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Tradução de
Raoni Borges Barbosa. Sociabilidades Urbanas – Revista de Antropologia e Sociologia, v.1, n.2, p. 61-70,
julho de 2017. ISSN 2526-4702.
Tradução
http://www.cchla.ufpb.br/sociabilidadesurbanas/
Ernest W Burgess
Tradução de Raoni Borges Barbosa
Resumo: Este artigo busca apresentar a perspectiva teórica e metodológica aplicada pelo
Departamento de Sociologia da Escola de Chicago em seus estudos sobre o crescimento da
cidade. Entende e descreve os processos de expansão urbana em termos de extensão, sucessão
e concentração da malha urbana e de suas atividades, de modo a poder determinar como a
expansão urbana perturba o metabolismo social urbano em situações em que os processos de
desorganização excedem os de organização do social. O artigo discute e diferencia
conceitualmente as noções de movimento na cidade e de mobilidade urbana, definindo a
mobilidade como a medida de expansão e de metabolismo no urbano, suscetível à formulação
quantitativa precisa e passível de ser considerada quase que literalmente como o pulso da
comunidade. Em síntese, a perspectiva teórico-metodológica apresentada e discutida introduz
os projetos de pesquisa em andamento no departamento de Sociologia da Escola de Chicago.
Palavras-chave: Escola de Chicago, crescimento da cidade, mobilidade urbana, expansão
urbana
Abstract: This article seeks to present the theoretical and methodological perspective applied
by the Department of Sociology of the School of Chicago in its studies on the growth of the
city. It understands and describes the processes of urban expansion in terms of extension,
success and concentration of the urban network and its activities, so as to be able to determine
how an urban expansion disturbs the urban social metabolism in situations in which the
processes of disorganization exceed those of social organization. The article discusses
conceptually the differences between the notions of movement in the city and of urban
mobility, defining mobility as a measure of expansion and metabolism in the urban, which is
susceptible to precise quantitative formulation and that can also be considered almost literally
as the pulse of the community. In summary, the theoretical-methodological perspective
presented and discussed introduces the ongoing research projects in the Department of
Sociology of the Chicago School. Keywords: Chicago school, city growth, urban mobility,
urban sprawl
1
Texto originalmente publicado como Capítulo II, The growht of the city: An introduction to a
research project, do livro The City, organizado por Robert Ezra Park e Ernest Burgess, e publicado
pela primeira vez em 1925 pela University of Chicago Press, em Chicago.
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americanas. As mais sutis transformações na nossa vida social, que em suas manifestações
mais grosseiras são chamadas de "problemas sociais", ou seja, aqueles fenômenos que nos
alarmam e nos confundem, tais como o divórcio, a delinqüência e o descontentamento
social, tem suas mais veementes expressões nos contextos urbanos de sociabilidade. As
forças profundas e "subversivas" que operaram essas mudanças são medidas no
crescimento físico e expansão das cidades. Esse é o significado das estatísticas
comparativas de Weber, Bücher e outros pesquisadores e estudiosos da cidade, do urbano e
do urbanismo.
Os estudos estatísticos, muito embora enfatizem principalmente os efeitos do
crescimento da malha urbana, evidenciaram algumas características distintivas das
populações urbanas em comparação com as populações rurais. A maior proporção de
mulheres para cada homem nas cidades do que na zona rural; a maior porcentagem de
jovens e de pessoas de meia-idade; a maior proporção de nascidos no estrangeiro; a
heterogeneidade ocupacional se acentua com o aumento do crescimento urbano e altera
profundamente a estrutura social da cidade. Essas variações na composição da população
sãofenômenos indicativos de todas as transformações que ocorrem na organização social
da comunidade. Com feito, fazem parte do crescimento da cidade e sugerem a natureza dos
processos de crescimento e complexificação urbanos.
O único aspecto do crescimento adequadamente descrito por Bücher e Weber foi o
processo bastante óbvio da agregação da população urbana. Um processo quase tão aberto,
o de expansão, tem sido investigado de um ponto de vista diferente e muito prático por
grupos interessados em planejamento urbano, zoneamento e levantamentos regionais.
Ainda mais significativo do que a crescente densidade da população urbana pode ser
considerada a sua correlativa tendência para transbordar as áreas geográficas já ocupadas, e
assim se estender por áreas mais amplas, e incorporar essas áreas em uma vida comunitária
maior. Este artigo trata primeiramente, portanto, da expansão da cidade e, em seguida, dos
processos menos conhecidos de metabolismo e mobilidade urbanos que estão intimamente
relacionados com esta expansão da malha urbana.
Expansão como crescimento físico
A expansão da cidade, da perspectiva dos processos de planejamento, de
zoneamento e de levantamentos regionais urbanos, é quase que exclusivamente
considerada em termos de seu crescimento físico. Estudos de tração abordaram o
desenvolvimento do transporte em sua relação com a distribuição da população em toda a
cidade. Nesse sentido, os levantamentos realizados, por exemplo, pela Bell Telephone
Company e outros serviços públicos tem tentado prever a direção e a taxa de crescimento
da cidade para antecipar as futuras demandas de extensão de seus serviços. No plano
diretor da cidade a localização de parques e de bulevares, assim como o alargamento das
ruas de tráfego e o aprovisionamento de um centro cívico, são todos considerados a partir
do interesse em um futuro controle do desenvolvimento físico da cidade.
Esta expansão territorial de nossas maiores cidades desperta foçosamente a nossa
atenção pelo plano para o Estudo de New York e Arredores, e pela formação da
Associação de Planejamento Regional de Chicago, que estende o distrito metropolitano da
cidade a um raio de 50 milhas, abrangendo 4.000 milhas quadradas de território. Ambos
pretendem mensurar a expansão da malha urbana para lidar com as transformações que
acompanham o crescimento da cidade. Na Inglaterra, onde mais da metade dos habitantes
vivem em cidades com uma população de 100.000 habitantes ou mais, a expressiva
apreciação da influência da expansão urbana na organização social é expressa do seguinte
modo por C. B. Fawcett:
2
Citado do: "British Conurbations in 1921”, Sociological Review, XIV (April, 1922), III-IV.
3
Ver o trabalho de: E. H. Shideler, The Retail Business Organization as an Index of Community
Organization (in preparation).
4
Para um estudo des área cultural da cidade, ver: Nels Anderson, The Hobo, Chicago, 1923·
5
Ver: WEBER, Max. The Growth of Cities, p. 442.
6
Adaptaddo de: W. B. Monro, Municipal Government and Administration, II, 377.
7
Ver: “Report on the Chicago Subway and Traction Commission”, p.80; e o “Report on a Physical Plan or a
Unified Transportation System”, p.391.
8
Dados compilados pela indústria automobilística.
9
Estatísticas da Divisão de Serviços Postais, Correios da Cidade de Chicago.
10
Determinado pelo: Census Estimates For Intercensual Years.
números de Chicago aumentaram de 12.3 para 2 1.6 telefones por 100 habitantes. Mas o
aumento do uso do telefone é provavelmente mais significativo do que o aumento no
número de telefones. O número de telefonemas em Chicago aumentou de 606.131.928, em
1914, para 944.010.586, em 192211, um aumento de 55.7 por cento, enquanto a população
aumentou apenas 13.4 por cento.
Os valores fundiários, na medida em que refletem o movimento na cidade,
proporcionam um dos índices mais sensíveis de mobilidade. Os mais altos valores de terra
em Chicago estão no ponto de maior mobilidade na cidade, na esquina das ruas State e
Madison, no Loop. Uma contagem de tráfego mostrou que durante o período do rush
31.000 pessoas por hora, ou 210.000 homens e mulheres em dezesseis horas e meia, passou
pelao esquina sudoeste. Por mais de dez anos os valores de terra no Loop foram
estacionários, mas ao mesmo tempo duplicaram, quadruplicaram e até mesmo
sextuplicaram nas áreas estratégicas dos "loops de satélite"12: um índice preciso das
transformações ocorridas. As investigações até o momento parecem indicar que as
variações nos valores das terras, especialmente quando correlacionadas com as diferenças
de aluguéis, oferecem talvez o melhor indicador de mobilidade e, portanto, de todas as
transformações que ocorrem na expansão e no crescimento da cidade.
Em linhas gerais, tentei apresentar a perspectiva teórica e os métodos de
investigação que o departamento de sociologia emprega em seus estudos sobre o
crescimento da cidade, ou seja, descrever a expansão urbana em termos de extensão,
sucessão e concentração; determinar como a expansão perturba o metabolismo quando a
desorganização excede a organização; e, finalmente, definir a mobilidade como medida de
expansão e de metabolismo, suscetível à formulação quantitativa precisa, para que possa
ser considerada quase literalmente como o pulso da comunidade. Em síntese, estas
afirmações introduzem qualquer um dos cinco ou seis projetos de pesquisa em andamento
no departamento de Sociologia da Escola de Chicago13. O projeto, no entanto, no qual
estou diretamente envolvido, se organiza como tentativa de aplicar esses métodos de
investigação a uma seção transversal da cidade - colocar esta área, por assim dizer, sob o
microscópio, e assim estudar mais detalhadamente e com maior controle e precisão os
processos que foram descritos de forma mais geral. Para este propósito, a comunidade
judaica de West Side foi selecionada. Esta comunidade inclui o chamado "Gueto", ou área
de primeiro assentamento, e Lawndale, o chamado "Deutschland", ou área de segundo
assentamento. Esta área tem certas vantagens óbvias para o estudo dos processos de
expansão, de metabolismo e de mobilidade, pois ilustra a tendência de expansão radial do
centro de negócios da cidade. E compõe atualmente um grupo cultural relativamente
homogêneo. Lawndale constitui em si uma área em fluxo, com a maré de migrantes ainda
fluindo dentro do gueto e uma saída constante para regiões mais desejáveis da zona
residencial. Nesta área faz-se também possível estudar como o resultado esperado da alta
taxa de mobilidade em desorganização social e pessoal é contrabalançada, em grande parte,
pela organização comunitária eficiente da comunidade judaica.
11
Retirado de Estatísticas preparadas por R. Johnson, supervisor de trânsito, Illinois Bell Telephone
Company.
12
Durante os anos de 1912-23,o valor fundiário aumentou em Bridgeport de $600 para $1,250; no distrito
Division-Ashland-Milwaukee, de $2,000 para $4,500; no "Back of the Yards," de $1,000 para $3,000; em
Englewood, de $2,$00 para $8,000; em Wilson Avenue, de $1,000 para $6,000; mas o valor fundiário
decresceu no Loop de $20,000 para $16,$00.
13
Ver os seguintes estudos: Nels Anderson, The Slum: An Area of Deterioration in the Growth of the City;
Ernest R. Mowrer, Family Disorganization in Chicago; Walter C. Reckless, The Natural History of Vice
Areas in Chicago; E. H. Shideler, TM Retail Business Organization as an Index of Business Organization; F.
M. Thrasher, One Thousand Boys' Gangs in Chicago: a Study of Their Organization and Habitat; H. W.
Zorbaugh, The Lower North Side: a Study in Community Organization.