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1 Introdução
Há um consenso de que a seleção de suínos para a produção de carcaças magras
provocou um efeito negativo sobre a qualidade da carne. Atualmente, a variação da
qualidade da carne suína encontrada após o resfriamento das carcaças, tem como
referencial a carne ideal e desejável e identificada como RFN (Reddish Pink, Firm
and Non-Exudative). As alterações de qualidade se referem às carnes PSE (Pale,
Soft and Exudative), RSE (Reddish Pink, Soft and Exudative) e DFD (Dark, Firm
and Dry). Carnes PSE representam o problema mais sério para a indústria porque
sua capacidade de retenção de água, com perda excessiva de esxudato, textura,
carcaterizada por uma extrema flacidez e pela ausência de cor, além de serem
rejeitadas pelos consumidores, prejudicam os processos industriais de fabricação com
conseqüências econômicas bastante sérias para o setor (van Laack et al., 1995).
As carnes PSE são provenientes de suínos abatidos em condições de estresse.
É certo que os defeitos de qualidade da carne suína resultam de fatores genéticos
e/ou ambientais que por sua vez determinam a velocidade e extensão dos eventos
bioquímicos post mortem. Dentre eles, a glicólise assume importância cada vez maior.
O processo de conversão do músculo em carne é complexo e envolve uma
série de alterações no metabolismo celular bem como na estrutura protéica, que
se caracterizam pelo esgotamento das reservas de ATP, diminuição do pH ou
acidificação, queda da temperatura da musculatura, aumento da concentração de íons
cálcio no citosol, rigor mortis, entre outros (Lawrie, 1974; Judge et al., 1989).
A combinação destes eventos resultam no aparecimento de novas condições
intracelulares, muito diferentes daquelas encontradas na célula muscular viva. Não
se sabe ao certo quanto estas modificações podem afetar os sistemas enzimáticos
intracelulares. Entretanto, sabe-se que são decisivas para a qualidade final da carne
suína.
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2.1 pH da carne
O pH exerce influência, direta ou indiretamente, sobre as diversas características
de qualidade da carne como a cor, capacidade de retenção de água, maciez,
suculência e sabor.
Após o abate dos animais, há um declínio do pH cuja extensão e velocidade irá
depender da natureza e condição do músculo no momento preciso em que cessa a
circulação sangüínea.
As transformações que ocorrem nos músculos após o abate, iniciam-se durante a
insensibilização dos animais. O objetivo desta etapa é minimizar o sofrimento animal
no curto período que antecede a sangria ou o abate propriamente dito realizando
o sacrifício do animal dentro dos preceitos humanitários. Por isso, a insensibilização,
qualquer que seja o método adotado, deve ser rápida para não causar mais sofrimento
e dor ao animal. Se não forem observadas certas condições (tratamento dado aos
animais pelso funcionários, funcionamento correto dos equipamentos) pode haver
uma excessiva estimulação do sistema nervoso e elevação da pressão sangüínea
(Judge et al., 1989).
A sangria do animal também é causa de estresse. Mecanismos neurogênicos e
hormonais tentam restaurar a pressão arterial principalmente através da angiotensina
II. Há também liberação, entre outros hormônios, de catecolaminas que auxiliam na
vasoconstricção durante a sangria.
O resultado desses estímulos é a despolarização da membrana celular juntamente
com os túbulos T, cuja distribuição dos eletrólitos Na+ , K+ se altera. Inicia-se, então,
uma série de reações metabólicas que visam recompor a distribuição normal dos
mesmos.
A membrana do retículo sarcoplasmático também sofre um aumento de permeabi-
lidade permitindo um fluxo de íons Ca++ em direção ao sarcoplasma onde ele se liga
à calmodulina, uma subunidade da fosforilase quinase ativando esta enzima sem a
necessidade de formação de AMPc como ocorre na célula muscular viva.
A presença de íons Ca++ no sarcopalsma desencadeia imediatamente a formação
de complexos actomiosina. O cálcio se liga à subunidade da Troponina (Troponina
C) causando alteração conformacional da molécula e liberando o sítio de ligação
da miosina com a actina. Formam-se, assim, pontes cruzadas entre os filamentos
grossos e finos, com hidrólise de ATP pela miosina-ATPase.
Enquanto houver ATP, a membrana do retículo sarcoplasmático retira os íons Ca++
do sarcoplasma através de sistemas enzimáticos que utilizam ATP, localizados na
membrana. A retirada de cálcio é acompanhada da entrada de Mg++ e da ligação de
ATP à miosina-ATPase provocando o desligamento das pontes cruzadas entre actina
e miosina à semelhança do que ocorre no relaxamento do músculo vivo. Este ciclo se
repete atá que as reservas de ATP se esgotem.
A manutenção de Ca++ dentro das cisternas do retículo sarcoplasmático exige mais
energia do que a repolarização da membrana celular (sarcolema e túbulos T) e talvez,
esse seja o fator mais importante na ocorrência de carnes PSE.
Os músculos, no momento em que é completada a sangria, não recebem mais
oxigênio restando apenas aquele ligado à mioglobina, suficiente para manter o
metabolismo aeróbio por pouco tempo. Porém, as fibras musculares continuam seus
processos metabólicos, com gasto de energia.
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ainda continuam sendo valorizadas as carcaças que têm maior proporção de carne
magra.
Investigações sobre a ocorrência de carnes suínas PSE apontam a genética como
o fator determinante, se não a única causa desta anomalia de qualidade da carne.
Embora tenha havido uma redução da influência do componente genético, através
da utilização de reprodutores livres do gene halotano, a incidência de carnes PSE
continua elevada. Fatores ligados ao manejo pré-abate, principalmente durante o
transporte dos animais ao matadouro e durante o período de descanso que antecede
o abate estão associados à incidência de carnes PSE.
De qualquer modo, perdas significativas ocorrem tanto em quantidade como em
qualidade de carcaças.
Se a ocorrência de carnes PSE se deve à genética (fatores intrínsecos) ou a fatores
ambientais (fatores extrínsecos), provocando estresse pré-abate, este é o principal
fator de esgotamento das reservas de glicogênio muscular.
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É certo que a presença do gene halotano (Haln ) no genótipo suíno faz aumentar a
freqüência de carcaças PSE quando comparadas às carcaças produzidas por animais
livres do gene halotano.
Culau (1999), utilizando a medida de pH inicial (pH ≤ 5,8) para diferenciar carnes
suínas PSE das carnes normais, encontrou 58,82% de carcaças PSE oriundas de
suínos heterozigotos (HalNn ). Dentre os suínos com genótipo halotano recessivo
(Hal[nn]), a freqüência de carcaças PSE foi de 85,71% e entre os animais normais,
a freqüência foi igual a 36,56%. Neste trabalho, verificou-se que suínos portadores
do gene halotano produziram carne normal e, em contrapartida, nem todas as carnes
com características PSE foram provenientes de animais portadores do gene halotano
e sim de animais normais. Estes resultados indicam que o manejo pré-abate pode
estar influenciando a incidência de carne PSE.
Costuma-se afirmar que é necessária a interação de fatores para a ocorrência
de carnes PSE em suínos mesmo que sejam portadores do gene halotano (Haln ).
Sabe-se, por outro lado, que os procedimentos de abate por si só se constituem
em fatores estressantes muito fortes para os animais (Grandin, 1994). A presença
do gene halotano nos suínos intensifica mais ainda a influência desse importante
componente de estresse que é o abate e que inclui os instantes que o precedem,
ou seja, o deslocamento dos animais das pocilgas de matança até o momento da
insensibilização. Talvez isto possa explicar a ocorrência de carcaças PSE mesmo após
um adequado manejo pré-abate dos animais e um excelente método de resfriamento
das carcaças.
Ao se produzir suínos heterozigotos, os cuidados com o manejo pré e pós-abate
devem receber atenção especial pois a sensibilidade ao gene Haln não é totalmente
recessiva com respeito a algumas características, podendo ocorrer deficiências de
qualidade se tais condições não forem adequadamente controladas (Sellier, 1995).
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