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Autor: Lana Lage da Gama Lima

Título: Rebeldia Negra & Abolicionismo


Indicação bibliográfica: Achiamé, Rio de Janeiro, 1981 (Série Universidade  Vol.: 19)
Localização: BPH-UFF
Data da 1ª edição: 1981
Informações sobre a edição: o livro em questão resultou da publicação da dissertação de
mestrado da autora  que ocorreu na UFF sob a orientação da Profª Dr.ª Ismênia de Lima
Martins.
O prefácio e do Prof.º Fernando Novais, que, em relação ao trabalho feito por Lana Lage
afirma: ...o livro de Lana Lage apresenta, em vários tópicos, observações extremamente
felizes, como sobre a violência das mulheres brancas (reequacionando observações de
Gilberto Freyre), ou como sobre a preservação da cultura africana enquanto forma de luta,
numa linha que conflui com as análises recentemente desenvolvidas por Moreno
Fraginals...
Ainda, sobre esta edição, vale salientar que os comentários na “orelha” do livro são de
autoria do Prof.º Joel Rufino dos Santos.

Memória da Escravidão:
► (Págs. 34-35) Vassouras:
Em 1838, os escravos da Fazenda Freguesia, de propriedade do Capitão-Mor Manuel
Francisco Xavier, revoltaram-se, assassinando um lavrador branco e expulsando os
feitores. Em seguida, atacaram a fazenda Maravilha, do mesmo senhor, e se refugiaram nas
matas de Santa Catarina, organizando um quilombo sob a liderança do escravo Manoel
Congo. Sucederam-se então as investidas contra as fazendas da vizinhança, que foram
depredadas e saqueadas.
A primeira expedição organizada para combater os quilombolas, composta de praças e
chefiadas por um oficial da Guarda Nacional, foi fragorosamente derrota, o que tornou os
negros mais ousados em seus ataques.
Alarmados, os fazendeiros apelaram para o Governo Imperial, que lhes enviou um
destacamento de tropas regulares comandado por Caxias. O ataque ao quilombo se deu no
dia 11 de dezembro de 1838, constituindo verdadeira carnificina, pois não tinham os negros
condições de reagir em pé de igualdade às forças enviadas. Os sobreviventes foram
julgados sumariamente e condenados a penas que variaram do enforcamento ao açoite
público. Manoel Congo foi enforcado em 06 de setembro de 1839 e outros líderes, como
Miguel Crioulo, Justiniano Benguela, Antônio Magro e Pedro Magro e Pedro Dias,
sofreram penas de seiscentos açoites cada um.
A devassa referente ao movimento revelou um princípio de articulação entre seus membros,
os quais haviam formado uma organização secreta suspeita de manter relações com os
negros malês de Bahia, sublevados nesse período.
Essa organização continuou funcionando, mesmo depois de destruído o quilombo e, em
1847, consegue articular nova revolta em Vassouras, sob a chefia de um pardo livre
denominado Estevão Pimenta. O movimento, no entanto, não chegou a deflagrar-se, sendo
descoberto antes pelas autoridades.
A devassa instaurada desvendou reminiscências de organização tribal no movimento, cujos
chefes, chamados “Tates Corongos”, procuravam congregar os negros na luta pela
libertação.
► (Págs. 35-36) Iguaçu e Estrela:
Os terrenos alagadiços situados entre os rios Sarapuí e Iguaçu, no recôncavo da baía de
Guanabara, foram, na Província do Rio de Janeiro, das regiões mais procuradas pelos
negros fugidos, justamente pela dificuldade de acesso que apresentavam, constituindo os
mangues um sistema de defesa natural para os quilombolas.
Em 1876, temos notícias de dois quilombos  denominados Gabriel e Bomba  entre os
Municípios de Iguaçu e Estrela. Esses mocambos situavam-se justamente nessa região de
vastos mangues, confinando por um lado com algumas fazendas e por outro com o mar, o
que lhes facilitava a comunicação com a cidade do Rio de Janeiro, de onde saíam barcos
que os negros carregavam com a excelente madeira tirada das matas que ocupavam, em
troca de alimentos e aguardente.
Os proprietários desses barcos eram acusados pelas autoridades policiais de compactuar
com os quilombolas para proteger seu lucrativo comércio, avisando-os sempre que motivos
para supor-se que seriam atacados.
As diligências finais contra esses quilombos começam pela prisão sucessiva de alguns de
sues membros, conseguindo o delegado de Estrela a adesão de um deles em troca de
liberdade. Auxiliados por esse negro, as tropas conseguem penetrar nas matas, aprisionado
os quilombolas e destruindo suas habitações, onde além de armas e ferramentas foram
encontradas 64 talhas de boa madeira.
► (Pág. 38) A violência das senhoras.
Sobre a violência das mulheres dos senhores de escravos, no regime escravista, Lana Lage
afirma:
Nesse contexto é que se explica a particular crueldade das mulheres no tratamento de seus
escravos ― tendência denunciada em vários textos contemporâneos à escravidão e
confirmada pela tradição oral e pelo folclore, onde são comuns as referências a casos em
que as escravas tinham olhos, dentes, seios, unhas ou orelhas arrancados por ordem de suas
senhoras.
O sadismo das mulheres na sociedade escravista ficou, além disso, relatado em fontes ainda
mais insuspeitas, tais, como os exames de corpo de delito anexos aos processos criminais
referentes a morte de escravos. E o certo é que a violência natural das relações entre senhor
e escravo se acentuava nesses casos pela própria situação da mulher na sociedade patriarcal.
Subjugada ao pai e depois ao marido, ela descarregava na negra a tensão de um cotidiano
amesquinhado pelo confinamento nos horizontes estreitos da casa-grande, onde o
envolvimento sexual entre senhores e escravas constituía-se em mais um fator
condicionante de impasses quase sempre resolvidos pela violência.
► (Págs. 87-90)
... no de 1885, a agitação de dos escravos na região alerta as autoridades policiais para o
perigo de uma insurreição em Nossa Senhora da Natividade do Carangola, 2º Distrito de
Paz da Freguesia de Santo Antônio de Garulhos, localizada na fronteira com Minas Gerais.
Tendo fugido, na ocasião, vários escravos da Companhia do Morro Velho, levando munição
e armas, teme-se que estes entrem em contato com os negros de Campos, acusados de
promover reuniões noturnas encabeçadas pelo escravo Paulo, que tinha fama de rebelde,
tendo participado anteriormente de uma insurreição.
Em 1861, a possibilidade de uma sublevação nessa região continua atemorizando as
autoriadades, dando provas de que não haviam serenado os ânimos entre os negros.
► (Pág. 94) Ação dos escravos na justiça:
...os escravos recorriam à justiça quando tinham consciência de que a lei estava do seu lado.
Como ocorreu com o negro Lourenço, escravo de José Basílio Teixeira Pires, que a 22 de
outubro de 1877 se apresentou à secretária de polícia da província, na Corte, para depor
contra seu senhor, morador no sítio da Pedra Lisa, em Campos, declarando ter fugido pelo
fato de não lhe ter sido concedida alforria, pela qual havia pago trezentos e dois mil réis.
Intimado a depor sobre o fato na delegacia de Campos, Teixeira Pires nega o recebimento
da quantia e reclama a posse do escravo.
►(Pág. 102) Mortes por epidemias:
A invasão da “cholera-morbus”, que dizimou a população escrava, trouxe como resultado
grande melhoramento nas condições de bem-estar, de habitação, de vestuário retirada do
trabalho quando chove, etc.;
Memórias do pós-abolição:
► (Págs. 146-147)
...em Campos, os antigos escravos vão de uma fazendas para outras, mas não se conservam
nelas, entendem que a vida e alimentação hão de ser outras; levantam-se às horas que lhes
aprouver, trabalham quando querem, dormem a sesta e à menor observação vão embora (...)
vão para onde mandam os chefes do abolicionismo, inconscientes de si param alguns nas
fazendas onde os colocam, mas voltam em procura de novas casas, novos ares, incertos,
desconfiados, sem consciência do que são e do caminho a segui  a autora cita matéria do
Jornal “Cidade Campos”, de 25 de julho de 1888.
Tráfico de escravos:
► (Págs. 98-99)
Tendo a Província do Rio de Janeiro, e especialmente o Município de Campos, recebido
grande parte dos escravos deslocados do Nordeste após o fim do tráfico, o presidente vai
ver nessa medida uma forma de incentivar a admissão do trabalho livre (relatório do
Presidente da Província do Rio de Janeiro, 1881).
No entanto, o afluxo de escravos continuou grande, como indica a relação dos impostos
arrecadados na província durante o exercício de 1880, onde a taxa de 20$000 sobre a
compra e venda de figura em quarto lugar como fonte de renda:
 imposto de 4% sobre o café 2.563:052$216
 décima urbana 295:338$822
 selo de heranças e legados 254:649$548
 compra e venda de escravos 229:004$671
Dividindo-se o total arrecadado por 20$000, temos 11.450 escravos transacionados na
província em um ano (extraído pela autora do mesmo relatório).
Já o relatório de 1882 vai acusar uma redução na arrecadação de impostos sobre compra e
venda de escravos, calculada em cerca de 100:000$000, tomando-se por base o primeiro
quartel do ano.
....
História de Campos:
► (Págs. 79-83)
Em fins do século XVIII vasta área da planície se encontrava ocupada e dividida em
pequenos lotes aforados, destacando-se apenas qatro latifúndios formados no período da
colonização: a Fazenda do Colégio, confiscada dos jesuítas por Pombal e comprada por
Joaquim Vicente dos Reis; a Fazenda de São Bento, administrada pelos próprios
beneditinos; a Fazenda do Visconde, nas mãos dos descendentes de Salvador Correia de Sá
e a Fazenda do Morgado, fundada por Miguel Ayres Maldonado e administrada pela família
Barcelos.
A cultura canavieira estabelecida em Campos distinguia-se das outras zonas produtoras do
Brasil justamente por ser feita em regime de pequena propriedade, não utilizando, de início,
escravaria numerosa ou grande aparelhagem de beneficiamento, ou seja, não requerendo
grandes inversões de capital. Assim mesmo, a tendência para a monocultura se afirma...
[...]
Lamego Filho destaca três períodos na história do açúcar em Campos: o primeiro, de 1750
a 1830, é o período dos engenhos de tração animal; o segundo, de 1830 a 1880, dos
engenhos a vapor; e o último, a partir de 1880, das usinas. Vemos, então, que a partir da
difusão do vapor como força motriz, a inicial dispersão da propriedade começa a se retrair.
Observando os dados sobre o acréscimo do número de engenhos em Campos, notamos que
o mesmo vai em marcha assessorial até 1828, quando se contam 700 fábricas, a partir daí. A
produção, no entanto, continua em ascensão: em 1852 foi de 8.982.420 quilos, passando a
16.029.080 em 1877, duplicando, portanto, em 25 anos. Isso se explica pela concentração
da lata produtividade dos engenhos a vapor. A atividade açucareira passa a requerer, então,
mais investimento de capital, afastando os pequenos produtores. Começa a fase da grande
propriedade, que transforma a organização social de Campos. [...] A partir de 1880, outra
transformação se opera na produção açucareira, intensificando-se a concentração de capital
através das usinas e engenhos centrais, que acabam por transformar o senhor de engenho
em simples fornecedor de cana, desorganizando toda uma hierarquia social anteriormente
estabelecida. Em 1885, 17 usinas e seis grandes engenhos beneficiavam toda a cana
distribuída, em 1881, por 372 fábricas.
A delimitação do Município de Campos durante o século XIX é tarefa difícil, devido às
flutuações ocorridas, no seu contorno. Vimos que a colonização parte do Campo Limpo, ao
norte da lagoa Feia, com o gado se espalhando pelas margens das lagoas, ocupando a região
das campinas. Iniciada a lavoura de cana, esta vai-se estabelecer na baixada da bacia
inferior do Paraíba, estendendo-se até a lagoa Feia e penetrando nas faixas aluviais dos rios.
Da lagoa, a povoação atinge São Fidélis, penetrando o baixo Muriaé.
[...]
Ao se iniciar a década de 1880, Campos possui uma superfície de 5.415,10 km²
constituídos pela planície e pelos alagados.
Seu principal produto é o açúcar, seguido do café, em marcha ascensional; e das madeiras-
de-lei, em declínio. São esses os produtos exportados pelo município, cujo comércio
atingiu, em 1880, o valor total de 10 mil contos de réis.
Além disso, a região produz: milho, arroz, feijão, mandioca, anil, fumo, cacau e algodão;
mas apenas para o consumo próprio, como também e o caso da criação de gado. As
atividades de beneficiamento restringem-se àquelas ligadas à lavoura canavieira, e mais a
fabricação em pequenas escala de calçados, solas, peles curtidas, farinhas e louças de barro.
[...]
O comércio, que se fazia pelo porto de São João da Barra, é desviado, após a criação da
Estrada de Ferro Campos-Macaé, em 1875, para o porto de Imbetiba, ficando o primeiro
destinado apenas á exportação de madeiras.
OBS: a autora informa que os dados referem-se à situação de Campos em 31 de dezembro
de 1880. Informa, também, extraído essas informações do livro Campos dos Goytacazes,
datado de 1886, cujo autor é José Alexandre Teixeira de Mello.
► (Pág. 138) Incêndios em Campos:
Os incêndios de canaviais começaram a se verificar, em Campos, em agosto de 1884, com
queima das lavouras dos engenhos de Queimado e do Seco, próximos à cidade. E, já nessa
época, supõe-se que não sido acidentais e sim fruto da ação criminosa dos abolicionistas.
Desde então, os incêndios não pararam mais, ocorrendo, de forma intermitente até 1887,
quando se multiplicam. Entre janeiro e fevereiro desse ano sucumbem ao fogo os canaviais
“das fazendas da Abadia, Mantiqueira, Penha, Usina de São João, Outeiro, a do Major José
Francisco de Miranda e Silva, de Francisco Tomás Pinheiro e do Barão de Miranda”
informações coletadas pela autora do relatório do Chefe de Polícia da Província do Rio de
Janeiro em 1887.
Demografia:
► (Págs. 88-89)
Quadro 1: População do Município de Campos — 1880
FREGUESIAS POP. LIVRE POP. ESCRAVA TOTAL % DA POP. ESCRAVA S/A
POP. TOTAL
SÃO SALVADOR 11.490 7.910 19.400 40,77
SÃO GONÇALO 7.191 4.483 11.674 38,40
SANTO ANTÔNIO DOS 6.484 7.825 14.309 54,68
GARULHOS
N.S. DAS DORES DO MACABU 5.949 2.098 8.047 26,07
SÃO SEBASTIÃO 6.402 3.038 9.440 32,18
N.S. DA PENHA DO MORRO DO 4.884 1.766 6.650 26,55
COCO
SANTA RITA DA LAGOA DE 4.292 1.195 5.487 21,77
CIMA

FREGUESIAS POP. LIVRE POP. ESCRAVA TOTAL % DA POP. ESCRAVA S/A


POP. TOTAL
N.S. DA N. DO 3.995 1.764 5.759 30,63
CARANGOLA
S. BENEDITO DA LAGOA 3.426 748 4.174 17,92
DE CIMA
BOM JESUS DE 2.842 1.298 4.140 31,35
ITABAPOANA
MUNICÍPIO 56.955 32.125 89.080 36,06
Fonte: José Alexandre Teixeira de Mello — Campos dos Goytacazes. RJ. Laemmert, 1886.
Quadro 2: População Escrava do Município de Campos segundo ocupação — 1888
FREGUESIAS ARTES E LAVOURA SERVIÇO PROF. TOTAL
OFÍCIOS DOMÉSTICO IGNORADA
SÃO SALVADOR 509 4.739 591 2.071 7.910
SÃO GONÇALO 281 2.597 486 1.119 4.483
GUARULHOS — — — — —
MACABU 62 1.127 138 771 2.098
SÃO SEBASTIÃO 341 1.417 619 607 3.038
MORRO DO COCO 12 1.132 312 310 1.766
SANTA RITA 4 938 40 213 1.195
CARANGOLA 150 998 280 336 1.764
SÃO BENEDITO 7 529 75 137 748
BOM JESUS 49 956 223 70 1.208
MUNICÍPIO 1.415 14.487 2.764 5.634 24.300
Fonte: José Alexandre Teixeira de Mello — Campos dos Goytacazes. RJ. Laemmert, 1886.

Comentários: foram extraídos do livro fragmentos relevantes para a pesquisa.

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