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14/01/2018 Carta a Engels

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Carta a Engels
(em Manchester)

Karl Marx

22 de Junho de 1867

Primeira Edição: Gestamtausgabe. Escrita em francês em finais de Novembro de 1877.


Fonte: http://www.marxists.org/archive/marx/works/1867/letters/67_06_22.htm
Tradução: Cássius M. T. M. B. de Brito.
HTML: Fernando A. S. Araújo.
Direitos de Reprodução: licenciado sob uma Licença Creative Commons.

Londres, 22 de Junho de 1867.

Caro Fred,

tenho aqui um conjunto de mais 4 folhas [do primeiro volume de O Capital] anexados para
você, que me chegaram ontem. Os colegas deixaram um número de erros de impressão que eu
corrigi de forma perfeitamente legível. Um erro que nós corrigimos em nós mesmos foi ‘Childrens’
Employment Commission’, Childrens’. Como Children é um substantivo plural, a marca genitiva
é ´[Apóstrofo]. Eu vi isso imediatamente quando dei, por mim mesmo, outra olhada nos Livros
Azuis (Blue Books)(1).

King escreveu pra dizer que os Fenians(2) ainda não estão fora. Eles estão adiando isso tanto
quanto for possível e tão próximo quanto possível do fechamento da sessão.

Eu espero que você esteja satisfeito com estas 4 folhas. Que você esteja satisfeito com isso até
agora é mais importante pra mim do que qualquer coisa que o resto do mundo possa dizer. Em
todo caso, eu espero que a burguesia se lembre dos meus furúnculos até o dia da sua morte. Aqui
está uma amostra fresca de quão suínos eles são! Você sabe que a Children´s Employment
Commission [Comissão de Emprego Infantil] está trabalhando há 5 anos. Quando seu primeiro
relatório veio a público em 1863, as indústrias que ela expôs foram imediatamente “chamadas à
ordem”. Ao começo desta sessão, o ministro tory apresentou um projeto de lei per Walpole – o
salgueiro chorão –, aceitando todas as propostas da Comissão, embora em uma escala muito
reduzida. Aqueles que foram chamados à ordem, dentre eles os grandes manufatureiros da
metalurgia, e especialmente os vampiros da “indústria doméstica”, mantiveram um covarde
silêncio. Agora, eles estão apresentando uma petição ao Parlamento e demandando – um Novo
Inquérito. O antigo, dizem, foi tendencioso! Eles estão contando com que a Lei de Reforma ocupe
toda a atenção pública, de modo que a coisa seja confortável e privadamente contrabandeada,
no exato momento em que as trade unions estão tendo uma difícil abertura. As piores coisas
sobre os relatórios são as declarações dos próprios colegas. Eles estão bem cientes de que um
novo inquérito significa apenas uma coisa e que é precisamente “o que nós, burguesia, queremos”
– uma nova concessão de 5 anos para a exploração. Felizmente, minha posição na
“Internacional” me permite frustrar aqueles joguinhos de vira-latas. É uma questão de extrema
importância. O que está em jogo é a abolição da tortura de 1,5 milhões de pessoas, excluindo os
homens trabalhadores adultos.

No que diz respeito ao desenvolvimento da forma valor, eu simultaneamente segui e não segui
o seu conselho, atingindo, portanto, uma atitude dialética nestas questões, também. Isso pra
dizer: 1) eu tenho escrito um appendix [apêndice] no qual eu demonstro, de novo, o mesmo
assunto tão simplesmente e tão ao modo de um livro escolar quanto possível; e 2) eu dividi cada
nova proposição em parágrafos etc., cada um com seu próprio cabeçalho, como você aconselhou.
No Prefácio, eu digo ao leitor “não-dialético” para pular as páginas x-y e, então, ler o apêndice.
Não são apenas os filisteus que eu tenho em mente aqui, mas os jovens, etc., que estão sedentos

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por conhecimento. De qualquer modo, a questão é crucial para o livro como um todo. Os
economistas têm, até agora, negligenciado o fato muito simples de que a equação 20 braças de
linho = 1 casaco não é senão a forma primitiva de 20 braças de linho = £ 2 e que, portanto, a
forma mais simples de uma mercadoria, na qual seu valor não é ainda expresso em sua relação
com todas as outras mercadorias, mas apenas como algo diferenciado de sua própria forma
natural, encarna todo o segredo da forma dinheiro e, desse modo, in nuce [embrionariamente], de
todas as formas burguesas dos produtos do trabalho. Em minha primeira apresentação
[Contribuição à Crítica da Economia Política] (Duncker), eu evitei a dificuldade do desenvolvimento
ao não analisar a maneira como o valor é expresso até que ele apareça em sua forma
desenvolvida, tal como expressa no dinheiro.

Você tem toda razão a respeito de Hofmann(3). A propósito, você verá na conclusão do meu
capítulo III(4), onde eu esboço a transformação do mestre-artesão em capitalista – como resultado
de mudanças puramente quantitativas – que, no texto, eu cito a descoberta de Hegel sobre a lei de
transformação de uma mudança meramente quantitativa em uma mudança qualitativa como sendo
atestada pela história e, de forma semelhante, pelas ciências naturais [ver O Capital, cap. IX]. Na
nota ao texto, (eu estava, na época, assistindo às palestras de Honfmann), eu menciono a teoria
molecular, mas não Honfmann, que não descobriu nada sobre a questão, embora tenha contribuído
em uma direção geral; em vez disso, eu realmente cito Laurent, Gerhardt e Wurtz(5), sendo este
último o homem real. Sua carta fez tocar um leve acorde em minha memória e, então, eu dei uma
olhada em meu manuscrito.

A impressão tem avançado lentamente nas duas últimas semanas (só 4 folhas), provavelmente
por conta de Pentecostes. Mas o sr. O. Wigand terá que compensar esse tempo perdido. A
propósito. Seu livro [A Situação da Classe Trabalhadora na Inglaterra] ainda está disponível. A
Associação de Trabalhadores fez o pedido e o sr. O. Wigand está enviando 2 novas cópias (2ª
impressão, 1848).

Agora, assuntos privados.

Minhas crianças estão obrigadas a convidar outras meninas para dançar no dia 2 de Julho, para
responder os convites, uma vez que elas não puderam convidar ninguém durante todo este ano e
estão, portanto, prestes a perder a classe. Então, mesmo tão pressionado como estou neste
momento, eu tive que concordar e conto com você para o vinho (“Clairet” e “do Reno”), isto é, em
me suprir com isso no curso da próxima semana.

Em segundo lugar, como “desgraça” nunca vem sozinha, Lina anunciou sua chegada para a
próxima semana. Minha esposa terá, então, que devolver a ela as £ 5 que lhe deve, e você
entende que, depois de prevenir a primeira onda de credores, eu não posso bancar isso.

Eu estou, de fato, extremamente irritado com as pessoas que me prometeram dinheiro, mas
não enviaram nada (pelo menos até agora). Eles têm interesse pessoal em mim. Eu bem sei. Eles
também sabem que eu não posso continuar meu trabalho a não ser que eu tenha um pouco de paz
e tranquilidade. E até agora eles não me enviaram nenhuma palavra!

Nosso “nobre” poeta Freiligrath(6) realmente está prestes a ganhar uma soma limpa. Pelo que
dizem, que pedir aos alemães ricos na América do Sul e – China! e as Índias Ocidentais! é mais
lucrativo, uma vez que esses colegas consideram isso um dever nacional! Entretanto, os
Freiligraths continuam a viver relativamente em grande estilo, constantemente divertindo-se e
constantemente visitando. Esta é uma das razões pelas quais os comerciantes alemães em Londres
são tão inacessíveis. Gordo como está, tem-se dito que ele (foi o que disse minha esposa, que
apelou a eles) aparenta estar com os “nervos arruinados”, adoentado e depressivo. Mas Ida está
positivamente resplandecente e nunca esteve em melhor espírito em toda sua vida.

Minhas amáveis lembranças à sra. Lizzy.

Seu,
K. M.

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Honoris causa: você precisa conseguir o fotograma da Madame Gumpert para mim.

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Notas de rodapé:

(1) Nome genérico das publicações dos textos do Parlamento inglês e dos documentos diplomáticos do Ministério dos
Negócios Estrangeiros. (retornar ao texto)

(2) Os Fenians eram revolucionários irlandeses que se chamavam assim em homenagem aos “Féne” – nome de um
antigo povo irlandês. As suas primeiras organizações apareceram nos EUA (nos anos 1850) e só posteriormente na
própria Irlanda. O objetivo deles era a instauração da República Irlandesa e utilizavam táticas políticas de tipo
conspirativo, incluindo o levante armado. (retornar ao texto)

(3) August Wilhelm von Hofmann (1818-1892) – químico alemão. Promoveu palestras públicas em que apresentava
modelos moleculares. (retornar ao texto)

(4) Nas edições atuais de O Capital, esta passagem aludida por Marx está no capítulo “Taxa e Massa de Mais Valia” e
diz o seguinte: “as corporações de ofício da Idade Média procuraram impedir pela força a transformação do mestre-
artesão em capitalista, limitando a um máximo muito exíguo o número de trabalhadores que um mestre individual
pode empregar. O possuidor do dinheiro ou de mercadorias só se transforma realmente num capitalista quando a
quantidade desembolsada para a produção ultrapassa em muito o máximo medieval. Aqui, como na ciência da
natureza, mostra-se a exatidão da lei, descoberta por Hegel em sua Lógica, de que alterações meramente
quantitativas, tendo atingido um determinado ponto, convertem-se em diferenças qualitativas” (São Paulo, 2013), p.
380-381. (retornar ao texto)

(5) A nota a que Marx se refere vem logo após a citação acima e diz o seguinte: “a teoria molecular, aplicada na
química moderna e desenvolvida cientificamente pela primeira vez por Laurent e Gerhardt, não se baseia senão nessa
lei. {Adendo à terceira edição: a título de esclarecimento desta nota, bastante obscura para quem não é químico,
observamos que o autor se refere, aqui, às ´séries homólogas´ dos compostos de hidrocarbonetos, assim
denominados pela primeira vez por C. Gerhardt, em 1843, e possuindo, cada uma delas, uma fórmula algébrica de
composição. Assim, a série das parafinas: CnH2n+2; a dos álcoois normais: CnH2n+2O; a dos ácidos graxos normais:
CnH2nO2 e muitas outras. Nos exemplos anteriores, a simples adição quantitativa de CH2 à fórmula molecular forma a
cada vez um corpo qualitativamente diferente. Sobre o papel – superestimado por Marx – de Laurent e Gerhardt na
determinação desse fato importante, cf. Kopp, Entwicklung der Chemie (Munique, 1873), p. 709-16, e Schorlemmer,
Rise and Progress of Organic Chemistry (Londres, 1879) p. 54. (F. E.)}. (retornar ao texto)

(6) Ferdinand Freiligrath (1810-1876), poeta que chegou a trabalhar com Marx na Nova Gazeta Renana. (retornar ao
texto)
Inclusão 01/08/2013

https://www.marxists.org/portugues/marx/1867/06/22.htm 3/3

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