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Resumo
Para compreender o novo espaço público que é o ciberespaço, é necessário compreender o que é
uma comunidade virtual. Os agrupamentos humanos na rede implicam novos códigos, novas
relações sociais e novas formas de identidade. Os novos actores sociais nascem das dinâmicas
da rede, às escalas global e local. À medida que os conceitos de identidade e cultura se adaptam
às novas condições criadas pelo ciberespaço, importa analisar os conceitos de comunidade
virtual e de virtualização do espaço público. O presente artigo propõe analisar a transformação
da noção de comunidade, a sua desterritorialização, a necessidade de construção partilhada que
a ausência de espaço físico e delimitado impõe, a utilização da rede como meio de comunicação
e acção, a relação entre a globalização e a emergência dos self media. Como estudo de caso, é
apresentado o universo da blogosfera, em particular a portuguesa. Importa então aqui perceber
como é que a Internet e o processo de globalização potenciam o fenómeno dos weblogs
enquanto novos actores sociais, pertencentes a redes sociais, nas escalas global e local.
Ainda que virtual, o ciberespaço existe e produz efeitos. Pode ser definido como o
espaço potenciado pelas comunicações mediadas por computador (email, fóruns, chat,
weblogs, newsgroups…) e assume-se como um modelo de comunicação individual,
permitindo ao receptor ser simultaneamente emissor. Espaço de fluxos, assume-se
como a dimensão social da rede permitindo a difusão de comunicação/informação à
1
Termo introduzido por William Gibson no livro de ficção científica “Neuromancer”, em 1984, para
designar o «espaço criado pela ligação de todas as bases de dados ligadas, das telecomunicações e das
redes de computadores» (Cascais, 2001: 47)
1
escala global. O que provoca um intenso processo de inclusão e exclusão de pessoas na
rede.
Os novos espaços sociais que advêm do ciberespaço geram novas solidariedades, novos
excluídos, novos mecanismos de participação, novas formas de democracia, de
negociação, de decisão, de cooperação, de afectividade, de intimidade, de sociabilidade.
O ciberespaço, enquanto plataforma social da economia digital, assume-se como a
materialização da globalização.
2
espacio-temporal traduz-se na globalização (Robertson, 19922). Logo, a Internet é um
instrumento de potenciação deste fenómeno. Num primeiro plano, a actual
transformação deriva da separação entre tempo e espaço. Efectivamente, pela primeira
vez é possível a troca de informação de forma instantânea e planetária.
2
citado em OLIVEIRA, J.M.Paquete, LEITÃO, Gustavo, CARDOSO, J.J.Barreiros (org) (2004),
Comunicação, cultura e tecnologias de informação, Lisboa, Quimera
3
“cultura de aceleração” e das redes. A cultura da velocidade obrigou-nos a estar em
forma, emagrecendo as empresas e adquirindo um estilo de vida ligado à alta
tecnologia. Os hippies foram substituídos pelos yuppies. O homem da velocidade
chegou com as novas tecnologias da comunicação e está em todo o lado, no centro das
coisas. A sua velocidade é o acesso instantâneo ao mundo (Kerckhove, 1997).
Pierre Lévy defende que com a virtualização não se dá uma “desrealização geral” mas
uma “procura da hominização” (Lévy: 2001, 11). A hipótese que Lévy equaciona, a
propósito do processo de virtualização, opõe-se à ideia de “desaparecimento universal”
4
(Idem, ibidem) vaticinada por Jean Baudrillard ou à “ameaça de um apocalipse cultural”
(Idem, ibidem) anunciada por Paul Virilio. A proposta de Lévy centra-se na
comunicação virtual enquanto elemento de um processo que abrange toda a vida social,
sublinhando aspectos como a diferenciação entre o virtual e o real, a dimensão
económica da comunicação, a desterritorialização e a problemática da temporalidade
associada ao movimento de virtualização.
Pierre Lévy considera que o virtual não se opõe ao real. O autor postula uma
desmistificação dos opostos, enunciando duas dialécticas: possível/real e virtual/actual.
Estes quatro conceitos existem nos domínios do latente e do manifesto, o que remete
para as noções de subjectividade e de objectividade – o latente anuncia o devir, o
manifesto situa-se na esfera da objectivação, da concretização. No âmbito das
dialécticas possível/real e virtual/actual, Lévy invoca estas quatro formas de existir para
definir duas ordens: a da selecção e a da criação – que correspondem aos pares
possível/real e virtual/actual, respectivamente. Segundo o autor, o virtual é mediado ou
potenciado pelas tecnologias, sendo produto de exteriorização de construções mentais
em espaços de interacção cibernéticos. Neste sentido, o virtual não remete para
operações puramente lógicas. É interpretado por Lévy como uma maneira de ser
diferente do possível e do real, «é o que existe em potência e não em acto» (Idem: 15).
A ideia de virtual enquanto potência pode remeter para a noção de ilusão, mas o autor
sublinha que este elemento não se situa no domínio do onírico: «a virtualização é um
dos principais vectores de criação da realidade» (Idem: 18). Neste sentido, o virtual
existe e produz efeitos. O movimento de virtualização implica irreversibilidade nos
seus efeitos, indeterminação no seu processo e invenção/criação do seu espaço. Será,
então, a virtualização um fenómeno da contemporaneidade? Lévy considera que, pelo
contrário, antes das tecnologias electrónicas (dos dispositivos tecnológicos), já existiam
vectores de virtualização, como a imaginação, a memória, o conhecimento e a religião.
5
remete para a inexistência ou relatividade do lugar. Neste sentido, a virtualização é uma
espécie de “êxodo”.
6
A virtualização do espaço público remete para o conceito de auto-edição. O acesso à
difusão de comunicação está agora aberto, sem as restrições impostas pelos media
tradicionais. Ferramentas de edição de simples utilização permitem que qualquer
utilizador, com noções de informática básicas, possa publicar na rede qualquer tipo de
informação, sem qualquer tipo de controlo. A auto-edição, ou informação não
profissionalizada, tem variadíssimas vertentes e até suportes. Dos simples diários aos
blogs de intervenção política, do jornalismo participativo (construído por não
profissionais) aos webzines de carácter jornalístico e não profissionalizadas. Dos
weblogs aos fanzines, passando pelas próprias páginas pessoais, a web tornou-se o
espaço ideal para a difusão de mensagens. A rede é a nova esfera pública. «A troca livre
de ideias possibilitada a todos, para além de remeter para a esfera pública, lembra
ainda o conceito de democracia. Estes aliás parecem ter nascido em conjunto»
(Rodrigues, s/d).
Os self media permitem uma nova forma de sociabilização, «algo que vem para renovar
a democracia cuja principal característica é precisamente a liberdade de expressão»
(Rodrigues, s/d). Os espaços alternativos de comunicação na rede criaram novos actores
sociais, nas escalas global e local. «Essa multiplicidade de canais permite uma nova
forma de colectividade, um novo tecido tecnosocial, uma rede de indivíduos em
contínua comunicação» (Pereira da Silva, 2004). Nesta nova esfera, as audiências não
têm fronteiras e a interacção permite a “glocalização”. Permite globalizar o local.
Porque a informação colocada na rede, devido às novas metáforas espacio-temporais,
existe num espaço global. Significa isto que, aliado ao imediatismo (e até ao
mediatismo), a característica óbvia da publicação na Internet é a globalização da
mensagem.
7
implica uma área geográfica, pelo que consideramos que pode ser entendida como um
espaço comum.
Em Piaget, o ponto de partida para a noção de sociedade não reside no individual. Para
o autor, «o tecido fundamental e elementar da sociedade é composto pela
multiplicidade que lhe confere simultaneamente existência e vida» (cit. in Rocher,
1971:39).
Palácios (1998 cit. in Recuero, 2004) enumerou os elementos que caracterizam a noção
de comunidade: sentimento de pertença; territorialidade; permanência; a ligação entre o
sentimento de comunidade; carácter corporativo; emergência de um projecto comum; e
a existência de formas próprias de comunicação.
Beamish (1995 cit. in Recuero, 2004) considera que o significado de comunidade pode
depender de dois factores. O primeiro refere-se ao lugar físico e geográfico; o segundo
8
diz respeito ao grupo social, que divide interesses comuns. A autora distingue então dois
factores que podem fundamentar uma comunidade, deixando o território de ser condição
sine quo non para uma definição deste conceito.
9
interacção é mediada com o computador. Os lugares são definidos num sentido
antropológico e, assim, existe espaço para as relações interpessoais e a organização
social. São estes espaços que estão na origem das comunidades virtuais.
As comunidades virtuais têm existência com base nas Comunicações Mediadas por
Computador (CMC). Estas ferramentas dão existência à visão de McLuhan de “aldeia
global” – as limitações de tempo e de espaço são transcendidas. Nas comunidades
virtuais verifica-se uma proximidade intelectual e emocional versus território físico e
geográfico, que aproxima muitas vezes as comunidades tradicionais. Há sempre um
interesse comum, mesmo na comunidade mais heterogénea.
Jones (1997 cit. in Recuero, 2004) distingue comunidade do lugar que ela ocupa no
ciberespaço. Comunidade virtual diz respeito a novas formas de comunidade, criadas
através do suporte das CMC’s. Virtual Settlement refere-se ao lugar que as comunidades
ocupam no ciberespaço, ou seja, é o suporte da comunidade. O conceito de Virtual
Settlement assume-se então como uma condição determinante para a existência das
comunidades virtuais. «A comunidade precisa, portanto, de uma base no ciberespaço:
um lugar público onde a maior parte da interacção se desenrole. A comunidade virtual
possui, deste modo, uma base no ciberespaço, um senso de lugar, um locus virtual. Este
espaço pode ser abstracto, mas é “limitado”, seja ele um canal de IRC, um tópico de
10
interesse, uma determinada lista de discussão ou mesmo um determinado MUD. São
fronteiras simbólicas, não concretas» (Recuero, 2004).
Wellman (cit. in Hamman, 1999) considera que a comunidade virtual não é uma nova
forma de sociabilizar, mas antes a comunidade tradicional transposta para um novo
suporte. Esta afirmação pode ser justificada com o facto da sociabilização no
ciberespaço apresentar marcas de exterioridade do mundo offline. Mas também com o
inverso. Segundo Recuero (2004), «grande parte das comunidades virtuais que
sobrevivem no tempo trazem os laços do plano do ciberespaço para o plano concreto,
promovendo encontros entre os seus membros».
As comunidades virtuais são redes sociais na medida em que interligam pessoas. «Uma
rede social é constituída de nós (indivíduos) conectados por laços sociais» (Watts,
2003: 75 cit. in Recuero, 2004). No ciberespaço encontra-se o primado da interacção
social. E, neste contexto, surge o conceito de software social online – «sistemas que
visam proporcionar conexões entre as pessoas, gerando novos grupos e comunidades,
simulando uma organização social» (Recuero, 2004).
Mackninnon (1995 cit. in Pereira da Silva, 2004) aplica o conceito de persona para
designar as identidades que são construídas no ciberespaço. Neste sentido, as personas
constituem localidades e territorialidades nos ambientes de sociabilidade virtual
potenciado pelas CMC’s. Neste sentido, e recuperando o pensamento de Pierre Lévy
(2001), é possível afirmar que o espaço da rede suporta uma realidade social. Este
espaço de espaços, o ciberespaço, caracteriza-se «pela multiplicidade dos sujeitos
11
envolvidos, pela coordenação que existe entre eles e, sobretudo, pela convergências de
actividades no sentido de alcançar um sentido comum» (Pereira da Silva, 2004).
A ideia de democracia plena no ciberespaço não tem uma exequibilidade tão simples
como, à primeira vista, pode parecer. Na verdade, os códigos não são inteiramente
novos, mas é necessário compreender que este novo contexto comunicacional implica
novos espaços antropológicos e novos espaços representacionais. Logo, (re)criam-se
novas identidades e práticas culturais. E, para se materializarem relações sociais e
valores num espaço de partilha que implica um forte sentimento de pertença
(indispensável para a construção de um lugar antropológico no espaço virtual) é
necessário criar regras. Ora, sendo a Internet um espaço de fronteiras diluídas e sem
condutas vinculativas, cada comunidade virtual implica regras de conduta para o
funcionamento da rede social. A estas regras, que os netcitizens de cada comunidade
estão sujeitos, convencionou-se chamar netiqueta. Não se tratam de regras rígidas e
vinculativas, mas uma forma de tentar regular as comunidades. São definidas pelos
próprios membros das comunidades e permitem a efectivação do sentimento de
pertença.
3
in Dicionário Priberam – http://www.priberam.pt/dlpo/ [em linha] (consultado em Janeiro 2005)
12
Sociologicamente, a interacção ocorre quando uma acção entre duas ou mais pessoas for
mútua. A interacção humano-computador pode ser vista como um processo de
comunicação entre dois sistemas cognitivos, que fazem tratamento de informação
simbólica. De um lado está o ser humano, cujas estruturas cognitivas elaboram
representações simbólicas da realidade. O outro sistema, o computador, é uma máquina
que transforma sinais produzidos pelos programadores para produzir os sinais que os
utilizadores interpretam e manipulam nos seus interfaces.
13
das comunidades e da interacção social. O termo software social propagou-se pela rede
num alargado conjunto de ferramentas que intensificam o significado de “social”. O
objectivo é criar ambientes e experiências sociais online, de forma colectiva.
4
disponível em http://www.orkut.com
5
in Wikipedia - http://pt.wikipedia.org/wiki/Orkut [em linha] (consultado em Janeiro de 2006)
6
disponível em http://www.43things.com
7
categorização com base em palavras-chave, ou seja, tags são descrições que os utilizadores atribuem aos
objecos. O fenómeno do tagging remete para a prática de categorização colaborativa, definida como
folksonomy.
8
disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Wiki [em linha] (consultado em Janeiro de 2006)
9
disponível em http://www.wikipedia.org [em linha]
10
in Wikipedia - http://pt.wikipedia.org/wiki/Weblog [em linha] (consultado em Janeiro de 2006)
14
sumários das notícias geralmente são enviados pelos próprios leitores do sítio,
podendo os editores aceitar ou não a contribuição» (in Wikipedia11);
o IRC – Internet Relay Chat «é um protocolo de comunicação bastante utilizado
na Internet. É utilizado basicamente como chat e troca de arquivos, permitindo
a conversa em grupo ou privada, sendo o predecessor dos mensageiros
instantâneos actuais» (definição da Wikipedia12);
o Messenger – programa de mensagens instantâneas criado pela Microsoft.
Permite a conversação entre utilizadores em tempo real (um-um ou todos-todos).
As novas redes sociais na rede, derivados das potencialidades das CMC’s e dos
chamados softwares sociais, remetem para activismo e militância. Tradicionalmente
associados à área sócio-política, estes conceitos ganham no ciberespaço uma amplitude
maior. As ferramentas da web permitem aos utilizadores transpor estas noções para a
escala global, potenciando as relações interpessoais e a interacção social em torno de
interesses e causas comuns. E todos os interesses e causas têm lugar na rede.
Note-se que redes sociais não são sinónimo de movimentos sociais. Ainda assim, e em
muitos casos, derivam directamente para a esfera dos movimentos sociais. Refira-se
ainda que o fortalecimento dos movimentos sociais a partir do acesso à Internet está
directamente relacionado com a globalização da mensagem, assim como os baixos
custos que a difusão desta acarreta e a sua instantaneidade. O site dos Repórteres Sem
Fronteiras14 pode ser referido como um bom exemplo da utilização da rede para a
difusão de um movimento social já existente anteriormente. Esta associação de origem
11
in Wikipedia - http://pt.wikipedia.org/wiki/Slashdot [em linha] (consultado em Janeiro de 2006)
12
in Wikipedia - http://pt.wikipedia.org/wiki/IRC [em linha] (consultado em Janeiro de 2006)
13
disponível em http://www.yahoo.com
14
disponível em http://www.rsf.org
15
francesa está a utilizar o alcance global da Internet para alargar o âmbito da divulgação
da sua missão. «Movimentos sociais, ativistas, movimentos políticos, todos os
segmentos da sociedade que buscam uma voz em meio a essa própria sociedade,
encontraram na Internet essa democracia tecno-comunicacional. O Movimento dos
Trabalhadores Sem Terra, o Exército Zapatista de Libertação Nacional, o Greenpeace,
o Movimento Anarco Punk de São Paulo, todos estes e mais milhões de vozes
encontraram, na web, um espaço de comutação, exposição e criticas de ideias» (Cruz,
s/d).
16
como colunistas nos jornais de referência portugueses ou a utilização dos textos
publicados em weblogs como fonte de informação.
Os weblogs assumem-se como uma revolução no acesso à difusão na Internet por parte
do cidadão comum. A escrita, individual ou colectiva, sob a forma de texto em páginas
próprias tornou-se uma prática recorrente na rede desde que surgiram os weblogs. A
facilidade de utilização da ferramenta e a rápida expansão dos sistemas de publicação e
alojamentos gratuitos permitiram o crescimento deste fenómeno. «Num curto espaço de
tempo, os weblogs (ou blogues) passaram de uma simples aplicação informática, a um
importante dispositivo de comunicação» (Canavilhas, 2004).
A rede está inundada de weblogs. E todos os temas têm o seu lugar. Existem blogs sob a
forma de diário privado, com textos literários, de intervenção cívica, sobre a
actualidade, que analisam os media, de discussão política, relacionados com cultura,
como suporte de arquivo de artigos publicados em jornais, para registar instantes
fotográficos…
17
confundindo as tradicionais definições de esfera pública. Tecnicamente, são um espaço
com textos (essencialmente, mas também outros conteúdos estáticos e mesmo
dinâmicos) de um autor (ou vários) agregados em várias páginas, organizadas por
ordem cronológica (o que permite criar arquivos). Podem permitir comentários, incluir
hiperligações externas (e internas) e inúmeras potencialidades técnicas, consoante a
tecnologia que utilizarem. Distinguem-se das páginas web, dos webzines e dos mais
diversos suportes de publicação pela estrutura, que se assemelha a de um diário (com as
entradas cronológicas) e pela lógica dos posts – entradas, registos de navegação. «De
um ponto de vista social, parece a ocupação humana de um espaço virtual e intelectual.
Tal como no faroeste ou no espaço, uma tentativa de ir mais longe colectivamente
através de iniciativas individuais» (Pedro F. cit. in Granado, 2003).
Raquel Recuero (2003) propõe cinco categorias, abertas e heterogéneas, para classificar
estes dispositivos: diários (remetem para a vida pessoal ou opiniões gerais do autor),
publicações (informação apresentada de modo opinativo), literários (contam histórias
ficcionadas ou compilam crónicas), clippings (recortes de outras publicações –
profissionais ou não) e publicações mistas (misturam posts – entradas – pessoais com
uma vertente mais informativa). A classificação dos weblogs pode ser também feita a
partir do formato do seu conteúdo: os fotoblogs (cujos posts são alimentados de
fotografias), os moblogs (versão de fotoblogs via câmera fotográfica incorporada no
telemóvel), os smsblogs (alimentados por envio de sms) e os vblogs (extensão dos
fotoblogs ao vídeo) (Barbosa e Granado, 2004). É possível ainda dividir os weblogs em
espaços individuais ou colectivos. O espaço que agrega os weblogs, independentemente
do formato ou conteúdo, é a blogosfera.
18
Em 1998, existiam apenas alguns weblogs. No início de 1999, Jesse James Garret 15
registava no seu diário 23 novos blogs. Em Julho de 1999 deu-se o grande
desenvolvimento nas publicações deste formato, com o lançamento do Pitas – uma
ferramenta autónoma e instantânea para a criação de weblogs. No mês seguinte, a
empresa Pyra lança o Blogger (entretanto comprado pelo Google, em Fevereiro de
2003) – a mais conhecida e utilizada tecnologia autónoma para a edição de blogs. Em
Setembro do mesmo ano, a Pyra criou o Blogspot.com, sistema de alojamento gratuito
em troca de anúncios colocados no topo da página. Em Março de 2002, o Blogger
registava 375 mil utilizadores. Em Agosto, nasce o Blogger Brasil, uma parceria entre a
Pyra Labs e a Globo (Barbosa e Granado, 2004).
15
weblog Infosit, actualmente disponível em http://www.jjg.net
16
weblog ainda activo em http://scripting.com
19
media tradicionais, por definição “filtrado” – quando não dirigido – pelas vicissitudes
da própria guerra» (Querido e Ene, 2003: 20).
«Em Portugal, 2003 terá também sido o ano da grande (a uma outra escala) afirmação
dos weblogs. A primeira tentativa consistente de elaborar uma listagem, iniciada em
17
disponível em http://dear_raed.blogspot.com
18
disponível em http://news.bbc.co.uk/2/hi/in_depth/world/2003/reporters_log/default.stm
19
disponível em http://www.back-to-iraq.com/
20
disponível em http://ciberia.aeiou.pt/?st=4041 (consultado em Janeiro de 2006)
20
Janeiro, referenciava 174 entradas. Em Maio os weblogs portugueses eram já 400, em
Junho mais de 600 e, no princípio de Julho, 905» (Santos e Zamith, 2004). A blogosfera
portuguesa começou mais tarde do que a norte-americana. Considerando que os sites de
jornalismo colaborativo não são weblogs, o primeiro diário português foi o “Dee’s
Life”, criado em Outubro de 199921. Ainda durante o século XX surgem alguns blogs. O
Ponto Media22, diário de referência na área do jornalismo, nasce em 2001. No ano
seguinte, referências como os blogs “Jornalismo e Comunicação” 23 e “Jornalismo
Digital”24. É no final de 2002 e início de 2003 que emerge a blogosfera política: “A
Coluna Infame”25, o “Blog de Esquerda”26 e o “País Relativo”27
A natural evolução continua no início de 2003, mas é com o “episódio Pacheco Pereira”
que a blogosfera portuguesa multiplica o número de leitores e triplica o número de
editores (Querido e Ene, 2003). A 6 de Maio de 2003, surge um weblog intitulado
“Abrupto”28 com a assinatura JPP. Durante alguns dias, debatia-se na blogosfera a
possibilidade de se tratar de José Pacheco Pereira, na altura eurodeputado do PSD. A
confirmação chegou por uma notícia do Diário de Notícias, que declarava Pacheco
Pereira como «a mais recente estrela do universo dos bloggers portugueses» (in
Querido e Ene, 2003). Os media tradicionais portugueses tinham descoberto a
blogosfera. O blog de Pacheco Pereira deu a visibilidade mediática que faltava aos
weblogs. Um blog de registo de outros sites mantido pelo jornalista Pedro Fonseca 29,
que em Janeiro de 2003 registava apenas 174 weblogs, em Julho contabilizava 925
diários (Canavilhas, 2004). A guerra do Iraque e o processo Casa Pia incendiaram a
blogosfera e os seus leitores durante a Primavera e Verão de 2003.
Até ao final de 2003, passando pelo Verão em que os blogs foram uma verdadeira moda,
a blogosfera foi muitas vezes notícia. E começou a dar-se o movimento de trocas: dos
media tradicionais para a blogosfera (foram muitos os casos de programas de televisão e
de rádio, de jornais e de jornalistas, que aderiram à nova esfera pública) e do universo
21
disponível em http://www.dee-dee.net/diario
22
disponível em http://ciberjornalismo.com/pontomedia
23
disponível em http://webjornal.blogspot.com
24
disponível em http://webjornalismo.blogspot.com
25
weblog já extinto, com arquivos disponíveis em http://colunainfame.blogspot.com
26
primeira versão em http://blog-de-esquerda.blogspot.com , actualmente em http://bde.weblog.com.pt
27
weblog já extinto, com arquivos disponíveis em http://paisrelativo.blogspot.com
28
disponível em http://abrupto.blogspot.com
29
weblog já extinto, com arquivos disponíveis em http://blogsempt.blogspot.com
21
dos weblogs para os media tradicionais (blogs que se tornaram programas de televisão,
bloggers que são hoje comentadores políticos ou cronistas de jornais).
Os anos de 2004 e 2005 mostraram que o universo da blogosfera está de “pedra e cal”
na web. Tendo a guerra do Iraque como grande impulsionador do movimento da
blogosfera, tanto à escala global como nacional, o mediatismo da mensagem e a Internet
como meio de comunicação (e consequentemente de acção) permitiram criar novos
actores sociais. Daí se conclui o activismo e militância das novas redes sociais criadas
na web. No entanto, refira-se que a esfera de visibilidade pública é significativamente
mais reduzida do que o universo da blogosfera. No ciberespaço, as comunidades criadas
em torno do dispositivo “weblog” são evidentes. Os weblogs, com a sua complexa
relação com o jornalismo e a política, são novos dispositivos de comunicação que
criaram novos actores sociais. Mas, a sua legitimação na esfera pública do mundo real
só acontece por via da representação que os media fazem deles. Até que ponto
conseguem os bloggers influenciar a opinião pública?
Em género de conclusão
A introdução das novas tecnologias nas esferas pública e privada da sociedade, mais do
que uma reformulação, originou um novo campo sócio-cultural e, consequentemente,
comunicacional. É a era da Cibercultura e do paradigma da individualização da
comunicação. Não pela oposição à comunicação de massas, mas pela aceleração da
experiência através da electrónica num novo universo de sociabilização: o ciberespaço.
«A Internet é hoje o tecido das nossas vidas. Não é o futuro. É o presente. A Internet é
um meio totalmente abrangente, que interage com o conjunto da sociedade» (Castells,
2000: 22130).
30
Castells, Manuel (2000), A Internet e a sociedade em rede, in OLIVEIRA, J.M.Paquete, LEITÃO,
Gustavo, CARDOSO, J.J.Barreiros (org) (2004), Comunicação, cultura e tecnologias de informação,
Lisboa, Quimera.
22
A globalização, que se materializa na técnica, traduz-se na transformação das relações
sociais. A introdução de dispositivos tecnológicos induz alterações ideológicas. Os self
media são o expoente do processo de globalização, na medida em que permitem a
intensificação das relações sociais globais e a “glocalização” das comunidades locais.
As ferramentas de CMC’s e os softwares sociais permitem a (re)configuração de novas
práticas e relações sociais, que remetem para códigos do mundo offline e para o
conceito de comunidade desterritorializada.
23
global, sem edições prévias ou limites de qualquer tipo. Note-se que a auto-edição é um
exemplo daquilo a que se pode chamar o activismo e a militância dos utilizadores da
web. Os softwares sociais são também um bom exemplo da utilização de meios de
comunicação enquanto meios de acção. Estas redes sociais – sejam utilizadas de forma
colectiva ou individual remetendo para um grupo – são criadas em torno de interesses
comuns e, com as potencialidades técnicas da rede, permitem tomar acções numa nova
esfera pública, com uma audiência à escala global. E, claro, permanentemente
observada e noticiada (ainda que de forma selectiva, como seja a mediatização dos
protagonistas da notícia) pelos media tradicionais.
O reconhecimento das comunidades virtuais como novos actores sociais, com relações,
práticas e códigos distintos dos grupos tradicionais é a principal conclusão deste
trabalho. Em última análise, consideramos válida a hipótese de trabalho adoptada neste
projecto: as comunidades virtuais implicam novas relações e práticas sociais. Neste
sentido, é permitido afirmar que as comunidades virtuais, em substância, são
efectivamente diferentes das tradicionais.
Bibliografia
Livros
24
- BARBOSA, Elisabete e GRANADO, António (2004) Blogues: Diário de Bordo, Porto
Editora, Porto
- KERCKHOVE, Derrick de (1997), A Pele da Cultura, Lisboa, Relógio d'Água
- LÉVY, Pierre (2001), O que é o virtual?, Coimbra, Quarteto.
- OLIVEIRA, J.M.Paquete, LEITÃO, Gustavo, CARDOSO, J.J.Barreiros (org) (2004),
Comunicação, cultura e tecnologias de informação, Lisboa, Quimera.
- QUERIDO, Paulo, ENE, Luís (2003), Blogs, Lisboa, Centro Atlântico
- ROCHER, Guy (1971), Sociologia Geral 1, Lisboa, Editorial Presença
Recursos online
- BAPTISTA, Joana (2004) O Fenómeno dos Blogues em Portugal, [em linha] URL:
<http://seminarioinvestigacao.blogspot.com/> (consultado em Dezembro de 2005)
- BARBOSA, Elisabete (2003), Jornalismo Digital, [em linha] URL:
<http://www.webjornalismo.com/sections.php?op=viewarticle&artid=7> (consultado em
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25
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<http://www.citi.pt/estudos_multi/homepages/espaco/html/home.html> (consultado em Janeiro
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Comunicações/Publicações
26