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ISSN: 1413-8271
revistapsico@usf.edu.br
Universidade São Francisco
Brasil
da Costa Araújo, Luciene; Leal Vieira, Kay Francis; da Penha de Lima Coutinho, Maria
Ideação suicida na adolescência: um enfoque psicossociológico no contexto do ensino
médio
Psico-USF, vol. 15, núm. 1, abril, 2010, pp. 47-57
Universidade São Francisco
São Paulo, Brasil
Resumo
Objetivou-se apreender as representações sociais da ideação suicida elaboradas por adolescentes do ensino
médio, bem como investigar a presença deste fenômeno nesta população, considerando-se que a ideação suicida
tem um importante valor preditivo para o ato suicida. Participaram 90 estudantes do ensino médio, os quais
responderam ao Teste de Associação de Palavras, ao Inventário de Ideação Suicida de Beck e a um questionário
sociodemográfico. Observou-se um índice de 22,2% de adolescentes com ideação suicida, havendo significativas
diferenciações entre as representações elaboradas pelos grupos com e sem ideação suicida. Os adolescentes que
apresentaram ideação se autorrepresentaram como pessoas sozinhas, associando a ideação a sentimentos de
desesperança e solidão, ao mesmo tempo em que expressaram um pedido de ajuda diante de seu sofrimento. Os
achados enfatizam a importância dos fatores sinalizadores, que podem permitir uma melhor compreensão sobre a
problemática do suicídio.
Palavras-chave: Ideação suicida, Adolescência, Representação social, Ensino médio.
Abstract
The purpose of this study was to grasp the social representations about suicide amongst adolescents in high
school context, as well as, to measure suicidal ideation levels among them, considering that suicide ideation
brings a strong predictive role in suicide risk evaluation. Ninety high school students took part in the study. The
inclusion criteria in the sample were: high school students aged between 14 and 22 years old. As instruments, the
Free-Word Association Test, the Beck Scale for Suicide Ideation (BSI) and a sociodemographic questionnaire
were used. A level of 22.2% of suicidal ideation sample and significant differences in social representations of
suicidal behaviors were observed among adolescents with and without suicidal ideation. Adolescents with suicidal
ideation self represented themselves as lonely, linking suicide ideations to hopelessness and loneliness, while
requesting help for their suffering. Findings lay emphasis on factors that may allow a better understanding of the
problem of suicide.
Keywords: Suicidal ideation, Adolescence, Social representation, High school.
Na 1 literatura específica, com frequência o a própria vida, mas sim modificar o ambiente no
comportamento suicida é classificado em três qual o indivíduo está inserido. Esses
categorias: ideação suicida, tentativa de suicídio e comportamentos são característicos da
suicídio consumado. Segundo Werlang, Borges e adolescência e de pessoas imaturas, como forma
Fensterseifer (2005), apesar de haver poucos dados de reação a um conflito, sendo diagnosticados, em
disponíveis, alguns estudos clínicos e numerosas ocasiões, como transtornos de
epidemiológicos sugerem a presença de possível personalidade e denominados de “chamadas de
gradiente de severidade e de heterogeneidade entre atenção”, e em algumas ocasiões têm caráter de
essas diferentes categorias. Assim, num dos chantagem emocional.
extremos tem-se a ideação suicida (pensamentos, Suicídio é uma palavra originada no latim,
ideias, planejamento e desejo de se matar) e, no derivada da junção das expressões sui (si mesmo) e
outro, o suicídio consumado, com a tentativa de caederes (ação de matar). Num sentido geral,
suicídio entre eles. significa o ato voluntário por meio do qual o
Segundo Vega Piñero, Blasco, Baca-Garcia & indivíduo possui a intenção e provoca a própria
Diaz (2002), utiliza-se o termo parassuicídio, que morte (Vieira, 2008). Apesar de não existir uma
significa condutas cuja intenção não é acabar com definição única aceitável, sabe-se que implica
necessariamente um desejo consciente de morrer e
a noção clara do que o ato executado pode
1 resultar.
Endereço para correspondência:
Rua João Soares Padilha, nº 21 apto. 1103 – Bessa – João Segundo dados da OMS (2000), a taxa
Pessoa-PB mundial de suicídio é estimada em torno de 16 por
E-mail: kayvieira@yahoo.com.br 100 mil habitantes, com variações conforme sexo,
48 Araújo, L. C., Vieira, K. F. L., Coutinho, M. P. L. Ideação Suicida na adolescência
idade e país. Calcula-se que as tentativas sejam 20 Segundo Stevenson (1992), há uma tendência
vezes mais frequentes que o ato consumado. para o sub-relato de suicídios, que reflete,
Botega (2007) ressalta que, em termos globais, a indubitavelmente, em algum grau, a tentativa de
mortalidade por suicídio aumentou 60% nos poupar aos membros da família um trauma
últimos 45 anos; neste período, os maiores emocional desnecessário. Além disso, a morte por
coeficientes mudaram de faixa etária – da mais suicídio pode ter impacto sobre certos temas
idosa para a mais jovem, sendo esta considerada o legais, tais como benefícios obtidos por seguros.
grupo de maior risco em 30 países. A morte por Mais ainda, Prieto e Tavares (2005) evidenciam
suicídio passou a ocupar a terceira posição entre as que, desde o ano de 1975, a Organização Mundial
causas mais frequentes de falecimento, na de Saúde já ressaltava a possibilidade de que as
população de 15 a 44 anos de idade, em alguns diferenças entre as taxas de incidência de suicídio,
países. entre os diversos países devessem-se, em grande
No Brasil, até há pouco tempo, o suicídio não parte, à falta de uniformidade nos procedimentos
era visto como um problema de saúde coletiva, de notificação. Segundo a OMS (2000), se os
pois entre as causas externas de mortalidades, mesmos métodos e regras para verificar se uma
encontrava-se na sombra dos elevados índices de morte ocorreu ou não por suicídio fossem
homicídio e de acidentes de trânsito, 7 e 5 vezes aplicados em todos os países, poder-se-ia assegurar
maiores, respectivamente, em média (Botega, com confiança que as diferenças dos índices
Werlang, Cais & Macedo, 2006). Neste país, a taxa refletem variações da incidência do fenômeno.
oficial de mortalidade por suicídio é estimada em De acordo com Holmes (2001), as mulheres
4,1 por 100 mil habitantes para a população como são três vezes mais propensas a tentarem o
um todo, estando, para o sexo masculino, em suicídio do que os homens, embora estes sejam
torno de 6,6 e em 1,8 para o sexo feminino, o que três vezes mais bem-sucedidos em suas tentativas.
o deixa no grupo de países os quais apresentam A razão para essa diferença ainda não está bem
baixas taxas de suicídio. No entanto, por tratar-se definida, mas acredita-se que, no primeiro caso,
de um país populoso, encontra-se entre os dez isso se deva a elas serem mais tendenciosas a
com números absolutos nesses casos, sofrer de depressão do que eles, reconhecendo-se,
configurando um total de 7.987 casos em 2004 assim, o importante papel desempenhado pela
(Brasil, 2006). depressão diante dos atos suicidas. Porém, no
Entretanto, sabe-se que as estatísticas sobre segundo caso, a hipótese destacada para explicar a
os atos suicidas são falhas e subestimadas, uma vez diferença entre mulheres e homens é que estes
que o número que consta nas estatísticas oficiais é usam técnicas mais violentas (revólveres, saltos de
extraído das causas de morte assinaladas nos prédio) do que aquelas (overdose, corte dos pulsos,
atestados de óbito. Porém, estes nem sempre são ingestão de medicamentos), aumentando assim, as
confiáveis, pois tanto a família quanto a própria chances das tentativas por eles utilizadas serem
sociedade, comumente, pressionam para que a bem-sucedidas.
causa seja falsificada. De acordo com Cassorla Conforme Barros, Coutinho, Araújo &
(1998), certamente a subestimação estatística será Castanha (2006), tem-se observado, nas últimas
mais intensa quando se trata de crianças e décadas, que o comportamento suicida tem
adolescentes, em que os atos autodestrutivos serão aumentado entre os jovens, sendo a adolescência
negados ou até escondidos pela família, diante de uma fase bastante associada à morte por causas
maiores sentimentos de culpa e/ou vergonha pelo violentas. É um período do desenvolvimento
ato. marcado por diversas modificações biológicas,
A subestimação das estatísticas sobre atos psicológicas e sociais; e essas mudanças,
suicidas deve-se a vários fatores, principalmente, geralmente, são acompanhadas de conflitos e
às dificuldades de conceituação. Dentre estas, por angústias. Às vezes, quando expostos às intensas e
exemplo, destacam-se as de identificar com prolongadas situações de sofrimento, de
precisão: quando um acidente automobilístico foi desorganização, os adolescentes podem
uma fatalidade ou tentativa de suicídio; ou quando desenvolver patologias e tornar-se mais
um usuário de drogas falece por over dose; assim vulneráveis ao suicídio (Teixeira & Luís, 1997). É,
como, quando um paciente nega-se a realizar o também, nesse período que tanto as ideações
tratamento de suas patologias; ou quando se quanto às tentativas ganham uma maior
recusa a comer, podendo ser compreendido como proporção, quando associadas ao quadro
abandono da vida.
Observou-se que dos 22,2% com ideação moram com os pais; 70% afirmaram ser católicos;
suicida, 55% são do sexo feminino e encontram-se e 100% disseram não possuir trabalho
na faixa etária entre 17 e 19 anos; 45% cursam o remunerado.
2º ano do ensino médio; 95% são solteiros; 85%
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Os dados coletados através da Técnica de modalidades. É possível também apreender a
Associação Livre de Palavras foram processados atração entre as variáveis fixas (sexo, faixa etária e
pelo software Tri-Deux Mots e analisados pela presença de ideação suicida) e as de opinião, que
Análise Fatorial de Correspondência (AFC), que correspondem às palavras evocadas pelos sujeitos
oferece uma leitura gráfica das variações para cada um dos estímulos indutores (ideação
semânticas na organização do campo espacial, suicida, suicídio, eu mesmo, futuro).
revelando aproximações e oposições das
falta-amor1 ─────────────────────┬──────────────────────────────────┐
│ ¨ │
│ ¨ │
│ ¨ │
│ ¨ deus3/amável3 │
│ ¨ jamais2 │
│ ¨ │
│ luta4 │
│ ¨ │
│ ¨ dor2 │
│ ¨ │
│ carinho3/objetivo4 ¨ │
│ ¨estudioso3/NÃO-IDEAÇÃO/deus4 bom4 │
│ ¨ │
│ ¨ fraqueza1 │
│ │
│ tragédia2/sincera3 ¨ │
│ FEMININO ¨ brincalhão3│
│ ¨ │
├¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨+¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨feliz4¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨┤
│ ¨ │
│ ¨ │
│ morte1 ¨ MASCULINO │
│ ¨ desespero1 │
│ desespero2 ¨ problema1 │
│ saudade2 ¨ │
│ ¨ saúde4/ruim2
│ raiva1 ¨ alívio2/atraente3 │
│ família4 │
│ IDEAÇÃO ¨ │
│ ¨ │
│ sozinho3/solidão1 ¨ │
│ ajuda1/tragédia1 ¨ │
│ ¨ bens4 │
│ ¨ cemitério2 │
│ ¨ │
│ ¨ │
└──────────────────────────--───14-16 ANOS──────────────────────────┘
Figura 1 – Análise fatorial de correspondência das representações sociais da ideação suicida
A descrição da Figura 1 faz-se pela leitura das variância, que junto ao fator 1, explica 58,5% da
modalidades que correspondem às palavras variância total das respostas.
evocadas ou representações, que se encontram Em relação ao fator 1 (F1) no lado superior
distribuídas de maneira oposta sobre os eixos ou esquerdo do gráfico em negrito, emerge o campo
fatores (F1 e F2). semântico correspondente às respostas evocadas
O primeiro fator (F1), em negrito, revela as pelos estudantes do sexo feminino. Para esses, a
mais fortes modalidades ou representações, que ideação suicida foi representada pelo elemento
explicam 33,9% da variância total das respostas. O “falta de amor”; indicando que a carência afetiva
segundo fator (F2), em itálico explica 24,6% dessa contribui para os pensamentos ou ideias de morte
autoprovocada. Ainda nesse mesmo eixo fatorial,
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verificam-se as palavras em negrito com direção de falha ou defeito como: covardia, falta
terminação 2, que se referem às representações de obstinação, ou seja, o lado fraco do caráter de
sociais do suicídio elaboradas por elas, as quais o um ser, o que revela uma propensão a ceder a
veem como decorrente de uma atitude de sugestões, imposições ou impressões e, nesse
“desespero” perante a vida, caracterizando uma sentido, devendo ser encarada como manifestação
“tragédia”. A “saudade” também foi lembrada e psicológica.
enfatizada pelas participantes, indicando ser esse o Em relação ao suicídio consumado, observou-
sentimento predominante após o ato suicida. Em se a existência de uma ambiguidade nas
relação ao terceiro estímulo – eu mesmo –, representações sociais desse fenômeno, ao qual
verificou-se que as evocações mais representativas atribuíram valores positivos e negativos. De forma
foram “sincera” e “carinhosa”, enquanto o semelhante, encontraram-se ambiguidades no
estímulo indutor futuro foi representado pelo estudo de Vieira (2008), onde o fenômeno foi
elemento “objetivos”. descrito como um ato de coragem e covardia ao
Observou-se que as representações do mesmo tempo, representando o fim não só da
comportamento suicida (ideação e suicídio vida, mas, principalmente, do sofrimento
consumado) ancoraram-se nos fatores vivenciado pelo indivíduo. Pode-se inferir, então,
desencadeantes do ato, focalizados na ausência de que a representação do indivíduo suicida para este
amor, no estado de sofrimento psíquico e grupo de pertença, ou seja, para a amostra de
desesperança do ser suicida. O sentimento de estudantes pesquisados, corresponde a um ser
saudade enfatizado pelas participantes remete ao corajoso, que atenta contra sua própria vida, mas
sofrimento dos que ficam; a dor da saudade dos ao mesmo tempo, é alguém que está fugindo dos
amigos e familiares, que sentem a perda oriunda seus problemas, vendo na morte a saída mais fácil,
do ato suicida. As autorrepresentações desse caracterizando, assim, um ato de covardia.
grupo de afiliação emergem de forma positiva, As autorrepresentações dos estudantes do
bem como as referentes às expectativas futuras, sexo masculino também emergiram de forma
caracterizadas pelo desejo de atingir alguns positiva, enfatizando características peculiares da
objetivos. adolescência. A respeito de suas expectativas, esses
Em contraste com essas evocações, os adolescentes destacaram seus desejos, suas
participantes do sexo masculino representaram a esperanças em relação ao futuro no intuito de
ideação suicida como uma atitude de “desespero”, serem saudáveis e felizes.
um ato de “fraqueza” diante de algum “problema”, Em relação ao fator 2, na parte superior do
o que pode ser observado à direita do fator 1, na gráfico, emergiu o campo semântico elaborado
parte inferior em negrito. O suicídio foi descrito pelos participantes, que, segundo a Escala de
de forma ambígua, pois ao mesmo tempo em que Ideação Suicida de Beck – BSI, não apresentaram
é visto como algo “ruim”, também traz “alívio”. a ideação suicida. Esta foi representada, por esse
Em relação ao estímulo indutor eu mesmo, as grupo de afiliação, como “fraqueza”, sendo o
representações mais significativas foram suicídio algo que representa “dor” e que,
“atraentes” e “brincalhões”; já as evocações mais provavelmente por isso “jamais” o cometeriam.
significativas, para o estímulo indutor futuro, foram Esses atores sociais se autorrepresentaram como
as palavras “saúde” e “feliz”. pessoas “amáveis”, “estudiosas” e que possuem
Percebe-se que esse grupo de afiliação grande fé em “Deus”. Para o estímulo indutor
apresentou a ideação suicida ancorada nos motivos futuro, a palavra “Deus” também foi evocada,
ou razões pelos quais um indivíduo viria pensar juntamente, com as evocações “bom” e “luta”.
em pôr um fim à própria vida; ou seja, diante de Observou-se que, para o grupo de estudantes
um problema, fraqueja e desesperadamente pensa que não atingiu o ponto de corte (16) no BSI, o
em provocar a própria morte. Ao atribuir uma comportamento suicida é representado mediante
condição de fraqueza ao individuo, os evocações, as quais indicam que essas atitudes, seja
participantes podem estar sinalizando dois o pensamento de morte ou mesmo a morte
sentidos diferentes e possíveis para o ser fraco. O propriamente dita, não fazem parte de suas
primeiro como sinônimo de falta de força, de vivências. O suicídio foi descrito como algo
vigor, de solidez, de energia, provavelmente inaceitável, que eles nunca chegariam a praticar,
associado a um quadro depressivo, sendo uma pois ocasiona dor; esta expressão “dói tanto” pode
manifestação predominantemente orgânica. O ser entendida como oriunda do ser suicida, que
segundo, significando uma avaliação negativa na estaria ocasionando o ato por esse sofrimento,
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como também pode ser a dor dos amigos e conhecimento socialmente difundido. Dessa
familiares, que sentem a perda. Percebe-se, nesse forma, tornou-se possível conhecer os
grupo, a presença forte da religiosidade, pensamentos, sentimentos e percepções dos
independentemente da crença, traduzida tanto nas participantes acerca dos fenômenos pesquisados.
autorrepresentações quanto nas expectativas As representações sociais da ideação suicida e
futuras, ambas representadas por meio de do suicídio consumado giraram em torno,
evocações positivas. principalmente, das razões ou motivos pelos quais
Por fim o último campo semântico, localizado levariam o indivíduo a apresentar esses
no fator 2 em itálico, refere-se às representações comportamentos, havendo significativas diferenças
sociais dos participantes com idades entre 14-15 entre os grupos que apresentaram ou não ideação
anos que apresentaram ideação suicida segundo a suicida. Estes demonstraram de certa forma sua
BSI. Para esse grupo de pertença, ela foi rejeição ao comportamento suicida mediante
objetivada através dos elementos “morte” e evocações de caráter negativo, enquanto aqueles
“tragédia”, enfatizando-se ainda os sentimentos de apresentaram uma descrição mais detalhada dos
“raiva” e “solidão” sentidos pelo ser que apresenta sentimentos vivenciados pelo suicida, indicando,
esses pensamentos. Também foi ressaltada a provavelmente, uma maior familiaridade com os
necessidade de “ajuda”, seja de um profissional, da temas pesquisados, já que são vividos e sentidos
família ou dos amigos. O ato suicida foi objetivado por eles.
pelo elemento representacional “cemitério”, Em relação à variável sexo, não houve
enfatizando-se, dessa forma, o local para onde vão diferenças significativas entre as representações
os indivíduos que o cometem. As sociais da ideação suicida e do suicídio
autorrepresentações desse grupo foram propriamente dito, mas no que tange às
objetivadas na solidão, uma vez que os autorrepresentações, algumas diferenças
participantes definiram-se como pessoas importantes foram observadas: os adolescentes do
“sozinhas”; enquanto para o estímulo indutor sexo masculino ancoraram em atributos externos
futuro as palavras “família” e “aquisição de bens” (atraentes e brincalhões), enquanto elas nos
foram as mais representativas. aspectos subjetivos de sua personalidade
Verificou-se uma quantidade maior de (carinhosas e sinceras). Diferenças também são
evocações para o estímulo indutor ideação suicida – percebidas entre os grupos com e sem ideação,
por parte desse grupo de pertença –, se sendo o primeiro constituído por evocações de
comparado aos demais, caracterizando-se, caráter negativo, diferentemente do segundo. No
provavelmente, por apresentar um maior consenso entanto, as expectativas futuras, de um modo
e uma maior facilidade em expor seus sentimentos geral, emergiram de forma positiva mesmo diante
e opiniões ante algo vivenciado. Os resultados do grupo que apresentou ideação suicida, não
assemelham-se aos encontrados por Araújo (2007), havendo diferenças representativas.
onde a ideação suicida foi representada como algo O alto índice de adolescentes que
consistentemente associado a fatores relacionados apresentaram a ideação suicida (22,2%) caracteriza
à solidão, tragédia, raiva e também a palavra ajuda um dado bastante preocupante, pois esse tipo de
como elemento representativo desse fenômeno. comportamento representa um fator de risco para
o suicídio consumado. Por ser um ato definitivo e
Considerações finais irreversível, a prevenção do suicídio faz-se por
meio da tentativa de diminuição dos fatores de
No desenvolvimento desta pesquisa, risco, tanto em nível individual quanto coletivo.
pretendeu-se verificar as representações sociais Sendo assim, enfatiza-se a relevância desta
acerca da ideação suicida elaboradas e pesquisa com o objetivo de detectar precocemente
compartilhadas por adolescentes inseridos no a ideação suicida para que possam ser traçadas
contexto do ensino médio, bem como investigar a estratégias de intervenção direcionadas a essa
presença desse fenômeno entre a população população. O significativo índice encontrado, na
estudada. Os dados obtidos possibilitaram a amostra pesquisada, demonstra a necessidade de
realização de uma análise científica do que se maior atenção a esses jovens estudantes, por meio
denomina senso comum, baseando-se no de serviços de apoio psicológico em sua formação
pressuposto de que o conhecimento do senso escolar.
comum propicia a compreensão do Por fim, acredita-se que esta pesquisa veio a
comportamento suicida a partir de um contribuir de forma parcimoniosa para a
compreensão das representações sociais da ideação Cunha, J. A. (2001). Manual da versão em português
suicida, tema este bastante carente de das Escalas de Beck. São Paulo: Casa do
investigações. É válido assinalar a necessidade de Psicólogo.
novas pesquisas, que possam complementar ou até Di Giacomo, J. P. (1981). Aspects
mesmo modificar as representações sociais aqui méthodologiques de l’analyse des
apreendidas. Reconhecendo as limitações représentations sociales. Cahiers de Psychologie
concernentes ao presente estudo, espera-se, Cognitive, 1, 397-422.
contudo, que o mesmo sirva para subsidiar Farr, R. M. (1994). Representações sociais: a teoria
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Sobre as autoras:
Luciene da Costa Araújo é discente do Curso de Psicologia da Universidade Federal da Paraíba – UFPB
e pesquisadora do Núcleo de Pesquisa Aspectos Psicossociais de Prevenção e Saúde Coletiva /Pós-
Graduação em Psicologia Social.
Kay Francis Leal Vieira é psicóloga Clínica-Hospitalar, mestre em Psicologia Social pela Universidade
Federal da Paraíba e pesquisadora do Núcleo de Pesquisa Aspectos Psicossociais de Prevenção e Saúde
Coletiva/Pós-Graduação em Psicologia Social.