bebe a cachaca diz: eu sou isso, eu sou aquilo, eu fago isso. Porque que eu falo isso? Porque ele esta tonto da eachaga. PEDRO TIKUNA ‘Onde vai o dinheiro Se eles fossem responsiveis, eles ajudariam, demarcariam as terras dos indios. Eu vou marcar as terras de vooés? E 0 dinheiro? Governo néo tem, nem 0 Governo, nem a Funai, nem o Presidente nfio tem dinheiro. Mas como houve a noticia de que agora, ano de 80, haviam mandado 17 milhdes melo para o Alto Solimées, ld para os Tikuna, para a demarcagdo e a escola. Mas lé ninguém viu, nem se sabe de notfcia de dinheiro. Para onde que foi? Eles tem a fama da promessa, eles prometem, mas as coisas nunca seguem. Parece que eu vou morrer no meio da luta de meu povo Tikuna, Até meus filhos também vio morrer como meus avés e bisavds e tataravés, que 6 tinham morrido nas mfos dos escravos. Que nos- sos pais ¢ indio, que é verdadeiramente indio ver- dadeiro. Temos 37 aldeias Tikuna e temos 15.150 habitantes. $6 falam a lingua Tikuna. Entio por isso que eu estou aqui representando, falando de cada aldeia. Agora eu quero saber porque 6 que © governo brasileiro prometeu de dizer que ele é responsével dos indios. © governo nao est nem sabendo 0 que esta acontecendo em drea dos Ti- kuna e de todos os nossos irmios. Porque nunca anda nas terras deles. Nunca dé um chego e nunca dé um passo, Um dia chega 14, é como vento, olha 1é, dé uma rapidinha e nem sabe o que acontece. Nem conversa, nem sabe se esté morrendo ou se esté bem. WAPIXANA © problema da terra 1 pela primeira vez que venho assistir a reu- nifio e estou com dois meses que sou tuxaua. Mas © que eu sinto na minha aldeia 6 0 problema de terra, Nés queremos procurar uma solucéo para nossas terras, porque é de nossa terra que tiramos tudo 0 que precisamos, Entéo vim & procura de uma forca para, quando voltar, orientar os que esto 14. Os conflitos no Acre “Olha, se vocés quiserem brigar com os colo- nos a gente vai meter a policia aqui e acabar com vooés”. Olha, nfo, a gente ndo vai brigar com os colonos, a gente vai ser contra vocés e a Funai, 5 a Funai que poe os colonos a brigar com nés. Fazer medo para nés acalmar e largar nossas ter- ras. E 0 fazendeiro Cabeca Branca sempre orien- tando os colonos If pra nfo largar que ele garantia, para 0 lado deles. Ai veio a polfcia acalmar a gente mas a gente néo acalmou. Expulsaram o Chefe de Posto que sempre ajudou a gente e a gente gosta dele. Agora Chefe de Posto a gente nao aceita mais. Té com um ano ¢ estamos dirigindo bem a nossa mercado- ria, sem a Funai, e de hoje em diante vamos vi ver assim. LINO PEREIRA CORDEIRO Como se defender: Edueagio Sou da nacéo dos Miranha, municipio de Tefé, do Amazonas. O problema da maioria dos indios do Brasil, acredito que os Miranha também te nham, Néo tém terra demarcada e a questio da satide fica no Deus nos acuda pro que der e vier, porque no tém a quem apelar. Quanto parte de educagéo, nessa parte defendo a questo da civili- zagiio pelo seguinte, porque na minha opinifio ¢ indio precisa se confrontar com 0 branco, ele pre- cisa mesmo entrar na escola, pegar o primeiro e segundo grau, até 0 nivel superior. O indio precisa aprender para se defender. Agora uma coisa que eu acho meio dificil, mas que vai na consciéncia de cada um. Porque uns pegam uma cultura e tém vergonha de ser indios e néo querem mais voltar no meio da comunidade, é um negécio meio russo. Mas se a gente fica sem saber ler e escrever 6 pior. A educagéo vai dar margem para a propria defesa do indio. © coméreto ¢ a auionomia da aldeia Coméreio € aquele negécio de intermediério, 0 comerciante e o indio. Ultimamente tem melhorado muito porque a gente bolou um plano. A gente con: seguiu por a mercadoria nossa no mereado de Ma- naus, direto. A gente conseguiu um barco. Porque se a gente for esperar pela Funai, praticamente todo o Brasil vai acabar na faléncia, Pelo que eu vejo, 0 que a Funai faz mesmo direito € acabar com os indios. Nos precisamos é partir por cima, discutir juntos na aldeia mesmo e tomar uma deci- so para a gente mesmo prépria, Entéo tudo 0 que tem na comunidade sao os préprios Miranha que decidiram juntar um por um e pagar a prestacéo. A Funai ‘Uma coisa que me deixa meio arretado é que a Funai existe para dar assisténcia ao indio. O problema maior néo é a Funai, mas 0 pessoal que estd jé 1d dentro. Os que tém culpa sio esses coro- néis implantados entre os administradores, porque, 16 dentro, tenho certeza, tem gente interessada na causa indigena, também. ‘Mobilidade: os encontros Nés somos 720, fora os que esto fora. Outra coisa ¢ essa coisa da Funai proibir sair para parti- cipar de encontros e saber da situagio de cada um e aprender alguma coisa ou ainda ensinar para 0s outros. Porque cada vez, que eu venho e participo 29 eu tenho novidades pra levar e uma ordem a pre- gar na minha comunidade. E acredito também que cada vez que eu venho, eu deixo alguma coisa para 0s outros também. Entéo, a participaciid vai de- pender do proprio indio, porque se ele sente neces- sidade 6 ele que tem que dar um jeito de sair ¢ procurar methoria. A Funai nfo tem nada a ver com ele. As liderancas das comunidades sto responsé- veis pelos outros. Se estiver sentindo necessidade, € a que tem que dar o jeito, ndo esperar que a Funai autorize, porque ela nfo vai fazer isso nunca. ‘Unido das Nagées Indigenas: Nos lideres do Brasil, confio © que a UNI precisa 6 de uma estruturagio in- digena; pegar as liderangas de cada Estado, fazer as bases para estruturar o alicerce da UNI. Se a gente esperar pela Funai a gente nunca vai conse- guir nada. Acredito que no Brasil, e néo sé na minha regio do norte, existem indigenas que sio eapazes de fazer uma boa lideranga, uma boa ad- ministragio. Nos lideres do Brasil, contio. MILTON KRAHO — Chefe Krahé Ap6io a UNI Hu sou caciqué de minha aldeia. L4 eu nfo sou desprezado, mas garantido e por isso eu tenho forga e liberdade de dar garantia a quem vai ser presidente das tribos indfgenas, o Marcos Terena. Estou apoiando os trés candidatos de hoje. Fi mi nha viagem da tribo s6 para apoiar, dando forga para a tribo. JOSH AUGUSTO DA SILVA, Potiguara da Paraiba Sou Potiguara da Parafba, a minha aldeia esta localizada na cidade de Bahia da Traigao, ou me- Ihor, a cidade de Bahia da Traicéo é localizada na aldeia Potiguara. A situagéo do nosso povo Poti- guara est4 muito ruim no momento. Existe uma di- visio. Ea Funai e 0 governo do Estado que pro- moveram esta divisio. Os projetos de desenvolvimento da Funai Para acabar com a luta entre invasores e 0 grupo indigena, o governo do Estado estudou rapi- damente um projeto as pressas. Elaborou no sen- tido de parar a nossa luta pela demarcagio, e con- tra as invas6es da drea, influindo com uma esmola grande, implantando um projeto agricola na drea, 30 botando trator para desmatar e fazer rogado no tamanho de dois hectares por familia, dando se- mente gratis, segundo eles falam, e material para combater as pragas; depois financiaram um barco pesqueiro para quem queira pescar, estrada e sa- neamento. Esta é a promessa do projeto Prodeco, chamado projeto integrado Potiguara. Esse projeto foi para acabar com a luta pela demarcagéo da terra, Néo é outra coisa. 1 uma esmola grande dada & forca. = JOSE AUGUSTO DA SILVA/POTK Os operarios Potiguara no Rio de Janeiro na Ilha do Governador (1975) Estive na Ilha do Governador 0 ano passado para ter contato com 0 nosso grupo. Eles prome- teram voltar & rea, Estéo voltando aos pouqtti- nhos. A influéncia que os encaminhou ao Rio para trabalhar como operdrios nos estaleiros da Ima- ae queé — e eu estive no meio de tudo isso — 6, nio sei, a elegdncia de passear, de beber cerveja, entre outras coisas. Aquela onda que o Rio é lugar de se ganhar muito dinheiro, Embora eles no estejam tendo resultado financeiro como deveria ser por- que hoje a situacio do brasileifo de classe baixa no tem resultado. Tem apenas sacrificio efetivo. Educagio ¢ recuperagio da lingua Nos anos trinta ainda restava a lingua Poti- guara, como apelido. Os velhos inclusive, os velhos eas criangas ainda bolavam a lingua Potiguara, mas aconteceu 0 seguinte: os primeiros professores do SPI pregaram a educac&o em portugués € nio acei- taram que os indios falassem a lingua abanhaé, de maneira nenhuma; proibiu. $6 ensinou portu- gués, por isso venho me queixando, eu aprendi por- tugués, agradego muito por uma parte, mas senti que a educacio prejudicou a raga Potiguara. Hoje a lingua estd cada vez mais esquecida, esté dando um trabalho tremendo para recapturar ela; agora estou conseguindo muitas palavras da Paraiba a Bahia, mas devido a uma luta muito grande para conseguir um diciondrio dos antigos ‘Tupi, que hoje se transformaram em Potiguara, que chamam a lingua abanhaé. Entéo nds temos muitas palavras jé recapturadas da lingua de origem Po- tiguara LINO MIRANHA ¥ 0 dinheiro 0 culpado? Esse negécio de dizer que 0 branco ¢ o culpado de todo ai, nesse ponto ai também defendo o bran- co, porque se for atacar todos os brancos, meus irmios teriam que atacar toda essa gente, interes. sados na causa do indio. A gente tem que pensar que 0 responsdvel de tudo isso é o capitalismo. 0 dinhefro que faz isso af. Nao 6 dizer que é branco. Esse 6 0 meu ponto de vista. Indios € Posseiros Hu acredito que a situacdo do posseiro seja & mesma que a do indio. O posseiro precisa do apoio do indio e o indio precisa do apoio do pos- seiro. Temos que juntar as forgas. Nao sei se os outros companheiros esto de acordo com isso que declarei, mas em Boca do Acre foi solucionado as- sim: a Funai jogava fazendeiro contra posseiro, de- pois jogava 0 posseiro contra o indio e jogava ele contra o fazendeiro e resultava aquela bagunga. No final ficava de bragos eruzados, vendo 0 pessoal bri- gar fora e ela ld dentro numa boa, como se nada tivesse a ver com isso. Indios Assassinados Os Tikuna e Kulina e Canamari também esto sendo vitimas — sempre desaparecem um ou dois indigenas quando estes comecam a brigar pelos seus direitos e até hoje fica tudo no esquecimento. Até hoje nunca vi pelos jornais, nunca vi em canto nenhum dizer que foram escondidas uma ou mais vitimas que foram encontradas assassinadas, mor- tos por ai, como jé vi © problema da terra Estou esperando até agora. Funai falou que tinha liberado trés milhées e meio para criagéo de posto e de cantina-cooperativa e a compra de um Danco e uma série de coisas. Eu falei para ele que isso nfio ia nem adiantar enquanto ndo tinha 0 que 6 necessério para nés: a terra. Porque do jeito que ‘as empresas estéo entrando na Amazonia agora! Onde faria eu minha casa se eles chegassem votando méquinas para ca, gado para 14, maquinas para transporte, méquinas agricolas. Tudo isso. Porque tudo isso de Funai, como vao fazer. Colo- car na cabeca e para onde que eu vou? A tnica coisa que eu exijo mesmo é a terra; delimitasse me entregasse documento, Nio vai adiantar ter polso cheio de dinheiro sem terra. FRANCISCO LUIS DOS SANTOS Kaingang de Mangueirinha ‘Temos 0 problema da terra, Nossas terras 14 foram vendidas pelo governador do Estado, em 1949, foram vendidas para a firma Slaviero, ¢ hoje esto em litigio; entao viemos pedindo para que se- jam devolvidas nossas terras, e até hoje nio tive- mos uma solugao de umas autoridades responsaveis por nés. Este Encontro foi muito bom porque os indios ficaram sabendo da situagio de nés Kaingang do Sul e Guarani, assim como nés também ficamos sabendo dos indios do Norte. % a mesma situagao’ terra, terra, terra. O indio sem terra pode ser men- digo, como tem muitos caboclos, hoje, mendigando por af pela estrada. Organizando a UNI, esperamos ser unidos e fortes. DOMINGOS VERISSIMO — Terena Sou indio Terena e um dos fundadores da Uniiio das NagSes Indigenas. Foi dificil no comeco, porque pela primeira vez depois do descobrimento do Brasil, a primeira vez que foi organizada esta, entidade dos prdprios indios, cujo objetivo ¢ de- fender os direitos dos indios, conforme a legislacio brasileira, conforme esta escrito no proprio Esta- tuto do Indio. O indio se levantou e conscientizou, e sem lutar nio consegue nada, Entio o valor dessa organizagio est ai. Aqui em Séo Paulo foi também eleita a nova diretoria. Entregamos nas mos dos Jovens, Terena Marcos, 0 Tukano Sampaio e Lino da Tribo Miranha. Entio estd ai o resultado do esforco dos velhos para que os indios lutem para © seu proprio interesse e para a sua propria sobre- vivéncia, Mas nfo ficar nisso. Lutamos também para néo acabar a nossa identidade, no caso a nossa cultura, a tradi¢fo, os costumes. PAULO ACACIO DOS SANTOS Xoc6 da Ilha de Séo Pedro © Encontro para mim foi uma maravilha por. que me achei no direito de contar o sofrimento que nés temos. Encontrei condigdes de falar a ver- dade com toda a cobertura da Comissio Pré-Indio. Foi mais um ano de estudo que ganhel. Mas nio posso falar muito, sou muito visado, enquadrado na lei de seguranga, nao do Brasil, mas do revélver 16 dos grandes da margem Ié do Rio Sio Francisco. ALVARO FERNANDES SAMPAIO — Tukano Eu sou Tukano, meu nome de ceriménia é Doethiro. Acabamos de eleger a nova diretoria da UNI, due visa trabalhar melhor, porque nés somos um povo etnicamente diferente, sentimos nossas dificuldades e vamos procurar resolver nossos pro: blemas dentro do contexto da politica nacional ¢ internacional. A idéia ¢ difundir uma nova politica, para ter uma vitéria, recuperar aquilo que perde- mos durante 400 e poucos anos de derrota. O indio brasileiro, pela primeira vez, consegue uma vit6ria. Como etnicamente diferente, procura se organi- zar para entrar no contexto da vida politica nacio- nal. E visa também este movimento para o bem- estar de toda a comunidade brasileira, no somen- te do indio mas de todo brasileiro, © Encontro foi fantastico, saiu totalmente dos trilhos, e entrou por um ritmo que a gente nao es- 32 perava. Fortaleceu incrivelmente 0 direito dos in- dios a se organizarem livremente. Devemos conse- guir que esta emancipagéo compuls6ria nao passe. ‘Tivemos audiéncia para isso, os indios deram um exemplo fantéstico. A venda de artesanato © pessoal indfgena faz artesanato, embora a pessoa saiba que a misséio esté monopolizando 0 artesanato indigena, muita gente nao sabe. “Nio, é freira, é boa, vamos dar para a freira.” E a freira dé aquele conto, é bem mais barato, né? H quando chega em Manaus 6 aquele prego! ANTONIO TIRIO A importancia da UNI ‘Sou do Parque Nacional do Tumucumaque, sou do lado do rio Paru do Oeste, na fronteira do Suri- nam e do Brasil. Eu acho que esta organizacio que esta criada, a organizagdo da Federagio Indigena, € muito importante, porque essa Federacéo néo vai ser negécio da Funai, nem da Missio, nem mistura, mas vai ser independente; s6 indio, fora de qual- quer politica, nem Arena, nem comunismo. Ai nio tem politica. $6 todo indio para defender o nosso direito, nossa bandeira como indio brasileiro é morrer sempre em nossa terra, no é verdade? LINO MIRANHA Indios na administragho A Funai esté com uma verba de dois milhdes de cruzeiros. 1 claro que nfo vou rejeitar a doa- do que de toda maneira vai servir. Mas sempre que isso seja administrado pelos préprios indios eno vou aceitar interferéncia de branco na admi- nistragio. Eu no sei se em todas as regiGes existe indios que estejam capacitados para uma boa ad ministragéio, Mas estou seguro que em muitas re- gides existe gente que est capacitada e que pode fazer uma boa administragio também. Entéo, quanto a essa parte de doagées da Funai, eu nao sou contra. O problema é quando recebe a doagio e fica sendo manipulado pelo homens da Funai, ou por outra pessoa como intermediério. . PEDRO TIKUNA A populacao cresce, precisamos de terra demarcada A floresta esté diminuindo cada vez mais, co- mo esté acontecendo com as nossas terras. Nao tem ninguém que ajude muito, sempre tem fazen- deiro tirando a madeira, a borracha e todas essas coisas e mesmo o peixe esté se acabando com esses pesqueiros que vém de Manaus, por 14 em volta tudo esté terminando. Entio a gente precisa a de- marcagio da terra antes que invada muito ainda, porque mais uns anos e nfo vai ter mais terra; entiio os seus filhos que cada vez esttio reproduzin: do, esta aumentando a tribo mesmo, nfo tem onde ir pescar, no tem onde ir trabalhar, no tem ond ir e fazer roca. ° Pode ser que 0 indio nfo sabe de nada, mas 0s brancos nfio sabern 0 que os indios tém; e tam- bém como fndio niio sabe 0 que os brancos tém, © indio também tem o seu direito igualmente como 08 outros. O cacique, como uma autoridade, tem que cuidar de seus problemas. TER®NCIO MAKUXI Os projetos do Governo Essa hidrelétrica est no meio dessas malocas, mas est mesmo no meio. Tem duas aldeias, uma com 300 € outra com 200 pessoas. Eno eles sen- tem que vai ter um grande prejuizo para essas comunidades. Essa hidrelétrica de Tamandud é um negécio muito acelerado para 0 povo... Ouvi falar que so 5.000 operdrios que vaio trabalhar 1é, entéo estiio vendo uma coisa que vai acontecer muito triste: ...em vez de orescer a comunidade, vao acabar dispersando por ai no mundo. Porque hi varios exemplos, todos com trabalhos que esto fazendo nas nossas reas, como aconteceu no Ro- berto Costa com uma ponte no Rio Cutingo que prejudicou muita gente, porque a ponte atravessou mesmo no moio de um grupo de 300 pessoas que estavam assim, inclusive onde tem uma escola. Quer dizer que deu mais ou menos 60 trabalhado- res. Que aconteceu? Era festa todos dias, toda noite, bem dizer, todo sdbado; prejudicou até o encarregado, andaram até com a mulher dos pré- prios parentes. Foi uma noticia muito triste. As filhas, 05 rapazes, tudo diminui. Quanto mais a Cachoeira do Tamandué. JOSE MIRANDA OLIVEIRA DE ARAUJO - Apurina A terra, a omissio e a violéncia ent&o que ele foi e enganou a gente, disse que nossa drea ia sair demarcagio e s6 fez prome- ter © nio fez, e dai nds exigimos de novo, ai ele 10 — axromio R16 fol, trouxe a policia, foi contra a gente 1d, veio a policia, 0 exéreito e a policia, as outras policias, mas ninguém fechou das nossas terras pa’ largar ¢ deixar para eles niio, enti veio pra amedrontar € © pessoal ficar calado e pra eles invadirem as terras da gente. Meu pai morreu, meu vO morreu, minha mae morreu, todos sepultados 1d, nascimos e criamos 16; hoje em dia nés tém direito, nds esté botando forea 1 ainda, nao € pra fazendeiro me botar, me forcar. Vai buscar outros cantos, sem terra, sem 33, nada. Lé 6 meu lugar, é meu. Até agora nds esta- mos esperando perguntar terra, até agora parece que esté me enganando nés, nos esta esperan- do... até agora, Hoje em dia, eu perdi minha von- tade de eu trabalhar. Hoje estou falando nessa reuniGo hoje. Estou discutindo nessa reuniao. Pri meiro nunca discuti isso, mas hoje estou discutindo porque 6 vontade. Bu estou esperando, agora se desta vez ele me enganar vou meter bala em fazen deiro 18. Suborno? Entio a Funai, ela promete Id, com mercado- ria, com dinheiro, com trator, caminhio e nunca n6s aceitamos, nem 6 de aceitar. Combinei com ‘meu pessoal todinho, da gente néo aceitar nem mereadoria, nem dinheiro, nem caminbfo, 0 que n6s aceitamos 6 sé as terras pra nds trabalhar, que 0 dinheiro esté na terra e todo mundo tem fora pra trabalhar, plantar feijéo, mandioca, mi- Iho, arroz pra comer e todo mundo vive, que a gente no precisa o que é da Funai, que a Funai 56 trata de enganar a gente, eles prometem dinhei- ro, dar mercadoria, mas a gente nunca aceitou. nto o presidente, quando estive em Brasilia, ofe- receu dinheiro pra gente se calar ¢ nunca me calei, nem vou trocar por dinheiro, por minha terra, pra viver que nem os outros vivem ai jogados pela cidade, vivendo pelo campo, eu nio quero saber Gisso, viu? Hu quero viver trabalhando as minhas terras e néo dou gosto a fazendeiro nenhum. Eu quero fazer esforco com a comunidade, trabalhar e viver nas nossas terras e nfo vender as nossas terras A costas de dinheiro, ficar enganado a costas de dinheiro, & costa de mercadorias. HIBES MENINO Os Projetos da FUNAI Qual seria 0 nosso ponto de vista? Primeiro a demarcagio das terras: porque implantar um pro- Jeto sem demarcagio das terras, ¢ depois suprimir todas aquelas terras? Qual 6 a sua opinifio? JOSE AUGUSTO DA SILVA A opiniéo minha e dos indios que estZio nas aldeias de Sdo Francisco, Itaqueira, Santa Rita & Laranjeiras € que estamos lutando pela demarea- co da drea, desde 34 tem documento provando a nossa terra, e depois desenvolver 0 interesse nosso, mas sendo projetado ¢ elaborado por nds mesmos. Nés 6 que sabe 0 que precisamos, onde precisa 34. mos e como precisamos, e no que venha uma pes: soa de fora a elaborar, sem consultar totalmente todos e sem tempo suficiente, HIBES MENINO A Funai comprou um trator de 400.000 cruzei- ros, um trator daqueles. E eu, em conversa com © funcionério, provei que 0 multicultor sendo im- plantado na Area ia trazer muito mais recurso: para o indio porque seria puxado por dois burros e 6 um trabalho quase artesanal como a gente faz e fazia antigamente. E que a implantacéio deste trator seria um desperdicio, um gasto que a Funai estava fazendo mas através de empresas interes. sadas em faturar através do projeto da Funai e que néo atenderia as necessidades da gente. Pré-Alcool As nossas tribos vém sendo descaracterizadas pelo poderio econdmico, pela imposicao e interesse dos capitalistas, com a implantagio de um projeto nos estados do Nordeste, chamado Pré-Alcool, que vern usurpando as terras indigenes, plantando cana inclusive dentro dos cemitérios indigenas. B a gente vem Iutando, eu pelo, menos tenho Iutado, amea- gado de morte, ameagado pelos jagungos; tenho lutado constantemente para que se possa fazer al guma coisa, que se faga a demarcacio das terras indigenas, para que se crie um sistema para a pre- servagio das nossas florestas no Nordeste. CIPRIANO XAVANTE Invasiio de terras Estamos aqui em S. Paulo, este é 0 primeiro Encontro que estou assistindo. Meu nome? Cacique Cipriano. Nés nio podemos fazer segredo, escon- der nosso sentimento, porque existem alguns na Funai que querem morder e ferrar o interesse do indio, de todas as tribos de toda regidio, poraue os nossos irmaos néo se interessam em olhar a vida dos indios. Eu percebo, estou vendo alguns brancos ‘como bichos ferozes, como sucuri, que, desde sé- culo passado, quando nossos bisavés enchiam essa regiaio da beira do mar ao Mato Grosso, roubavam, nossas terras. Os nossos bisavés, os nossos pais, quando os brancos iam em cima deles, se afasta- vam e fugiam, e até hoje existe esse problema. Onde que nés vamos aumentar nossa naco? Onde que nds vamos dar vida aos nossos filhos, aos nossos netos? IP cman XAVANTE A nossa reserva 6 Sio Marcos. No tempo de 1953, por af, nfo havia posseiros, nfio havia fazen- deiros, e com muita liberdade os nossos pais an- cavam por aquela regifio. Agora até bicho do mato ndo tem mais vaga. ¥ isso que 6 nossa vida, aper- tando até esmagar. Vocés sio muito complicados, levam aparelhos € procuram as coisas como ouro, diamante. Isso que mata, isso que é a matanga do indio, Por isso onde ns vamos viver dentro de dex anos? Vocés ainda pensam que o govemno esté tra. balhando para apoiar a vida do indio? Nao. Desde 1959 defendemos os nossos costumes, pedimos con- ducio para poder levar os doentes para 0 hospital. E 0 nosso povo fica triste porque o projeto agri cola nao foi para a frente, ele parou. Nao tem 6leo diesel, ndo tem Toyota para doente, e falta medica mento para as pessoas e 0 gado nos prejudica. Rodolfo € 0 Chefe de Ajudancia e nfo quer fazer nada para nés, ele tenta dividir pela ameaga. Nos todos da reserva de Sao Marcos, nao atendemos as mentiras dessas pessoas da Funai que ld estio entre os missionérios, que nfo respeitam os nossos costumes, que nao deixam a gente ir para Brasilia para falar com o presidente da Funai. Nos quere- mos que eles sejam retirados. $6 isso, muito obri gado. ANICETO TSUDZAWERE Cacique da aldeia Xavante de Sio Marcos Um apelo: Aniceto Tsudzawéré, cacique Xavante da al- deia de Sao Marcos, no Estado de Mato Grosso, pede uma escola de nivel ginasial com 52, 6, 7. e 82 séries do 1° grau a ser construida na aldeia de Sdo Marcos para os jovens indios Xavante das diversas aldeias Xavante. Esse pedido ou apelo é dirigido ao Sr. Minis- tro da Educacio, coronel Ludwig, ao Sr. Ministro do Interior, coronel Andreazza, ao Presidente da Funai, coronel Joao Carlos Nobre da Veiga, aos Salesianos, ao Conselho Indigenista Missionério, aos antropélogos, aos doutores, as Comissdes de defesa dos interesses dos indios, as pessoas de bem, aos politicos e dirigentes. Solicito a construgio da escola ginasial em ‘Sdio Marcos, equipada com salas para aulas, cadei- ras e material escolar, a vinda de professores sale- sianos dos diversos colégios que a Ordem, voltada para a educaco, mantém no pais. Os jovens indios estéio terminando 0 curso primédrio em escolas re- conhecidas pelo governo em So Marcos e Sangra- douro, e desejam prosseguir os estudos com a aprovagio das comunidades Xavante que desejam 35 estar mais preparadas no futuro e menos depen- dentes da sociedade envolvente. Eu, Aniceto, vejo como solug&o, aos que dese- Jam prosseguir os estudos, uma escola ginasial com sede em Sio Marcos, donde os jovens nao percam contato com suas familias, continuem respeitosos como Xavante e nfo corram o risco de aprender maus costumes ou mau comportamento nas cidades. © trabalho atual dos salesianos com o primé- rio ow até a 4+ série do 1° grau 6 muito intenso © absorvente, devido ao ntimero crescente de crian- ¢as. Para tanto, temos necessidade da construcio da futura escola ginasial, com a vinda de mais professores, Desejamos 0 mais breve possivel o inf cio da 5. série em S80 Marcos com a criagéo em soqiléncia da 6,79 © 8 séries. Queremos os nos- sos filhos nas aldeias, ajudandonos, trabalhando ¢ estudando, longe dos vicios e maus costumes das cidades. ‘Temos que nos preparar para sobrevivermos no futuro e no continuar ou tornarmo-nos depen- dentes, ANISIO TUPA MIRIM Garani — 8. Paulo © problema do indio Guarani da aldeia de M'Boi Mirim de Sao Paulo 6 o seguinte: um grupo de indios Guarani vieram do Posto Indigena de Mangueirinha, Estado do Parand, por causa da Fu- nai, porque a Funai judiava muito do indio. A Funai dava servigo para os indios ¢ todos os indios trabalhavam para a Funai, que prometia que ia pagar a dinheiro, e prometia também dar roupa, ‘¥2— WETAGUE CANTANDO MUSICA SUIA 36 sapato, alimento e assisténcia. Mas no fim os in dios nfo receberam nenhum cruzeiro, nem um pe- aco de roupa, nfo recebeu nada, A Funai fazia também outras coisas com 0 indio brasileiro: ela mandava os indios fazerem roga de vinte a trinta alqueires e dizia que aquela roca, que tudo que 08 indios fizessem, ia ser para 0 proprio indio. De- pois, quando chegava o tempo da colheita, a Funai falava: “vamos colher tudo que depois eu vou ven- der para vocés e 0 dinheiro que vai vir € de vocés”. Ai os fndios ficavam feliz, contente e alegre espe- rando seu dinheiro. No fim, cadé aquele dinheiro que a Funai prometeu? Até agora 0 indio néio re- cebeu aquele dinheirinho e assim os indios passa- ram 0 tempo sofrendo, completamente sem nada na vida. Por falta de proteco da Funai, porque a Fu- nai no ajudava em nada, s6 maltratava, entéo por ‘causa de tudo isso que nds viemos do Parané para S. Paulo. Alf onde eu moro chama-se aldeia do indio de M’Boi Mirim, o padre José mandou fazer trés casas para os indios, entéio é por isso que eu estou mo- rando 14 com minha familia, UBTAGUI Eu estou dizendo para vooés que estou aqui em S. Paulo. Muitas vezes venho aqui em S. Paulo, todo ano venho aqui em S. Paulo. Eu passei um ano aqui em S. Paulo, fiz tratamento de satide. Por- que vou falar para vocés, vou cantar para vocés mi- nas cangdes em Suid, eu sou indio Suid, Uetagui, do Parque do Xingu. ADALBERTO FERREIRA DA SILVA — Tingui Falta de terra (indios do Nordeste) Povo paulista e meus irmios indios, eu falei no meu idioma, estou nesta grande cidade, S. Paulo, e meu nome € Adalberto Ferreira da Silva, da tribo Tingui, do Estado de Alagoas. © meu problema é terra, que nfo tem para minha comunidade. A minha comunidade sio qui- nhentos indios; nds s6 temos dois hectares de terra, nao dé para nds indios trabalhar, néo podemos des: matar esses dois hectares. Os indios da minha tribo trabalham fora, para os fazendeiros. Vao até & usi- na, ganham uma diria de cem cruzeiros e se chu- par uma cana é cortada a diéria. Meus amigos, a coisa est pesada para o indigena. LAZARO GONZAGA DE SOUZA — Kiriri — Ribeira do Pombal © meu interesse é pronunciar aquilo que nao esta escrito. Nosso sofrimento foi bastante tam- bém, igual ao de todos os indios, de sul a norte de todo o Brasil, e que estou vendo sofrer, o mesmo clamor. Indios ¢ Posseiros © nosso problema néo ¢ a demarcagio. O pro- blema sito os posseiros dentro da rea. Tem muita gente que pode viver mais do que outros e tem outros que so iguais aos indios. Este problema é um problema sério entre posseiro e indio, porque aqueles que podem, eles usam os pequenos para lutar contra os indios. Entonce, eu acho que isso € um assunto que cabe & entidade da justica, pre- parar uma coisa a este respeito. Porque nés tra- balha em roca comunitéria — roca comunitéria que eu chamo é junto, todas as familias junto. Nos somos cerca de 325 familias e este povo vive 86 da lavoura, de plantar milho, feijéo e mandioca, apesar de que planta algum arrozinho, mas 6 pou- co, 56 para uso, e também caju e outras coisas, mas 0 necessirio 6 mandioca e feijéo. Entonce nés fizemos esta roca comunitéria, todo mundo traba- Ihando junto, No dia que terminamos de cercar, ajuntou os pequenos posseiros e os grandes, tive: ram uma reuniao no dia 17 de marco a noite. En- tonce, foram 14 na roca comunitéria e cortaram todo o arame. E este arame nfo se aproveitou para nada, apesar de que os indios esto tomando uma atitude por conta propria e esto entrando tam- bém na roca de grandes fazendeiros e pequenos fazendeiros, fazendo a mesma coisa. E isto é uma coisa que nfio cabe entre nds, entre os pobres. Eu acho que assim como tem a justica publica, eu acho que tem também um interesse. E a justica, piiblica tem o dever de entender e defender os in teresses, porque ninguém pode tocar um contra outro. Tem que limitar as coisas para que todo mundo possa sobreviver, entre o seu mundo e pes- soas unidas e honestas como nds somos. Isto é uma coisa que tem que ser assumida, que tem que ser cuidada, Este povo denunciaram no jornal, néio sei quando, mas eu vi a histéria do jornal, que nin- guém podia tirar posseiros de dentro da area por- que tinha 8.000 habitantes dentro. Mas isto nfo é correto, porque em 76, no tempo em que o presi- dente, General Ismarth, esteve 14, 0 prefeito de Ri beirio do Pombal pegou aquele pessoal de todo lugares e levou carros cheios para despejar dentro do povoado para impressionar 0 general presiden- te, para que achasse que aquele povo seria tudo de aquela érea. Entdo isso ai, essa dentincia de 8.000 habitantes dentro da érea no é possivel. MANOEL PEREIRA XAVIER — Pankararé Hoje o que acontece 6 que a gente nem cagar nfio pode mais, Quando tinha verfo, seca, a gente vivia da cagada. Hoje a companhia (SEMA) foi e 6 proibida a cacada. Logo que chegou Ié um engenheiro, um pes soal do Interba, entrou 14 em casa falando pra gente se reunir com os posseiros para dar um tipo de documento que era muito garantido. Eu disse: eu nfo sei se esse documento ¢ garantido, eu nao conhego, apenas nés nfo precisamos desse docu mento, nfio. Mas ele disse, se vocés no assinarem para pegar esse documento, quando for amanha ou depois, 0 Interba, 0 Governo vem e pée vocés para fora. Ai eu falei que mesmo assim a gente no as- sina nfo, pode a gente ser tirado, mas ninguém vai assinar. Ai ele foi em casa trés vez. Ai eu no dei decisio a ele, s6 dei decisio que nao assinava, De- pois desse més de marco saiu no jornal dizendo assim — acho que ele é coordenador do Interba —: que tinha estado 14 no grupo Pankararé, conver- sando pessoalmente e a gente tinha assinado pra receber esse documento. Entéo com esse documen- to assinado, ele pediu ao governador do Estado da Bahia para dar uma ajuda para demarcar essas terras e com esse documento 0 governador mandou ele para 1d. Depois veio pessoal da Funai, a Dolores © um advogado falando da tutela, falando para a gente aceitar esse tipo de coisa que assim 0 as- sunto era mais fdcil. Porque se a gente aceitava esse documento, logo depois era instalado um posto in- digena com assisténcia médica. Ai eu falei: mas como é esse documento? Quer dizer que a gente tem, esté trabalhando seis tarefas de terra, eu co- mo sou casado tenho cinco filhos, ai quando esse filho crescer, entéo vai dar outro tipo de documen- to para meu filho? Que tipo de documento vai fa- zer? Ai ele disse: “Nao, esses cinco filhos seus tém que trabalhar, que eles sao herdeiros seus.” Mas, como 6 que seis familias de gente vai trabalhar em seis tarefas de terra? H depois que a gente quer um pau de madeira para fazer cerca, de onde vai tirar? ‘Tira de sua roca. Mas, e se néo tem? Minha roca esté toda cultivada. Est cheia de milho e feijio que precisa de cozinhar pra comer, ai vou ter que torar um pé de milho ou feijéo pra por no fogo pra 37 cozinhar uma panela, Isso a gente néo vai aceitar ndo. Af ele ficou parado assim, e quando foi na hora da saida ele foi pedir minha decisio. Bom, a minha decisiio 6 demarcar e um posto médico para dar assisténcia para o pessoal que esté sofrendo, inclu- sive hé duas pessoas que estdio doentes; eu posso levar vocés agora e mostrar qual a situacho deles € nfio tem apoio do governo do Estado. Ai ele fa- lou: “Voces tém direito a esse posto e essa reserva, mas isso vai demorar muito”. Ai eu disse: vai de- morar muito mas o senhor vai ajudar num ponto assim; até esta semana um indio foi fazer uma cer- ca no que era dele, af um posseiro Ihe proibiu, que no era pra fazer. Ai chamaram na delegacia e 0 indio foi I. O indio falou que era dele, ai o dele- gado falou: “Nao, vocé vai derrubar a cerca, vocé fez, vocé derruba, o terreno vai ficar para ele e voce nfo vai falar...” Ai ele foi 14 pegou a palmatéria, ai disse: “Aqui tem uma palmatoria, para alguma coisa voce fica aqui. E se eu lhe prender, nem Funai vai soltar, porque a Funai pra soltar vai ter que trazer a chave, vai ter que trazer uma serra pra serrar 0 cadeado porque a chave eu néo dou.” DRPRESENTARAM SUA ANCA 38 Esse conselheiro af ¢ também Pankararé, ele esté numa situagio que os posseiros cercaram a casa dele assim, em redor, e em aquele meio ele no pode criar um porco, criar uma galinha, por- que até h4 poucos dias ele tinha uns porquinhos 14, daqui a pouco chega um com a perna quebra- da. Depois, como vocé falou, se ele no prendesse, ai iam matar. Logo no outro dia aconteceu de matar um porco, ai falou assim: “Agora vocd dé queixa & Punai, que é pra ela vir resolver”. Eo homem da cerca? O indio mesmo derrubou a cerca e entregou para o outro, ai bem perto da casa dele, PEDRO AGOSTINHO (UNB) Se vocés me dio licenga, eu tenho uma informagio a colocar. Estdo querendo dar titulos individuais de ter- ras Pankararé e a Funai esté tomando conheci- mento da questiio porque ela disse que eles niio io indios, e eu sei disso através de um colega meu que trabalha no Museu Nacional, nfo é antropé: logo, ele é naturalista, trabalha no estudo de ani- mais e plantas e é 0 responsdvel pela orientago cientifica da Estagao Ecoldgica do Raso da Cata- rina. E ele tem consciéneia do problema indigena © vem me procurar e me disse: “como é isso, tem indio no Raso?" Entéo vamos saber como é que 6. Ento ele me explicou que do Ministério do Inte. rior, na certa na Secretaria do Meio Ambiente, hd um documento da Funai dizendo que podem mon- tar a estagio ecolégica @ vontade, porque os indios, 0s habitantes do Raso no sao indios. Quer dizer, entio a idéia era botar todo o pessoal que estava no Raso, inclusive 0 pessoal da Serra do Chi, pra fora, Mas a gente discutiu o problema com o rapaz, resolveu passar a divisa da reserva para abaixo do Chi, no sul do Chi, para deixar 0 Chi de fora. E ai a gente conversou da idéia que era o pessoal do Chi que ia ficar com pouca casa ete, EK ento se- rem contratados pela Secretaria do Meio Ambiente para serem os guardas da reserva, para trabalha- rem para a reserva, A Funai no se importou com isso € @ Sema nao deu bola. Resultado: hoje esta a reserva do sul, e pro norte tem um tanto de terra do Raso, até 14 no Brejo, segundo o Manoel me in- formou que tem caca nenhuma. — Tem nio. — No tem a caga que € necessiria para o pessoal do Chi e que é necesséria para o pessoal do Brejo. De maneira que nisso est a responsa- bilidade da Funai... Ela est fazendo uma coisa que ela nfio tem o direito legal de fazer. Porque a lei disse que indio é quem acha que ¢ indio e € con- siderado indio pelos outros. A Funai nao tem direi- to legal de dizer que fulano e ciclano é indio ou ao € indio, O indio esta ai, 6 indio, e acabou-se. Isso dela estar dizendo que é indio e no é indio é ilegal. JOSE AUGUSTO DA SILVA — Potiguara Esta me sangrando lé no peito. est me doendo muito, para mim est me sangrando Id no peito, porque um senhor de aqui de Brasilia, assessor da Funai, chegou I ¢ mandou os tratoristas pra arrasar em cima dos babacu, mangabeira e cajueiro, toda a fruteira natural que existia 16. © babagu levou direito tudo, nfo sei porque tantos indios lé aceitaram uma coisa dessa, uma desgraca dessa. HIBES MENINO ‘Um pé de manga é um pai de familia Agora A pouco, lf na minha reserva, um pos- seiro enganou um caboclo indio, enganou porque © indio ele se considera menor até os 94 anos, de acordo como decreto federal. Entfo ele niio tem condigées de fazer negdcios legalmente. Porque 0 indio é menor quando ele quer fazer critica & Funai. Entio niio estamos fazendo critica, estamos fa zendo dentincias e pedimos que 0 pessoal vé fazer averiguagio de perto, 4 que 0 indio é de menor e no podemos fazer critica, entio estamos denun- ciando, porque um dos posseiros, Amaro Batista, enganou um indio, comprou um pedacinho de ter- ra por Cr$ 100,000,00. J demarcou tanta terra, que no cabe mais. B a coisa mais constrangedora, que revoltou todo mundo da regido, foi que existia pé de jaca, pé de mangueira, fruteiras de estimagio que vinham sendo preservadas ha mais de 100 anos; dentro de uma semana cle colocou os jaguncos ‘com os lavradores Id dentro, e, para vocé ter uma {déia, derrubou tanta fruteira, elas em plena época de desfrutar, mas derrubou tanta jaqueira, man- gueira, coqueiro, cafezal, laranja, tudo, mas derru- ou tudo ¢ ali ele vendeu. Quando a gente procurou ele pra indagar, ele disse: “A terra é minha, eu nio quero fruteira, quando eu quero fruta eu compro. Isso agui é pra plantar cana”, Quer dizer, isso pra mim doou, doeu pra tudo mundo antigo, porque um pé de jaca para uma aldeia 6 um pai de familia Um pé de laranja, um pé de manga é um pai de familia que dé 0 sustento dos nossos filhos. Outro negécio que eu venhho combatendo cons- tantemente 14. Pela gente néio ter um policiamento que defenda os nossos direitos, os nossos rios sio constantemente bombardeados, vem gente da cida- de, amigo de prefeito, amigo de politico ¢ tal e solta, bomba nos nossos ios. Isso é uma coisa... isso 6 um crime, nfo s6 contra a aldeia mas contra a propria natureza. E isso, as autoridades nao ve- rem! bom que se veja isso. Nao verem. Se a gente for denunciar dizem: “Ah! mas porque vocé nko veio na hora?” E a gente mostra, foi fulano. Eles simplesmente se omitem a apurar os fatos. Pra gente 0 que interessa é a preservacdo da mata, da natureza, das coisas que existem, porque é a nossa sobrevivéncia, Ninguém precisa de nada para ven- der, mas sim pra que nossos irmiios utilize m aquilo ali como a gente utiliza. ‘Vamos acabar chupando s6 cana? ‘Uma tristeza que eu tenho quando eu chego na aldeia, é ver que no meu tempo de garoto, aos 12 anos, existia mata que a gente passava de dia por dentro da mata e parecia que era de noite, onde homens e mulheres nfo tinham coragem de pas sar, porque existia ongas, existia gato do mato, existia bicho. E hoje eu vejo isso com uma tris- teza imensa que vocé chega e sé vé o escampado. ‘As madeiras foram exploradas pelos madeireiros e a terra infértil, improdutiva, e a corrosio acabando a cada dia mais com aquelas terras, serve simples- mente para o plantio da cana de agicar e que pra gente nfo vai trazer beneficio nenhum, porque 0 indio, ou seja, 0 pobre, 0 caboclo, ele nfo vai co- mer cana de manha, ele nao vai se alimentar de manh& de um pedaco de cana, a0 meio-dia ele nao vai chupar uma cana, de noite ele no vai chupar outra cana; a0 contrério, ele precisa de aquelas matas onde ele possa ter subsisténcia, da caga, do inhame, do card, que dé muito no mato sem preci- sar ser plantado. E hoje eu vejo com muita rari- dade... as variedades de passaros que a gente ti- nha, hoje nfo tem mais. uma luta que a gente. eu mesmo cumpro constantemente isso... 0 go- ‘verno poderia fiear também nfo s6 pela demarca- fio de terra, mas para a preservacao disso ai. O indio nfio quer a terra simplesmente para status, mas, como eu jé falei, para que isso possa ser pre- servado, para que a gente possa ter a alegria de dizer para nossos filhos: “aquilo ali é um bicho, € uma onga pintada criada na propria reserva in- digena...” 39 A A A Uniao das Nacées Indigenas I — Reunifio e discussdes anteriores & votagio da atual diretoria da U.N.I. pelas liderangas indi genas presentes ao “Encontro” de 481 em Sio Paulo (Reunido fechada aos nao-indios). DOMINGOS VERISSIMO TERENA “ uma sociedade humana o que estamos fa- vendo, cada um tem sua idéia, ¢ mais dificil de atingir. Que néo ¢ uma mercadoria que deixa 1é, fica 14. Cada um de nds tem sua idéia e opiniao. Entéo 6 mais dificil de vocé conseguir essa unio. Para atingir nés temos que explicar, nés temos que conscientizar todo mundo. Entdio parece que essa uniio, a UNI nfo est4 funcionando por motivos dessa mobilizacéo de todo mundo. Mas vamos tra- tar assessorar 0s indios ¢ as suas comunidades ¢ fas suas nagdes ao reconhecimento de seu direito. Qual 6 0 direito do indio? Esté aqui no préprio Estatuto. Esté tudo aqui. Pode reclamar. Pode exi- gir demarcacio da terra. Pode exigir a escola, pode exigir sade.” _MARIANO MARCOS TERENA “Nos estamos vendo 0 que é dividir cabeca. To sentindo como é que ¢ dividir cabega? Entao 6 isso que a Funai procura fazer entre os indios, como fez com os Xavantes, com Aniceto, com Ci- priano, dividir, af cada um fala uma coisa, outro fala outra coisa, Ento quando um comega a puxar pra ld, outro puxa pra cd, outro puxa pra ef, af fica fraco, tf vendo como é a divisio, o que esté fa- VY zendor ¢...) Mas nés estamos aqui procurando entendimen- to, para a gente ficar forte. Para a gente ter forca pra lutar contra a Funai, porque a Funai é forte. Ela tem técnico, tem economista, tem advogado, tem antropélogo. Entéo a gente esté fraco ainda. Entfio nem comegamos ainda. Ainda nem comeca- mos a lutar e jé estamos comecando a brigar. E ¢ nos mesmos, sabe? Entéo vamos procurar agora, vamos reunir, unir”. (...) “A cada reunido que passa 6 a mesma palavra, © mesmo problema e nunca esté resolvido nada, entio parece que voces esto querendo uma nova idéia, um novo pensamento pra gente resolver de uma vez. Entio, como é que nds vamos fazer? Os brancos esto tudo af fora vendo a gente. Talvez eles esto 1d rindo da gente. Olha Id os indios “bo- bos” estdo brigando entre eles mesmos, sabe?” (...) “Agora vamos falar em decisao, Primetra coisa 0 nome Uniiio de Nagées Indigenas — Fede- ragio Nacional de Indios — Confederacio Nacio- nal de ndios. Vai ser que nem eles. Porque eles tem Comissio Pro-Indio, Associagdo Nacional de Apoio ao Indio, CTT, bastante. Mesma coisa, nio resolve nada, Entéio nds temos que fazer um s6. Uma cabega s6, pra gente lutar junto”. — “Mas 0 pessoal ja esta preocupado. O Con- selho de Seguranga j4 est4 preocupado. A Funai jé esta preocupada. Falando, os indios jé esto fican- do sabidos, os indios esto se unindo. A Funai néo quer isso. Ninguém quer isso, porque nés somos fortes, nds somos donos da terra. Nés temos direi- tos. Nos temos que fazer a Funai andar direitinho. Se 0 presidente nao presta, tira. Quando a gente tiver organizag&o forte a gente vai chegar no Pre- sidente da Reptiblica e falar ‘nio queremos aquele na presidéncia da Funai, entéo sai’. O indio pode decidir. Mas para que isso aconteca, a gente tem que comecar a juntar sabedoria”. — “Entio no interessa 0 nome. Nao interessa, se é de Mato Grosso do Sul, se ¢ do Nordeste, do Paré, 0 que interessa 6 que seja um. Poraue o bran- co nao fala assim: 0 Terena, o Xavante, ele fala o indio, porque eles falam em geral. Entiio tem que ser um povo 86. O indio. Para a gente brigar junto. A gente quer mostrar para 0 povo branco que esta junto e esta com 0 mesmo pensamento.” “Rntio nés temos que olhar para frente. Por- que j4 passou o tempo em que o indio guerreava, com outra tribo. Mas isso nfo existe. Hoje nds temos que lutar por nossos direitos, buscar que a criangada tenha escola, buscar que os velhos te- nham satide, buscar casa, aldeia, roca pra gente. Porque se a gente nfo trabalhar, o branco vai to- mar ¢ 0 indio vai acabar. 4 ALVARO TUKANO “Como foi organizada a UNI? Foi criada em Campo Grande, no dia 19 de abril do ano pasado, justamente no Dia do tndio. Por que que nasceu 8 UNI? A UNI nasceu, como ele disse, justamente como conseqiiéncia da opressio dos povos indi- genas, que vinham sofrendo nio s6 deste tempo, mas durante quatro séculos. Quatro séculos. E ago- ra, até o momento, nfio tem uma organizagio como a UNI. Creio que a UNI € tao forte que preocupa © SNI. Entre dezembro e janeiro passaram nas al- deias de voeés 0 Projeto Rondon. Para que que foi 0 Projeto Rondon 14? Hles foram cobaias da Funai. Foram pedir informagdes de vocds mesmos e de- pois levé-las em plendrio ai desses grandes donos que querem ultimamente mexer af com o Estatuto do Indio. E por isso nés vemos que a UNI nunca fol fraca, Ultrapassando os limites. (,..) eu acho impossivel fazer uma confederacéo federativa, pelo seguinte: porque nés temos varios inimigos. Nos fndios n&o sabemos trabalhar com lei, Nunca fize- mos uma lei como as pessoas brancas e nunca va- ‘mos fazer. Qual é a questo agora? Questiio que eu digo ¢ assim: ndo adianta fazer um golpe assim de nds mesmos, para tudo recomecar de novo para nunea mais fazer como um fogo assim, Acho bom a gente prosseguir somente como UNI. ‘Tem que ser assim.” I — Apresentacio dos candidatos & diretoria da Uniio das Nagées Indigenas — S. Paulo, 28.04.81 MARIO JURUNA — Xavante “nto nés indicamos quatro candidatos & di- retoria da UNI pra poder procurar, pra fazer cons- tar com todo indio de comunidade de brasileiro. Entéio nés quer recorrer todo o Brasil pra poder ver 0 nosso problema da comunidade indigena. En- téo nés apoiamos e todos nés indicamos, toda tribo que estava assistindo nosso debate. Entéo pergun- tei todo mundo: seré que o pessoal tem confianca de mim? Entao pessoal que me respondeu, todo mundo: nés tem confianga em voce. Bem, entéo se vocés tém confianga de mim, entéo nés vamos indicar 0 Marcos como presidente da Federagio Indigena Nacional. Entéo todo mundo apoiou. En- 42, to 6 hoje que a gente quer assumir responsabili- dade com FIN. Ai que esse documento tem que ser aprovado, tem que ser mandado, e todo mundo nds vamos discutir sobre a associagao de apoio ao indio, pessoal esté ai para apoiar o indio, 0 CIMI esté ai também para apoiar o indio. Ha muita gente, ha senador, deputado, vereador e todo esse pessoal que quer apoiar essa FIN. Esta na hora de nés aproveitar 0 nosso debate e nds no deve esperar ninguém, esse documento tem que ser aprovado e encaminhado ao Presidente da Repiblica, pra po- der ajudar a comunidade indigena. E nds nfo deve esperar que Estado vai resolver, que Funai vai resolver. Entdo estes quatro candidatos tem que assumir hoje com responsabilidade e tém que co- megar a batalhar 0 problema do indio (...).” ALVARO SAMPAIO TUKANO. “Nao 6 a primeira vez que estou seguindo este problema aqui, j4 desde 1979, mas em relagio aos outros que jé Iutaram mais do que eu, sou muito novo ainda ai. Eu acho interessante fazer esta es: colha porque nunca houve na nossa historia se- melhante reuniao como esta.” MARIANO MARCOS TERENA “Meu nome é Marcos, assim para as pessoas brancas, mas 0 meu nome é Mariano, mas todos vocés jé me chamam de Marcos, entdio eu sou Te rena, do sul de Mato Grosso e moro lé na Casa do Cearé, em Brasilia. Mas, desde 1977 estou co- nhecendo indios de vérias tribos e a Funai, ¢ estou estudando. Ainda néo me formei, O ano que ven, em 1982, eu vou me formar. Entéo eu estou concorrendo e vamos ver 0 que 6 possivel para a gente fazer. Eu no vou fazer tudo, mas vou fazer forca para fazer alguma coisa. Obrigado.” LINO MIRANHA “Me chamo Lino Pereira Cordeiro, mas na mi- nha lingua de Miranha, chamam-me Oiumé. Sou da nagio dos Miranha que fica situada no lago de Uarini, municipio de Tefé, Estado de Amazonas. HIBES MENINO — Wassu “Wu s6 queria fazer uma ressalva, é impor- tante que a gente temos trés candidatos, nao existe oposig&o, os trés candidatos sio apresentados pe- las proprias liderancas indigenas e daqui nao saird nem © vencedor nem o vencido, daqui sairé mais um representante legitimo das nagées indigenas do Brasil, (,..) mesmo apés a eleigéo, nenhum can- didato ficaré triste porque ird se engajar na nossa Juta, ganhando ou néio.” PAULO PATAXO “O mais votado seré o presidente; 0 segundo, 0 vice-presidente e 0 terceiro seré 0 secretério.” II. Votacao a portas fechadas | ‘f= REGULIADOS DA ELEICAO DA NOVA DIREIORIA OA UN! IV. Depois da votagio: DOMINGOS VERISSIMO TERENA Mas a gente, gragas a Deus conseguiu superar, que o mais importante agora, nessa etapa da orge- nizagéo, que vai partir para a segunda etapa que 6a mobilizagao, que 6 mais dificil, j4 conseguimos © fruto dessa. Jé conseguimos, os senhores estio vendo ai, ento essa nova diretoria, aliss 0 nosso estatuto provisério reza também que em abril de 81 seria a eleigio de nova diretoria. Tai o resultado, foi tudo cumprido, esta tudo dentro de um pro- grama que foi planejado. Foi eleita a nova direto- ria ai. Gracas a vocés também, que compreenderam, entenderam a nossa posigéo. Nao é querer ser pre- sidente pra toda a vida, isso é coisa que néo existe. Nos, ,. vocés viram o resultado dessa luta que nés estamos aqui 6! Trés mogos jovens, 6 o futuro da comunidade do povo indigena. Conscientizou da responsabilidad’ que assumiu. Néo é fécil no. Quando forem atingir a etapa... atingir 0 objetivo deles, eles mesmos vao sentir, vio cansar, vio es- gotar, que a luta nfo 6 facil. % mais dificil do que qualquer organizagéo da sociedade nacional. A nos- sa luta 6 desigual, porque a nossa cultura 6 dife- rente da de vocés. Um t4 14, outro estd aqui, outro esté 14 em cima, Entio todas essas presses por parte das sociedades indigenas, essa diferenga de cultura, de educagao, de orientagéo, porque cada tribo tem a sua cultura, tradi¢ao e costume. En- tGo torna mais dificil ainda equiparar 0 caso do ‘Terena e 0 caso do Miranha e de outras tribos que estéo mais acima. APRESENTACAO PUBLICA 28/04/81 T= ANOVA OIREIORIA HIBES MENINO Eleigéo UNI “Estamos hoje, aqui em S. Paulo, participando do I Encontro Indigena do Brasil, no qual estéo presentes representantes de todas as tribos do Brasil. A nossa reuniao foi precisamente para que 43 @ gente pudesse conhecer as nag6es indigenas de todo 0 Brasil e juntos ouvir 0 sofrimento de cada, irmio indio, ¢ dentro da nossa capacidade de luta, formar uma estratégia de ago para defender os in- teresses da comunidade indigena do Brasil. Entiio nds nos reunimos e surgiu uma propos- ta: vamos criar a UNI? Vamos. So os lideres in- digenas de todo o Brasil que esto solicitando isso. Por isso foi eleita, agora de tarde, a diretoria que representaré os indigenas em todo o territério na- cional e possivelmente no exterior, e aonde mais, se fizer direito, demonstrando que nao somos mais aqueles que séo empurrados. Demonstramos hoje, em unio fraternal entre as nagdes, que o indio sabe falar, ele sabe resolver seus problemas. E, ninguém veio aqui contra A, nem contra B, viemos aqui a favor dos nossos interesses e hoje com ale- gria e participacdo exclusiva dos indios, estamos com nossa Unifio das Nacées Indigenas criada. Foram eleitos para a diretoria trés rapazes que achamos que tém competéncia, como qualquer branoo que se ache intelectual, para resolver os problemas do indio. Para presidir a nossa entidade foi escolhido 0 nosso amigo, que é indio e estu- 44 dante de administragéo em Brasilia e nds achamos que ele é uma pessoa altamente competente. Por isso, agradecendo a todos os senhores que nos apoiaram, a todos vooés que deram forea para que nos chegdssemos aqui, quero apresentar aos senho- res 0 nosso presidente nacional, 0 nosso irmio Marcos Terena”. MARCOS TERENA Elelefio UNI “O que ou poderia falar nesta noite? © que eu poderia contar para voeés, brancos ¢ indios? ‘Todos voots estio aqui para ver alguma coisa nova, algu ma coisa que seja titil para seu dia a dia, para sua vida. Voots, pode ser que estejam aqui para ver 0 indio como pessoa diferente, para assistir uma Ganga, ouvir uma musica indfgena, Muitos de vo- 8s estio aqui, quem sabe, porque estio com dé do indio ou talves alguns estejam aqui para regis- trar alguma coisa que thes vai ser util, para seu dia a dia, ou até mesmo para a entidade que voces estio defendendo. Quando digo entidade que voods estiio defendendo, eu estou me referindo a toda e qualquer entidade que exista no Brasil, porque acho que © principio da humanidade 6 que o indi- viduo deve trabalhar para sie para sua coletivi- dade, A sociedade que nfo trabalha assim, 6 uma sociedade em fase de destruicéo. Eu acho que a sociedade branca esté buscando algo de novo; quan- tas mulheres, quantos homens estio aqui, esta noi- te, buscando uma nova experiéneia de vida? Muitas vezes eu penso que o problema do pranco é particular do branco, o problema do indio 6 problema particular do indio, mas enquanto néo houver uma troca de pensamentos, uma troca de informagées entre 0 indio e a sociedade envol- vente, jamais iremos encontrar 0 caminho ideal. Hoje, desde cedo, desde cinco horas da manhi os indios j4 estavam de pé, buscando alguma coisa que satistizesse sua vontade, as suas necessidades, 08 seus anseios. Estamos cansados de ouvir falar que esto matando 0 indio, que esto tomando a terra do indio, que o indio esté morrendo cultural- mente. Por outro lado, também estamos cansados Ge ouvir pessoas falarem do ponto de vista tedri co sobre os direitos dos povos indigenas, sobre a pessoa do indio, sobre a sociedade indigena, sem jamais atingir aquilo que o indio esté buscando: 'a solugéo dos seus problemas. Quantos de vocés estiio aqui porque esto na “onda”, na “onda do indio”? Seria conveniente que cada um buscasse, primeiramente dentro de si, qual tem sido real- mente sua participagiio na luta dos povos indfge- nas. Porque no inicio do Brasil, no descobrimento do Brasil, o indio j6 estava aqui, nos litorais bra- sileiros, e 0 indio recebeu de bracos abertos aque- Ins novas pessoas, dando a sua terra para que 0 ranco pudesse crescer, porque cle queria crescer junto. Foi af entio que iniciou o fim do indio, ele fio sabia que 0 povo branco que estava colonizan- do esse novo continente, era um povo indesejével na sua terra, Hoje 0 indio ainda insiste em sobreviver — 200.000 aproximadamente. E hoje o indio pode con- tar com 0 apoio do governo federal através da Pundagiio Nacional do indio, o drgio tutor do in- dio brasileiro, Mas o indio continua na mesma st tuagio; ultimamente témse ouvido falar muito, pelo menos durante a Semana do Indio foi pregado, propagado, que » Funai esté demarcando as ter- ras indigenas. No entanto, a mesmo tempo que isso esté acontecendo, descobriuse que a Funai estava elaborando &s escondidas, uni projeto de emancipacéo para acabar com as lideranas indi- genas. Se 0 projeto de emancipacio vingar, 0 indio estaré automaticamente arrasado e iré sumir do mapa, seré marginalizado, quem sabe mendigo, como muitos dos brasileiros que estio mendigando na Tua, esto favelados, como quantos, quem sabe, que no Nordeste esto passando fome. Nés nio queriamos que essa outra parte da sociedade bra- sileira passasse por essas experiéncias, porque clas séo trdgicas. Enquanto vocés estio aqui j4 Jantados, quem sabe quantos brasileiros ainda nfo tiveram a oportunidade de se alimentar hoje. No entanto, o Brasil 6 grande, o Brasil é rico, por isso nés estamos querendo contar com vocés, cada um. com um pouquinho poderd ajudar o indio, que po- deré futuramente ajudé-los também. Porque o indio nfo esté economicamente preparado para competir com vocés, mas ele tem suas capacidades. Se ele treina, se ele estuda, ele poderd ser uma grande poténcia que vai ajudar o Brasil a ser maior ainda. Hoje de tarde, aqui, as pessoas indigenas deci diram que era conveniente eleger uma comissio, uma diretoria formada por fndios, para tratar de assuntos relativos a indios. Uma grande responsa- bilidade, eles me escolheram, eu sou muito novo e ainda preciso aprender muita coisa. Mas estou certo que nos momentos dificeis, porque esses mo- mentos hiio de vir, poderei contar com as lideran- gas indigenas que aqui esto presentes. E essa or- ganizagio dos indios, a Uniio das Nagées Indigenas, pioneira no Brasil, buscaré acima de tudo tratar dos problemas dos indios com base na lei existente e cobrar tudo aquilo que est previsto em lei e que a Funai e qualquer outro érgio tém a obri- gaco de realizar, No queremos mais ver a Funai comprometida com outra coisa que néo a politica indigenista, que nio assuntos indigenas. Nao esta- mos com isto querendo dizer que 0 povo indigena 6 uma faccdo, mas acima de tudo queremos que a populagéo indfgena posse compartilhar futuramen- te, com o restante da sociedade brasileira do bem- estar, daquilo que se chama 0 bem-estar da nagiio. Queremos isso, estamos buscando isso, nao é facil, mas nio 6 impossivel que se realize. Queriamos que vocés compartilhassem de alguma forma dessa luta e que pudéssemos estender a miio para voces no sentido de dizer amizade mitua, respeito mu- tuo. Gostaria que todos vocés levassem em seus coragées esta mensagem de que também estamos preocupados com a situagio do Brasil. Nao pode- mos resolver 0 problema do Brasil porque nao nos compete, mas também n&o podemos comparti- Thar os erros que tém sido cometidos, principal- mente com a sofrida nagao indigena. Obrigado.” 45 DOMINGOS VERISSIMO MARCOS Eleigio UNI “Eu sou Domingos Verissimo Marcos, da tribo Terena. Terena sai da presidéncia, outro Terena assume. Néo vamos pensar que 0 Terena esta se promovendo, nfo. Nunca na vida o indio pensa em desuniéio. A mentalidade do indio Terena con- serva essa mentalidade de uniéo que € 0 mais im portante, 6 0 principal na vida nao sé do" indio, mas dos brasileiros também. Transmito assim nos- sa alegria em ver a nossa organizagéo para a frente, nas miios dos jovens, trés jovens. Saiu da mio do velho, da experiéneia, da coragem, esta sendo entro- gue nas méos dos jovens. Esta é uma posicio dos indios muito importante atualmente, na defesa Ge seu direito.” LULA “Companheiros, companheiras: hoje tive a satistagiio de receber, no sindicato de Sao Bernardo do Campo, 0 Cacique Mério Juruna e um repre- sentante da tribo Caraj4, 0 Olair. Eu acredito que para mim foi uma grande ligdo. Uma licho porque eu imaginava encontrar um cacique falando uma Hingua que eu nfo conhecia. Sem brincadeira, as veres chegava a imaginar um homem de arco ¢ flecha na minha frente, Afinal de contas, eu nao posso ter culpa disso, e acredito que ninguém do plenério poderia ter culpa disso, poraue a forma- io que nés recebemos sobre o indio nas grandes cidades é uma formagéio deturpada, recebemos a informagdo de que o indio é selvagem. AS nossas eriancas quando entram numa escola, recebem essa informagao de que 0s indios sfo selvagens ea coisa nao para por af; quem liga a televisio, assiste um filme de bangbang americano, com os brancos matando os indios como forma de garantir a so- brevivéncia da raga supostamente tida como ma- ravilhosa ¢ bondosa, a raga branca. Esse quadro foi desmistificado a partir do momento que Juruna demonstrou que o indio, em primetro lugar, é 0 tint co ser vivo deste pafs, 6 0 tinico destes 8 milhes de quildmetros quadrados que teria o direito de reivindicar nfio um espaco de terra para sobreviver, mas toda a terra, porque estava aqui antes do que nés. Em segundo lugar, me marcou profundamente a sabedoria com que 0 Olair e o Juruna trataram do problema do indio, hoje. Sempre existem aque- les que tentam dizer que o problema do indio é um e o problema do trabalhador ¢ outro, mas é mentira, o problema 6 um 86, é a fome, é a explo: ragéo, 6 a miséria, 1 tudo igual! # a multinacional comprando ou roubando a terra do indio, é a mul- tinacional roubando o sangue e o suor do traba Ihador em SAo Bernardo do Campo. Alguns companheiros me questionavam se eu tinha alguma proposta para a questéo do indio. Eu sinceramente nfo quero pintar de heréi aqui na frente e dizer que na minha cabega esté o problema do indio, eu dizia aos companheiros que me per- guntavam qual solugdo que eu tina para o indio, que o méximo que posso fazer para a questo in- digena no Brasil 6 permitir, lutar para que o indio possa falar, possa gritar e mostrar ao mundo, e a0 Brasil, & sociedade branca, que ele é gente, que ele precisa viver, precisa de terra para trabalhar e precisa de paz para poder cuidar de sua familia, Eu gostaria de dizer ao Juruna e aos demais caciques que estfio aqui, que 6 necessdrio que os trabalhadores conhecam mais sobre os indios para se motivarem mais. O que eu poderia me compro- meter com vocds, aqui neste encerramento, 6 que colocarei a minha vida em jogo pela liberdade de vooés, como coloco em jogo minha vida pela liber- dade da classe trabalhadora. # isso que eu queria falar para vocés.’ HIBES MENINO “Bu queria deixar bem claro uma coisa, uma luta, com vitdria ou sem vitria foi uma Iuta. Um. homem s6 se realiza quando ele luta pelos seus direitos. Lutar pelos seus direitos nfo é atrofiar os direitos dos outros, ¢ dar um grito para que se possa ouvir a sua cleméncia e para que se possa fazer alguma coisa por aquelas classes sofredoras. Com a eleigio da Unido das Nag6es Indfgenas, nés tivemos aqui em Sio Paulo, uma coisa muito importante. Os senhores & assistiram ontem, 0 dis- ‘curso do nosso presidente, Marcos Terena, no qual ele fala do direito do indio, que esté sendo cada dia mais massacrado. E néio 6 s6 0 direito do indio, 6 0 direito de todos aqueles que se acovardaram no canto de uma parede ou por detrés de um mével, com medo de gritar para no ser humilhado e massacrado, Ouse ser pobre, seja humilde, um coi tado, mas nunca seja um covarde porque af entéio voc’ seré uma pessoa morta. Representando esse Encontro estiveram lide- rancas de 17 Estados do Brasil, a totalidade maxima de todas as liderangas brasileiras. B todas essas 47 721 ASPECTOS OA PLAISIA DURANTE A APESENTAGAO. PUBLICA liderancas tiveram algo em comum, quer dizer, néio € 86 um problema de Alagoas, nfo é sé um problema do Rio Grande do Sul,.nfio 6 s6 um pro- blema do Amazonas, mas é um problema de todo 0 Brasil. 1 lutar pelo direito sagrado que nos per- tence, pois o indio 6 dono verdadeiro da terra, por fato e por direito. Néo queremos terra para status, queremos terra para que nossa raga indigena nao morra, para que © nosso povo possa crescer ¢ ter forea, para que nossos filhos, filhos daqueles que hoje estZio Iutando pelos seus direitos, possam ter amanh& um lugar onde viver. Queremos participar como indios, como brasi- leiros e como pessoas humanas, e que vocés tam- bém participem, e que vocés sofredores também sejam ouvidos. Hoje em dia se criou uma coisa diferente: se vocé defende os seus direitos, voce é agitador. 48 Eu queria deixar aqui uma mensagem de nor- destino sofredor. Uma classe que, sé por ser nor- destino, j4 sofre a marginalizagio das autoridades competentes de todo o pais. Nao 6 s6 indio, pode dizer € Nordeste, é nordestino, 6 “o pau do burro”. Entéio minha gente 6 preciso que se forme uma consciéncia nacional para lutar por esse povo. Olhe gente, se vocés conheceram 0 Nordeste hi dez anos atris, nfo iriam reconhecé-lo agora. Est descarac- terizado. O que existe no Nordeste é a miséria, 6 a implantagio de um programa multimilionério que nfio atende, de jeito nenhum, as necessidades do povo nordestino, principalmente dos pobres, Olhe, © Brasil depende do que? Depende da agricultura; no entanto, um pais como o nosso tem que impor- tar alimentos. Isso no é interesse nosso.” D, TOMAS BALDUINO Explica © significado da apresentagiio piiblica “Gente, eu niio queria destoar desta palavra que esté sendo proferida para nds pelos indios; eu acho que é hora deles tomarem a palavra, mas é pedido deles mesmos, da coordenagio. Entdo, aten- dendo 20 pedido deles, eu queria dizer a vocés que aguilo que foi apresentado aqui, nfio foi com a intengiio de fazer um show para branco, mas um sinal de amizade e um sinal de confianga porque, como foi dito por Marcos Terena, sem a colabo- ragdo dos outros aliados nfo se chega a nada, nem por parte dos indios, nem por parte dos néo-indios. Ele, certamente, fez alusio A luta do povo opri mido procurando sua libertagao. Alids, estas apre- sentagées tém um significado muito profundo na hora atual para os diversos grupos indigenas que estiio recuperando a sua cultura como forma de fortalecimento do grupo. Nao se trata do indio folel6rico; essa recuperacio, que vemos em vérios grupos que a foram perdendo e agora estiio reto- mando, € a emergéncia do indio politico. Eu acho que da parte de muitos que nfo entendem a problemética indigenista, o indio interessa na me- dida em que é folel6rico e rejeitam totalmente esse indio politico. Eu digo politico, na medida em que busca os meios de se afirmar como povo, com seus direitos terra, & cultura e & autode- terminago. E hoje, neste local, os indios consti- tufram a sua primeira diretoria e isso foi uma supresa para todos nds, para toda a coordenagio do seminério. Eles estavam numa reunifio priva- tiva, e, dentro desse espago de liberdade que Ihes foi dado, sem nenhuma interferéncia de nfo-indios, tomaram essa deciséo, isso 6 algo sagrado porque 6 um direito deles. E acho, para terminar, que num seminério como este, nfo devemos apenas encher nossos olhos nossos ouvidos de coisas exdticas, mas olhar com seriedade aquilo que se processa aqui como injus- tiga institucionalizada contra os indios,” Direito & organizacHo e repressio As liderancas “HA uma represséo montada contra os indios, contra as liderangas que ousaram, ou que ousam, constituir uma espécie de confederagio nacional dos indios. A repressio 6 por parte do governo, via Funai, e nés precisamos nos unir em apoio a esse povo, que além de perder tudo, a cultura, a terra, a vida —, perderam o proprio direito de se unir, 0 que é fundamental na vida deles. Entéo eu acho que é hora de entendermos o que eles esto nos propondo e nos unir seriamente e mais engajadamente esses grupos indigenas.” © fndio como problema de seguranga nacional “Devemos nos lembrar que para a Funai, dentro desse modelo desenvolvimentista, os indios foram sempre considerados estorvos, empecilhos a0 desenvolvimento, a esse progresso que nds sabe- mos a quem beneficia, Atualmente hé um outro dado, eles esto sendo considerados, imaginem, um risco ou um perigo para a seguranca nacional. Eu acho que € 0 maximo de mé-fé, 0 maximo de mé-vontade, que um governo possa definir essa politica com relagéo aos indios. E nés sabemos com que fidalguia, com que educac&io, com que abertura e sensibilidade eles tém acolhido os bran- cos e tém-se dirigido a nés brancos. EF as solugdes que 08 indios propéem nesse relacionamento séio as solucées mais sébias e as mais pacificas. Esse governo no tem autoridade para enquadrar nos- Sos indios na Seguranga Nacional, de forma al- guma.” 72 ASPECTO DA PUATEIA DURANTE A APRESENTAGAO 49 Plenaria Final RELATORIO CONCLUSIVO AREA NORDESTE-LESTE “Bem, eu vou fazer 0 relatério da regitio Nor: deste-Oeste que compreende os seguintes grupos: Wassu, Potiguara, Tingui-Bot6, Xocé, Kiriri, Kueu- ruKarirl, Kaimbé, Pankararé, Patax6, Xoco-Kariri, Krenak e os indios da Fazenda Guarani. Ouvindo as liderangas de todas essas nagdes indigenas, as difi culdades e necessidades que todos sentiam eram as mesmas. Concluimos que providéncias preci- sam ser tomadas com urgéncia nas nossas éreas, nas nossas aldeias, para evitar o exterminio de nossa regiéo, Entio eu vou ler os pontos princi- pais que foram determinados: Solicitagio ao Ministro do Interior que mande a Funai demarcar as terras indigenas com urgén- cla, para evitar a ago de grileiros, que no momento expulsam os indios das suas terras, usando a vio- Jéncia para exterminar as liderangas que Jutam pelos direitos da classe sofrida e oprimida. Caso nfo haja uma posicéo urgente das autoridades competentes em defesa deste povo, este seré mais, uma classe em extingao, massacrada em nome dos interesses de uma politica capitalista desumana, que, nao tendo amor pelo préximo, s6 reconhece © direito da forca. H necessrio que essa demar- cago tenha a participagio de todas as liderancas indigenas. Solicitamos as autoridades competentes na regitio, garantia de vida para os lideres indigenas que sio constantemente ameacados de repressio pelos posseiros, que tém recursos para andarem armados ¢ contratarem jagungos, que rondam constantemente a aldeia, procurando, através da 50 pressio moral ¢ até fisica, calar a luta da comu- nidade em beneficio dos posseiros. Defendemos, todas essas aldeias defendem, uma assisténcia médica integral, uma assisténcia educacional, um programa de apoio através do INAMPS para a alimentagio dessas comunidades que sfio carentes. Que se dé uma assisténcia real- mente correta. ‘Necessidade de dar liberdade para que lideres do Conselho Tribal possam indicar os funcionérios que a Funai emprega para trabalhar na drea, tais como chefe de Posto, assistente administrativo, enfermeiros, professores etc. Pols os mesmos, uma vez que siio colocados pela Funai, s6 aten: dem os interesses da mesma, provocando divisées dentro da tribo, para poderem agir livremente em interesse proprio e em muitos casos sonegando a ajuda que chega a ser distribuida aos indios, pro- curando descaracterizar e desmoralizar a ordem do cacique, do pajé e do conselho tribal. Outro ponto é a necessidade de fazer saber que © conselho tribal é a entidade maxima, 0 mesmo com pajé, cacique e vice-cacique, e que tém direito de impor as regras da aldeia que respeitadas, tém que ser cumpridas para serem respeitados os cos. tumes indigenas. Deve-se evitar a intromissiio do chefe de posto, que quer dar ordens e ter mais autoridade que o cacique e 0 pajé, Assim, as de- marcagdes das terras indigenas, que devem ser feitas com a maxima urgéncia e devem contar com a participacao dos povos indigenas.” Relator: HIBES MENINO DE FREITAS, ‘Wassu de Alagoas | POTIGUARA - Bafa da Traigéo-PB. Populacio: 3.500 hab. Representante: José Augusto da Silva ‘Territério de posse imemorial. Documentos de concessio de terras emitidos por D. Pedro II (27-12-1859) com uma extensio total de 57.600 hec- tares, ou 4 (quatro) I6guas em quadra. Esta area tradicionalmente dividese em duas vilas, Monte- mor e So Miguel, com marcos antigos que a deli- mitam ao sul pelo rio Mamanguape, ao norte pelo rio Camaratuba, a leste pela costa atléntica, ea este por uma linha seca. Encontrase atualmente invadida por grupos econdmicos poderosos (Lundgren -e Pessoa de Mello). O primeiro chegou a apossar-se de toda a frea da vila de Monte-mor, enquanto que 0 se- gundo obteve, em 1977, uma certidio negativa da Punai que Ihe permitiu a instalagio de uma des- tilaria dentro dos limites da reserva, que passou a incentivar o plantio de cana de aclicar por parte dos indios e dos invasores de suas terras. Ao lado destes grupos particulares, também 0 INCRA de senvolveu uma agéo expropriatéria sobre os Poti guara, tendo invadido uma drea de 3.000 hectares. Atualmente, os Potiguara tém oficialmente demar- cada uma extensio de 29.000 hectares que inclui toda a sirea da vila de Sio Miguel. No momento, orientam todos os esforgos no sentido de obter a retomada integral do seu territério, tendo obtido alguns sucessos significativos, como a retomada de 1 Iégua de matas as margens do Camaratuba (11.80), e de uma plantagéio de cocos junto & cida- de de Baia da Traicfio. Esta cidade, incluida na reserva, esté ameagada de ser desmembrada pelo prefeito. A partir de fevereiro de 1981, a implantacho de um projeto de desenvolvimento agricola (Pro- jeto Integrado Potiguara) fez agravar as tenses na érea, Este Projeto, que conta com 0 apoio téc- nico-institucional do Prodecor (Projeto de De- senvolvimento Comunitério Rural do Estado da Paraiba), veio aumentar as divisdes entre os Poti- guara, a0 tempo que funciona como mecanismo enfraquecedor da luta pela retomada das terras. ‘Tera se implantado sem a participagio dos indios, e sem estar referido as suas expectativas e neces- sidades, com a presenga de grandes tratores 20 custo de Cr§ 1.600,00/he e a destinagio de 2 hee- tares por familia, criando uma situagio em que se sentem mais como “moradores”, assalariados pela Funai e usinas, ¢ néo como indios aldeados. As reivindicagées basicas dos Potiguara sio hoje, a completa retomada das suas terras ¢ 0 con- trole do Projeto Integrado Potiguara, de modo a adequé-lo As suas reais necessidades. WASSU - Aldeia de Cocal, municipio de Joaquim Gomes-AL. Populagéo: 1.200 hab. Representante: Hibes Menino de Freitas, vice- cacique, ‘Territério de posse imemorial, com documen- tos de doagio emitidos por D. Pedro II apés # Guerra do Paraguai, e entregues & guarda dos che- fes Salazar de Souza e Joio Tomas Marques Flo- res que, juntamente com outros Wassu, partici: param daquela guerra, Este documento caiu no poder de uma familia de usineiros, Goes de Bar- ros, que tem decididamente se negado a devolvé-1o e a reconhecer a sua existéncia. Hé também um documento datado de 1904 e que se presume estar no cartério de Passo do Camaragibe, ocorrendo também aqui o mesmo tipo de recusa. Outros tes- temunhos — uma espada utilizada na Guerra do Paraguai e distintivos de infantaria existentes — sio também invocados como confirmadores da doacdo de terras anteriormente referida. ‘A rea considerada como original (cerca de 57.000 hectares, ou 4 Iéguas em quadra) sofreu um violento processo de invasio por parte de gran- des plantadores de cana, estando hoje reduzidas ‘as posses dos Wassu a 300 hectares de terrenos pe- dregosos e largamente devastados, privando-os de madeira e cipd, necessirios as suas atividades tra- dicionais, Nos tiltimos meses, a iniciativa dos Wassu, de realizar a limpeza de seu cemitério em Torre do Camaragibe-Wassu, deparouse com violenta rea- cao dos grileiros que a impediram e ameacaram uma invasio armada & Aldeia de Cocal. Diante desta ameaga, decidiram-se pela derrubada da ponte que dé acesso & Aldeia, o que impediu a imi- nente ocorréncia de invasiio. Tal agao repressiva foi incentivada pelos proprietarios e politicos 1o- cais, destacando-se Amaro Galdino, Amaro Batista eo proprio prefeito do municipio de Joaquim Go- mes, Gendevaldo Cicero dos Santos, os quais con- taram com 0 apoio da policia local. Mais recentemente, a presenga do Pr6-41 cool na drea tem agravado a situagio face a0 avango do plantio de cana, que ameaga o que resta do seu territdrio e os submete a uma relagio de dependéncia, marcada pela exploragéo, Dada a st inexisténcia de terras para 0 desenvolvimento de seus cultivos de subsisténcia, enfrentam uma situa- go em que séo, inevitavelmente, levados a traba- Ihar como assalariados nos canaviais, remunerados & base de Cr$ 240,00 por tonelada de cana colhida, ou Cr$ 120,00 por dia, ‘Tem no momento, os Wassu, problemas de sati- de ligados a grande ocorréncia de escorbuto, devido & desnutrigao que atinge sobretudo as criancas, conforme constatou recentemente a Legiio Brasi- leira de Assisténcia (LBA). Hi também limitag6es impostas a prética do Toré, que os obrigam a realizélo as escondidas nas capoeiras, e toda uma carga de preconceitos que os define como bébedos © preguicosos junto & populagao regional. As maibres reivindicagdes dos Wassu sio: a metade da terra a que tém direito; o seu reconhe- cimento pela Funai e pela sociedade brasileira como um povo indigena com direito & assisténcia prevista em lei e & autodeterminagéo; apoio mé- ico © educactonal atualmente inexistentes, ¢ efe- tivas medidas com vistas & preservagdo do seu meio-ambiente. XUKURU-KARIRI - Palmeira dos indios-AL. Po- pulagao: 900 hab. Representantes: Manuel Celestino, Presidente do Conselho Estadual dos tndios de Alagoas Milton Celestino, representando Miguel Celestino, pajé. © territério demarcado Xukuru-Kariri restrin- ge-se A Mata de Cafurna, reserva destinada apenas a realizagéo dos rituais (segredos) indigenas, com 389 tarefas, e a denominada Fazenda Canto com 750 tarefas (aproximadamente 117 hectares), érea insuficiente para as suas necessidades. Os Xukuru- Kariri esto a exigir a demarcacdo de uma légua em quadra, a que tém direito, atualmente inva- dida por posseiros, A insuficiéncia da area jé demarcada tem im- plicado no assentamento de virias familias indi genas fora dos seus limites, as quais se véem obri- gadas a0 pagamento de impostos sobre estas terras, Um projeto instalado pela Funai, a partir de abril de 1981, no valor de Cr$ 2.100.000,00, tem diversos campos de aplicacio, incluindo, entre ou- tros, reforma de prédios escolares, construgio de casa de farinha, abertura de pocos; aquisicio de instrumentos agricolas e construgio de um reser- vatério para agua, Este projeto 6 gerido exclu. sivamente pela Funai, 0 que tem provocado desa- grado e desconfianca por parte dos indios. Desde 1967, 0s Xukuru-Kariri tém fornecimen: to gratuito de energia elétrica que Ihes foi conce- dido num acordo, a titulo de indenizagio por te- rem as linhas de transmissio cortado o seu terri tério, ocupando 0 espaco de algumas rogas. Re- centemente, ocorreu interrupgio neste forneci- mento sob justificativa de falta de pagamento. Além da retomada definitiva das terras a que tem direito, reivindicam a sua participagio na geréncia dos projetos desenvolvidos pela Funai, colocando presentemente como necessidade bisica, © apoio as atividades agricolas. Ao lado disso, exi- gem © cumprimento do acordo firmado para for- necimento de égua e luz. TINGUI-BOTO - Otho D’Agua do Meio, Feira Gran. de-AL. Populagio: 800 habitantes. Representante: Adalberto da Silva, cacique. Os Tingui-Botd deslocaram-se ha cerca de 70 ou 80 anos da rea do atual Posto Indigena Real do Colégio, fixando-se desde entao no local onde hoje se encontram. A drea af originalmente ocupa- da, foi sendo progressivamente invadida até a per- da total do seu territério agricola, conservando hoje apenas 2 hectares que correspondem ao es- Pago reservado & pratica do seu principal ritual, © Ouricuri. Para sobreviver, véem-se obrigados & utilizacdio de uma parcela desta limitada érea para agricultura. As outras alternativas de sobrevivén- cia reduzem-se ao trabalho assalariado, no corte de cana & base de Cr$ 100,00 por dia, nas fazendas que circundam seus 2 hectares, deslocando-se ou- tros para usinas mais distantes. O cultivo de ro- as nas fazendas vizinhas, indispensvel ao provi- mento de sua subsisténcia, s6 hes 6 permitido me- Giante devolugéo das terras ao prazo de um ano, com pasto para 0 gado. Tal condigao limita-os a cultivos de répida maturacao (feijio e algodio). Este ano, a situagao se agravou com a perda quase total de toda a lavoura, provocando a saida de grande mimero de pessoas. As mulheres Tingui-Boto trabalham com arte- sanato, utilizando o ouricuri, e atualmente sio obrigadas a comprar nas fazendas vizinhas este produto, bem como a lenha para cozinha. Com- prando a diizia de palha a Cr$ 170,00, produzem com esta quantidade cerca de 3 chapéus por sema- na, que sio vendidos a Cr$ 40,00 a unidade, - Desde 1962 existe na Funai um proceso rela- tivo & comprovagéo da existéncia dos Tingui-Botd, seguido de um relatério completo, em 1979, feito pelo antropélogo Célio Horst, da Funai, e mais recentemente de uma carta-relatério do professor Clovis Antunes, da Comissio Pré-tndio e Univer sidade Federal de Alagoas. Até o momento, nio se tem conhecimento de qualquer encaminhamen- to por parte daquele érgio. Por outro lado, na medida em que buscam o apoio da Funai, so- frem, por parte desta, restri¢des & sua liberdade e capacidade de deciséo, como, por exemplo, ten- tativas de impedir a sua participacéo em assem- biéias indigenas. A reivindicagio bésica dos Tingui-Boto 6 0 direito & porcdo de terra originalmente ocupada quando ‘do seu assentamento no local, pois 86 as- sim podero manter a sua unidade, preservando as préticas culturais e mantendo, fortalecida, a sua identidade étnica. O néo atendimento desta reivindieacio bésica em curto espago de tempo, poderd implicar em prejuizos ainda mais sérios, na medida em que presentemente, a exigiiidade ter- ritorial 6 ameacada por tentativas de fazendeiros vizinhos de destruir a faixa de matas que deli- mita e preserva o territério Tingui. Esta retvindi- cagio combina-se com a exigéncia do seu reconhe- cimento pelo, 6rgéo tutelar como povo indigena, com pleno acesso a todas as garantias disto decor rentes. KARIRI-XOKO - Porto Real do Colégio-AL. Popu- lagéo: 700 hab. Representantes: Antonio Celestino, cacique Francisco Queiroz, pajé. © territério historicamente ocupado pelos Ka- riri-Xok6 correspondia a uma area de 2 1éguas em quadra, da qual hoje, apenas 860 hectares Ihes so reconhecidos. Desta porcéo, viram-se durante mui- to tempo redusidos & ocupagao de apenas 250 hec- tares correspondentes & denominada “Sementei- ra”, estando o restante sob 0 controle de invasores, © maior dos quais, a Companhia de Desenvolvi- mento do Vale do Sao Francisco (Codevast), ocupava 480 hectares. Mais recentemente, um movimento de exclusiva iniciativa dos Kariri-Xok6 permitiu a retomada daqueles 480 hectares, dos quais, entretanto, apenas 200 hectares foram ga- rantidos pela Funai, que restituiu ao controle da Codevast a area restante. Nos limites da drea itt '21— ADALBERTO FERREIRA DA SILVA, TINGULEOTO DE ALAGOAS retomada foi implantado um programa agricola, ocupando 40 familias indigenas voltadas para o plantio de arroz, cultivo bésico atualmente. A apli cagio deste programa é limitada pela nao incor- porag&o do total da érea retomada, o que continua, gerando insatisfacdo, Contando com um cacique e um pajé, além de ‘um conselho tribal de 10 membros, tém os Kariri XOK6 enfrentado nos ultimos tempos, certas pres- ses e interferéncias por parte de estranhos e da propria Funai, no sentido de dificultar a aco de suas liderangas, buscando com isso, criar divisdes entre os indios, em proveito proprio. Deste modo, a autoridade mais reconhecida dos ultimos tem- pos vem sendo a de um vereador, nascido no local, que disto tem se utilizado para beneficiar paren: tes. Ao lado disso, ocorre ainda o fato de que toda inieiativa de produgio econdmica por parte dos indios, sofre limitagdes e controle da Funai, que, a0 contrério, permite a livre aco dos invasores, sempre prejudicial aos primeiros. 33 As duas reivindicages atualmente defendidas pelos Kariri-Xok6 sio a completa devolucio do territdrio a que tém direito, eo reconhecimento das suas liderangas, com 0 devido respeito as suas tra- digdes e capacidade de gerir seus proprios inte- resses. XOKO - Ilha de Séo Pedro, Porto da Folha-SE. Populagio: 170 habitantes. Representantes: Paulo Acdclo dos Santos, conselheiro José Apolonio dos Santos, conselheiro. Desde 0 século XVII 0s Xok6 conseguiram 0 dominio reconhecido sobre terras na extensio de 1 Iégua em quadra (a “Caigara”), as margens do rio So Francisco. Constantes conflitos com eria- dores de gado, que invadiam suas terras, levaram- nos a utilizar como refigio a Tha de Sio Pedro — defronte & légua de terra que thes pertence —, sede de uma misséio de capuchinhos. No inicio deste século, muitos Xokds j tinham se deslocado para Porto Real do Colégio, de onde empreenderam sucessivas tentativas de retomada de suas terras. A partir da década de trinta inicia-se a forte influéncia da famflia Brito que disputa aos indios a posse da “Caigara”, comprandoa final mente & Prefeitura de Porto da Folha em 1963 Nao satisfeitos com isso, empreendem, nos anos setenta, um avango sobre as terras nfo incluidas na compra anteriormente feita, drea de refigio das familias indigenas que ainda ai permaneciam, obrigando.as desde entio, a trabalhar como assa- lariados ou meeiros. Em 1978, cansados de todas as persegui¢ées movidas pelos Brito, decidem nfo apoiar eleitoral- mente candidatos destes, dando infcio a um inten- 50 trabalho de mobilizagdo pelo completo reconhe cimento de seus direitos as terras. Neste sentido, decidem-se a tomar posse da Tha de Séo Pedro, ento desocupada, cereandoa, de 13 a 15 de setem- bro daquele ano, A reacéo dos Brito fazse sob a forma de uma queixa judicial de invasio de tor Tas, acompanhada de ago policial. Apés viverem um perfodo de fortes pressbes, deslocam-se os Xok6, em setembro de 1979, para a Tha de Sao Pedro, como tinica forma de se manterem em se- guranca e garantir a posse da Iha. Diante dessa situagio, a Funai propée ficar a Tiha sob a posse dos indios, enquanto a “Caicara” permaneceria sob controle dos Brito. Rejeitada esta proposta, intervém 0 governo do Estado de 54 Sergipe “desapropriando” a Ilha de Sio Pedro, pela qual receberam os Brito a quantia de Cr$_ 2.400,000,00 referente a 600 tarefas de terras, quando na realidade a Ilha tem apenas 319 tarefas. Estabilizada a permanéncia dos indios na Ilha, enfrentam contudo, ainda hoje, restrigGes por par- te dos Brito que os impedem de sair da Ilha atra- vés da “Caigara”, e de se locomoverem nesta, colo- cando pistoleiros ao longo das estradas. Prosseguindo na luta pela reconquista plena dos seus direitos, os Kok6 exigem hoje a supera- cdo de todas as ameacas e a completa retirada dos Brito da drea da “Caicara”. PANKARARE - Brejo do Burgo, Nova Gléria-BA. Populagéo: 1.200 habitantes. Representantes: Manoel Pereira Xavier, cacique Menezes Celestino de Barros, conselheiro, Procedentes da extinta missio de Curral dos Bois (Santo Antonio da Gléria), &s margens do S80 Francisco, fixaram-se os Pankararé, desde 0 séoulo XVIII, na drea de Brejo do Burgo, onde des- cobriram uma fonte perene, a “Fonte Grande”. O territ6rio que esto ocuparam tinha aproximada. mente 2 Iéguas no sentido de “nascente” a “poen- te” e estendia-se, no sentido nortesul, desde as proximidades do Brejo até os limites de Raso da Catarina. ‘Ao longo do tempo, esta drea passou a ser ocupada por nfo-indios, ocorrendo hoje uma gran- de penetraco das éreas de ocupacio, indfgena ¢ nao-indigena. Tal quadro tem estimulado uma situagio permanente de tensio, com grande pre- juizo para os indios, agravada por constantes in- terferéncias de politicos com interesses na locali dade, os quais procuram negar a identidade dos Pankararé, incentivando as disputas, Até o pre- sente, a participagio da Funai tem sido de com. pleta omisséo, limitando-se & apresentacéo de pro- postas em desacordo com os interesses dos indios. Nos titimos dois anos, foi implantada, pela Secretaria Especial do Meio Ambiente (SEMA), a Reserva Hcologica do Raso da Catarina que res tringiu quase que totalmente o territério de caga dos Pankararé, prejudicando sobretudo, 0 nticleo do “Chico”, que tem nesta a sua atividade mais importante, z Jé no corrente ano, o Instituto de Terras da Bahia (Interba) propée como soluc&o a titula cdo das terras ocupadas, no que é apoiado pela | | Funai que também promete a instalagio de um Posto Indigena. A proposta de titulagao foi firme- mente recusada pelas liderangas indigenas, embo- ra bem recebida por muitos no-indios. Diante des- ta atitude e do propésito dos Pankararé de lutar pela criagio de uma reserva indigena, um funcio- nério da Funai teria afirmado “voeés tém direito a esta reserva mas vai demorar muito”, insistindo na vantagem de aceitagéo dos titulos individuals. ‘A criagHo de uma reserva indigena compreen: dendo todo o territorio sem ocupagio permanente entre 0 povoado de “Salgadinho”, ao norte, e os limites da Reserva Ecoldgica, ao sul, ¢ os antigos marcos indigenas do “nascente” e do “poente”; a implantac&o imediata de um Posto Indigena que venha a garantir a seguranga dos indios, bem como assisténcia médico-sanitiria, educacional e agricola da qual se encontram hoje extremamente carentes, so as reivindicagbes fundamentais do povo Pan- kararé. KAIMBE - Massacaré, Euclides da Cunha-BA. Po: pulagio: 950 habitantes. Representante: Silvino Pereira de Santana, conse- Iheiro. Aldeados na missio de Massacaré desde 0 sé- culo XVII, os Kaimbé tém direito a uma drea de 12.320 hectares (uma légua em quadra), corres- pondente ao territdrio original daquela missio que se encontra hoje em grande parte ocupado por invasores, dispersando-se os indios pelas faixas menos f6rteis do terreno. Ultimamente os Kaimbé empenham-se bastan- te na luta pela demarcacéo e retomada de suas terras, agindo de forma enérgica diante das tenta- tivas de expanséo dos invasores, sobretudo dos grandes fazendeiros Severino Francisco dos San- tos, Ari Almeida e Oliveira Brito, ao tempo em que aguardam 0 inicio dos trabalhos de demar- cago ainda no corrente ano, conforme promessa da Funai. A reivindicagio bisica dos Kaimbé é que a demarcagio se faga acompanhada de um trabalho de esclarecimento junto & populagéo nao indigena, de modo a garantir a seguranca dos trabalhos e dos prdprios indios, e de uma definicdo clara quanto a0 reassentamento dos posseiros. Ao lado disso, reivindicam a presenga de funciondrios ¢ material que permitam o funcionamento da escola e do posto de saide. KIRIRI - Mirandela, Ribeira do Pombal-BA. Popu- lag&o: 1.800 habitantes. Representante: Lézaro Gonzaga de Souza, cacique. Foram também aldeados numa missio jesuita no século XVII, com direito a 12.320 hectares de territério, amplamente invadido ao longo dos ulti mos dois séculos, e que se encontra atualmente em demarcagao, apés intensa campanha neste sentido realizada pelas liderangas Kiriri, desde inicios da década de setenta. No decorrer desta luta tiveram que enfrentar, além do descaso da Funai, forte resisténcia por parte dos invasores que chegaram a promover, em determinados momentos, levantes armados. Presentemente, 0 principal problema dos Ki- riri relaciona-se com 0 fato de estar a demarcagao sendo feita sem o devido esclarecimento aos pos- seiros, @ sem 0 conhecimento de quaisquer medi- das quanto ao seu reassentamento, o que tem it centivado reagSes de hostilidades destes contra os indios, a ultima das quais causou a destruigio de toda a cerea da roga comunitéria indigena da Bai- xa da Catuaba, sendo seguida de atitudes seme- Ihantes por parte dos indios. Apesar deste quadro de intranqitilidade, tem trabalhado intensamente no sentido de fortalecer @ sua unidade, incentivando a pratica regular do “Toré” e a implantagio de rocas comunitarias em todos os nticleos indigenas, acompanhada da aber- tura de pogos artesianos. ‘A grande reivindicagio dos Kiriri é a tomada de medidas urgentes para solucionar 0 problema dos posseiros, permitindo-Ihes, deste modo o com- pleto controle sobre o territério. Junto a isto, ten: tam obter os meios para uma efetiva ocupagao deste territorio, reivindicando principalmente um bom programa de apoio agricola. Tal necessidade tem aumentado por forea de recente periodo de estiagem, PATAXO - Barra Velha, Porto Seguro-BA. Popu- lag&o: 1.800 habitantes. Representantes: José Farias do Nascimento Benedito Braz Ferreira Estabelecidos no sitio de Barra Velha desde meados do século XIX, por iniciativa do governo da Provincia & época, os Patax6 reconhecem como seu territério toda a 4rea compreendida entre a costa e © Monte Pascoal, no sentido leste-ceste, € 58 ‘H— SILVINO PEREIRA DE SANTANA, KARIMBE DA BAHIA, © curso dos rios Caraiva, ao norte, e Corumbau, ao sul. Exatamente nesta drea foi criado em 1962, pelo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF), 0 Parque Nacional do Monte Pascoal. A partir dai, iniciaram-se fortes pressbes sobre 0s indios, impedidos pela guarda do Parque de cacar e estabelecer rocas. A intervengao da Funai no sentido de dimi- nuir as tensées, levou a um longo periodo de nego: ciagdes com 0 IBDF, tendo em vista a definicéo de uma érea para a criagéo de uma reserva indi. gena. Durante todo esse periodo esteve bem clara disposigao do povo Pataxé de exigir toda a drea do Parque, ja que esta correspondia ao seu terri- torio tradicional. © acordo firmado entre a Funai e 0 IBDF, em julho de 1980, desrespeitou tal disposic&io, destinando a reserva indigena ape- nas 8.720 hectares dos 22.500 do Parque, sem qual- quer consulta mais ampla & populacéo Pataxé, 56 ‘Tal medida ¢ agravada pelo fato de 0 territério des- tinado & reserva corresponder &s faixas mais esté- reis, brejos e aredes em sua maior parte. Por outro lado, a Funai valeu-se do recurso flegal de indenizar individualmente, mediante dinheiro, os indios estabelecidos fora dos limites definidos para a reserva, A revolta dos Pataxé diante destes fatos tem aumentado em face das atitudes tomadas pelo che- fe do Posto Indigena, Moacir Cordeiro de Melo, ¢ pelo Delegado Regional Carlos Roberto Grossi, que néio apenas criaram as condicées para a realizagdio da demareacéo, como tém pressionado os indios a aceité-la sem reclamagdes, mediante ameagas de expulséo da drea e intervencdo policial. Ao lado disso, a md geréncia do “Projeto de Desenvolvimento Comunitério”, com a utilizagao de verbas cuja aplicagéio nfo € conhecida pelos Pataxé, tem estimulado um permanente clima de 15 — LAZARO GONZAGA DE SOUZA, KIRIAI DE MIRANDELA/BARIA desconfianga para com os principais administra- dores. Reivindicam, acima de tudo, a anulagio da rea presentemente demarcada, continuando a insistir no seu direito sobre toda a érea do Par- que. Exigem também a saida do atual chefe do PII. e suia substituicdo por alguém que venha a de- fender seus interesses, medidas indispensdvels 20 restabelecimento do equilibrio das relages sociais na érea. INDIOS DA FAZENDA GUARANI - Carmésia, MG. Populagio: 180 habitantes. Representantes: Manuel Ferreira da Silva (patexd) Babiano Xerente Criada pela Funai com o objetivo de servir como colénia penal indigena, a Fazenda Guarani 6 hoje ocupada por indios de diversas origens, sobretudo Patax6, Krenak e Xerente, que vivem em péssimas condiges e sob a dependéncia de maus administradores. Recentomente a Funai suspendeu a compra de artesanato ind{gena, de cuja comercializacao se encarregava, retirando, sem qualquer prévia comu- nicagio, um dos principais meios de subsisténcia dos indios. Do mesmo modo, foi suspenso o for- necimento de alimentagéo pelo INAM, devido & interferéncia do administrador que 0 considerou desnecessério. A educagéo na drea é extremamen- te precdria, estando a cargo de duas professoras despreparadas para a fungiio, o que agrava as més condigées materiais. Os indios da Fazenda Guarani estao exigindo © reinicio da compra pela Funai do seu artesa- nato, bem como do fornecimento da alimentagéo do INAM. Reivindicam também apoio a0 traba. Iho nas rogas comunitérias, manutengfo da can- tina, e ampliagiio e melhoria da assisténcia educa. cional que atinge atualmente a 2.* série do primeiro grau. Outras necessidades apontadas so a refor- ma das casas, todas elas em més condigdes, e 0 fornecimento de roupas ¢ cobertores, indispensé- veis nos perfodos de inverno, Os Krenak que ainda hoje permanecem na Fazenda, encontram-se impedidos de deixé-la, sob severa vigilincia dos funciondrios da Funai, o reclamam seu direito de se juntarem aos Krenak que conseguiram voltar ao seu territério de origem, as margens do Rio Doce. KRENAK - Resplendor-MG, Populagéo: 50 habi- tantes. Representantes: Augusto Paulino Adio Lufs Viana (relato apresentado, por escrito, pelos represen- tantes), Ha sete anos atris nds fomos transferidos pelo Capito Pinheiro para a Fazenda Guarani. Ele Jevou nés enganados. Tirou a comunidade da drea, levando até indio preso. Entéo na Guarani nao foi cumprido o que prometeram. Tinham garan- tido dois anos de comida e s6 levaram um cami- nh&o de mantimentos. Nao foi mais. 2 AEPRESENTANIE O08 PATARO OA GAHIA 7 Nés néo tinha recurso pra manter a famiflia, Lé no tem servigo. Era na base de banana cozida com sal. As familias doentes e 0 chefe nao se inco- modava. Quando levava 0 doente para a cidade, o enfer- meiro da Funai cobrava. Nés nfo tinha dinheiro @ ficava em precisiio. Como viver 14? Dr. Adhemar apoiou nds voltar pro Krenak. A Guarani néo era nossa. Nos se combinamos ¢ Aecidimos voltar pro nosso lugar. Quando foi no dia pra nds vir, os outros amo- leceu com medo da Funai, Ai, Addo, 0 cacique José Alfredo e Manoel, nés fomos pro Krenak com as familias, Ocupamos a drea do patronato, Queriam man: dar a polfcia contra nds. Af veio muito apoio e nés ficamos na area com 13 alqueires Comegamos a trabalhar nessa area. Logo veio © delegado da Funai querendo levar nds de volta para a Guarani, Af nds dissemos que s6 voltava morto. Af ele ameacou até de expulsio. Proibia de trabalhar. ‘Mas nés vimos que a terra era pouca e pega- mos mais 2 hectares que estava na mio do fazen. deiro. O delegado proibiu. Ele queria que n6s ficasse com os 13 alqueires. Pagava até o servigo que a gente tinha feito nos 2 alqueires. Deu 2 mil pro Manoel, sem com- binagio com o grupo. Quando nés soube, nés man- damos uma carta pro presidente da Funai como ele tinha proibido 0 nosso servico. No teve res: posta da carta. Nés demos prazo para demarcar a terra, sendo nés entrava na drea. Veio o Raimundo, secretério do presidente, ¢ © delegado. Juntou o grupo e perguntou quanto nés queria. Af combinamos de 250 alqueires, da margem do rio Doce até na Barra do Eme, dgua vertente. © Raimundo queria fazer um documento na hora mas 0 delegado nfo quis, S6 fazia na Delegacia Regional, em Valadares. Em vez de fazer 250 alqueires, 0 delegado fez 250 hectares. Nos néo aceitamos essa historia. A terra toda sio 1.950 alqueires, e nds s6 quer 250 alqueires. © delegado esta criando problema com nés. Nos quer medig&o logo. Pra frente nés podemos querer mais, se eles nio fizerem logo demar- cagio, Hoje 0 problema é de posseiro botando gado em cima da roca dos indios. A gente fala com 0 vaqueiro ¢ ele diz que vai botar o gado todo na roga porque 0 advogado deles diz isso. Jé comegamos a prender 0 gado e s6 solta de- pois que pagar o estrago. Se no resolver esse 58 problema de terra o mais breve, nds vai comegar a comer 0 gado. Nés quer enfermeiro, professora. Umas me- ninas esto estudando fora. Na Delegacia de Vala- dares os doentes sfio mandados de volta, sem aten- dimento, Em Resplendor 6 0 foco dos fazendeiros € nfo gostam de nés. Por isso nds niio vai la. A gente pede ao delegado a terra e ele chama nés de preguigoso © beberréio. O delegado chama ‘Addo de agitador, © delegado quer cobrar a semente de planta que a Funai quer mandar. Ele disse que era pra devolver a semente que receber e disse que no era pra Funai, era pra Unido, Ai nés dissemos que @ Uniiio era no meio de nés mesmos. Por isso a semente vai ficar com nés mesmos. Af ele disse que ns néo ia mais receber semente, Nés estamos morando no tempo, no que res- tou da enchente. Estamos precisando de casa. Observacio: Apés a entrega do relatério, os representantes lembraram a questo criada em torno da renda da partida de futebol realizada em Belo Horizonte, entre artistas e jogadores profissionais, 40% da qual seria destinada aos Krenak, para que estes adquirissem ferramentas e sementes e atendessem ‘a outras necessidades. A entrega da importancia (Cr§ 379.105,68) ao Grupo de Estudos da Questao Indigena (Grequi) — co-promotor do evento foi embargada pelo delegado regional da Funai, estando a sua entrega aos Krenak dependendo, no momento, de deciséo judicial). Lembraram também a situagio de dispersio ‘a que eles foram levados, referindo-se & presenga, hoje, de indios além da Fazenda Guarani, na Tha do Bananal, em Goids, nos Postos Indigenas em Cachoeirinha (MS), Vanuire (SP), Maxakali (MG) e Fulnié (PE). XAKRIABA - Miss6es Itacarambi - MG. Relato apresentado pelo indigenista José Porfirio dos Santos Neto - MG). © grosso da populacéo esta fixada nas locali- dades denominadas Sumaré e Brejo do Mata-Fome, no municipio de Itacarambi, norte de Minas Ge- rais, Sao, aproximadamente, 3.500 pessoas, entre indios e mesticos. Em fins do século XIX, 05 Xakriabé recebe- ram uma drea de terra que ia do Morro Pintada até Sao Joao dos Indios (atualmente Séo Jodo das Miss6es), limitada a0 norte pelo rio Carinhanha. | Esta drea foi doada pelo Imperador D. Pedro II ¢ registrada na localidade de Ouro Preto. Na década de sessenta intensificouse a inva- so e grilagem da terra dos indios sob alegagio geral de que “terras tio boas nfo podem ficar nas méos de preguicosos sem ambigéo”. Em 1968, jé com a maior parte de suas terras invadidas, um grupo de indios foi até Brasilia, procurar seus di- reitos. Apés muita andanga e insisténcia, conse- guiram a criagdo de um P.I. na érea, que $6 fi im- plantado em 1974, Foi feita nova demarcagio, desta vez abrangendo 46.800 hectares, menos da metade da drea original, e foram colocadas placas do Ministério do Interior nos limites (MINTER. FUNAI/Area Indigena. Proibida a entrada de pes soas estranhas). Nada foi feito para relirar da rea os grileiros e invasores que lé permanecem, utilizando m&o-de-obra indigena a troco de roupa e cachaga. Em 1977, um fazendeiro colocou uma grande cerca dentro da érea, cerca que fechava a estrada que dava acesso a Sio Joao das Missdes. Os indios, que necessitam ir sempre a esta localidade realizar suas trocas, denunciaram 0 fato ao chefe de Posto, que imediatamente mandou que jogassem a cerca 20 chéo, no trecho que impedia a estrada. A cerca foi refeita com reforcos e novamente jogada 20 chiio. Por causa disso, uma equipe do DOPS (De- partamento de Ordem Publica e Social), acrescida, de jaguncos bem armados, invadiu a area, pren- dendo 0 chefe do Posto, revistando a sede do Posto @ as casas dos fndios, sob alegacéo de que ali esta- va havendo preparagio para Iuta armada contra os fazendeiros. Encontraram apenas facdes ¢ en- xadas. Foram embora, no sem antes dispararem muitos tiros e amedrontarem bastante os indios. O chefe de Posto foi transferido e substituido. Atualmente, 95% da terra dos Xakriabé esté invadida. Os indios mais jovens trabalham para os invasores, por absoluta falta de terra, O pré- dio onde deveria funcionar a escola esta sem cober- tura e com duas paredes ao chi. Nao existe posto de satide. Rodrigao, um dos Iideres, nos disse ter sido varias vezes chamado para que aceitasse a divisio das terras restantes em glebas individuais, divisio essa que seria levada a efeito pela EMATER, me- diante 0 pagamento de Cr$ 60.000,00. Declara Ro- drigio que 0 Delegado Regional afirmou que esta seria a melhor saida para eles, pois de posse da escritura das glebas poderiam pedir financiamento bancdrio para agricultura e assim ganharem muito dinheiro. 'TUXA - Rodelas-BA. Populagéo: 600 habitantes, A situagio dos Tuxé foi referida pelo repre- sentante Kiriri, Lézaro Gonzaga de Souza, que soli- citou 0 seu registro neste relatorio. Os indios Tux4, historicamente localizados as margens do rio Sao Francisco, encontram-se hoje ameacados pela construcio da Barragem de Ita- parica, que inundard o seu territério. As obras jé foram iniciadas e tém conclusao prevista para 1895, Até 0 momento néo tém os Tuxé, conheci- mento de quaisquer medidas referentes @ garantia dos seus direitos, temendo que possam vir a ser transferidos para um local que nfo corresponda as caracteristicas da drea onde hoje estio estabe- lecidos, propicia & agricultura de vérzea e apoiada no cultivo de cebola para mercado. Temem sobre- tudo que venham a ser pressionados a receber indenizagio em dinheiro, o que fatalmente provo- caria sua desintegragao. Resumo das reivindicagées bisicas: — Garantia & posse e plena utilizagio das terras a que tém direito e que sio necessirias & sua sobrevivéncia. — Demarcagio destas terras. — Partieipagiio integral na elaboragao, acompanhamento e execucio dos projetos desenvolvidos em suas dreas. — Reconhecimento oficial dos povos indigenas que tém hoje contes- tada a sua identidade étniea. — Garantia a estes povos dos direitos previstos pela Lei 6001 — Esta- tuto do Indio e pela Constituigao. — Respeito e garantia & sua liberdade de manifestacio, dentro e fora das areas indigenas. — Reconhecimento e respeito as suas liderancas. 59 Representantes de Entidades Partietpantes da Reuniio Clévis Antunes Albuquerque — CPLAL Beatriz Gées Dantas — CPLSE Fabio Alves dos Santos — CIMI-NE Clélia Neri Cortes — ANAL-BA Edwin Reesink — ANALBA José Augusto Laranjeiras Sampaio — ANALBA (relator) Ma. Rosdrio G. de Carvalho — ANAL-BA (relator) Rosella de Oliveira Santos — ANAL-BA José Portirio dos Santos Neto — MG ‘Sonia Lausky — AMDA-MG ‘Thais Christéfaro — GREQUIMG Willer Araijo Barbosa — GREQULMG Pedro Agostinho da Silva — CEAI-ABA RELATORIO CONCLUSIVO REGIAO NORTE Invasio do territério: “Nés, 0 pessoal da regifio Norte, éramos com- postos por 11 lideres indigenas, alguns voluntérios da Comissio Pr6-tndio de S. Paulo e alguns antro- POlogos, provavelmente. Nés debatemos questdes muito importantes. A primeira foi sempre a ques: to da terra; a invasio do territério de Roraima pelos posseiros, fazendeiros, griletros e garimpel- Tos; acontecendo a mesma coisa no Pard, aonde ha garimpeiros e aqueles invasores de castanhais, principalmente na area dos Tirid, onde ultimamen- te vém surgindo invasées de pequenos comercian- tes estrangeiros que vém ultrapassando os limites, entregando aos indfgenas uns objetos de valor muito baixo, isso que nés debatemos,” 60 Edueagio e religifo: “NOs fizemos um debate sobre a questiio de educagdo, educagdo e religiao, quando, como ocorre muitas vezes, 0 filho indigena aprende s6 coisas do branco. Com esse processo de ensino adotado pelas missées religiosas, ele perde ou tem vergo: nha de se manifestar como ser indigena. Prova: velmente isso se vé em todas as dreas onde ndo existe uma conscientizagéio a nivel nacional, pro- movida pela igreja, que é 0 CIMI. Isso dificulta a vida da sociedade tribal indigena, quero dizer, uma religiao catolica ou protestante desconcentra a unio dos povos indigenas.” 27 — 0018 REFRESENTANTES DOS TIKUMA OO AMAZONAS Usinas Hidrelétricas: Na discussio do grupo Norte surgiu uma questiio importante, a usina hidrelétrica no rio Utinga. Isso foi uma questéo importantissima, mesmo porque é um projeto que nfo beneficia as populages Wapixana, Macuxi e outras circunvi- zinhas; porque ela vai trazer problemas serissimos & comunidade indfgena daquela regio, como cri- me, doengas desconhecidas pelos grupos indigenas ©, ainda por cima, as filhas indigenas correm o risco de se prostitufrem, como sempre acontece aonde hé invasio de tal progresso. A hidrelétrica Parakand, de Tucurui, mesma coisa, Abordamos também 0 caso Waimiri Atroari, onde a hidrelétrica de Balduina vai inundar toda aquela érea. Sao coisas que parecem ser boas s0- mente para as comunidades brancas, Um lider Macuxi falou assim: ‘coisa do branco € do branco, nunca ¢ do fndio’. Por isso é que o indio nunca se deu bem, e por isso que nés néio vamos aceitar também, vamos fazer alguma coisa, nem que seja moderada, $6 isso. Desvio de verbas da Funai: “Outra coisa que criticamos foi a Funai, por estar sobrevivendo as custas dos indios. No Par: cada posto indigena recebeu dois milhdes de eru- zeiros para fazer um trabalho que beneficiasse as comunidades indigenas. Entretanto, até hoje nfio houve esse tipo de trabalho. Para os Tikuna, no Alto Amazonas, foram liberados 17 milhdes ¢ meio de cruzeiros, mas muito pouca coisa foi para @ comunidade: 30 tercados, 30 enxadas, 30 macha- dos, um motor de 9HP e uma maquina de ralar macaxeira; s6 isso, 0 resto do dinheiro sumiu, ent&o so coisas sérias que nés denunciamos.” ‘Compra de liderangas e ameagas feitas aos lideres: “No territério do Amapé, os funcionérios da Funai, ou delegados, compram algumas comu- nidades indigenas, quer dizer, comprar justamen- te 0 cacique, para qué? Para facilitar a invasao de fazendeiros nas comunidades. 61 BE - Varios nfio-caciques sofrem ameagas quando defendem seus direitos, 6 sempre aquela represé. lia, promessas de cadeia, foi 0 que aconteceu com Paulo Honorato da tribo Tikuna, mesmo: comigo, depois da minha participacao no ‘Tribunal Russel.” Relator: Alvaro Tukano Invasio, barragens e indenizagiio em terras: “A gente estd pedindo o apoio das comunida- des indigenas e de todas as entidades que aqui se encontram, para que ajudenos a retomar aquela nossa rea, que foi vendida por Moisés Lupién a firma Slaviero. Sao 6,000 alqueires povoados de floresta ainda. N6és queremos 0 apoio das entida- des e dos irmfos indios para que nds criemos um parque nacional indigena. Outro problema que temos é aquela barragem de Santiago que inundou mais ou menos duzentos alqueires de terra na margem do rio Tguacu, ¢ até agora nfio fomos indenizados de coisa alguma. Eu pediria uma indenizagiio em terra. S6 isso ai que eu posso dizer, Obrigado.” Relator: Francisco Kaingang. (vide relatério sobre Mangueirinha) RELATORIO DA REGIAO CENTRO-OESTE, Parque Araguaia/Invasées: “Vamos comegar pela regio do Araguaia, na- bes Carajé, Javaé e Tapirapé. O Parque Indigena do Araguaia, que abriga os indios Javaé e Carajé, est totalmente invadido por posseiros e fazendei- ros — cerea de 15.000 pessoas. A Funai estd co- ‘brando imposto dos posseiros e est criando gado do DGPI nas terras do parque. Além do problema dos posseiros, que estéo acabando com as matas nativas da Ilha do Bananal e do gado da Funai, que invade as rogas dos Carajé de Santa Isabel, existe outros problemas, como os mariscadores, bareos de comércio que compram peixe a progos muito baratos e’ vendem mercadorias muito caras. Além disso, os mariscadores vendem pinga aos Ca- rajé da Barra do Tapirapé e Macatiba. Outro pro- blema ainda’ sio os turistas que invadem o rio Araguaia e 0 rio Tapirapé no veriio, acabando com ‘a pesca e a caga e deixando os peixes e tartarugas pescados apodrecendo nas praias. Agravando ainda mais a situagio, a BR-262 vai cortar o Parque do Araguaia, trazendo mais turistas, posseiros e fazendeiros.” ‘Tapirapé/Invasio de fazendeiros: “Os Tapirapé jé estéo hd oito anos brigando com a fazenda Tapiraguaia, na tentativa de demar- car suas terras; esto irritados com as freaiientes promessas da Funai de demarcar o terreno, que nunca se cumprem. Os Tapirapé perderam a paciéncia e no més de janeiro atacaram a flechadas e mataram vinte va- cas da Tapiraguaia. Isso porque os fazendeiros in- sistiram em invadir um pasto que ha muito os Ta- pirapé avisaram que era seu. A Funai, com medo que algum fazendeiro ou ‘Tapirapé morresse, fez: uma titima promessa, que os indios Tapirapé exi- gem que seja cumprida. Até julho a Punai vai demarcar a terra pedida pelos Tapirapé e vai reti- rar treze familias de posseiros que vivem nas suas terras, perto do morro do Cadete." Carajé de Luciara/Invasio: “Os Carajé de Luciara estéio com um lote de Si Domingos, que Ihes foi doado depois dos in- dios terem sido enganados pelos fundadores da cidade, totalmente invadido por posseiros ¢ fazen- deiros. Os indios estdo exigindo a imediata expul- so dos fazendeiros e a demarcagéo de suas ter- ras pela Funai. Os indios exigem também o fim das pressdes, pela propria presidéncia da Funai, para retiré-los das suas terras no Mato Grosso, e jogélos dentro do Parque Indigena do Araguaia. Os indios exigem também que a Funai reco- nheca os direitos da comunidade Carajé de Lu ciara, de viverem nas suas terras, onde vivem desde antes da chegada dos brancos.” Bakairi / Invasdes: “As terras dos Bakairi esto invadidas por fa- zendeiros que soltam gado na reserva e que for- cam os indios a matarem 0 gado. E quando os indios matam o gado, comegam os conflitos. Os fazendeiros pressionam os indios rondando a al- deia de madrugada, armados, para néo demarca- 63 rem sua dea. A Funai, por sua vez, nio toma providéncias sobre o problema da terra, Os indios exigem a demarcagéo de suas terras, fim das pres- sdes e expulsdes dos fazendeiros invasores.” Pareel / Invasie “Os Pareci colocam que quando as verras fo- rem demarcadas, teréo que ser demarcadas de acordo com as necessidades do grupo, e sem a redugéo da érea, Os fazendeiros que esto ocupan- do ilegalmente a reserva nao demarcada, esto ex pandindo a érea invadida com a ampliagao do re- banho de gado. Os fazendeiros, no passado, jé ‘entraram nas aldeias, armados, para intimidé-los a entregar a terra, Devido a inoperdncia da Funai, os Pareci temem que 0 episddio se repita, e os in- dios venham a sofrer novas ameagas de fazendel- ros armados. Precisam de assisténcia da Funai nas dreas de satide e educagio.” ‘Terena/Falta de assisténeia médica e educacional: “O cacique do posto indigena Toné, Reginaldo Miguel, colocou que um dos problemas principais do grupo é a satide: ndo existe enfermaria e faltam. medicamentos. Outro problema ¢ que néo existem instalagdes para o funcionamento das escolas, A alimentagio do grupo também ¢ problematica, pois © que 0 grupo produz no ¢ suficiente para as ne- cessidades da comunidade.” Xavante / Invasées: “Na aldeia de Parabubure existem terras to- madas por fazendeiros ha muitos anos; a Funai prometeu devolver as terras, mas até hoje nada foi feito. Os indios querem todas benfeitorias da fazenda Xavantina para eles, e a Funai quer de- volver as terras e ficar com as benfeitorias. Os indios querem a casa da fazenda para transformé- la em hospital e escola, assim poderfio ter menos contato com a Funai. Os indios acusam a Funai de defender seus proprios interesses e nfo as ne- cessidades dos indios. Os Xavante da aldeia de Nossa Senhora Auxi- liadora demonstraram grande preocupagio com a continuidade dos projetos de educagiio e os proje- tos agricolas. A comunidade quer autonomia para desenvolver os projetos e nfio quer que estes fi- quem na dependéncia do Chefe da Ajudancia do Barra do Garca.” Trantxe/Necessidade da demarcagio das terras: “Nos Iutamos com a Funai, sempre a gente foi e veio e a Funai sempre prometeu demarcar as terras, isso ha questo de anos. A gente esperou, esperou, € nunca houve demarcagéo, a gente quer mesmo que sejam demarcadas as terras, porque tem esses proprietérios por perto, nossos vizinhos, ‘que estiio sempre loteando, devagar por devagar. Ai a preocupacio de nés, Irantxe, é que as autori- dades tomem providéncias para que sejam demar- cadas as terra Depoimenw de Atanésio Irantxe, Krah6/Projetos agricolas ¢ educacionais: “Os Krah6 falaram que eles esto precisando muito de gente que queira trabalhar nas aldeias, — de gente que tenha interesse mesmo em resolver © problema do indio, e néo de funcionério da Funai. Quer dizer, eles precisam de projeto.de roca feito por antropélogos, e nao esto querendo mais funcionérios da Funai. Falaram também que seria importante que se desenvolvesse projetos na drea de satide e na drea de educacao.” Relator: André Amaral de Toral — CPI-SP. * RESUMO DAS REIVINDICACOES . POR REGIAO: I — NORDESTE/LESTE, ALAGOAS ‘Wassu (Joaquim Gomes - AL) — Reconhecimento urgente por parte da Funai — Demarcacio das terras — Assisténcia médica e educacional ‘TinguiBot6 (Feira Grande-AL) — Reconhecimento por parte da Funai — Recuperagio de suas terras — Assisténcia médica e escolar Xucuru-Kariri (Palmeira dos tndios-AL) — Que os posseiros paguem foro aos indios — Assisténcia agricola — Participagio dos indios na aplicagao dos recur- sos destinados ao PI. Kariri-Xok6 (Porto Real do Colégio-AL) — Que a Codevast devolva os lotes aos indios — Que a Funai nfo corrompa as liderancas SERGIPE Xocé (Porto da Folha-SE) — Que as terras hoje nas mos dos Brito Ihe sejam devolvidas PARAIBA Potiguara (Baia da Traigio - PB) — Retirada imediata da policia da area — Suspensio do Projeto Integrado Potiguara — Demarcacéo de suas terras BAHIA Pankararé (Nova Gléria-BA) — Reconhecimento imediato por parte da Funai — Suspensio da titulagdo de terras dos posseiros por parte do INTERBA — Criag&o de Posto Indigena Kiriri (Ribeira do Pombal-BA) — Que © dinheiro dos projetos chegue aos indios — Garantia dos indios ocuparem as terras que sio suas — Término da demareagio Kaimbé (Buclides da Cunha-BA) — Demarcacio das terras — Assisténcia médica, educacional’ e agricola Tuxé (Rodelas-BA) — Providéncias da Funai com relagdo & barragem de Itaparica, que inundaré toda érea indigena Pataxé (Porto Seguro-BA) — Anulagéo da demareagio — Mudanga do chefe do PI, Moacir Cordeiro de Melo — Participagio dos indios na aplicagio das verbs | destinadas ao PI. MINAS GERAIS Fazenda Guarani (Carmésia-MG) — Assisténcia médica, educacional e agricola — Demarcagio de 250 alqueires de suas terras até fins de maio — Defesa das rogas dos indios da invasio do gado das fazendas — Assisténcia médica e escolar . Krenak (Resplendor-MG) 65 1 — CENTRO/OESTE Krahé — Querem trabalhar com antropslogos e no com funcionérios da Funai — Solicitam auxilio nas areas da educagio e satide Bakairi — Que as terras tomadas pelos fazendeiros Ihes sejam devolvidas e demarcadas — Fim das pressées dos fazendeiros Pareci — Nio tém e no desejam presenca da Funai em suas terras — Devolugao das terras invadidas pelos fazen- deiros — Assisténcia em educagiio e satide Terena (Aldeia Alagoinha) — Instalagéo de enfermaria e fornecimento de medicamentos — Querem instalagées de escolas — Apoio para melhorar as condigdes de alimen- tago que sio precdrias ‘Tapirapé, Javaé ¢ Carajé — Expulsdo de posseiros ¢ fazendeiros — Expulsio de mariscadores e fim da invasio de turistas — Fim da destruigio da fauna (peixes e tarta- rugas) —Luta para impedir construgdio da BR-262 que vai cortar 0 Parque, com prejuizos para os indios — Demareagao das terras e pasto ocupados pela fazenda Tapiraguaia — Querem organizar 2 produgéo sem interferén- cia da Funai — Fim das press6es da Funai que quer transfe- rir os Carajé de Luciara Xavante Aldeia Nossa Senhora Auxiliadora — Querem autonomia para seus projetos e garan- tia de sua continuidade Aldeia Parabubure — Devolugio de terras tomadas por fazendeiros — Fim das promessas da Funai 66 —Querem benfeitorias da Fazenda Xavantina para instalar hospital e escola — Querem menos contato com a Funai IIL — REGIAO NORTE Em 27 de abril do corrente ano de 81, 73 lide- res e caciques indigenas reuniram-se em S80 Paulo- Capital para um debate, quando o SNI havia feito uma conspirag&o contra a populagio indigena, ten- tando alterar 0 Estatuto do Indio. Devido ao grande mimero de participantes no Semindrio, foi decidido pela coordenacko, a forma- gio de grupos por regio. A regiio Norte foi com: posta por 11 pessoas, as quais expuseram os seus problemas e manifestaram a coragem de serem tilhos da terra. Estes representantes eram: Galibi (Amapé), Apurina (Acre), Wapixana (Roraima), Makuxi (RR), Miranha (AM), Tikuna (AM), Tisi6 (PA) e Tukano (AM). Os indigenas reconheceram os abusos de al- guns funciondrios da Funai, quando Ihes dizem de que néo tém terra ou direito pela posse; séo explorados e considerados incapazes. Denunciaram, ameagas em que alguns lideres sao vistos como ni: chefes e, quando se é civilizado s6 porque se tem documento que fala e escreve em portugues, os fun- cfondrios nao thes reconhecem como indigenas. O roubo em dinheiro que alguns postos indigenas vera tazendo, por exemplo no Pard e Amapé, onde foram Gestinados dois mithées para cada posto para que realizasse um trabalho beneficente, e no foi feito. Para os Tikuna (AM) vieram 17 milhdes e quinhen tos cruzeiros ¢ no fim s6 tinha 30 machados, 30 tercados, 30 enxadas, 3 fornos, 1 motor de ralar mandioca ¢ 1 motor de 9 HP. Povos indigenas do Alto Purus e de Tumukumaque (PA) so explora dos em todos os sentidos, quando muitas vezes a Funai facilita a invasio, tem guarda-costas ete. A educacio e religiio branca foram temas im- portantes. Os indigenas sentiram o valor do estudo, que todos precisam disso para melhor defender seus direitos. A deciséo deve partir das tribos, isto 6, “nunca devemos esperar que a Funai resolva os nossos problemas, coisas que nés mesmos podemos fazer”, disseram 0s indigenas. Isso tanto pela de-

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