e Serviços de Saúde
R E V I S T A D O S I S T E M A Ú N I C O D E S A Ú D E D O B R A S I L
ISSN 1679-4974
ISSN online 2237-9622
2
Epidemiologia
e Serviços de Saúde
REVISTA DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE DO BRASIL
Indexação: LILACS
Sumarios.org
Latindex
© 2003. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde.
Os artigos publicados são de responsabilidade dos autores e não expressam, necessariamente, a posição do Ministério da
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ISSN 1679-4974
ISSN online 2237-9622
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Carlos Machado de Freitas - Fiocruz/RJ Projeto Gráfico
Denise Aerts - Ulbra/RS Fabiano Camilo Silva - SVS/MS/DF
Eliseu Alves Waldman - USP/SP
Guilherme Loureiro Werneck - UFRJ/RJ Revisão de Texto em Português e Inglês
José Cássio de Moraes - FCM-SC/SP Ermenegyldo Munhoz Junior - SVS/MS/DF
José Ueleres Braga - UFRJ/RJ
Maria Cecília de Souza Minayo - Fiocruz/RJ Normalização Bibliográfica
Maria da Glória Teixeira - UFBa/BA Hedileuza Honorata Viana - IEC/SVS/MS/PA
Maria Fernanda Lima-Costa - Fiocruz/MG Nilton Cesar Mendes Pereira - IEC/SVS/MS/PA
Márcia Furquim - USP/SP
Iná dos Santos - UFPEL/RS Editoração Eletrônica
Marilisa Berti de Azevedo Barros - Unicamp/SP Marco Antonio Ribeiro de Oliveira - IEC/SVS/MS/PA
Pedro Luiz Tauil - UNB/DF
Diagramação
Editoras Assistentes Edite Damásio da Silva - SVS/MS/DF
Ana Maria Johnson de Assis - SVS/MS/DF
Ana Maria Sobreiro Maciel - SVS/MS/DF Tiragem
Elza Helena Krawiec - SVS/MS/DF 30.000 exemplares
Luciana Monteiro Vasconcelos Sardinha - SVS/MS/DF
Zouraide Guerra Antunes Costa - SVS/MS/DF
Luane Margarete Zanchetta - SVS/MS/DF
Trimestral
ISSN 1679-4974, ISSN online 2237-9622
223 Sobrevivência e infectividade do Trypanosoma cruzi na polpa de açaí: estudo in vitro e in vivo
Survival and infectivity of Trypanosoma cruzi in açaí pulp: in vitro and in vivo study
Luiz Augusto Corrêa Passos, Ana Maria Aparecida Guaraldo, Rodrigo Labello Barbosa, Viviane Liotti Dias, Karen Signori Pereira, Flavio Luis Schmidt,
Regina Maura Bueno Franco e Delma Pegolo Alves
243 Conhecimento dos profissionais de saúde sobre a situação da tungíase em uma área endêmica no
município de Uberlândia, Minas Gerais, Brasil, 2010
Tungiasis-related knowledge of health professionals from an endemic area of Uberlândia, Minas Gerais, Brazil, 2010
Jean Ezequiel Limongi, Tatiana Ferraz Carvalho, Liana Ariza, Jorg Heukelbach, Juliana Junqueira Silva, Júlio Mendes e Alcides de Assis e Silva
265 Mortalidade infantil na cidade de Pelotas, estado do Rio Grande do Sul, Brasil,
no período 2005-2008: uso da investigação de óbitos na análise das causas evitáveis
Infant mortality in the city of Pelotas, state of Rio Grande do Sul, Brazil, in the period 2005-2008:
use of death investigation in the analysis of avoidable causes
Vera Lucia Schmidt da Silva, Iná S. Santos, Nélida Souza Medronha e Alicia Matijasevich
293 Violência interpessoal: estudo descritivo dos casos não fatais atendidos em uma unidade de
urgência e emergência referência de sete municípios do estado de São Paulo,
Brasil, 2008 a 2010
Interpersonal violence: descriptive study of not fatal cases assisted in an emergency reference unity to seven
municipalities of the state of São Paulo, Brazil, from 2008 to 2010
Lenise Patrocinio Pires Cecílio, Cléa Adas Saliba Garbin, Tânia Adas Saliba Rovida, Ana Paula Dossi de Guimarães e Queiroz e
Artênio José Ísper Garbin
305 Mortalidade por causas externas na microrregião de São Mateus, estado do Espírito Santo, Brasil:
tendências de 1999 a 2008
Mortality due to external causes in the micro-region of São Mateus, state of Espírito Santo, Brazil:
trends from 1999 to 2008
Kamila Medani Tristão, Franciéle Marabotti Costa Leite, Edilson Romais Schmildt, Esmeraldo Costa Leite, Denise Silveira de Castro e
Ana Paula Martins Vilela
315 Acidentes e doenças relacionadas ao trabalho em Jequié, Bahia, registrados no Instituto Nacional
de Seguridade Social, 2008-2009
Occupational injuries and diseases in the municipality of Jequié, sate of Bahia, Brazil, registered in National Institute of
Social Security, 2008-2009
Marcela Andrade Rios, Adriana Alves Nery, Murilo da Silva Alves e Cléber Souza de Jesus
325 Índice de massa corporal obtido por medidas autorreferidas para a classificação do estado
antropométrico de adultos: estudo de validação com residentes no município de Salvador,
estado da Bahia, Brasil
Validity of the body mass index calculated from self-reported values for the classification of anthropometric status in
adults: validation study with residents in the municipality of Salvador, state of Bahia, Brazil
Lucivalda Pereira Magalhães de Oliveira, Valterlinda Alves de Oliveira Queiroz, Maria da Conceição Monteiro da Silva, Jacqueline Costa Dias
Pitangueira, Priscila Ribas de Farias Costa, Franklin Demétrio, Maria Carolina Guerreiro dos Anjos e Ana Marlúcia Oliveira Assis
COMUNICAÇÃO CIENTÍFICA
351 Estrutura do artigo cientifico
Structure of the scientific paper
Mauricio Gomes Pereira
A
s evidências científicas constituem os alicerces para a tomada de decisão em saúde, seja na clí-
nica, ou na saúde pública. Essas evidências são derivadas de estudos conduzidos por meio de
métodos científicos. Para que os resultados dos estudos sejam considerados fontes de evidência,
é fundamental a observação rigorosa do método, de modo que sua validade seja assegurada. Ademais,
os estudos somente serão acessados como fonte de evidência se forem comunicados adequadamente.
Na área da saúde, os artigos publicados em periódicos são o meio mais adequado de comunicação
científica.1 Estudos que são importantes para o progresso do conhecimento na área ou para a melhoria
dos serviços de saúde merecem ser apresentados da melhor forma possível, de modo que sejam publi-
cados. A publicação em periódicos reconhecidos favorece a divulgação dos estudos, fazendo com que
seus resultados alcancem outros estudiosos da área.2
A Revista Epidemiologia e Serviços de Saúde (RESS) possui alcance destacado, uma vez que seu
público-alvo é constituído não apenas por estudiosos da área, mas também por trabalhadores e gestores
de diversas instâncias do Sistema Único de Saúde (SUS). Este periódico constitui-se meio de difusão do
conhecimento epidemiológico aplicável às ações de vigilância, prevenção e controle de doenças e agravos
de interesse da saúde pública, visando ao aprimoramento dos serviços oferecidos pelo SUS.
Nos últimos anos, a saúde pública avançou no sentido em que os padrões científicos de evidências
que fundamentam intervenções e ações foram aprimorados.3 A saúde pública baseada em evidências
requer uma base de conhecimento sólida sobre a frequência e a distribuição, sobre os determinantes
e as consequências de doenças e agravos nas populações, bem como sobre a segurança, a eficácia e a
efetividade das intervenções e seus custos.4
A RESS constitui-se importante meio de divulgação desses conhecimentos, que podem gerar evidên-
cias para a tomada de decisão em saúde pública e vigilância em saúde. Considerando a relevância dos
temas abordados e a especificidade do público-alvo deste periódico, seu núcleo editorial tem promovido
iniciativas visando ao aprimoramento da comunicação dos resultados dos estudos.
Entre essas iniciativas, encontra-se a série que se inicia no presente número, cujo objetivo é oferecer
orientações sobre como redigir artigos para publicação em periódicos científicos. O autor convidado
para esta série é Maurício Gomes Pereira, professor titular da Universidade de Brasília e renomado epi-
demiologista. Entre as obras do autor, destacam-se os livros: Epidemiologia: teoria e prática5 e Artigos
científicos: como redigir, publicar e avaliar.1 Este último constitui-se documento de referência para os
textos que serão apresentados.
Na redação científica, o desafio que se apresenta é o de produzir textos claros, objetivos e concisos, que
permitam aos leitores compreenderem adequadamente o que os autores desejam transmitir. Para isso,
os autores devem ser capazes de converter seus resultados em sentenças, parágrafos, tabelas e figuras,
por meio do preparo cuidadoso dos dados. Os textos da série abordarão os elementos essenciais para a
redação de artigos científicos e fornecerão orientações para o desenvolvimento das habilidades neces-
Epidemiol. Serv. Saúde, Brasília, 21(2):193-194, abr-jun 2012 193
sárias para a produção desta modalidade de comunicação. Este material poderá servir como incentivo
para que os leitores da RESS se tornem também autores.
Esta série estará acessível a todos os leitores da RESS e poderá ser útil aos autores em potencial deste e
de outros periódicos da área. Complementarmente, o desenvolvimento de um curso de redação científica
é outra iniciativa prevista, visando a proporcionar o aprimoramento dessa modalidade de comunica-
ção. A atividade, proposta pelo comitê editorial da RESS, conta com o apoio da Coordenação-Geral de
Desenvolvimento da Epidemiologia em Serviço, da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da
Saúde (CGDEP/SVS/MS).
O primeiro texto da série, publicado neste número, apresenta a estrutura do artigo científico. Os se-
guintes detalharão cada uma de suas partes. Espera-se que os leitores da RESS apreciem esta série e que
a mesma venha a contribuir para o desenvolvimento das habilidades relacionadas à redação científica,
de modo que os autores comuniquem seus resultados, com palavras do Prof. Maurício, “de maneira
competente e atraente”.
Referências
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Larval infestation indicators and influence of population size on dengue transmission in the
State of São Paulo, Brazil: an ecological study in the periodo 2007-2008
Mariza Pereira
Diretoria de Combate a Vetores, Superintendência de Controle de Endemias, Secretaria de Estado da Saúde,
Governo de São Paulo, São Paulo, Brasil
Resumo
Objetivo: descrever indicadores de infestação larvária e analisar a associação entre ocorrência de dengue, porte populacional
e distância entre municípios no estado de São Paulo. Métodos: estudo ecológico utilizando indicadores larvários, segundo tipo
de imóvel, e regressão logística. Foram utilizados dados dos sistemas da Superintendência de Controle de Endemias (Sucen) e do
Centro de Vigilância Epidemiológica (CVE) dos anos 2007 e 2008. Resultados: o Índice de Infestação Predial e a positividade
de Pontos Estratégicos e Imóveis Especiais apresentaram valores maiores em municípios com dengue. Nos municípios contidos
num raio de 50km dos municípios-pólo, a chance de ocorrência de dengue foi o dobro dos municípios mais distantes. Naqueles
com população maior que 50.000 habitantes, a chance de ocorrência de dengue foi cinco vezes aquela em municípios menores.
Conclusão: é evidenciada a importância da adoção de estratégias de controle baseadas nos indicadores entomológicos, sobretudo
nos municípios de grande porte.
Palavras-chave: Aedes; Controle de Vetores; Dengue; Densidade Demográfica; Estudos Ecológicos.
Abstract
Objective: to describe larval indicators and analyze the association of occurrence of dengue and population size and
distance between municipalities in the State of São Paulo, Brazil. Methods: ecological study utilizing larval indicators
according to property type and logistic regression. The data was obtained from the systems of Endemics Control Bureau and
Center of Epidemiological Vigilance in 2007 and 2008. Results: household Index Infestation and positivity of Strategic Points
and Special Property were higher in municipalities with dengue. The chance of occurrence of dengue in municipalities less
than 50km away from the major municipalities was twice as likely. The municipalities with populations greater than 50.000
inhabitants had five times more chance of dengue occurrence compared to the small municipalities. Conclusion: this study
emphasizes the importance of adopting control strategies based on entomological indicators, especially in big municipalities.
Key words: Aedes; Vector Control; Dengue; Population Density; Ecological Studies.
A dinâmica da transmissão é modulada por fatores Trata-se de um estudo ecológico realizado no Estado
macro e microdeterminantes. Fatores de risco am- de São Paulo, onde se registrou, no ano de 2008, 532
biental, como latitude, temperatura e umidade rela- municípios – 82,5% dos 645 municípios do estado –
tiva, e fatores sociais, como densidade populacional, infestados por Ae. aegypti. Foram avaliados os anos de
saneamento básico e atitudes da população frente ao 2007, com elevada incidência de dengue (225,2 por
problema são macrodeterminantes dessa dinâmica. Os 100.000 habitantes), e 2008, com baixa incidência
microdeterminantes são aqueles relativos ao próprio (18,0 por 100.000 habitantes). Nos dois anos de ava-
hospedeiro, como idade, grau de imunidade, ocupação liação, mais de 70,0% dos casos ocorreram nos meses
e condições específicas de saúde, além da densidade de janeiro a abril.4 Os municípios avaliados foram
de fêmeas de Ae. aegypti, frequência de alimentação, divididos em dois grupos, segundo a ocorrência ou não
susceptibilidade inata à infecção, disponibilidade de de transmissão de dengue para cada ano de estudo.
criadouros, entre outros.6 Municípios em que o número de casos confirmados
pólo e sua vizinhança; os municípios com distancia 1, observa-se o raio de delimitação da distância
maior que 50km dos pólos foram considerados de de 50km entre os municípios-pólo e a vizinhança:
menor influencia para a ocorrência de dengue; para os dois anos do estudo, a maior quantidade
- Porte populacional, classificado em cinco catego- de pontos (municípios ‘com dengue’) encontra-se
rias – municípios com menos de 10.000 habitantes, dentro desses limites.
entre 10.000 e 30.000 habitantes, entre 30.000 A Figura 2 mostra a distribuição dos indicadores
e 50.000 habitantes, entre 50.000 e 100.000 larvários IIP, PE e IE. Aqui, os maiores valores regis-
habitantes e com mais de 100.000 habitantes; os trados referem-se aos períodos mais quentes do ano,
municípios mais populosos foram considerados destacando-se os indicadores PE e IE, mais elevados
com maior chance da ocorrência de dengue. que o IIP. Nota-se comportamento semelhante dos três
O presente estudo foi realizado com base em dados indicadores quanto à sazonalidade; porém, os valores
secundários. Seus resultados são apresentados de médios nos municípios ‘com dengue’ superaram os
forma agregada, garantindo o sigilo das informações observados nos municípios ‘sem dengue’, para os
individuais e sem envolver qualquer identificação do três indicadores.
cidadão. O número médio mensal de recipientes contendo
água e objetos de pesquisa entomológica, ao longo do
Resultados período 2007-2008, sofreu variação entre 0,7 e 2,2
recipientes pesquisados por imóvel. O conjunto dos
Cerca de 80,0% dos casos registrados nos anos municípios ‘com dengue’ apresentou, em 22 dos 24
considerados ocorreram em municípios com mais meses avaliados, valores mais altos (Figura 3).
de 50.000 habitantes. No ano de 2007, 266 muni- A avaliação de recipientes segundo os tipos consi-
cípios foram classificados ‘com dengue’, segundo o derados mostra distribuição semelhante dos recipien-
critério definido por este estudo; no ano de 2008, tes positivos, tanto em 2007 como em 2008, nos dois
foram assim classificados 99 municípios. Na Figura grupos, em relação à ocorrência de transmissão da
Ano de 2007
Ano de 2008
Figura 1 - Raios de distância (50km) entre municípios-pólo e municípios com transmissão de dengue no estado
de São Paulo. Brasil, 2007 e 2008
A - IIP B - PE
6 14
5 12
% de positividade 10
% de positividade
4
8
3
6
2 4
1 2
0 0
Fev
Mar
Abr
Mai
Jun
Jul
Ago
Set
Out
Nov
Dez
Jan
Fev
Mar
Abr
Mai
Jun
Jul
Ago
Set
Out
Nov
Dez
Jan
Fev
Mar
Abr
Mai
Jun
Jul
Ago
Set
Out
Nov
Dez
Jan
Fev
Mar
Abr
Mai
Jun
Jul
Ago
Set
Out
Nov
Dez
Jan
C - IE D - Log casos
14 5
4,5
12
4
10
% de positividade
3,5
8 3
Log
2,5
6 2
4 1,5
1
2
0,5
0 0
Nov
Dez
Jan
Fev
Mar
Abr
Mai
Jun
Jul
Ago
Set
Out
Nov
Dez
Jan
Fev
Mar
Abr
Mai
Jun
Jul
Ago
Set
Out
Nov
Dez
Jan
Fev
Mar
Abr
Mai
Jun
Jul
Ago
Set
Out
Nov
Dez
Jan
Fev
Mar
Abr
Mai
Jun
Jul
Ago
Set
Out
2007 2008 2007 2008
Sem dengue Com dengue
Figura 2 - Indicadores entomológicos mensais de Aedes aegypti e logaritmo do número de casos de dengue
[A – Índice Predial (IP) –; B – positividade de Pontos Estratégicos (PE) –; C – positividade de Imóveis
Especiais (IE) –; e D – logaritmo do número de casos mensais de dengue] no estado de São Paulo.
Brasil, janeiro de 2007 a dezembro de 2008
2,5
2
Recipientes pesquisados
1,5
0,5
0
Jan
Fev
Mar
Abr
Mai
Jun
Jul
Ago
Set
Out
Nov
Dez
Jan
Fev
Mar
Abr
Mai
Jun
Jul
Ago
Set
Out
Nov
Dez
2007 2008
Figura 3 - Número de recipientes pesquisados por imóvel segundo grupo de municípios com e sem dengue no
estado de São Paulo. Brasil, janeiro de 2007 a dezembro de 2008
100,0
8,0
6,0
Percentual
4,0
2,0
0,0
Sem dengue Com dengue Sem dengue Com dengue
2007 2008
Figura 4 - Distribuição percentual dos recipientes positivos segundo tipo e grupo de municípios com e sem
dengue no estado de São Paulo. Brasil, 2007 e 2008
Tabela 1 - Regressão logística univariada da associação entre transmissão de dengue e características dos
municípios no estado de São Paulo. Brasil, 2007 e 2008
2007
Variáveis independentes Municípios ‘com Municípios ‘sem OR a IC95% b
dengue’ dengue’
Distância de município-pólo N % N %
de municípios com transmissão em 2008 e acentuada sil, apuraram para o estado do Rio de Janeiro e para o
queda no número de casos notificados, os indicadores município de Tupã-SP maior número de casos de dengue
entomológicos mostraram que o nível de infestação e na estação mais chuvosa do ano.20-22
as flutuações na densidade vetorial foram semelhantes Destaca-se a importância dos imóveis classifica-
nos dois períodos, e que valores maiores corresponde- dos como PE e IE, que atingiram mais de 10,0% de
ram ao conjunto de municípios ‘com dengue’. positividade no período mais favorável, enquanto o
Estudo realizado em Cuba18 encontrou índices larvá- IIP alcançou valor inferior a 5,0% no período corres-
rios mais elevados em agrupamentos de áreas, vizinhan- pondente. Esses dados apontam para a necessidade
ças e blocos com casos de dengue, comparativamente de implementar estratégias específicas nesses locais,
a agrupamentos semelhantes sem casos de dengue. No especialmente em períodos de epidemia. Imóveis com
Estado de Goiás, o estudo de Souza e colaboradores19 acúmulo de recipientes (PE) podem manter a infes-
demonstrou que o IIP e os casos de dengue apresen- tação na área e dificultar a diminuição da infestação
taram aumento dos valores nos meses mais quentes e vetorial; ou ainda, imóveis com grande circulação de
chuvosos (janeiro a abril). Outras pesquisas, ao avaliar pessoas (IE) podem disseminar o vírus da dengue
informações de diferentes estados e localidades no Bra- rapidamente. Nos municípios paulistas, os picos de
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Adrieli Rochembach
Hospital São Vicente de Paulo, Passo Fundo-RS, Brasil
Marlene Doring
Curso de Enfermagem, Universidade de Passo Fundo, Passo Fundo-RS, Brasil
Jusceli Seidler
6ª Coordenadoria Regional de Saúde, Secretaria Estadual da Saúde, Governo do Rio Grande do Sul, Brasil
Gilberto Santetti
6ª Coordenadoria Regional de Saúde, Secretaria Estadual da Saúde, Governo do Rio Grande do Sul, Brasil
Resumo
Objetivo: conhecer o impacto da influenza pandêmica (H1N1) 2009 e de doenças do aparelho respiratório na mortalidade de
mulheres em idade fértil (MIF) e caracterizar epidemiologicamente esses óbitos. Métodos: estudo misto, do tipo de série de casos
e caso-controle, dos óbitos de MIF (10 a 49 anos de idade) notificados ao Sistema de Informações sobre Mortalidade no período
2008-2009, nos municípios da 6a Coordenadoria Regional de Saúde do estado do Rio Grande do Sul. Resultados: no período
estudado, ocorreram 421 óbitos de MIF e a taxa de mortalidade observada foi de 111,4/100.000 (2008) e 117,4/100.000 (2009).
As mortes maternas corresponderam a 5,7% dos óbitos. Gravidez e puerpério foram características maisf requentes entre os óbitos
por influenza pandêmica, do que entre aqueles por outras causas. Conclusão: o perfil de mortalidade das MIF em 2009 mudou
em consequência do aumento dos óbitos por doenças do aparelho respiratório, incluindo a influenza pandêmica.
Palavras-chave: Influenza Humana; Mulheres; Gestantes; Mortalidade; Saúde da Mulher.
Abstract
Objective: to describe the impact of pandemic influenza (H1N1) 2009 and respiratory diseases on mortality of women
at childbearing age (WCA), and characterize epidemiologically those deaths. Methods: a mixed study of case series and case
control of WCA (10 to 49 years old) deaths reported to the Brazilian Mortality Information System in the period 2008-2009, in
the Municipalities situated in the 6th Regional Health Coordination/Health Secretariat of the State of Rio Grande do Sul, Brazil.
Results: during the period of the study, 421 deaths occurred in WCA and the mortality rate observed was 111.4/100.000 (2008)
and 117.4/100.000 (2009); considering all deaths, 5.7% were maternal deaths; pregnancy and postpartum were characteris-
tics more frequent in death due to Pandemic Influenza than in death due to other causes. Conclusion: the WCA mortality
profile in 2009 changed as result of increase in deaths from respiratory diseases, including pandemic influenza (H1N1) 2009.
Key words: Influenza Human; Women; Pregnant Women; Mortality; Women’s Health.
Legenda
Divisão das Macros
Divisão das CRS
Divisão dos Municípios
Figura 1 - Localização geográfica dos municípios da 6a Coordenadoria Regional de Saúde, Secretaria Estadual
da Saúde do Rio Grande do Sul. Brasil, 2009
da região, unidades de saúde e visitas domiciliares. Para o cálculo da taxa de mortalidade em mulheres
Não foram incluídos no estudo os casos suspeitos de de idade fértil, considerou-se como numerador o total
Influenza pandêmica (H1N1) 2009 sem confirmação de óbitos em mulheres de 10 a 49 anos de idade e
laboratorial [reação em cadeia da polimerase (PCR)]. como denominador a população feminina dessa faixa
Consideraram-se as doenças do aparelho respi- etária circunscrita na 6ª CRS/SES/RS (ambos disponí-
ratório contempladas pela Classificação Estatística veis no Datasus), para cada ano estudado, multiplicado
Internacional de Doenças e Problemas Relacionados por 100 mil. Para o cálculo da taxa de mortalidade
à Saúde – Décima Revisão (CID-10),7 registradas materna, considerou-se como numerador os óbitos
na Declaração de Óbito (DO), a saber: H1N1 (J09); relacionados à gestação, parto e puerpério, e como
influenza identificada (J10); pneumonia bacteriana denominador, o total de recém-nascidos para cada
(J15); pneumonia não especificada (J18.9); doença ano, multiplicado por cem mil.
pulmonar obstrutiva crônica (J41.0); asma (J45); Para investigar as características associadas aos óbi-
edema pulmonar (J81); e doença pulmonar intersticial tos de mulheres em idade fértil por Influenza pandêmica
(J84.9). (H1N1) 2009, foi empregado desenho de caso-controle:
Analisaram-se as variáveis demográficas, clínicas, casos eram os óbitos por H1N1 (2009; e controles, os
e as relacionadas aos óbitos. Os dados referentes ao óbitos por outras causas (2008-2009). Para verificar a
Comitê Regional de Investigação de Óbitos foram com- associação entre as variáveis, utilizou-se o teste exato de
parados com os provenientes do SIM e do Sinan NET. Fischer, com nível de significância de 5%.
Após ajuste e complementação do banco de dados, Parecer de comitê de ética em pesquisa não foi
os dados foram importados para o software Excel e, recomendado em razão de o estudo utilizar dados
posteriormente, para o Stata versão 10. secundários, de domínio público.
Tabela 1 - Número, percentual de óbitos e taxas de mortalidade por 100 mil mulheres em idade fértil (MIF) nos
municípios da 6a Coordenadoria Regional de Saúde do estado do Rio Grande do Sul. Brasil, 2008-2009
2008 2009
Municípios
N % Taxa/100 mil N % Taxa/100 mil
Soledade 9 4,4 9,3 20 9,3 20,7
Lagoa Vermelha 13 6,3 15,3 17 7,9 20,1
Marau 10 4,9 8,7 18 8,3 15,7
Passo Fundo 72 35,1 12 70 32,4 11,6
Carazinho 33 16,1 17,6 21 9,7 11,2
Tapejara 5 2,4 8,2 6 2,8 9,9
Ibiraiaras 5 2,4 23,8 2 0,9 9,5
Espumoso 3 1,5 6,5 4 1,9 8,7
Não-Me-Toque 3 1,5 6,3 4 1,9 8,4
Sananduva 3 1,5 6,7 3 1,4 6,7
Outros a 49 23,9 – 51 23,6 –
TOTAL 205 100,0 111,4 216 100,0 117,4
a) Municípios com frequência menor que 3 óbitos.
Tabela 2 - Distribuição das principais causas básicas de óbito de mulheres em idade fértil (MIF) nos municípios
da 6a Coordenadoria Regional de Saúde do estado do Rio Grande do Sul. Brasil, 2008-2009
2008 2009
Causa básica
N % Taxa/100 mil N % Taxa/100 mil
Neoplasias 46 22,4 25,0 48 22,2 26,1
Causas externas 44 21,5 23,9 37 17,1 20,1
Doenças do aparelho respiratório 5 2,4 2,7 32 14,8 16,8
Doenças do aparelho circulatório 36 17,6 19,6 26 12,0 14,1
Doenças infecciosas e parasitárias 21 10,2 11,4 19 8,8 10,3
Outras doenças 53 25,9 – 54 25,0 –
TOTAL 205 100,0 216 100,0
Tabela 3 - Características epidemiológicas dos óbitos de mulheres em idade fértil (MIF) por doença do aparelho
respiratório nos municípios da 6a Coordenadoria Regional de Saúde do estado do Rio Grande do Sul.
Brasil, 2008-2009
por Influenza pandêmica (H1N1) 2009 foi 5 vezes a encontraram-se dados semelhantes aos identificados
chance de óbito para mulheres que se encontravam nas macrorregiões brasileiras,8 se comparados com
fora desse período (p=0,027) (Tabela 4). os dados de 2008; à exceção das causas externas, as
quais assumem a segunda posição no presente estudo.
Discussão Em 2009, destacaram-se na 6ª CRS/SES/RS as doen-
ças do aparelho respiratório, terceira causa de morta-
A taxa de mortalidade geral em MIF na 6ª CRS/SES/ lidade entre as MIF, sendo o risco de morrer por essas
RS, no período 2008-2009, apresentou uma pequena causas 7 vezes maior se comparado ao mesmo risco
variação, de ligeiro aumento entre 2008 e 2009. Quan- observado para 2008. Por se tratar de uma pandemia
do se analisa essas taxas por município, percebe-se grave,9 de início súbito, normalmente confundido com a
uma heterogeneidade, aliada à deficiência nos serviços gripe sazonal, a mortalidade incidiu de forma acentuada
de saúde, esta representada pela diferente condição de nos primeiros casos, cujo aumento de óbitos pode estar
acesso ou déficit na estruturação da atenção à saúde relacionado ao surgimento da Influenza pandêmica
da mulher em cada localidade. (H1N1) 2009 no período quando os profissionais ainda
Ao se estudar a mortalidade proporcional no pe- não estavam vigilantes e preparados para o diagnóstico
ríodo, segundo grande grupo de doenças da CID-10, precoce e preciso da doença. Desse modo, registrou-
Tabela 4 - Características associadas aos óbitos de mulheres em idade fértil por Influenza pandêmica (H1N1)
2009 nos municípios da 6a Coordenadoria Regional de Saúde do estado do Rio Grande do Sul.
Brasil, 2008-2009
se na DO, como causa básica desses óbitos, doenças de complicações em mulheres grávidas quando aco-
do aparelho respiratório, a exemplo das pneumonias, metidas pela Influenza H1N1, o que exige diagnóstico
broncopneumonias ou síndrome respiratória aguda precoce e início imediato de terapia antiviral.
grave causada por Influenza A – SRAG. É importante destacar algumas limitações do presente
A proporção de óbitos de gestantes por doenças estudo. Foram consideradas apenas as comorbidades das
do aparelho respiratório encontrada no estudo foi pacientes com Influenza pandêmica (H1N1) 2009, por
inferior à divulgada para o Rio Grande do Sul, assim constarem na ficha de notificação do Sinan NET ou por
como a proporção de óbitos por Influenza pandêmica fazerem parte da investigação de óbito materno. Para as
(H1N1) 2009, o que pode ser explicado pelo acesso demais MIF, não foi possível obter essa informação por se
facilitado do atendimento local dos casos considera- tratar de dados secundários e não constarem da Declara-
dos graves, instalado pela 6a regional2 após o período ção de Óbito, inviabilizando a inclusão de outras comor-
inicial da doença. Já a proporção de óbitos por SRAG bidades na análise das características epidemiológicas.
em gestantes (12,08%) de Porto Alegre-RS, apontada O estudo mostrou que o perfil de mortalidade das
por Neumann e colaboradores,9 resultou semelhante. MIF em 2009 na região mudou, em consequência do
A maior suscetibilidade das gestantes às infecções aumento dos óbitos por doenças do aparelho respira-
respiratórias e suas complicações tem-se atribuído tório, incluindo Influenza pandêmica (H1N1) 2009. A
a alterações do estado geral imune, diminuição da gravidez e o puerpério foram as características estatisti-
expansibilidade pulmonar devida a compressão dia- camente associadas aos óbitos por doenças do aparelho
fragmática, associação de uma ou mais comorbidades respiratório, e a gravidez e o puerpério foram os fatores
e doenças crônicas.10,11 Tais fatores tornaram-se mais estatisticamente associados aos óbitos por Influenza
evidentes em razão da ocorrência da pandemia H1N1. pandêmica (H1N1) 2009, o que corrobora o impacto
Os óbitos maternos por doenças do aparelho dessa epidemia entre os óbitos das mulheres estudadas.
respiratório assumiram maior proporção em 2009, Estudos de períodos pandêmicos são fundamentais,
alterando o perfil estabelecido nos anos anteriores. A especialmente ao abordar os grupos mais atingidos,
gravidez é uma fase da vida da mulher reconhecida – e para que se conheça melhor a extensão dos danos e
simbolizada – pelo bem-estar da gestante e seu concep- suas consequências, e se qualifique, cada vez mais, as
to. Não obstante, em razão da pandemia H1N1, estar ações da Vigilância em Saúde. É possível reestruturar a
grávida significou maior risco de morte para ambos.12 rede desses serviços de saúde, reorientando as ativida-
A chance de morrer por Influenza pandêmica des necessárias no sentido de impedir ou minimizar o
(H1N1) 2009 em gestantes encontrada neste estudo impacto de pandemias na saúde da população.
foi duas vezes maior que a revelada por Mangtani e
colaboradores13 para os Estados Unidos da América Contribuição dos autores
(RR 7,7 – IC95%: 3,3-16,7). Pesquisas realizadas em
vários países, onde o vírus se propagou amplamente, Pastorello CM e Rochembach A participaram da co-
concluem que mulheres grávidas apresentaram maior leta à análise dos dados, na primeira versão do artigo.
risco de adoecer ou morrer em decorrência de com- Doring M participou da concepção e delineamento
plicações da pandemia (H1N1) 2009.4,12-15 do estudo, análise e interpretação dos dados, redação
Neste trabalho, a maior frequência de óbitos e revisão/correção do conteúdo do manuscrito até a
maternos devidos à pandemia H1N1 refere-se ao aprovação final da versão a ser publicada.
período puerperal, diferentemente da conclusão Moretto EFS auxiliou no fornecimento dos registros
de estudo realizado no México,16 onde a elevada do Comitê de Mortalidade Materna, na elaboração da
taxa de letalidade ocorreu no final da gestação. descrição, interpretação e discussão dos resultados.
Saraceni e colaboradores,17 em estudo realizado no Seidler J e Santetti G forneceram os dados dos
Rio de Janeiro, não encontraram associação entre registros do Comitê de Mortalidade Materna, Sinan e
gestação e óbito, porém recomendam que as gestantes SIM, e contribuíram na interpretação e discussão dos
infectadas pelo vírus da Influenza pandêmica (H1N1) resultados.
2009 sejam acompanhadas cuidadosamente. Já Ozyer Dalmolin BM e Petuco VM contribuíram na redação,
e colaboradores12 apontam para o risco aumentado discussão e revisão do artigo.
Referências
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Brasília: Ministério da Saúde; 2006. Aprovado em 22/06/2012
Isabella Samico
Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira, Recife-PE, Brasil
Resumo
Objetivo: avaliar o Sistema de Vigilância Epidemiológica (SVE) da esquistossomose nos municípios de Antônio Cardoso e Catu,
estado da Bahia, Brasil. Métodos: avaliação realizada em 2004, contemplou os determinantes contextuais para a implementação
da intervenção, estrutura e processo do SVE da esquistossomose, utilizando, como estratégia de pesquisa, o estudo de caso; para
coleta dos dados, foram empregados os roteiros para avaliação de sistemas de vigilância dos Centros de Controle e Prevenção de
Doenças dos Estados Unidos da América, além de questionários para análise do contexto, estrutura e processo. Resultados: os
resultados indicam um SVE fragmentado, individualizado e não priorizado pelos gestores locais. Conclusão: é necessário um
trabalho integrado entre os funcionários da Vigilância Epidemiológica e outros setores da Saúde, especialmente a Atenção Básica,
de retroalimentação do SVE e reestruturação do Programa de Vigilância e Controle da Esquistossomose.
Palavras-chave: Esquistossomose; Esquistossomose Mansoni; Descentralização; Vigilância Epidemiológica; Avaliação de Pro-
gramas e Projetos de Saúde.
Abstract
Objective: to evaluate the Schistosomiasis Epidemiologic Surveillance System (SESS) in the municipalities of Antônio
Cardoso and Catu, state of Bahia, Brazil. Methods: evaluation carried out in 2004, considered the contextual determinants
for the implementation of the intervention, structure and process of the SESS; it was adopted the research strategy of case
study; for data collection, it was used the US Atlanta-based Centers for Disease Control and Prevention Guidelines for Evalu-
ating Surveillance Systems, and questionnaires to analyse context, structure and process. Results: the study results indicate
an SESS fragmented, individualized, and not prioritized by local managers. Conclusion: it is necessary an integrate work
between Epidemiologic Surveillance professionals and other Health sectors, specially Primary Health Care, as well as feedback
of generated information by the SESS and restructuring of the Schistosomiasis Surveillance and Control Program.
Key words: Schistosomiasis; Schistosomiasis Mansoni; Decentralization; Epidemiologic Surveillance; Program Evaluation.
*Artigo elaborado a partir da dissertação de Mestrado Profissional em Vigilância em Saúde apresentada à Escola Nacional de
Saúde Pública Sérgio Arouca, Fundação Instituto Oswaldo Cruz/Rio de Janeiro-RJ, Brasil, em 2005.
dispunha de farta documentação nos níveis estadual da doença, segundo os preceitos da avaliação de
e municipal a partir do ano de 1979. qualidade em saúde preconizados por Donabedian17
Na seleção dos municípios, foram consideradas as e roteiros para avaliação dos sistemas de vigilância
seguintes características: a) pertencer à área endêmica epidemiológica.18
para esquistossomose, conforme os critérios das diretri- Foram utilizados os dados do censo demográfi-
zes técnicas vigentes; b) ter realizado, pelo PCE munici- co realizado pela Fundação Instituto Brasileiro de
pal, ao menos três inquéritos ou censos coproscópicos Geografia e Estatística (IBGE) no ano 2000,13 dos
recentes; c) pertencer a distintas Dires; e d) permitir Cadernos de Saúde dos Municípios disponibilizado
facilidade de acesso. Também levou-se em consideração pelo Departamento de Informática do Sistema Único
o interesse da gestão do PCE/SESAB na avaliação desses de Saúde (Datasus)/Ministério da Saúde, dos Planos
dois municípios, pela razão de haverem mantido as Municipais de Saúde dos dois municípios, dos ma-
mesmas equipes de trabalho após a descentralização. nuscritos consolidados dos inquéritos coproscópicos
O município de Antônio Cardoso-BA se localiza na do PCE realizados também nos dois municípios, e do
mesorregião Centro-Norte baiana, à margem esquer- Sistema de Informação do Programa de Controle da
da do rio Paraguaçu, possui uma área geográfica de Esquistossomose (SISPCE).19
293,1km2 e população residente de 11.620 habitantes Para o levantamento dos dados referentes ao
segundo o censo demográfico de 2000: apenas 19,9% contexto do SVE nas duas localidades, foram aplica-
residiam na zona urbana enquanto 80,1% viviam na dos questionários com perguntas semiestruturadas,
zona rural. Antônio Cardoso-BA estava habilitado na adaptadas para avaliação do sistema de vigilância da
Gestão Plena de Atenção Básica, possuía um centro e esquistossomose, a partir de instrumento construído
quatro postos de saúde. Para a atenção primária nes- por Felisberto e colaboradores20 Para a elucidação de
sas unidades de saúde, o município dispunha de duas contexto, optou-se por: a) variáveis demográficas; b)
equipes da Estratégia Saúde da Família (ESF); e como variáveis relacionadas à gestão; e c) algumas variáveis
destino de referência para sua assistência de média e epidemiológicas.
alta complexidade, contava com a cidade de Feira de Nas entrevistas, foram utilizados os roteiros para
Santana-BA, distante 31km.13-15 O Programa de Vigilân- avaliação de sistemas de vigilância recomendados
cia e Controle da Esquistossomose desenvolve ações no pelos Centers for Disease Control and Prevention dos
Município há 25 anos, inicialmente conduzidas pelas Estados Unidos da América (CDC/EUA), questionários
esferas federal e estadual até 1999, ano quando o PCE específicos de análise de contexto, estrutura e pro-
foi descentralizado para a gestão municipal. cesso, e atributos qualitativos e quantitativos próprios
O município de Catu-BA está situado na região de um sistema de vigilância. Além da metodologia
Nordeste do estado da Bahia, na bacia hidrográfica de avaliação proposta pelo CDC/EUA, também se fez
do rio Pojuca. Possui uma área geográfica de 520km2 necessária a avaliação normativa – componentes de
e, na conclusão do censo demográfico de 2000, apre- estrutura e de processo – e aspectos da pesquisa avalia-
sentava uma população de 46.731 habitantes: 80,9% tiva, qual seja, a análise dos determinantes contextuais
na zona urbana e 19,1% na zona rural. Desde 1988, o do grau de implantação de programas como um dos
município estava habilitado na Gestão Plena do Sistema três componentes que “apóia a análise de implantação
Municipal de Saúde e contava com 15 ESF. Na assistên- de programas.” 17-20
cia ambulatorial e hospitalar de média complexidade, E como parâmetros da avaliação, foram empre-
possuía um Ambulatório de Especialidades, um Centro gados os modelos de questionários aplicados por
Ortopédico, um Laboratório Municipal e um Serviço Moliner e colaboradores,21 adaptados para o SVE da
Municipal de Fisioterapia, além do Hospital Municipal esquistossomose.
de Catu.13,14,16 O PCE desenvolve ações no município No que se refere à avaliação da estrutura – sujeito
desde 1990, inicialmente conduzidas pelas esferas e objeto –, foram atribuídos os seguintes valores de
federal e estadual até 1999, ano quando o Programa pontuação-qualificação:
foi descentralizado para o nível municipal. a) sujeito: 0 a 6 (indefinido); 7 a 9 (pouco defini-
O estudo constituiu-se da análise e descrição do); 10 a 13 (bem definido) – Valor máximo, 13
dos componentes de estrutura e de processo da VE pontos.
saúde: seis da zona urbana e três da zona rural. Em fato chama a atenção... quando cheguei aqui, o pessoal
algumas dessas unidades, foi necessário retornar duas de saúde não ia a campo vacinar, fazer busca ativa de
vezes para coleta das informações. Das 15 unidades doentes, pois não tinha transporte, achava que não
com ESF, duas na zona rural deixaram de ser visitadas era necessário. O gestor municipal não tem visão da
devido à distância e exiguidade do tempo disponível. gravidade da doença... não percebe.”
As entrevistas tiveram seu conteúdo analisado em A questão do saneamento ficou evidenciada pela
quatro etapas: ordenação; classificação; transcrição; dificuldade do município em ter acesso às fontes de
e tabulação final dos dados. Também foram colhidas recursos, principalmente no final da gestão. Ainda foi
informações por meio de visitas, observação da rotina referido que não houve mudança dos componentes da
dos serviços e discussão com os profissionais integran- gestão no período 2002-2004, e que as duas equipes
tes do SVE da esquistossomose da SESAB, das Dires, e de Saúde da Família dos postos e centros de saúde
com os gestores da Saúde nos municípios. cobriam 100,0% da Atenção Básica municipal.
Cada entrevistado assinou um ‘Termo de Consenti- O Sujeito (organização dos recursos humanos e
mento Livre e Esclarecido’, documento que assegura materiais necessários para o desenvolvimento das
o anonimato e sigilo sobre as declarações prestadas, atividades da vigilância) está ‘bem definido’, embora
de acordo com a Portaria nº 196/96, do Conselho deva ser observado que esta pontuação encontra-se
Nacional de Saúde (CNS)/MS. O estudo recebeu a no limite inferior da qualificação.
aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Escola O Objeto (a população sob vigilância) foi caracte-
Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca – ENSP/ rizado como ‘bem definido’.
Fundação Instituto Oswaldo Cruz – Fiocruz/Rio de A somatória desses valores teve a pontuação válida
Janeiro-RJ, conforme Parecer nº 63/04, de 01/09/04. de 15,4% e a classificação de uma estrutura adequada
(Tabela 1).
Resultados Dos nove atributos avaliados, um foi qualificado
como ‘bom’ e sete como ‘regulares’. Observa-se que
As equipes do SVE da esquistossomose de Antônio a sensibilidade ficou no limite inferior do escore e o
Cardoso-BA pontuaram a estrutura como adequada, a VPP teve pontuação ‘ruim’. A mesma interpretação é
despeito de o PCE municipal atuar com dificuldades há válida para a sensibilidade do SVE.
mais de 25 anos. Dificuldades como a desarticulação O processo, cujo escore agrega a soma das médias de
entre as equipes de endemias e de Saúde da Família, todos os atributos, foi pontuado como de bom funciona-
pouca visibilidade da doença por parte do gestor muni- mento (Tabela 2) embora a maioria dos entrevistados
cipal e acomodação da população diante do relevante tenha referido (i) falta de divulgação do trabalho execu-
problema de Saúde Pública que a doença representa. tado pelo PCE, (ii) carência de análise e disseminação
A dimensão da esquistossomose no Município foi enfa- de informação para os próprios participantes do SVE,
tizada na fala de um membro da gestão do SVE municipal: instituições e população do município, assim como (iii)
“a esquistossomose é uma doença que as pessoas, necessidade de atualização dos profissionais da rede
não digo que se acostumam, mas convivem conside- básica de saúde e das equipes de endemias.
rando como normal. O próprio gestor passa a achar que Em Catu-BA, o componente gerencial não se
é natural, porque quando ocorre um caso de menin- encontrava institucionalizado na rotina do planeja-
gite, leishmaniose ou tuberculose numa localidade, o mento como as demais Secretarias Municipais de
Tabela 2 - Pontuação por atributo do processo de vigilância epidemiológica da esquistossomose nos municípios
de Antônio Cardoso e Catu, estado da Bahia. Brasil, 2004
Infraestrutura, Transporte e Educação, na utilização da atributos obtiveram qualificação ‘ruim’ (Tabela 2). A
informação sobre esquistossomose existente na esfera oportunidade foi referida como ‘limitada’, por dispor
municipal. As atividades anuais eram programadas somente de uma intervenção – a medicação –, fato este
baseadas nos dados dos inquéritos coproscópicos de acentuado pela falta de disseminação da informação
anos anteriores. Esses inquéritos eram realizados pelos no nível local.
Agentes de Endemias da Dires sediada no município Entre os atributos do SVE, a aceitabilidade do sis-
de Alagoinhas-BA, que operavam como supervisores tema de VE da esquistossomose foi manifestada seja
do PCE e da equipe dos agentes de endemias do mu- pelos profissionais que operam o SVE em sua gerência
nicípio, sem o envolvimento de outros profissionais estadual, regional e local, seja pelas equipes das regio-
presentes e atuantes naquele cenário. nais e dos servidores das diversas áreas que entendiam
A estrutura do SVE foi pontuada como mal defi- a gravidade da esquistossomose como problema de
nida principalmente no que se refere a organização, Saúde Pública e identificavam a necessidade de maior
estrutura física e de pessoal, além da inexistência de participação das entidades públicas afins.
integração do PCE com as demais ações da Atenção Sobre a representatividade, o SVE não tem possi-
Básica (Tabela 1). bilidade de identificar todos os grupos e subgrupos
O Sujeito (organização dos recursos humanos populacionais em que ocorrem casos, segundo pessoa,
e materiais necessários para o desenvolvimento tempo e lugar. Os casos assintomáticos dificilmente são
das atividades da vigilância) foi classificado como detectados pela rede de atenção à saúde, enquanto os
‘indefinido’. inquéritos tampouco cobrem a totalidade da popula-
O Objeto (a população sob vigilância) foi assinalado ção, inclusive aquela residente em áreas de risco de
como ‘pouco definido’. transmissão.
Na somatória desses valores, a pontuação válida de A oportunidade está ligada ao fluxo da informação e
9,3 caracteriza uma estrutura mal definida. sua capacidade de provocar respostas imediatas. Como
Dos nove atributos, sete tiveram qualificação ‘regu- medida oportuna, a VE da esquistossomose conta ape-
lar’ e dois deles, oportunidade e capacidade de auto- nas com o tratamento dos portadores de S. mansoni.
resposta, receberam classificação ‘ruim’. O resultado Os atributos sensibilidade e valor preditivo positivo,
do escore atribuído à oportunidade está diretamente importantes para a efetividade do sistema, tiveram
ligado à capacidade de auto-resposta: ambos os escores inferiores.
Quanto à flexibilidade, ainda não havia ocorrido A qualidade do desempenho do sistema de saúde
qualquer mudança ou adaptação à realidade dos muni- brasileiro está diretamente associada ao processo
cípios: por exemplo, a identificação de casos em outras decisório municipal e estadual.”
fontes de notificação, como o atendimento espontâneo O SVE da esquistossomose no município de Antônio
na Atenção Básica e na rede hospitalar (identificação Cardoso-BA dependia, em grande parte, do reforço
de formas graves), e especialmente de estratégias dos agentes de endemias da sede da Dires em Feira de
diferenciadas para áreas de baixa prevalência ou com Santana-BA para as atividades de busca ativa. A Secre-
focos delimitados. taria Municipal de Saúde não possuía estruturas física
A utilidade, como atributo que pode responder a e de pessoal adequadas para responder à demanda de
muitos questionamentos sobre o SVE e o próprio PCE, exames coproscópicos e de outras patologias oriundas
era pouco referida e empregada no planejamento das de sua área de atuação.
ações de vigilância e controle da doença, tanto na Na avaliação dos atributos do SVE da esquistosso-
esfera estadual quanto local. mose em Antônio Cardoso-BA, a estrutura foi conside-
rada adequada. O resultado pode ser atribuído à visão
Discussão geral que os entrevistados têm do SVE da esquistosso-
mose, ainda que, nas questões específicas, tenha-se
Os depoimentos sobre a gestão da Saúde e a di- constatado a carência de estrutura física e de pessoal
reção do SVE nos municípios referiram-se ao pouco de suporte às atividades de laboratório, tanto do PCE
envolvimento da população representada nos Conse- como da Atenção Básica. A avaliação do processo
lhos Municipais de Saúde, principalmente quanto à obteve pontuação classificada como boa, embora,
esquistossomose, o mais vultoso agravo à saúde local. os participantes do SVE tenham indicado problemas
Isso se deve à falta de motivação das pessoas pela parti- de ordem gerencial e operacional que afetam o bom
cipação popular na busca e resolução de questões que desempenho do processo de trabalho. Esses aspectos
escapam à governabilidade dos profissionais de saúde, também são referidos por Costa & Pinto.22
principalmente em municípios pequenos e com pouca De forma geral, na avaliação dos atributos que
participação na economia do Estado.21 expressam o desenvolvimento do processo, as maiores
Foi ponto marcante, nas citações das entrevistas, a dificuldades para mensurá-los estão refletidas na sensi-
desarticulação entre as equipes de endemias e de ESF, bilidade e no valor preditivo positivo – VPP.21 Na análise
em todo o processo de trabalho. A falta de articulação da qualificação obtida em Antônio Cardoso-BA, a sen-
entre os profissionais possui raízes mais profundas, sibilidade regular e o VPP ruim estão no limite inferior
envolve divisão do trabalho e do espaço, competição do escore, o que expressa as próprias características
do saber e dos recursos, carência de um esforço da esquistossomose: curso silencioso e dificuldade de
conjugado das instâncias estadual, regionais (Dires) predição dos casos. Para a detecção de casos, tem sido
e de cada gestor municipal no sentido de integrar os realizada busca ativa dos portadores mediante a positi-
profissionais de saúde e seus processos de trabalho, vidade no exame coproscópico. A rotina dos serviços de
instituições e outras entidades que atuam no contexto saúde não conta com outro meio de diagnóstico senão o
do município. parasitológico de fezes e não têm outra estratégia para
Costa & Pinto,22 em artigo que trata da atenção a triagem dos portadores de S. mansoni.
ambulatorial e a experiência da descentralização no Ainda que a avaliação do processo tenha obtido
Brasil, referem que: pontuação classificada como boa, em virtude, princi-
“para a maioria dos programas de saúde, palmente, da avaliação positiva da representatividade,
implantados ou implementados de modo descen- atributo de peso acentuado nessa avaliação, foram
tralizado, a dependência para um bom resultado identificados vários problemas referidos pelos partici-
das decisões do gestor local torna-se uma variável pantes do SVE. Na somatória das pontuações atribuídas
decisiva. Esse fato ocorreu com os programas de à utilidade do processo, o sistema de VE da esquistos-
ampliação da cobertura na Atenção Básica desen- somose no município de Antônio Cardoso-BA obteve
volvidos no país a partir da década de 1990, sendo qualificação aceitável, apesar das dificuldades referidas
exemplo o Programa de Saúde da Família (PSF). e descritas na qualificação de todos os atributos.
O SVE do município de Catu-BA apresenta uma dos por Cerqueira e colaboradores na Bahia23 e por
avaliação de estrutura mal definida, caracterizada por Takahashi & Oliveira em São Paulo.24 Esses autores
um sujeito indefinido e um objeto pouco definido. Essa identificaram que, para atender o atual conceito de
qualificação sintetiza a percepção dos entrevistados, VE, cujo principal fundamento se encontra na análise
traduzida pelos escores relativos a organização e da situação de saúde, seus determinantes e condi-
definição do SVE, objetivos do sistema, fluxo da in- cionantes, e sua finalidade na indicação e execução
formação, estruturas física e de pessoal, e população das ações de prevenção e controle de agravos, faz-se
coberta pelo sistema de vigilância da esquistossomose. necessário extrapolar a prática voltada às doenças de
Na avaliação do processo do SVE de Catu-BA, os notificação compulsória ou àqueles agravos-alvo do
escores regulares e ruins conferidos a oportunidade, clamor público. Para tanto, é necessária a capacitação
capacidade de auto-resposta e valor preditivo positivo e a articulação entre seus componentes e outros seto-
podem ter essa qualificação atribuída, em parte, à falta res da sociedade, com vistas a alcançar o verdadeiro
de divulgação das informações sobre a doença para a objetivo da Vigilância em Saúde. A organização do SVE
população, impedindo a ação oportuna e eficiente do da esquistossomose como um subsistema do Sistema
SVE e dificultando o estabelecimento de parcerias. Se de Vigilância Epidemiológica nos municípios analisa-
para doenças que possuem como principal estratégia dos depende da reorganização desse sistema maior.
a busca ativa de casos para reduzir a transmissão, o Em relação aos questionários aplicados ao contexto,
julgamento desses atributos fica limitado,21 no caso da estrutura e processo, trabalhos dessa natureza, que
esquistossomose, a avaliação fica comprometida devi- envolvem questões subjetivas, estão sujeitos a vieses
do a seu caráter crônico e insidioso, com a existência de percepção dos entrevistados, decorrentes de sua
de infectados assintomáticos. formação profissional, tempo dedicado e experiência
A somatória dos escores atribuídos à utilidade do em Saúde Pública, relações pessoais, profissionais e
processo qualificou o sistema de vigilância da esquis- culturais. Esses problemas, contudo, não comprome-
tossomose em Catu-BA como aceitável, em função da tem um estudo de análise inicial do SVE da esquistos-
disposição e do entendimento que os profissionais somose no cenário local após a descentralização das
demonstraram diante do trabalho, apesar dos entraves ações de vigilância e controle de doenças por parte
apontados pelos entrevistados: falta de retroalimenta- da esfera federal.
ção do sistema; falta de análise, utilização e divulgação Na vigilância e controle da esquistossomose, os
dos dados para as instituições e população geral; e falta avanços alcançados após a descentralização todavia
de discussão sobre a esquistossomose e as atividades são incipientes e não repercutem no aprimoramento
do PCE, enquanto intervenção de alcance no enfren- das ações e em melhorias para a população. Não há um
tamento do problema. modelo desenvolvido que possa se adequar à realidade
Os depoimentos dos participantes da VE da es- local. Os municípios-objeto do estudo realizam a VE da
quistossomose entrevistados nos dois municípios esquistossomose dentro de suas possibilidades e limita-
situaram o lapso ocorrido na capacitação e adaptação ções, reproduzem procedimentos sem qualquer análise
do pessoal cedido pela Funasa para o Estado. Não ou questionamento dos resultados para a população,
houve preocupação dos gestores federal e estadual dos objetivos propostos e dos alcançados, não levam em
com o processo de trabalho vivido por essas pessoas conta a mudança do perfil das localidades trabalhadas
oriundas de cultura institucional diferente. Houve, há uma ou duas décadas, tampouco consideram o
sim, uma adaptação onde cada equipe preservou seu próprio contexto onde as atividades são desenvolvidas.
saber e seu espaço, sem uma visão integrada do SVE Nessa conjuntura, a ação das Dires como facilitadoras
da esquistossomose e de outros agravos. dos processos não é evidenciada, o papel gerencial é
O sistema de vigilância da esquistossomose era per- sufocado pelo peso da burocracia e automatização das
cebido pelos participantes do SVE municipal de forma ações e, assim, não se valoriza os dados produzidos, uma
fragmentada. Embora fossem eles seus executores, não fonte rica de informações de cunho epidemiológico e
visualizavam a vigilância da esquistossomose em toda operacional para o enfrentamento da doença.
sua abrangência. Essa evidência também foi observada Inconsistências de dados existem, dificuldades
em estudos sobre a vigilância epidemiológica realiza- operacionais também, mas nada que impeça uma
revisão e reorganização, um novo pacto e divisão de Aos gestores, agentes de combate às endemias e
responsabilidades dos gestores, técnicos e agentes profissionais da Estratégia Saúde da Família – ESF – e
responsáveis pela vigilância da esquistossomose nos aos servidores das Secretarias Municipais de Saúde de
municípios de Antônio Cardoso-BA e Catu-BA. Antônio Cardoso-BA e Catu-BA.
E aos coordenadores e técnicos da Secretaria de
Agradecimentos Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, Brasília-
DF, pelo acesso aos documentos e apoio, essenciais
Aos técnicos da Secretaria da Saúde do Estado da para a realização desta pesquisa.
Bahia, Aécio Meireles Dantas S. Filho e Edgar Lessa
Crusoé. Contribuição dos autores
Aos técnicos e agentes de combate às endemias
do Programa de Vigilância e Controle da Esquistosso- Menezes MJR participou de todas as etapas da pes-
mose – PCE – de Salvador-BA e da 2ª e 3ª Diretorias quisa, da elaboração do artigo e de sua revisão final.
Regionais de Saúde – Dires de Feira de Santana-BA e Carmo EH e Samico I participaram da concepção e
de Alagoinhas-BA. orientação da pesquisa, revisão crítica e final do artigo.
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Survival and infectivity of Trypanosoma cruzi in açaí pulp: in vitro and in vivo study
Resumo
Objetivo: estudar a sobrevivência e a infectividade de Trypanosoma cruzi na polpa de açaí. Métodos: foram realizados expe-
rimentos in vitro e in vivo. Alíquotas de polpa provenientes da cidade de Belém (capital do estado do Pará, região Norte do Brasil)
foram misturadas a 105 tripomastigotas e mantidas às temperaturas ambiente, 4ºC e -20ºC, com diferentes períodos de incubação;
posteriormente, os parasitos foram isolados e inoculados em camundongos imunodeficientes C.B-17-Prkdcscid/PasUnib pelas vias
intraperitoneal, oral ou gavagem. Resultados: todas as vias foram eficientes. Houve retardo de 5 dias no início da parasitemia na
infecção oral. À temperatura ambiente por 48 horas, a polpa preservou a virulência do parasito. Refrigeração a 4°C por 144 horas
e congelamento a -20°C por 26 horas não eliminaram o parasito. Conclusão: os testes sugerem a possibilidade de os surtos de
doença de Chagas aguda no Norte do Brasil estarem relacionados ao consumo de polpa de açaí.
Palavras-chave: Trypanosoma cruzi; Doença de Chagas; Sucos; Camundongos; Hospedeiro Imunocomprometido.
Abstract
Objective: to evaluate infectivity by Trypanosoma cruzi and its survival in açaí pulp. Methods: experiments were per-
formed in vitro and in vivo; aliquots of pulp from Belém City (capital of the state of Pará, Northern Region of Brazil) were
mixed with 105 trypomastigotes, and maintained at room temperature, and at temperatures of 4°C and -20°C, within different
incubation periods; following that, the parasites were isolated and inoculated into immunodeficient mice CB-17-Prkdcscid/
PasUnib, by intraperitoneal, oral, or gavage routes. Results: all routes showed effectiveness. There was a delay of 5 days in the
beginning of the parasitemia by oral infection; the pulp at room temperature for 48h kept the parasite virulence preserved.
Keeping the samples cooled at 4°C during 144h and the freezing at -20°C for 26h did not kill the parasite. Conclusion: tests
suggest that açaí pulp consumption may be related to outbreaks of acute Chagas’ disease in Northern Brazil.
Key words: Trypanosoma cruzi; Chagas Disease; Juices; Mice; Imunocompromised Host.
*Estudo financiado pelo convênio nº 667/2008, firmado entre o Ministério da Saúde e a Universidade Estadual de Campinas,
intitulado ‘Análise da interferência da polpa de açaí na transmissão oral de Trypanosoma cruzi, contribuindo para o surgimento
de surtos de doença de Chagas aguda na Região Norte do Brasil’.
Norte do Brasil nos últimos anos, o presente trabalho até alcançar, aproximadamente, 1/3 da altura máxima
teve por objetivo estudar, por meio de ensaios in vitro da seringa. Finalmente, antes da aplicação da amostra,
e in vivo, a sobrevivência e infectividade de T. cruzi a extremidade superior foi coberta com nova camada
na polpa de açaí submetida a diversos períodos de de lã de nylon estéril. A tamisação forçada empregada
incubação, sob temperaturas ambiente, refrigeração na mistura da polpa de açaí e tripomastigotas facilitou a
e congelamento. separação das fases sólida e líquida da polpa. O sistema
proporcionou livre passagem dos parasitos ao longo
Métodos da coluna e permitiu que eles fossem recuperados
no eluato.
Foram realizados testes in vitro e in vivo. Misturas de polpa de açaí e plasma contendo tripo-
Utilizou-se a forma sanguícola da cepa Y de T. cruzi, mastigotas foram preparadas nas proporções de 1:2,
mantida em camundongos CBA/J/Unib, proveniente do 1:3 e 1:4, em um volume final de 1mL. Em seguida, as
Centro Multidisciplinar para Investigação Biológica na misturas foram aplicadas às colunas individualmente, e
Área da Ciência em Animais de Laboratório, da Univer- o êmbolo cuidadosamente recolocado. No decorrer da
sidade Estadual de Campinas (CEMIB/Unicamp). Os tamisação, uma pequena pressão foi exercida gerando
tripomastigotas foram empregados na contaminação o eluato, logo coletado em alíquotas individuais com
da polpa de açaí utilizada nos testes in vitro e in vivo. volume máximo de 50μL. Frações de 5µL foram reco-
Foram utilizados camundongos isogênicos imu- lhidas e examinadas por microscopia óptica comum.
nodeficientes, machos e fêmeas da linhagem C.B-17- Após a coleta de todas as frações de eluato, cada
Prkdcscid/PasUnib (scid) contando oito a 12 semanas coluna de tamisação foi lavada com 200µL de solu-
de idade e peso médio de 30g, oriundos de colônias do ção de NaCl 0,15M; e os eluatos obtidos, igualmente
CEMIB. Os animais foram marcados individualmente, examinados.Os tripomastigotas foram determinados
por amputação de falange. quantitativamente, pelo método de Brener.12
A polpa in natura de açaí utilizada foi adquirida Para avaliação da motilidade, as misturas de polpa de
no comércio local da cidade de Belém-PA e congelada açaí e plasma com T. cruzi (1:3) contendo 105 tripomas-
para transporte até o laboratório onde, em câmara de tigotas foram mantidas à temperatura ambiente durante
fluxo laminar, foi distribuída em alíquotas de 50mL e 6, 18, 24, 42 e 48 horas; e a 4ºC durante 7, 24, 30, 48 e
mantida em freezer a -20ºC, até o momento do uso. 144 horas. Após a tamisação forçada, os tripomastigotas
Na data da utilização, cada alíquota foi descongelada observados no eluato foram classificados como bem
e, quando necessário, previamente submetida ao pro- ativos, ativos ou lentos; para classificá-los, realizou-se
cesso de autoclavagem a 121ºC, durante 20 minutos. uma comparação com o comportamento observado no
Para a avaliação da mortalidade imediata dos para- controle positivo, formado pelo plasma com parasitos
sitos, um volume de 100µL da polpa de açaí recebeu e mantido sob as mesmas condições experimentais.
5µL de plasma contendo 105 tripomastigotas. A ativi- A infectividade do T. cruzi foi investigada pela in-
dade dos parasitos foi monitorada após contato inicial fecção de camundongos scid com a mistura da polpa
com a polpa, a intervalos regulares de 15 minutos, por e plasma contaminado. Nos testes, foram utilizados
um período de até 60 minutos. A observação foi feita eluatos da tamisação forçada, obtidos após diferentes
em triplicata, por microscopia óptica comum, com e tratamentos térmicos, para inoculação pelas vias i.p.,
sem a coloração vital pelo azul de trypan. gavagem ou oral.
Para a recuperação dos tripomastigotas misturados Para eliminar os efeitos prejudiciais da contaminação
à polpa do açaí, desenvolveu-se um processo denomi- bacteriana da polpa in natura,7 os camundongos a
nado ‘tamisação forçada’, no qual colunas de filtração serem inoculados com o eluato da tamisação pela via
foram preparadas em fluxo laminar, empregando-se i.p. receberam tratamento prévio com cefalexina 500mg.
seringas plásticas de 3mL e microesferas estéreis com Foi administrada aos animais a dose de 1,75mg de
3mm de diâmetro, confeccionadas em plástico e metal. antibiótico/dia, baseada no peso médio de cada animal
Na montagem das colunas, uma primeira camada de (30g), com a ingestão média de água de 15mL/100g
lã de nylon foi colocada na base para, em seguida, de de peso-animal/dia para os camundongos13 (volume
forma intercalada, serem adicionadas as microesferas do bebedouro: 200mL). No esquema de cobertura, foi
administrada uma primeira dose em 100µL pela via i.p., sição dos parasitos como nos 15, 30, 45 e 60 minutos
dois dias antes da infecção experimental. Posteriormen- subsequentes.
te, os animais receberam o antibiótico por gavagem Nos testes de sobrevivência de longa duração, a
(100µL), um dia antes da inoculação com o parasito. mistura mantida à temperatura ambiente por 6, 18,
Finalmente, no dia da infecção e nos sete dias subse- 24, 42 e 48 horas, quando comparada com o controle
quentes, o antibiótico foi mantido na água do bebedouro. positivo (plasma) mantido nas mesmas condições,
Na realização dos ensaios, foram preparados os apresentou formas bem ativas de parasitos no período
seguintes grupos experimentais: controles negativos, de até 18 horas, parasitos ativos por até 42 horas e
formados pelos animais que receberam polpa in na- parasitos lentos a partir de 24 horas de incubação.
tura de açaí ou polpa de açaí autoclavada; controles Na mistura mantida a 4°C por 24, 30, 48 e 144 horas,
positivos, formados pelos animais que receberam foram observados 100,0% de parasitos bem ativos no
plasma contendo 105 tripomastigotas da cepa Y de T. período de até 7h e 100,0% de parasitos ativos no
cruzi; e grupos teste, constituídos pelos animais que período de 144 horas (Tabela 1).
receberam os eluatos obtidos a partir da tamisação Quanto aos testes in vivo, todos os animais do
forçada da mistura da polpa de açaí com as formas controle negativo – que receberam a polpa in natura
tripomastigotas. Nos grupos teste, foram adotadas as ou a polpa autoclavada – sobreviveram, indepen-
seguintes condições: a) polpa autoclavada, infectada dentemente da via de inoculação utilizada. Quanto
com T. cruzi em fluxo laminar e mantido na tempera- aos animais do controle positivo – que receberam
tura ambiente por até 14 horas; b) polpa in natura, o plasma contaminado –, morreram todos após a
infectada e mantida (b1) à temperatura ambiente por inoculação, tanto pela via i.p. como pelas vias oral
24 horas, (b2) à temperatura ambiente por 48 horas + ou gavagem. No grupo infectado com o plasma con-
72 horas na geladeira (tratamento combinado), (b3) gelado a -20ºC durante 14 horas, entretanto, 75,0%
na geladeira (4°C) por até 144 horas e (b4) congelada dos camundongos morreram.
(-20°C) por até 26 horas. Nos ensaios com a polpa autoclavada contaminada
Os camundongos CB-17-Prkdcscid/PasUnib (scid) com 105 parasitos e mantida à temperatura ambiente
receberam ração autoclavada e água ad libitum e por até 7 horas, os animais do grupo controle po-
foram mantidos em salas com 22ºC (±2), fotoperíodo sitivo apresentaram, para cada uma das vias, início
de 12-14 horas/24 horas14 e umidade relativa (UR) da parasitemia e dia de morte, respectivamente, nos
entre 65,0 e 70,0%, de acordo com as recomendações seguintes dias: 7,0±2,0 e 18,0±3,0 (i.p.); 10,0±2,0 e
internacionais.15 Após a infecção experimental, os 20,0±0,0 (gavagem); e 12,0±2,0 e 21,0±1,0 (oral).
animais foram alojados em mini-isoladores e mantidos Paralelamente, os animais inoculados com o eluato
em prateleiras ventiladas (modelo ALESCO); passado o apresentaram início de parasitemia e dia de morte, res-
período de observação, foram descartados conforme pectivamente, nos seguintes dias: 8,0±1,0 e 19,0±2,0
os padrões vigentes de biossegurança.16 (i.p.); 12,0±0,0 e 22,0±1,0 (gavagem); e 14,0±2,0 e
A constatação da parasitemia seguiu a metodologia 23,0±2,0 (oral). Os animais que receberam a mistura
preconizada por Brener.12 Todos os animais foram total pela via oral apresentaram início de parasitemia
observados por um período mínimo de 40 dias; e a e dia de morte, respectivamente, nos dias 14,0±1,0 e
mortalidade, registrada diariamente. 23,0±1,0 (Tabela 2).
Todos os ensaios experimentais com camundongos Nos testes realizados com a polpa autoclavada con-
foram aprovados pela Comissão de Ética no Uso de taminada com 105 parasitos e congelada a -20°C por
Animais (CEUA) da Universidade Estadual de Campinas até 14 horas, observou-se que 75,0% dos animais do
– Unicamp –, sob o nº 1.569. controle positivo e 25,0% do grupo teste adoeceram.
No controle positivo, o início da parasitemia e a morte
Resultados ocorreram, respectivamente, nos dias 10,0±2,0 e
18,0±3,0. Nos animais do grupo teste inoculados via
Nos testes in vitro de sobrevivência após contato i.p. com o eluato da tamisação forçada, o início da
com a polpa, 100,0% dos parasitos apresentaram-se parasitemia e a morte ocorreram, respectivamente,
bem ativos, tanto no momento imediato após a depo- nos dias 12,0±0,0 e 20,0±0,0 (Tabela 3).
Tabela 1 - Motilidade da cepa Y do T. cruzi no eluato da polpa de açaí autoclavada e in natura contaminada com
105 tripomastigotas após períodos de incubação de até 48 horas à temperatura ambiente e de 144
horas a 4°C
Tabela 2 - Porcentagem de infecção, tempo para início da parasitemia e mortalidade em camundongos scid
infectados por diferentes vias de inoculação com polpa de açaí autoclavada e contaminada com 105
tripomastigotas da cepa Y do T. cruzi, mantida à temperatura ambiente durante 7 horas
Período de N° infectados / % de Constatação da DCAa Mortalidade
Inóculo Via
Incubação (em horas) N°inoculados infecção (d.a.i.) b (d.a.i.)
Controle i.p.c 0/1 − Negativo −
Negativo Gavagem 0/1 − Negativo −
(Eluato) Oral 0/1 − Negativo −
i.p.c 2/2 100,0 7,0±2,0 18,0±3,0
Controle
7 Gavagem 2/2 100,0 10,0±2,0 20,0±0,0
Positivo
Oral 2/2 100,0 12,0±2,0 21,0±1,0
i.p.c 2/2 100,0 8,0±1,0 19,0±2,0
Grupo Teste
Gavagem 2/2 100,0 12,0±0,0 22,0±1,0
(Eluato)
Oral 2/2 100,0 14,0±2,0 23,0±2,0
(Mistura)
Oral 2/2 100,0 14,0±1,0 23,0±1,0
a) DCA: doença de Chagas aguda
b) d.a.i.: dias após infecção
c) i.p.: intraperitoneal
Nos testes com a polpa in natura infectada com dias 14,0±3,0 e 21,0±4,0. Foi possível constatar um
105 parasitos, os animais inoculados com a mistura, atraso de 5 dias no início da parasitemia, no caso
mantida em diferentes condições, apresentaram os da infecção pela via oral (Tabela 4).
seguintes resultados: - polpa in natura mantida em temperatura ambiente
- polpa in natura mantida à temperatura ambiente por 48h + 72h na geladeira (4°C) (tratamento
por 24 horas combinado)
No controle positivo, 100,0% dos animais apre- No controle positivo, a virulência foi preservada
sentaram infecção, com o início da parasitemia e a em 100,0% dos animais. O início da parasitemia
morte, respectivamente, nos seguintes dias: 4,0±0,0 e a morte ocorreram, respectivamente, nos dias
e 15,0±0,0 (i.p.); 8,0±0,0 e 17,0±0,0 (gavagem); 7,0±0,0 e 16,0±0,0 (i.p.). No grupo teste, a pre-
e 11,0±1,0 e 19,0±2,0 (oral). No grupo teste, servação da virulência foi observada em 50,0%
os animais que receberam o eluato da tamisação dos animais, com início da parasitemia e morte,
apresentaram infecção com início de parasitemia e respectivamente, nos dias 16,0±2,0 e 22,0±1,0
morte, respectivamente, nos seguintes dias: 7,0±1,0 (i.p.) (Tabela 5).
e 16,0±2,0 (i.p.); 11,0±2,0 e 17,0±2,0 (gavagem); - polpa in natura mantida em geladeira (4°C) por
e 16,0±0,0 e 21,0±0,0 (oral). E um percentual de até 144h
20,0% dos animais que receberam a mistura total Os animais infectados do controle positivo (i.p.)
pela via oral também apresentaram infecção, com apresentaram-se positivos, com o início da parasi-
início de parasitemia e morte, respectivamente, nos temia no 10º dia e a morte aos 18 dias pós-infecção,
tripomastigota do T. cruzi podem apresentar parasitos No presente trabalho, foram realizados testes
viáveis após períodos que variam de algumas horas, à de sobrevivência in vitro e infecção experimental
temperatura ambiente, até dias e mesmo semanas a baixas empregando a polpa de açaí contaminada com tripo-
temperaturas.17,18 Estudos de sobrevivência do T. cruzi em mastigotas metacíclicos do T. cruzi. Inicialmente, foi
diferentes alimentos, como banana, pêssego, cana-de- conduzida uma avaliação com o propósito de investi-
açúcar, mamão, maçã, batata, cenoura e tomate, todos gar a morte imediata do T. cruzi após o contato com
armazenados a 26ºC, demonstraram que em 73,0% das a polpa de açaí íntegra ou com seu sobrenadante. A
amostras, os parasitos permaneciam vivos por um período não visualização dos parasitos diretamente na polpa
entre 6 e 72 horas, sendo estimado o maior número de de açaí íntegra durante a inspeção microscópica foi
parasitos vivos entre 6 e 18 horas após a contaminação. associada, principalmente, a sua coloração escura,
Nesses estudos, apenas o abacaxi contaminado (pH 3) devido à grande quantidade de matéria orgânica e
não apresentou parasitos vivos.19 Porém, segundo Rogez,7 antocianinas.7
a polpa de açaí apresenta um pH ligeiramente ácido. Os Em contrapartida, a observação de 100,0% de
resultados aqui apresentados evidenciam que a viabilidade formas tripomastigotas bem ativas no sobrenadante da
do parasito na polpa ficou preservada. polpa de açaí indicou que, apesar de o pH ideal para
A infecção experimental em modelos animais por o parasito estar entre 7,2 e 7,3 e ser conhecida sua
alimentos contaminados com as fezes de Triatoma morte em meios muito ácidos ou alcalinos,21,22 ele, o
pallidipennis demonstraram ser possível a trans- parasito, sobreviveu na polpa in natura de açaí (pH
missão da DCA pela via oral, mediante a ingestão de 5,3) produzida em Belém-PA.
água potável, leite pasteurizado, carne moída crua ou Em razão dos elevados índices de matéria orgânica,
cozida, queijo fresco e arroz cozido. Entretanto, os especialmente fibras vegetais, e das características
autores admitiram existir uma variação na eficiência físico-químicas da polpa de açaí íntegra,7 desenvolveu-
da infecção relacionada com o tipo de alimento admi- se uma metodologia para o isolamento e observação de
nistrado aos animais.20 formas tripomastigotas na polpa. Diversos protocolos
foram utilizados e o que apresentou melhor resultado gando-se camundongos isogênicos da linhagem scid,
foi a tamisação realizada sob pressão, ou tamisação os quais são deficientes em linfócitos funcionais T e
forçada. Adotada esta metodologia, a separação entre B23 e, por esse motivor, não resistem à presença do
as frações sólida e líquida da polpa de açaí resultou parasito, ainda que em baixa concentração. Alguns
em um eluato que permitiu a quantificação exata e autores já demonstraram mortalidade de 100,0%
visualização da motilidade dos tripomastigotas. A com- em machos e fêmeas infectados experimentalmente,
paração com as formas sanguícolas obtidas do plasma com 102 tripomastigotas da cepa Y do T. cruzi, por
de camundongos infectados possibilitou a adoção via intraperitoneal.24
de critérios de motilidade dos parasitos depositados No presente trabalho, a mortalidade na fase aguda
na polpa. Outrossim, o eluato eliminou a indução ocorreu em 100,0% dos camundongos scid com pa-
de eventual peritonite nos animais que receberam a rasitemia confirmada, independentemente da polpa
injeção intraperitoneal e permitiu a administração da autoclavada ou in natura, do tratamento térmico ou
polpa via gavagem. do período de incubação.
Considerando-se que a temperatura poderia alterar A sensibilidade desse modelo de animal foi capaz
as propriedades físico-químicas da polpa de açaí e de denunciar a presença de quantidades mínimas de
interferir na relação parasito-polpa, foram realizados T. cruzi no eluato obtido após diferentes tratamentos,
testes com a polpa autoclavada. Segundo dados da indicando que a virulência fora preservada. Além
literatura, a autoclavagem a 121ºC por 15 minutos disso, a polpa de açaí in natura comercializada na
acarreta a perda de aproximadamente metade do Região Norte apresenta elevados índices de contami-
conteúdo de polifenóis e antocianinas da polpa de nação sanitária, seja por bactérias, seja por fungos,7
açaí, além de alterar outros nutrientes do produto.7 devendo ser consumida com cuidado por pacientes
Os resultados referentes à contaminação da polpa imunocomprometidos. Em razão desses patógenos
autoclavada e logo mantida à temperatura ambiente e da suscetibilidade dos animais scid, os ensaios de
por 48 horas demonstraram 100,0% de tripomasti- infecção experimental com a polpa in natura somente
gotas lentos. A despeito das modificações oriundas foram conduzidos após o tratamento com antibiótico.
do aquecimento do produto, esses dados indicam que Desde que não houve morte entre os animais que
a sobrevivência dos parasitos não foi comprometida. receberam as amostras de polpa in natura sem T.
Com relação à polpa in natura mantida sob cruzi (controle negativo), pôde-se desconsiderar a in-
refrigeração a 4ºC, foram observadas 100,0% de terferência dos contaminantes da polpa nos resultados
tripomastigotas ativas após 144 horas de exposição, de infecção experimental e validar a antibioticoterapia.
sugerindo que o microambiente proporcionou con- As condições de congelamento da mistura possi-
dições para a sobrevivência do parasito. Contudo, bilitaram a comparação da viabilidade dos parasitos
não foram encontrados parasitos no eluato das mantidos sob estresse térmico. O dado é importante,
misturas obtidas de polpa in natura após as mesmas uma vez que a polpa de açaí congelada pode ser
terem sido mantidas congeladas a -20ºC, fato devido, consumida de diversas maneiras, pela população.25
principalmente, à impossibilidade da observação da A confirmação da sobrevivência do T. cruzi na polpa
totalidade do eluato: do volume total¸ triplicatas de de açaí submetida a diferentes tratamentos, aliada
alíquotas de 5μL eram analisadas na microscopia à preservação da virulência do parasito na mistura
óptica e o restante reservado à infecção dos animais. mantida por até 24 horas à temperatura ambiente, por
Outra hipótese é a de que o congelamento foi capaz 144 horas sob refrigeração (4ºC) e por até 26 horas
de matar ou inativar grande quantidade dos tripo- sob congelamento (-20ºC) demonstram que a trans-
mastigotas, não sua totalidade. missão da DCA por açaí é possível. Principalmente, o
A avaliação da capacidade da polpa de açaí atuar achado indica a necessidade de atenção sanitária em
na preservação da virulência dos tripomastigotas todas as fases da cadeia produtiva, iniciando-se com
recuperados da mistura e, consequentemente, pro- a orientação dos produtores na colheita dos frutos,
vocar infecção chagásica aguda e morte exigiu testes passando por seu armazenamento e transporte e fi-
in vivo utilizando camundongos certificados. Foram nalizando com a adoção de métodos de higienização
realizados ensaios de infecção experimental empre- no preparo da polpa.
É lícito ressaltar que o presente estudo foi con- no desenvolvimento da região e na qualidade de vida
duzido utilizando-se tripomastigotas metacíclicos das pessoas que habitam a Bacia Amazônica.
sanguíneos (T. cruzi), visando a priori a obtenção Os parasitos recuperados da polpa de açaí experi-
de dados sobre a sobrevivência desse protozoário em mentalmente contaminada e mantida em temperatura
polpa de açaí e respectivos efeitos sobre sua infecti- ambiente, sob refrigeração e congelada, mostraram-se
vidade – ainda que tripomastigotas sanguíneos não virulentos e causaram DCA em camundongos imuno-
sejam as formas que contaminam a polpa de açaí e deficientes infectados pelas três vias: oral, gavage e in-
infectem pela via oral. traperitoneal. Por essa razão, os resultados observados
Os resultados obtidos contribuem com evidências de- não permitem descartar o consumo da polpa de açaí
monstrativas da manutenção da viabilidade e virulência contaminada pelo T. cruzi como a principal hipótese
após o contato com a matriz alimentícia do açaí. Embora da ocorrência dos surtos de doença de Chagas aguda
animais infectados pelas três vias utilizadas tenham no Norte do Brasil.
apresentado DCA, o estudo foi realizado em condições
de laboratório e sugere a necessidade de pesquisas com Agradecimentos
isolados de cepas nativas do Norte do país.
No estudo, não foi considerado qualquer método de Ao Ministério da Saúde, órgãos e equipes, e à Se-
tratamento sanitário do fruto ou da polpa, embora os cretaria de Estado de Saúde do Pará – SESPA – , pelo
dados observados ressaltem a importância da higiene apoio à realização do presente estudo.
quanto a esses itens. Se por um lado, os resultados
obtidos com a polpa contaminada são consistentes Contribuição dos autores
em demonstrar a transmissão da DCA pela via oral,
por outro, estudos adicionais de tratamento da matriz Passos LAC coordenou o estudo.
alimentícia, tais como o branqueamento dos frutos e a Guaraldo AMA e Franco RMB conduziram estudos
pasteurização da polpa, poderão ser necessários para relacionados com o protozoário e sua infectividade.
conciliar a eficiência do método na eliminação do Barbosa RL e Dias VL realizaram os ensaios bio-
parasito, com possíveis mudanças na palatabilidade, lógicos.
uma vez que alterações sensoriais no produto poderão Pereira KS e Schmidt FL conduziram estudos rela-
ser responsáveis por sua rejeição pelos consumidores. cionados com o açaí e seu processamento.
São cuidados importantes a se tomar, pois uma Alves DP foi responsável pela infraestrutura e pro-
redução em sua comercialização será acompanhada de dução dos modelos animais imunocomprometidos
prejuízos em vários segmentos e terá reflexos diretos (scid).
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Marcela M. de C. Campos
Fundação Ezequiel Dias, Belo Horizonte-MG, Brasil
Nilson Branco
Laboratório de Protozoologia, Instituto de Biologia, Universidade Estadual de Campinas, Campinas-SP, Brasil
Resumo
Objetivo: avaliar a performance de três protocolos de concentração de cistos e oocistos em amostras de água bruta de rios
brasileiros. Métodos: os protocolos estudados foram precipitação química, filtração em membranas de 47mm de diâmetro e 3µm
de porosidade nominal e filtração com o sistema Filta-Max®. Amostras de água bruta coletadas de rios nos estados de São Paulo
e Minas Gerais foram analisadas após contaminação artificial. Os resultados de precisão inicial e recuperação de organismos
marcados (Color-Seed®) foram comparados com os critérios da Agencia de Proteção Ambiental dos Estados Unidos da Améri-
ca (USEPA). Resultados: Nos ensaios de precisão inicial para cistos de Giardia, a filtração em membranas e com Filta-Max®
atingiram os critérios da USEPA para recuperação de cistos. Para Cryptosporidium, somente o procedimento com Filta-Max®
alcançou os critérios. Conclusão: o sistema Filta-Max® foi o único método que atingiu todos os critérios para identificação de
Cryptosporidium e Giardia em água.
Palavras-chave: Cryptosporidium; Giardia; Métodos de Detecção; Água.
Abstract
Objective: this study aimed to evaluate three different concentration protocols of cysts and oocysts in raw water samples
in Brazilian rivers. Methods: the protocols studied were chemical precipitation, filtration in membranes of 47mm of diameter
versus nominal porosity of 3μm and filtration using Filta-Max® system. The raw water samples collected from rivers in the
states of São Paulo and Minas Gerais were analyzed after being seeded with Color-Seed®. The results of initial precision using
filtration in membranes and recovery of Color-Seed® organisms were compared to the acceptance criteria established by the
United States Environmental Protection Agency (USEPA). Results: The study of initial precision to Giardia using filtration
in membranes and recovery of Color-Seed® met the USEPA criteria; for Cryptosporidium only the Filta-Max® achieved the
established criteria. Conclusion: Filta-Max® system showed to be the only method that achieved all the performance criteria
for identification of Giardia and Cryptosporidium in water.
Key words: Cryptosporidium; Giardia; Detection Methods; Waters.
a pesquisa de Cryptosporidium spp. e Giardia spp. cada para a detecção de protozoários em água no
em águas captadas para consumo humano, coletadas Laboratório de Protozoologia da Unicamp, com a
de rios localizados nos estados de São Paulo e Minas colaboração da Sanasa/Campinas-SP, e foi objeto de
Gerais no ano de 2011. Trata-se de uma avaliação várias publicações nacionais e internacionais.17-20
interlaboratorial visando à implantação da capacida- A amostra de água é filtrada mediante bomba de
de de pesquisa de oocistos e cistos em amostras de vácuo (fluxo de 4L/min.) e sistema porta-filtro; após
água bruta superficial, em atendimento à demanda da filtração, o material é eluído a partir da superfície da
Vigilância em Saúde Ambiental. membrana mediante a lavagem e raspagem da mes-
ma com solução de Tween 80 a 0,01%. O material
Métodos resultante é concentrado por dupla centrifugação
(1050 x g; 10 min.).
Foi proposta a experimentação de três metodologias Após a concentração e eluição dos organismos-
para concentração das amostras de água destinadas alvos nas diversas amostras de água analisadas pelas
às análises de Cryptosporidium spp e Giardia spp. metodologias escolhidas para avaliação, acrescen-
Três instituições participaram dessa comparação de tando-se a etapa de purificação mediante a separação
metodologias, considerando-se a experiência previa imunomagnética (Dynabeads® GC-Combo IMS kit;
do laboratório na execução do método: Dynal), a detecção dos protozoários foi realizada
- A Fundação Ezequiel Dias – Funed – de Minas por microscopia de imunofluorescência, pelos três
Gerais (MG), com a colaboração da Companhia laboratórios, empregando-se anticorpos monoclo-
de Saneamento de Minas Gerais (COPASA, MG), nais anti-Cryptosporidium e anti-Giardia adquiridos
avaliou a técnica de concentração por floculação comercialmente, tendo-se como critérios de positivi-
com carbonato de cálcio.13 Neste procedimento, dade o tamanho, o formato dos organismos e a cor e
a amostra de água é submetida a agitação rápida, intensidade de fluorescência.
com a adição de 100ml das soluções de cloreto de No caso da purificação dos organismos-alvo
cálcio (1M) e bicarbonato de sódio (1M); a seguir, mediante separação imunomagnética, foi utilizada a
o pH é elevado até 10, com solução de hidróxido dissociação ácida para o procedimento de filtração
de sódio (1M). Após um período de sedimentação em membranas, enquanto para as metodologias de
(overnight), o sobrenadante é descartado e o floculação em carbonato de cálcio e o Método 1623,
precipitado formado é dissolvido empregando-se empregou-se a dissociação térmica.
200ml da solução de ácido sulfâmico a 10,0%, A avaliação interlaboratorial das metodologias foi
concentrado por sucessivas centrifugações (3000 realizada em duas etapas diferentes, a saber:
x g; 10 min). - Na primeira etapa, o objetivo era verificar o compor-
- A Companhia Ambiental do Estado de São Paulo tamento de cada um dos três métodos, em termos
– Cetesb – avaliou o Método 1623 da USEPA em- de recuperação e precisão, na ausência de interfe-
pregando a concentração por filtração com sistema rências de matriz. Foram utilizadas amostras de 10L
Filta-Max® (fluxo de 4L/min). Após a filtração, a de água reagente, contaminada com uma suspensão
matriz filtrante (espumas filtrantes) é retirada do padronizada de cistos e oocistos (Easy-Seed®) ad-
módulo do filtro, acondicionada em saco plástico, quirida comercialmente. Cada laboratório preparou
lavada com adição de solução tampão de fosfato suas amostras. Foram processadas quatro réplicas
contendo Tween 80 e comprimida; o liquido re- e um controle negativo.
sultante é centrifugado a 1250 x g (15 min.). - Na segunda etapa, foram utilizadas amostras de águas
- A Universidade Estadual de Campinas – Unicamp –, brutas superficiais de mananciais das cidades de Belo
com a colaboração da Sociedade de Abastecimento Horizonte-MG (Córrego Ressaca – tributário do re-
de Água e Saneamento – Sanasa – de Campinas-SP, servatório da Pampulha, Belo Horizonte-MG; latitude
executaram a avaliação do método de concentração 19°51.750’; longitude 043°58.877’) e São Paulo-SP
por filtração empregando membrana de ésteres (Baixo Cotia, localizado na região Metropolitana
mistos de celulose de porosidade nominal de 3μm de São Paulo-SP; latitude 23°32.25’; longitude 46°
e 47mm de diâmetro. Esta metodologia foi modifi- 51.45’), uma vez que o objetivo era verificar o efeito
Tabela 1 - Critérios de controle de qualidade para métodos de análise de Giardia spp e Cryptosporidium spp
estabelecidos pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos da América (USEPA). EUA, 2005
Métodos
Porcentagem média de recuperação/
desvio padrão (%) Filtração Sistema
Floculaçãob Membrana Filta-Max®
Giardia spp 3 43,5 / 8,3 55,5 / 5,4
Cryptosporidium spp 0 15,3 / 7,0 c 54,2 / 5,1
a) Média de 4 experimentos e desvio padrão
b) Somente 1 resultado
c) Somente 3 resultados
Nota: todos os controles negativos com ausência de cistos e oocistos.
Tabela 3 - Performance dos métodos de floculação em carbonato de cálcio, filtração em membranas de 47mm e
sistema Filta-Max® para água brutaa do Córrego Ressaca, estado de Minas Gerais [efeito da matriz de
água]. Brasil, 2011
Métodos
Porcentagem média de recuperação/
desvio padrão (%) Filtração Sistema
Floculação Membrana Filta-Max® b
Giardia spp 39,9 / 22,1 23,5 / 13,7 −
Cryptosporidium spp 26,8 / 5,3 1,1 / 0,9 −
a) média de 4 experimentos e desvio-padrão
b) Não há resultados referentes ao Sistema Filta-Max®, uma vez que as lâminas preparadas apresentaram grande quantidade de material particulado, o que impossibilitou a leitura.
Notas: Todos os controles negativos com ausência de cistos e oocistos.
Turbidez média da amostra: 14,5 NTU.
Tabela 4 - Performance dos métodos de floculação em carbonato de cálcio, filtração em membranas e sistema
Filta-Max® para água brutaa do Baixo Cotia, estado de São Paulo [efeito da matriz de água].
Brasil, 2011
Métodos
Porcentagem média de recuperação/
desvio padrão (%) Floculação em Filtração Sistema
Carbonato de Cálcio Membrana Filta-Max®
Protozoários
Giardia spp 23,8 / 10,2 45,8 / 16,1 41,3 / 4,0
Cryptosporidium spp 2,1 / 1,0 2,75 / 1,7 22,0 / 8,3
a) média de 4 experimentos e desvio-padrão.
Nota: todos os controles negativos com ausência de cistos e oocistos.
Quando examinadas as amostras do Baixo Cotia, para as amostras do Baixo Cotia: a turbidez variou de
região Metropolitana de São Paulo-SP, as três meto- 17,9 a 18,5 ntu; o valor de pH, de 7.15 a 7.25; e a cor,
dologias empregadas geraram resultados: para cistos de 90,4 a 91 Hz.
de Giardia, tanto a filtração em membranas como Consideradas as formas de resistência naturalmente
pelo sistema Filta-Max® alcançaram eficiência de presentes nas amostras da água superficial do Rio
recuperação: respectivamente, 45,8% e 41,3% (Tabela Cotia, na captação da Estação de Tratamento de Água
4). Entretanto, para oocistos de Cryptosporidium, do Baixo Cotia, foram encontrados 144, 100, 94, 97
apenas o sistema Filta-Max® apresentou performance cistos de Giardia e 4, 7, 9, 1 oocistos de Cryptos-
de acordo com os critérios de aceitação estabelecidos poridium, ao empregar o sistema Filta-Max®; e ao
pela USEPA. As seguintes condições foram observadas utilizar a filtração em membranas, foram detectados,
no mesmo manancial, 159, 273, 238, 196 cistos de protozoários patogênicos em água, analisadas neste
Giardia e 3, 2, 1, 1 oocistos de Cryptosporidium. Os estudo (Figura 1).
resultados gerados pelo procedimento de floculação
em carbonato de cálcio foram: 159, 86, 140, 72 cistos; Discussão
e <1, 3, 5, 1, 2 oocistos.
Finalmente são apresentadas, para apreciação Considerando-se que a dose mínima infectante para
e comparação, as vantagens e desvantagens no uso o ser humano, tanto no caso da criptosporidiose como
de cada uma das metodologias de concentração de na giardiose, é baixa – ao redor de 10 a 100 cistos e 9 a
1042 oocistos,23,24 a depender da cepa –, é importante sobrenadante, devido à ausência de material floculado.
que as metodologias de detecção de protozoários em Em se tratando de água reagente, essa perda pode ser
água apresentem sensibilidade e especificidade efetivas acentuada nessa etapa.
no sentido de concentrar pequenos números de (oo) O método de filtração em membrana apresentou
cistos usualmente presentes nas amostras ambientais. boa recuperação média de cistos e oocistos. Porém,
Não existe um procedimento universalmente o sistema Filta-Max® foi o que mostrou melhores
aceito.25 Nos EUA, a Agencia de Proteção Ambiental taxas de recuperação, tanto para cistos de Giardia
desenvolveu o Método 1623, que permanece como spp quanto para oocistos de Cryptosporidium spp,
referencia, empregando pequenos volumes (10 litros); um resultado esperado para este que é o método de
e no Reino Unido, os SOP (standard opperating referência internacional.
procedures, ou procedimentos operacionais padrão) Nos testes com água bruta – segunda etapa –, um
empregam grandes volumes de água tratada. Ambos os dos principais fatores que influenciaram o desempe-
métodos são baseados na performance, requerendo o nho das diversas metodologias foi a complexidade
uso de filtração, separação imunomagnética para pu- da matriz de água colhida do Córrego Ressaca (Belo
rificação de organismos-alvo e detecção empregando Horizonte-MG): a presença de óleos, graxas, ferro,
imunofluorescência direta e teste confirmatório de matéria orgânica e grande quantidade de material
morfologia com corantes vitais fluorogênicos, além de em suspensão (possivelmente algas) dificultaram o
DIC (differential interference contrast, ou contraste processo analítico, principalmente a visualização ao
de interferência diferencial).25 microscópio dos (oo)cistos provenientes do produto
A concentração da amostra durante a filtração Color-Seed® (fluorescência vermelha). Essas condi-
resulta no acúmulo de partículas de tamanho similar ções interferiram principalmente na execução do teste
ao dos oo/cistos. A presença de sujidades na amostra da metodologia de filtração pelo sistema Filta-Max®.
concentrada é um dos principais fatores limitantes da Por isso, a Cetesb/SP não apresentou resultados re-
eficiência de recuperação das metodologias. De acordo ferentes a essa amostra, embora as metodologias de
com Smith e Nichols,25 é grande a probabilidade de os filtração em membranas e floculação em carbonato
oocistos ficarem encobertos nessa sujidade, ao redor de cálcio tenham se mostrado adequadas para um
de 108:1 em 10 litros de água bruta. São considerações processamento de amostras complexas como essas.
possíveis de explicar a dificuldade na obtenção de Sabe-se que a turbidez muito elevada de amos-
resultados quando empregada a metodologia Filta- tras pode influenciar negativamente na separação
Max® pela Cetesb/SP para a análise de uma amostra imunomagnética, esta que é uma etapa para captura
complexa como a do manancial de Belo Horizonte-MG. de cistos e oocistos livres e não daqueles ligados a
Nessas situações, quando a amostra contém grande sedimentos e outras partículas. Além disso, metais
quantidade de material particulado, pequenos volumes pesados, presentes na amostra, também interferem na
devem ser amostrados e os oocistos recuperados, por ligação dos complexos ‘esferas magnéticas-anticorpos
filtração ou por floculação [(anônimo) 1999; disponí- de captura-protozoários’. Quanto maior o precipitado
vel em //www.epa.gov/microbes/1623de05.pdf], o que obtido na etapa de centrifugação, menor a eficiência de
justifica a inclusão de metodologias alternativas como recuperação pela separação imunomagnética.
a floculação química e a filtração em membranas nesta Quando o interesse é avaliar a capacidade infec-
avaliação de performance de métodos mais adequados tante, a metodologia de floculação com carbonato
à realidade nacional. de cálcio é contraindicada, considerando o alto
A metodologia de floculação com carbonato de valor de pH no qual a precipitação química ocorre
cálcio não apresentou bons resultados nos testes com (pH 10) e o tempo prolongado em que permanece
água reagente (controle) – primeira etapa. Explicações nessas condições (overnight), o que pode alterar
para esse fato podem se encontrar tanto na constatação ou lesar cistos e oocistos, comprometer ensaios de
de que a floculação funciona melhor para águas com infectividade e, dessa forma, representar uma restrição
alguma turbidez ou substâncias passíveis de floculação para situações de investigação de surtos. Durante a
(diferentemente da água reagente), como na possível floculação, outrossim, a precipitação química em pH
perda de (oo)cistos durante a etapa de aspiração do elevado, por período prolongado (overnight), e a
posterior dissolução do sedimento em ácido sulfâmico de filtração pelo sistema Filta-Max® atende a todos
podem acarretar deformações nos cistos e oocistos, os critérios de aceitação para métodos de análise de
implicando maior dificuldade no reconhecimento dos Cryptosporidium e Giardia.
parasitas ao microscópio. A floculação com carbonato Em conjunto, os resultados obtidos pelo presente
de cálcio não é um procedimento rápido (a amostra estudo demonstram o grau de performance das prin-
permanece floculando overnight) e há, também, a cipais metodologias de detecção de protozoários em
manipulação de reagentes ácidos e bases fortes, o que água, quando aplicadas em mananciais representativos
implica maior cuidado laboratorial e procedimentos da realidade nacional: existência de contaminantes,
de biossegurança. elevada turbidez e alta presença de matéria orgânica.
A metodologia de filtração em membrana com Deve-se ressaltar que pH, presença de cátions diva-
47mm de diâmetro apresentou bons resultados de lentes, ferro e algas afetam a ligação dos anticorpos
recuperação de cistos e oocistos. Essa metodologia é na separação imunomagnética.26 Além disso, no caso
de menor custo e muitos laboratórios (Laboratórios da filtração em membranas, alguns fatores podem
Centrais de Saúde Públicas – Lacen –; e empresas de explicar a menor recuperação para os oocistos de
saneamento) já contam com a infraestrutura (equipa- Cryptosporidium.
mentos de filtração) necessária para esse procedimen- Na filtração em membranas, foi utilizada a disso-
to. Ademais, o volume menor de amostra (um litro) ciação ácida, enquanto nas duas outras metodologias,
pode ser um fator facilitador para a coleta, transporte empregou-se a dissociação térmica, que, sabidamente,
de amostras e realização desse tipo de análise. Essa resulta em maiores recuperações, e, de acordo com o
metodologia também sofre os efeitos de alta turbidez, protocolo discutido nas reuniões, apenas uma etapa
o que pode levar ao processamento de um maior de dissociação foi empregada. Já nos processamentos
número de membranas para filtrar o volume desejado pelo sistema Filta-Max® e por floculação, a fase de
da amostra, como foi o caso da amostra do Córrego dissociação térmica foi repetida duas vezes, o que
Ressaca, em que foram necessárias 4 membranas para pode ter contribuído para a maior sensibilidade destas
processar uma amostra. metodologias na etapa de efeito da matriz de água.
Fator importante a considerar é que os métodos de Durante a leitura microscópica da amostra, levou-se
filtração (em membrana; e pelo sistema Filta-Max®) em consideração apenas os oocistos na cor verde-maçã
podem manter a capacidade infectante dos protozoá- brilhante, não sendo enumerados os que mostraram
rios e permitir a realização de PCR (técnica de biologia fluorescência fraca.
molecular) a partir do material retido na membrana. A contaminação dos recursos hídricos por protozo-
A metodologia de filtração utilizando o sistema ários patogênicos de veiculação hídrica tem ocorrido
Filta-Max® alcançou os melhores resultados de re- em todo o mundo e aí está um grande desafio para os
cuperação de cistos e oocistos, confirmando o motivo sistemas produtores e distribuidores de água. Uma
pelo qual esse é o método de referência internacional, estruturação laboratorial adequada faz-se necessária
validado pela USEPA. Trata-se de um método relativa- no país, portanto.
mente rápido (semelhante à filtração em membrana), As diferentes metodologias empregadas para a
que apresenta como desvantagem o alto custo da aná- pesquisa de protozoários patogênicos em água estão
lise: R$19.837,00 para a aquisição do Filta-Max Sarter sujeitas a várias limitações. Além dos altos custos e da
Kit® e dos filtros de espuma suficiente, suficientes para necessária importação dos insumos imprescindíveis,
a análise de 10 amostras (preço consultado na data de elas requerem recursos humanos especializados para
conclusão deste relato). sua correta execução. Também é grande a variabili-
Na comparação dos resultados obtidos, relativamen- dade dos resultados gerados e baixa a eficiência de
te aos critérios de controle de qualidade estabelecidos recuperação (em geral, variando de 1,0 a 50,0%,
pelo Método 1623/USEPA (2005) para determinação mesmo quando empregado o método de referencia –
da precisão e recuperação inicial (contaminação de Método 1623/USEPA), pois a obtenção de resultados é
amostras de água reagente com Easy-Seed®), precisão influenciada pela turbidez e composição físico-química
e recuperação contínua (contaminação de amostras da amostra. Outrossim, é relevante que em situação de
de campo com Color-Seed®), apenas a metodologia surto epidêmico, essas metodologias não permitem a
identificação da espécie de protozoário – o que pode qualidade físico-química e microbiológica, assim como
ser útil para determinar a fonte da contaminação –, a prática desenvolvida pelo laboratório na execução
tampouco fornecem informações sobre a infectividade da análise parasitológica, além dos custos implicados.
dos organismos detectados na amostra ambiental.
Em suma, a escolha da metodologia de detecção Contribuição dos autores
de protozoários em água deve levar em consideração
o propósito da análise, as vantagens e desvantagens Todos tiveram igual participação no projeto de
de cada metodologia, o tipo de amostra de água e sua pesquisa e redação do artigo.
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Liana Ariza
Departamento de Saúde Comunitária, Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza-CE, Brasil
Jorg Heukelbach
Departamento de Saúde Comunitária, Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza-CE, Brasil
School of Public Health, Tropical Medicine and Rehabilitation Sciences, James Cook University, Townsville, Australia
Júlio Mendes
Núcleo de Imunologia, Microbiologia e Parasitologia, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia-MG, Brasil
Resumo
Objetivo: descrever o conhecimento dos profissionais de saúde sobre a tungíase em área endêmica. Métodos: estudo transver-
sal, mediante aplicação de questionário estruturado a profissionais de Saúde Pública de seis bairros no município de Uberlândia,
estado de Minas Gerais, Brasil, em 2010. Resultados: participaram do estudo 78 profissionais de saúde, dos quais 38 observaram
alta prevalência de tungíase em humanos; para 61 deles, a ocorrência da tungíase tem variação sazonal, de julho a setembro; casos
graves foram corretamente associados a infecções secundárias (20/78) ou superinfestação (11/78); a maioria das questões teve
considerável proporção de respostas ‘Não sabe’ (Mín-Máx: 8/78-52/78), especialmente aquelas relacionadas à epidemiologia da
doença. Conclusão: a tungíase é negligenciada na atenção primária e o conhecimento dos profissionais de saúde sobre a doença,
mesmo lotados em área endêmica, é insuficiente.
Palavras-chave: Tungíase; Pessoal de Saúde; Educação Profissional em Saúde Pública.
Abstract
Objective: to describe tungiasis-related knowledge of health professionals in an endemic area. Methods: a cross-sectional
study, using structured questionnaire applied to 78 public health professionals of six districts in the municipality of Uber-
lândia, state of Minas Gerais, Brazil, in 2010. Results: the study included 78 health professionals, from which 38 reported
their observation of high prevalence of tungiasis in humans; for 61 of them, tungiasis occurrence has seasonal variation,
from July to September; severe cases were correctly associated with secondary infections (20/78) or superinfestation (11/78);
most of the questions had considerable proportion of answers ‘Do not know’ (Min-Max: 8/78-52/78), especially those related
to the epidemiology of the disease. Conclusion: tungiasis is neglected by primary health care and the knowledge of health
professionals about the disease, even in endemic areas were they work, is insufficient.
Key words: Tungiasis; Health Personnel; Education, Public Health Professional.
* Manuscrito originado da monografia de especialização de Tatiana Ferraz Carvalho no curso de Saúde Pública e da Família no
Instituto Passo 1 de Pós-graduação.
Os dados coletados foram inseridos e analisados sobre esse evento associado à tungíase e 31 não soube-
pelo programa Epi Info versão 3.5.1 (Centers for ram como definir ‘caso grave de tungíase’. Entretanto,
Disease Control and Prevention, Atlanta, EUA), e veri- a concepção de caso grave foi corretamente associada
ficados, para dirimir possíveis erros de digitação. Foi a infecções secundárias (20/78) e superinfestação
realizada a distribuição de frequências de variáveis (11/78). A presença de comorbidades também foi
categóricas. Para as variáveis contínuas, calculou-se relatada e, entre elas, diabetes (4/6) foi a mais citada
média e desvio-padrão. (Tabela 1).
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Entre as práticas de prevenção da tungíase conheci-
Pesquisa da Universidade Federal de Uberlândia (UFU): das pelos entrevistados, a manutenção de boas condi-
Protocolo nº 681/09. Os participantes foram formal- ções de higiene (34/78) e o uso de calçados (28/78)
mente integrados ao estudo após seu esclarecimento de foram as mais citadas, além do uso de vários produtos.
todas as etapas previstas e a assinatura, por cada um, A falta de higiene foi considerada nas respostas como
de um ‘Termo de Consentimento Livre e Esclarecido’. o principal fator condicionante da ocorrência da tun-
gíase (53/78); a criação de animais, principalmente
Resultados porcos, também foi citada (19/78) (Tabela 2). A Tabela
2 também detalha o conhecimento sobre tratamento
Dos 96 profissionais da atenção primária que atu- da tungíase: a remoção da pulga foi o tratamento mais
avam na área de estudo, 78 participaram da pesquisa. referido (60/78), não obstante mais de 1/5 dos entre-
Oito profissionais de saúde não se encontravam na vistados desconhecesse qualquer tipo de tratamento.
unidade de saúde durante a visita – por motivos de Para 53 entrevistados, a tungíase não era um pro-
afastamento, como férias. A coordenação de uma das blema de Saúde Pública e apenas 14 deles conferiram
unidades não autorizou a participação de sua equipe à doença tal status (Tabela 3). Foi relatado que a
de dez profissionais. Dos 78 participantes efetivados, infestação ocorria com frequência em sua área, e que
41 eram agentes comunitários de saúde, 13 técnicos estava associada a infecções secundárias.
de enfermagem, 13 agentes de controle de zoonoses, A maioria das perguntas apresentou elevada pro-
seis médicos e cinco enfermeiros. A maioria era do porção de entrevistados que não sabiam a resposta. As
sexo feminino (67/78); e a média de idade, de 36,6 maiores proporções de falta de conhecimento foram
(Desvio-padrão ±10,5; Mín-Máx de 21-64 anos). O identificadas na seção que diz respeito à epidemiologia
tempo médio de atuação profissional dos participantes da tungíase e sua gravidade (Tabela 1).
na área de estudo foi de 3,7 anos (Desvio-padrão ±3,3;
Mín-Máx 1 mês-17 anos). Discussão
Grande parte dos profissionais entrevistados
(38/78) relatou a ocorrência da tungíase em humanos, Ectoparasitoses como a pediculose, escabiose,
em sua área de atuação. Entre os que responderam larva migrans cutânea e tungíase são comuns em co-
sobre quais grupos eram mais atingidos pela tungíase, munidades carentes do Brasil embora frequentemente
para 15, de um total de 26, seria o sexo masculino, e negligenciadas, tanto pela população como pelos
para 37, de um total de 59, as crianças. Foi relatado profissionais de saúde.17 Os dados do presente estu-
que a tungíase também ocorria em animais e destes, do mostram que, de maneira geral, o conhecimento
os cães seriam os mais afetados (22/78). A maioria a respeito da tungíase era insuficiente, evidenciado
dos respondentes (61/78) considerou o período do pelo alto número de questões respondidas com ‘Não
ano de julho a setembro como de maior ocorrência sabe’ ou com respostas divergentes. A opinião sobre
da tungíase, sendo agosto o mês mais citado (33/78) a frequência com que ocorre a doença, por exemplo,
(Tabela 1). foi incoerente entre os profissionais que discordaram
Quanto à gravidade da tungíase, dois profissionais em relação a sua incidência na área em que trabalham.
relataram casos de internação devidos à infestação por Houve uma perda importante de 18 profissionais
T. penetrans. Porém, a maioria (54/78) afirmou que da amostra, devido, principalmente, à recusa da
nunca encaminhou qualquer pedido de internação. coordenação de uma equipe de ESF, composta por
Dos 78 participantes, 23 afirmaram não ter informação dez profissionais, para que seus funcionários parti-
Tabela 1 - Frequência absoluta nas categorias de resposta às questões referentes ao conhecimento sobre a
epidemiologia e gravidade da tungíase entre profissionais de saúde (n=78) de área endêmica no
município de Uberlândia, estado de Minas gerais. Brasil, 2010
Variáveis Frequência
Presença de tungíase em humanos
Sim 38
Não 28
Não sabe 9
Não respondeu 3
Sexo mais atingido
Homens 15
Mulheres 8
Ambos os sexos 3
Não sabe 52
Grupos etários mais atingidosa
Crianças 37
Adultos 10
Idosos 7
Jovens 5
Não sabe 35
Presença de tungíase em animaisa
Cão 22
Gato 2
Porco 1
Não 16
Não sabe 38
Não respondeu 2
Período do ano de maior ocorrência de tungíasea
Jul-Set 61
Out-Nov 36
Abr-Jun 18
Jan-Mar 14
Não sabe 33
Definição de caso grave de tungíase em humanosa
Presença de infecções secundárias 20
Superinfestação 11
Comprometimento pés e digitais 8
Inflamação 7
Presença de comorbidades 6
Não sabe 34
a) Possibilidade de resposta múltipla
cipassem do estudo. Não foi possível avaliar se essas dos profissionais, que poderiam ter assinalado respos-
perdas influenciaram os resultados apresentados tas mesmo sem ter conhecimento delas.
mas é importante ressaltar que os conhecimentos e Estudos prévios mostraram que o desconhecimento
práticas dos profissionais dessa equipe podem ser in- e/ou uso de conceitos errôneos sobre doenças por
fluenciados pelas características socioepidemiológicas profissionais de saúde pode levar a negligência na
da população do território sob sua responsabilidade. prevenção e tratamento, bem como nas medidas de
Apesar de o instrumento conter a maior parte de controle.18-21 No caso da tungíase, os dados sobre
questões de tipo discursiva, havia as objetivas, que, conhecimento, atitudes e práticas são todavia mais es-
possivelmente, teriam superestimado o conhecimento cassos, e a importância da doença é subestimada. Por
Tabela 2 - Frequência absoluta nas categorias de resposta às questões referentes ao conhecimento sobre
as práticas de profilaxia e terapêutica da tungíase entre profissionais de saúde (n=78) de área
endêmica no município de Uberlândia, estado de Minas Gerais. Brasil, 2010
Variáveis Frequência
Práticas de prevençãoa
Manter boa higiene 34
Uso de calçados 28
Evitar contato com áreas de risco e manter boa infra-estrutura 5
Uso de cal no solo 4
Evitar criação de animais 3
Uso de água sanitária no solo 2
Uso de pó de mandioca 1
Não sabe 23
Formas/produtos para tratamentoa
Retirada 60
Medicamentos antiinflamatórios e antibióticos 2
Não sabe 17
Fatores que favorecem a ocorrência de tungíasea
Falta de higiene 53
Criação de animais 19
Falta de infraestrutura 7
Educação precária 4
Baixa renda 2
Não sabe 8
a) Possibilidade de resposta múltipla
Tabela 3 - Frequência absoluta nas categorias de resposta às questões referentes à opinião sobre a magnitude
da tungíase entre profissionais de saúde (n=78) de área endêmica no município de Uberlândia,
estado de Minas Gerais. Brasil, 2010
Variáveis Frequência
Tungíase como problema de saúde pública na área
Sim 14
Motivos
Alta incidência 6/14
Devido à predisposição a infecções secundárias 3/14
Falta de educação em saúde e infraestrutura precária 1/14
Não sabe 4/14
Não 53
Motivos
Baixa incidência 21/53
Não sabe 32/53
Não respondeu 11
exemplo, estudo realizado em Fortaleza-CE mostrou foi realizada pelos próprios pacientes; e concluíram
que a tungíase foi quase totalmente negligenciada por que um mínimo de suporte do setor Saúde, como
médicos da atenção primária atuantes em área de alta fornecimento de agulhas hipodérmicas e educação em
prevalência.17 Winter e colaboradores15 mostraram, saúde, reduziria a intensidade da infestação, a superin-
em estudo sobre conhecimento, atitudes e práticas fecção bacteriana e outras morbidades associadas.15
da população afetada, que a terapêutica da tungíase Há necessidade de se implementar programas edu-
cacionais específicos para os profissionais de saúde, sionais (61/78) participantes do estudo reconheceu
sobre ectoparasitoses e outras doenças negligenciadas. o terceiro trimestre do ano, época de calor e seca
Esses programas poderiam, inclusive, ser integrados no local, como o período de maior prevalência da
a medidas de intervenção dirigidas contra outras do- tungíase. A alta umidade do solo na época de chuva
enças negligenciadas, como filariose e helmintíases prejudica o desenvolvimento de estágios de vida livre
intestinais.22 de T. penetrans;30 porém, grande parte dos partici-
Animais são conhecidos como importantes reser- pantes desconhecia um período típico de ocorrência
vatórios, e a tungíase, considerada uma zoonose.1,23 da doença. A ocorrência sazonal da tungíase favorece
A presença de ratos e animais errantes, ou animais o planejamento de estratégias de controle e a busca
domésticos como gatos e cães, favorece a dissemina- ativa de casos graves; raramente, contudo, as ações de
ção da pulga no ambiente. Porém, o conhecimento controle de doenças de ocorrência sazonal contem-
sobre reservatórios da tungíase foi escasso entre os plam o fator tempo.
entrevistados, e mais da metade deles não respondeu Uma grande parcela dos entrevistados não se
a essa questão ou respondeu-a erroneamente. De fato, sentia segura para definir um caso grave de tungíase,
a importância de cães, gatos e ratos como reservató- embora a superinfestação e a presença de infecções
rios foi constatada em comunidades do Ceará1 e na secundárias tenham sido – corretamente – as situações
Nigéria, porcos foram identificados entre os principais mais associadas a casos graves. Na área deste estudo,
reservatórios de T. penetrans.24 O desconhecimento a superinfestação não ocorre com frequência mas
da tungíase como doença zoonótica interfere sobre- casos associados, inclusive de internação, já foram
maneira nas medidas de controle. Ações voltadas para relatados (Limongi, comunicação pessoal). Em áreas
o controle de reservatórios certamente diminuiriam a endêmicas, as altas infestações estão associadas, prin-
incidência de casos humanos. cipalmente, a condições precárias de moradia, falta
Os entrevistados reconheceram as crianças como o de educação em saúde e presença de animais.25 As
grupo mais vulnerável. Vários estudos também corro- infecções secundárias são muito comuns na tungíase,
boram que crianças são mais susceptíveis à tungíase, causadas por uma grande variedade de microorganis-
devido, principalmente, a seu comportamento em mos patogênicos.13,31,33,34
áreas pobres onde ocorre a doença, como andar des- Entre as formas de prevenção, as mais conhecidas
calço ou brincar em contato direto com o solo.9,12,25,26 dos profissionais foram o uso de calçados e as práticas
Alguns autores também acreditam que a prevalência de higiene. Estas são as formas mais preconizadas na
da tungíase tem relação com a idade: a queratinização literatura, para a prevenção da tungíase.16,22 Entretanto,
da pele dos pés dos adultos dificultaria a penetração estudo realizado em Fortaleza-CE não observou efeito
da pulga.27,28 protetor completo para o uso de calçados fechados.25
Em relação ao sexo, os estudos disponíveis são Além disso, o uso contínuo de calçados não é comum,
discordantes. Em vários deles, a doença ocorreu em até culturalmente não aceito por algumas comuni-
proporções similares, entre homens e mulheres,5,13,29-31 dades. Existe a descrição de tungíase em indivíduos
enquanto outros estudos encontraram uma diferença que visitam áreas com altas infestações, mesmo na-
entre ambos os grupos. Novamente, uma explicação queles que utilizam calçados fechados, como botas
plausível seria de que as diferenças encontradas entre de segurança (Limongi, comunicação pessoal). Os
sexos estariam associadas às diferenças sociocompor- profissionais também relataram o uso de cal (óxido
tamentais entre homens e mulheres, nas comunidades de cálcio) no solo pelos moradores, como medida
endêmicas.27,32 Por exemplo, indivíduos do sexo mas- de prevenção da infestação. Esse procedimento é
culino, principalmente durante a infância, são mais adotado empiricamente, nos quintais infestados por
frequentemente expostos à T. penetrans por suas T. penetrans, não havendo estudos sistemáticos que
atividades de lazer na comunidade. comprovem sua efetividade.
A incidência da tungíase mostra uma variação sazo- A retirada da pulga foi citada entre os profissionais
nal dominante, com maiores prevalências nas épocas como a principal forma de tratamento da tungíase. A
mais quentes e secas, e prevalências mais baixas na terapia-padrão consiste na remoção da pulga com
estação chuvosa.30 De fato, grande parte dos profis- uma agulha esterilizada, seguida da aplicação tópica
de antibiótico no caso de infecção secundária.12 En- demonstrou que a prevalência de tungíase e pediculose
tretanto, os cuidados com os indivíduos infestados, registrada em centro de saúde difere, significativamen-
frequentemente, não são realizados pelas equipes te, da real prevalência dessas ectoparasitoses na co-
de Saúde da Família. A retirada de T. penetrans em munidade.17 Em outras doenças, das quais se conhece
crianças é feita quase sempre pelas mães, não por a ocorrência embora se desconheça a prevalência, o
profissionais de saúde.15 Considerando-se esses as- primeiro passo para a delimitação das áreas de alto
pectos, poder-se-ia evitar casos graves mediante uma risco está no papel de informantes-chave na própria
intervenção estruturada, que incluísse educação em comunidade, como chefes/líderes, e/ou na identifica-
saúde para a população e distribuição de material ção da prevalência em grupos mais atingidos, como
adequado para retirada da pulga. Trata-se de uma escolares. Em áreas endêmicas da esquitossomose,
intervenção da atenção primária com baixo inves- por exemplo, esses métodos de estimação rápida da
timento de recursos financeiros e poucos recursos prevalência e gravidade da doença na comunidade
humanos envolvidos, frente ao impacto que causaria já estão estabelecidos.36,37 Portanto, são necessários
na comunidade. Durante a estação seca, em razão das estudos transversais como propósito de identificar a
altas taxas de infestação, famílias necessitam de 20 a real situação da prevalência e incidência da doença
30 minutos para examinar e extrair as pulgas de suas na área que serviu a esta pesquisa.
crianças, em áreas gravemente afetadas. Intervenções A tungíase é amplamente negligenciada pelos pro-
socioambientais também são necessárias, dirigidas fissionais de saúde, apesar de casos graves terem sido
aos reservatórios animais e ao ambiente peridomi- relatados, alguns levados a óbito.38 É costume considerar
ciliar.13,22,30,35 Intervenções devem ser realizadas de a tungíase apenas um incômodo e não uma infecção
forma multidisciplinar para alcançar sustentabilidade, importante na área endêmica estudada. As conclusões
incluindo profissionais da área da Saúde Pública, ve- deste estudo indicam que mais esforços devem ser
terinários e assistentes sociais. A vacinação contra o empreendidos para melhorar a informação, educação
tétano deve ser verificada pelos profissionais de saúde, e atuação dos profissionais de saúde frente à tungíase.
visto que, frequentemente, são utilizados instrumentos
inadequados para remoção das pulgas.3,13 Contribuição dos autores
O conhecimento insuficiente dos profissionais
pode ser explicado pelo fato de a tungíase ocorrer de Carvalho TF realizou o delineamento do estudo,
forma focalizada, podendo não se manifestar como interpretação dos dados e redação do artigo.
uma doença endêmica em toda a área de estudo, e Ariza L e Heukelbach J contribuiram na redação,
sim concentrada nos locais de mais baixos recursos. revisão crítica do conteúdo intelectual do manuscrito
Apenas algumas unidades e profissionais atenderiam e aprovação final.
aos casos de tungíase. Ademais, estudos mostram Silva JJ, Mendes J e Silva AA contribuiram na revi-
que mesmo em áreas endêmicas afetadas, é baixa a são crítica do conteúdo intelectual do manuscrito e
proporção de indivíduos com tungíase que procuram aprovação final.
a unidade de saúde por conta da doença.17 Assim, Limongi JE contribuiu na concepção e delineamento
torna-se difícil basear-se apenas nos profissionais de do estudo, análise e interpretação dos dados, redação
saúde para estimar a prevalência ou identificar áreas e revisão crítica do conteúdo intelectual do manuscrito
de risco. Estudo conduzido em favela de Fortaleza-CE e aprovação final.
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Artigo
original Vigilância de infecção de sítio cirúrgico pós-alta hospitalar
em hospital de ensino do Distrito Federal, Brasil: estudo
descritivo retrospectivo no período 2005-2010*
doi: 10.5123/S1679-49742012000200008
Surveillance of surgical site infection after hospital discharge in a teaching hospital of the
Federal District, Brazil: a retrospective descriptive study in the period 2005-2010
Resumo
Objetivo: investigar a ocorrência de infecção de sítio cirúrgico (ISC) e descrever as características dos casos entre pacientes
atendidos no âmbito do programa de vigilância pós-alta de egressos da Cirurgia Geral em hospital de ensino de Brasília, Distrito Fe-
deral, Brasil. Métodos: estudo descritivo retrospectivo do período 2005-2010, com dados dos sistemas de informações do hospital,
prontuários de pacientes e registros dos resultados dos exames microbiológicos realizados. Resultados: no período do estudo, foram
atendidos 4.098 pacientes e 82,3% deles compareceram ao seguimento pós-alta. Foram diagnosticados 147 casos de ISC entre 4.375
cirurgias avaliadas (3,4%). Houve predominância do Staphylococcus aureus entre as 19 espécies isoladas nas culturas dos sítios
cirúrgicos. Verificou-se maior ocorrência de ISC entre o 6º e o 10º dia pós-operatório. Conclusão: ficou evidenciada a relevância do
acompanhamento ambulatorial na redução da subnotificação e consequente contribuição para a validade dos indicadores, aprimorando
a vigilância de ISC no serviço de saúde.
Palavras-chave: Procedimentos Cirúrgicos Operatórios; Seguimentos; Assistência Ambulatorial; Vigilância Epidemiológica;
Infecção da Ferida Operatória.
Abstract
Objective: this study investigated the occurrence of surgical site infection (SSI) and characteristics of cases among patients
served under the program of post-discharge surveillance of the General Surgery Teaching Hospital of Brasilia, Federal District,
Brazil. Methods: the retrospective descriptive study, from 2005-2010, used data obtained by consulting hospital information
systems, patients records, and records of results of microbiological tests. Results: during the study period, 4,098 were treated
and 82.2% of them attended by the follow-up program. From 4,375 surgeries evaluated, (3.4%) 147 cases of SSI were diagnosed;
Staphylococcus aureus was predominant among the 19 species isolated in cultures of the surgical site; a higher incidence of
SSI occurred between the 6th and the 10th postoperative day. Conclusion: this study showed the importance of ambulatory
accompaniment in reducing underreporting and its consequent contribution to the validity of indicators and in improving the
surveillance of SSI in the health services.
Key words: Surgical Procedures, Operative; Follow-up Studies; Ambulatory Care; Epidemiologic Surveillance; Surgical
Wound Infection.
* Pesquisa financiada com recursos da Universidade de Brasília, por seu Programa de Iniciação Científica, da Diretoria de
Fomento à Iniciação Científica/Decanato de Pesquisa e Pós-Graduação – ProIC UnB/CNPq
gem no controle das infecções hospitalares.9 Assim retornar à Sala de Egressos no Ambulatório do hospital
foi criado o Serviço de Atendimento Ambulatorial de entre o 6º e o 10º dia pós-operatório. Por ocasião desse
Egressos Cirúrgicos (SAAEC), que funciona duas vezes retorno, é realizada avaliação de sua condição clínica
por semana, pautado na atuação integrada entre CCIH, geral e feita a inspeção direta do sítio cirúrgico, além
técnicos de enfermagem do ambulatório e médicos da retirada total ou parcial dos pontos cirúrgicos.
residentes da Cirurgia Geral, além de acadêmicos de Para diagnóstico de um caso suspeito de infecção,
enfermagem vinculados ao PEAC. foram adotadas ações e procedimentos preconizados
A realização de pesquisas que avaliem a relevância pela Anvisa, fundamentados na classificação da ISC.
de se implantar a vigilância de ISC pós-alta hospitalar Assim, quanto a topografa, a ISC pode ser categorizada
é justificada pela necessidade de melhor conhecer o como:
perfil epidemiológico de serviços de acompanhamento - infecção incisional superficial – envolve apenas pele
de egressos cirúrgicos. e tecido subcutâneo; pode apresentar drenagem
O objetivo deste estudo é investigar a ocorrência de secreção purulenta da incisão e/ou micro-or-
de ISC e descrever as características dos casos entre ganismo isolado de maneira asséptica de secreção
pacientes atendidos no âmbito do programa de vigi- ou tecido; diagnóstico de infecção superficial pelo
lância pós-alta de pacientes egressos da especialidade médico assistente;
Cirurgia Geral em hospital de ensino da cidade de - infecção incisional profunda – envolve tecidos
Brasília, Distrito Federal, Brasil, durante o período moles profundos, músculo ou fáscia; apresenta
de 2005 a 2010. drenagem purulenta, deiscência espontânea ou
deliberadamente aberta pelo cirurgião quando o
Métodos paciente apresentar febre, dor localizada, exceto
quando se tratar de cultura negativa e/ou abscesso
Trata-se de estudo epidemiológico descritivo e ou outra evidência de infecção envolvendo fáscia
retrospectivo, sobre dados de pacientes acompanha- ou músculo, identificada em reoperação, exame
dos no âmbito do programa de vigilância pós-alta de clínico, histopatológico ou exame de imagem; e
egressos da especialidade Cirurgia Geral em hospital - infecção de órgão/cavidade – envolve qualquer
de ensino na cidade de Brasília-DF, no período com- órgão ou cavidade aberta ou manipulada durante
preendido entre março de 2005 e dezembro de 2010. a operação cirúrgica, que tenha isolado micro-
Os dados utilizados no estudo foram obtidos a partir organismo de maneira asséptica de secreção ou
de consulta ao banco de informações gerado no SAAEC, tecido de órgão ou cavidade e/ou abscesso ou outra
prontuários dos pacientes atendidos e registros dos evidência de infecção envolvendo órgão ou cavidade
resultados dos exames microbiológicos realizados. identificada em reoperação, exame clínico, histo-
Para registro dos dados de interesse para a pesquisa, patológico ou exame de imagem.3
utilizou-se um instrumento próprio, em que constaram Para identificação do micro-organismo causador da
as seguintes variáveis: sexo e idade dos pacientes; infecção, realizou-se a coleta de material para cultura
operações cirúrgicas realizadas; ISC notificadas; clas- de vigilância do sítio cirúrgico, segundo protocolo
sificação do tipo da ISC; micro-organismos isolados padronizado pela CCIH do hospital, utilizando-se o
nas culturas dos sítios cirúrgicos avaliados; e tempo swab. Somente a primeira infecção de sítio cirúrgico
transcorrido entre a operação cirúrgica e o diagnóstico de cada paciente foi registrada.
de ISC no período pós-alta hospitalar. Indicadores de resultados da vigilância de ISC pós-
As informações coletadas foram reunidas em ban- alta hospitalar foram calculados como proporções,
co de dados, pelo software Microsoft Office Excel® expressas sob a forma percentual. Foram calculados
2007, para análise e posterior construção de tabelas os seguintes indicadores:
e gráficos. - proporção de retornos – número total de pacientes
O seguimento ambulatorial do paciente no SAAEC que retornaram ao serviço em relação ao número
ocorre nos primeiros 30 dias após a operação cirúrgi- total de pacientes submetidos a procedimentos ope-
ca; ou até um ano, nos casos de colocação de prótese. ratórios, por ano; considerou-se, no numerador
No momento da alta hospitalar, o paciente é orientado a dessa proporção, um único retorno, excluindo-se
os retornos subsequentes dos pacientes que volta- entre as seguintes faixas etárias: 3,4% (n=139) tinham
ram ao serviço mais de uma vez; menos de 20 anos; 13,3% (n=544), entre 21 e 30
- proporção de perdas – número total de pacientes anos; 19,7% (n=806), entre 31 e 40 anos; 19,2%
que não compareceram ao serviço em relação ao (n=786), entre 41 e 50 anos; 21,4% (n=879), entre
número total de pacientes submetidos a procedi- 51 e 60 anos; 14,1% (n=577), entre 61 a 70 anos;
mentos operatórios, por ano; 7,3% (n=300), entre 71 a 80 anos; e 1,6% (n=67)
- proporção de incidência (incidência cumulativa) eram maiores de 81 anos de idade. Constatou-se, nessa
de ISC – número total de casos notificados em re- distribuição, a predominância dos pacientes com ida-
lação ao número total de pacientes em seguimento des entre 21 e 60 anos (73,6%; n=3.015), enquanto as
ambulatorial, por ano; e faixas correspondentes aos extremos, ou seja, menores
- indicadores de distribuição proporcional dos casos de 20 e maiores de 60 anos, corresponderam, juntas, a
de ISC – proporção dos casos segundo categorias 26,4% (n=1.083) dos pacientes atendidos. Em relação
das variáveis de interesse, a saber, diagnóstico ao sexo, 54,0% (n=2.215) eram femininos e 46,0%
(análise clínica ou laboratorial), topografia (inci- (n=1.883) masculinos.
sional superficial, incicional profunda ou de órgão/ No período estudado, a proporção de retorno dos
cavidade), agente etiológico (espécies de micro- pacientes para avaliação pós-alta no SAAEC foi de
organismos identificadas), intervalos de tempo 82,3%: no ano de 2005, foram realizadas 736 cirurgias
entre a operação cirúrgica e o diagnóstico de ISC e 82,1% (n=604) dos pacientes retornaram para aten-
(6 a 10, 11 a 15, 16 a 30, >31 dias). dimento no SAAEC; e em 2006, o número de operações
Média: cirúrgicas aumentou para 933, com 75,4% (n=704)
- retorno do paciente ao serviço – número total de dos pacientes sob vigilância do serviço. De 2007 a
pacientes que retornaram ao serviço em relação ao 2009, houve um aumento crescente no número de
número total de pacientes submetidos a procedi- operações cirúrgicas: em 2007, foram realizados 708
mentos operatórios no período, em anos; e procedimentos, com proporção de retorno de 90,2%
- perdas obtidas – número total de pacientes que não (n=639); em 2008, realizaram-se 923 operações e
retornaram ao serviço em relação número total de 87,1% (n=804) dos pacientes foram acompanhados
pacientes submetidos a procedimentos operatórios após a alta; e em 2009, obteve-se 84,8% (n=826) de
no período, em anos. retorno de pacientes dos 974 procedimentos operató-
Para operacionalização do estudo, o projeto de rios realizados. Em 2010, observou-se uma queda no
pesquisa foi submetido à apreciação do Comitê de Ética número de procedimentos para 703, com proporção
e Pesquisa da Faculdade de Medicina da Universidade de retorno de 74,1% (n=521). Esses dados estão
de Brasília, observando-se os preceitos da Resolução demonstrados na Figura 1.
CNS/MS nº 196/96, sendo aprovado sob o Protocolo A Figura 2 apresenta as proporções de perdas,
nº 70/2006. correspondentes às frequências relativas dos pacien-
tes que não retornaram ao SAAEC para seguimento
Resultados pós-alta hospitalar. A maior proporção dessas perdas
foi observada em 2010 (25,9%; n=182), enquanto a
No período de março de 2005 a dezembro de menor foi registrada em 2007 (9,7%; n=69). A pro-
2010, foram atendidos 4.147 pacientes, sendo ex- porção de perdas no período foi de 17,7%.
cluídos do estudo 49 devido a informações incom- Quanto aos procedimentos operatórios a que os
pletas. Assim, a amostra estudada constitui-se de pacientes foram submetidos, registrou-se um total
4.098 pacientes que permaneceram em seguimento de 94 tipos diferentes de operações cirúrgicas; 4.375
na Sala de Egressos Cirúrgicos, no Ambulatório do procedimentos foram avaliados separadamente, devido
hospital. Nesses pacientes, foram realizados 4.977 a 6,7% (n=277) dos pacientes terem se submetido a
procedimentos operatórios pela equipe cirúrgica da mais de uma operação cirúrgica. A frequência absoluta
especialidade Cirurgia Geral. e relativa das operações cirúrgicas predominantes
Os pacientes acompanhados no SAAEC encontra- entre os pacientes em seguimento ambulatorial é
vam-se com idades entre 18 e 83 anos, distribuídas apresentada na Tabela 1, destacando-se a hernior-
974
933 923
804 826
736 704 708 703
639
604
Frequencia absoluta 521
Figura 1 - Frequência absoluta das operações cirúrgicas realizadas pela equipe da especialidade Cirurgia Geral
e atendimentos realizados no SAAECa de hospital de ensino em Brasília, Distrito Federal.
Brasil, 2005 a 2010
30,0
25,9
24,5
25,0
Frequencia relativa (%)
20,0 17,9
15,2
15,0 12,9
9,7
10,0
5,0
2005 2006 2007 2008 2009 2010
Figura 2 - Proporção de perdas de pacientes que não retornaram para atendimento no SAAECa de hospital de
ensino em Brasília, Distrito Federal. Brasil, 2005 a 2010
rafia (35,7%; n=1.560) e a colecistectomia (24,1%; porção de incidência de ISC média no período foi de
n=1.054); também se apresenta a distribuição propor- 3,4% (n=24).
cional de casos de ISC por procedimento operatório, O diagnóstico dos casos de ISC foi realizado por
com um total de 147 notificações e destaque para as meio de análise clínica (50,3%; n=74) e laboratorial
herniorrafias (28,6%; n=42). (49,7%; n=73), com distribuição nos diferentes
Na Figura 3 é demonstrada a incidência cumulativa procedimentos cirúrgicos avaliados. Em relação à
de ISC no período do estudo, sendo a maior proporção topografia das ISC confirmadas laboratorialmente,
registrada no ano de 2009 (5,3%; n=26), enquanto houve predominância do tipo incisional superficial
a menor correspondeu a 2010 (1,9%; n=10). A pro- (95,0%; n=69), e quanto à confirmação clínica,
Tabela 1 - Frequência absoluta (N) e relativa (%) dos tipos de operações cirúrgicas e distribuição proporcional
dos casos de infecção de sítio cirúrgico (ISC) entre pacientes atendidos no SAAEC a de hospital de
ensino em Brasília, Distrito Federal. Brasil, 2005 a 2010
Frequência ISC
Operações cirúrgicas
N % N %
Apendicectomia 155 3,5 2 1,4
Colecistectomia 1.054 24,1 16 10,9
Exérese de tumor 477 10,9 17 11,6
Gastroplastia 239 5,5 18 12,2
Herniorrafia 1.560 35,6 42 28,6
Laparotomia exploradora 100 2,3 11 7,5
Tireoidectomia 165 3,8 – –
Outras 625 14,3 41 27,8
TOTAL 4.375 100,0 147 100,0
6,0
5,3
5,0
4,3
3,8
4,0
2,8
% de ISC
3,0 2,5
2,0 1,9
1,0
0,0
2005 2006 2007 2008 2009 2010
Figura 3 - Incidência cumulativa (%) de casos de infecção de sítio cirúrgico (ISC) por ano, entre pacientes
atendidos no SAAECa de hospital de ensino em Brasília, Distrito Federal. Brasil, 2005 a 2010
na totalidade dos casos, a ISC foi do tipo incisional No que concerne ao intervalo de tempo entre a ope-
superficial (n=74). ração cirúrgica e o diagnóstico de ISC pós-operatório,
Quanto aos micro-organismos identificados nas seja por confirmação laboratorial ou avaliação clínica
culturas obtidas dos sítios cirúrgicos, encontrou-se pelo cirurgião, verificou-se, em sua totalidade, 45,6%
19 espécies diferentes: predominaram o Staphylo- (n=67) dos diagnósticos entre o 6º e o 10º dia pós-
coccus aureus (40,4%; n=34), seguido do Klebsiella operatório (DPO), 29,2% (n=43) entre o 11º e 15º
pneumoniae (8,3%; n=7), Escherichia coli e Proteus DPO, 18,4% (n=27) entre o 16º e 30º DPO e, após o
vulgaris (7,2%; n=6, respectivamente). 31º DPO, 6,8% (n=10) diagnósticos realizados.
Tabela 2 - Distribuição proporcional dos casos de infecção de sítio cirúrgico (ISC) diagnosticados no seguimento
pós-alta hospitalar, segundo tipo de procedimento cirúrgico, classificação do sítio cirúrgico, agente
etiológico e dia pós-operatório (DPO), em hospital de ensino em Brasília, Distrito Federal.
Brasil, 2005 a 2010
Diagnóstico de ISC no
seguimento pós-alta hospitalar TOTAL
Variáveis Laboratorial Clínico
N % N % n %
Procedimento cirúrgico
Apendicectomia – – 2 2,7 2 1,4
Colecistectomia 8 11,0 8 10,8 16 10,9
Exérese de tumor 6 8,2 11 14,9 17 11,6
Gastroplastia 10 13,7 8 10,8 18 12,2
Herniorrafia 17 23,3 25 33,8 42 28,6
Laparotomia 8 10,9 3 4,0 11 7,5
Outros 24 32,9 17 23,0 41 27,8
Total 73 100,0 74 100,0 147 100,0
Classificação da ISC
Incisional superficial 69 95,0 74 100,0 143 97,3
Incisional profunda 4 5,0 – – 4 2,7
Órgão/cavidade – – – – – –
Total 73 100,0 74 100,0 147 100,0
Agente etiológico
Enterococcus faecalis 5 5,9 – – 5 5,9
Escherichia coli 6 7,2 – – 6 7,2
Klebsiella pneumoniae 7 8,3 – – 7 8,3
Proteus mirabilis 4 4,8 – – 4 4,8
Proteus vulgaris 6 7,2 – – 6 7,2
Staphylococcus aureus 34 40,4 – – 34 40,4
Outros 22 26,2 – – 22 26,2
Total 84 100,0 – – 84 100,0
DPO (em dias)
6 a 10 35 47,9 32 43,2 67 45,6
11 a 15 19 26,0 24 32,4 43 29,2
16 a 30 15 20,5 12 16,2 27 18,4
>31 4 5,5 6 8,1 10 6,8
Total 73 49,7 74 50,3 147 100,0
A Tabela 2 descreve a distribuição proporcional de cia hospitalar, essa vigilância não fornece indicadores
casos de ISC diagnosticados segundo o tipo de proce- válidos, gerando subnotificação.8,10,11
dimento cirúrgico, classificação da ISC, espécies de No Brasil, a maior parte dos hospitais limita-se à
micro-organismos envolvidas e período transcorrido vigilância de ocorrência de ISC no período de interna-
entre a operação e o diagnóstico de ISC no retorno ção e não inclui o acompanhamento sistemático dos
ambulatorial. pacientes cirúrgicos após a alta hospitalar.12 O Centers
for Disease Control and Prevention, dos Estados Unidos
Discussão da América (CDC/USA), recomendam que esse tipo de
paciente – em razão de fatores específicos, inerentes
O acompanhamento de pacientes cirúrgicos após ao ato cirúrgico e sua condição –, tenha sua vigilância
sua saída do hospital aumenta a acurácia da vigilância ampliada para o período pós-alta.4 Contudo, a escolha
de ISC. Quando realizada apenas durante a permanên- da forma ideal dessa vigilância é difícil, tendo em vista
a variedade de métodos recomendados. Fica, portanto, de Brasília às regiões administrativas do Distrito Fe-
a cargo de cada instituição utilizar e desenvolver o deral, de pacientes do entorno do DF e, inclusive, de
método mais adequado a seus recursos, infraestrutura diversas unidades da Federação.16 Ademais, grande
e perfil da clientela hospitalizada.10 parte dos pacientes apresenta baixa condição socio-
Com o intuito de obter indicadores acurados de econômica e o alto custo do transporte público local
ISC, a partir de 2005, o hospital de ensino em tela constitui, para eles, fator determinante para o retorno
implementou o retorno ambulatorial de egressos ci- ou não ao hospital, sem contar com a possibilidade
rúrgicos empregando diferentes métodos de vigilância de acesso à Unidade Básica de Saúde mais próxima
de ISC após alta hospitalar, a saber: avaliação direta de seu domicílio. Somados, esses fatores reduzem a
do sítio cirúrgico; consulta aos prontuários; coleta disponibilidade do paciente regressar para avaliação
de amostra de cultura do sítio específico para exame e seguimento pelo SAAEC.
microbiológico; e avaliação clínica do paciente. Estes Outro aspecto constatado foi que os casos de ISC
métodos têm sido considerados como referência,10 ocorreram em indivíduos de diferentes faixas etárias
devido à vantagem da notificação de todos os casos, e sexo. Os resultados da análise dessas características
independentemente da localização e tipo, embora não demográficas sugerem que a ocorrência de infecções
se tenha instituído, todavia, o melhor e mais adequado cirúrgicas pode incidir indistintamente, conforme as
método a ser utilizado.10,11,13 variáreis investigadas.
No presente estudo, os dados de grande parte dos Entre as operações cirúrgicas predominantes na
pacientes em seguimento pós-alta hospitalar foram especialidade Cirurgia Geral do hospital, constatou-se
examinados, à exceção de cerca de 1,0% deles, cujas elevado número de procedimentos relacionados ao
informações de interesse para a pesquisa estavam aparelho digestivo, como a colecistectomia e a gastro-
incompletas. A proporção de retorno dos pacientes, plastia, e a herniorrafia. A diversidade do potencial de
de 82,3%, pode ser considerada satisfatória, visto que contaminação desses procedimentos, o perfil clínico
a vigilância pós-alta foi realizada somente por meio cirúrgico dos pacientes, as doenças de base associadas
de retorno ambulatorial, enquanto para outros estu- e o maior número de operações realizadas alimentam
dos,8,10,14 que complementaram a busca de casos por a grande preocupação dos estudiosos no que concerne
contato telefônico, a média foi de 95,0%. A vigilância à taxa de ISC observada em pacientes submetidos a
por retorno ambulatorial, ultimamente considerada essas cirurgias.17
um método eficiente,11 apresenta como aspecto po- O presente estudo verificou que a herniorrafia
sitivo a consistência dos dados obtidos: quem realiza foi o procedimento mais realizado pela equipe da
a avaliação do sítio cirúrgico é um profissional de Cirurgia Geral. A técnica geralmente utilizada nesse
saúde, o que confere maior credibilidade aos registros, procedimento é o reparo de Lichtenstein, qual seja, o
quando comparados com as respostas do paciente ao uso de telas de polipropileno para o reparo cirúrgico
inquérito telefônico.13,15 das hérnias, uma técnica que permite a redução das
A elevada frequência de retorno ao serviço pode recidivas para cerca de 1,0% e é aceita como padrão
ser explicada pelo fato de a instituição hospitalar ouro pelo Colégio Americano de Cirurgiões.18 Contu-
ser pública e de ensino, em que tanto as internações do, a realização dessa operação cirúrgica depende
quanto o acompanhamento do paciente são reali- de um sistema de internação hospitalar do paciente,
zados no mesmo local.15 Não obstante, a análise da apesar de um estudo19 demonstrar que se trata de
frequência dos atendimentos realizados evidencia um procedimento de baixo risco e de pequeno porte,
uma distribuição não linear do percentual de retorno sendo, portanto, indicada sua realização em centro
ambulatorial, no decorrer dos anos, em conformidade cirúrgico ambulatorial. O serviço, além das vantagens
com a frequência das operações cirúrgicas realizadas supracitadas, como a redução dos custos, e o menor
pela equipe da Cirurgia Geral a cada ano, observando- tempo de internação e maior disponibilidade de leitos
se maior proporção de perdas de pacientes nos anos hospitalares, não apresenta diferença na ocorrência
de 2006 e 2010. Esse fato pode estar associado a de infecção entre pacientes que realizaram o proce-
características próprias do hospital, que atende à uma dimento ambulatorial e aqueles que se submeteram à
ampla demanda atendida, da comunidade da cidade internação convencional.
Outro procedimento cirúrgico frequentemente re- geral e de ginecologia de 48 hospitais italianos, entre
alizado no hospital foi a colecistectomia, considerada 4.665 pacientes acompanhados, identificou 241 casos
segura e eficaz, tanto por via tradicional como por via de ISC, dos quais 93 (38,6%) ocorreram nos 30 dias
videolaparoscópica. O método tem sido amplamente do seguimento pós-alta hospitalar.22
difundido no Brasil e em outros países, nas últimas Entre as ISC aqui identificadas, constatou-se pre-
décadas, sendo também o mais utilizado no hospital dominância daquelas decorrentes de herniorrafia e
de ensino considerado por este estudo, nos últimos gastroplastia. Embora a herniorrafia seja classificada
anos. Suas vantagens em relação à técnica conven- pelo CDC/USA4 como um procedimento limpo, nela, a
cional, ao diminuir a agressão cirúrgica e o tempo de ocorrência de ISC observada foi maior do que em outras
permanência hospitalar, permitindo o rápido retorno cirurgias limpas. Alguns fatores podem estar associados à
às atividades diárias, menores complicações pós- elevada proporção de ISC constatada no presente estudo:
operatórias e melhor recuperação estética,20 podem preparo do paciente no pré-operatório; características
estar associadas à relativa frequência de ISC, conforme intrínsecas do paciente; adequação dos procedimentos
foi constatado por esta pesquisa. assistenciais durante o transoperatório – como técnica
Nos últimos anos, assistimos ao aumento do número utilizada na operação cirúrgica, habilidade da equipe,
proporcional de pessoas obesas, até se transformar em ambiente da sala operatória, paramentação cirúrgica
um dos mais importantes problemas de Saúde Pública –; profilaxia antimicrobiana; atenção ao estado geral
no mundo. A obesidade é considerada uma doença do paciente; e cuidados necessários no período pós-
crônica, causadora de diversas complicações meta- operatório.11,23 Quanto à gastroplastia, um procedimento
bólicas e sistêmicas, diminuindo, significativamente, potencialmente contaminado, a composição corporal e
a qualidade de vida de seus portadores. Quando esse as comorbidades associadas aos pacientes que se sub-
problema compromete a saúde, a terapêutica cirúr- metem a essa operação cirúrgica também são fatores
gica mostra-se como a maneira ideal de tratamento, contributivos do aumento das taxas de ISC. Além disso,
principalmente pela gastroplastia, o quarto tipo de muitos desses pacientes apresentam alguns problemas
procedimento operatório com expressiva frequência, no pós-operatório que poderiam contribuir para a ocor-
conforme constatação deste estudo. Pesquisas demons- rência de ISC, como intolerância a alguns tipos de ali-
tram que o número de cirurgias bariátricas realizadas mentos – e possível deficiência nutricional –,21 alterações
em todo o mundo já atinge grandes proporções e psicológicas, frustrações e sentimento de incompetência
cresce exponencialmente, em função dos bons prog- para prosseguir com o tratamento.24 A elevada proporção
nósticos e dos resultados efetivamente alcançados.21 de infecção em cirurgias gástricas, aqui encontrada, está
Apesar de o hospital em estudo também ser uma em conformidade com a literatura.22
instituição de ensino com finalidade de graduação, O diagnóstico da ISC foi realizado a partir de avalia-
residência médica e residência multiprofissional em ção clínica pelo cirurgião e em análise microbiológica
saúde, o que implica rotatividade constante de estu- laboratorial. Clinicamente, os sinais e sintomas suges-
dantes e residentes todavia desprovidos da habilidade tivos de infecção são dor, hiperemia local, mudança de
técnica aprimorada para realização dos procedimentos odor e febre, além da presença de secreção purulenta
cirúrgicos e prestação de cuidado perioperatório, a – considerada como padrão ouro – desde que esta não
proporção de ISC média pós-alta hospitalar foi de se caracterize como uma reação localizada, no ponto
3,4%, dado parcialmente coincidente com o encon- cirúrgico.8,25 Para confirmação laboratorial, o material
trado em estudo11 de acompanhamento prospectivo de biológico do sítio cirúrgico com suspeita de infecção
203 pacientes adultos submetidos a cirurgias eletivas, foi coletado com swab. Este método, bastante utilizado
limpas e contaminadas em hospital universitário bra- por não causar dor ao paciente, não traumatizar o
sileiro, entre junho de 2007 e agosto de 2008: uma tecido, ser de baixo custo e fácil realização, tem sido
taxa global de ISC de 10,3% dos casos, 10 (8,3%) alvo de críticas e controvérsias quanto a sua fidedigni-
deles em procedimentos limpos e 11 (13,2%) em dade e forma correta de realização, uma vez que várias
contaminados; e entre os casos de infecção notificados, partes da ferida apresentam diversidade bacteriana,
17 (80,9%) detectados no seguimento pós-alta. Estudo tanto no aspecto quantitativo quanto qualitativo, além
multicêntrico e prospectivo, conduzido em unidade de produzir informações da superfície da ferida, tão-
somente, não do tecido mais profundo.26 O método é Quando se considera o intervalo – em dias – entre a
comumente empregado, embora seja preferível o uso operação cirúrgica e o diagnóstico de ISC, os resultados
de coleta da amostra por aspiração com seringa e mostram que a maioria das manifestações ocorreu entre
agulha estéril se a lesão for aberta e desde que feita a o 6º e o 10º dia pós-operatório – DPO. Houve uma dis-
limpeza da ferida previamente à coleta, evitando-se a tribuição proporcional de casos nos demais intervalos
contaminação do material com as áreas adjacentes.25 de tempo, entretanto, justificando a importância de se
Em relação à classificação da ISC, a frequência mais seguir a recomendação do CDC/USA, de ampliação da
alta do tipo incisional superficial (95,0%) encontrada vigilância do paciente cirúrgico no período pós-alta
aqui está de acordo com os achados de outros auto- hospitalar para 30 dias; ou até um ano, nos casos de
res,8,12,27 os quais relatam a maior incidência de ISC implante de prótese. Também foram identificados casos
como incisional superficial. de ISC após o 31º DPO, ainda que em menor frequência,
Com referência aos micro-organismos isolados nas fato não descrito em outras pesquisas.
culturas dos sítios cirúrgicos, destaca-se o Staphylo- Fica evidente a importância de se instituir, nos
coccus aureus, uma bactéria que pode ser encontrada serviços de vigilância de infecção hospitalar dos esta-
no trato digestivo, na pele humana normal e em outros belecimentos brasileiros de saúde, o acompanhamento
sítios anatômicos. As infecções causadas por essa ambulatorial de pacientes cirúrgicos no período pós-alta
bactéria são comuns, principalmente no ambiente hospitalar para reduzir a subnotificação e obter indica-
hospitalar, podendo atingir desde regiões superficiais dores válidos sobre ISC, haja vista o número expressivo
até os tecidos mais profundos. O potencial infeccioso de eventos identificados após a alta do paciente.
do S. aureus não se restringe apenas à facilidade de mul- Estes autores acreditam que os resultados apresenta-
tiplicação e disseminação nos tecidos, também afeta dos por este estudo podem sensibilizar os profissionais
a produção de moléculas com poder patogênico.28 dos serviços sobre a necessidade do acompanhamento
A bactéria Klebsiella pneumoniae é uma impor- pós-alta como forma de garantir maior confiabilidade
tante fonte de preocupação no meio hospitalar, repre- aos indicadores de infecção de sítio cirúrgico, de ma-
sentando a segunda espécie predominante nas culturas neira a viabilizar medidas direcionadas à prevenção
microbiológicas identificadas neste estudo. A infecção e controle desses riscos, aprimorando o sistema de
causada por Klebsiella spp. tende a ocorrer em pessoas vigilância com novos parâmetros de ação.
com sistema imunitário deprimido, associando-a a
um risco elevado de mortalidade. Sua transmissão Agradecimentos
ocorre por contato direto ou por fonte comum, em
qualquer área física hospitalar, acometendo pacientes À Diretoria de Fomento à Iniciação Científica –
clínicos, cirúrgicos e pediátricos. O número de surtos DIRIC –, Decanato de Pesquisa e Pós-Graduação da
hospitalares causados por essa bactéria é cada vez Universidade de Brasília – DPP/UnB –, e ao Conselho
maior, devido à mudança no padrão de sensibilidade Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológi-
aos antimicrobianos.29 co – CNPq –, pela concessão de bolsa vinculada ao
Algumas enterobactérias e o S. aureus estão presen- Programa de Iniciação Científica (ProIC).
tes no trato digestivo, sistema orgânico no qual a maior À enfermeira Jacqueline Rodrigues de Carvalho e ao
parte dos procedimentos operatórios foi realizada, além Hospital Universitário de Brasília, pelo apoio à pesquisa.
de muitos dos patógenos isolados estarem presentes nas
mãos dos profissionais e na própria pele dos pacientes, Contribuição dos autores
de que se presume que a prática adequada de higieniza-
ção nos procedimentos e nas mãos dos profissionais de Batista TF participou na elaboração do delineamen-
saúde foi deficiente. Outro importante fator relacionado to da pesquisa, coletou os dados, analisou resultados
é a resistência bacteriana aos antimicrobianos, cujos e redigiu o manuscrito.
benefícios são indiscutíveis no combate às doenças in- Rodrigues MCS participou na concepção, de-
fecciosas. Seu uso indiscriminado ao longo dos últimos lineamento e orientação da pesquisa, análise dos
anos, contudo, tem proporcionado às bactérias reagirem resultados, revisão crítica do texto e aprovação final
de forma seletiva contra a ação desses medicamentos.30 do manuscrito.
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Recebido em 07/12/2011
Aprovado em 06/05/2012
Infant mortality in the city of Pelotas, state of Rio Grande do Sul, Brazil, in the period
2005-2008: use of death investigation in the analysis of avoidable causes
Alicia Matijasevich
Programa de Pós-graduação em Epidemiologia, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas-RS, Brasil
Resumo
Objetivo: avaliar a evitabilidade dos óbitos infantis em Pelotas, no período 2005-2008, e comparar resultados da auditoria
de óbito pós-investigação com dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM). Métodos: as causas de óbito foram
classificadas conforme a Classificação Internacional de Doenças, 10ª Revisão; a evitabilidade foi classificada conforme a ‘Lista
de causas de mortes evitáveis por intervenções no âmbito do Sistema de Saúde do Brasil para menores de cinco anos de idade’.
Resultados: segundo informação das auditorias, 43,6% dos óbitos eram redutíveis por adequada atenção à mulher na gestação e
segundo os dados do SIM, 41,9% dos óbitos eram redutíveis por adequada atenção ao recém-nascido. Conclusão: a evitabilidade
se altera conforme a origem dos dados, auditorias de óbito ou SIM. A classificação de evitabilidade proposta na Lista de causas
de mortes evitáveis somente pode ser usada quando se dispõe de minuciosa informação das causas que levaram ao óbito.
Palavras-chave: Mortalidade Infantil; Qualidade, Acesso e Avaliação da Assistência à Saúde; Avaliação de Serviços de Saúde.
Abstract
Objective: to evaluate evitability of infant deaths in the municipality of Pelotas, Brazil 2005-2008, and compare results
from the audit of post-investigation deaths using data from Mortality Information System (SIM). Methods: causes of death
were classified according to the International Statistical Classification of Diseases and Related Health Problems, 10th Revision;
evitability was classified according to the ‘List of Avoidable Causes of Death Due to Interventions of the Brazilian Health System
for Children Under Five’. Results: information from audits of deaths showed that 43.6% of those were reducible by providing
proper care for women during pregnancy; and using SIM data, 41.9% of deaths were reducible by providing adequate newborn
care. Conclusion: evitability changes with relation to the source of data, death audits or SIM. The classification of evitability
proposed by the List of Avoidable Causes of Death should only be used when detailed information of cause of death is provided.
Key words: Infant Mortality; Quality, Access and Evaluation of Health Care; Health Services Evaluation.
dos desde o aparecimento do primeiro sinal da doença e tratamento incorreto; alta do recém-nascido com
até a consecução do óbito. Para coleta das informações, menos de 24h de vida; não uso materno de corticóide
foram utilizados os formulários de investigação dos óbi- antenatal em pré-termos menores de 34 semanas; tra-
tos infantil e fetal sugeridos pelo ‘Manual dos comitês balho de parto sem assistência no período expulsivo;
de prevenção do óbito infantil e fetal’, do Ministério da parto realizado por médico residente sem supervisão
Saúde, publicado no ano de 2005.15 direta do preceptor; atendimento do recém-nascido
Concluído o processo de investigação (entrevista na sala de parto por médico residente sem supervisão
no domicílio e investigação de prontuários), as in- direta do preceptor, ou por outro profissional médi-
formações foram analisadas por um grupo técnico, co que não pediatra; recém-nascido hipotérmico e/
composto por três integrantes do COMAI. O grupo ou hipoglicêmico ao ingressar na UTI; e ocorrência
analisou os óbitos, identificou os problemas surgidos de pneumotórax em recém-nascido sob assistência
no processo da atenção e classificou as causas básicas ventilatória mecânica. A única intervenção desneces-
de óbitos infantis segundo a Classificação Estatística sária possível de se avaliar no estudo foi a cesariana
Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à eletiva com erro na idade gestacional e consequente
Saúde – 10a Revisão (CID-10), agrupando-as conforme nascimento de criança pré-termo, situação que foi
a frequência: perinatais (P00 a P96); malformações classificada como problema na qualidade do atendi-
(Q00 a Q99); infecções respiratórias (J10 a J18, J20 mento prestado.
a J22); diarreia (A00 a A09); outras infecções (G00 a Foi considerado atendimento pré-natal inadequado:
G06, A50, B20, M86); outras causas (C74, V87, X91); atendimento realizado por estudantes sem supervi-
e causas mal definidas (R95 a R99). são direta do preceptor; não solicitação de exames
Os problemas identificados nas auditorias de óbi- laboratoriais complementares; gestante com relato
to foram agrupados em três categorias: problemas de não haver sido examinada; diagnósticos tardios;
relacionados ao risco social; problemas relacionados não identificação de risco gestacional e/ou ausência
com o acesso aos serviços de saúde; e problemas na de encaminhamento para a referência de risco; e não
qualidade do atendimento prestado. haver realizado vacinas.
Foram considerados problemas relacionados ao Para a análise da evitabilidade dos óbitos infantis,
risco social: mães sem companheiro; mães com baixa foi utilizada a ‘Lista de causas de mortes evitáveis por
escolaridade (menos que 4 anos de estudo); mães com intervenções no âmbito do Sistema de Saúde do Brasil
idade menor que 20 anos e maior que 35 anos; presen- para menores de cinco anos de idade’, proposta por
ça de moradia precária (locais com déficit de serviços Malta e colaboradores.13 Os óbitos infantis foram
urbanos básicos e/ou loteamentos clandestinos); baixa classificados como: evitáveis (quando reduzíveis por
renda (renda inferior a um salário mínimo); história ações de imunoprevenção; por adequada atenção à
de óbito de outro filho; mães tabagistas; violência fami- mulher na gestação; por adequada atenção à mulher
liar (maus-tratos de algum membro da família contra no parto; por adequada atenção ao recém-nascido;
a mãe registrados no prontuário de Unidade Básica por ações adequadas de diagnóstico e tratamento;
de Saúde ou hospital); gravidez indesejada; óbito de ou por ações adequadas de promoção à saúde); por
outros filhos; ausência de pré-natal; mãe fumante e/ou causas de morte mal definidas; e por demais causas
usuária de drogas; e mãe sem companheiro. não claramente evitáveis.
Os problemas de acesso aos serviços de saúde in- Os óbitos de menores de um ano de mães residen-
cluíram: falta de captação para o pré-natal (ausência tes no município de Pelotas-RS, ocorridos nos anos
de pré-natal, pré-natal de início tardio e/ou pré-natal 2005-2008, foram identificados no banco de dados
incompleto); negação de atendimento (no pré-natal do SIM. Extraiu-se a causa básica de morte codificada
ou à criança, nas Unidades Básicas de Saúde; ou no no Sistema e classificou-se a evitabilidade dos óbitos
momento do parto, nas instituições hospitalares); e conforme a lista proposta por Malta e colaborado-
falta de leito em UTI e/ou maternidade. res.13 Compararam-se os resultados da classificação
Foram consideradas como atendimento inadequado de evitabilidade entre as informações da auditoria de
(problemas na qualidade do atendimento prestado) óbito pós-investigação e as informações obtidas na
algumas das seguintes situações: diagnóstico tardio declaração de óbito original.
Foram realizadas análises descritivas. Para cada Em torno de 70,0% dos óbitos infantis ocorreram
ano do período 2005-2008, foram calculadas as taxas no período neonatal. Destes, aproximadamente 68,0%
de mortalidade infantil e de seus componentes, assim aconteceram antes dos 7 dias de vida (37, 38, 21 e 30
como as taxas de mortalidade infantil por causas espe- óbitos, respectivamente nos anos de 2005, 2006, 2007
cíficas. As frequências de causas de óbito infantil evi- e 2008) e 17,0% ocorreram nas primeiras 24h de vida
táveis, causas de morte mal definidas e demais causas (nove, nove, quatro e dez óbitos, para os respectivos
não claramente evitáveis foram calculadas para cada anos estudados). As causas perinatais foram as mais
ano do período estudado. Verificaram-se tendências frequentes de óbito infantil, em todo o período. As
no período, mediante teste de χ2 de tendência linear. malformações congênitas ficaram em segundo lugar nos
Todas as informações obtidas das auditorias de óbi- anos de 2005 e 2006; em terceiro lugar, no ano de 2007;
to infantil para os anos de 2005 a 2008 foram digitadas e em quarto lugar, no ano de 2008. As causas mal defi-
em um banco de dados, criado pelo programa Epi Info nidas mantiveram-se como a segunda ou terceira causa
versão 6.04. As análises foram realizadas pelo pacote mais frequente, no período. As infecções respiratórias
estatístico Stata (Stata Statistical Software: Release 9.2. foram a quarta causa de morte entre os anos de 2005 e
College Station, TX: Stata Corporation; 2003). 2007, e a terceira causa de morte no ano de 2008. Outras
O protocolo do estudo foi aprovado pelo Comitê de causas e outras infecções variaram de posição, ao longo
Ética Médica em Pesquisa da Universidade Federal de do período. A diarréia ocupou sempre o último lugar
Pelotas (Protocolo N° 063/09). como causa de óbito, em todo o período (Tabela 2).
Aplicando os critérios de evitabilidade propostos
Resultados por Malta e colaboradores13 às informações obtidas
com as auditorias de óbito, identificou-se que, dos
No Município de Pelotas-RS, a taxa de mortalidade 266 óbitos ocorridos no período, 194 entraram na
infantil (TMI) caiu de 19,8 por mil nascidos vivos em classificação de evitáveis (72,9% ) (Tabela 3). A maior
2005 para 12,2 por 1000 nascidos vivos em 2007, contribuição correspondeu aos óbitos infantis preve-
verificando-se um aumento para 16,3 por 1000 nas- níveis por adequada atenção à mulher na gestação
cidos vivos no ano de 2008. Observou-se uma redução (n=110), representando 56,7% do total dos óbitos
em torno de 20,0% da TMI entre os anos de 2005 e evitáveis no período (n=194). As causas reduzíveis por
2007; e um aumento da TMI de 33,0% no ano de 2008, ações adequadas de diagnóstico e tratamento (n=34)
em relação a 2007. O componente pós-neonatal apre- ocuparam a segunda posição, com 17,5% dos óbitos
sentou maior redução que o componente neonatal, no evitáveis no período (n=194). As causas reduzíveis por
período estudado (Tabela 1). ações adequadas de promoção à saúde diminuíram ao
Tabela 1 - Número de nascidos, número de óbitos infantis segundo o momento do óbito e taxas de mortalidade
infantil, município de Pelotas, estado do Rio Grande do Sul. Brasil, 2005 a 2008
Tabela 2 - Distribuição dos óbitos e taxas de mortalidade infantil específicas por causa, município de Pelotas,
estado do Rio Grande do Sul. Brasil, 2005 a 2008
longo do período (χ2 de tendência linear p=0,037). menos frequentes a dificultar o acesso à atenção. Os
Não se observou qualquer óbito infantil prevenível por problemas relacionados com a falta de leito de UTI
ações de imunoprevenção, no período. ou de maternidade aumentaram no período: corres-
Quando aplicados os critérios de evitabilidade ponderam a 3,5% no ano de 2005 e a 38,5% no ano
utilizando-se unicamente as informações do SIM, de 2008 (χ2 de tendência linear p=0,009); e ocor-
observou-se que a percentagem de óbitos evitáveis reram, principalmente, nas gestantes em trabalho de
foi praticamente igual à obtida usando informações parto prematuro. Nestes anos observou-se, também,
das auditorias de óbito pós-investigação (75,1%). A aumento dos problemas relacionados à qualidade do
maior contribuição dos óbitos evitáveis, entretanto, atendimento prestado: de 31,3% para 76,2% (χ2 de
correspondeu aos óbitos infantis preveníveis por tendência linear p<0,001).
adequada atenção ao recém-nascido (41,9%). A A qualidade do atendimento prestado esteve re-
segunda posição foi ocupada pelos óbitos reduzíveis lacionada, principalmente, ao não uso de corticóide
por adequada atenção à mulher na gestação (10,8%). antenatal, a intervenções desnecessárias – como a
Não foram observados óbitos reduzíveis por ações de cesariana eletiva, com erro na idade gestacional e,
imunoprevenção. (Tabela 4) consequentemente, nascimento de criança pré-termo
Entre os problemas identificados nas auditorias de –, e a hipotermia do recém-nascido pré-termo ao
óbito infantil no período, o risco social apresentou ingressar na Unidade de Tratamento Intensivo Neo-
uma frequência de 72,0%; as dificuldades de acesso, natal. As intervenções desnecessárias, como a cesa-
46,0%; e os problemas na qualidade do serviço pres- riana eletiva e ocorrência de nascimento de crianças
tado, 59,0% (Figura 1). A falta de captação para o pré-termo, foram classificadas como um problema
pré-natal (ausência de pré-natal, pré-natal de início relacionado ao parto.
tardio e/ou pré-natal incompleto) foi o problema Em 16,0% das auditorias realizadas no ano de 2005,
mais observado dentro da categoria de dificuldade não foi possível estabelecer a causa básica de óbito.
de acesso. Negação de atendimento e falta de leito Este problema aconteceu com frequência semelhante,
(leito de UTI ou leito em maternidade) foram causas em todo o período estudado.
Tabela 3 - Classificação dos óbitos infantis conforme evitabilidade (Classificação de Malta e colaboradores),
município de Pelotas, estado do Rio Grande do Sul. Brasil, 2005 a 2008
Tabela 4 - Classificação dos óbitos infantis conforme evitabilidade comparando informações das auditorias
de óbito e do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), município de Pelotas, estado do Rio
Grande do Sul. Brasil, 2005 a 2008
Risco social 72
Dificuldade de acesso 46
Negação de atendimento 23
Qualidade do serviço 59
Figura 1 - Problemas identificados nas auditorias de óbitos infantis no município de Pelotas, estado do Rio
Grande do Sul. Brasil, 2005 a 2008
Para o mundo como um todo, a TMI em 2005 foi na mortalidade infantil, como também o aumento
estimada em 72 óbitos por 1000 nascidos vivos, com relativo da mortalidade neonatal precoce observado
uma diferença marcada entre as regiões mais e menos para o conjunto do Brasil,22 verificou-se na cidade
desenvolvidas.16-18 A TMI de Pelotas-RS situou a cidade de Pelotas-RS ao longo do período estudado. O fato
em posição intermediária, no Brasil e no mundo. O de a mortalidade neonatal tornar-se o principal com-
município apresentou taxa inferior ao Rio Grande do ponente da mortalidade infantil aproxima o Brasil e
Sul apenas no ano de 2007: 12,3 versus 12,7 por 1000 a cidade de Pelotas-RS do perfil de mortalidade de
nascidos vivos. No período estudado, embora condi- países desenvolvidos.
cionada a flutuações, foi observada uma diminuição da As causas de mortalidade infantil no Brasil mu-
TMI na cidade, de acordo com dados disponíveis no daram ao longo das últimas décadas. As doenças
nível federal que mostram para Pelotas-RS, no período infecto-contagiosas deram lugar às causas perinatais
entre 1998 e 2008, uma diminuição da TMI de 21,3 como primeira causa de morte em todas as regiões do
para 16,8 por 1000 nascidos vivos.19,20 país.21 A mesma situação evidenciou-se em Pelotas-
No Brasil, até a década de 1990, o componente pós- RS, onde as causas perinatais foram as primeiras
neonatal foi o que mais predominou na mortalidade causas de morte no período estudado, seguidas pelas
infantil. A ampliação do acesso a saneamento básico, malformações congênitas. Os óbitos por causas mal
a melhoria nas condições de vida da população e a definidas avaliam o grau da qualidade da informação
queda da fecundidade são fatores relacionados com a sobre causas de morte e percentuais elevados expres-
diminuição da mortalidade no período pós-neonatal, sam tanto problemas de qualidade no preenchimento
principalmente a decorrente de causas infecciosas.21 da declaração de óbito – DO – quanto problemas de
A partir daquela década, prevaleceu o componente acesso e disponibilidade de serviços de saúde.22,23 É
neonatal, intimamente ligado à qualidade da atenção preocupante a frequência de causas mal definidas na
prestada durante o pré-natal, no parto e ao recém- cidade de Pelotas-RS, com cifras superiores ao dobro
nascido.22 A preponderância do componente neonatal da estimativa para o Brasil: 2,3 versus 1,0 por 1000
nascidos vivos, respectivamente.23 Estudos prévios fazer parte de seu cotidiano. O conhecimento do risco
observaram que a investigação dos casos classificados existente e um atendimento qualificado e resolutivo à
como de causa mal definida permitiu reduzir o número gestante e à criança são ações básicas para a redução
de óbitos por essa causa.24,25 A necropsia permite, de óbitos evitáveis.15,26
também, um diagnóstico mais acurado e constitui Neste estudo, foram detectados problemas de aces-
um instrumento auxiliar à avaliação da qualidade so – em tempo oportuno – a serviços de saúde qualifi-
da assistência médica.26 Não obstante, o número de cados, em dois terços dos óbitos infantis investigados.
necropsias vem diminuindo em diversos países,24,25 O acesso aos serviços de saúde ainda é um problema
e o número de necropsias realizadas em Pelotas foi no país, sendo frequente a peregrinação das gestantes
escasso no período. Os autores do presente estudo até sua internação definitiva, reduzindo as chances de
acreditam que um serviço de autópsia de qualidade intervenções clínicas eficazes.31 Vale ressaltar que, em
poderia esclarecer os óbitos por causas mal definidas, situações de urgência obstétrica, a proximidade do
como foi verificado em estudo realizado na cidade de serviço de saúde e o acesso facilitado determinam o
São Paulo-SP.27 desfecho materno-fetal. O acesso a serviços de saúde
A classificação de evitabilidade proposta por Malta e qualificados reduz, de forma relevante, a mortalidade
colaboradores13 foi uma ferramenta de fácil aplicação infantil e deve ser considerado na análise de evitabili-
durante o estudo. As informações procedentes das audi- dade desses óbitos.32
torias de óbito, especialmente as informações coletadas Estudos demonstraram que o uso de corticóide
dos prontuários hospitalares e das entrevistas realizadas antenatal é um fator de proteção contra a mortalidade
com os médicos e as famílias, permitiram classificar neonatal, reduz significativamente a incidência de
a evitabilidade dos óbitos infantis. Durante o estudo, síndrome de dificuldade respiratória, a ocorrência
entretanto, ficou evidente que essa ferramenta somente de hemorragia intracraniana e a mortalidade em
pode ser usada no caso de se dispor de minuciosa in- recém-nascidos pré-termos.33,34 Dados não publicados
formação das causas do óbito. Classificar a evitabilidade da coorte de nascimentos de 2004, de Pelotas-RS,
dos óbitos infantis baseando-se unicamente nos dados evidenciaram que quase 30,0% dos recém-nascidos
das DO pode levar a conclusões erradas. Por exemplo: pré-termo não receberam corticóide antenatal. Um
se na DO consta como causa básica ‘dificuldade res- estudo inglês sugere que o uso de corticóide antenatal
piratória’, pela classificação de Malta e cols. ela será profilático em cesarianas eletivas reduz a incidência
categorizada como ‘reduzível por ações adequadas ao de problemas respiratórios no recém-nascido, mesmo
recém-nascido’;13 porém, se a mesma DO corresponder para idades gestacionais de 37 e 38 semanas. O mesmo
a um recém-nascido de 900 gramas, o óbito será classi- estudo salienta, no entanto, que o ideal é esperar até
ficado como ‘reduzível por adequada atenção à mulher 38 semanas para realizar cesarianas eletivas.
na gestação’ pela auditoria de óbito pós-investigação. O tipo de parto também tem papel fundamental na
Esta divergência pode ter graves consequências no redução da mortalidade neonatal. O parto cesariano
planejamento das ações para diminuir a mortalidade está associado à prematuridade, principalmente em
infantil, levando os gestores a fazer investimentos de cesariana eletivas, por erro na idade gestacional esti-
alto custo em tecnologia quando o problema principal mada em exames de ultrassom. Estes exames possuem
se encontra na atenção ao pré-natal. uma margem de erro que pode superestimar a idade
A mortalidade infantil ocorre por influência de uma gestacional e levar à interrupção da gestação de um
combinação de fatores biológicos, sociais, culturais, bebê considerado a termo, e o nascimento desse bebê
e por falhas do sistema de saúde.28 A identificação e prematuro.35,36
o monitoramento dos determinantes de saúde e das A hipotermia é uma situação frequente nos recém-
estratégias de atenção à saúde foram e continuam nascidos, principalmente naqueles com baixo peso ao
sendo de grande valia para a redução da mortalidade nascer e pré-termos. Estes bebês apresentam maior
infantil. Sobretudo, deve-se destacar a qualidade da risco de hipotermia devido à inadequada termorre-
assistência como importante fator na redução desse gulação. A hipotermia é considerada um importante
indicador.12,29,30 O sentido de responsabilidade e o e independente fator de risco para a mortalidade
compromisso público dos serviços de saúde devem neonatal.37
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Resumo
Objetivo: descrever as internações por condições sensíveis à atenção primária (CSAP) no estado do Espírito Santo, Brasil, no
período 2005-2009. Métodos: estudo ecológico descritivo das internações do Sistema Único de Saúde, classificadas conforme a lista
brasileira de internações por CSAP, estudadas por municípios de residência, distribuídas por microrregião, sexo, faixa etária e grupo
de causas. Resultados: registro de 823.343 internações por CSAP no período, representando 28,9% do total de internações por
CSAP em 2005 e 23,2% em 2009; coeficiente de internações por CSAP reduzido de 14,1 para 11,4/1000 habitantes, diferentemente
segundo microrregiões; internações por CSAP mais frequentes em menores de cinco anos e idosos, 29,3 e 39,1/1000 habitantes
respectivamente; gastroenterites, pneumonias, insuficiência cardíaca e infecção no rim e trato urinário somaram 50,3% das causas.
Conclusões: há indícios de melhoria no quadro das internações por CSAP apesar dos ganhos irregulares.
Palavras-chave: Atenção Primária à Saúde; Indicadores de Qualidade em Assistência à Saúde; Hospitalização; Estudos Ecológicos.
Abstract
Objective: to describe hospitalization for ambulatory care sensitive conditions (ACSC) in the state of Espírito Santo,
Brazil, in the period 2005-2009. Methods: an ecological descriptive study of hospitalizations in the National Health System,
based on the Brazilian list of ACSC, by Municipalities of residence, distributed by Micro-region, gender, age group and causes.
Results: were recorded 823,343 hospitalizations for ACSC in the period, representing 28,9% of these admissions in 2005 and
23,2% in 2009; ACSC rates per 1000 population decreased from 14,1 to 11,4 per 1000 inhabitants, differently among micro-
regions; children under five years and elderly were more likely to hospitalization, 29,3 and 39,1/1000 inhabitants respectively;
gastroenteritis, bacterial pneumonia, heart failure and infection in urinary tract account for 50,3% of cases. Conclusion:
there are indications of improvement on hospitalizations for ACSC in the State despite irregular gains.
Key words: Primary Health Care; Quality Indicators, Health Care; Hospitalization; Ecological Studies.
(AIH-SUS).16 Os procedimentos de estatística descri- 28,9% para 23,3%, entre o primeiro e o último ano do
tiva foram realizados por meio do software Statistical período (Tabela 1).
Package for the Social Sciences (SPSS) versão 11.5. O coeficiente de internação por CSAP por 1000
Foi definido como causa da internação o diagnósti- habitantes, no Estado, mostrou declínio de 14,1 para
co principal que seencontrava discriminado em código 11,4 entre 2005 e 2009, notando-se quedas sucessivas
da Classificação Estatística Internacional de Doenças ao longo dos anos, com aumento ao final do período.
e Problemas Relacionados à Saúde – Décima Revisão A ocorrência anual e segundo algumas características
(CID-10).16 Excluídos os partos (CID-10: O80 a O84), sociodemográficas está apresentada na Tabela 2.
as demais foram classificadas como internações por A ocorrência de internações por CSAP foi semelhante
CSAP, de acordo com a Portaria n° 221/2008 do Mi- entre homens e mulheres, embora um pouco superior
nistério da Saúde,10 e não CSAP. entre as últimas. Quanto à distribuição por idade, as in-
Considerou-se o ano de competência da AIH-SUS para ternações foram mais frequentes entre idosos, seguidos
definir a temporalidade do evento. Dados referentes a pelas faixas de zero a quatro anos e de 50 a 59 anos.
sexo foram assumidos sem modificações. As idades Todas as microrregiões apresentaram queda das
foram categorizadas em faixas etárias, analisando-se internações por CSAP no período estudado. As maio-
os ciclos de vida (0 a 4, 5 a 9, 10 a 14 e 15 a 19 anos res reduções foram observadas nas microrregiões de
para crianças e adolescentes, 20 a 49 e 50 a 59 para os Serra/Santa Teresa (10,6%), Vila Velha/Venda Nova
adultos e 60 e mais anos de idade para os idosos). Os (7,4%), Linhares (6,7%) e Vitória (5,2%).
municípios de residência foram classificados segundo as Entre as internações por CSAP no período, os dez
microrregiões de saúde estabelecidas no Plano Diretor grupos de causas mais frequentes ocasionaram 85,0%
de Regionalização (PDR) do Espírito Santo.14 das ocorrências (50,3% nos quatro primeiros). Como
Foi calculada a proporção das internações por CSAP no apresentado na Tabela 3, foram registrados, em ordem
total de internações (excluídos os partos) e o indicador decrescente, gastroenterites infecciosas (17,8%), pneu-
representado pela relação entre o número de interna- monias bacterianas (11,7%), insuficiência cardíaca
ções de acordo com as variáveis de interesse (ano, sexo, (10,9%), infecção no rim e trato urinário (10,0%), doen-
faixa etária e microrregião de residência) e a população ças cerebrovasculares (6,9%), asma (6,3%), hipertensão
correspondente a cada categoria das citadas variáveis. (6,1%), doenças pulmonares (5,6%), angina (5,2%)
O coeficiente de internação por CSAP, calculado e diabetes mellitus (4,5%). Os outros nove grupos de
como medida de ocorrência por 1000 habitantes, to- diagnóstico representaram menos de 4,0% cada um.
mou como denominador as estimativas populacionais Em relação à alteração da frequência proporcional
também acessíveis na página do Datasus. Calculou-se dos grupos de diagnóstico CSAP entre os anos estuda-
a variação percentual anual do indicador e sua média dos (Tabela 4), notou-se aumento da participação das
no período. Foi verificada, ainda, a proporção de cada seguintes causas, no Estado: infecções de ouvido, nariz
grupo de causa no total das internações por CSAP. e garganta; doenças relacionadas ao pré-natal e parto;
O projeto dessa pesquisa foi submetido ao Comitê de doenças preveníveis por imunização e condições sensí-
Ética em Pesquisa (CEP) do Hospital Infantil Nossa Se- veis; infecção no rim e trato urinário; diabetes mellitus;
nhora da Glória, sob protocolo no 57/2010. A instituição, angina; deficiências nutricionais; infecção da pele e tecido
responsável pela avaliação de todos os projetos de pes- subcutâneo; pneumonias bacterianas; e insuficiência
quisas desenvolvidos na rede estadual de saúde, declarou cardíaca. Por sua vez, houve redução da participação das
não haver necessidade de aprovação para o estudo, uma seguintes causas: anemia; gastroenterites infecciosas e
vez que empregou dados secundários de domínio público. complicações; doenças pulmonares; doença inflamatória
dos órgãos pélvicos femininos; epilepsias; hipertensão; do-
Resultados enças cerebrovasculares; asma; e úlcera gastrointestinal.
Em todas as microrregiões, com destaque para São
No período 2005-2009, o SIH/SUS registrou 823.343 Mateus, foi observado aumento da participação dos
hospitalizações de residentes no Espírito Santo. Desse seguintes grupos: infecções de ouvido, nariz e gargan-
total, as internações por CSAP representaram 210.894 ta; doenças preveníveis por imunização e condições
e sua participação veio caindo progressivamente, de sensíveis; e infecção no rim e trato urinário.
Tabela 1 - Número e proporção das internações por condições sensíveis à atenção primária (CSAP), segundo
microrregião de saúdea e estado do Espírito Santo. Brasil, 2005 a 2009b
Tabela 2 - Coeficiente de internação por condições sensíveis à atenção primária (CSAP) por 1000 habitantes
e variação média percentual no período, segundo sexo, faixa etária, microrregião de residência e
estado do Espírito Santo, Brasil, 2005 a 2009a
Variação média
Características 2005 2006 2007 2008 2009 2005-2009 2005 a 2009
Sexo
Masculino 13,9 12,2 12,1 10,7 11,1 12,0 -5,3
Feminino 14,3 12,3 12,2 11,3 11,7 12,4 -4,6
Faixa etária (em anos)
0a4 35,7 29,3 30,5 30,1 29,3 31,0 -4,5
5a9 6,7 5,8 6,1 6,6 6,7 6,4 0,6
10 a 14 3,1 2,7 3,3 3,4 3,9 3,2 6,3
15 a 19 3,9 3,1 3,7 4,0 4,5 3,8 5,2
20 a 49 6,9 6,0 5,7 5,3 5,5 5,9 -5,5
50 a 59 21,8 19,3 15,4 13,0 13,6 16,1 -10,6
60 e mais 59,6 53,8 46,3 37,4 39,1 46,5 -9,6
Microrregião
Serra / Santa Teresa 12,1 9,5 9,3 7,9 7,6 9,3 -10,6
Vila Velha / Venda 13,0 10,6 10,4 8,9 9,4 10,4 -7,4
Vitória 10,0 7,7 8,1 7,4 7,8 8,2 -5,2
Colatina 15,2 14,6 15,2 12,6 14,0 14,3 -1,4
Linhares 14,6 11,8 11,0 10,8 10,9 11,8 -6,7
São Mateus 17,2 16,1 16,0 14,1 15,3 15,7 -2,7
Cachoeiro do Itapemirim 16,0 16,0 15,5 15,0 14,5 15,4 -2,4
Guaçuí 27,1 24,5 23,6 24,3 26,6 25,2 -0,2
Espírito Santo 14,1 12,2 12,1 11,0 11,4 12,2 -4,9
a) Calculado com base nos dados de internação registrados no Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS) e estimativas populacionais da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), disponíveis no Departamento de Informática do SUS (Datasus).
Também foi verificado aumento da proporção de A participação das internações por hipertensão em
internações relacionadas ao pré-natal e parto, diabetes relação ao total de internações por CSAP apresentou
mellitus e angina, em quase todas as microrregiões redução em metade das microrregiões, sendo que a
– com exceção para cada grupo de CSAP –, respecti- maior queda foi em Vitória e o maior crescimento
vamente em Linhares, Vitória e Guaçuí. em São Mateus. Para doenças cerebrovasculares, a
Tabela 3 - Número e proporção de internações por condições sensíveis à atenção primária (CSAP), segundo
grupo de causas no estado do Espírito Santo. Brasil, 2005 a 2009a
Gastroenterites infecciosas e complicações 9.038 18,8 7.814 18,4 6.818 16,0 6.865 18,1 7.041 17,7 37.576 17,8
Pneumonias bacterianas 5.377 11,2 4.808 11,3 5.363 12,6 4.519 11,9 4.591 11,5 24.658 11,7
Insuficiência cardíaca 5.261 11,0 4.606 10,9 4.423 10,4 4.199 11,1 4.437 11,2 22.926 10,9
Infecção no rim e trato urinário 4.263 8,9 3.559 8,4 3.678 8,6 4.664 12,3 4.841 12,2 21.005 10,0
Doenças cerebrovasculares 3.456 7,2 3.238 7,6 3.538 8,3 2.052 5,4 2.214 5,6 14.498 6,9
Asma 3.436 7,2 2.665 6,3 2.858 6,7 2.305 6,1 1.988 5,0 13.252 6,3
Hipertensão 3.194 6,7 2.477 5,8 2.651 6,2 2.326 6,1 2.289 5,8 12.937 6,1
Doencas pulmonares 2.688 5,6 2.535 6,0 2.578 6,0 2.037 5,4 2.042 5,1 11.880 5,6
Angina 2.105 4,4 2.185 5,2 2.215 5,2 2.037 5,4 2.385 6,0 10.927 5,2
Diabetes mellitus 1.920 4,0 1.785 4,2 1.823 4,3 1.801 4,7 2.219 5,6 9.548 4,5
Infecção da pele e tecido subcutâneo 1.462 3,0 1.578 3,7 1.521 3,6 1.036 2,7 1310 3,3 6.907 3,3
Úlcera gastrointestinal 1.899 4,0 1.606 3,8 1.566 3,7 653 1,7 583 1,5 6.307 3,0
Deficiências nutricionais 1.186 2,5 1.196 2,8 1.197 2,8 1187 3,1 1.200 3,0 5.966 2,8
Doença inflamatória órgãos pélvicos femininos 894 1,9 848 2,0 770 1,8 692 1,8 684 1,7 3.888 1,8
Epilepsias 861 1,8 627 1,5 748 1,8 510 1,3 609 1,5 3.355 1,6
Doenças relacionadas ao pré-natal e parto 352 0,7 283 0,7 311 0,7 362 1,0 526 1,3 1.834 0,9
Doenças prev. por imunização e condições sensíveis 241 0,5 208 0,5 262 0,6 261 0,7 310 0,8 1.282 0,6
Anemia 288 0,6 280 0,7 232 0,5 186 0,5 223 0,6 1.209 0,6
Infecções de ouvido, nariz e garganta 113 0,2 109 0,3 139 0,3 285 0,8 293 0,7 939 0,5
TOTAL 48.034 100,0 42.407 100,0 42.691 100,0 37.977 100,0 39.785 100,0 210.894 100,0
a) Calculado com base nos dados de internação registrados no Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS), disponíveis no Departamento de Informática do SUS (Datasus).
Tabela 4 - Variação percentual média da proporção de internações por condições sensíveis à atenção primária
(CSAP) segundo grupo de causas, por microrregião de residência no estado do Espírito Santo.
Brasil, 2005 a 2009a
Serra/ Santa VilaVelha/ Vitória Colatina Linhares São Cachoeiro do Guaçuí Total (média
Grupo de causas CSAP Teresa Venda Nova Mateus Itapemirim no Estado)
Infecções de ouvido, nariz e garganta 23,4 34,4 122,9 60,1 103,7 223,0 18,7 54,8 41,4
Doenças relacionadas ao pré-natal e parto 14,1 36,6 30,8 75,8 -10,0 120,1 6,6 74,9 17,5
Doenças prev. por imunização e condições sensíveis 24,3 14,3 15,0 22,3 12,0 68,0 15,7 13,3 11,9
Infecção no rim e trato urinário 6,8 11,0 13,7 13,4 1,4 11,8 13,7 12,8 9,8
Diabetes mellitus 7,2 6,6 -7,8 13,1 7,4 17,5 13,4 15,6 8,8
Angina 9,0 10,0 13,4 14,9 25,6 22,2 4,2 -5,2 8,1
Deficiências nutricionais 7,1 -1,0 -14,6 -0,3 10,0 24,5 6,1 7,9 5,6
Infecção da pele e tecido subcutâneo -6,2 10,7 7,0 -0,4 56,0 26,9 -12,4 7,0 3,8
Pneumonias bacterianas 11,0 1,6 15,0 5,5 -13,5 -21,9 -3,0 6,0 0,9
Insuficiência cardíaca 0,5 3,1 -0,5 -0,1 2,9 -2,1 5,0 -1,8 0,6
Anemia 6,4 10,7 -15,3 56,2 -37,6 32,6 -1,3 -12,8 -0,8
Gastroenterites infecciosas e complicações 0,3 -2,5 -0,9 1,5 -10,5 6,7 -4,9 -1,9 -1,1
Doencas pulmonares -9,6 -3,7 -1,5 -5,5 6,2 -5,2 14,1 -1,1 -1,7
Doença inflamatória órgãos pélvicos femininos -0,8 19,0 -5,6 -16,8 13,1 1,7 0,1 -3,2 -1,9
Epilepsias -2,8 4,6 -0,2 0,8 -9,0 -10,5 -0,1 10,9 -2,1
Hipertensão 6,0 -8,8 -21,1 3,2 -12,2 15,4 -9,0 13,8 -3,4
Doenças cerebrovasculares 7,4 -8,4 -13,6 -11,4 6,0 -6,0 4,8 -0,4 -4,2
Asma -21,8 -14,9 -10,6 -5,4 -13,9 3,3 -0,9 3,9 -8,1
Úlcera gastrointestinal -17,6 -11,6 -28,0 -25,9 -28,4 -1,1 -31,5 0,8 -18,8
a) Calculado com base nos dados de internação registrados no Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS), disponíveis no Departamento de Informática do SUS (Datasus).
participação se reduziu em cinco microrregiões, com valores de 28,5% de internações por CSAP sobre o total
maior queda em Vitória, seguida por Colatina. de internações e 149,6 por 10 mil habitantes, para o
Para asma, houve redução da participação percen- Brasil, no ano de 2006. Outro estudo, que considerou a
tual em seis microrregiões, mais ressaltada em Serra/ população do Estado de São Paulo no período de 2000
Santa Teresa. Em todas as microrregiões, verificou-se a 2007, encontrou queda de 12,0 para 10,8 por 1000
redução da participação das internações por úlcera habitantes por ano.5 No Espírito Santo, observaram-se va-
gastrointestinal em relação ao total de internações por lores menores que no Brasil e maiores que em São Paulo.
CSAP, exceto em Guaçuí. Todas as microrregiões de saúde do Espírito Santo
registraram tendência de redução da ocorrência das
Discussão internações por CSAP; o tamanho dessa redução,
porém, variou. Isso não pode ser explicado apenas
Essa pesquisa permitiu conhecer o cenário existente pela expansão da APS, uma vez que as microrregiões
no estado do Espírito Santo em relação às interna- com maior coeficiente de internação, como Guaçuí e
ções por CSAP. Notou-se sua diminuição no período São Mateus, apresentam altas coberturas desse nível
2005-2009 e foram identificadas as faixas etárias e as de atenção (96,5 e 81,3%, respectivamente), maiores
microrregiões mais afetadas, bem como os principais inclusive que a média do estado.
grupos de CSAP envolvidos. Baixa escolaridade, maior taxa de desemprego e
Registra-se que a análise dos resultados obtidos sofre menor renda da população,20,21 bem como o menor con-
limitações decorrentes da fonte de dados utilizada, o SIH/ tingente populacional do município,22 têm sido descritos
SUS, que toma como unidade de observação a internação, como outros fatores associados a uma maior proporção
podendo a mesma pessoa ser internada mais de uma vez. de internações por CSAP. A revisão do PDR permitiu
Além disso, esse sistema de informações em saúde tem verificar que os municípios das microrregiões de Guaçuí
abrangência restrita às ocorrências no SUS, excluindo e São Mateus estão entre os que têm os piores índices
a parcela da população coberta por planos de saúde.16 de desenvolvimento humano (IDH), as maiores taxas
Estudos inseridos em recente revisão de literatura de analfabetismo e de mortalidade infantil do estado.14
sobre qualidade dos dados e métodos aplicados na Ainda segundo o PDR, essas microrregiões estão
avaliação dos sistemas de informações em saúde docu- entre as que mais ofertam leitos/SUS de internação
mentam a ocorrência de problemas de consistência nos por 1000 habitantes, cuja distribuição no estado é:
bancos de dados secundários do SIH/SUS.17 Acredita-se, Cachoeiro de Itapemirim (3,1); Guaçuí (2,3); Vitória
porém, que a continuidade do viés ao longo do tempo re- (2,0); São Mateus (1,8); Colatina (1,6); Serra/Santa
duza o efeito desses erros na estimativa de tendências.18 Teresa (1,1); Vila Velha/Venda Nova (1,1); e Linhares
Ao se estudar as internações por CSAP, procura-se (1,0). São dados que podem indicar ocorrência da
medir indiretamente o acesso oportuno, o funcio- indução da demanda pela oferta, conforme postulado
namento e a capacidade de resolução da Atenção por Dias-da-Costa e colaboradores.22
Básica.1,9,19 A literatura nacional tem enfatizado a Em relação às internações por CSAP por grupos de
existência de estreita relação entre cobertura da APS causas, a maioria decorreu de gastrenterites, pneumo-
e a magnitude do indicador,5,7 de modo que a redução nias bacterianas, insuficiência cardíaca e infecção no
da ocorrência de internações por CSAP observada no rim e trato urinário. Destes, apenas o primeiro grupo
Espírito Santo pode ter sido influenciada pela grande apresentou variação negativa da proporção ao longo
expansão da APS ocorrida no estado. dos anos, na maioria das microrregiões, enquanto os
Porém, a análise da ampliação contempla apenas demais sofreram crescimento percentual, com distri-
a cobertura populacional da ESF e não considera a buição discrepante entre as regiões.
adequação da composição das equipes, a qualificação Surpreende o aumento verificado, em todas as
profissional, os vínculos trabalhistas, tampouco outros microrregiões, da participação das internações por
aspectos estruturais. doenças preveníveis por imunização e condições
Estudo realizado por Alfradique e colaboradores,2 sensíveis em relação ao total das internações por CSAP
com base na lista de CSAP definida pelo Ministério da (variação de 11,9%), uma vez que essas doenças não
Saúde, também utilizada na presente pesquisa, encontrou deveriam ocorrer na presença de uma APS de quali-
dade.2,9 Esse comportamento também foi verificado as doenças que acometem cada grupo e na maior
quanto às doenças relacionadas ao pré-natal e parto utilização dos serviços da APS pelas mulheres.4,23,24 Na
(17,5%) e ao diabetes mellitus (9,8%). presente pesquisa, porém, não se fez comparações
Portanto, neste estudo, destaca-se a alta prevalência entre os sexos por faixa etária.
e o crescimento, em relação ao total de internações por Quanto aos grupos etários, o padrão de distribuição
CSAP, da participação percentual de grupos de doenças encontrado coincide com o descrições em outros
cujo diagnóstico precoce e tratamento ambulatorial estudos,6,18,20 sendo as crianças menores de quatro
são efetivos para evitar hospitalização,1,2,9 ao lado de anos e os idosos os mais afetados. Neste último grupo
outros grupos que constituem alvo de programas da etário, o coeficiente de internação por CSAP chegou a
Atenção Básica há muitos anos. Ao mesmo tempo, o ser até dez vezes maior que em adultos.
ganho obtido sobre as condições crônicas foi irregular: Ao refletir sobre o envelhecimento populacional ora
houve redução das internações por hipertensão, asma em curso, é provável que nos próximos anos ocorram
e úlcera gástrica, e aumento daquelas por diabete. cada vez mais hospitalizações por causas sensíveis à
Nesses grupos, os efeitos esperados da APS seriam a APS caso não sejam efetivadas intervenções em nível
redução das agudizações e das reinternações.2,9 de prevenção primária e secundária. Alguns autores
Essas observações, acrescidas à irregularidade têm se aprofundado no estudo da morbidade existente
da distribuição geográfica dos grupos de CSAP nas entre idosos, na busca por medidas mais eficazes para
microrregiões administrativas de saúde, sugerem falta reduzir o acometimento desse grupo.23,25
de padronização das ações da APS, o que poderia ser Embora futuros estudos, com desenhos mais com-
minimizado, por exemplo, com a implantação efetiva plexos, sejam necessários para avaliar as relações
de protocolos clínicos e planejamento sistêmico da de causalidade aqui levantadas, a presente pesquisa
assistência no Estado. aponta para uma melhoria no quadro das internações
Deve ser ponderado que, para alguns autores, os por CSAP no Estado, apesar dos ganhos irregulares,
aumentos observados poderiam ser efeito da amplia- e indicam que as políticas de saúde no Espírito Santo
ção da oferta de serviços de saúde, dando vazão à devem se voltar, principalmente, para o fortalecimento
demanda até então reprimida.2,5,22 qualitativo das ações da atenção primária à saúde.
Outras informações contidas nos resultados desta
pesquisa possibilitaram apontar os grupos populacio- Contribuição dos autores
nais para os quais deve ser implementado o acesso e
potencializadas as ações da APS. Pazó RG e Frauches DO colaboraram na concepção
Considerando sexo, há estudos que indicam maior da pesquisa, coleta e análise de dados, elaboração,
número de internações de mulheres por CSAP, quando redação e revisão final do artigo.
considerada a faixa etária de 20 a 59 anos, e predomí- Galvêas DP, Stefenoni AS, Cavalcante ELB e Pereira-
nio de homens internados por CSAP entre os idosos. Silva FH contribuíram na coleta e análise de dados e
As justificativas para isso estariam nas diferenças entre na elaboração do artigo.
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métodos aplicados na avaliação dos sistemas de
Lúcia Abelha
Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro-RJ, Brasil
Resumo
Objetivo: caracterizar as vítimas de acidentes de motocicletas em três capitais brasileiras, Rio Branco-AC, Vitória-ES e Palmas-
TO. Métodos: estudo descritivo exploratório com dados do Inquérito Nacional sobre Acidentes e Violências (Projeto VIVA 2007).
Resultados: os acidentes envolvendo motocicletas foram causa de 14,8% dos atendimentos de vítimas de acidentes e violências nos
serviços de urgência e emergência participantes. Dentre as vítimas de acidentes de transporte, a proporção envolvendo motocicletas
foi 52,0% em Rio Branco, 39,9% em Vitória e 27,2% em Palmas. O perfil sociodemográfico predominante das vítimas de acidentes
com motocicletas era de adolescentes e adultos jovens, do sexo masculino e com média escolaridade. Os condutores foram as
vítimas mais frequentes (75,0%). Em cerca de 20,0% das ocorrências, suspeitou-sede uso de álcool. Conclusão: o cenário indica
a necessidade de se manter o contínuo e efetivo monitoramento desses eventos e garantir medidas preventivas seguras.
Palavras-chave: Acidente de Transporte Terrestre; Trânsito; Motocicleta; Vigilância de Lesões e Agravos Não Transmissíveis;
Serviço de Emergência.
Abstract
Objective: to characterize victims of motorcycle accidents in three Brazilian capitals, Rio Branco-AC, Vitória-ES and
Palmas-TO. Methods: a descriptive study based on data of the National Inquiry of Accident Injuries and Violence (VIVA Project
2007), performed by the Brazilian Ministry of Health. Results: in 3,324 victims of accidents of all causes which occurred in
September 2007, 46.0% were due to traffic accidents; the distribution of accidents involving motocycles was 52.0% in Rio
Branco-AC, 39.9% in Vitória-ES, and 27.2% in Palmas-TO; social-demographic pattern of adolescent and young adult males
with average schooling and living in urban areas (in Vitória-ES, victims were non-residents) has prevailed; drivers were
preferential victims (75.0%), and alcohol consumption was suspected in 20.0% of events; the most frequent injuries involved
legs – cut/perforation/laceration lesions (33.9%) –, and 20.7% exhibited broken bones. Conclusion: the setting points to
needs of effective continuous monitoring and guarantee of safe preventive measures.
Key words: Vehicle Accident; Traffic; Motorcycle; Surveillance of Trauma and Non-Transmissible Diseases; Emergency Service.
Municipais de Saúde; e os dados de Palmas-TO, seguida por Vitória (n=346) e Palmas-TO (n=244). O
cedidos pela Secretaria de Vigilância em Saúde do número de acidentes de transporte só foi superado por
Ministério da Saúde, em Brasília-DF. outros tipos de acidentes em Rio Branco-AC (n=409),
O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de e por queda (n=590) e outros acidentes (n=464) em
Ética em Pesquisa do Instituto de Estudos em Saúde Co- Vitória-ES. Destaca-se também, como informação de
letiva, Universidade Federal do Rio de Janeiro (Parecer interesse, que em Vitória-ES a maioria das vítimas não
nº 16/2011), conforme recomendação da Resolução era residente, diferentemente do observado nas outras
no 196/1996 do Conselho Nacional de Saúde, sendo duas cidades. A zona de ocorrência do acidente foi,
aprovado em maio de 2008. em cerca de 80,0% dos casos, urbana.
A motocicleta foi o principal tipo de transporte
Resultados envolvido em acidentes de trânsito nos três municí-
pios, contabilizando um total de 494 (14,8%) casos
Em setembro de 2007, um total de 3.324 casos de notificados, representando 52,0% das ocorrências
acidentes e violências foi notificado pelos hospitais de em Rio Branco-AC, 39,9% em Vitória-ES e 27,2% em
urgência e emergência dos municípios de Vitória-ES Palmas-TO. A bicicleta foi o segundo tipo de transporte
(N: 1.530), Rio Branco-AC (N: 1.264) e Palmas-TO mais envolvido nesses acidentes (Tabela 2).
(N: 530) (Tabela 1). Os acidentes de transporte foram Do total de vítimas dos acidentes com motocicleta,
em maior número na capital Rio Branco (n=405), 79,3% eram do sexo masculino. Vitória-ES mostrou a
Tabela 1 - Distribuição da população atendida segundo tipo de acidente/violência nos serviços de urgência e
emergência selecionados nos municípios de Vitória-ES, Rio Branco-AC e Palmas-TO.
Brasil, setembro de 2007
Tabela 2 - Distribuição das vítimas de acidentes de trânsito segundo tipo de transporte, atendidas nos serviços
de urgência e emergência selecionados nos municípios de Vitória-ES, Rio Branco-AC e Palmas-TO.
Brasil, setembro de 2007
maior razão entre homens e mulheres (7:1), seguida e emergência selecionadas nas capitais estudadas,
de Rio Branco-AC (5:1). 73,1% das vítimas receberam alta e 15,2% neces-
A faixa etária de 20 a 24 anos foi a mais atingida, sitaram internação. Apenas Vitória-ES apresentou
com 28,4% dos casos, seguida por indivíduos de 30 a registro de óbito (1,4%), levando a crer que as
39 anos de idade, estes responsáveis por 25,0% dos lesões foram de gravidade leve a moderada, embora
casos. Vitória-ES e Palmas-TO repetiram o mesmo a informação ignorada sobre a evolução hospitalar
padrão para as idades; apenas em Rio Branco-AC, o da vítima tenha sido registrada em 13,8% dos casos,
grupo mais atingido foi o de 30 a 39 anos (27,0%), nesse Município.
embora próximo do grupo de 20 a 24 anos (24,5%).
Destaca-se que nas categorias sexo e faixa etária, não Discussão
houve perda de informação (Tabela 3).
Com relação à escolaridade, 49,0% das vítimas Incialmente, os autores consideram oportuno men-
tinha 9-11 anos de estudo (49,0%): em Palmas, eram cionar as possíveis limitações do presente estudo. In-
55,5%; em Rio Branco, 49,5%; e em Vitória-ES, 40,6% quéritos sentinelas, por serem localizados em unidades
das vítimas referiram a mesma escolaridade, 9-11 de saúde de urgência e emergência, não contabilizam
anos de estudo. os casos leves e/ou que resultem em óbitos imediatos,
Em 76,0% dos casos, o condutor foi a vítima mais estes encaminhados ao Instituto Médico Legal. Neste
frequentemente envolvida nesse tipo de acidente, nos estudo, ‘outros tipos de acidentes’ e ‘outros acidentes’
três municípios (Tabela 4). Registrou-se suspeita de são aqueles que não puderam ser classificados, fato
uso de álcool em 18,1% dos acidentados, em sua que prejudica a avaliação da dimensão real dos aci-
maioria homens (89,9%): uma razão de 8,9 homens dentes de transporte.
para cada mulher. Em Vitória-ES, observou-se 21,0% Modificações nos espaços urbanos vêm sendo
de casos suspeitos. realizadas para facilitar o fluxo e circulação de veí-
Quanto à natureza da lesão, as mais frequentes fo- culos, onde se observa uma tendência crescente da
ram corte/perfuração/laceração em 33,9% dos casos, e frota e o privilégio que o modelo de crescimento e
fratura em 20,7%. Rio Branco-AC foi o único município planejamento urbano adotado concede ao automóvel.11
com um número significativo de contundidos: 21,2% As transformações socioeconômicas e culturais não
dos acidentados. foram acompanhadas por medidas de prevenção à
Como mais um resultado do Inquérito VIVA 2007, morbimortalidade provocada por acidentes de trânsito
após o atendimento inicial nas unidades de urgência e outras violências.
Tabela 3 - Distribuição das variáveis sociodemográficas vítimas de acidentes de motocicletas atendidas nos
serviços de urgência e emergência selecionados nos municípios de Vitória-ES, Rio Branco-AC e
Palmas-TO. Brasil, setembro de 2007
Os dados gerais do estudo nacional já haviam vado foi o de jovens adultos com escolaridade entre 9
apontado os motociclistas como importante grupo e 11 anos de estudo.
de risco, entre as vítimas de acidente de transporte.3 A baixa frequência de internação e a elevada frequ-
Foram verificados e especificados diferentes aspectos ência de alta com resolubilidade sugerem lesões leves
sobre as vítimas dessas ocorrências nas capitais es- mas necessitadas de atenção médica, implicando cus-
colhidas para este estudo. A ocorrência de acidentes tos e sobrecarga para os serviços de saúde. Para efeito
de trânsito, especialmente aqueles envolvendo mo- de comparação, dados de outras capitais brasileiras
tocicletas, é elevada nos municípios de Vitória-ES, são escassos e insuficientes. No estudo de Koizumi13
Rio Branco-AC e Palmas-TO, é senso comum que se para a capital São Paulo-SP, são mencionadas frequ-
repitam e para tanto contribuem fatores determinantes, ências elevadas de alta hospitalar (95,0%) e 4,9% de
em combinação: aumento da frota de veículos; alta óbitos indicando, igualmente, lesões leves. De qualquer
densidade populacional; condições da malha viária; maneira, muitas vítimas falecem antes de serem inter-
intenso trafico urbano e regional; não cumprimento nadas, o que exige um monitoramento constante das
das leis de trânsito; falta de uma fiscalização efetiva taxas de mortalidade para esse tipo de acidente.12 O fato
do cumprimento dessas leis; educação do usuário; e de não se chegar ao hospital não minora a magnitude
medidas de proteção dirigidas aos motociclistas.4,11,12 do problema e sim indica: falha nos mecanismos de
As vítimas de acidentes envolvendo motocicletas assistência de urgência; ou impossibilidade de socorro,
aqui observadas foram, em sua grande maioria, do dada a gravidade do acidente.
sexo masculino, como já fora apontado por inúmeros O predomínio dos acidentes no grupo jovem, pos-
estudos realizados em diferentes cidades brasilei- sivelmente, está relacionado ao uso da motocicleta
ras.3,12,13 Eles se somam às vítimas de homicídios, como veículo que responde a uma exigência de rapidez
agravando o cenário das violências para esse sexo. O de locomoção no trabalho, obrigando os conhecidos
perfil sociodemográfico mais frequentemente obser- motoboys a uma postura de risco no trânsito.14
Recentemente, foi regulamentado o exercício das Embora as taxas de mortalidade por ATT para a ca-
atividades de mototaxistas e motoboys.15 Com a regu- pital do estado do Tocantins tenham declinado de 45,9
lamentação da profissão, passou-se a exigir a idade óbitos por 100 mil habitantes em 2000, para 27,1/100
mínima de 21 anos, posse de carteira de habilitação mil hab. em 2006,3,17,23 seus indicadores quanto aos
por, no mínimo, dois anos, ter curso especializado e acidentes envolvendo motocicleta são bastante preo-
usar vestimenta e acessórios de acordo com o mode- cupantes. Palmas-TO apresenta a maior proporção de
lo preconizado pelo Conselho Nacional de Trânsito acidentes envolvendo motocicletas, em relação ao total
(Contran), entre outras obrigações, além da previsão de AT, e se encontra no topo da lista das cidades com
de inspeção semestral para verificação dos equipa- elevadas taxas de mortalidade e de vítimas não fatais
mentos obrigatórios e de segurança. A regulamentação por acidentes de transporte.17 De qualquer forma, a
da Lei visa reduzir o número de acidentes de trânsito diminuição dos níveis de ATT pode ser considerada
envolvendo motocicletas. Silva, Soares & Andrade16 uma mudança positiva decorrente da implantação do
também enfatizam a necessidade da regulamentação Código de Trânsito Brasileiro a partir de 1997,18 de
da fiscalização das empresas que se utilizam desses estratégias de maior fiscalização e da fixação de novos
profissionais. valores das multas, além da implementação da ‘Redu-
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Dispõe sobre a estruturação da Rede Nacional profissionais em transporte de passageiros,
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e a Implantação e Implementação de Núcleos de serviço comunitário de rua, e “motoboy”, com o
Prevenção à Violência em Estados e Municípios. uso de motocicleta, altera a Lei no 9.503, de 23 de
Diário Oficial da União, Brasília, p.52, 20 maio 2004. setembro de 1997, para dispor sobre regras de
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consumo de bebida alcoólica por condutor de veículo
automotor, e dá outras providências. Diário Oficial da
União, Brasília, p. 1, 20 jun. 2008.
Resumo
Objetivo: descrever o perfil dos casos não fatais de violência interpessoal atendidos em uma unidade de urgência e
emergência de referência para sete municípios do estado de São Paulo, no período 2008- 2010. Métodos: os dados dos
casos notificados à Vigilância Epidemiológica de Penápolis foram obtidos do Sistema de Informação de Agravos de Notificação
(Sinan); as variáveis foram apresentadas conforme a Ficha de Notificação/Investigação Individual de Violência Doméstica,
Sexual e/ou Outras Violências. Resultados: foram estudados 109 casos; a maior parte das vítimas eram jovens do sexo
feminino (93,6%) e os agressores, majoritariamente homens (57,8%), cônjuges ou parentes/conhecidos das vítimas. A
violência física foi a principal forma de agressão (93,6%), ocorrida, principalmente, nas residências (67,9%), aos domingos
(16,5%), entre 18:01 e 24:00 horas (57,8%). Conclusão: os casos notificados apresentaram perfil compatível com violência
intrafamiliar doméstica contra mulheres, diferentemente dos estudos sobre violência interpessoal nas grandes cidades e
Regiões Metropolitanas.
Palavras-chave: Violência; Serviços Médicos de Emergência; Agressão; Epidemiologia Descritiva; Saúde Pública.
Abstract
Objective: to describe the profile of non-fatal cases related to interpersonal violence treated in an emergency care unit
of reference that serves seven municipalities of the state of São Paulo, Brazil, from 2008 to 2010. Methods: the study data
came from the cases reported from the Epidemiological Vigilance in Penápolis-SP to the Brazilian Information System for
Notifiable Diseases; variables were shown according to the Notification/Investigation Individual Formulary of Domestic,
Sexual, and/or other Types of Violences. Results: 109 occurrences were studied; most of the victims were young and female
(93.6%); and the aggressors, mostly were men (57.8%), partners or relatives/acquaintances of victims. Physical violence was
the main form of aggression (93.6%), principally in the home (67.9%), on Sunday (16.5%), between 6:01pm and 12:00pm
(57.8%). Conclusion: the cases reported had a consistent profile of domestic family violence against women, different from
other studies about interpersonal violence in large cities and metropolitan regions.
Key words: Violence; Emergency Medical Services; Aggression; Epidemiology, Descriptive; Public Health.
* Manuscrito redigido com base na Dissertação de Mestrado de Lenise Patrocinio Pires Cecilio, apresentada à Universidade
Estadual Paulista ‘Júlio de Mesquita Filho’ (Unesp)/Araçatuba-SP e defendida em abril de 2012.
interior do estado de São Paulo e notificados à Vigi- outra, destacando a intencionalidade do ato violento.
lância Epidemiológica da cidade de Penápolis-SP, para Particularmente neste estudo, ademais, foi considerado
mostrar as características da violência interpessoal fora ‘caso de violência interpessoal’ todo atendimento re-
das capitais e Regiões Metropolitanas. sultante de agressão/maus tratos desferidos a outrem,
que tenha como desfecho a alta do paciente. Foram
Métodos excluídos, portanto, os casos de morte e internação
seguida de óbito, com o propósito de estudar apenas
Trata-se de um estudo epidemiológico descritivo a morbidade por essa causa.
transversal, realizado na região do primeiro Consórcio Os dados foram obtidos do Sistema de Informação
Intermunicipal de Saúde do Brasil, o CISA, implanta- de Agravos de Notificação (Sinan). As variáveis foram
do em 1986, com sede no município de Penápolis, apresentadas conforme constam na Ficha de Notifica-
interior de São Paulo. O CISA congrega o município- ção/Investigação Individual de Violência Doméstica,
sede e outros seis, de pequeno porte: Alto Alegre-SP; Sexual e/ou Outras Violências, do Sinan, e as escolhidas
Avanhandava-SP; Barbosa-SP; Braúna-SP; Glicério-SP; para o presente trabalho foram: sexo, faixa etária, raça
e Luiziânia-SP. O universo populacional da região ou cor, escolaridade e situação conjugal da vítima;
consorciada é de aproximadamente 112 mil pessoas, sexo do agressor e seu vínculo/grau de parentesco
45% delas concentradas no município-sede. Para com a vítima; e dados referentes à agressão sofrida,
efeitos deste estudo, considerou-se como municípios como tipo, natureza, parte do corpo atingida, meio de
de pequeno porte aqueles com população inferior a agressão, frequência, local, dia da semana e horário
20 mil habitantes, e de médio porte os que contam da ocorrência.
entre 20 e 100 mil habitantes. A consolidação dos dados foi realizada na forma
Foram objeto do estudo os casos de violência de tabelas de distribuição de frequência, geradas pelo
interpessoal ocorridos nos sete municípios consor- aplicativo TabNet e importadas pelo programa TabWin
ciados, notificados junto à Vigilância Epidemiológica (Tab para Windows 2,0), ambos desenvolvidos pelo
e atendidos pela Unidade de Urgência e Emergência Departamento de Informática do SUS (Datasus). As
(Pronto-Socorro) de referência nos anos de 2008, informações foram analisadas sob a forma de núme-
2009 e 2010. ros absolutos e proporções, uma vez determinadas as
A Unidade de Urgência e Emergência atua 24 horas/ prevalências e razões entre os sexos.
dia, conta com dois médicos plantonistas e realiza, Os dados foram agrupados conforme categorias: ca-
aproximadamente, 5 mil atendimentos/mês. Após a racterísticas da vítima e do autor da agressão/violência
detecção ou suspeita da ocorrência de violência, a sofrida, e características da ocorrência. Os casos com
equipe de enfermagem preenche a Ficha de Notificação, resultado zero não foram excluídos, a fim de auxiliar
enviada para a Vigilância Epidemiológica do município na caracterização epidemiológica.
de Penápolis-SP semanalmente. É nesse município que A pesquisa utilizou dados secundários, sem risco
são registrados os dados de todos os demais municípios para a população do estudo ou identificação nominal
atendidos pela Unidade de Urgência e Emergência. dos sujeitos. Foram cumpridas as Diretrizes e Normas
Entende-se como ‘violência’ a relação, processo Regulamentadoras de Pesquisa envolvendo Seres
ou condição em que há violação da integridade física, Humanos, estabelecidas pela Resolução no 196/96
psicológica ou social mediante uso de força física, do Conselho Nacional de Saúde – CNS. O projeto foi
poder real ou ameaça a um indivíduo, classe, grupos apreciado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa
ou nações, contra si próprio ou contra a coletividade, da Universidade Estadual Paulista ‘Júlio de Mesquita
que resulte ou possa resultar em morte, danos físicos, Filho’ – Unesp –, Campus de Araçatuba-SP: Processo
psicológicos, emocionais e espirituais, deficiência de nº 00645/2010.
desenvolvimento ou privação.2,13,14
Neste trabalho, a expressão ‘violência interpessoal’ Resultados
foi adotada para designar a situação relacional em
que há uso intencional da força física ou do poder, No período estudado, foram notificados 109 casos
real ou na forma de ameaça, de uma pessoa contra de violência interpessoal. Entre as principais caracte-
rísticas das vítimas, a maioria era do sexo feminino, tinham Ensino Fundamental incompleto. Quanto à
93,6%, contra 6,4% do sexo masculino, implicando situação conjugal, observou-se a mesma proporção
uma razão feminino/masculino (F/M) de 14,6:1. A de solteiras ou casadas/união consensual (35,8%)
faixa etária predominante entre as vítimas atendidas (Tabela 1).
foi a de 20 a 34 anos (43,1%), seguida do estrato Em relação ao autor da agressão, a maioria era
de 35 a 49 anos de idade (21,1%). A maioria das do sexo masculino (63,3%), tanto para as vítimas
vítimas era da cor ou raça branca (69,7%) e 23,8% masculinas quanto para as femininas. Em 8,2% das
Tabela 1 - Distribuição dos casos de violência interpessoal não fatais atendidos em unidade de urgência
e emergência de referência para sete municípios do interior do estado de São Paulo, por sexo
e segundo características da vítima, notificados à Vigilância Epidemiológica do município de
Penápolis-SP. Brasil, 2008-2010
ocorrências houve envolvimento de ambos os sexos. O meio de agressão mais utilizado foi a força cor-
Suspeitou-se do uso de álcool pelo agressor em 35,8% poral/espancamento (80,7%). A prática de ameaça,
dos casos mas a maior parte das vítimas (55,0%) in- o uso de objeto contundente e o enforcamento foram
formou não suspeitar do uso da substância. O vínculo/ encontrados, respectivamente, em 22,0%, 12,8% e
grau de parentesco mais frequente entre agressores e 11,0% dos casos. Também foi observada a ocorrência
vítimas foi o de cônjuges (22,9%), seguido de amigos/ de mais de um meio de agressão por notificação. O tipo
conhecidos (21,0%) (Tabela 2). de lesão que apareceu com valor proporcional mais
Quanto às características da violência, em 41,3% expressivo foi a contusão (36,7%). Corte/perfuração/
dos casos ela era repetida, ou seja, já havia ocorrido laceração vem em seguida, com 21,0%. As partes do
outras vezes. O tipo de violência mais frequente foi a corpo mais atingidas pela agressão foram a cabeça/face
física (93,6%), seguida de psicológica/moral (50,5%) (47,7%) e os membros superiores (20,18%), sendo
e da tortura (20,2%). Nesta avaliação, observou-se a primeira mais comum nas mulheres, e a segunda,
uma frequência maior que 100,0% na soma dos tipos nos homens (Tabela 3).
de violência sofridos, o que demonstra que a mesma As características da ocorrência de violência de-
vítima sofreu mais de um tipo de violência. monstram que a residência foi o locus privilegiado,
Tabela 2 - Distribuição dos casos de violência interpessoal não fatais atendidos em unidade de urgência
e emergência de referência para sete municípios do interior do estado de São Paulo, por sexo e
segundo características do autor da agressão, notificados à Vigilância Epidemiológica do município
de Penápolis-SP. Brasil, 2008-2010
Tabela 3 - Distribuição dos casos de violência interpessoal não fatais atendidos em unidade de urgência
e emergência de referência para sete municípios do interior do estado de São Paulo, por sexo e
segundo características da violência, notificados à Vigilância Epidemiológica do município de
Penápolis-SP. Brasil, 2008-2010
Tabela 4 - Distribuição dos casos de violência interpessoal não fatais atendidos em unidade de urgência
e emergência de referência para sete municípios do interior do estado de São Paulo, por sexo e
segundo características da ocorrência, notificados à Vigilância Epidemiológica do município de
Penápolis-SP. Brasil, 2008-2010
alcançando o índice de 67,9%, e, com menos da ção dos atendimentos por violência, a subprocura por
metade dessa proporção, a via pública (23,8%). atendimento médico das vítimas do sexo masculino,
Da totalidade dos casos, 89,9% foram confirmados, muito provavelmente, está mais relacionada a fatores
4,6% considerados prováveis e 5,5% inconclusivos culturais que epidemiológicos. Assim, esses dados não
(Tabela 4). devem ser generalizados, tampouco desprezados uma
A maioria dos atendimentos aconteceu aos finais de vez que podem fornecer subsídios para a formulação
semana, com predominância no domingo (16,5%), de políticas e intervenções sociais por parte dos entes
no horário compreendido entre 18:01 e 24:00 horas públicos.
(57,8%), e o período do ano predominante de ocor- Entre os pontos fortes do trabalho, está a relevância
rências foi o mês de fevereiro (12,8%) (Tabela 5). dos dados em relação às regiões interioranas. Estas não
são foco preferencial dos pesquisadores mas podem
Discussão apresentar perfil epidemiológico diferente das grandes
cidades e regiões metropolitanas e carecerem, portan-
A violência interpessoal, um fato que se tem to, de mais estudos e informações sobre os diversos
apresentado habitual em nossa sociedade, é um fe- agravos que atingem sua população.
nômeno universal a afetar diferentes grupos sociais e Embora este seja um trabalho descritivo, o tema
etários e exibir uma multiplicidade de manifestações. da violência traz a necessidade de discussões e re-
Observa-se, entretanto, uma escassez de estudos que flexões sobre as principais características – não só
trabalhem com a morbidade causada por violências, epidemiológicas como também sociais – e tendências
principalmente em cidades de pequeno e médio porte de ocorrência da violência, capazes de ajudar no dire-
e regiões interioranas. cionamento das ações para públicos-alvo específicos.
Esta pesquisa apresenta algumas considerações im- A intencionalidade relacionada à ocorrência de
portantes. A despeito da possibilidade de subnotifica- atos violentos sugere que este seja um agravo passível
Tabela 5 - Distribuição dos casos de violência interpessoal não fatais atendidos em unidade de urgência e
emergência de referência para sete municípios do interior do estado de São Paulo, segundo o dia
da semana, mês e horário da ocorrência, notificados à Vigilância Epidemiológica do município de
Penápolis-SP. Brasil, 2008-2010
Total
Características
n %
Dia da semana
Segunda 9 8,2
Terça 12 11,0
Quarta 14 12,8
Quinta 7 6,4
Sexta 12 11,0
Sábado 16 14,7
Domingo 18 16,5
Feriados 5 4,6
Sem informação 16 14,7
Mês
Janeiro 10 9,2
Fevereiro 14 12,8
Março 9 8,2
Abril 7 6,4
Maio 10 9,2
Junho 11 10,1
Julho 5 4,6
Agosto 4 3,7
Setembro 10 9,2
Outubro 7 6,4
Novembro 12 11,0
Dezembro 10 9,2
Horário
00:01 as 06:00 7 6,4
06:01 as 12:00 9 8,2
12:01 as 18:00 14 12,8
18:01 as 24:00 63 57,8
Sem registro 16 14,7
TOTAL 109 100,0
de atuação dos mais diversos setores da sociedade. às características da violência mais prevalente nos
Minayo4 afirma que, embora a intencionalidade municípios. Os municípios maiores apresentam mais
possa ocorrer também de forma indireta, a ideia da casos de violência interpessoal nas formas criminais
intenção demonstra que existe a responsabilidade dos e deliquenciais, que atingem mais vítimas do sexo
sujeitos. Estes, em seus contextos sociais, seriam os masculino, e que são menos frequentes nas regiões
principais alvos de intervenções e, para tal, dever-se-ia interioranas, onde são encontrados mais casos de vio-
conhecê-los. lência intrafamiliar, doméstica e de gênero, fenômenos
Os resultados deste estudo demonstraram a predo- sociais de caráter histórico abrangente não exclusivo
minância de vítimas do sexo feminino, na proporção das grandes cidades. Quando se analisa estudos espe-
de 14,6:1 sobre o sexo masculino, o que difere da cíficos sobre violência intrafamiliar, o sexo feminino é
maioria dos trabalhos relacionados à violência inter- o mais atingido,3,20 como foi encontrado neste trabalho.
pessoal como um todo, que apontam a prevalência de Outro aspecto que pode estar relacionado aos resul-
homens.1,4,8,9,15-19 Diante dos achados aqui apresen- tados encontrados é que, conforme dados estatísticos
tados, supõe-se que esta diferença esteja associada da Unidade de Urgência e Emergência focada neste
estudo, 61,0% dos atendimentos são de ambulatório.21 rência da violência, no entanto, isoladamente, constitui
Excluídas as internações e os óbitos, estima-se que os atributo biológico que não deve ser considerado como
casos avaliados, não letais e menos graves, ainda que fator determinante do fenômeno.5
tenham sido atendidos em uma unidade de urgência Quanto ao tipo de violência, a mais frequente foi a
e emergência, possam-se tratar, em sua maioria, de física (93,6%), seguida de psicológica/moral (50,5%).
ocorrências ambulatoriais. Pesquisas demonstram: Um fato, causador de estranhamento, é a tortura posi-
a população que mais procura atendimento médico cionada em terceiro lugar nessa lista de frequências,
ambulatorial é a feminina, principalmente por questões representando 20,2% dos casos e indicando a neces-
culturais relacionadas a masculinidade e vulnerabili- sidade de se definir o que vem a ser tortura para fins
dade.22,23 de notificação. Como a ficha do Sinan não o faz e os
Este trabalho teve como foco a violência interpesso- funcionários que a preenchem não têm um protocolo
al geral mas os resultados encontrados são compatíveis definido com esse objetivo, a hipótese suscitada por
com o perfil da violência interpessoal doméstica, intra- estes autores é de que o termo ‘tortura’ tenha sido
familiar e de gênero – em relação a esta última, sem utilizado para os casos violentos de maior gravidade e
apresentar simetria, sendo mais expressiva a violência crueldade. Há divergências na definição desse conceito
contra a mulher. entre as áreas da Justiça e da Saúde, o que remete à
Qaunto à faixa etária, independentemente de gê- oportuna padronização e qualificação dos profissionais
nero, os resultados coincidem com os achados de para sua utilização adequada.
muitos autores,9,15-17,24-27 ainda que se analise tipos de A situação conjugal das vítimas e seu grau de
violências diversos. A população adulta é a mais atin- parentesco com os autores da violência demonstram
gida por esse agravo, e vale destacar que a incidência que a maior parte das ocorrências envolve relações
da violência, intencional ou não, sobre adultos jovens afetivas (ou “desafetivas”) entre parceiros ou ex-
em idade produtiva pode ser de grande impacto para parceiros. Isto corrobora o resultado de estudo sobre
a sociedade e as famílias, em ‘anos potenciais de vida a arqueologia da agressividade humana desenvolvido
perdidos’. Conforme afirma Norman e colaboradores,28 por Lessa,29 que aponta a ruptura temporária dos
a violência interpessoal é o segundo maior fator de mecanismos e relações de convívio e o rearranjo
risco para a perda de anos saudáveis de vida. permanente dos papéis sociais como combustível
Também é mportante salientar a especificidade do para situações potenciais de violência. Confirma-se,
local de coleta dos dados notificados. Por se tratar mais uma vez, a importante contribuição dos dados
de uma unidade de saúde, a busca por atendimento relativos à violência intrafamiliar e de gênero no que
cabe exclusivamente à vítima. Quando pensamos nas concerne à epidemiologia da morbidade das agressões
crianças e idosos agredidos, que não têm condição e maus-tratos.
de fazê-lo ou mesmo efetuar uma denúncia ou noti- A informação e os resultados do presente estudo,
ficação formal, eis aqui mais um fator relevante para de que a maior parte das ocorrências tenha-se dado
esta discussão. Se os dados fossem retirados das bases no interior da residência, com o sexo feminino
de dados do Conselho Tutelar, Conselho do Idoso, ou como vítima de agressões diversas provocadas por
de documentos e inquéritos policiais, a distribuição familiares, vai ao encontro dos achados de Oliveira25
epidemiológica do agravo por faixas etárias poderia e Mascarenhas8,9 quando separarem seus resultados
ser diferente, ampliando a possibilidade de novas por sexo. Em maior ou menor grau, a violência in-
pesquisas nessa região. trafamiliar está presente – e dispersa – na maioria
A observância da cor de pele ou raça das vítimas das pesquisas sobre a violência interpessoal. Estima-
revelou maior proporção de brancos, população pre- se que 12,0% das famílias apresentem episódios
dominante nos municípios. Porém, a identificação da de violência e, em 40,0% dos casos, associados a
cor da pele ainda é questão complexa e controversa, diferentes tipos de agressão (psicológica, física, por
não havendo consenso quanto a essa classificação. negligência).3
Sendo assim, este achado não será alvo de discussão Seja qual for a tipologia da violência, um achado
aqui. Ademais, quando associada a outras variáveis, a alarmante e preocupante, a requerer atenção e iniciativa
raça ou a cor da pele pode estar relacionada à ocor- de toda uma sociedade, relaciona-se ao perfil do agres-
sor. Dados de mortalidade, morbidade, criminalidade horas. O tipo de violência mais prevalente foi a física,
e delinquência, violência contra mulheres, idosos e até acompanhada da psicológica; e o meio de agressão
mesmo crianças, todos apontam para o sexo masculino utilizado foi a força corporal, seguida de ameaça.
como o mais prevalente autor de agressão.4,10,12,17 Ainda Grande parte das vítimas sofreu contusão nas regiões
que estudos recentes e específicos sobre violência conju- da cabeça/face e dos membros superiores e, em muitos
gal comecem a apresentar simetria e reciprocidade nas casos, além do autor poder estar sob uso de álcool, a
agressões entre parceiros íntimos, quando se observa o agressão já ocorrera outras vezes.
conjunto dos eventos de violência, encontra-se o sexo Os resultados demonstraram que o perfil epidemioló-
masculino como principal autor. As formas tradicionais gico mais frequente da morbidade causada por violência
de violência praticadas pelos homens têm conservado as interpessoal fora das grandes cidades e regiões metro-
mesmas características históricas, independentemente politanas, quando se analisa os casos que procuram
da condição da vítima, talvez herança de um compor- por atendimento médico de urgência, é compatível com
tamento cultural machista, de origem patriarcal, a violência intrafamiliar e doméstica. A coleta de dados
atravessar as gerações.4 mediante inquéritos policiais ou entrevistas pessoais
Ao se analisar o sítio das lesões, a cabeça/face e poderia revelar outros aspectos, não encontrados aqui,
os membros superiores foram as regiões do corpo o que abre um leque de alternativas para o desenvolvi-
mais atingidas, de acordo com a maioria dos artigos mento de próximos estudos nessas regiões.
pesquisados. Essa informação pode estar relacionada Há que se avançar na compreensão do fenômeno
tanto ao caráter simbólico de humilhação, que o da violência. Mais do que agir sobre um agravo ge-
agente imprime ao atingir o rosto da vítima, quanto rador de estatísticas, deve-se encontrar maneiras de
ao comportamento defensivo por parte da vítima, que atuar nas diversas formas de violência velada, não
usa os membros superiores como defesa.27 notificada e, muitas vezes, quase imperceptível ou
Já a prevalência de um número maior de casos nos mesmo ignorada. Explícita ou não, a complexidade
finais de semana pode estar relacionada ao fato de que envolve o assunto requer abordagem multidis-
os indivíduos concentrarem seu lazer nesse período, ciplinar, multifatorial e intersetorial, com foco nas
quando ingerem bebida alcoólica e assumem com- diversas características sociodemográficas e culturais
portamentos propiciadores de um ambiente mais fértil associadas a sua ocorrência.
para o conflito.30 Esta também pode ser a explicação Com suas múltiplas faces, a violência continuará a
para fevereiro ter apresentado maior proporção de impactar a sociedade, diminuir a qualidade de vida das
casos que os demais meses do ano, pois é naquele pessoas, provocar danos físicos, emocionais e sociais
mês que ocorre o carnaval, festa associada ao maior aos indivíduos, acarretando elevados gastos para os
consumo de bebidas alcoólicas. serviços públicos. E avançar ainda mais, na medida
Grande parte dos problemas com violência não em que não formos capazes de uma visão ampliada
acontece no confronto com bandidos e sim onde vive, sobre as questões que a envolvem, com uma atuação
trabalha e se diverte a população comum. É principal- preventiva e assistencial mais efetiva. A desvalorização
mente nos conflitos interpessoais, desavenças, brigas das hierarquias tradicionais e da autoridade familiar e
de vizinhos, contendas conjugais e pós-bebedeira em comunitária contribuem para tanto4 e cabe a todos os
bares que as pessoas perdem o controle emocional e atores sociais a responsabilidade do enxergar, pensar
criam a oportunidade para o ato violento.4 e atuar no sentido de uma mudança desse paradigma.
A maior parte das vítimas de violência interpessoal O presente estudo dá visibilidade à violência
nos sete municípios avaliados e que procurou aten- manifesta dentro de uma infinidade de lares brasi-
dimento na Unidade de Urgência e Emergência de leiros, de uma população significativa, frequente-
referência foi do sexo feminino, brancas, com idade mente distante do olhar da maior parte de nossos
entre 20 e 34 anos e Ensino Fundamental incompleto, estudiosos. Trabalhos deste tipo, na medida em que
sem distinção entre solteiras e casadas ou vivendo em agregam novos conhecimentos, permitem ampliar
união consensual, agredidas por homens, cônjuges ou as possibilidades de ação dos diversos setores da
conhecidos das vítimas dentro da própria residência, sociedade na prevenção de violências e promoção
durante os finais de semana, entre as 18:01 e 24:00 de uma cultura de paz.
Contribuição dos autores Rovida TAS colaborou na análise dos dados e revisão
da redação do artigo.
Cecilio LPP participou do delineamento da pesquisa, Queiróz APDG auxiliou no levantamento bibliográ-
levantamento bibliográfico, coleta e análise dos dados, fico e revisão do artigo.
redação e revisão do artigo. Garbin AJI contribuiu no delineamento da pesquisa,
Garbin CAS contribuiu na orientação para a realiza- análise dos dados e orientação estatística.
ção do trabalho, concepção e delineamento do estudo,
análise dos dados e revisão do artigo.
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Recebido em 07/07/2011
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Mortality due to external causes in the micro-Region of São Mateus, state of Espírito Santo,
Brazil: trends from 1999 to 2008
Resumo
Objetivo: analisar as tendências da mortalidade por causas externas segundo variáveis sociodemográficas, na microrregião de
São Mateus, estado do Espírito Santo, no período 1999-2008. Métodos: os dados foram obtidos do Sistema de Informações sobre
Mortalidade (SIM). Foram calculados coeficientes de mortalidade segundo sexo, faixa etária e cor da pele ou raça. Realizou-se análise
de tendência usando o modelo de regressão polinomial melhor ajustado. Resultados: No período 1999-2008, o coeficiente de morta-
lidade por causas externas elevou-se 76,45 para 118,21 óbitos por 100 mil habitantes (p<0,001). Também houve aumento significativo
(p<0,001) entre homens, (117,00; 204,22), adolescentes (10 a 19 anos) (51,93; 96,80), adultos (20 a 59 anos), (109,19; 158,79);
indivíduos de cor da pele parda (40,59; 144,04) e negra (50,15; 145,66). Conclusão: a mortalidade por causas externas foi maior
na população masculina, jovem e negra. No período estudado, a microrregião apresentou forte tendência de aumento da mortalidade
por causas externas.
Palavras-chave: Mortalidade; Coeficiente de Mortalidade; Causas Externas; Acidentes; Violências; Distribuição Temporal.
Abstract
Objective: to analyze trends in mortality due to external causes according to sociodemographic variables, in the microrregion
of São Mateus, Espírito Santo state, in the period 1999-2008. Methods: data were obtained from the Mortality Information System
(SIM). Mortality rates by sex, age and skin color, and race were calculated. Trends were analyzed using adjusted polynomial
regression models. Results: In the period 1999-2008, the mortality rate from external causes rose from 76.45 to 118.21 deaths
per 100,000 inhabitants (p <0.001). There were also significant increases (p <0.001) among men, (117.00, 204.22), adolescents
(10 to 19 years) (51.93, 96.80), adults (20 to 59 years) (109.19, 158.79); and individuals with brown (40.59, 144.04) and black
(50.15, 145.66) skin color. Conclusion: the mortality from external causes was higher among the male, young and black indi-
viduals. In the studied period, there was a strong trend towards increase in the mortality from external causes.
Key words: Mortality; Mortality Rate; External Causes; Accidents; Violence; Temporal distribution.
* Artigo baseado em monografia defendida no ano de 2010, na Universidade Federal do Espírito Santo.
Foram selecionados os óbitos classificados no Ca- 1999 a 2008. Verificou-se que os coeficientes de
pítulo XIX (Lesões, envenenamento e algumas outras mortalidade apresentaram significativa tendência de
consequências de causas externas) e XX (Causas exter- aumento (p<0,001). No período estudado, a média
nas de morbidade e de mortalidade) da Classificação dos coeficientes foi de 95,61 óbitos por 100 mil
Estatística Internacional de Doenças e Problemas habitantes, variando de 76,45 óbitos por 100 mil
Relacionados à Saúde, 10ª Revisão (CID-10). Os co- habitantes, em 1999, para 118,21 óbitos por 100
eficientes de mortalidade por causas externas foram mil habitantes, em 2008.
calculados sobre o denominador 100 mil habitantes. Em relação ao sexo, observou-se que os coeficientes
As informações referentes à população residente, base de mortalidade por causas externas entre os homens
de cálculo das taxas, correspondem aos dados estima- foram superiores aos das mulheres (Figura 2). O co-
dos pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e eficiente entre os homens variou de 117,00 óbitos por
Estatística (IBGE), disponibilizados na home page do 100 mil habitantes, em 1999, para 204,22, em 2008;
Departamento de Informática do Sistema Único de e entre as mulheres, de 35,19, em 1999, para 32,04,
Saúde (Datasus), do Ministério da Saúde; à exceção em 2008. Os coeficientes de mortalidade no sexo
dos cálculos das taxas referentes à cor da pele ou raça, masculino apresentaram tendência de aumento esta-
para os quais se utilizou como população-padrão a tisticamente significante (p<0,001); já os coeficientes
referida no Censo 2000, para todos os anos, uma vez de mortalidade no sexo feminino não apresentaram
que não se encontra disponível a população estimada significância estatística (p=0,519).
para cor da pele ou raça. Em relação à faixa etária, o comportamento do
A partir dos coeficientes de mortalidade por causas coeficiente de mortalidade por causas externas apre-
externas encontrados, foi realizada análise de tendên- sentou-se heterogêneo, como pode ser visualizado na
cia utilizando o modelo de regressão polinomial, com Figura 3. Os coeficientes de mortalidade por causas
auxílio do programa Genes,11 tendo como variáveis externas em menores de um ano, na faixa de 1 a 4
dependentes (y) os coeficientes de mortalidade por anos e na de 5 a 9 anos de idade não apresentaram
causas externas geral e específicos referentes ao sexo, significância estatística: p>0,05. O coeficiente de mor-
faixa etária e cor da pele ou raça; e como variável talidade por causas externas médio para os menores
independente (x), os anos de ocorrência dos óbitos. de 1 ano foi de 45,17 óbitos por 100 mil habitantes,
Inicialmente, um diagrama de dispersão foi elabora- para a faixa de 1 a 4 anos, de 23,98 óbitos por 100
do pelo aplicativo Excel 2007, para correlacionar as mil habitantes, e para a faixa de 5 a 9 anos, de 19,47
variáveis dependentes com a variável independente. óbitos por 100 mil habitantes. Os adolescentes (10
Posteriormente, realizou-se o teste de regressão poli- a 19 anos de idade) apresentaram coeficientes de
nomial individual, com seleção até o grau 3. O grau mortalidade por causas externas com tendência a au-
da linha de tendência de melhor ajuste foi identificado mento, no período do estudo (p=0,037). O coeficiente
conforme o valor da probabilidade encontrado em de mortalidade por causas externas variou de 51,93
cada grau, considerando-se 5% de significância. Final- óbitos por 100 mil habitantes, em 1999, para 96,80 por
mente, também com o auxílio do aplicativo Excel 2007, 100 mil habitantes, em 2008. A faixa etária de 20 a 59
foram construídos os gráficos com linhas de tendência. anos (adultos) apresentou aumento dos coeficientes
Não foi necessária a submissão desta pesquisa à de mortalidade por causas externas, com tendência a
aprovação de um Comitê de Ética em Pesquisa, haja aumento estatisticamente significante (p<0,001). O
vista o procedimento de obtenção dos dados utilizar coeficiente de mortalidade por causas externas variou
base de dados secundária, disponível na Internet e de de 109,19 óbitos por 100 mil habitantes, em 1999,
acesso público. para 158,79 óbitos por 100 mil habitantes, em 2008.
Em relação à faixa etária de 60 anos ou mais (idosos),
Resultados os coeficientes de mortalidade por causas externas
se apresentaram oscilantes no decorrer dos anos
A Figura 1 apresenta os coeficientes de mortali- de estudo, tendendo a um descenso de significância
dade por causas externas (por 100 mil habitantes) estatística (p=0,049) nos últimos anos. O coeficiente
na Microrregião de São Mateus-ES, no período de de mortalidade por causas externas variou de 114,08
140,0
120,0
Coeficiente de mortalidade (por 100 mil hab.)
100,0
80,0
60,0
40,0
20,0
0,0
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008
Ano 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008
Coeficiente 76,45 88,84 77,23 90,30 91,51 87,99 102,30 112,29 111,01 118,21
Figura 1 - Coeficientes de mortalidade (por 100 mil habitantes) por causas externas e respectiva linha de
tendência na microrregião de São Mateus, estado do Espírito Santo. Brasil, 1999 a 2008
250,0
Masculino Feminino
150,0
100,0
50,0
0,0
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008
Ano/Sexo 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008
Masculino 117,00 145,44 128,87 148,20 147,50 137,44 159,29 164,86 179,21 204,22
Feminino 35,19 31,59 25,00 31,74 34,89 37,98 44,69 25,00 42,65 32,04
Figura 2 - Coeficientes de mortalidade (por 100 mil habitantes) por causas externas e respectivas retas de
tendência, segundo sexo, na microrregião de São Mateus, estado do Espírito Santo. Brasil, 1999 a 2008
aqui, apresentar a mortalidade por acidentes e violên- Santo revelam uma situação de mortes violentas mais
cia ou analisar o comportamento das causas externas expressiva que a situação nacional.9
mal definidas, cujos resultados poderiam explicar, O aumento nas taxas de morte por causas externas
ao menos em parte, a elevação dos coeficientes de está atrelado à desigualdade, injustiça, corrupção,
mortalidade por causas externas. impunidade, deterioração institucional, violação dos
Outra limitação do estudo está relacionada à direitos humanos, banalização e baixa valorização da
subnotificação, bem como à própria fonte de dados. vida.12 Eventos violentos ainda podem ser explicados
O Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM como resultado de uma complexa interação de fatores
– congrega dados de Declarações de Óbito, algumas sociais, econômicos, culturais, étnico-raciais, psicológi-
inadequadamente preenchidas quando atribuem os cos e comportamentais. Estes, denominados pela saúde
respectivos óbitos a ‘causas mal definidas’. coletiva como ‘Determinantes Sociais em Saúde’, tanto
Na presente pesquisa sobre a microrregião de São influenciam na ocorrência de agravos à saúde como
Mateus-ES, evidenciou-se uma média de coeficientes de podem representar fatores de risco para violência.13
mortalidade igual a 95,61 óbitos por 100 mil habitan- Compreender como esses fatores estão relacionados à
tes, dado próximo ao do Estado do Espírito Santo onde, violência é um dos passos importantes na abordagem
no mesmo período, foram registrados 100,89 óbitos da saúde coletiva para o controle e prevenção das
por 100 mil habitantes. Na comparação com o Brasil, causas externas. Além dos condicionantes biológicos e
cuja média foi de 70,41 óbitos por 100 mil habitantes, demográficos, outros fatores devem ser levados em con-
a microrregião de São Mateus-ES e o estado do Espírito sideração, como impulsividade, baixo nível educacional,
160,0
< 1 ano 1-4 anos 5-9 anos
140,0
10-19 anos 20-59 anos 60 anos ou +
120,0
Coeficiente de mortalidade (por 100 mil hab.)
100,0
80,0
60,0
40,0
40,0
40,0
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0,0
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008
Ano/
Faixa etária (anos) 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008
<1 62,93 22,46 44,41 43,83 43,36 85,82 20,95 41,37 21,29 65,29
1-4 15,25 27,71 10,96 37,86 42,8 26,46 10,33 25,52 32,04 10,88
5-9 23,20 16,98 16,79 20,73 16,40 0,00 47,52 3,91 35,81 13,53
10-19 51,93 72,88 54,55 55,80 57,11 50,85 62,55 67,27 63,25 96,80
20-59 109,19 122,63 114,06 127,84 129,14 129,54 140,21 135,19 150,45 158,79
60 ou + 114,08 101,36 70,87 116,82 121,51 120,43 174,12 133,40 139,52 125,71
p
Coeficiente de mortalidade (CM) segndo faixa etária Equação ajustada R2
valor
CM <1 ano y = 46,115 – 0,172x 0,945 0,0059
CM 1-4 anos y = 25,153 – 0,213x 0,875 0,0031
CM 5-9 anos y = 18,009 + 0,269x 0,867 0,0034
CM 10-19 anos y = 70,896 -8,195x + 0,973x² 0,038 0,6030
CM 20-59 anos y = 105,561 + 4,753x <0,001 0,8892
CM 60 anos ou + y = 149,539 -48,731x +12,342x² - 0,776x³ 0,049 0,6662
Figura 3 - Coeficientes de mortalidade (por 100 mil habitantes) por causas externas e respectivas retas de
tendência, segundo faixa etária, na microrregião de São Mateus, estado do Espírito Santo.
Brasil, 1999 a 2008
abuso de substâncias químicas e histórico de agressão e apenas no sexo masculino. Tais resultados assemelham-
abuso interpessoal/social. De igual modo, em comuni- se aos de estudo realizado por Paes15 na última década,
dades onde há isolamento social generalizado (vizinhos revelando tendência de crescimento da mortalidade
não se relacionam, não há envolvimento comunitário), é por causas externas para ambos os sexos no país, ainda
maior a probabilidade de viver experiências violentas.14 que esse percentual tenha se revelado maior entre os
A variável sexo estudada revelou que entre os homens homens. Semelhante é o resultado de estudo realizado
da microrregião de São Mateus-ES, a mortalidade por no mesmo Espírito Santo, em que a taxa de mortalidade
causas externas foi cerca de cinco vezes superior à das foi maior para homens, de todas as idades.16
mulheres. Em ambos sexos, as taxas tenderam a au- Souza17 rejeita qualquer afirmação universal sobre a
mento, embora fosse observada significância estatística relação do ser homem e a espontânea e instintiva inclina-
160,0
Branca Preta Parda Negra
140,0
100,0
80,0
60,0
40,0
20,0
0,0
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008
Ano/Raça 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008
Branca 39,87 37,21 47,84 51,83 34,55 55,81 53,16 46,51 42,53 67,77
Preta 110,62 50,28 50,28 85,48 105,59 40,23 60,34 50,28 80,45 150,84
Parda 40,59 50,93 72,42 70,83 90,72 84,35 115,39 104,25 149,61 144,04
Negra 50,15 50,84 69,39 72,83 92,75 78,32 107,87 96,87 140,16 145,66
Coeficiente de mortalidade (CM) segundo cor da pele ou raça Equação ajustada p valor R2
CM branca y = 37,477 + 1,860x 0,085 0,3215
CM preta y = 64,026 + 2,620x 0,538 0,0504
CM parda y = 28,704 + 11,565x < 0,001 0,9238
CM negra y = 33,387 + 10,381x <0,001 0,8924
Figura 4 - Coeficientes de mortalidade por causas externas (por 100 mil habitantes) e respectivas retas de
tendência, segundo cor da pele ou raça, na microrregião de São Mateus, estado do Espírito Santo,
Brasil, 1999 a 2008
ção a praticar atos de violência física. Entretanto, destaca violência envolvendo homens possuem maior visibilidade
nesse grupo a maior exposição do seu corpo a riscos por ocorrer nos espaços públicos e não ter um caráter
pelos quais se desenvolve a violência e o enfrentamento tão velado e silencioso como a maioria das situações de
como forma de obter respeito. Por conseguinte, morrem violência contra as mulheres, crianças e idosos.19
primeiro que a mulher e as causas de suas mortes refletem Em relação à idade, os maiores coeficientes de
uma exposição deliberada de enfrentar riscos e perigos. mortalidade por causas externas foram encontrados,
O predomínio de homens entre as vítimas não pode ser em ordem decrescente, nas faixas de 20 a 59 anos, 60
justificado por um fator biológico específico, mas, talvez, anos ou mais, e 10 a 19 anos de idade: uma tendência
pelos padrões socioculturais cristalizados na noção de gê- crescente nos adolescentes e adultos, decrescente nos
nero.18 A agressividade está associada ao sexo masculino indivíduos de 60 anos ou mais ainda que estes tenham
e, em grande parte, vinculada ao uso abusivo de álcool, de apresentado valores altos, nos últimos anos.
drogas ilícitas e ao acesso às armas de fogo, que tendem Os resultados encontrados para a microrregião
a inibir a censura, e levam a pessoa a assumir condutas de São Mateus-ES são semelhantes aos do país, o que
socialmente reprováveis. Além disso, as situações de revela uma realidade preocupante desde que as causas
externas têm atingido adolescentes e adultos jovens, o que os torna mais vulneráveis ao sofrimento por vio-
população economicamente ativa em sua grande maio- lências.19 O país ainda presencia a segregação racial de
ria.4 Pesquisas apontam que a vulnerabilidade desse segmentos com altas taxas de pobreza, o que contribui
grupo etário também está relacionada a determinados para o acirramento das diferenças raciais entre esses
comportamentos, como a busca de emoções, o prazer grupos, seja na educação, emprego, renda, saúde, opor-
em experimentar situações de risco, a impulsividade e tunidades de ascensão social, seja na vitimização por
o abuso de substâncias psicoativas.19 Souza17 assinala crimes, principalmente homicídios e uso de drogas.25
que na fase da adolescência e a partir dela, os jovens Os resultados desta pesquisa demonstram que, du-
se abrem para o mundo, tornam-se mais expostos – e rante o período de 1999 a 2008, a microrregião São Ma-
vulneráveis – aos riscos de serem vítimas de violências. teus apresentou tendência crescente para a mortalidade
A mortalidade por causas externas em relação à por causas externas. Em relação às variáveis estudadas,
cor da pele ou raça revelou as maiores taxas para as principais vítimas por essas causas de morte foram
pretos, pardos e negros. Especificamente entre pardos os homens, na faixa etária de 20 a 59 anos e negros.
e negros, a tendência dessas taxas é fortemente cres- Sugere-se que as variáveis sexo, faixa etária e raça/
cente. Conforme o Censo 2000,20 a população negra cor estão amplamente associadas aos acidentes e vio-
(parda e preta) representou 65,3% da população da lências e apresentam causas multifatoriais. Acredita-se
microrregião de São Mateus-ES no período de 1999 a que são necessárias investigações que dêem conta de
2008, frente a 50,18% da população do Espírito Santo e especificar mais detalhadamente os diferenciais que
44,66% da população brasileira. São dados reveladores têm contribuído para o crescimento da mortalidade
de uma grande concentração de negros no município por causas externas, assim como buscar explicações
de São Mateus-ES, o mais populoso da microrregião e para a maior vitimização de populações específicas na
local onde ocorreu o último carregamento de escravos microrregião do estudo.
negros apreendido na costa brasileira.21 Os estudos de Políticas públicas devem ser elaboradas e implemen-
mortalidade por causas externas no Brasil têm apon- tadas a partir de evidências epidemiológicas, orientadas
tado maior vitimização da população negra, refletida pelo princípio e objetivo da equidade social. É funda-
na microrregião aqui estudada. A cor da pele ou raça mental a implantação de estratégias de prevenção desses
negra é apresentada como a mais vulnerável para to- agravos e a construção de redes de apoio à redução da
dos os tipos de violência, principalmente nos casos de morbimortalidade por causas externas, na região estuda-
agressões, com um número de vítimas de homicídios da. A efetiva implantação da Política Nacional de Atenção
quase duas vezes mais que o dessas vítimas cuja cor da Integral à Saúde do Homem, na medida em que propõe
pele é branca.19,22,23 Em estudo realizado por Araújo e o combate à violência e aos acidentes, deverá fortalecer
colaboradores, negros apresentaram maior perda de essas ações na microrregião de São Mateus-ES.
anos potenciais de vida e maior número médio de anos
não vividos, além de morrerem – em média – mais Contribuição dos autores
precocemente, por todas as causas externas.24
Os negros e negras brasileiros, majoritariamente, Todos os autores participaram na elaboração do
encontram-se nas camadas sociais mais pobres, em conteúdo intelectual, desenho e execução do projeto,
situação de desigualdade crônica, cotidiana, agravada análise e interpretação dos dados, redação crítica e
pelo racismo e suas diversas formas de discriminação, aprovação da versão final do artigo.
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Occupational injuries and diseases in the municipality of Jequié, state of Bahia, Brazil,
registered in National Institute of Social Security, 2008-2009
Resumo
Objetivo: conhecer o perfil dos acidentes e doenças relacionadas ao trabalho no município de Jequié, estado da Bahia, Brasil,
registrados no Instituto Nacional de Seguridade Social em 2008-2009. Métodos: estudo descritivo, com dados das Comuni-
cações de Acidente do Trabalho (CAT) disponibilizadas pelo Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest). Resultados:
foram registrados 144 casos novos de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho; acidente típico foi o mais frequente (44,5%),
seguido por acidentes de trajeto (33,3%) e doenças relacionadas ao trabalho (22,2%). A maior parte das comunicações (80,6%)
ocorreu por parte do empregador, seguida pelo Cerest (11,1%) e sindicatos de trabalhadores 7,6%). O ramo de atividade com
maior número de acidentes de trabalho foi o das indústrias de transformação (40,6% de acidentes típicos; 54,1% de acidentes
de trajeto). Conclusão: observou-se semelhança nas ocorrências locais, comparadas com a tipologia dos acidentes e doenças
envolvendo trabalhadores no Brasil.
Palavras-chave: Trabalho; Notificação de Acidentes de Trabalho; Vigilância em Saúde do Trabalhador; Epidemiologia Descritiva.
Abstract
Objective: to investigate the profile of accidents and occupational diseases among workers of the municipality of Jequié,
state of Bahia, Brazil, registered in the National Social Security Institute, in 2008-2009. Methods: cross-sectional descriptive
study based on data from the Occupational Accidents Registries (CAT) provided by the Reference Center on Occupational Health
(Cerest). Results: 144 new cases of occupational accidents and diseases were registered; typical accidents were the most
frequent (44.5%), followed by commuting accidents (33.3%), and work-related diseases (22.2%). The majority of notifications
(80.6%) were by the employer, followed by Cerest (11.1%) and the union of workers (7.6%); industrial transformation sector
had the highest number of accidents (40.6% of typical accidents; 54.1% of commuting accidents). Conclusion: similarity
was observed on local occurrence compared with types of accidents and occupational diseases involving workers in Brazil.
Key words: Work; Occupational Accidents Registry; Surveillance of the Workers Health; Descriptive Epidemiology.
(22,2%). Comparando-se apenas os anos estudados, Em relação ao agente causador dos eventos,
obsevou-se um aumento de 90,1% no número de verifica-se na Tabela 2 que entre os veículos, as
registros de doenças relacionadas ao trabalho, de 11 motocicletas foram o principal meio de transporte
para 21 notificações. envolvido no acidente de trajeto (62,1%), seguidas
Em relação ao emitente, o estudo revelou que a maior pelas bicicletas (18,9%).
parte das comunicações (80,6%) ocorreu por conta do Ao analisar a situação geradora do acidente des-
empregador, seguido pelo Cerest (11,1%), sindicatos crita nas CAT, conforme se observa ainda na Tabela
de trabalhadores (7,6%) e dependente de segurado 2, predominaram: quedas (56,2%), nos acidentes de
(0,7%). Esses percentuais, entretanto, modificam-se de trajeto; aprisionamento, atrito ou abrasão (39,0%),
acordo com o tipo de acidente ou doença, sendo que nos acidentes típicos; e situações de reação do corpo
as doenças relacionadas ao trabalho possuem o Cerest a seus movimentos (41,7%), entre as doenças rela-
como principal emissor de CAT (37,5%). cionadas ao trabalho.
Os ramos de atividade com maior número de Os membros superiores foram a parte do corpo
acidentes de trabalho foram as indústrias de transfor- mais atingida nos acidentes típicos (67,2%) e doen-
mação, com 40,6% dos acidentes típicos e 54,1% de ças relacionadas ao trabalho (50,0%). Os membros
acidentes de trajeto. O ramo que envolve o comércio inferiores foram mais acometidos nos acidentes de
e a reparação de veículos automotores e motocicletas trajeto (37,5%).
contribuiu para as doenças relacionadas ao trabalho Fraturas representaram as lesões que mais afetaram
com 25,0% dos registros. os trabalhadores acidentados (48,4% dos acidentes
Em relação às características sociodemográficas dos típicos; 56,2% nos acidentes de trajeto), seguidas
trabalhadores, a média de idade foi de 35,6 anos: idade por escoriações, abrasão e corte (20,3% nos típicos;
mínima de 20 e máxima de 65 anos. Houve predomínio 18,8% nos de trajeto) e distensão ou torção (9,4%
de acidentes típicos e de trajeto nos trabalhadores do sexo para típicos; 14,6% para os de trajeto).
masculino, na faixa etária de 20 a 29 anos e solteiros. Inflamação de articulação, tendão ou músculo
Para as doenças relacionadas ao trabalho, observou-se constituiu a natureza da lesão que mais atingiu os tra-
equilíbrio entre os sexos dos indivíduos atingidos – tra- balhadores com doença comunicada ao INSS (46,9%),
balhadores casados, de 40 a 49 anos de idade. seguida por hérnia de qualquer natureza (28,1%) e
Os acidentes e doenças registrados ocorreram, asfixia (12,5%).
majoritariamente, entre trabalhadores com renda mais O capítulo XIX da CID-10, ‘Lesões, envenenamen-
baixa (Tabela 1). tos e algumas consequências de causas externas’,
Entre os acidentes e doenças registrados, a maior representou 82,8% dos acidentes típicos e 75,0% dos
proporção foi de trabalhadores da produção de bens e acidentes de trajeto, enquanto 65,6% dos casos de
serviços industriais (56,9%), destacando-se a confec- doenças relacionadas ao trabalho foram classificados
ção de calçados (47,6%) e a construção civil e obras de acordo ao capítulo XIII, ‘Doenças do sistema oste-
públicas (10,1%) (Tabela 1). omuscular e do tecido conjuntivo’.
Quanto às características dos acidentes, no turno As instituições do SUS, aqui representadas pelo hospital
diurno ocorreu o maior número desses eventos (87,5%), geral público e pelo Cerest, encarregaram-se da maior
havendo equilíbrio entre os turnos matutino (42,8%) e parte dos atendimentos aos trabalhadores (Tabela 3).
vespertino (44,6%). Os acidentes aconteciam, predomi- A maioria dos trabalhadores com CAT emitida
nantemente, no inicio de jornada de trabalho – menos (75,0%) não necessitou de internação, enquanto
de uma hora trabalhada: 28,6% – e no final da jornada 25,0% permaneceram hospitalizados e 0,7% (uma
– mais de cinco horas trabalhadas: 33,9% (Tabela 2). CAT, apenas) não contava com essa informação. Entre
Os locais com maior ocorrência de acidentes típicos os casos de internamento, 41,7% foram provocados
foram os estabelecimentos da empregadora (65,9%), por acidentes típicos, 33,3% por acidentes de trajeto
seguidos pela área rural (10,9%). Os acidentes de e 25,0% por doenças.
trajeto referiram a via pública (rua) como principal Apenas 3,5% dos trabalhadores não necessitaram
local de ocorrência, especialmente as ruas e avenidas de afastamento para recuperação do seu estado de
do distrito industrial do município (33,3%). saúde. Os trabalhadores acometidos por doenças ne-
Tabela 1 - Distribuição das características dos trabalhadores registradas nas Comunicações de Acidente do
Trabalho (CAT) emitidas em 2008 e 2009, no município de Jequié, Bahia. Brasil, 2010
cessitaram de um maior tempo de recuperação (31 a síndrome do túnel do carpo, tendinites, fraturas ex-
60 dias), comparados àqueles que sofreram acidentes postas, queimaduras de 3º grau, politraumatismos e
de trabalho: 53,1% (Tabela 3). patologias respiratórias.
Foram encontrados acidentes típicos, de trajeto e O estudo revela, ademais, consequências fatais
doenças do trabalho com mais de 120 dias de afas- por acidentes de trabalho. Foram comunicados dois
tamento, demostrando a existência de ocorrências óbitos (n=1 em 2008; n=1 em 2009) entre trabalha-
relevantes sobretudo, para a saúde dos trabalhadores: dores do sexo masculino, na idade de 20 e 29 anos,
perda auditiva induzida por ruído (PAIR), lombalgias, solteiros, remunerados mensalmente com até dois
Tabela 2 - Distribuição das características dos acidentes e doenças relacionadas ao trabalho registradas nas
Comunicações de Acidente do Trabalho (CAT) emitidas em 2008 e 2009, no município de Jequié,
Bahia. Brasil, 2010
salários mínimos. Ambos pertenciam aos ramos da muitos trabalhadores experimentaram: necessidade de
agricultura e do comércio, vítimas de acidentes típico reiniciar o tratamento e/ou manifestação de um agravo
e de trajeto, respectivamente. O acidente de trajeto da lesão que gerou incapacidade funcional.
ocorreu em via pública (rodovia): um acidente de Em relação ao tipo de acidente, prevaleceu o acidente
trânsito envolvendo automóvel. Já o acidente típico típico, seguido por trajeto e doença relacionada ao
contou com arma de fogo como agente causador: trabalho. Aqui, observou-se semelhança com a tipologia
uma situação de violência (assalto) no ambiente dos acidentes e doenças envolvendo trabalhadores no
de trabalho, em área rural. Os óbitos ocorreram no Brasil, segundo publicação da Previdência Social.6
momento dos acidentes. Em Botucatu, interior de São Paulo, foi desenvolvida
Os coeficientes de letalidade encontrados foram de uma pesquisa sobre CAT emitidas nos anos 2000 e
1,7% em 2008 e de 1,9% em 2009. Os coeficientes de 2001. Entre os 772 registros analisados, o acidente
mortalidade foram de 5,8 por 100 mil trabalhadores típico foi o principal causador de acidente (85,0%),
em 2008 e de 5,9 por 100 mil trabalhadores em 2009. seguido pelo acidente de trajeto (11,9%) e pelas do-
enças relacionadas ao trabalho (3,1%).11
Discussão Quanto ao número de registros dessas doenças, o
achado do estudo em tela revelou porcentagem maior
Ao tratar do perfil dos acidentes e doenças relacio- desse evento quando comparado aos resultados de
nadas ao trabalho em 2008 e 2009, o estudo demons- outras pesquidas,6,11 possivelmente explicado pela
trou não haver grandes modificações no número de existência de um Centro de Referência em Saúde do
comunicações realizadas nos dois anos estudados. O Trabalhador e sua eficiência no diagnóstico de doenças
elevado número de CAT de reabertura refletiu o que relacionadas ao trabalho. O estudo também indica
Relacionados ao Trabalho (LER/DORT) pode revelar as Não obstante suas limitações, o presente estudo,
transformações no processo de trabalho decorrentes ao focalizar a situação local dos acidentes e doenças
da introdução de novos modelos organizacionais e de relacionadas ao trabalho, busca contribuir para o
gestão.17 Fatores ligados à organização do trabalho, estabelecimento de prioridades e estratégias de ação
como fragmentação das tarefas, cobrança de produti- específicas, dirigidas aos trabalhadores acidentados
vidade e ritmo acelerado, associados a fatores biome- e/ou expostos a acidentes e doenças decorrentes do
cânicos, como atividades repetitivas, força, mobiliário processo laboral, no município de Jequié-BA.
e posições ergonomicamente inadequados, levam ao Esta pesquisa pretende chamar a atenção sobre um
aumento na ocorrências de doenças osteomusculares, problema que não compete apenas aos profissionais de
cuja evolução apresenta um caráter insidioso.17,22 saúde e sim a todos os segmentos da sociedade. Nesse
É importante ressaltar que a subnotificação e o sentido, algumas recomendações são indicadas visando
inadequado preenchimento das CAT são fatores de contribuir para a formulação e implementação de ações
dificuldade para a realização de estudos epidemio- de vigilância à saúde do trabalhador: realizar educação
lógicos sobre os acidentes e doenças relacionadas permanente junto aos profissionais de saúde, para o diag-
ao trabalho. A fonte de dados representada pelo CAT nóstico de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho,
deixa de considerar a parcela de trabalhadores que assim como para a importância da comunicação de tais
não contribui com a Previdência Social, o que ademais, eventos; sensibilizar as empresas sobre a necessidade da
constitui importante limitação para o presente estudo. adoção de medidas preventivas e de comunicação de aci-
A despeito desses entraves, a utilização das CAT é fun- dentes e doenças junto ao INSS; alertar os gestores locais
damental enquanto ferramenta de estudo dos agravos da necessidade de implementação da educação para o
que afetam a saúde dos trabalhadores. trânsito envolvendo, especialmente, motociclistas e ciclis-
Algumas medidas vêm sendo adotadas para melhor tas; e divulgar amplamente a problemática dos acidentes e
conhecer a magnitude dos acidentes e violências, doenças relacionadas ao trabalho para a população geral,
identificando problemas ocultos, como a relação das mais além dos trabalhadores e empregadores formais.
violências doméstica e sexual e os acidentes de trabalho.
Um exemplo da eficácia dessas medidas é a instituição Agradecimentos
do Sistema de Vigilância de Violências e Acidentes
(VIVA), composto pela vigilância das causas externas em À equipe do Centro de Referência em Saúde do
emergências hospitalares selecionadas (VIVA Contínuo) Trabalhador – Cerest – do município de Jequié-BA,
e pela vigilância de violências em serviços de referência pela disponibilização das Comunicações de Acidente
(VIVA Inquérito). Com o sistema VIVA, implantado pelo do Trabalho – CAT – e pelo acolhimento dos pesqui-
Ministério da Saúde no ano de 2006, também é possível sadores durante o estudo.
caracterizar os atendimentos por violências e acidentes
que incluem lesões de menor gravidade, e dessa forma, Contribuição dos autores
demonstrar a ocorrência de causas externas nos am-
bientes de trabalho, dando melhor visibilidade a um Todos os autores contribuíram para a elaboração,
problema todavia pouco discutido.23,24 análise e revisão final do manuscrito.
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Validity of the body mass index calculated from self-reported values for the classification of
anthropometric status in adults: validation study with residents in the municipality of Salvador,
state of Bahia, Brazil
Lucivalda Pereira Magalhães de Oliveira
Escola de Nutrição, Universidade Federal da Bahia, Salvador-BA, Brasil
Franklin Demétrio
Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Santo Antônio de Jesus-BA, Brasil
Resumo
Objetivo: avaliar a validade do índice de massa corporal (IMC) calculado a partir de medidas autorreferidas e aferidas, para uso
na classificação antropométrica. Métodos: estudo de validação realizado com 65 adultos residentes em Salvador, que responderam
a entrevista telefônica e tiveram peso e estatura aferidos. Utilizou-se teste t-pareado e coeficiente de correlação intraclasse (CCIC);
estimou-se sensibilidade, especificidade e valor preditivo positivo (VPP) do IMC obtido a partir do peso e estatura autorreferidos
e aferidos. Resultados: mulheres superestimaram sua estatura em 3,15cm (p<0,001), resultando em subestimação do IMC de
1,39kg/m2 (p<0,001), sem comprometimento da classificação antropométrica (p>0,05). Foram encontrados CCIC maiores que
60,0% para peso, estatura e IMC, segundo idade, sexo e escolaridade, exceto para estatura entre homens; e boa acurácia para
medidas autorreferidas. As medidas gerais de sensibilidade, especificidade e VPP foram 92,9%, 78,4% e 76,5%, respectivamente.
Conclusão: o IMC autorreferido mostou-se válido para ser utilizado na classificação antropométrica populacional.
Palavras-chave: Peso Corporal; Estatura; Índice de Massa Corporal; Sensibilidade e Especificidade; Estudos de Validação.
Abstract
Objective: to evaluate the validity of body mass index (BMI) calculated from self-reported weight and height and measured
for use in anthropometric classification. Methods: validation study involving 65 adults from Salvador city, Brazil, using a
telephone interview with weight and height measured in person. Paired t-test and interclass correlation coefficient (ICC)
were calculated; sensitivity, specificity and positive predictive value (PPV) of self-reported BMI were estimated and verified.
Results: women overestimated height by 3.15cm (p<0.001) with BMI underestimation of 1.39kg/m2 (p<0.001), but without
impairment on anthropometric classification (p>0.05). The study showed ICC greater than 60.0% for weight, height and BMI,
considering age, gender and schooling, except for male height; and accuracy for self-reported measures. The general measures
of sensitivity, specificity and PPV were 92.9%, 78.4% and 76.5%, respectively. Conclusion: self-reported BMI showed to have
been valid to be used on population anthropometric classification and monitoring.
Key words: Body Weight; Body Height; Body Mass Index; Sensitivity and Specificity; Validation Studies.
* Artigo originado da pesquisa ‘Implantação, avaliação e resultados de um sistema municipal de monitoramento de fatores
de risco nutricionais para doenças crônicas não transmissíveis a partir de entrevistas telefônicas em cinco capitais das
macrorregiões brasileiras (Simtel)’, financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico − CNPq.
Para compor o presente estudo, optou-se pela sele- (baixo peso); IMC >18,5 até 24,9kg/m2 (eutrofia);
ção das duas últimas listas – de 20 listas, inicialmente IMC ≥25 até 29,9kg/m2 (sobrepeso); e IMC >30,0kg/
construídas para o estudo Simtel –, para manter um m2 (obesidade). O individuo foi considerado com
intervalo de tempo menor entre as entrevistas. Foram excesso de peso quando apresentava sobrepeso ou
contatados 220 indivíduos, aleatoriamente seleciona- obesidade. A partir das medidas autorreferidas de
dos a partir das duas últimas listas, para participar de peso e estatura, o índice de massa corporal obtido
avaliação nutricional pelo Consultório Dietético da teve sua validade analisada com base nos valores de
Escola de Nutrição da Universidade Federal da Bahia sensibilidade, especificidade e valor preditivo positi-
(UFBa). Desses 220, 65 adultos compareceram à vo (VPP), tomando-se como parâmetro as medidas
consulta e realizaram as medidas de peso e estatura, aferidas, para que se chegasse à classificação correta
constituindo-se uma amostra por adesão. do IMC. As análises estatísticas foram realizadas pelo
Os indivíduos que responderam ao convite para software estatístico SPSS versão 13.0; adotou-se nível
participar da segunda etapa – presencial – deste de significância de 0,05.
estudo confirmaram as informações demográficas O estudo original contou com a aprovação dos
(sexo e idade) e sociais (escolaridade) fornecidas Comitês de Ética em Pesquisa da Faculdade de Saúde
por telefone, no período de maio de 2005 a janeiro Pública/Universidade de São Paulo e da Maternidade
de 2006. Essas informações foram registradas em Climério de Oliveira/Universidade Federal da Bahia.
questionários estruturados. Para a realização deste subprojeto, foi feito um adendo
Na consulta presencial, realizada no período de à nova proposta, aprovado pelo Comitê de Ética da
abril a junho de 2006, as medidas antropométricas Maternidade Climério de Oliveira/UFBa (Parecer/Re-
de peso e estatura foram aferidas em duplicata, por solução Aditiva nº 37/2005). Na entrevista presencial,
nutricionistas treinados com técnicas padronizadas cada participante assinou um Termo de Consentimento
segundo a proposta de Lohman e colaboradores.16 O Livre e Esclarecido. Aqueles que apresentaram altera-
peso foi aferido em balança eletrônica da marca Fili- ções clínico-nutricionais foram encaminhados para
zola, modelo E-150/3P, com capacidade para 150kg e acompanhamento pelo Consultório Dietético da Escola
precisão de 100g. Para a medição da estatura, utilizou- de Nutrição da UFBa.
se estadiômetro marca Leicester Height Measure, com
a leitura realizada no milímetro mais próximo. Em Resultados
caso de diferenças não aceitáveis (diferenças de valor
maiores de 100g para peso; e de 0,5cm, para estatura), A distribuição das variáveis demográficas e sociais
uma terceira medida foi aferida pelo supervisor.16 dos indivíduos investigados indicou predomínio do
Utilizou-se o teste t-pareado para detectar possíveis sexo feminino (46/65), média de idade de 38 anos,
diferenças das medidas autorreferidas e aferidas. Ado- maioria (37/65) dos entrevistados com menos de 40
tou-se o coeficiente de correlação intraclasse (CCIC), anos e nível de escolaridade de Ensino Médio (37/65)
que estima a proporção de variabilidade total observada, (Tabela 1). Entre os investigados, identificou-se que
atribuível entre os indivíduos. Foram considerados a diferença da média entre as medidas de peso foi
os critérios de Landis & Kock17 para interpretação da subestimada em 780g, quando comparada com as
concordância, a saber: quase perfeita, 0,81 a 1,00; informações das medidas aferidas, enquanto a estatura
substancial, 0,61 a 0,80; moderada, 0,41 a 0,60; regular, foi superestimada em 2,69cm e o IMC subestimado
0,21 a 0,40; discreta, 0 a 0,20; e pobre, <0. A discre- em 1,14kg/m2. As diferenças foram estatisticamente
pância nas informações de peso e estatura foi calculada significativas para as informações autorreferidas da
pela diferença entre as informações autorreferidas e estatura e do IMC (Tabela 2).
as aferidas. Para efeito de interpretação, as diferenças Ao analisar as diferenças entre as informações
positivas e negativas representam, respectivamente, antropométricas autorreferidas e aferidas segundo o
superestimação e subestimação de valores verdadeiros. sexo, observou-se que somente as mulheres superes-
Para a classificação do estado antropométrico timaram a estatura significativamente (p<0,001) e,
de adultos, foram adotados os pontos de corte da por conseguinte, seu IMC foi subestimado (p<0,001)
Organização Mundial da Saúde:18 IMC <18,5kg/m2 (Tabela 2).
Tabela 2 - Diferença entre as médias das medidas de peso e estatura autorreferidas e aferidas e índice de
massa corporal (IMC) da população estudada, no total da amostra e por sexo, no município de
Salvador, estado da Bahia. Brasil, 2006
60 56,9
p=0,49
50 47,7
44,6 p=0,72
40 38,5
30
%
20
10 7,7
4,6
0
Baixo peso Eutrofia Excesso de peso
Autorreferido Aferido
Figura 1 - Classificação do estado antropométrico a partir do índice de massa corporal (IMC) obtido de medidas
autorreferidas e aferidas da população estudada no município de Salvador, estado da Bahia.
Brasil, 2006
Tabela 3 - Coeficiente de Correlação Intraclasse (CCIC) entre medidas autorreferidas e aferidas de peso, estatura
e índice de massa corporal (IMC) da população estudada no município de Salvador, estado da Bahia.
Brasil, 2006
Tabela 4 - Sensibilidade, especificidade e valor preditivo positivo para classificação de excesso de peso pelo
índice de massa corporal (IMC) obtido a partir de medidas autorreferidas e aferidas da população
estudada, segundo características demográficas e socioeconômicas, no município de Salvador,
estado da Bahia. Brasil, 2006
No presente estudo, a estatura foi superestimada os observados por Lucca e Moura21 e similares aos
– de maneira estatisticamente significativa – apenas resultados registrados por outros estudos nacionais3,4,6
pelas mulheres. Embora tenha sido registrada supe- e internacionais.22,23
restimação da estatura e consequente subestimação do A sensibilidade do IMC proveniente das medidas
IMC, isto não comprometeu a classificação do estado autorreferidas para a identificação de indivíduos com
antropométrico da população estudada. Resultados excesso de peso situou-se entre 62,5 e 91,2%, no grupo
similares foram observados por outros investigadores estudado. Os participantes com menos de 40 anos, do
no Brasil,3,4,15,19 o que reforça a premissa de erro na sexo feminino e com menor escolaridade informaram
direção de um padrão cultural que, além da magreza, as medidas de peso e estatura mais próximas do valor
valoriza a elevada estatura para o sexo feminino. De real, o que está em acordo com resultados de outros
acordo com Ziebland e colaboradores,20 esses resul- estudos nos quais se observou maior sensibilidade do
tados também podem ser parcialmente explicados IMC para identificar mulheres com excesso de peso,
pelo fato de as pessoas em geral, mesmo aquelas que comparativamente aos homens;24 entretanto, os re-
recebem cuidados médicos periódicos, não terem sua sultados do presente estudo diferem dos encontrados
estatura aferida com frequência e por isso desconhe- por Lim e colaboradores,23 em que a sensibilidade
cerem sua verdadeira medida. para identificar excesso de peso/obesidade foi maior
O efeito da variação no valor da estatura autor- para homens. No que se refere à especificidade do IMC
referida, em relação ao valor da estatura aferida, determinado com base nas medidas autorreferidas, os
convergiu para que o IMC fosse subestimado, com resultados foram similares aos observados em outras
diferença estatisticamente significativa somente para investigações, cujas especificidades foram ligeiramente
as mulheres. A subestimação do IMC entre mulheres mais elevadas para as mulheres.6,23
também foi observada em amostra de funcionários de O valor preditivo positivo, à semelhança de outros
um banco estatal no Rio de Janeiro-RJ3 e em indivíduos estudos,23 foi maior para mulheres, sugerindo maior
maiores de 40 anos residentes na Região Metropolitana acurácia desses paramentos para o sexo feminino.
de São Paulo-SP,21 utilizando metodologia similar à A classificação do estado antropométrico mostra
do presente estudo. Aqui, os níveis de concordância que a ocorrência de excesso de peso identificada
intraclasse observados validam a utilização do IMC pelo IMC obtido com as medidas de peso e estatura
obtido nas mesmas circunstâncias, para o mesmo autorreferidas não diferiu, de forma significante
grupo populacional. Destaca-se que os valores encon- estatisticamente, daquela encontrada a partir do IMC
trados no presente estudo são mais elevados do que aferido. Esse resultado é similar ao de relatos de
outros estudos4-6 e corrobora o uso do IMC obtido de as autorreferidas. Ressalta-se que as diferenças possíveis
medidas de peso e estatura autorreferidas em estudos de haver ocorrido, por superestimação da altura ou
de prevalência e controle do sobrepeso e obesidade. subestimação do peso, não foram suficientes para alte-
Não obstante os resultados apresentados aqui rar a classificação do estado antropométrico pelo IMC.
indicarem que a informação autorreferida de peso cor- Esses resultados, associados a outros gerados no
poral e estatura possa ser de boa qualidade, o estudo Brasil, indicam que a informação sobre as medidas de
apresenta limitações. Os resultados encontrados não peso e estatura obtidas via entrevista telefônica podem
podem ser estendidos à população geral de Salvador- constituir um instrumento viável, prático e econômico,
BA, pois não foram originados de amostra probabi- a ser utilizado em estudos como screening nutricional e
lística de indivíduos da cidade, além de apresentarem monitoramento do estado antropométrico da população.
diferentes proporções entre homens e mulheres.
Há, também, o possível viés ocasionado pela técnica Agradecimentos
amostral adotada e pela captação da amostra,25 uma vez
que a seleção aconteceu por adesão voluntária: parte dos Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico
indivíduos recrutados não compareceu à consulta nutri- e Tecnológico – CNPq –, pelo financiamento da pesqui-
cional. É possível que indivíduos conhecedores de suas sa ‘Implantação, avaliação e resultados de um sistema
medidas de peso e estatura possam, diferentemente dos municipal de monitoramento de fatores de risco nu-
demais participantes, estar mais motivados a participa- tricionais para doenças crônicas não transmissíveis a
rem do estudo, influenciando positivamente o resultado. partir de entrevistas telefônicas em cinco capitais das
Considera-se como mais uma limitação do estudo macrorregiões brasileiras (Simtel)’, coordenada pelo
a não realização do cálculo da estimativa do erro téc- Prof. Carlos Augusto Monteiro, da Faculdade de Saúde
nico de medida (definido como o desvio padrão entre Pública da Universidade de São Paulo.
medidas repetidas), de duas formas: intra-avaliador,
quando se avalia a variabilidade das medidas repetidas Contribuição dos autores
em uma mesma pessoa pelo mesmo antropometrista; e
interavaliador, quando se avalia a variação de medidas Oliveira LPM e Assis AMO participaram da concep-
realizadas em uma mesma pessoa por diferentes an- ção do projeto, coleta e análise dos dados, interpreta-
tropometristas.26 Como um mecanismo de controle de ção dos resultados e redação do manuscrito.
qualidade e buscando minimizar os erros das medidas, Queiroz VAO participou da coleta e análise dos dados,
os antropometristas foram treinados e avaliados perio- interpretação dos resultados e redação do manuscrito.
dicamente. Também foi realizada calibração e aferição Silva MCM, Pitangueira JCD, Costa PRF e Franklin
dos instrumentos de medida durante todo o estudo. Demétrio participaram da análise dos dados, interpre-
Por último, é mister lembrar aqui a possibilidade tação dos resultados e redação do manuscrito.
de o estudo apresentar um viés de informação devido à Anjos MCG participou da análise dos dados e inter-
diferença temporal entre a coleta das medidas aferidas e pretação dos resultados.
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Aprovado em 25/05/2012
Assessment of dental treatment needs and productive capacity of primary dental care in the
municipality of Pelotas, state of Rio Grande do Sul, Brazil, 2009
Aluísio J. D. Barros
Programa de Pós-Graduação em Epidemiologia, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas-RS, Brasil
Resumo
Objetivo: descrever as necessidades de tratamento odontológico da população e a capacidade produtiva da atenção básica
no município de Pelotas, Rio Grande do Sul. Métodos: foram utilizados dados do inquérito de saúde bucal de 2003 para estimar
indicadores de necessidade de restaurações, extrações e tratamento periodontal entre indivíduos com 15 anos ou mais de idade,
segundo faixa etária e renda. O potencial produtivo foi estimado a partir dos dados do Sistema de Informações Ambulatoriais
(SIA/SUS). Resultados: mais de 234 mil indivíduos tinham necessidade de tratamento, incluindo 274.085 elementos dentários
necessitando de restauração, 107.659 de extração, 282.986 sextantes necessitando remoção de cálculo e 17.803 de tratamento
periodontal. Assim, seriam necessárias mais de 680 mil consultas clínicas, em grande desproporção com a produção ambulatorial
do município no ano de 2008, de 47.179 procedimentos. Conclusão: o potencial produtivo do serviço odontológico era deficitário
para atender a todas as necessidades da população.
Palavras-chave: Atenção Primária à Saúde; Necessidades e Demandas de Serviços de Saúde; Assistência Odontológica Integral;
Saúde Bucal.
Abstract
Objective: to describe dental treatment requirements and productive capacity of primary health care in the municipa-
lity of Pelotas, Brazil. Methods: This study used data from the 2003 National Oral Health Survey to estimate the indicators
of individuals 15 years or above, that needed restorations in the teeth, extractions, and periodontal treatment, by age and
income. The productive potential of the city was estimated using data from the Ambulatory Care Information System/Natio-
nal Health System. Results: over 234,000 individuals showed a need of dental treatment; 274,085 needed teeth restoration;
107,659 needed extraction; 282,986 sextants with needs of calculus removal; and 17,803 needed periodontal treatment. The
680,000 dental visits that were necessary are hugely disproportional compared with the 47,179 procedures performed in
the municipality in 2008. Conclusion: productive capacity of the public oral health care in Pelotas-RS was far from being
sufficient to cater to all the needs of the population.
Key words: Primary Attention; Health Services Needs and Demand; Comprehensive Dental Care; Oral Health.
de Saúde Bucal da População do Rio Grande do Sul’ em que estimam em 18,0% a população do Estado do Rio
2003 (SB/RS 2003), além de dados do IBGE. O SB/RS Grande do Sul coberta por planos privados de saúde.
2003 é parte de um inquérito nacional e incluiu uma Assim, aplicou-se redução de 20,0% nas necessidades
ampliação da amostra original. Maiores informações estimadas para esse grupo.
sobre a metodologia desse estudo estão disponíveis no Como os dados do SB/RS 2003 são limitados a
relatório final do SB-Brasil.12 algumas faixas etárias, não é possível estimar dire-
No inquérito, foram estudados os grupos etários de tamente as necessidades para todas as idades, razão
18-36 meses e de 5, 12, 15-19, 35-44 e 65-74 anos. porque foram utilizados modelos de regressão com
No presente estudo, foi analisada a população a partir polinômios fracionais, para interpolar as estimativas
dos 15 anos de idade, de quem houvesse informação de necessidade dos grupos sem informação. Essa
de renda, estimando-se as necessidades de tratamento estratégia inclui uma família de curvas muito mais nu-
restaurador, extrações e tratamento periodontal. merosa, permitindo o ajuste adequado ao modelo.15 Os
Para a avaliação de necessidades de restaurações e modelos foram ajustados com as necessidades como
extrações dentárias, foi utilizada uma estratégia cons- desfecho, e a idade em anos inteiros como preditor,
tituída de dois passos. Em primeiro lugar, estimou-se separadamente para os 40,0% de menor renda e os
o percentual de indivíduos com alguma necessidade, 60,0% de maior renda.
para cada idade. A seguir, e apenas para o grupo com Dados demográficos do município referentes ao
necessidade, estimou-se o número médio de dentes número de habitantes para cada grupo etário foram
que necessitavam de tratamento, também por idade. extraídos do sistema de consultas SIDRA (Sistema
Ao final, estimou-se o número total de indivíduos e de IBGE de Recuperação Automática), com base no
elementos dentários com necessidade de tratamento. Censo Demográfico de 2000, realizado pelo IBGE,16 e
Para a avaliação de necessidades de tratamento perio- utilizados com o intuito de expandir as necessidades
dontal, foi realizado processo semelhante, embora a de tratamento da amostra para o total da população
avaliação fosse realizada por sextante. do município.
As necessidades de tratamento para cárie dentária, A estimativa de necessidades de tratamento odon-
estimadas a partir de dados do SB/RS 2003, foram tológico da população estudada em Pelotas-RS foi
classificadas como ‘tratamento restaurador de uma realizada em duas etapas:
ou mais superfícies’ e ‘extração dentária’. - primeiramente, estimou-se o percentual de indiví-
Em relação às doenças periodontais, as necessida- duos da amostra com necessidade de tratamento:
des de tratamento foram estimadas com base nos dados utilizou-se a amostra total para o Estado do Rio
de morbidade, de acordo com o número de sextantes Grande do Sul, visto que as análises comparativas
apresentando cálculo dental e bolsa periodontal a realizadas junto ao banco de dados SB/Brasil-RS
partir de 4mm. Para necessidade de tratamento 2003 entre a macrorregião de Pelotas-RS, de cuja
periodontal, optou-se por não incluir o sangramen- amostra o Município fez parte, e os dados do Estado
to gengival, por ser essa uma condição sensível às apresentaram resultados bastante semelhantes; a
medidas de promoção e prevenção em saúde bucal, utilização da amostra do Estado (N=24.988) e não
passível de ser executada por profissionais auxiliares apenas da subamostra da macrorregião de Pelotas-
com supervisão do cirurgião-dentista e não exigindo, RS (N=2.411) implica um ganho substancial de
necessariamente, tratamento clínico.13 precisão nas estimativas;
A população foi dividida em quintis de renda - segundamente, as proporções estimadas foram
familiar e a estratégia aqui descrita foi aplicada se- aplicadas à população total do Município, a partir
paradamente, para dois grupos: os 40,0% de menor de dados do Censo 2000.
renda; e os 60,0% de maior renda. Os 40,0% da Para o cálculo do potencial produtivo de Pelotas-RS,
população com menor renda familiar foram tratados utilizou-se o banco de dados do Sistema de Informa-
integralmente, como usuários do serviço público. ções Ambulatoriais, do Sistema Único de Saúde (SIA/
Dos 60,0% restantes, considerou-se 20,0% deles SUS),16 de onde foram retirados os dados de produção
usuários de serviços privados, com base nos dados do atendimento odontológico ambulatorial no municí-
da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS)14 pio. Os dados utilizados no estudo referem-se à produ-
ção ambulatorial local no ano de 2008 e contemplam de Medicina da Universidade Federal de Pelotas, sob
o número e o tipo de procedimento odontológico o no 077/09.
realizado pela rede de Atenção Básica. O banco de
dados do Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Resultados
Saúde (CNES)17 foi utilizado para a obtenção dos dados
de infraestrutura do município e equipes odontoló- A rede de atenção básica do município realizou
gicas: número de equipamentos; e número e tipo de 120.070 procedimentos durante o ano de 2008. A
profissionais (cirurgiões-dentistas, técnicos em saúde Tabela 1 apresenta os procedimentos ambulatoriais
bucal, auxiliares de saúde bucal). Essas informações referentes às necessidades estudadas: restaurações,
foram utilizadas para avaliar a capacidade instalada extrações e tratamentos periodontais. Na totalidade,
da rede municipal: número de UBS com consultórios foram realizados 47.179 procedimentos nos serviços
odontológicos; unidades que prestam atendimento es- de saúde bucal, sendo que as restaurações (42,4%) e
pecializado; e número de cirurgiões-dentistas disponí- as raspagens supragengivais (33,4%) foram os mais
veis para atendimento. Informações junto à Secretaria frequentes.
Municipal de Saúde de Pelotas-RS foram consultadas Na Figura 1, observam-se as retas com as intrapo-
para checar possíveis divergências entre os dados do lações das necessidades de tratamento odontológico
CNES e a situação encontrada no nível local, além de estimadas para o presente estudo, segundo os mode-
informações sobre o gerenciamento do serviço, turnos los de polinômios fracionais. Os quatro gráficos que
de atendimento odontológico efetivo segundo tipos de compõem a figura mostram as grandes mudanças de
programas oferecidos. necessidade com o decorrer da idade: crescentes para
O cálculo do potencial produtivo da rede de Atenção extrações; e decrescentes para as demais necessida-
Básica em Saúde Bucal foi avaliado de acordo com os des avaliadas. As necessidades também variaram em
parâmetros estabelecidos pelo Departamento Nacional relação aos quintis de renda, principalmente para as
de Auditoria do SUS (Denasus)/Ministério da Saúde, exodontias e restaurações, inversamente proporcionais
que estabelece o número de consultas por turno de à renda. Para as necessidades periodontais, pouca
atendimento.18 O Denasus/MS define um número de diferença em relação aos estratos de renda foi obser-
três atendimentos/hora/profissional, com tempo médio vada para raspagem supragengival. As necessidades
de 20 minutos e média de 22 dias úteis/mês. Portanto, de raspagem subgengival, que se mantiveram estáveis
a fórmula do cálculo do potencial produtivo foi: nº com a idade, no estrato de maior renda, reduziram-se
de turnos de atendimento × carga horária diária × 3 entre aqueles de menor renda.
consultas/hora × 22 dias úteis/mês. As necessidades estimadas estão demonstradas na
O Ministério da Saúde recomenda que 75,0 a 85,0% Tabela 2, que apresenta o número de indivíduos, de
das horas contratadas devem ser dedicadas à assistên- dentes e de sextantes com necessidade de cada tipo
cia, e o restante do tempo utilizado para outras ativi- de procedimento. Considerando-se que um mesmo
dades.4 Como o serviço de saúde bucal de Pelotas-RS indivíduo pode necessitar de mais de um procedimento,
não preconiza a redução da carga horária para essas as necessidades foram calculadas por procedimento:
atividades, nem possui pessoal auxiliar, o cálculo foi 274.085 elementos dentários necessitavam de restaura-
realizado de acordo com a situação real, alocando a ções; 107.659, extrações; 282.986 sextantes, tratamento
carga horária integral para atividades clínicas. para remoção do cálculo dentário; e 17.803 sextantes
As necessidades de tratamento da população estima- necessitavam de tratamento para bolsa periodontal. As
das neste estudo foram comparadas com os dados de necessidades mais prevalentes entre a população de 15
produção ambulatorial do município e com o potencial anos de idade ou mais foram a raspagem periodontal su-
produtivo da rede de Atenção Básica em Saúde Bucal, pragengival (46,0%) e os procedimentos restauradores
o que possibilitou concluir o tempo necessário para a (39,7%). Somente para a resolução das necessidades de
realização de todos os procedimentos odontológicos tratamento levantadas pelo estudo, seriam necessárias ao
assistenciais necessários, nesta avaliação. menos 682.533 consultas clínicas, o que representa mais
O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de de 14 vezes a produção anual registrada pelo município
Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Faculdade de Pelotas-RS em 2008.
Tabela 1 - Produção ambulatorial por necessidades avaliadas no município de Pelotas, estado do Rio Grande do
Sul. Brasil, 2009
Média de dentes com necessidade de extração Média de dentes com necessidade de restauração
4 4
3 3
Média de dentes
Média de dentes
2 2
1 1
0 0
0 10 20 30 40 50 60 70 80 0 10 20 30 40 50 60 70 80
Idade em anos Idade em anos
Média de sextantes com necessidade de raspagem supragengival Média de sextantes com necessidade de raspagem subgenvival
4 4
3 3
Média de sextantes
Média de sextantes
2 2
1 1
0 0
0 10 20 30 40 50 60 70 80 0 10 20 30 40 50 60 70 80
Idade em anos Idade em anos
Figura 1 - Necessidades de tratamento odontológico estimadas para indivíduos com 15 anos de idade ou mais,
segundo os Modelos de Regressão de Polinômios Fracionais. Brasil, Inquérito de Saúde Bucal 2003
Tabela 2 - Necessidades em saúde bucal da população de 15 anos de idade ou mais no município de Pelotas,
estado do Rio Grande do Sul, a partir de estimativa baseada no Inquérito de Saúde Bucal 2003.
Brasil, 2009
de idade. Outra limitação refere-se à não inclusão, Estudo sobre o uso dos serviços públicos odon-
nas estimativas, das necessidades de tratamentos tológicos no Município revelou que a população de
pulpares e reabilitações com próteses, por falta de menor renda fazia mais uso desses serviços,23 resultado
parâmetros para o cálculo do número de consultas: a consistente com estudo realizado a partir de dados do
Saúde Bucal do município não oferece esses serviços. SB Brasil 2003.24 Estes estudos também identificaram
Contudo, mais do que identificar o número exato de que os usuários dos serviços públicos tiveram maior
necessidades e consultas assistenciais necessárias para probabilidade de realizar essa consulta motivados
resolução dos problemas de saúde bucal da população, por algum problema, quando comparados àqueles
este trabalho demonstra que um modelo de atenção à que utilizaram os mesmos serviços de forma regular
saúde voltado exclusivamente ao atendimento clínico ou preventiva. Camargo e colaboradores23 apontam
acaba por acumular enormes necessidades de trata- que 80,0% dos usuários procuraram pelo serviço
mento. Não foram identificados na literatura acadêmica odontológico público de Pelotas-RS em decorrência
outros estudos com o objetivo de avaliar o déficit do de um problema instalado.
potencial produtivo em relação às necessidades de Sendo a população de menor renda a que apresenta
tratamento odontológico, o que denota a originalidade maior necessidade acumulada de tratamento odon-
do trabalho, embora limite a comparação dos resul- tológico, é compreensível que os serviços públicos
tados encontrados. vejam-se pressionados a dedicar grande parcela de
Este trabalho também evidenciou as acentuadas sua capacidade produtiva para resolver problemas
diferenças nas necessidades de tratamento por estratos pontuais. Por não lograr reduzir a incidência de pro-
de renda, evidenciando um quadro de iniquidades blemas mediante ações preventivas, essa estratégia de
dos agravos bucais. A relação entre doenças bucais e resposta à pressão imediata dos usuários leva a um
iniquidades de renda pode ser explicada por diferenças aumento das necessidades de tratamento no médio e
nos comportamentos em saúde e acesso a serviços. no longo prazos, até o ponto em que o sistema não é
Indivíduos com piores condições socioeconômicas mais capaz de atender a demanda. Estudo realizado
possuem maior prevalência de tabagismo,19 consomem no Rio Grande do Sul identificou que moradores dos
maior quantidade de alimentos doces,20 reproduzem municípios com maiores taxas de procedimentos
piores padrões de higiene bucal21 e acessam ou utili- individuais preventivos tiveram menor chance de
zam com menor frequência os serviços de saúde pre- apresentar cárie não tratada, quando comparados
ventivos e assistenciais.22,23 Em Pelotas-RS, a proporção aos habitantes dos municípios que apresentavam as
de adultos que utilizaram os serviços de saúde bucal no menores taxas desses procedimentos, sinalizando
ano anterior foi de 66,2% no grupo de indivíduos com que o serviço público pode ter contribuído para a
maior renda, frente a 41,9% no grupo de indivíduos diminuição do número de cáries não tratadas.25 Não é
com menor renda.22 tarefa fácil organizar um serviço que contemple tanto
ações preventivas quanto uma oferta assistencial que diassem o planejamento da assistência.29 A alternativa
estimule sua utilização de forma regular. Não obstante, que se apresenta viável, especialmente por seu co-
a busca desse equilíbrio é necessária. nhecido potencial preventivo, é a de um modelo que
O presente estudo demonstrou um aumento das enfatize ações de promoção e prevenção em saúde
necessidades de exodontia proporcional à idade, o que bucal tendo como meta a redução da incidência das
pode refletir a não exposição da população adulta aos respectivas patologias. A médio prazo, essa estratégia
benefícios do flúor no decurso de sua vida. Daí viria o – se implementada de forma efetiva – poderá resultar
maior acúmulo de cárie, suas sequelas e consequente na redução das necessidades clínicas e consequente
necessidade de perda dentária, conforme observaram diminuição da pressão da demanda sobre o serviço.5
Peres e colaboradores26 e Narvai e colaboradores27 O O município de Pelotas-RS oferece assistência,
aumento das necessidades de exodontia acaba por ser não atua na prevenção das doenças bucais. Assim, as
inversamente proporcional às necessidades restau- necessidades de tratamento tornam-se extremamente
radoras, uma vez que o edentulismo aumenta com a elevadas e geram alto custo para a sociedade, não ape-
idade. No Brasil, a proporção de pelo menos um dente nas no aspecto financeiro como no sofrimento gerado
perdido devido à cárie foi de 38,9% em adolescentes pelas doenças bucais. Completando o quadro de ina-
de 15 a 19 anos,28 de 55,0% nos adultos entre 35 e 44 dequação, fica evidente que o potencial produtivo do
anos3 e chegou a 92,9% no grupo dos idosos, entre serviço odontológico de Pelotas-RS está muito aquém
65 e 74 anos de idade.12 Barbato e colaboradores3 de atender a todas as necessidades da população.
também encontraram que a redução das necessidades
periodontais aumentava com a idade e nos estratos de Contribuição dos autores
menor renda. Essa redução pode ser explicada pelo
aumento progressivo da perda dentária nesses grupos.3 Jaccottet CMG desenvolveu a hipótese do estudo,
No Brasil, os modelos de assistência, em muitos analisou e interpretou os dados e redigiu a primeira
casos, foram implementados pela simples cópia do versão do manuscrito.
modelo da prática privada e sua aplicação ao setor Barros AJD, Camargo MBJ e Cascaes AM analisaram
público, com enfoque individual e curativo-reparador, e interpretaram os resultados e realizaram a revisão
sem utilizar informações epidemiológicas que subsi- crítica do artigo.
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Mesa J, Menezes AM. Tabagismo no Brasil: Aprovado em 25/05/2012
Resumo
Objetivo: descrever aspectos da prescrição e cuidado a pacientes em Unidades Básicas de Saúde da Família (UBSF) do muni-
cípio de Esperança, estado da Paraíba, Brasil. Métodos: estudo descritivo, sobre indicadores de prescrição e cuidado ao paciente
propostos pela Organização Mundial da Saúde; amostra de conveniência, composta por pacientes maiores de 18 anos atendidos em
janeiro-agosto de 2007. Resultados: foram considerados 600 pacientes, com média de medicamentos/receita de 2,4, 74,6% dos
medicamentos prescritos pelo nome genérico e 85,3% constantes da Relação Municipal de Medicamentos Essenciais (REMUME);
9,3% das receitas continham ao menos algum antibiótico, 10,1% algum psicofármaco e 2,97% alguma medicação injetável; foram
dispensados 48,0% dos medicamentos prescritos; o tempo médio de dispensação foi de 49 segundos e o tempo médio de consulta,
7 minutos e 8 segundos. Conclusão: os prescritores seguem a relação de medicamentos padronizados embora a REMUNE necessite
atualizá-la periodicamente para atender o perfil epidemiológico populacional.
Palavras-chave: Assistência Farmacêutica; Medicamentos Essenciais; Prescrições de Medicamentos.
Abstract
Objective: to discribe aspects of prescription and patient-care at Healthcare Units of Family Health (HUFH) in the
municipality of Esperança, state of Bahia, Brazil. Methods: a descriptive cross-sectional study on prescription and patient-
care indicators proposed by the World Health Organization. Results: average for prescribed drugs were 2.4; 74.6% of the
medicaments were prescribed by generic name; 85.3% were listed by the Municipal List of Essential Drugs (REMUME); 9.3%
had at least one antibiotic; 10.1% had at least one psychotropic; and 2.97%, at least an injectable medication; 48.0% of the
prescribed drugs were effectively dispensed; the average time of dispensation was 49 seconds, and the medical consultation
time, 7 minutes and 8 seconds. Conclusion: prescription follows standard list recommended, but REMUME needs actuali-
zation to attend the epidemiologic profile of the population.
Key words: Pharmaceutical Services; Drugs, Essential; Drug Prescriptions.
A coleta dos dados ocorreu entre janeiro e agosto micos como sexo, idade, escolaridade e renda, para
de 2007 e os indicadores foram calculados conforme caracterização da amostra. Após a saída do paciente
apresentado na Figura 1. do, caso ele houvesse recebido uma receita, os medi-
Para análise dos indicadores de prescrição, a OMS camentos prescritos foram transcritos no formulário
recomenda que a amostra seja representativa e que a para análise.
aplicação dos indicadores seja realizada em 20 unida- A classificação dos medicamentos na nomenclatura
des de saúde ou em todas as unidades locais.7 Como o genérica tomou como referência a Denominação Co-
município possuía tão-somente 10 UBSF, todas foram mum Brasileira (DCB)10 e, em sua ausência, a Denomi-
incluídas no estudo. nação Comum Internacional (DCI).11 Os medicamentos
Segundo recomendação da OMS,7 foram entrevis- foram classificados pelo Índice de Classificação Anatô-
tados 60 pacientes que haviam passado por consulta mico, Químico e Terapêutico (ATC)12 para conhecer os
médica, em cada UBSF. Totalizou-se 600 entrevistas de medicamentos e classes terapêuticas mais prescritas.
pacientes, habilitados para o estudo de acordo com O tempo médio de consulta foi avaliado sobre o total
os seguintes critérios: maior de 18 anos de idade que dos 600 pacientes e, para cada um deles, do momento
se apresentou à consulta médica desacompanhado quando entrou até sair da sala de consulta, o tempo
e capaz de se comunicar – paciente não debilitado. transcorrido foi contabilizado por cronômetro.
A coleta ocorreu durante todo o horário de fun- As informações referentes ao tempo médio de
cionamento da unidade e a amostra, selecionada por dispensação, à porcentagem de medicamentos dispen-
conveniência, contemplou os pacientes que aceitaram sados e àqueles adequadamente rotulados foram ava-
participar e se encaixaram nos critérios de inclusão, liadas isoladamente, por não manterem relação entre si
até que se completasse o número estipulado de entre- e suas análises serem de fato independentes. Para esses
vistados por UBSF. indicadores, a coleta aconteceu nos meses de julho e
Antes de o paciente adentrar o consultório médico, agosto, de segunda a sexta-feira, no turno da manhã
um contato preliminar foi realizado, ocasião quando (único horário de funcionamento), exclusivamente
foram coletados dados demográficos e socioeconô- na farmácia central do município, haja vista o fato de
Procedimento N %
Houve prescrição de medicamentos 474 79,0
Nenhum procedimento médico-terapêutico 64 10,7
Solicitação de exames 42 7,0
Encaminhamento para outras especialidades médicas 18 3,0
Manutenção de tratamento medicamentoso prescrito por outro profissional 2 0,3
TOTAL 600 100,0
15:00
13:39
12:00
10:26
09:00
07:08 07:14
06:36 06:20 06:48
06:06
Horas
06:00 05:41
04:13 04:22
03:00
00:00
3
ral
1 0
SF
SF
SF
SF
SF
SF
SF
SF
SF
ge
SF
UB
UB
UB
UB
UB
UB
UB
UB
UB
UB
dia
Mé
Figura 2 - Tempo médio de consulta entre os atendimentos (n=600) realizados em Unidades Básicas de Saúde
da Família (UBSF) do município de Esperança, estado da Paraíba. Brasil, agosto-setembro de 2007
Anti-hipertensivos 41,6
Antimicrobianos 13,6
Ilegível 10,1
Outros 66
Antiparasitários 6,3
Fitoterápicos 0,2
0 5 10 15 20 25 30 35 40 45
%
Figura 3 - Grupos farmacológicos mais prescritos aos pacientes atendidos (n=600) em Unidades Básicas de
Saúde da Família do município de Esperança, estado da Paraíba. Brasil, agosto-setembro de 2007
regimes posológicos e adequá-los aos hábitos de vida nº 10/01, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (An-
do paciente sempre que possível.22 visa), estabelecendo critérios a serem respeitados pela
Em relação à prescrição dos medicamentos pelo prescrição médica e pela dispensação de genéricos no
nome genérico, a proporção encontrada (74,6%) foi âmbito do SUS, as prescrições assinadas pelo profissional
bastante próxima à observada em Brasília-DF (73,2%)14 responsável adotarão, obrigatoriamente, a Denominação
e Ponta Grossa-PR (70,2%),15 inferior à média nacional Comum Brasileira – DCB – ou, em sua falta, a Denomi-
(84,2%)17 e superior à de Ribeirão Preto-SP (30,6%).13 nação Comum Internacional – DCI.2 Importante fator de
Entre as UBSF, houve uma variação de 57,6 a 85,6%, interferência nesse indicador é a existência, no mercado
mostrando mais adesão por parte de alguns prescritores farmacêutico brasileiro, de medicamentos com elevado
do que por outros. O hábito de prescrever pelo nome número de associações. Nesse caso, o prescritor pode
genérico tem grande impacto na racionalização das encontrar dificuldades para o exercício de sua função,
ações da assistência farmacêutica, baixando os custos seja por deficiência na formação acadêmica, seja por
de aquisição desses produtos e facilitando a adoção de falta de condições de consulta à DCB, e assim, tender à
protocolos ou padronização de esquemas terapêuticos. prescrição pelo nome fantasia.14
Considerando-se a legislação vigente no país, espera- Uma das classes de medicamentos que trazem mais
se que a proporção de medicamentos prescritos pelo prejuízos – quando utilizados inadequadamente – é
nome genérico seja muito próxima dos 100,0%, haja a dos antibióticos. A porcentagem de receitas aqui
vista a obrigação legal de o Serviço Público prescrever analisadas em que se prescreveram antibióticos foi de
por essa denominação genérica. Segundo a Resolução 9,4%, condizendo com a estimativa recomendada pela
OMS7 de que ela deve ser inferior a 20,0%. O valor rando as expectativas da OMS7 de adesão de 70,0%.
encontrado está abaixo do referido em Ribeirão Preto- O valor encontrado foi equivalente à média nacional
SP (21,3%),13 Brasília-DF (26,4%),14 Ponta Grossa-PR (78,3%),17 porém inferior ao encontrado em Brasília-
(33,0%)15 e Campina Grande-PB (21,1%).16 DF (85,3%),14 Ponta Grossa-PR (87,0%)15 e Campina
O principal problema quanto aos antibióticos é de Grande-PB (91,9%).16 Entre as UBSF, a adesão da RE-
que seu uso indiscriminado pode resultar em resistên- MUME variou de 35,8 a 75,9%. É importante salientar
cia de bactérias, aumentando os casos de infecções e, que todas as unidades da zona urbana apresentaram
consequentemente, maior ônus para o sistema público valores inferiores a 70,0%, possivelmente relacionados
de saúde e o usuário, gerando dificuldades para o a falhas na padronização dos medicamentos, senão a
controle da doença. hábitos prescricionais.
A baixa indicação de antimicrobianos, observada O resultado geral aponta que os prescritores
neste estudo, pode estar relacionada a fatores climáti- seguem a relação de medicamentos padronizados.
cos do período de coleta de dados, pois a sazonalidade É mister apontar a necessidade de esta lista ser atua-
é importante no comportamento epidemiológico de lizada periodicamente, para melhor atender o perfil
doenças infecciosas.23 Vale salientar que o monitora- epidemiológico da população local.
mento de ações voltadas à terapia racional de antimi- As consultas duraram, em média, 7 minutos e 08
crobianos, com a adoção de protocolos validados por segundos, variando de 59 segundos a 23 minutos e 9
estudos epidemiológicos, constitui estratégia política segundos, enquanto o tempo preconizado pelo SUS,
visando à utilização adequada de antimicrobianos.24 estabelecido na Portaria nº 1.101/GM, de 12/06/02, é
Outro grupo de medicamentos a exigir cuidados é de 15 minutos.26 A média foi inferior à encontrada em
o dos psicofármacos. Sua prescrição tem aumentado, Ribeirão Preto-SP,11 de 9 minutos e 2 segundos, e supe-
não só em quantidade como em tempo de uso por rior à de Ponta Grossa-PR,13 de 6 minutos e 8 segundos.
períodos às vezes maiores do que os preconizados na Se se analisasse o tempo preconizado pelo SUS,
literatura especializada. O fato é bastante preocupante, ter-se-ia quatro consultas por hora, número não con-
uma vez que pode levar à dependência física e psíqui- dizente com o tempo real de que “dispõem” muitos
ca25 a ponto de impor a este estudo a observância do profissionais para examinar uma média de 15 pacien-
indicador de frequência com que esses medicamentos tes por turno. Na prática, sabe-se que a carga horária
são prescritos na Atenção Básica. de 40 horas semanais para atendimento médico não
No Município estudado, o número de receitas com costuma ser cumprida.
pelo menos um psicofármaco prescrito foi equiva- As primeiras consultas realizadas, no início do
lente a 10,1%. Por ser um indicador criado por estes dia ou do turno, tendiam a serem mais duradouras,
autores, não há parâmetro de comparação disponível reduzindo-se, gradativamente, o tempo das demais. O
em outros trabalhos. Porém, é relevante salientar que tempo de duração da consulta poderia influenciar a
o número verificado nas UBSF não foi tão expressivo, qualidade do atendimento médico mas considerando-
dado o Município possuir um CAPS, onde se concentra se os dados obtidos e, a partir deles, a complexidade
a grande dispensação desses medicamentos. dessa conclusão, sua confirmação não é possível.
Normalmente, os injetáveis são uma forma farma- Deve-se lembrar, inclusive, que o tempo de consulta
cêutica usada em excesso, além de, frequentemente, é variável segundo os diferentes problemas de saúde
tornar o tratamento mais caro. Verificou-se que 2,9% e seus pacientes. É importante ressaltar, isso sim, que
das receitas continham pelo menos um injetável, valor grande parte dos usuários era constituída de idosos
condizente com a recomendação da OMS7 para este e/ou doentes crônicos, os quais compareciam para
indicador, inferior a 10,0%. O valor encontrado tam- renovação da receita. Caso se aceitasse essa explicação
bém foi inferior aos apresentados em Ribeirão Preto- do tempo reduzido das consultas, como ficariam a
SP (8,3%),13 Brasília-DF (7,5%)14 e Ponta Grossa-PR reavaliação e o acompanhamento desses indivíduos?
(13%);15 superior, entretanto, ao encontrado em Ao se analisar as rotinas das UBSF, observou-se que
Campina Grande-PB (1,1%).16 as consultas, em sua grande maioria, encontravam-se
Os medicamentos que constam na REMUME9 foram pré-marcadas, sendo pequeno o número de usuários
indicados em 78,3% do total de prescrições, supe- que procuravam o serviço sem agendamento prévio. Já
fora determinada a quantidade de indivíduos que po- discrepante dos 95,0% recomendados pela OMS.7
deria ser consultada diariamente, independentemente A falta de medicamentos nos serviços públicos de
da demanda espontânea direta. saúde compromete não só seu acesso regular como
O tempo de dispensação variou de 3 segundos a 1 a segurança para os pacientes que dependem de seu
minuto e 3 segundos – média de 49 segundos, tempo uso continuado, especialmente aqueles de menor
superior ao de Santos e Nitrini (8,4 segundos),13 mas poder aquisitivo.28
inferior ao encontrado por Marcondes (1 minuto e Uma baixa proporção da dispensação em relação
46 segundos).15 Não foi encontrado valor ideal para ao total de prescrições pode, entretanto, ser resul-
esse indicador; todavia, tempo ideal deve ser o tempo tante de uma seleção equivocada dos medicamentos
suficiente para que sejam repassadas todas as infor- presentes na REMUME: os medicamentos padroniza-
mações necessárias e para que o usuário esclareça dos podem não corresponder à demanda do perfil
todas suas dúvidas. epidemiológico de doenças e agravos na população.
Outro problema encontrado na dispensação de medi- Esse percentual reduzido pode, também, ser decor-
camentos foi a ausência de profissional Farmacêutico no rente de equívocos nos padrões prescricionais. São
local estudado, restando aos auxiliares de Farmácia esse necessários, portanto, estudos adicionais investiga-
encargo. Eis aqui uma situação extremamente perigosa, tivos dessas hipóteses.
a ausência do profissional habilitado para orientar o O estudo aqui relatado mostrou que o município de
uso de medicamentos – no caso, o Farmacêutico –, Esperança-PB apresenta maioria de bons indicadores
que pode trazer sérios prejuízos ao paciente. Muitas de prescrição e cuidado ao paciente, ao mesmo tempo
vezes, durante a consulta médica, não são passadas ao que revela problemas na Saúde Pública que dificultam
paciente todas as informações necessárias; da mesma o uso racional de medicamentos.
forma, o paciente pode não compreender plenamente É indiscutível a oportunidade de próximos estudos
as recomendações médicas, ficando sujeito a um trata- sobre a utilização dos indicadores, tanto pela escassez
mento ineficaz ou mesmo ao agravamento de seu quadro de dados existentes como pelo fato de eles contri-
clínico. A ineficiência dessa etapa poderá comprometer buírem para o maior entendimento da realidade e a
não só o uso do medicamento como fazer ruir todo o elaboração de políticas e estratégias reorientadoras
investimento programado.27 da Assistência Farmacêutica.
No caso específico da dispensação, a ausência do
farmacêutico nas unidades públicas e privadas é um Contribuição dos autores
fator crítico para a consolidação do uso racional de
medicamentos. Ela impede que os pacientes recebam Portela AS contribuiu na concepção do estudo,
instruções seguramente corretas e que seja realizada coleta de dados e redação do artigo.
a avaliação adequada das interações medicamentosas Silva PCD participou da coleta de dados.
e possíveis reações adversas. Vale destacar quão fun- Simões MOS e Medeiros ACD participaram da revi-
damental é uma capacitação técnica de qualidade para são crítica e aprovação final do artigo.
o exercício da profissão de Farmacêutico. Montenegro Neto AN executou as análises esta-
Dos 2.370 medicamentos prescritos, apenas 48,0% tísticas dos dados e participou da revisão crítica e
foram efetivamente dispensados, percentual bastante aprovação final do artigo.
Referências
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Neto NA, Silva PCD. Prescrição médica: orientações
adequadas para o uso de medicamentos? Ciência &
Saúde Coletiva. 2010; 15 Supl 3:S3523-3528.
Os artigos científicos constituem a unidade de informação do periódico científico. Por meio deles, as informa-
ções do autor são transformadas em conhecimento científico, que é de domínio público. Se o artigo é divulgado
adequadamente, ele poderá ser lido, citado e utilizado por profissionais de saúde nas suas atividades diárias. Por
divulgação adequada entenda-se aquela efetuada em periódico científico que adota o procedimento de revisão
por pares.1 O Conselho Editorial da revista Epidemiologia e Serviços de Saúde adota a revisão por pares na ava-
liação dos artigos que lhe são submetidos para publicação sendo, portanto, um veículo apropriado para publicar
trabalhos científicos. Dessa maneira, tem-se alta probabilidade de alcançar a audiência acertada, se o tema for
adequado para ser publicado na Revista.
Há vários tipos de artigo científico.1 O autor se limitará a abordar os artigos originais (scientific article ou
paper em inglês). São os que contêm o relato, em primeira mão, dos resultados de uma pesquisa.
O texto de um artigo científico original é geralmente dividido em quatro seções com os seguintes títulos:
• Introdução
• Métodos (Método, Material e métodos ou Metodologia)
• Resultados
• Discussão
Semelhante estruturação, dita IMRD, predomina na área biomédica e em muitos campos do conhecimento.
Em um estudo no qual foram analisados quatro dos principais periódicos de clínica médica publicados no idioma
inglês, Sollaci e Pereira relatam que a estrutura IMRD começou a ser usada na década de 1940.2 Na década de
1970, atingiu 80,0% e, na de 1980, foi o único padrão adotado nos documentos originais.
Cada uma das subdivisões do artigo científico tem suas especificidades, como detalhado a seguir.1
Indica-se, na seção sobre método, como o estudo foi delineado e a amostra selecionada, qual a forma de coleta
de dados, qual análise foi planejada para alcançar o objetivo da pesquisa e quais aspectos éticos foram envolvidos.
O relato termina na seção de discussão, com a interpretação e os comentários sobre o significado dos resulta-
dos, a comparação com outros achados de pesquisas sobre o assunto e as conclusões a que chegaram os autores,
em consonância com o objetivo da pesquisa ou a hipótese formulada. Os fatos e argumentos são concatenados
para orientar o leitor e fazê-lo compreender a conclusão do autor e poder analisar, ele próprio, a validade e a
aplicabilidade da investigação.
O conhecimento da estrutura apresentada é o ingrediente básico para entender a lógica do artigo científico. A
tabela a seguir contém algumas perguntas que podem ajudar o leitor a compreender o conteúdo das quatro seções
e o relacionamento entre elas. Temas adicionais sobre comunicação científica serão abordados em novos textos,
Estrutura do artigo científico e algumas perguntas-chave que auxiliam a redação do conteúdo de cada seção
Seções Perguntas-chave
De que trata o estudo? Por que a investigação foi feita?
Introdução O que se sabia sobre o assunto no início da investigação?
Ou melhor, o que NÃO se sabia sobre o assunto e motivou a investigação?
Método Como o estudo foi realizado?
Resultados O que foi encontrado? Quais são os fatos revelados pela investigação?
O que significam os achados apresentados?
Discussão Os achados estão de acordo com os resultados de outros autores ou são divergentes?
O que este estudo acrescenta ao que já se sabe sobre o assunto?
Fonte: Adaptado de Pereira 2011.1
Referências
1. Pereira MG. Artigos científicos: como redigir, publicar e avaliar. Rio de Janeiro: Editora Guanabara-Koogan, 2011.
2. Sollaci L, Pereira MG. The introduction, methods, results and discussion (IMRAD) structure: a fifty-year survey. Journal
of the Medical Library Association. 2004; 92(3):364-367.
Escopo e política
A Epidemiologia e Serviços de Saúde é uma publicação trimestral de caráter técnico-científico e acesso livre, nos
formatos eletrônico e impresso, editada pela Coordenação-Geral de Desenvolvimento da Epidemiologia em Serviços,
da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (CGDEP/SVS/MS). Sua principal missão é difundir o
conhecimento epidemiológico aplicável às ações de vigilância, prevenção e controle de doenças e agravos de interesse
da Saúde Pública, visando ao aprimoramento dos serviços oferecidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Além das modalidades de manuscritos aceitos para publicação, a revista divulga Portarias, Regimentos e
Resoluções do Ministério da Saúde, bem como Notas Técnicas relativas aos programas de vigilância, prevenção
e controle de doenças e agravos à saúde, consensos, relatórios e recomendações de reuniões ou oficinas de
trabalho sobre temas de interesse do SUS. Também está prevista a republicação de textos originalmente editados
por outras fontes de divulgação técnico-científica e considerados pelos editores da revista como relevantes para
os serviços de saúde.
A Epidemiologia e Serviços de Saúde segue as orientações do documento Requisitos Uniformes para Ma-
nuscritos Submetidos a Periódicos Biomédicos, do International Committee of Medical Journal Editors (ICMJE),
conhecido como ‘Normas de Vancouver’.
Modalidades de manuscrito
Os autores são os responsáveis pela veracidade e ineditismo do trabalho. O manuscrito submetido deve ser
acompanhado de uma Declaração de Responsabilidade, assinada por todos os autores, em que afirmam que o
estudo não foi publicado anteriormente, parcial ou integralmente, em meio impresso ou eletrônico, tampouco
encaminhado para publicação em outros periódicos, e que todos os autores participaram na elaboração intelectual
de seu conteúdo. O modelo da Declaração de Responsabilidade está disponível ao final destas Instruções (Anexo I).
Critérios de autoria
Fontes de financiamento
Os autores devem declarar todas as fontes de financiamento ou suporte – institucional ou privado – para a
realização do estudo. Fornecedores de materiais, equipamentos, insumos ou medicamentos, gratuitos ou com
descontos também devem ser descritos como fontes de financiamento, incluindo cidade, estado e país de origem
desses fornecedores. Essas informações devem constar da Declaração de Responsabilidade.
Conflito de interesses
Conflitos de interesses, por parte dos autores, são situações em que estes possuem interesses – aparentes ou
não –, capazes de influir no processo de elaboração dos manuscritos. São conflitos de natureza diversa – pessoal,
comercial, política, acadêmica ou financeira – a que qualquer um pode estar sujeito, razão porque os autores
devem-nos reconhecer e revelar, quando presentes, na Declaração de Responsabilidade assinada, ao submeter
seu manuscrito para publicação.
A observância dos preceitos éticos referentes à condução, bem como ao relato da pesquisa, são de inteira respon-
sabilidade dos autores, respeitando-se as recomendações éticas contidas na Declaração de Helsinque (disponível
em http://www.wma.net). Para pesquisas realizadas com seres humanos no Brasil, os autores devem observar,
integralmente, as normas constantes na Resolução CNS nº 196, de 10 de outubro de 1996, do Conselho Nacional
de Saúde (disponível em http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/reso_96.htm); e resoluções complementares,
para situações especiais. Os procedimentos éticos adotados na pesquisa devem ser descritos no último parágrafo
da seção Métodos, fazendo menção ao número do protocolo de aprovação por Comitê de Ética em Pesquisa. No
caso de ensaio clínico controlado e randomizado, será necessária a indicação do número de registro.
Agradecimentos
Quando desejável e pertinente, recomenda-se a nomeação, ao final do manuscrito, das pessoas que colaboraram
com o estudo embora não tenham preenchido os critérios de autoria adotados por esta publicação. Os autores são
Direito de reprodução
Os manuscritos publicados pela Epidemiologia e Serviços de Saúde são de sua propriedade. Sua reprodu-
ção – total ou parcial – por outros periódicos, tradução para outro idioma ou criação de vínculos eletrônicos é
permitida somente mediante autorização expressa do editor geral da revista ou, por sua delegação, de seu editor
executivo. Após a decisão final de ‘Aceito’ do manuscrito para publicação, os autores deverão enviar, em formato
PDF, o Termo de Cessão de Direitos assinado por cada um dos autores, cujo modelo se encontra ao final destas
Instruções (Anexo II).
Para o preparo dos manuscritos, os autores devem-se orientar pelo documento Requisitos Uniformes para
Manuscritos Submetidos a Periódicos Biomédicos, do International Committee of Medical Journal Editors – ICMJE
–, conhecido como ‘Normas de Vancouver’, disponível no idioma inglês, em http://www.icmje.org e em sua tra-
dução para o português, em http://scielolab.iec.pa.gov.br/pdf/ess/v15n1/v15n1a02.pdf (edição da Epidemiologia
e Serviços de Saúde 2006; 15(1):7-34).
Serão acolhidos manuscritos redigidos no idioma português. O trabalho deverá ser digitado em espaço duplo,
fonte Times New Roman 12, no formato RTF (Rich Text Format) ou DOC (Documento do Word), em folha-padrão
A 4, com margens de 3cm. Não são aceitas notas de texto de pé de página.
Cada manuscrito, obrigatoriamente, deverá conter:
Folha-de-rosto
a) título do manuscrito, em português e inglês;
b) título resumido, para referência no cabeçalho das páginas;
c) nome completo dos autores e das instituições a que pertencem;
d) endereço eletrônico de todos os autores;
e) endereço completo e endereço eletrônico, números de fax e de telefones do autor correspondente;
f) informação sobre monografia, dissertação ou tese que originou o manuscrito, com as respectivas instituições
de ensino envolvidas, se pertinente; e
g) créditos a órgãos financiadores da pesquisa, se pertinente.
Resumo
Parágrafo único, de até 150 palavras, estruturado com as seguintes seções: Objetivo; Métodos; Resultados; e
Conclusão.
Palavras-chave
Três a cinco, selecionadas a partir da lista de Descritores em Ciências da Saúde (DeCS), vocabulário estruturado
pelo Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde, também conhecido pelo nome
original de Biblioteca Regional de Medicina (BIREME). Os DeCS foram criados para padronizar uma linguagem
única de indexação e recuperação de documentos científicos (disponíveis em http://decs.bvs.br); e
Keywords
Versão em inglês das mesmas palavras-chave selecionadas a partir dos DeCS.
Texto completo
O texto de manuscritos nas modalidades de artigo original e nota de pesquisa deverão apresentar as seguintes
seções, nesta ordem: Introdução; Métodos; Resultados; Discussão; e Referências. Tabelas e figuras serão referidas
nos Resultados e apresentadas ao final do artigo, quando possível, ou em arquivo separado. Eis as definições e
conteúdos dessas seções:
Introdução – apresentação do problema, justificativa e objetivo do estudo, nesta ordem.
Métodos – descrição dos métodos empregados, incluindo, quando pertinente, cálculo do tamanho da amostra,
amostragem, procedimentos de coleta dos dados, procedimentos de processamento e análise dos dados; quando
se tratar de estudo envolvendo seres humanos ou animais, devem estar contempladas as Considerações éticas
pertinentes; pesquisas clínicas devem apresentar número de identificação em um dos registros de ensaios clínicos
validados pela Organização Mundial da Saúde e pelo ICMJE.
Resultados – exposição dos resultados alcançados, podendo considerar tabelas e figuras, desde que autoex-
plicativas (ver o item Tabelas e Figuras destas Instruções).
Discussão – comentários sobre os resultados, suas implicações e limitações; confrontação do estudo com
outras publicações de relevância para o tema e, no último parágrafo da seção, as conclusões.
Agradecimentos – após a discussão devem-se limitar ao mínimo indispensável.
Contribuição dos autores – parágrafo descritivo da contribuição de cada um dos autores.
Referências – para citação das referências no texto, deve-se utilizar o sistema numérico adotado pelas Normas
de Vancouver; os números devem ser grafados em sobrescrito, sem parênteses, imediatamente após a passagem
do texto em que é feita a citação, separados entre si por vírgulas; em caso de números sequenciais de referências,
separá-los por um hífen, enumerando apenas a primeira e a última referência do intervalo sequencial de citação
(Ex.: 7,10-16); após a seção Contribuição dos autores, as referências serão listadas segundo a ordem de citação
no texto; em cada referência, deve-se listar até os seis primeiros autores, seguidos da expressão latina et al para
os demais; os títulos de periódicos, livros e editoras deverão constar por extenso; as citações são limitadas a 30;
para artigos de revisão sistemática e meta-análise, não há limite de citações e o manuscrito fica condicionado ao
limite de laudas definidas nestas Instruções; o formato das Referências deve seguir os Requisitos Uniformes para
Manuscritos Submetidos a Periódicos Biomédicos do ICMJE (disponíveis em www.icmje.org), com adaptações
definidas pelos editores conforme os exemplos a seguir:
(anais de congresso)
1. Samad SA, Silva EMK. Perdas de vacinas: razões e prevalência em quatro unidades federadas do Brasil In:
Anais da 11ª Expoepi – Mostra Nacional de Experiências Bem-Sucedidas em Epidemiologia, Prevenção e Controle
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(artigos de periódicos)
2. Lima IP, Mota ELA. Avaliação do impacto de uma intervenção para a melhoria da notificação da causa básica
de óbitos no Estado do Piauí, Brasil. Epidemiologia e Serviços de Saúde. 2011; 20(3):297-305.
(autoria institucional)
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(Portarias e Leis)
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das informações sobre óbitos e nascidos vivos para os Sistemas de Informações em Saúde sob gestão da Secretaria
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(teses e dissertações)
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2006: situação atual, tendências e impacto da vacinação [Dissertação de Mestrado]. Salvador (BA): Universidade
Federal da Bahia; 2008.
No caso de ter sido usado algum software para gerenciamento das referências (por exemplo, Zotero, End-
note, Reference Manager ou outro), as mesmas referências deverão ser convertidas para o texto. A exatidão das
referências constantes na listagem e a correta citação no texto são de exclusiva responsabilidade dos autores.
Tabelas e Figuras
Figuras e as tabelas serão apresentadas ao final do manuscrito (quando possível) ou em arquivos separados,
por ordem de citação no texto. Os títulos das tabelas e figuras devem ser concisos e evitar o uso de abreviaturas
ou siglas; estas, quando indispensáveis, serão traduzidas em legendas ao pé da própria tabela ou figura. Tabelas,
quadros (estes, classificados como figuras), organogramas e fluxogramas devem ser apresentados em meio
eletrônico, nos formatos-padrão do Microsoft Office (Word; Excel); gráficos, mapas, fotografias e demais ima-
gens serão apresentados nos formatos EPS, JPG, BMP ou TIFF, no modo CMYK, em uma única cor (preto) e suas
diversas tonalidades.
Submissão
A submissão dos manuscritos deverá ser feita via e-mail, para o seguinte endereço eletrônico: submissao.
ress@saude.gov.br
Juntamente com o arquivo do manuscrito, os autores devem providenciar o envio da Declaração de Respon-
sabilidade, assinada por cada um deles, digitalizada em formato PDF.
Para se assegurar da adequação do formato do manuscrito às recomendações do núcleo editorial da Epide-
miologia e Serviços de Saúde, contempladas nestas Instruções, sugere-se aos autores conferir a lista de itens
apresentada ao final deste documento (Anexo III).
Serão acolhidos apenas os manuscritos formatados de acordo com estas Instruções e cujos assuntos se enqua-
drem no escopo da revista. Uma análise preliminar verificará a aprovação por um Comitê de Ética em Pesquisa,
no caso de o estudo envolver seres humanos, assim como seu potencial para publicação e seu interesse para os
leitores da revista. Trabalhos que não atenderem a essas exigências serão recusados. Após a avaliação dos editores,
os manuscritos serão enviados para avaliação "cega" (não identificada) por, ao menos, dois revisores especialistas
(peer reviewers) e, concomitantemente, para consulta às áreas técnicas do Ministério da Saúde especializadas. Os
autores poderão indicar até três possíveis revisores, também especialistas no assunto abordado em seu manuscrito.
Eles ainda poderão indicar, opcionalmente, até três revisores especialistas para os quais não gostariam que seu
manuscrito fosse submetido. Caberá aos editores da revista a decisão de acatar ou não as sugestões dos autores.
A partir dos pareceres recebidos, os editores poderão considerar o manuscrito: (i) Aceitável para publicação;
(ii) Aceitável, condicionado a reformulação; ou (iii) Não aceitável. A comunicação com o autor principal acon-
tecerá pelo endereço eletrônico informado por ele. Os trabalhos aceitos para publicação, porém condicionados
a reformulação, serão enviados aos autores com prazo definido para devolução do manuscrito reformulado à
secretária executiva da revista. Uma vez aprovado para publicação, se todavia for identificada a necessidade de
pequenas correções e ajustes no texto, os editores da revista reservam-se o direito de o fazer. Finalmente, a decisão
definitiva pela publicação do manuscrito será condicionada à aprovação final do Comitê Editorial da Epidemiologia
e Serviços de Saúde. Nessa ocasião, nova reformulação poderá ser solicitada pelo Comitê aos autores, os quais
terão prazo adicional para o reenvio do trabalho reformulado.
Anexo I
Declaração de Responsabilidade
Este documento deve ser encaminhado juntamente com o manuscrito, de acordo com o modelo a seguir:
1. Este manuscrito representa um trabalho original cujo conteúdo integral ou parcial ou substancialmente
semelhante não foi publicado ou submetido à publicação em outro periódico, seja no formato impresso ou
eletrônico;
2. Houve participação efetiva de todos os autores relacionados no trabalho, tornando pública sua responsabilidade
pelo conteúdo apresentado;
3. A versão final do manuscrito foi aprovada por todos os autores;
4. Não há qualquer conflito de interesse dos autores em relação a este manuscrito (ou) existem conflitos de
interesses dos autores em relação a este manuscrito (no caso de haver, deve-se descrever, nesta passagem, o
conflito ou conflitos de interesse existentes).
(registrar o local, data e nome; a Declaração de Responsabilidade deve ser assinada por cada um dos autores
do manuscrito).
Anexo II
Este documento será enviado à revista, assinado por todos os autores, desde que aprovada a publicação do
manuscrito na revista. A seguir, o modelo:
(registrar o local, data e nome; o Termo de Cessão de Direitos deve ser assinado por cada um dos autores do
manuscrito).
Anexo III
1. Formatação: fonte Times New Roman 12, tamanho de folha A4, margens de 3cm, espaço duplo.
2. Folha-de-rosto:
a. Modalidade do manuscrito;
b. Título do manuscrito, em português e inglês;
c. Título resumido, em português;
d. Nomes e instituição de afiliação e e-mail de cada um dos autores;
e. Endereço completo e telefone do autor correspondente;
f. Nomes das agências financiadoras e números dos processos, quando pertinente; e
g. No caso de manuscrito redigido com base em monografia, dissertação ou tese acadêmica, indicar o nome
da instituição de ensino e o ano de defesa.
3. Resumo em português e Abstract em inglês, para todos os tipos de manuscritos – exceto cartas; e especifi-
camente para artigos originais e notas, respeito ao formato estruturado e discriminado – objetivo, métodos,
resultados e conclusão.
4. Palavras-chave/Key words, selecionadas entre os Descritores em Ciências da Saúde, criados pela Biblioteca
Virtual em Saúde e disponíveis em sua página eletrônica.
5. Informação do número de aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa e do número de registro do ensaio
clínico, quando pertinente.
6. Parágrafo contendo a contribuição de cada autor.
7. Tabelas e figuras – para artigos originais e de revisão, somadas, não devem exceder o número de cinco, e para
notas de pesquisa, não devem exceder o total de três.
8. Referências normalizadas segundo o padrão ICMJ (Normas de Vancouver), ordenadas e numeradas na sequ-
ência em que aparecem no texto; verificar se todas estão citadas no texto e se sua ordem-número de citação
corresponde à ordem-número em que aparecem na lista das Referências ao final do manuscrito.
9. Anuência das pessoas mencionadas nos Agradecimentos.
10.Declaração de Responsabilidade, assinada por todos os autores.
» EDITORIAL: Comunicação e redação científica para a » Acidentes de transporte envolvendo motocicletas: perfil
epidemiologia e os serviços de saúde epidemiológico das vítimas de três capitais de estados
brasileiros, 2007
» Indicadores de infestação larvária e influência do porte
Letícia Fortes Legay, Simone Agadir Santos, Giovanni Marcos Lovisi,
populacional na transmissão de dengue no estado de Jeane Soares de Aguiar, José Carvalho Borges, Renata Martins Mesquita e Lúcia Abelha
São Paulo, Brasil: um estudo ecológico no período 2007-2008
Gerson Laurindo Barbosa, Márcia Moreira Holcman, Mariza Pereira,
» Violência interpessoal: estudo descritivo dos casos não fatais
Antonio Henrique Alves Gomes e Dalva Marli Valério Wanderley atendidos em uma unidade de urgência e emergência referência de
sete municípios do estado de São Paulo, Brasil, 2008 a 2010
» Impacto da influenza pandêmica (H1N1) 2009 e de doenças
Lenise Patrocinio Pires Cecílio, Cléa Adas Saliba Garbin, Tânia Adas Saliba Rovida,
respiratórias na mortalidade de mulheres em idade fértil Ana Paula Dossi de Guimarães e Queiroz e Artênio José Ísper Garbin
no estado do Rio Grande do Sul, Brasil, 2008-2009
Cláudia Maria Pastorello, Adrieli Rochembach, Marlene Doring, Eliane Flora S. Moretto,
» Mortalidade por causas externas na microrregião de São Mateus,
Vilma Madalosso Petuco, Bernadete Maria Dalmolin, Jusceli Seidler e Gilberto Santetti estado do Espírito Santo, Brasil: tendências de 1999 a 2008
Kamila Medani Tristão, Franciéle Marabotti Costa Leite, Edilson Romais Schmildt,
» Avaliação do Sistema de Vigilância Epidemiológica da Esmeraldo Costa Leite, Denise Silveira de Castro e Ana Paula Martins Vilela
Esquistossomose em dois municípios do estado da Bahia, Brasil
» Acidentes e doenças relacionadas ao trabalho em Jequié, Bahia,
Maria José Rodrigues de Menezes, Eduardo Hage Carmo e Isabella Samico
registrados no Instituto Nacional de Seguridade Social, 2008-2009
» Sobrevivência e infectividade do Trypanosoma cruzi na polpa de Marcela Andrade Rios, Adriana Alves Nery, Murilo da Silva Alves e Cléber Souza de Jesus
açaí: estudo in vitro e in vivo
» Índice de massa corporal obtido por medidas autorreferidas para
Luiz Augusto Corrêa Passos, Ana Maria Aparecida Guaraldo, Rodrigo Labello Barbosa, a classificação do estado antropométrico de adultos: estudo de
Viviane Liotti Dias, Karen Signori Pereira, Flavio Luis Schmidt,
Regina Maura Bueno Franco e Delma Pegolo Alves validação com residentes no município de Salvador, estado da
Bahia, Brasil
» Avaliação da Performance de Metodologias de Detecção de
Lucivalda Pereira Magalhães de Oliveira, Valterlinda Alves de Oliveira Queiroz, Maria da
Cryptosporidium spp. e Giardia spp. em água destinada ao Conceição Monteiro da Silva, Jacqueline Costa Dias Pitangueira, Priscila Ribas de Farias Costa,
consumo humano, para o atendimento às demandas da Franklin Demétrio, Maria Carolina Guerreiro dos Anjos e Ana Marlúcia Oliveira Assis
Vigilância em Saúde Ambiental no Brasil, 2011
» Avaliação das necessidades de tratamento odontológico e da
Regina Maura Bueno Franco, Elayse Maria Hachich, Rita Maria L. Naveira, capacidade produtiva da rede de atenção básica em saúde bucal no
Eduardo de Carvalho Silva, Marcela M. de C. Campos, Romeu Cantúsio Neto,
Daniel Adolpho Cerqueira, Nilson Branco e Diego Averaldo Guiguet Leal município de Pelotas, estado do Rio Grande do Sul, Brasil, 2009
Cleusa Marfiza Guimarães Jaccottet, Aluísio J. D. Barros, Maria Beatriz Junqueira de Camargo
» Conhecimento dos profissionais de saúde sobre a situação da e Andreia Morales Cascaes
tungíase em uma área endêmica no município de Uberlândia,
Minas Gerais, Brasil, 2010 » Indicadores de prescrição e de cuidado ao paciente na atenção
básica do município de Esperança, Paraíba, 2007
Jean Ezequiel Limongi, Tatiana Ferraz Carvalho, Liana Ariza, Jorg Heukelbach,
Juliana Junqueira Silva, Júlio Mendes e Alcides de Assis e Silva Alyne da Silva Portela, Paulo César Dantas da Silva, Mônica Oliveira da Silva Simões,
Ana Cláudia Dantas de Medeiros e Asdrúbal Nóbrega Montenegro Neto
» Vigilância de infecção de sítio cirúrgico pós-alta hospitalar em
hospital de ensino do Distrito Federal, Brasil: estudo descritivo » Estrutura do artigo cientifico
retrospectivo no período 2005-2010 Mauricio Gomes Pereira
Taína Fagundes Batista e Maria Cristina Soares Rodrigues