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da diversidade cultural da humanidade e que incentive a economia solidária como
maneira de colaborar para diminuir os efeitos perversos das diferenças
socioeconômicas.
Entendemos o conceito cidadania como um conceito mediador dos requisitos mínimos
de justiça e do sentimento de pertencimento comunitário, significando, portanto,
igualdade em dignidade e no comprometimento com a coisa pública, valor hoje
absolutamente fundamental. A cidadania constitui a razão de ser da civilidade,
fomentada pelo fato de que os cidadãos compartem um ideal de justiça, bem como um
conjunto de valores, atitudes, condutas e compromissos, cujo denominador comum
reside no fato de que, por debaixo de todas as nossas diferenças culturais, sociais e
econômicas, existe um mesmo ar que se respira e uma mesma fonte que permite a vida
e que rege também as leis da vida coletiva.
Desta forma, o conceito de cidadania planetária surge a partir de uma consciência que
reconhece que, independente da nacionalidade e do contexto em que vivemos, estamos
todos em um ‘mesmo barco’, habitando um mesmo planeta que necessariamente precisa
ser cuidado, reconhecido, valorizado e amado. Para tanto, é preciso consensuar valores,
princípios, atitudes e comportamentos comuns, sem os quais não daremos conta de
enfrentar a crise sistêmica, ou melhor, a policrise que vem afetando e colocando em
xeque a sobrevivência de nossa civilização.
3. Quais são as contribuições de Edgar Morin, nosso querido homenageado, na construção
dos ‘Saberes para uma nova cidadania planetária’?
Edgar Morin, em sua obra ‘Rumo ao abismo: ensaios sobre o destino da humanidade
(2011: 75), pergunta-nos: que política seria necessária para que uma sociedade-mundo
pudesse se constituir não como o coroamento planetário de um império hegemônico,
mas como base de uma confederação civilizatória?
Para ele (2011), seriam necessários alguns princípios nutridores de uma política de
humanidade em escala planetária e de uma política de civilização, bem como o
abandono do termo desenvolvimento, mesmo atenuado pelos conceitos estável,
sustentável e humano. Já não podemos aceitar o modelo ideal e perfeito dos países
considerados desenvolvidos, dos países ocidentais, cuja meta e finalidade da história
humana seria o estado atual das sociedades ocidentais. São modelos que não
questionam os seus princípios e os seus valores, que ignoram as qualidades da
existência, do meio e da vida, bem como o dom, a magnanimidade, a honra e a
consciência, além dos tesouros culturais, das tradições, das civilizações arcaicas e da
sabedoria das culturas milenares.
Para Edgar Morin, já não podemos continuar atenuando os problemas ou retardando a
busca de suas soluções. É preciso tentar encontrar um ponto de partida, um novo
começo, promovendo uma política de civilização e uma política de humanidade.
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Uma política do humano como missão urgente para solidarizar o planeta visando
diminuir as injustiças sociais em todos os aspectos da existência humana e no sentido de
resguardar os bens planetários, como a água, os lençóis petrolíferos, a qualidade do ar
que respiramos, etc. Uma política de civilização capaz de cuidar dos problemas mais
vitais do planeta, voltada para a criação de uma sociedade-mundo que promova a
reforma do espírito e a reforma do pensamento visando ao desenvolvimento da
compreensão e da solidariedade humana.
Sabemos que estas mudanças ou reformas do pensamento e das instituições não
acontecem sem uma transformação de natureza mais profunda, de natureza
paradigmática, como nos recorda Edgar Morin, o que certamente, pressupõe novas
perspectivas ontológicas, epistemológicas e metodológicas para se trabalhar em
educação. Sem elas não haverá a reforma do pensamento humano, a reforma interior
dos espíritos e das pessoas, a cada dia mais urgente e necessária à política civilizacional.
Como adviria tal reforma radical que pressupõe uma corrente de compreensão e de
compaixão no mundo, nos perguntaria Edgar Morin? Para este nosso grande pensador
planetário, é preciso aprender a pensar o contexto e o complexo. A identidade terrena e
a antropolítica não poderiam ser concebidas sem um pensamento capaz de religar as
noções disjuntas e os saberes compartimentados. Os novos conhecimentos que nos
fazem reconhecer e reverenciar a terra-pátria – a biosfera – a terra Gaia, não terão
sentido se estiverem separados uns dos outros. Isto porque a terra é uma totalidade
complexa, de natureza biofísica e antropológica, na qual a vida é uma emergência na
história da Terra e o ser humano é uma emergência na história da vida.
As relações homem/natureza e indivíduo/espécie não podem ser concebidas de
maneira redutora e fragmentada. A humanidade é, para ele, uma entidade planetária e
biosférica. O ser humano deve ser criado na natureza viva e física, ao mesmo tempo em
que emerge no seio da cultura, no exercício da intersubjetividade humana, pelo
pensamento e pela consciência em seu processo evolutivo. O pensamento fragmentado
ignora o complexo antropológico e o contexto planetário. A reforma necessária do
pensamento é aquela capaz de gerar um conhecimento contextualizado e de natureza
complexa.
Para Edgar Morin, precisamos aprender a pensar em termos planetários a política, a
economia, a ecologia, as riquezas ambientais, as diversidades culturais e a reconhecer a
relação de interdependência e de inseparabilidade entre os fenômenos e seus
respectivos contextos e destes com o contexto planetário. Precisamos também aprender
a pensar religando o que está separado, pensar de maneira complexa, respeitando a
diversidade, reconhecendo nela cada unidade que a constitui e discriminando os
processos de interdependência. Isto significa ter um pensamento ecologizado que, em
vez de isolar o objeto, percebe-o em suas relações autoecoorganizadoras com seu
ambiente natural, sociocultural, político, econômico e espiritual. Um pensamento que
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concebe a ecologia da ação e a dialógica em ação e que seja capaz de encontrar
estratégias compensatórias sempre que necessário.
Tais aspectos foram consolidados por Edgar Morin em sua obra Sete Saberes para uma
Educação do Futuro1, publicada pela UNESCO, ao redor do ano 2000, em vários idiomas.
Nela, ele reflete profundamente sobre esta temática e apresenta um conjunto de saberes
para uma nova cidadania planetária, sem os quais torna-se difícil o enfrentamento das
múltiplas crises sociais, econômicas, políticas, éticas, culturais e espirituais que colocam
em risco a sobrevivência individual e coletiva, bem como a preservação da vida no
planeta.
4. Qual é o papel e o potencial da Educação em tão importante e imprescindível tarefa?
Em seu sentido mais genuinamente humano e social, a educação nos leva a buscar
sempre novas possibilidades de atuação, a atualizar as potencialidades individuais e
coletivas, a partir de ações pautadas na esperança radical de que o ser humano,
mediante o exercício reflexivo consciente e o desenvolvimento de suas potencialidades,
pode chegar a ser mais plenamente humano, mais singularmente pessoa, mais
conscientemente cidadão/ã.
Neste sentido, reconhecemos e ratificamos o papel fundamental de uma educação
transformadora centrada na condição humana, no desenvolvimento da compreensão, da
sensibilidade e da ética, assim como na diversidade cultural e na pluralidade de saberes.
Sem uma educação para a compreensão humana fica difícil, ou quase impossível,
promover uma cultura de paz e cidadania, ancorada no respeito à diversidade e à
promoção dos direitos humanos universais. O desenvolvimento da compreensão de
nossa condição humana é fundamental para percebermos nossa identidade terrena, que
exige o respeito constante à terra e à vida em toda a sua multidimensionalidade e
diversidade, bem como o reconhecimento de que tudo está interconectado, em profunda
comunhão. Ensinar a condição humana exige um humanismo civilizatório cultivado de
modo intergeneracional e que se expressa mediante o cultivo de uma ética planetária,
como condição essencial para a sobrevivência da humanidade.
Referências
BOFF, Leonardo. Ecologia, Grito da Terra, Grito dos pobres. São Paulo, Ática, 1996.
MORIN, Edgar. Rumo ao abismo: ensaios sobre o destino da humanidade. Rio de Janeiro: Bertrand
Brasil, 2011.
1Ensinar a compreensão; ensinar o conhecimento pertinente; ensinar a condição humana; ensinar as cegueiras do
conhecimento; ensinar a identidade terrena; ensinar a ética do gênero humano.