Violência não é um conceito próprio da filosofia de Foucault, apesar de suas
discussões contribuírem para pensar esse debate. Refletir sobre violência, a partir desse autor, é possível em relação à análise do poder. Para abordarmos, de maneira resumida, de qual compreensão sobre poder ele parte, precisamos sinalizar que há definições diferentes, conforme elementos trabalhados pelo mesmo. Foucault contribuiu para pensar o poder nos níveis moleculares das relações, no que podemos chamar de micropoderes (FOUCAULT, 1979), assim como o poder enquanto governabilidade política, nos termos da biopolítica e do biopoder (FOUCAULT, 1999; 2008).
Com base na discussão em torno das expressões microfísicas do poder, podemos
compreender de que modo Foucault percebe as relações. Para este autor, o poder só existe em relação, em ato, sendo dinâmico e exercido por todos cotidianamente. Pensando assim, todas as relações são relações de poder. O poder não é uma característica ou um bem que se possa possuir ou negociar, trata-se de um contexto de disputa. As relações de poder, portanto, são relações de força. Em face do seu caráter, devemos reconhecer que todas as pessoas se relacionam de modo variável com o poder, ora em posição de dominação, ora de assujeitamento (FOUCAULT, 1979), apesar, é claro, de que há certa tendência à cristalização nas relações de poder, por exemplo, referente às relações estabelecidas entre os sexos. Entretanto, Foucault (1979) acredita que onde existe poder, é possível resistência, que é um efeito mesmo do poder. As resistências se dão nas relações entre sujeitos e sujeitos e instituições.
As relações de poder podem ser entendidas como relações de opressão e de
violência, mas não é somente disso que Foucault está falando. O poder não possui somente caráter repressor, punitivo e negativo, de modo amplo; há também seu caráter produtivo, no sentido mesmo de produção de sujeitos. Aqui podemos esclarecer um pouco mais a que se refere a biopolítica. Biopolítica é um termo empregado por Foucault (1999, 2008) para nomear uma nova modalidade de poder que emerge no final do século XVIII e que se volta para a gestão da vida. É um poder que se propõe garantir o prolongamento da vida, bem como indicar qual a melhor forma de vivê-la. Se, até o século XVII, o poder soberano se organizava a partir da morte e da permissão da vida, esse é um exercício inverso, de produzir a vida e permitir o processo de adoecimento e morte (FOUCAULT, 1999). Esse é um modelo econômico de gestão da vida, na medida em que pretende massificar os sujeitos a fim de garantir populações com determinadas características de produção, saúde e força (FOUCAULT, 1999; 2008). Ainda que não seja possível negar os ganhos, é necessário avaliar os riscos desse modelo. A biopolítica produz sujeitos justamente na medida em que regula seu modo de vida. Ainda assim, as possibilidades de escapar às normas estão presentes, mesmo que se pague o preço. Nessa lógica, existem regimes políticos, econômicos e institucionais que produzem relações de violência e que precisam ser mais bem compreendidos para serem modificados. Nos primeiros estudos de Foucault, chamados de arqueológicos, ele procurou entender como a verdade produz efeitos de poder, para em seguida passar aos
estudos genealógicos, de compreensão de como o poder produz efeitos de verdade
(FOUCAULT, 1979; 2008). Aqui podemos citar como exemplos conhecimentos científicos que historicamente legitimaram a diferença entre os sexos como desigualdades, apontando para uma suposta inferioridade das mulheres. Genealogia é, então, uma ferramenta política importante proposta por Foucault, que permite investigar e trazer à tona as circunstâncias de legitimação de determinadas verdades, permitindo o aparecimento de outras possibilidades de existência e relações. Não há saber neutro, todo saber é político e produz a realidade que vivemos. Apesar de as discussões de Foucault possibilitarem uma importante desnaturalização de mecanismos de controle e opressão dos sujeitos em geral, limitam-se ao considerar que homens e mulheres são igualmente alvos e da mesma forma atingidos por seus efeitos. Nesse sentido consideramos importante a interlocução com autores (as) que discutam mais diretamente as relações de violências entre homens e mulheres.
O CINEMA DO INTERIOR PARA O INTERIOR UM PANORAMA SOBRE CINEMA ITINERANTE E ESPECTATORIALIDADE CINEMATOGRÁFICA EM COMUNIDADES RURAIS DO MUNICÍPIO DE SERRINHA - BA - Carla Nascimento Lima