Você está na página 1de 14

Cimentos Geopoliméricos

F.J. da Silva, M. C. de Oliveira, M.V.S. Machado, F. P. Duarte e C. Thaumaturgo

Instituto Militar de Engenharia (IME)


Departamento de Engenharia Mecânica e de Materiais – DE/4
Praça General Tibúrcio, 80 – Urca, 22290-270, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
email: imes4cle@epq.ime.eb.br

Abstract

The alkaline activation of Portland cement-based composites and granulated blast furnace slags
have been accomplished with success since the 40th decade, in several countries of the world. The
potentiality of the use of the alkalis opens new opportunities for the obtaining of special cements,
with different properties from those presented by the Ordinary Portland cement.

This work presents comparative studies of the physical-chemistries and mechanical properties of a
new inorganic polymeric cement alkali-activated artificial pozolana based (geopolymer), of ultra
early-high compressive stregth and curable at room temperature called poly(sialate-siloxo) (PSS).
The results reveal that the obtained product is formed by an only phase of sodium, potassium and
calcium aluminosilicate, amorphous to the X-rays and with polymeric chains of the type (Si-O-Al-
O-Si-O-Si), composed by tetrahedros of SiQ4(2Al) and with cross-linkage connections from the
aluminum atoms in four-fold coordination number.

Compressive strengths higher than 45 MPa are obtained in few hours, overcoming all the Portland
cement types, besides of the early-high compressive strength (ARI).

Key words: geopolymer cements; alkaline activation; poly(sialate-siloxo)

Resumo

A ativação alcalina de compósitos à base de cimento Portland e escórias de alto-forno vem sendo
realizada com sucesso desde a década de 40, em vários países do mundo. A potencialidade do uso
dos álcalis abre novas oportunidades para a obtenção de cimentos especiais, com propriedades
distintas daquelas apresentadas pelo cimento Portland convencional.

Este trabalho apresenta estudos comparativos das propriedades fisico-químicas e mecânicas de um


novo cimento polimérico inorgânico à base de pozolana artificial álcali-ativada (geopolímero), de
ultra alta resistência inicial e curável a temperatura ambiente chamado polisiloxossialato (PSS).
Os resultados revelam que o produto obtido é formado por uma única fase aluminossilicato de
sódio, potássio e cálcio, amorfa aos raios X e com cadeias poliméricas do tipo (Si-O-Al-O-Si-O-
Si), composta por tetraedros de SiQ4(2Al) e com ligações cruzadas a partir dos átomos de
alumínio em número de coordenação IV.

Resistências à compressão superiores a 45 MPa são obtidas em poucas horas, superando todos os
tipos de cimento Portland, inclusive o de alta resistência inicial (ARI).

Palavras-Chaves: cimentos geopoliméricos; ativação alcalina; polisiloxossialato


Introdução

Os chamados geopolímeros ou polissialatos, uma terminologia adotada para abreviatura de poli-


silico-aluminatos, foram descritos pela primeira vez em patentes 1981, onde são apresentados
vários exemplos de mistura de reagentes e processos de obtenção. Os polissialatos apresentam
características particulares que revelam o seu grande potencial de aplicação como aglomerante,
em substituição ao cimento Portland. Segundo o autor1, trata-se de uma adaptação moderna de
processos de estabilização de solos cauliníticos ou lateríticos com cal [Ca(OH)2], feita pelos
antigos Romanos e Egípcios na confecção de aglomerantes estruturais.

Em uma publicação, intitulada “The Pyramids: An Enigma Solved” 2, é afirmado que as grandes
pirâmides do Egito foram erguidas, há 4500 anos atrás, com blocos moldados com este material.
Baseando-se em estudos mineralógicos e químicos, foi constatado que os blocos não são de pedra
calcária natural, e sim de um concreto feito a partir da mistura de pedregulhos de calcário
caulinítico oriundos de Gizé com NaOH, produzido in situ pela mistura de cal [Ca(OH)2], barrilha
[Na2CO3] e água. Segundo as análises, as pedras calcárias naturais são compostas por folhas
fossilizadas dispostas paralelamente entre si, em camadas sedimentares.

Nos blocos das pirâmides, entretanto, as camadas são orientadas aleatoriamente, como ocorre
quando pedregulhos de calcário são aglomerados dentro do concreto. Estudos de difração de raios
X de amostras removidas dos blocos das pirâmides de Cheops, Chefren, Teti e Sneferu indicam
que a calcita (CaCO3) é a fase cristalina predominante. Entretanto, um material amorfo composto
por silicatos e aluminossilicatos complexos e um material criptocristalino (zeólita do tipo
analcima, Na2O×Al2O3×4SiO2×2H2O), acompanham a microestrutura2.

Estes compostos também são comumente encontrados em amostras de estruturas antigas


existentes na Grécia, Cyprus e Itália, algumas com quase 9000 anos de idade. A excelente
durabilidade dessas estruturas é considerada estar relacionada com a existência de tais compostos.

Encontram-se em fase de desenvolvimento, neste Instituto, vários trabalhos de tese sobre a


obtenção, caracterização e emprego dos geopolímeros (polissialatos). A cinética das reações de
síntese, principais funções dos diferentes reagentes, influência da ordem de adição dos reagentes
durante a síntese, além de outros fatores que afetam as suas propriedades foram estudados.
Utilizando espectroscopia de ressonância magnética nuclear (RMN) no estado sólido, foi proposto
um modelo molecular que representa o arranjo formado pelas cadeias poliméricas dos
polissialatos3. A resistência sob ataque químico e ciclagem térmica, o reforçamento com fibras
contínuas e o desenvolvimento de concretos de matriz de cimento polissialato também estão sendo
implementados4, 5. Excelentes resultados foram recentemente obtidos com a aplicação destes
materiais em blindagens balísticas6.

Este tem trabalho como objetivo a caracterização das propriedades físicas e mecânicas de um
cimento geopolimérico, tipo polisiloxossialato de sódio, potássio e cálcio, Na,K,Ca-PSS, indicado
para aplicações estruturais. Em analogia aos cimentos Portland, foram adotados os principais
procedimentos prescritos pelas normas técnicas brasileiras e internacionais, para que os resultados
obtidos pudessem ser comparados com aqueles apresentados na literatura.

Materiais e Métodos
Para obtenção do aglomerante PSS, a fonte de alumínio empregada foi um aluminossilicato da
família dos filossilicatos (Si2O5Al2O2), uma pozolana artificial apresentando estrutura amorfa com
o alumínio em número de coordenação IV em relação ao oxigênio. Como a razão Si/Al na
pozolana é inferior a 3, uma fonte complementar de silício, um polissilicato solúvel comercial, foi
empregada. Para obter um pH da ordem de 14, necessário para atacar a estrutura da pozolana e
provocar a polimerização, foi empregado também, como fonte suplementar de álcali, hidróxido de
potássio (Vetec P.A.). A fonte de cálcio foi a escória granulada de alto forno (EGAF) fornecida
pela Belgo-Mineira S.A.. A areia empregada na confecção dos corpos de prova para ensaios
mecânicos foi de rio, lavada e beneficiada para atender às quatro frações da areia Normal
brasileira (ABNT NBR 7214/92). A Tabela 1 mostra a composição química e as propriedades
físicas dos materiais usados.

A mistura dos constituintes básicos e a confecção dos corpos de prova seguiram as prescrições da
ABNT NBR 7215/92. Após determinação das resistências à compressão, amostras de pastas e
argamassas foram selecionadas para análise térmica diferencial (DSC - Shimadzu),
termogravimétrica (TGA – Shimadzu)difração de raios X (Philips D 5000), ressonância magnética
nuclear dos núcleos de 27Al e 29Si (MAS-NMR – Varian 300) e microscopia eletrônica de
varredura (MEV – Jeol 5800 LV). Para servir de comparação, esses mesmos estudos foram
realizados em pastas e argamassas de cimento Portland CPIIE-32, marca Campeão/Mauá,
fornecido pela Lafarge S. A.. As Figuras 1 e 2 mostram micrografias (MEV) da pozolana artificial
e da EGAF, respectivamente.

Tabela 1 – Composição química e propriedades físicas dos materiais empregados

Pozolana EGAF Polissilicato CPIIE-32


aquoso
(< # 200) (< # 200)
SiO2 44,4 39,7 35,6 20,0

Al2O3 39,8 13,0 - 5,0

<0,01 47,8 - 60,4


CaO

0,30 0,72 - 1,6


Fe2O3
0,11 0,38 - -
TiO2
0,11 0,63 - 1,4
MgO
0,04 0,21 17,3 -
Na2O
0,33 0,26 - -
K2O
- 0,47 - 3,9
SO3
47,9 59,4 36,9 1,9
a
R.I.
14,4 1,14 44,3 6,3
b
P.F.
1009,35 262,93 - 349,92
Área Esp. Blainec (m2.kg-1) 1665,17 205,40 - 222,34
Área Esp. BETd (m2.kg-1) 2,56 2,93 2,11 3,04
Massa Específica (kg.dm-3) 12,35 55,70 - -

Resíduo na # 325(%) 107,88 - - -

Strength Activity Indexe (%) 12,99 - - -

I.A.P.f (MPa)

a – Resíduo insolúvel em ácido clorídrico.


b – Perda ao fogo por calcinação a 950 + 50 oC.
c – Determinação da área específica pelo “permeabilímetro de Blaine” (NBR 7224).
d – Análise por absorção de N2.
e – Resistência à compressão aos 28 dias de idade, da argamassa Normal com 20% de adição de
pozolana, comparada com a argamassa com 100% de cimento Portland (ASTM C 311).
f – Índice de Atividade Pozolânica com a cal – (NBR 5751).

Figura 2: Micrografia (MEV) da pozolana Figura 3: Micrografia (MEV) da EGAF (1000X)


artificial (13000X)

Resultados e Discussões

A Figura 3 mostra as resistências à compressão alcançadas em função da idade, do cimento PSS,


do cimento Portland composto, CPIIE-32 e do cimento Portland de alta resistência inicial, ARI.
Como observado, o cimento PSS, quando curado a 65 oC por 4 horas, atinge resistência à
compressão da ordem de 45 MPa. Esse mesmo nível de resistência é atingido aos 3 dias de idade,
quando curado a temperatura ambiente (22 oC).
Figura 3: Variação da resistência à compressão da argamassa Normal, em função do tempo, do
cimento Na,K,Ca-PSS, CPIIE-32 e CPV ARI.

Os cimentos Portland, geralmente, sofrem alterações deletérias em sua microestrutura quando


curados a quente. Foi observado que o ARI atinge apenas 20 MPa, quando curado a 65 oC por 4
horas. Foi notado também uma queda na taxa de desenvolvimento da resistência. Aos 28 dias,
atingiu apenas 36 MPa. Quando curado a temperatura ambiente e imerso em câmara úmida,
atingiu aos 28 dias de idade, resistência à compressão igual a 48 MPa. Nesta mesma idade, o
cimento PSS atingiu 57 MPa.

A literatura de patentes e as demais referências sobre os polissialatos descrevem algumas


características físico-químicas que diferenciam estes materiais de outros produtos tais como as
zeólitas, os feldspatóides e também os cimentos portland2, 7. A seguir é feita a caracterização da
matriz de cimento polisiloxossialato obtido com razão Si/Al = 3.

A principal diferença apontada entre é a de que os polissialatos processados a pressão atmosférica


e temperaturas abaixo de 100 oC, apresentam baixa cristalinidade. Quando analisados por difração
de raios X, apresentam um halo difuso a cerca de 27-29o 2q máximo (radiação Cu-Ka). A Figura 4
mostra o difratograma de raios X do Na,K,Ca-PSS obtido.
Figura 4: Espectro de difração de raios X do Na,K,Ca-PSS.

Segundo alguns autores2, 7, 8, os polisiloxossialatos obtidos nessas condições são o equivalente


amorfo de vários tecto-aluminossilicatos tais como a Phillipsita e a Leucita para os Na,K-PSS e os
K-PSS, respectivamente. Quando há presença de Ca++ em complemento aos íons Na+ e K+, a
estrutura equivalente sugerida é a da zeólita Analcima.

Com relação aos cimentos Portland, os polissialatos apresentam diferenças consideráveis. Nos
cimentos Portland, independente das adições minerais (pozolanas), os principais produtos da
hidratação são o C-S-H e a portlandita, enquanto que nos polissialatos, não há formação de fases
distintas, sendo formado inteiramente por uma microestrutura massiva, sem morfologia definida e
com composição semelhante a das rochas. Por esse motivo, os pesquisadores associam este
material aos minerais formadores das rochas, enfatizando a sua potencial durabilidade2, 7, 8. As
Figuras 5[a] e 5[b] mostram as microestruturas da pasta de cimento PSS com 7 dias de idade. A
Figura 6 mostra o espectro de EDS.

[a] [b]

Figura 5: Micrografias (MEV) da pasta de cimento PSS, aos 7 dias de idade. [a] Microestrutura
massiva e monofásica (1.400X). [b] Detalhe mostrando a compacidade da matriz (5.000X).
Figura 6: Espectro de EDS da pasta de cimento PSS, aos 7 dias de idade.

Para comparação, uma microestrutura típica formada pela hidratação do cimento Portland é
mostrada na Figura 7 (CPIIE-32, A/C = 0,30). Comparando as microestruturas, ficam claras as
diferenças entre as duas matrizes. No cimento PSS, a microestrutura é compacta e homogênea,
sendo formada por uma única fase aluminossilicato de sódio, potássio e cálcio. Na matriz de
cimento Portland, as fibrilas de C-S-H e os cristais poligonais de Ca(OH)2 são as principais fases
formadas, correspondendo a mais de 85% dos produtos hidratados.

[a] [b]

Figura 7: Micrografias (MEV) da pasta de cimento Portland CPIIE-32, aos 28 dias de idade. [a]
Cristais pseudohexagonais de Ca(OH)2 e fibrilas de C-S-H tipo (I) (1.400X). [b] Detalhes das
diferentes morfologias das fases formadas (5.000X).

Na ativação do cimento Portland, mesmo em concentrações elevadas, os álcalis não alteraram


substancialmente as características da matriz endurecida. As mudanças composicionais geradas
nas fases hidratadas não provocam quebra da cristalinidade e as principais fases hidratadas
continuam sendo as mesmas do cimento sem ativação só que em proporções bem distintas9.

Diversos materiais cimentícios híbridos contendo escórias de alto-forno álcali ativadas também
têm sido comparados com os polissialatos. Contudo, em todos esses sistemas o papel catalítico dos
álcalis apenas desperta as propriedades latentes das escórias, principalmente daquelas
consideradas de baixa hidraulicidade, e os teores de álcalis empregados não ultrapassam a 5% da
massa total. Os produtos comuns das reações desses cimentos álcali-ativados são diversas
variedades de C-S-H, fases tipo (C,M)mAHn, ou seja, aluminatos de cálcio hidratado com Mg2+ e
álcalis incorporados, e pequenas quantidades de strätlingita (C2ASH8) 9.
Como os cimentos polissialatos são materiais mal-cristalizados ou amorfos, as técnicas usuais de
caracterização por difração de raios X não são as mais adequadas para investigar sua estrutura. Por
conseguinte, técnicas mais avançadas como espectroscopia vibracional são úteis para identificar os
principais domínios existentes nestes materiais. Dentre elas, a ressonância magnética nuclear com
rotação do ângulo mágico RMN-MAS (do inglês Magic Angle Spinning) é uma das ferramentas
mais empregadas para estudar materiais “desordenados” ou “mal-ordenados” tais como géis,
colóides e sistemas policristalinos ou altamente dispersos. Para silicatos, aluminatos e
aluminossilicatos os núcleos mais empregados são 27Al e 29Si, mas os núcleos de 17O e de 1H
também promovem informações importantes9-11.

As principais informações obtidas a partir dos espectros de RMN-MAS para esses materiais são a
detecção da presença ou ausência de alguma fase, as porcentagens relativas entre as fases ou os
ambientes estruturais do Si e Al, o grau de polimerização dos tetraedros silicatos, o ângulo médio
entre as ligações Si-O-Si e as abundâncias relativas dos átomos de alumínio tetraédricos e
octaédricos 10.

A Figura 8 mostram os espectros de RMN-MAS gerados pelo cimento PSS (Na,K,Ca-PSS)


para o núcleo de 27Al.

O espectro 27Al RMN-MAS revelou um único acoplamento químico em cerca de 55 ppm a partir
do padrão empregado (nitrato de alumínio hexahidratado, 0 ppm). As correlações entre estrutura e
acoplamento químico em aluminossilicatos indicam que o alumínio no cimento PSS é do tipo
AlQ4(4Si), apresentando coordenação tetraédrica em relação ao oxigênio2, 10, 11. A ausência de
qualquer outra ressonância e o pico extremamente estreito a 55 ppm, exclui a indicação da
presença de unidades repetitivas de baixo peso molecular tais como dímeros e trímeros2, 10.

Figura 8: Espectro de 27Al RMN-MAS para a pasta de cimento PSS.

Para a pasta de cimento Portland CPIIE-32, o espectro de 27Al RMN-MAS (Figura 9) apresentou
acoplamento químico a cerca de 58 ppm correspondente ao AlQ4(4Si), (tetraedro AlO4) e um
outro acoplamento químico a cerca de 8,5 ppm, correspondente ao alumínio octaédrico, em
número de coordenação VI (AlO6). Segundo a literatura10, 11, os espectros de 27Al RMN-MAS
mostram uma conversão de Al-IV, domínio principal nos C3A e C4AF, para Al-VI nas fases
aluminatos e ferro-aluminatos de cálcio hidratados. Contudo, o pico correspondente a esses
aluminatos ocorre em cerca de 12 ppm. O outro, próximo a 8 ppm é atribuído a presença de
gibsita11. O sinal na faixa do Al-IV é atribuído a resíduos de partículas não hidratadas, pois muitos
dos aluminatos de cálcio anidros possuem somente Al-IV, apresentando tipicamente um único
acoplamento químico entre 78 e 85 ppm, exceto para o Ca6Al2O3 que também contém Al-VI10, 11.

Entretanto, por causa das simetrias dos sítios Al-IV e da presença de impurezas no aluminato
tricálcico (C3A) e no ferroaluminato tetracálcico (C4AF), é comum ocorrer alargamento dos picos.
É sabido também que o Fe39, presente no C4AF pode interferir no sinal do Al, devido a efeitos
paramagnéticos, mas este fenômeno não dificulta a caracterização dos cimentos, a despeito da
presença significante deste elemento11.

Figura 9: Espectro de 27Al RMN-MAS para a pasta de cimento Portland CPIIE-32, aos 28 dias de
idade.

Os resultados de 29Si RMN-MAS para o cimento PSS mostraram a ocorrência de apenas um


acoplamento químico a –92 ppm em relação ao padrão tetrametilsilano (TMS), correspondente aos
silicatos de estrutura tridimensional com ligações cruzadas do tipo SiQ4(2Al), apresentando total
polimerização dos tetraedros silicatos2, 10-11 (Figura 10).

O espectro de 29Si RMN-MAS para a pasta de cimento Portland CPIIE-32 mostrou dois picos
principais entre –68 e –80 ppm (Figura 11). O primeiro à esquerda (-70 ppm), corresponde aos
monossilicatos SiQ0, cujos tetraedros são totalmente depolimerizados tal como os que ocorrem nas
fases C3S e C2S. O segundo acoplamento (–78 ppm), corresponde ao dímeros na forma SiQ1 dos
tetraedros silicatos2, 10, 11. A presença dos monossilicatos confirma a existência de núcleos ainda
anidros na pasta hidratada aos 28 dias de idade e corrobora com os resultados de difração de raios
X, que identificaram resíduos de C2S e, em menor intensidade também o C3S.
Figura 10: Espectro de 29Si RMN-MAS para a pasta de cimento PSS.

Segundo a literatura9, 10, 11, numa pasta de cimento Portland comum totalmente hidratada, a
configuração dominante entre os tetraedros SiO4 no C-S-H é do tipo SiQ1. Entretanto, para
cimentos Portland com adição de baixos teores de escória de alto forno e/ou pozolana também
ocorrem espécies SiQ2 e que a razão SiQ1/SiQ2 pode ser igual ou inferior a um 11.

Estudos revelam10, 11 que a fração de espécies SiQ1 atinge seu valor máximo em poucas semanas
após o início da hidratação e então declina. É sugerido que este fenômeno seja resultante das
reações pozolânicas que formam fases C-S-H mais ricas em Si. Contudo, a probabilidade de
ocorrência de espécies SiQ3 e SiQ4 ainda é pequena, mesmo após anos de hidratação. Em alguns
casos, há registros de sinais na faixa do SiQ3 mas são atribuídos a sílica coloidal eventualmente
presente.

Algumas patentes recentes10, relacionadas com os cimentos álcali-ativados apresentam diferentes


combinações entre diversos tipos de cimento Portland, pozolanas artificiais, escória de alto-forno,
ativadores alcalinos e, eventualmente aditivos plastificantes. O objetivo é obter produtos com
propriedades especiais, capazes de desenvolver elevadas resistências mecânicas e químicas em
tempos cada vez mais curtos.
Figura 11: Espectro de 29Si RMN-MAS para a pasta de cimento Portland CPIIE-32, aos 28 dias de
idade.

No entanto, como o cimento Portland ainda entra nessas formulações em maior quantidade, em
relação aos demais constituintes (escória de alto-forno, cinza volante, metacaulim, ativadores
alcalinos e aditivos plastificantes), os sistemas obtidos são muito distintos dos polissialatos.

Para complementar a caracterização microestrutural do cimento PSS, foram realizadas análises


térmicas DSC e TGA para determinar se houve formação de alguma outra fase. As curvas DSC e
TGA do cimento PSS são mostradas na Figura 12 e novamente comparadas com o CPIIE-32
(Figura 13).

A curva de DSC para o cimento PSS não revelou o pico endotérmico característico da dissolução
da portlandita, indicando ausência dessa fase na matriz PSS. A ausência de qualquer transição até
cerca de 700 oC, exclui qualquer indício da eventual formação de CaCO3. O primeiro pico
endotérmico a cerca de 100 oC está associado a evaporação da água livre e adsorvida no PSS,
contudo a progressiva perda de massa com a elevação da temperatura indica também que há perda
da água quimicamente ligada.
Figura 12: Curvas DSC e TGA da pasta de cimento PSS, aos 28 dias de idade.

As diferentes funções da água na matriz de cimento Portland e o desenvolvimento lento e contínuo


do processo de hidratação faz com que a cura seja de suma importância para a qualidade do
produto endurecido. A manutenção da umidade interna durante os primeiros dias de idade visa
garantir que haja água suficiente para promover as reações de hidratação e ao mesmo tempo evitar
que ocorra fissuração por evaporação10.

Nos polissialatos, a água funciona principalmente como dispersante e meio de condução iônica. A
água catalisa a polimerização e posteriormente pode ou não deixar a molécula. A água residual
(livre) pode ser totalmente eliminada por aquecimento sem prejudicar a resistência do produto,
uma vez que a polimerização tenha sido completada. Isto faz com que a cura dos cimentos PSS
seja menos crítica, dispensando artifícios onerosos como aqueles empregados na cura dos
concretos de alto desempenho.

Para a pasta de CPIIE-32, a curva de DSC mostra nitidamente os picos típicos associados à
dissolução da portlandita
(~ 480 oC ) e a dissolução do CaCO3 (~ 750 oC). O primeiro pico endotérmico a aproximadamente
145 oC está associado a perda de água livre e adsorvida ao C-S-H. A transição registrada a cerca
de 185 oC é devida à dissolução de algumas fases AFm (C4AH13, C2AH10)10.
Figura 13: Curvas DSC e TGA da pasta de cimento CPIIE-32, aos 28 dias de idade.

Comparando as curvas TGA para o PSS e o CPIIE-32, é percebida uma menor perda de massa
pelo cimento PSS, cerca de 70% a menos que a pasta de cimento Portland. Este resultado mostra a
grande capacidade de adsorção de água desenvolvida pelo C-S-H e ajuda a avaliar as diferentes
funções da água nos dois materiais.

No cimento PSS, a água não-residual está incorporada na matriz de forma estável, com ligações
primárias que não são rompidas nas faixas de temperatura que provocam dissolução das fases
hidratadas do cimento Portland.

Conclusões

É possível, a partir de uma reação pozolânica controlada, obter um polímero totalmente


inorgânico, de alta resistência mecânica e capaz de ser processado a temperatura ambiente. Os
elevados níveis de resistência à compressão registrados o tornam potencialmente promissor como
material aglomerante para argamassas e concretos.

Os resultados de caracterização mostraram que o produto obtido é um cimento polisiloxossialato


do tipo Na,K,Ca-PSS, com uma microestrutura densa e isenta de Ca(OH)2, sendo constituída por
uma única fase aluminossilicato de sódio, potássio e cálcio, apresentando estrutura amorfa aos
raios X.

As análises de RMN-MAS para os núcleos de 27Al e 29Si revelaram que o Na,K,Ca-PSS obtido é
formado por cadeias poliméricas com ligações cruzadas, cuja unidade funcional (-Si-O-Al-O-Si-
O-Si-) apresenta-se em tetraedros de SiQ4(2Al) com átomos de alumínio em número de
coordenação IV. Estas configurações diferem bastante do cimento Portland hidratado (CPIIE-32),
com seus silicatos de cálcio monoméricos e diméricos e aluminatos de cálcio com Al-VI, assim
como dos cimentos álcali-ativados, com seus arranjos irregulares e diferentes ambientes químicos.

Agradecimentos

Os autores agradecem à CAPES e FAPERJ pelo suporte financeiro, aos laboratórios de


Microscopia Eletrônica (LME), de Materiais de Construção e Mecânica dos Solos (LMC) e de
Catálise do IME. Sinceros agradecimentos também ao CENPES, pelas análises de RMN e à
Belgo-Mineira S.A./Cimento Mauá S.A., pela cortesia de fornecer a EGAF.
Referências

1 - Davidovits, Joseph.. “Properties of Geopolymer Cements”. PROCEEDINGS. 1th International


Conference on Alkaline Cements and Concretes. Kiev, Ukraine, 1994. pp. 131-149.

2 - Davidovits, Joseph.. “Ancient and Modern Concretes: What is the Real Difference”. Concrete
International, Vol. 9, n. 12, 1987, pp 23-35.

3 - Barbosa, Valéria F. F.. “Síntese e Caracterização de Polissialatos”. Tese de Doutorado.


Instituto Militar de Engenharia. Rio de Janeiro, 1999. 150p.

4 - Dias, Dylmar P.. “Reforços em Polissialatos”. Tese de Doutorado – Em desenvolvimento.


Proposta aprovada em Fev. 1998. Instituto Militar de Engenharia. Rio de Janeiro.

5 - Thomaz, Eduardo C.. “Concreto Polissialato”. Dissertação de Mestrado – Em


desenvolvimento. Proposta aprovada em Fev. 1998. Instituto Militar de Engenharia. Rio de
Janeiro.

6 - Sousa, Alexandre N.. “Compósito p/ Blindagens Balísticas Leves”. Dissertação de Mestrado.


Instituto Militar de Engenharia. Rio de Janeiro. 1999, 250p.

7 - Husbands, T. B., Malone, P. G., Wakeley, L. D. “Performance of Concretes Proportioned with


Pyrament Blended Cement”. Construction Productivity Advancement Research (CPAR) Program.
US ARMY CORPS OF ENGINEERS – Waterways Experiment Station. Final Report CPAR-SL-
94-2, April 1994. 80p.

8 - Shi, Caijun. “Strength, Pore Structure and Permeability of Alkali-Activated Slag Mortars”.
Cement and Concrete Research. V. 26, n. 12, 1996. pp. 1789-1799.

9 – Silva, Felipe J.. “Reforço e Fratura em Compósitos de Matriz Álcali-Ativada”. Tese de


Doutorado. Instituto Militar de Engenharia – IME. Rio de Janeiro. 2000. 271p.

10 - Kirkpatrick, R. J., Cong, X-D.. “An Introduction to 27Al and 29Si NMR Spectroscopy of
Cements and Concretes”. In: Application of NMR Spectroscopy to Cement Science. Gordon and
Breach Science Publishers. Pennsylvania - USA, 1994, pp 55-75.

11 - Grimmer, A.-R.. “Structural Investigation of Calcium Silicate from 29 Si Chemical Shift


Measurements”. In: Application of NMR Spectroscopy to Cement Science. Gordon and Breach
Science Publishers. Pennsylvania - USA, 1994, pp 113-151.

Você também pode gostar