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1 A estrada passa pelo padrão de Bartolomeu Dias, depois pelo Vasco da Gama. Chego a um último
cruzamento: à esquerda, uma placa indica Cape Point, “Promontório do Cabo”; à direita, diz “Cape of
Hope”, cabo da Boa esperança. Viro à direita.
Mais um par de quilómetros. É aqui. Espero que um grupo de turistas reformados da Alemanha tire as
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suas fotografias, que regresse ao autocarro, que me deixe sozinho. Espero que o silêncio regresse ao cabo
da Boa Esperança. Está um dia de sol estupendo, uma luminosidade de início de Outono que espalha um
tom dourado pelas rochas, húmidas da maresia. Tiro um bloco de notas da mochila, começo a escrever.
Este livro.
10 Estou no fim de África, no início dos meus passos por ela acima. Começo hoje uma longa e imprevisível
travessia do continente africano, um devaneio orientado por um simples objectivo: regressar a casa. É este
o meu projecto: atravessar África. Prosseguir do sul para o norte utilizando as estradas do continente,
recorrendo aos transportes públicos, aos autocarros maltratados pelos anos, aos comboios que ainda
andam, pedindo boleia, viajando com as pessoas da terra – em terra onde estiver, farei como vir fazer.
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Excluo o transporte aéreo, voar sobre África não é viajar por África. Aliás, voar não é viajar.
(…)
Levo uma bomba química de vacinas, vagueio pela cidade mais bonita do novo mundo atordoado, frágil,
meio adoentado. Entretanto, espero pelos vistos no transporte. Cada visto demora cinco, sete, dez dias. Às
vezes não são concedidos. Sabe-se lá porquê. Não pela profissão, porque não sou jornalista. Sou “chefe de
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manutenção de máquinas”, da clínica de uns amigos meus – jornalista, nunca, raras vezes são bem-vindos.
Não há vistos fáceis. E são caríssimos. Noventa e três euros para os Camarões, cento e quinze euros para
Moçambique, noventa euros para o Congo, oitenta para a Zâmbia. E por aí fora. Que preços são estes?
Que género de turista é este que aceita pagar noventa euros por um visto de turismo para visitar o Congo?
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Resposta simples: não são vistos de turismo. Não há turismo no Congo.
(…)
Chove no Cabo Agulhas. Não é uma chuva qualquer, não é anónima pluviosidade sobre as vinhas e as
savanas, as selvas suaves e as cordilheiras dentadas da nação sul-africana. Esta chuva encerra todo um
30 continente. Como, aliás, tudo o que aconteça, exista ou termine de existir aqui. Porque aqui termina
África. “Bem-vindo ao Cabo Agulhas, o ponto mais a sul do continente africano”. Há um orgulho infantil
neste limite geográfico, recordado em todos os cartazes afixados nas paredes dos estabelecimentos
comerciais: tomo café no bar mais a sul, compro um postal numa mercearia mais a sul, visito o farol mais
a sul da África.
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Vide in: Cadilhe, Gonçalo África Acima
Parte II - 30 pontos
8.1. “ (…) Levo uma bomba química de vacinas (…) ”. Linha 18 (3,75 p)
8.2. “ (…) Às vezes não são concedidos. Sabe-se lá porquê. Não pela
profissão, porque não sou jornalista. Sou “chefe de manutenção de
máquinas”, da clínica de uns amigos meus – jornalista, nunca, raras vezes
são bem-vindos (…) ”. Linha 23 (3,75 p)
8.3. “ (…) tomo café no bar mais a sul, compro um postal numa mercearia
mais a sul, visito o farol mais a sul da África (…) ”. Linhas 33-34 (3,75 p)
7.1. O senhor disse-lhes que o amanhecer naquela zona era magnífico. (3,75 p)
7.2. “Aquela ruazinha é muito antiga” – disse Cadilhe. (3,75 p)
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10.1. O fanatismo no futebol.
10.2. A mão-de-obra infantil.